Veículo: Portal R7
Data: 21.07.11
Consumo e crédito crescem, mas colocam economia do país em risco
Isso, combinado a juros altos, é bomba ao bolso do consumidor e pode superaquecer o país
Consumo e crédito continuam crescendo sem parar no Brasil, mas isso não é necessariamente
uma coisa a ser comemorada. A combinação de juros altos e inflação é uma verdadeira bomba
para o bolso do consumidor, e os economistas já falam em superaquecimento brasileiro. Em
um cenário como esse, há um jeito quase infalível de o trabalhador proteger o próprio dinheiro:
poupando e evitando financiamentos longos.
Juros mais altos, de 12,5% ao ano, indicam que a hora é de aperto nas finanças
Renda fixa é a melhor aplicação em 17 anos do Real
Renda fixa é ideal para quem quer evitar riscos
Nesta quarta-feira (20), os juros do país subiram novamente, para 12,5% ao ano, para manter
a política do Banco Central de controle da inflação. A nova taxa afeta diretamente os gastos do
dia a dia, desde a compra do mês no supermercado até o financiamento do carro novo.
Um levantamento feito pela revista inglesa The Economist mostra que o Brasil é o país que tem
“uma das maiores taxas de juros reais do mundo”, o que o coloca entre os emergentes que
mais “correm o risco de superaquecer”.
Os juros reais descontam a inflação da taxa nominal da economia. Aqui, essa taxa é de “quase
6%”. A revista levou em conta a Selic na casa dos 12,5% e subtraiu dela o IPCA (Índice de
Preços ao Consumidor Amplo) de 6,3% (com os dados da inflação de maio).
A lista dos “emergentes ferventes” tem 27 economias, analisadas a partir de seis aspectos:
juros reais, inflação, emprego, crédito, balança comercial (a diferença entre o que o país
importa e exporta) e o PIB (Produto Interno Bruto, isto é, a geração de riquezas). A Argentina é
a economia mais perigosamente aquecida, com dados alarmantes nos seis componentes. O
Brasil e outros cinco (Hong Kong, Índia, Indonésia, Turquia e Vietnã) vêm em seguida.
No caso brasileiro, cinco dos seis indicadores preocupam, sobretudo por causa dos dados
contraditórios. A inflação só saiu do controle porque o governo vem incentivando o consumo
desde o final de 2008, após o estouro da crise econômica, com juros menores e mais crédito
na praça para os trabalhadores.
O economista Felipe Leroy, professor do Ibmec-MG, explica que o governo agora quer reverter
os juros para deixar o crédito mais caro, mas o brasileiro tem salários cada vez maiores e quer
continuar consumindo independentemente do financiamento ter ficado mais pesado ou não.
O que faz a renda subir é justamente a busca mais intensa das empresas por funcionários. Por
causa disso, por exemplo, é que o desemprego está em seus menores níveis da história.
- A nossa inflação é de demanda. Há procura maior do que a oferta. O culpado por toda essa
inflação é o próprio governo, que baixou a Selic [em 2009], ampliou crédito para a construção
civil, o que pressionou os preços de imóveis, e cortou impostos para automóveis, entre outras
medidas. Tudo foi feito para aquecer a economia [na época da crise], mas agora é hora de
controlar.
E como falar em renda alta é falar em mais grana rodando no mercado, uma coisa leva a outra:
com um dinheirinho extra o consumidor quer comprar, o comércio vende mais, a fábrica eleva a
produção e tem que contratar mais para dar conta de abastecer o mercado, pagando salários
maiores, que virarão mais consumo.
Demanda e oferta
Isso não parece nem de longe uma coisa ruim, mas a questão da demanda e da oferta ajuda a
explicar outro componente preocupante – e contraditório – da economia do nosso país.
O dólar nunca esteve tão desvalorizado em relação ao real desde 1999. Com a moeda
americana baratinha, praticamente todos os setores da economia acabam levando vantagem
ao comprar produtos de fora: seja a fábrica que precisa de uma máquina, o comércio que
vende televisores e computadores, o pequeno importador que repassa perfumes e o milionário
que curte carrões.
As contas de negócios do Brasil com outros países tiveram resultado negativo em maio de
2011, de R$ 6,5 bilhões (US$ 4,1 bilhões). Isso significa que o país trouxe de fora muito mais
coisa do que mandou para o estrangeiro. E quem sofre é a indústria daqui.
As fábricas são obrigadas a conviver com uma enxurrada de produtos da Ásia (leia-se China) e
ainda manter a produção para atender o consumo interno. Impostos altos e burocracia são a
principal crítica à falta de competitividade dos itens “made in Brazil”. Mas são os importados
que seguram a inflação onde está. Sem eles, ela seria muito maior, analisa o economista Silvio
Campos Neto, da Tendências Consultoria.
- Isso fica claro no segmento de serviços, que não tem como aumentar a oferta via
importações. Esse setor não se beneficia da valorização cambial. E o que vemos é que o
sujeito que tem uma doméstica em casa, que vai ao cabeleireiro ou que depende de qualquer
outro tipo de serviço está pagando cada vez mais caro por isso. Os serviços encareceram 8,7%
[acima da inflação] nos últimos 12 meses.
Como é que eu fico
E nessa roda cheia de contradições está o brasileiro, que vê a economia crescer como “nunca
antes na história do país”. O PIB do país avançou 7,5% em 2010 – o maior número já visto nos
últimos 24 anos. Em 2011, deve crescer na casa dos 4%. Então vem a questão: é hora de
gastar para aproveitar o bom momento ou de poupar para caso esse superaquecimento vire
um esfriamento crônico?
Os economistas são unânimes em defender mais cautela ao consumidor. Campos Neto afirma
que a questão não é parar de comprar de uma vez por todas, mas analisar bem cada gasto e
aprender a ter controle sobre essas despesas.
- A onda é positiva, mas temos um programa de aperto monetário na economia. Não é o
momento de um endividamento excessivo. O ideal é que as pessoas evitem compromissos
acentuados.
Leroy diz que não é da cultura do brasileiro poupar o suficiente para comprar as coisas à vista,
tampouco se preocupar com os juros dos financiamentos longos.
- O consumidor costumeiramente não poupa, mas ele tem que ficar atento com as compras e
os prazos. Tem que poupar, mas em vez de aplicar só na poupança, é interessante buscar
uma renda fixa.
Segundo uma pesquisa do Instituto Assaf, as aplicações em fundos de investimento em renda
fixa tiveram os melhores rendimentos dos últimos 17 anos, já que a valorização no período foi
de 2.481,81% desde a criação do Plano Real. Isso significa dizer que um investimento de R$
1.000 feito em 1º de julho de 1994 virou um montante de R$ 24.818,10.
Nesse cenário de juros maiores e inflação em alta, então, vale mais investir o dinheiro do que
sair por aí torrando tudo. Em junho, o número de famílias endividadas aumentou em SP,
segundo uma pesquisa da Fecomercio (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo
do Estado de São Paulo). Quase metade de todos os consumidores da capital tem alguma
conta para pagar, ou 1,683 milhão de famílias.
Três em cada dez famílias (29,4%) têm dívidas que deverão ser pagas em mais de um ano.
Outros 23,2% têm o orçamento comprometido com o pagamento de dívidas por períodos entre
três e seis meses. Só pouco mais de uma família a cada cinco (22,6%) pagarão as dívidas em
período de três meses.
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