II Congreso de Estudios Poscoloniales y III Jornadas de Feminismo Poscolonial Mesa Temática 11: Epistemologías disidentes, género y color Título: SABERES COMUNITÁRIOS E AGÊNCIA FEMININA DAS PARTEIRAS AMAZÔNICAS Autores: Iraci Barroso (Doutoranda em Sociologia - DINTER UFC/UNIFAP), [email protected]; Cristian Paiva (Professor do PPG-Sociologia/Universidade Federal do Ceará), [email protected]). Resumo: Trata-se de um estudo tipo descritivo de caráter qualitativo em que pretendemos evidenciar as disputas e tensões, campos de agência e processos de subalternização associados à semântica dos termos: “saber tradicional”, “saber comunitário”, “práticas alternativas”, “capacitação técnica”, dentre outros, a partir do relato das parteiras rurais e remanescentes quilombolas que vêm se configurando como interlocutoras de nossa pesquisa de doutoramento, indagando sobre suas percepções sobre essa linguagem regulatória do saber e como essas injunções científicas e institucionais vêm impactando sua atuação no partejar, sua relação com as parturientes e crianças e seu protagonismo nas comunidades a que pertencem. Os resultados revelam que a história dessas mulheres se inscreve em um saber milenar que ao longo do tempo oferece significativa contribuição para a construção de um novo olhar em busca da humanização do parto e das relações no contexto da saúde, embora muito desse saber tenha sido desqualificado pela institucionalização dos cuidados com o parto e nascimento. Palavras-chave: Parteira tradicional. Saber comunitário. Subalternização. Agências culturais. Abstract: It is a descriptive study of qualitative character in which we intend to highlight the disputes and tensions, agency fields and processes of subjection of semantic related terms: "traditional knowledge", "know", "community practice" alternatives, "technical training", among others, from the account of rural midwives and remnant quilombolas coming shaping up as speakers of our doctoral research, inquiring about their perceptions about this regulatory language of knowledge and how these scientific and institutional orders are impacting you‟re in deliver, their relationship to the women and children and its role in the communities to which they belong. The results reveal that the story of these women subscribes to a millennial know that over time provides a significant contribution to the construction of a new look in search of humanization of childbirth and relations in the context of health, although much of this knowledge has been disqualified with the institutionalization of care with labor and birth. Keywords: traditional Midwife. Know community. Neutralising. Cultural agencies. 1. Introdução O presente artigo tem a intenção de evidenciar as disputas e tensões, campos de agência e processos de subalternização associados à semântica dos termos: “saber tradicional”, “saber comunitário”, “práticas alternativas”, “capacitação técnica” de parteiras tradicionais e injunções científicas e institucionais que vêm impactando a atuação no partejar tradicional. Os dados da Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde (PNDS), indicam que no Brasil, entre 1996 e 2006, o percentual de partos hospitalares passou de 96% para 98%, com variações regionais (92% na região Norte e 99,5% na região Sudeste). Em muitas regiões do País, especialmente nas zonas rurais, ribeirinhas e lugares mais distantes, a única opção que existe para a mulher é o parto domiciliar assistido por parteiras tradicionais (MANUAL REDE CEGONHA/MS, 2011, p.10). Anualmente, são realizados, em média, 41 mil partos domiciliares, a maioria é assistida por parteiras tradicionais, sobretudo, nas Regiões Norte e Nordeste do País (DATASUS/MS, 2012). Na Região Norte está a maior concentração, aproximadamente vinte mil parteiras tradicionais. (REDE DAS PARTEIRAS TRADICIONAIS, 1998, P.5). No Estado do Amapá, o censo de parteiras tradicionais de 1995, apontava a existência de seiscentas e noventa e oito parteiras em todo o Estado (LACZYNSKI, 1999). Atualmente estão cadastradas 1.531 parteiras tradicionais (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012). Os acontecimentos que envolvem o processo do parto e do nascimento em comunidades rurais e ribeirinhas da Amazônia brasileira se apresentam como uma experiência tecida em uma rede de múltiplos significados tanto para as parteiras tradicionais como para as parturientes, como para seus familiares (BARROSO, 2001; 2009). O parto domiciliar tem importância cultural nessas comunidades, particularmente nas rurais e quilombolas. As parteiras tradicionais exercem forte protagonismo cultural, herdeiras de um saber recebido de suas mães e avós, passados de geração a geração. Interessa-nos discutir, a experiência comunitária da Rede das Parteiras Tradicionais do Amapá, o marco legal constituído pelo PL n. 2354/2003 (que regulamenta o exercício da profissão de parteiras tradicionais) e o Projeto de Resgate e Valorização das Parteiras Tradicionais, de 1995, financiado pela UNICEF (com o objetivo de promover a profissionalização e a capacitação das parteiras do Amapá), como se articulam, deslocam e (re)significam essa redes de sujeitos, saberes e agências culturais em torno da dicotomia tradicional x científico na questão do parto e do nascimento. Revestindo-se da linguagem dos direitos reprodutivos e inserindo-se nas estratégias das políticas nacionais de inclusão no âmbito da saúde, o “ofício do partejar” protagonizado pelas parteiras, passa a disputar espaço nas práticas de cuidado com o corpo da mulher e com a saúde das crianças, objetos privilegiados da medicina contemporânea a partir do século XVIII, e que caracteriza a atual “monocultura do saber” (SANTOS, 2009) médico/científico, produzido por um sujeito epistêmico universal (masculino e colonial) e centrado na concepção do corpo humano abordado como unidade psicofisiológica recortada de suas pertenças comunitárias. Nossa intensão, não é de empreendermos uma análise biomédica, mas de contribuirmos com dados contextuais e etnográficos a fim de pluralizar as imagens que têm se cristalizado sobre as parteiras tradicionais no Brasil, evidenciando tensões e subalternidade, especialmente no Estado do Amapá parte da Amazônia Legal. Nos depoimentos optamos pela utilização de nomes fictícios para preservar a identidade das interlocutoras. 1.1. Parteiras da Amazônia Brasileira: recorte empírico A Amazônia brasileira abriga uma diversidade geográfica e cultural imensa que se expressa, entre eles, na atenção da saúde e no universo simbólico representado por meio das distintas práticas de cuidar da gestante e do nascimento. Nas comunidades rurais, o processo de nascimento em domicilio se apresenta como uma experiência tecida em uma rede de múltiplos significados e simbolismos, tanto para as parteiras tradicionais como para as mulheres por elas assistidas. Especialmente na zona rural e nas áreas ribeirinhas de difícil acesso do Estado do Amapá, a única opção para a parturiente é o parto domiciliar assistido pela parteira. Nosso projeto de doutoramento em andamento tem na pesquisa empírica um recorte de 20(vinte) parteiras tradicionais remanescentes quilombolas e rurais que residem na comunidade de Ilha Redonda-AP. Esta comunidade é composta por remanescente de quilombos e existe há aproximadamente 170 anos, fica localizada na BR 210, distante a 14 km de Macapá, capital do Estado do Amapá, tem cerca 90 famílias morando na comunidade nesta comunidade quilombo. Descrevemos as parteiras como mulheres nascida e criadas na roça, acostumadas a andar quilômetros carregando saco de farinha, mandioca e outras plantações colhidas da roça. A maior parte delas vem de famílias numerosas e um dado interessante é que todas as entrevistadas nasceram por mãos de parteiras, suas avós, mães ou vizinhas. Daí o inicia de suas experiências na “arte de partejar”. Em seus relatos as interlocutoras contam que a herança herdada de suas antepassadas, fez com que adquiriram suas aptidões fazendo partos de outras mulheres, estimuladas pelo desejo de servir ou pela curiosidade. Na comunidade, as parteiras exercem forte protagonismo cultural, herdeiras de um saber tradicional apreendido culturalmente e transmitido as novas gerações. Em geral, são mulheres humildes e não alfabetizadas, prestam assistência ao parto domiciliar é por isso são reconhecidas e legitimadas pela comunidade como parteira. A formação das 20 (vinte) protagonistas não foi adquirida nos banco de universidades, não possuem diplomas, nas palavras das parteiras “a prática é a escola da vida”. Há um embate, a falta de assistência às mulheres pelo poder público naquela comunidade e a forma como as parteiras assistem as mulheres. Essas Parteiras fazem mais do que partos, são conselheiras, curadoras da família e da população, são mulheres que detêm saber essencial na sobrevivência de suas comunidades. Herdeiras de um saber histórico-cultural acreditam que o “dom de partejar” é aprimorado com os conhecimentos recebidos oralmente, com a prática e nos cursos de capacitação. A compreensão, dessas mulheres, das doenças e de suas práticas tem uma forte conotação mágico-religiosa. Elas utilizam os elementos biológicos e culturais para a sua prática cotidianas, por isso conseguem uma relação integradora com as parturientes e seus familiares e por fim com a comunidade. As parteiras que fazem parte deste universo empírico dispensam contar número de partos, elas narram cada parto e são essas narrativas que contribuem na comunidade para socialização de seus saberes e também para o processo de legitimação no campo das relações de reciprocidade, prestígio e poder local. Em medos da década de 1990, no Estado do Amapá, as parteiras são inseridas nas políticas públicas, como um projeto de visibilidade a seu saber e articular com o saber médico. Na verdade, elas sempre estiveram presentes em muitas localidades deste Estado, em comunidades onde não há médicos, são as parteiras que tomam conta da saúde da população e, muitas vezes, fazem a articulação para levar as pessoas para os postos de saúde ou hospitais das cidades vizinhas. Por isso elas são o elo entre a comunidade e os serviços de saúde. Por suas características peculiares, as parteiras tradicionais são nas comunidades pessoas mais qualificadas para oferecer uma assistência totalmente humanizada ao parto, que respeite integralmente as características socioculturais das parturientes, em especial nas zonas rurais. Sua relação com a comunidade é afetiva vez que a qualquer hora atendem a mulher e os indivíduos da comunidade. Em troca são recompensadas com gêneros alimentícios ou outros produtos que a comunidade dispõe na ocasião do atendimento. A despeito da grande relevância social do exercício da “arte de partejar” as parteiras não tem qualquer garantia trabalhista. Entretanto, as parteiras do Amapá, através do “Projeto de Resgate e valorização de Parteiras”, cadastradas e “capacitadas”, recebem desde o ano de 2012 uma “bolsa parteira” equivalente a meio salário mínimo vigente no país, que não atende suas necessidades básicas. 2. Saber Tradicional de Parteira Deslocado do Saber Científico Masculino A medicina contemporânea se configura como intervenção científica, com um conjunto de conhecimentos, técnicas e práticas que se fundamenta a partir do final do século XVIII, onde figurava a diversidade da prática da “arte da cura” e os cuidados com o corpo da mulher pertencentes ao saber de parteiras. Firma-se no início do século XIX a prática dos cuidados com o corpo feminino como competência exclusiva dos médicos, desenvolver-se, organizarse, enfim, legitimar-se (VIEIRA, 2002, p.23). Foucault (1980) analisa essas mudanças ocorridas a partir do século XVIII, a nova estrutura do saber médico consiste numa nova maneira de olhar e falar sobre os corpos e seu funcionamento. O que muda fundamentalmente é a relação que se estabelece entre o visível e o invisível. A construção do olhar médico se contextualiza na inauguração de uma nova racionalidade científica que rompe com a visão renascentista e instala definitivamente a medicina como saber científico. O século XVIII foi o século do disciplinamento dos saberes. É neste século que ocorre uma organização interna de cada saber como uma disciplina, com critérios de seleção para descartar o que era considerado um falso saber e o que era considerado um não saber. Aparecem também as formas de normalização e de homogeneização dos conteúdos, além da hierarquização e organização interna da centralização dos saberes. Pode-se então localizar, entre o século XVIII e XIX, o nascimento da medicina forense enquanto uma disciplina autônoma e especializada, data que também marca os primeiros passos da constituição de uma ciência. Acrescenta Foucault, que isso não quer dizer que antes do século XVIII e XIX não existisse ciência, existiam ciências e saberes, mas não um campo global denominado “a ciência”, e assim expressa: Logo, organização de cada saber como disciplina e, de outro lado, escalonamento desses saberes, assim disciplinados, do interior, sua intercomunicação, sua distribuição, sua hierarquização recíproca numa espécie de campo global ou de disciplina global a que chamam precisamente a “ciência”. A ciência não existia antes do século XVIII. Existiam ciências, existiam saberes [...] aparece agora, com o disciplinamento dos saberes, em sua singularidade polimorfa, ao mesmo tempo o fato e regra que agora estão incorporados na nossa cultura e que se chama „ciência‟ (Foucault, 2002, p. 217 – 218). Apoiamo-nos na concepção de Santos (2009) em que “os saberes consistem na promoção de dialogo entre o saber científico produzidos na universidade e os saberes leigos, populares, tradicionais e campesinos que circulam na sociedade”. O referido autor propõe que o conhecimento científico e humanístico se obrigue a dialogar com outras formas de conhecimento que foram deixadas de lado pela modernidade tardia. É nesse sentido que concordamos com o autor, a ecologia dos saberes se expressa como um conhecimento plural, em que reside a necessidade do confronto entre os diversos saberes da humanidade. A partir da monocultura dos saberes é possível uma reflexão atual, confrontando o saber tradicional das Parteiras e o saber médico contemporâneo. O olhar médico vê o saber das parteiras tradicionais como ignorante, por isso é necessário segundo esse olhar masculino e dominante, “capacita-las”. É importante lembrar que as Associações Brasileiras de Medicina, na mesma linha da Associação Americana de Medicina, não reconhecem a parteira como profissional legítima (BOURGEAULT, 1997). A percepção médica sobre o trabalho de parteiras é de uma prática desqualificada pela medicina moderna. Sobre a ignorância, vejamos o que diz Santos: Na ecologia de saberes cruzam-se conhecimentos e, portanto, também ignorãncias. Não existe uma unidade de conhecimento, como não existe uma unidade de ignorância. As formas de ignorância são tão heterogêneas e interdependentes quanto as formas de conhecimento. [...] A ignorância só é uma forma desqualificada de ser e de fazer quanto o que se aprende vale mais do que se esquece. A utopia do interconhecimento é aprender outros conhecimentos sem esquecer os próprios. (SANTOS, 2009, p. 47) Mott (1999) refere-se à construção da imagem da parteira como mulher ignorante, analfabeta, sem moral, responsável pela morte de mães e recém-nascidos devido à falta de qualificação profissional, é encontrada não apenas na literatura médica brasileira do século XIX, como também na de vários países, tendo sido inclusive incorporada por historiadores e sociólogos do século XX. A referida autora ressaltar que quando a literatura médica do Século XIX, e também os autores contemporâneos, quando se referem às parteiras, raros são aqueles que fazem alguma distinção entre elas, como se houvesse um único tipo e perfil e assim nos relata: [...] as práticas, que exerciam a profissão sem autorização legal. Embora sendo o grupo mais numeroso, as fontes consultadas forneceram poucas informações. Em geral, essas 'comadres' atendiam pessoas da família ou da vizinhança, e a assistência ao parto nem sempre era a principal atividade que desempenhavam. Tanto podiam ser senhoras que faziam o parto de suas escravas e das moradoras de engenhos e fazendas, como o contrário, escravas que faziam o parto de suas senhoras e das demais escravas (MOTT, 1999). A partir dessa constatação a autora se pergunta se a tão propalada ignorância das parteiras não deveria ser entendida como uma crítica ao modo como elas concebiam todo o processo da parturição, ou como uma estratégia que os médicos encontraram para serem reconhecidos como detentores do discurso competente sobre o corpo das mulheres, tornandose os únicos legitimamente autorizados para intervir nesses corpos. Barreto (2007) nos faz recordar que nos anos 70 e 80 do século XX, a história das mulheres e, em especial, as análises feministas, ao tratarem da assistência ao parto, questionaram a imagem das parteiras, apresentadas como mulheres sujas, supersticiosas e de pouco ou nenhum saber. Tal discurso pejorativo foi elaborado pelos médicos e cirurgiões, no processo de afirmação da obstetrícia, respaldados nos conhecimentos da anatomia e da fisiologia. Acrescenta a referida autora que a eloquência dos médicos na desqualificação das parteiras – caracterizadas como mulheres ignorantes e cheias de crendices, cuja atividade punha em risco a vida da mulher e do bebê – ajudou os cirurgiões-parteiros na sedimentação e legitimação da própria profissão, rompendo, assim, a longa preponderância da autoridade das comadres no que se refere ao ato do nascimento. A “arte de partejar”, pautada na tradição e na experiência da parteira, foi oficialmente convertida em categoria da cirurgia – ou seja, em “ciência do parto”. É na metade do século XX, que o parto hospitalar tornou-se uma prática da maioria das mulheres urbanas e sua adesão ao campo da assistência médica. Neste processo de mudanças, foram deslocados os saberes femininos, leigos, subalternizando as mulheres que prestavam assistência: parteiras, comadres, matronas, curiosas. O rechaço aos círculos e redes de saber e informação entre mulheres, atualmente conhecidas, por parte dos médicos, como conversas de comadres que, desde então, passaram a ser consideradas nefastas ao bom andamento da gravidez e do parto, mostra o quanto este processo de subalternização e estigmatização impregnou a formação médica, moderna e racionalista (TORQUIST, 2004, p. 79). Nesse contexto da modernidade, é percebível o poder médico se apoderando da monocultura do saber e na atualidade vê o saber tradicional das parteiras apenas como uma prática alternativa de cuidar da saúde de mulheres no parto em lugar onde eles não estão. 3. (Re)sinificando Redes de Sujeitos, Saberes e Agências Culturais na questão do Parto e do Nascimento Observamos os avanços da medicina na vida das mulheres e na sociedade ao longo do século XX, principalmente, naquelas de classe mais favorecidas que incorporaram essa ideologia e passaram a propagar as noções de que, para as mulheres, o parto ideal seria o parto sem dor; a assistência de um médico no parto assegurava não somente a eliminação dos riscos, mas garantia às mulheres o status advindo do uso das novas tecnologias e dos serviços médicos. Assim, a disseminação da noção do parto como um evento médico leva a institucionalização/hospitalização do parto, medicalização e ao uso indiscriminado de tecnologias (BARROSO, 2001, 2009; TORNQUIST, 2002, 2004). A contemporaneidade assiste o processo de intervenção instrumental no parto. A partir de um processo lento de convencimento para que as mulheres grávidas se submetessem aos exames cada vez mais minuciosos e desveladores, as técnicas deste processo começam com as mãos dos médicos. Há um discurso de que as técnicas de exames e os instrumentos cirúrgicos são desenvolvidos para salvar vidas e amenizar situações aflitivas para as mulheres. Contudo, o desenvolvimento das técnicas e dos instrumentos obstétricos não pode ser vistos como resultados imediatos da racionalidade e da objetividade. Este processo está relacionado a uma visão de mundo e uma relação de poder médico. Essa invenção dos instrumentos e o desenvolvimento de técnicas obstétricas e cirúrgicas tinham uma finalidade ancorada na ideologia da maternidade: fazer aqueles corpos cumprirem sua missão e desta forma contribuir para as mulheres se adequarem aos seus corpos maternos (MARTINS, 2004). A proposta da Organização Mundial de Saúde (OMS) não é eliminar tais intervenções, mas reduzi-las apenas às situações de necessidade comprovada, uma vez que se entende que o modelo de atenção ao parto e ao nascimento hospitalar estaria abusando de práticas prejudiciais à saúde da mulher e do bebê, a curto, médio e longo prazos. O conjunto de medidas tidas, então, como humanizadoras busca desestimular o parto medicalizado, visto como tecnologizado, artificial e violento, e incentivar as práticas e intervenções biomecânicas no trabalho de parto, consideradas como mais adequadas à fisiologia do parto, e, portanto, menos agressivas e mais naturais (TORNQUIST, 2002, p.484). O conhecimento científico se modificou nos últimos tempos, mas ainda vivemos, Num tempo atônito que ao debruçar-se sobre si próprio descobre que seus pés são um cruzamento de sombras, sombras que vêm do passado que ora pensamos já não sermos, ora pensamos não termos deixado ainda de ser, sombras que vêm do futuro que ora pensamos já sermos, ora pensamos nunca virmos a ser. (SANTOS, 1988. p.1) No que tange a dicotomia tradicional X científico, há um movimento internacional das parteiras, que reúne parteiras de vários países da América do Sul, do Canadá, do México, Europa. Esse movimento busca a valorização dessas mulheres e também respeito às suas tradições. A tecnologia, quando entrou na sala de parto, veio como ajudar no parto e no nascimento. No entanto, essa tecnologia afastou a ideia do parto como um evento antropológico e social. A luta do movimento internacional é para que a parteira seja vista como uma aliada na humanização do parto e nascimento. Essa questão nos remete ao pensamento de Santos, quando diz: Estamos de novo regressados à necessidade de perguntar pelas relações entre a ciência e a virtude, pelo valor do conhecimento tido como ordinário ou vulgar que nós, sujeitos individuais ou colectivos, criamos e usamos para dar sentido às nossas práticas e que a ciência teima em considerar irrelevante, ilusório e falso. (SANTOS, 1988. p. 2) Reconhecendo o trabalho de humanização do parto iniciado pelas parteiras tradicionais, elas representam hoje, o elo entre a comunidade e o Sistema Único de Saúde (SUS), pelo trabalho de atenção integral à saúde da mulher e da criança, pois acompanham toda a gravidez, conhecem a vida das famílias e representam o mesmo nível social e econômico das parturientes, o que aproxima ainda mais a parteira da comunidade. Isso é fundamental para o momento da gravides a capacidade de interagir de forma mais humana. Nas discussões do parto humanizado se reconhece o trabalho das parteiras tradicionais como “prática alternativa” da saúde, e por isso, elas chamadas a dialogar e são inseridas nas políticas públicas, nos projetos e programas governamentais, como no caso das parteiras do Estado do Amapá. 3. 1. A concepção do Projeto “Resgate e Valorização das Parteiras Tradicionais do Amapá” Em 1990 quando o Ministério da Saúde oficializou o Programa de agentes comunitários e criou também o programa nacional de parteiras, prevendo o cadastramento, a capacitação e o pagamento dessas mulheres, através do Sistema Único de Saúde (SUS). Com esse programa, na região o Norte inicia o movimento de organização das parteiras tradicionais, através da criação de Associações de Parteiras, cuja articulação tem a ONG de Pernambuco Centro Ativo de Integração do Ser (CAIS do Parto) criada em 1991 com objetivo de promover cursos de capacitação e seminários para as parteiras. Em 1995 o Governo do Amapá para viabilizar as ações do seu programa governamental cria uma Coordenadoria de Articulação do governo com a Sociedade Civil Organizada, a qual possibilita a implementação de projetos que nasçam no seio das próprias comunidades e cuja execução envolva baixos custos e soluções rápidas entre um conjunto de projetos criados, estão os que mais impactaram a sociedade, os voltados para a mulher como o “mulher cidadã” e “Parteiras Tradicionais do Amapá”. É neste contexto, em meado da década de 90 do século XXI, que as parteiras voltam ao cenário nacional para serem reconhecidas pelo poder público, saindo do anonimato. O Governo do Amapá incentivado pela UNICEF cria em 1995 o “Projeto de Resgate e valorização das Parteiras Tradicionais” visando o resgate das tradições culturais, promovendo cursos de capacitação para essas mulheres, tirando-as do anonimato, profissionalizando-as e regulamentando a prática tradicional de fazer parto, sem modificar seu estilo. Essa proposta também visa dar “visibilidade as parteiras”. Na mesma época, a Coordenadoria de Articulação, adotou uma iniciativa para incorporar a participação e formação de consciência de cidadania, voltada para o resgate e regularização da prática de realizar partos no estilo tradicional. O público-alvo dessa iniciativa consiste em uma categoria até então desconhecida e desprezada pelo poder público, sem receber nenhum reconhecimento e apoio à sua profissão: as parteiras tradicionais do Amapá. Os desafios iniciais eram grandes e exigiram uma pesquisa de campo nos 16 municípios que o estado possui, para a realização de um censo geral de parteiras, levantando suas condições socioeconômicas e alguns detalhes sobre o trabalho que realizavam ( SILVA,1999. P.4). Para que os anseios das parteiras fossem atendidos, os gestores do projeto acharam necessário a sua organização, na comunidade local e no Estado. Assim, surgiram as associações em cada município, que deram origem à rede de parteiras tradicionais “Mãe Luzia”. Essa estratégia de implantação culminou com o estabelecimento de parcerias entre o poder público, a sociedade civil, ONG e UNICEF. O trabalho foi sendo implantado gradativamente, o que possibilitou avanços com a ampliação do grau de participação das parteiras nos municípios. Municípios das regiões delimitadas pelo programa REGIÃO I II III IV MUNICÍPIOS Amapari, Cutias, Ferreira Gomes, Itaubal, Macapá, Mazagão, Porto Grande, Santana, Serra do Navio. Amapá, Pracuúba, Tartarugalzinho. Calçoene, Oiapoque. Laranjal do Jari, Vitória do Jari. FONTE: COORDENADORIA DE ARTICULAÇÃO - PROJETO PARTEIRAS TRADICIONAIS DO AMAPÁ. O “Projeto Resgate e Valorização de Parteiras Tradicionais do Amapá” é conhecido internacionalmente, pois o Estado do Amapá sediou dois encontros internacionais, o I Encontro Internacional de Parteiras da Floresta, ocorrido no período de 18 a 21 de julho de 1998. Esse evento reuniu parteiras das regiões Norte e Nordeste do Brasil; parteiras e representantes de ONG do Canadá, da Costa do Marfim, Alemanha e França; representantes da Comunidade Europeia; a embaixatriz de Cuba; representantes do Programa Comunidade Solidária do Brasil; Coordenadores de programa de saúde da mulher de vários estados brasileiros, e ainda, Secretários de Estado de Saúde de vários Estados (SILVA, p.5). O II encontro aconteceu em maio de 2012 com a participação de mais de duzentas parteiras do Amapá e representantes de vários países. A principal diretriz do projeto é resgatar e valorizar a “arte de partejar”, melhorando a qualidade de assistência ao parto domiciliar, diminuindo a morbidade e mortalidade materna, através de capacitação, supervisão e avaliação do trabalho das parteiras e, ainda, possibilitando a sua organização em associações. Entre as principais metas estão difundir os conhecimentos da “arte de partejar” entre os profissionais de saúde (convencionais ou não), contribuindo para ampliar a prática do nascimento humanizado. Também, contribuir para o estabelecimento de um sistema de referência para gravidez de risco e partos complicados; reconhecimento profissional, com inserção das parteiras nos serviços locais de saúde; assegurar seus direitos trabalhistas. Sobre essas metas, vejamos o relato de uma interlocutora: Participo desde o primeiro curso de parteiras, e desde esse tempo foi prometido pra gente nos sos direitos trabalhistas, mas até agora nada, nem na maternidade agente pode entrar, inventaram um tal crachá pra identificar a parteira tradicional e ela poder acompanhar a parturiente, quando é preciso ir pro hospital, mas somo barradas, é esse nosso reconhecimento, é assim que somo valorizada? (R. J., parteira tradicional, remanescente quilombola). Verificamos que até hoje essas metas ainda encontram-se no plano teórico, pois essas garantias ainda não foram efetivadas, embora a existência da PL nº. 2354/2003 que regulamenta o exercício da profissão de parteiras tradicionais ainda tramita no Congresso Nacional. 3.2. Os Cursos de Capacitação de Parteiras Tradicionais: medicalização e higienização do parto no Amapá-AP. A preocupação com partos higiênicos e seguros faz com que surja uma parceria governamental para promover treinamentos para parteiras tradicionais/leigas como forma alternativa de saúde de mulheres sem acesso a serviços modernos. As parteiras treinadas são na maioria oriundas de áreas rurais e ribeirinhas, são chamadas na cidade pelo poder público que de forma articulada trocam suas experiências e socializam suas práticas com outras parteiras sob o controle do poder médico. Os cursos de capacitação promovidos pelo Governo do Estado do Amapá seguem uma lógica de continuidade que acontece desde 1996, são realizados cursos através da Secretaria de Estado de Inclusão e Mobilização Social e desde 2012 faz parceria com a Rede Cegonha da Secretaria de Estado da Saúde e Ministério da Saúde do Governo Federal, para promover atividades de capacitação e treinamentos. Para tanto, utilizam-se de uma metodologia participativa, organizada em forma de palestras, aulas expositivas, dinâmicas de apresentação, simulação de parto, higienização, etc., enfatizando a interação entre o saber empírico das parteiras e o conhecimento técnico obstétrico. Essas atividades são executadas por médicos, enfermeiras e psicólogos, com intuito a nosso ver, de tornar mais urbano o atendimento a mulher rural. Nesses cursos seguese um ritual utilizando o “livro da parteira” mostrando cada situação do processo do parto, apresentam-se mais figuras e fotos do que texto escrito, vez que a maioria das participantes dos cursos não consegue acompanhar as leituras. Essa metodologia facilita o acompanhamento pelas parteiras. Nesse ritual, encontra-se o trabalho de higienização do corpo da mulher (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012). Nesses cursos, as parteiras são orientadas a ajudam e acompanhar o estado de saúde da mulher e do bebê, encaminhar casos urgentes para o serviço de saúde, além de orientar as mulheres a tomar os medicamentos médicos e se alimente bem. Algumas parteiras que participam desses cursos contestam em parte essas práticas afirmando a eficiência das ervas para curar a mulher e o bebê. Assim relata uma parteira tradicional: Nós já existia antes desses médicos da cidade e de criarem a farmácia, agora eles vem ensinar o que agente já sabe, só dão nome esquisito de quem estudou, nós temo experiência e conhece muitas plantas boa pra mulher e pra criança (J.S. Parteira tradicional, remanescente quilombola). Dos conhecimentos incorporados, a parteira tradicional nos diz: Agente aprende com os médicos, embora eles não confiem na gente, mais eles também aprendem com nós. Nós existiam antes deles, eles vieram e nós caímos na clandestinidade, agora eles nos chama para conversar e reconhecer que fazemo parto muito bem e cuidamos da mulherada e das crianças no interior, o erro é querer que agente use só o remédio de farmácia, mais se não tiver agente usa nosso matinho, que é bom. (M. P. Parteira tradicional, remanescente quilombola rural). Nesse sentido, se percebe a tentativa inculcadora de que o medicamento alopático é mais eficaz, seguindo assim o modelo biomédico, a orientação é substituir o uso de ervas utilizado culturalmente pelas parteiras, como processo não-medicalizado para cuida das parturientes e a criança, pelo medicamento. No que pese essa concepção, gera resistência e nesse sentido é possível superar essa ideia de subalternidade do saber e da prática de parteiras tão somente como prática alternativa a saúde da mulher. A resistência às práticas medicalizadas, em geral, se observa em áreas rurais ou periferias urbanas, marcadas pela manutenção e padrões de vida comunitários e de vizinhança e ainda pela não oferta de serviços públicos adequados. O atual reconhecimento, pela OMS, destas práticas populares em áreas longínquas e distantes do Terceiro Mundo, é revelador do quanto o processo de medicalização no Ocidente é, ainda hoje, além de heterogêneo, inconcluso (TORQUIST, 2004, p.78). No contexto em que as parteiras tradicionais do Amapá são levadas a participar de cursos e treinamentos dialogando com outros conhecimentos, é salutar a preocupação de preservar também a tradição e mais importante ainda é que as próprias parteiras não se esqueçam das práticas adquirida culturalmente transmitidas pela tradição oral. 3.3. Processo de instrumentalização nas práticas de parteiras. Os instrumentos e as técnicas obstétricas, criados e usados no campo da medicina da mulher, são reveladores desta visão, ao mesmo tempo em que estão carregados de associações com a sexualidade e a ascendência dos homens sobre as mulheres ou, neste caso, dos médicos sobre suas pacientes. Embora, no século XX, o corpo feminino tenha adquirido um estatuto de simetria em relação ao corpo masculino, ele não deixou de ser visto em uma posição de assimetria e englobamento pelo masculino. (TORQUIST, 2004, p. 72) O apoio da Organização Mundial de Saúde (OMS), Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e Fundo de Populações das Nações Unidas (FNUAP) se faz presente nos países onde parteiras leigas/tradicionais fazem um número significativo de partos e seu ofício é consistente com as políticas de saúde em vigor. Dentre os objetivos empreendidos destacam-se: Apoiar o treinamento de parteiras leigas sempre que ela puder ter um efeito significativo sobre a saúde da mulher e da criança; colaborar no desenvolvimento de programas de treinamento de parteiras complementares ás estratégias de treinamento adequadas à situação nacional; fornecer “kits simples” e descartáveis para o uso em partos, para garantir partos higiênicos. As metas desses programas são: a redução da mortalidade e morbidade materna e infantil e melhorar a saúde reprodutiva. (OMS/FNUAP/UNICEF, 1992 p. 25). Em 1996, o Estado do Amapá firma parceria com essas organizações propiciando recursos financeiros para treinamento e aquisição de kits de material de trabalho para parteiras. Os kits são oferecidos às parteiras cadastradas e capacitadas pelo programa. Os Kits parteira são utilizados como forma de ajudar no parto domiciliar e na assistência da saúde da mulher e do bebê e auxiliará a prática principalmente em áreas rurais e ribeirinhas. Os kits contêm vários itens como: capa de chuva, toalha, estetoscópio de pinard, tesoura, material para curativo, guarda-chuva, lanterna, material de higiene e limpeza, bacia e outros instrumentos. Esses materiais necessitam de constante reposição, são instrumentos médicos que se constituem em intervenção no modo de assistir o parto normal que tradicionalmente não são comuns na prática de partejar de parteiras. O discurso do poder público é de homogeneizar o saber/fazer dessas mulheres e tornar os partos mais higiênicos. É importante ressaltar que segundo o relato das parteiras, os trâmites burocráticos causam morosidade na entrega do material e argumentam elas: na ausência desse material, vem a medicina tradicional: azeite de andiroba para cura umbigo de bebê, não se tem luvas, então se lava bem as mãos e apara as unhas, como sempre se fez, isso também é higiênico afirma uma parteira e segue: Às vezes não se tem tesoura pra cortar o imbigo. Muitas vezes, nosso material de trabalho no interior acaba sendo uma faca qualquer, fervida não dava „teto‟ no „imbigo‟ da criança, é Deus que protege (J. S. parteira tradicional remanescente quilombola). Para as parteiras rurais, os kits são válidos, porém acabam muito rápido então recorrem ao recurso que retiram da natureza, pois as comunidades que atuam são pobres e em muitos locais não existe se quer um posto médico. Isso se verifica na fala de uma parteira: Sem o material que nós recebe do governo, nós recorre ao alho assado, sarro de cachimbo, não deixo de usar meu azeite de andiroba pra fazer massagem na mulher e curar o „imbigo‟ do bebê (L. M. parteira tradicional, rural). Entendemos que a tentativa de criar programas para a homogeneização do parto e nascimento, passa por um processo de cunho político. Nesse processo existem culturas e práticas diferenciadas. De um lado estão as parteiras, elas têm uma autoridade frente à comunidade que atuam, que está relacionada ao atendimento a gestante, ao parto, apoio e aconselhamento às mulheres. Do outro que o poder médico tem uma relação de controle e subalternidade frente ao saber tradicional. 4. Resultados e Reflexões finais Os achados sugerem que diante da diversidade cultural e simbólica que envolve o saber de parteiras, considerado uma prática eminentemente feminina, é possível a comunicação entre rede de sujeitos sociais e uma aproximação real com o saber médico e cientifico. No processo de “articulação de saberes”, promovido pelo Estado do Amapá, com a implantação do Programa de Valorização de Parteiras Tradicionais, o saber médico assume uma posição de controle que lhe atribuía função de reorientar a prática das parteiras e ampliar os seus conhecimentos, configurando-se a subalternidade das parteiras. O encontro dos saberes das parteiras tradicionais com os conhecimentos da medicina moderna, representa um intenso processo de (re)significação dos saberes e das práticas das parteiras, implicando o esvaziamento gradativo da base tradicional do ofício do partejar. Nesse sentido, há um processo permeado por tensões e resistência cultural. Pois, percebemos que a parteira não absorve o saber médico de forma imediata, vai interiorizando de forma gradativa, sem desqualificar seus saberes. Finalmente, percebemos ainda, que os cursos de capacitação promoveram mudanças no habitus das parteiras tradicionais, mais expressam, apenas, uma das faces do processo de (re)significação do seu ofício. Referências BARRETO, Maria Renilda Nery. A Ciência do Parto nos Manuais Portugueses de Obstetrícia. Revista Gênero. Niterói, v. 7, n. 2, p. 219-236, 1. sem. 2007. BARROSO, I. C. Saberes e Prática das Parteiras Tradicionais do Amapá: Histórias e Memórias. [Dissertação de Mestrado]. UNICAMP, Campinas/SP, 2001. _____________. Os saberes de parteiras tradicionais e o ofício de partejar em domicílio nas áreas rurais. Revista Eletrônica de Humanidades do Curso de Ciências Sociais da UNIFAP. 2009, dez, nº 2. BOURGEAULT, I. L., Fynes, M. Integrating lay and nurse-midwi-fery care into the US and Canadian health systems. 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