A sociedade nas crônicas de Luís Fernando Veríssimo Cristina Markowski1 Claudia Carvalho1 Rodrigo Santos de Oliveira2 Resumo O presente artigo objetiva a realização de uma análise de cunho sociológico, tendo como pano de fundo algumas das crônicas do renomado escritor brasileiro Luís Fernando Veríssimo, a fim de esclarecer o caráter sociológico presente em suas obras. Primeiramente, faremos uma breve exposição do conceito de crítica e do que representa a análise sociológica dentro do mundo da literatura. Uma apresentação concisa acerca do autor escolhido e das crônicas selecionadas para a referida análise contribuem para o estudo proposto. O suporte teórico conta com pesquisas na web e com publicações do cronista em questão, além de material sobre a classificação dos métodos da crítica e da gênese da crônica brasileira. Palavras-chave: crônica – sociedade – literatura – análise 1. A sociedade na literatura: método sociológico Após estabelecer esse panorama evolutivo da crônica brasileira, deteremo-nos agora nos aspectos que devem ser considerados para uma crítica sociológica. Primeiramente, cabe esclarecer o significado da palavra “crítica” dentro do estudo a que nos propomos. Segundo Enrique Anderson Imbert, em sua obra “Métodos da Crítica Literária”, essa palavra implica a vontade de julgar uma realidade qualquer. O homem compreende, examina, escolhe, toma posição frente às coisas e enuncia um juízo, no qual se afirma ou se nega algo sobre um objeto. A crítica literária, ainda de acordo com o referido autor, está relacionada à compreensão sistemática de tudo o que entra no processo da expressão escrita, apreciando o valor estético de uma obra em todas as fases de sua realização. Quanto ao método sociológico, que será o fio condutor de nosso estudo crítico, este examina as marcas da comunidade no valor estético. O autor que conseguir abordar com propriedade as questões de cunho social terá logrado êxito em sua empreitada, pois “esse 1 2 Discentes em Letras – Licenciatura Plena. ULBRA – Campus Guaíba. Professor Orientador, ULBRA – Campus Guaíba método vê a literatura entrosada na sociedade, a qual pode ser analisada em três planos: Primeiro, a sociedade real de onde surge o escritor e a partir da qual produz a sua obra. Segundo, a sociedade, idealmente reflectida na própria obra. E, por último, se se trata de literatura de costumes, política, satírica ou moralizante, o programa de reforma social da obra”. Para efeitos do direcionamento que será dado a nossa análise, convém esclarecer que nosso ponto de vista está voltado para o segundo dos três itens acima expostos, ou seja, a sociedade refletida na obra, não obstante destacarem-se também os demais aspectos. Para Imbert, o “método sociológico procura o denominador comum: o escritor tem de comum com os homens a sua condição social; a experiência que expressa é partilhada com outros homens; o conteúdo da sua obra baseia-se na observação do comportamento humano; a própria obra repercutirá na consciência social dos leitores e será representativa do seu gênero... ”. 2. O autor Passaremos agora a uma breve apresentação do autor de cujas produções nos utilizaremos para nossa análise. Luís Fernando Veríssimo é filho de um dos escritores mais importantes da literatura nacional, Érico Veríssimo - autor de "Incidente Em Antares", "Clarissa", "O Tempo e o Vento" e "Olhai Os Lirios Do Campo", entre outros). Até os 30 anos, não tinha profissão definida. Começou a trabalhar em um jornal e, com o passar do tempo, conquistou seu espaço como um dos maiores cronistas da nossa literatura. Já lançou mais de 50 livros, sendo o autor que mais vende no Brasil na atualidade. Seus temas favoritos são os que contam histórias do cotidiano das pessoas com humor e inteligência. 3. Sinopse das crônicas As crônicas ficcionais de Veríssimo a que nos reportaremos, intituladas: “A volta da Andradina”, “A mulher do Silva”, “Posto 5” e “A descoberta”, serão utilizadas para comprovação da natureza social dos textos desse escritor. A primeira delas, “A volta da Andradina”, trata do constrangimento de uma família ao receber de volta um ente recém-separado, Andradina, ainda muito abatida, devido ao recente desenlace conjugal. A simples menção ao nome de seu ex-marido vira tabu, e todos na casa se vêem numa posição muito desconfortável, evitando ao máximo qualquer referência ao casamento desfeito. Na segunda, “A mulher do Silva”, a questão fundamental está relacionada à preocupação das pessoas com a opinião alheia, com as convenções sociais. O personagem Silva, ao exigir de um vizinho que pintasse a fachada de sua casa, na qual foram escritas palavras que colocavam em dúvida a conduta moral de sua esposa, acaba por arcar com todas as despesas relativas à pintura. Acontece que, depois disso, outras casas da mesma rua apareceram com insinuações semelhantes sobre a mulher do Silva em suas fachadas. Silva não teve dúvidas: mandou pintá-las também. Na penúltima crônica, “Posto 5”, o tema abordado é o relacionamento de uma mulher madura com um rapaz vinte anos mais jovem e a decepção que ela sofre quando, dois meses após tê-la abandonado, ela o reencontra na praia e ele, ao invés de implorar pelo seu perdão e pedir para que ela o aceitasse de volta - como era da vontade dela - a apresenta ao seu novo amor, uma garota de dezoito anos. Por fim, em “A descoberta”, o enfoque fica por conta das expectativas paradoxais que um pai deposita no filho. O pai aparece de surpresa no apartamento do filho, após anos lhe mandando dinheiro, a pretexto, segundo o filho, nas cartas que escrevia para pedir dinheiro, de custear noitadas regadas a bebidas e mulheres. Esse pai chega ao apartamento de seu filho cheio de orgulho e louco para ver com seus próprios olhos o espécime viril e fanfarrão que ele ajudara a gerar. Qual não foi a decepção dele quando ouve de seu filho que não havia, nem nunca houve, mulheres, tampouco orgias sexuais regadas a uísque importado, e que o dinheiro que ele lhe enviara durante todos aqueles anos custeara os seus estudos da faculdade e materiais de pesquisa. Após essas colocações, podemos concluir que, por trás das crônicas de Luís Fernando Veríssimo há toda uma estrutura social minimamente demarcada. Seus personagens são seres comuns, figuras criadas a partir de estereótipos estabelecidos pela sociedade em que vivemos. As situações expostas em suas criações são as mais corriqueiras possíveis, vivenciadas por todo e qualquer mortal em seu dia-a-dia, afinal de contas, quem de nós não viveu ou conhece alguém que tenha vivido, alguma vez na vida, alguma das quatro situações elencadas acima? Veríssimo cria seres eminentemente sociais e escreve suas crônicas para outros seres capazes de compreender o que há por trás de cada metáfora por uma razão muito simples: a de que nós, seres sociais, exercemos uma capacidade muito grande de identificação com os temas e personagens com que ele tão generosamente nos presenteia. A maneira como Luís Fernando Veríssimo escreve revela sua competência em abstrair toda a essência da sociedade em que ele, escritor, está inserido, e transferi-la para o leitor. Seu poder de representação da realidade de maneira ficcional traduz todo o valor estético de suas obras. Portanto, não resta dúvidas de que podemos enxergar a sociedade refletida nas obras de Luís Fernando Veríssimo, com todos os seus vícios e suas virtudes, expondo suas mazelas com muito bom humor e ironia. Referências Bibliográficas: Crônica na sala de aula: material de apoio ao professor/Apresentação Marisa Lajolo; texto Cilza Bignotto, Noemi Jaffe. São Paulo: Itaú Cultural, 2004. IMBERT, Enrique Anderson.Métodos da crítica literária. Trad. De Eugenia Maria M. Madeira de Aguiar e Silva. Coimbra. 1971. LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO. Disponível : http://www.usinadeletras.com.br [capturado em 20 de maio de 2006]. VERÍSSIMO. Luís Fernando. O melhor das comédias da vida privada.Rio de Janeiro, Objetiva. 2004.