A82
ID: 60904618
10-09-2015
Tiragem: 35268
Pág: 12
País: Portugal
Cores: Cor
Period.: Diária
Área: 25,70 x 31,00 cm²
Âmbito: Informação Geral
Corte: 1 de 3
Suicídio aumentou nas zonas pobres
e rurais do centro e interior Norte
Os municípios mais pobres e mais rurais
são aqueles onde existe maior risco
de suicídio, que em Portugal subiu
depois do início da crise, em 2009
Estudo
Catarina Gomes
Há largos anos que as taxas mais altas de suicídio em Portugal surgem
sobretudo associadas à região sul do
país, sobretudo ao Alentejo, mas um
estudo recente, que analisa o fenómeno ao nível dos municípios, mostra que os suicídios aumentaram no
centro e no interior Norte de Portugal junto à fronteira com Espanha. As
diferenças entre Norte e Sul estão a
esbater-se e é nas zonas mais pobres
e mais rurais que existe maior risco
de suicídio.
Os autores do estudo científico
Suicídio em Portugal: determinantes
espaciais num contexto de crise económica, que foi publicado na revista
científica Health & Place no final de
Agosto, analisa duas décadas de taxas de suicídios em Portugal, divididos em três períodos de tempo: 19891993, 1999-2003 e 2008-2012. Este
último já inclui o período de crise,
assinala o estudo, que faz remontar
o seu início a 2009.
A coordenadora do estudo, a geógrafa Paula Santana, nota que encontraram uma relação entre o suicídio e
os municípios “com maiores graus de
privação material e social”, medidos
através do chamado “índice de privação material”. Este indicador junta a
taxa de desemprego, a taxa de iliteracia (percentagem de pessoas com
mais de 10 anos que não sabem ler ou
escrever) e más condições de habitabilidade (traduzidas na percentagem
de casas sem casa de banho). Assim,
“independente ou além das características individuais de cada um, o
local onde se vive pode influenciar
actos de suicídio”, explica o artigo.
Nos municípios com maiores níveis
de privação o risco de suicídio é de
mais 46% do que no grupo dos municípios mais afluentes.
O trabalho não estabelece uma
relação causal entre a crise e o aumento dos suicídios, mas não deixa de notar que, enquanto entre os
dois primeiros períodos de tempo
houve um decréscimo de 5,4% nos
suicídios, a comparação entre o segundo período e o último dá conta
de um acréscimo de 22,6%. “Os pa-
drões recentes de suicídios podem
resultar do actual período de crise”,
escrevem os autores.
O que a crise pode ter trazido “é o
agravamento destas condições nos
municípios”, nota Paula Santana,
investigadora do Centro de Estudos
de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Coimbra.
Refere-se, por exemplo, que uma das
consequências da aplicação das medidas de austeridade foram os cortes
nos apoios ao transporte de doentes
para os hospitais.
Os dados mostram também que
quem vive em zonas rurais tem maior
risco de suicídio. O “índice de ruralidade” agrega a densidade populacional (numero de pessoas por km2),
a acessibilidade a hospitais (tempo
para ter acesso a uma unidade) e a
percentagem de população rural.
Se é verdade que já era nos espaços
rurais que havia mais suicídios nos
dois primeiros períodos de tempo
estudados, essa associação intensificou-se, sublinha a investigadora. “A
investigação conclui que os padrões
de suicídio Norte/Sul esbateram-se,
mas a divisão entre espaços urbanos
e rurais intensificou-se”, o que é o
mais notório no casos dos suicídios
de homens do que de mulheres.
O aumento do suicídio em zonas
rurais pode ter vários factores explicativos, entre eles “o isolamento
social, o estigma em relação a perturbações mentais (especialmente nos
homens), o fácil acesso a pesticidas
tóxicos e dificuldades económicas”.
Ao mesmo tempo, refere-se que, com
a crise, pode ter havido um aumento da dificuldade destas populações
em ter acesso a antidepressivos e a
serviços de saúde mental. Embora
os autores notem que nas zonas urbanas se encontraram “importantes
bolsas de pobreza”, referem que tende a existir maior acesso aos serviços
e redes de suporte social, tendo as
áreas urbanas resistido mais à crise
do que as rurais.
“As características dos locais de
residência têm um efeito relevante
no comportamento suicidário a nível local”, escrevem os autores, que
recomendam então “a alocação de
recursos para os locais onde existe
maior concentração de suicídios nes-
Um em cada cinco suicídios tem que ver com o desemprego
E
m termos internacionais,
em cada ano, cerca de
45.000 pessoas põem
fim à vida, porque estão
desempregadas. E isso já
acontecia antes da recessão
económica dos últimos anos —
embora a crise global de 2008
tenha obviamente exacerbado
a situação. Esta é a principal
conclusão de um artigo
publicado este ano na revista
The Lancet Psychiatry, noticiado
pelo PÚBLICO.
Os autores concluem que
o desemprego associado
à crise de 2008 provocou
efectivamente um excesso de
suicídios: cerca de 5000. Porém,
o estudo mostra que o número
de suicídios anuais associados
ao desemprego é nove vezes
maior do que o número
directamente relacionado com
a crise.
Assim, cerca de um suicídio
em cada cinco é devido ao
desemprego e, em todas as
regiões consideradas, o risco
de uma pessoa desempregada
se suicidar é 20% a 30% mais
elevado do que o risco de uma
pessoa empregada se suicidar.
Uma outra conclusão do
estudo é que os suicídios
associados à actual recessão
económica mundial começaram
a aumentar seis meses antes
do início “oficial” da crise em
2008. “A evolução do mercado
de trabalho foi claramente
antecipada e as incertezas
relativas à situação económica
já tiveram, naquela altura,
consequências negativas”.
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ID: 60904618
10-09-2015
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País: Portugal
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Área: 25,70 x 30,36 cm²
Âmbito: Informação Geral
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Isolamento e
dificuldades
económicas
podem
explicar
aumento no
interior
ADRIANO MIRANDA
O QUE ELES DIZEM
“A solução não está
na saúde mental,
está na Segurança
Social, no
desenvolvimento
de programas activos
de criação de trabalho”
“Em situação de crise
não é com
antidepressivos
e psicoterapia que
se resolvem os
problemas, pode-se
amenizar o desespero”
Álvaro Carvalho
Director do Programa
Nacional para a Saúde Mental
“A investigação
conclui que os padrões
de suicídio Norte/Sul
esbateram-se, mas
a divisão entre
espaços urbanos e
rurais intensificou-se”
tas áreas rurais. O interior alentejano
continua a apresentar um risco muito alto de suicídio, mas nos mapas
incluídos no trabalho nota-se que,
de 2008 a 2012, os maiores aumentos das taxas maiores de suicídio incluem municípios rurais do distrito
de Bragança junto a Espanha, assim
como o interior centro do país.
O director do Programa Nacional
para a Saúde Mental, o psiquiatra
Álvaro Carvalho, que hoje se vai referir a este estudo na conferência
Prevenção do Suicídio: Responsabilidade Partilhada, que se realiza em
Beja, assinalando o Dia Mundial de
Prevenção do Suicídio, constata que
o estudo “mostra uma relação dos
suicídios com a crise”. E se é verdade que mais pode ser feito ao nível
do diagnóstico precoce de situações
de depressão, “em situação de crise
não é com antidepressivos e psicoterapia que se resolvem os problemas,
pode-se amenizar o desespero”. O
médico sublinha que “com medidas
concretas que levem à redução do
desemprego é que se pode alterar
o estado de humor das pessoas. A
solução não está na saúde mental,
está na Segurança Social, no desenvolvimento de programas activos de
criação de trabalho”.
Portugal é um dos países com a
mais baixa taxa de suicídios na Europa, diz-se, mas o estudo ressalva
que o suicídio pode estar subrepresentado, uma vez que nos dados do
INE (usados neste trabalho) 9,6% das
causas de morte estão por definir.
“As características
dos locais de residência
têm um efeito
relevante no
comportamento
suicidário a nível local”
Paula Santana
Geógrafa, coordenadora
do estudo Suicídio em
Portugal: determinantes
espaciais num contexto
de c
crise
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económica
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nó
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Professores com formação
para identificar perturbações
Catarina Gomes
Cerca de 1500 professores vão receber formação para saberem identificar “a diferença entre um comportamento desafiador, mas que
é ‘normal’, e atitudes que podem
esconder uma perturbação psiquiátrica nas crianças e adolescentes”,
refere um comunicado da Aliança
Europeia contra a Depressão em
Portugal (Eutimia).
O programa WhySchool vai abranger 16 agrupamentos de escolas. O
objectivo da formação dos professores é “melhorar a literacia e as
aptidões na gestão dos problemas
de saúde mental, em particular na
identificação de casos, triagem, referenciação e apoio aos casos em
risco”. Ao todo serão beneficiados
cerca de 100 mil estudantes, entre
os 12 e os 18 anos.
A formação visa “melhorar o acesso dos jovens aos cuidados de saúde
mental, já que actualmente apenas
10% a 15% das crianças e adolescentes com problemas de saúde mental
recebe ajuda”, lê-se no comunicado
da Eutimia. Para tal, será disponibilizada uma plataforma de e-learning
com conteúdos educativos na área
da saúde mental dos adolescentes e
depressão, dirigidos a professores e
educadores e um site para os jovens
e encarregados de educação, que serão utilizados pelos professores na
sala de aula.
O projecto é financiado no âmbito
do programa EEA Grants (linha de
financiamento concedida pela Islândia, Liechtenstein e Noruega aos Estados-membros da União Europeia),
sendo gerido pela Administração
Central do Sistema de Saúde.
Este programa será apresentado
hoje na conferência Prevenção do
Suicídio: Responsabilidade Partilhada, em Beja, assim como um outro
programa nacional de formação que
vai dar formação em depressão a 900
médicos de família, enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais a trabalhar em centros de saúde. Dois dos
seus objectivos são a prevenção do
suicídio e a redução do consumo de
ansiolíticos, explicou o responsável
pelo projecto, o psiquiatra e presidente da Eutimia, Ricardo Gusmão.
Uma das ferramentas do programa
nacional envolverá uma plataforma
informática que poderá ser prescrita
pelo médico de família, sendo dado
ao doente um login e palavra-passe,
sendo o seu uso acompanhado por
um profissional de saúde.
Quando a plataforma informática que pretende ajudar doentes do
SNS com depressão foi apresentada,
em Maio, a Ordem dos Psicólogos
considerou que o seu anúncio “cria
expectativas exageradas na população e justifica as políticas de fraco
investimento na saúde mental dos
cidadãos”. Na opinião da ordem, afirmar que a aplicação faz psicoterapia
é “um abuso de linguagem” e “uma
extrapolação da eficácia para aquilo
que pode ser um instrumento útil,
mas limitado”. A ordem entende que
a resposta deve passar pela “contratação de psicólogos.
Para assinalar o Dia Mundial da
Prevenção do Suicídio, este ano sob o
lema “Chegar mais próximo e salvar
vidas”, a Linha SOS Voz Amiga (21354
45 45; 91 280 26 69; 96 352 46 60) assegura 48 horas de atendimento telefónico contínuo, entre as 00h00
de 9 de Setembro até às 24h00 do
dia 10 de Setembro. A Linha SOS
Voz Amiga é um serviço de ajuda telefónica pontual —confidencial, com
anonimato —, em situações agudas
de sofrimento emocional causadas
por solidão, ansiedade, depressão e
risco de suicídio.
Psiquiatra Ricardo Gusmão
preside à Eutimia
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Suicídio aumentou nas zonas pobres e rurais do centro e interior