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REPRESENTAÇÃO SOCIAL DO PROCESSO DE ENVELHECER: UMA VISÃO
DOS ACADÊMICOS DE ENFERMAGEM
Aline Cecilia Pizzolato1
David Osório França2
Juliana Salszbrun3
Rosimara Ganassoli4
O envelhecimento da população é um fenômeno mundial. O Brasil denominado “país
de jovens” pode ser considerado um país estruturalmente envelhecido, segundo
padrões estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) (DUARTE, 2005).
Para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) o Brasil em 2025 será o
6º país em população idosa do mundo. Portanto, é fundamental que os profissionais
da saúde, compreendam o processo de envelhecimento e suas peculiaridades de
forma a direcionar seus esforços na construção de um futuro digno e humano a
todos (DUARTE, 2005). Estudos tem sido realizados objetivando verificar as
representações sociais da velhice, a auto-Representação Social dos idosos e a
relação entre as duas. Conforme Araújo e Carvalho (2004), os resultados indicam
uma tendência a considerar a velhice, principalmente, de forma negativa em ambos
os grupos. Neri (1998), por sua vez, ressalta que o desconhecimento do que
significa ser velho induz a práticas com foco ideológico, que contribuem para a
manutenção e a propagação de mitos, estereótipos e preconceitos acerca da
velhice. Muitas crenças e valores que a atual sociedade impõe, nem sempre podem
ser acompanhados pelos idosos, se levar em consideração suas limitações e
algumas mudanças e perdas que freqüentemente se associam à velhice (VELOZ,
1999). Parte dessas crenças é construída na forma de representações, nas
conversações diárias dos grupos. Medrado (1996), diz que compreender a
Representação Social da velhice é apreender as imagens e os significados
atribuídos a essa etapa do desenvolvimento e às conseqüências dessas
representações sobre a identidade dos idosos; enfim, é compreender o seu espaço
1
Enfermeira, Especialista em Enfermagem em Emergência. Contato: <[email protected]>
Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
2
Enfermeiro, cursando Especialização em Terapia Intensiva, IBEPEX.
3
Enfermeiro, cursando Especialização em Terapia Intensiva, IBEPEX.
4
Enfermeiro, cursando Especialização em Hemoterapia, Instituto de Ensino e Pesquisa em Saúde de
São Paulo.
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no meio em que está inserido. Segundo Jodelet (apud MOSCOVICI, 1981) as
representações sociais são um saber prático. A função essencial da Representação
Social, para aqueles que representam, é tornar aquilo que não é familiar em algo
familiar, próximo e prático. Essa função relaciona-se com a tentativa de representar
uma realidade pouco conhecida. Assim, dentro da nossa inquietação queremos
conhecer qual a visão que os acadêmicos de Enfermagem dos diversos
períodos da graduação da PUC-PR têm com relação ao processo de
envelhecimento do idoso. E como objetivos específicos: conhecer o que os
acadêmicos sabem sobre o processo de envelhecimento; identificar como os
acadêmicos sabem sobre o processo de envelhecimento; e identificar a origem do
conhecimento dos acadêmicos sobre o processo de envelhecimento.
Segundo
Salgado (1982), a velhice é entendida como uma etapa da vida na qual, em
decorrência da alta idade, ocorrem modificações de ordem bio-psico-social que
afetam a relação do indivíduo com o meio. O envelhecimento traz várias
conseqüências sociais, de saúde e econômicas e pode ser definido como uma série
de modificações morfológicas, psicológicas, funcionais e bioquímicas que ocorrem
com o passar do tempo, nos seres vivos (VERAS, 1999, p. 20). De acordo com
Nakamura (2005, p.7), o cuidado voltado ao idoso constitui-se um serviço de saúde
que
incorpora
aos
conhecimentos
específicos
de
Enfermagem
àqueles
especializados sobre o processo de envelhecimento para estabelecer, no idoso e ao
seu redor, as condições que permitam, entre outras, aumentar as condutas
saudáveis e minimizar e compensar as perdas de saúde relacionadas com o idoso.
Com relação à formação acadêmica do enfermeiro pode-se dizer que apesar do
crescimento significativo da população idosa poucas são as faculdades na área de
Saúde que preparam o profissional para enfrentar essa realidade (UPE, 2005).
Segundo Santos (2001) é importante não somente os alunos aprenderem a resolver
os problemas de saúde ligados aos seres humanos idosos, mas compreenderem as
questões de saúde, como um todo, interpretando e construindo a realidade através
de uma reflexão histórico-crítica e contextualizada. Para Lisboa (2000) existe uma
visão fragmentada da assistência envolvendo a formação do profissional enfermeiro.
Nesta visão o conhecimento transmitido aos acadêmicos está voltado para o
processo de doença do idoso e, não para o processo saúde-doença. A Teoria das
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Representações Sociais foi introduzida por Moscovici (1961 apud JUNQUEIRA,
1998), em princípio, dentro da Psicologia Social, mas posteriormente seus
seguidores atribuíram-lhe um caráter multidisciplinar. Segundo Jodelet (1985 apud
MEDRADO, 1996), o campo da Representação Social compreende um conjunto
hierarquizado de elementos em termos do conteúdo (predominância, oposição, etc.,
de um elemento sobre o outro) e do caráter vasto desse conteúdo, suas
propriedades qualitativas e figurativas; remete a uma atitude manifesta em relação
ao objeto, uma resposta organizada (complexa) e latente, uma orientação face ao
objeto da representação, à qual é determinada, fundamentalmente, pelo nível de
informação de que o individuo dispõe acerca do referido objeto. Não existe
representação sem informação. Jodelet (1986 apud JUNQUEIRA, 1998) define as
representações como formas de conhecimento prático, como o saber do senso
comum, que tem a função de estabelecer uma ordem, que tanto permite ao indivíduo
orientar-se e dominar seu mundo social e material, como possibilita a comunicação
entre os mesmos, caracterizando-se assim como linguagem do cotidiano. Assim, à
medida que surgem novos problemas no cotidiano, na busca de soluções, a
sociedade produz novas representações, levando os indivíduos a transformar em
familiar o que lhes é estranho. Esse estudo foi baseado no modelo de pesquisa
qualitativa social de caráter exploratório. O modo tradicional de ver as coisas
desconsidera a característica especificamente qualitativa do pensamento coletivo e
afirma que se um indivíduo tem um pensamento, uma coletividade também
apresenta uma distribuição estatística desse pensamento (LEFÈVRE; LEFÈVRE,
2003). Como referencial teórico metodológico utilizamos a Teoria das Representações
Sociais, de Moscovici (1978), em três dimensões de representação: o idoso, o processo
e a formação. A estratégia metodológica foi a do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) de
Lefèvre e Lefèvre (2003) uma proposta que visa organizar e tornar mais clara uma dada
Representação Social e o conjunto de representações, reunindo vários discursos
obtidos em um único discurso síntese. A proposta consiste em analisar o material verbal
coletado, extraindo-se de cada um dos depoimentos, as idéias centrais e/ou
ancoragens e as suas correspondentes expressões chave denominada de figuras
metodológicas; com as expressões chave das idéias centrais ou ancoragens
semelhantes compõe-se um ou vários discurso - síntese na primeira pessoa do singular
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(LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2003). Essa pesquisa foi realizada numa instituição privada de
ensino superior, a Pontifícia Universidade Católica do Paraná, localizada no município
de Curitiba-PR. Especificamente no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS)
no Curso de Enfermagem. Esse trabalho foi realizado com dezesseis acadêmicos,
sendo entrevistados dois acadêmicos de cada período da graduação, cujo critério de
inclusão foi: ser maior de 18 anos e matriculado no Curso de Enfermagem,
selecionados de forma aleatória. Como forma de coleta de dados foi empregada a
entrevista, tendo sido utilizado um questionário semi-estruturado composto de questões
abertas. Todas as entrevistas foram gravadas. Os discursos individuais obtidos
durante as entrevistas gravadas, foram ouvidos e transcritos um a um em seu estado
bruto. A partir disso, as informações foram organizadas e avaliadas por meio da
elaboração do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). Após a construção dos discursossíntese, cada um foi considerado à luz da literatura tomando por base as
experiências do grupo durante a realização das entrevistas. Foram seguidos os
princípios éticos de autonomia, beneficência, não maleficência e justiça do Conselho
Nacional de Saúde - Resolução 196/96. As considerações finais são: Percebemos
que o quê os acadêmicos do Curso de Enfermagem dos diversos períodos da
PUCPR sabem sobre o processo de envelhecer não é suficiente para promover o
cuidado ao idoso. Essa problemática levantada é uma conseqüência da formação
acadêmica superficial que não prepara adequadamente os futuros enfermeiros no
que diz respeito a atender as necessidades humanas básicas do idoso. Quanto a
origem do que sabem e como sabem, notamos que a minoria dos entrevistados tem
a visão do processo de envelhecer como uma transformação biofisiológica na qual
ocorre a diminuição das funções do organismo, sendo este conhecimento adquirido
durante a formação acadêmica. Em contrapartida, a grande maioria, fala do
processo de envelhecer como algo natural, o qual todos estão sujeitos a passar e
esta visão esta ancorada no convívio com familiares idosos, o que implica em dizer
que seu conhecimento é empírico. Para os acadêmicos, o processo de envelhecer
representa: a) o conceito de velhice esta associado à visão negativa que a
sociedade tem sobre o idoso como um ser sem importância, descartável, ignorado,
desrespeitado, discriminado, um incômodo, dependente, frágil, sinônimo de doença,
abandonado, improdutivo, desvalorizado que não tem o seu espaço; b) ser velho é
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uma pessoa que passa de uma determinada idade e que envelhece gradativamente.
Muitas vezes, a idade cronológica não acompanha a idade fisiológica. Há diferenças
entre as pessoas no decorrer do desenvolvimento e isto acarreta no envelhecimento
a diferença de um velho ativo para um velho inativo, dependendo da classe social
que está inserido e a representatividade que ele tem nos meios de comunicação; c)
as pessoas envelhecem de forma gradativa, com o passar dos anos surgem as
rugas, cabelos brancos entre outras características da velhice, o que não é visto
como algo bom pela sociedade, pelo fato de que a mídia supervaloriza a jovialidade
e a aparência; d) após a aposentadoria muitos idosos começam a desfrutar do tempo a
seu favor participando de programas para idosos, voluntariados, atividades em grupos,
entre outras formas de inserção social e meios de manter o idoso como um ser ativo. Há
também, pessoas idosas que mesmo após a aposentadoria continuam produzindo, visto
que isso gera uma gratificação para o idoso, pois ele se sente parte de sua família e da
sociedade; e) o idoso quando ouvido é um ser com vasta experiência de vida que
transmite conhecimentos, pois sua sabedoria foi adquirida pela vivência e por isso,
tem muita história para contar.
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REFERÊNCIAS
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e. Velhices: estudo comparativo das representações sociais entre idosos de grupos
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<http://www. pec.uem.br/dcu/Trabalhos/3laudas/>. Acesso em: 2 mar. 2005.
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7
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Palavras-chave: Representação Social. Idoso. Processo de Envelhecer. Acadêmico de
Enfermagem
Área temática: Relações de trabalho: ética e subjetividade.
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