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A concretização do Direito à Saúde no Contexto do Estado
Socioambiental
V Mostra de
Pesquisa da PósGraduação
Caroline Dimuro Bender, Carlos Alberto Molinaro (orientador)
Programa de Pós Graduação em Direito – Mestrado, PUCRS.
Resumo
A proteção do meio ambiente está, também e especialmente, vinculada à concretização
do direito fundamental e social à saúde. Essa idéia não é recente. Hipócrates, filósofo grego
que viveu no século IV a. C. já afirmava que o modo como as pessoas vivem em uma
sociedade é fator determinante para influenciar as principais doenças enfrentadas pela
população (DALLARI, 1995, p. 17). Engels, no século XX, também conseguiu relacionar
determinadas enfermidades com o ambiente ao qual os trabalhadores eram submetidos. Por
outro lado, a sociedade industrial, caracterizada pela disseminação de novas tecnologias,
influenciou a idéia de que o corpo humano poderia ser equiparado a uma máquina. Para
Descartes, por exemplo, no início século XVII, saúde era o mesmo que ausência de doenças.
Sob a idéia do “caráter mecanicista da doença”, esta seria o mesmo que um “defeito na linha
de montagem que exigia reparo especializado” (DALLARI, 1988, p. 58).
O conceito de saúde foi motivo de discussão entre as duas correntes durante o final do
século XIX e o início do século XX, no entanto fatores políticos deram fim ao debate. Após a
segunda Grande Guerra, a sociedade, deteriorada em muitos aspectos e desacreditada, quis
consolidar alguns direitos considerados indispensáveis a uma vida digna. A ONU
impulsionou a criação de alguns órgãos que garantissem esses direitos. Dessa forma, a
Organização Mundial da Saúde – OMS – definiu, no preâmbulo da sua Constituição:
La salud es un estado de completo bienestar físico, mental y social, y no
solamente la ausencia de afecciones o enfermedades. El goce del grado máximo de
salud que se pueda lograr es uno de los derechos fundamentales de todo ser humano
sin distinción de raza, religión, ideología política o condición económica o social. La
salud de todos los pueblos es una condición fundamental para lograr la paz y la
seguridad, y depende de la más amplia cooperación de las personas y de los Estados.
Fonte: http://apps.who.int/gb/bd/PDF/bd47/SP/constitucion-sp.pdf
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Essa compreensão de saúde não coloca o indivíduo em uma posição isolada, e apenas
foca o seu problema de saúde, mas o vê inserido na sua sociedade, a qual influencia
diretamente o seu bem-estar.
No contexto do Estado Liberal, apesar da insuficiente proteção estatal em questão de
saúde, essa é tratada como matéria constitucional. Entre 1814 e 1830 – foram criadas as
primeiras leis sobre a higiene urbana, o controle sanitário de fronteiras e a noção de
insalubridade em estabelecimentos. Importante relembrar que tudo o que dizia respeito à
saúde pública condizia com os interesses da burguesia, sendo a valorização do individualismo
a marca do Estado Liberal. (DALLARI, 2006, p. 249-250).
No Brasil, somente entre os anos de 1870 e de 1930 é que o Poder Público passa a se
envolver mais com a saúde da população, inclusive com o uso comum de força policial, por
causa da adoção do modelo “campanhista”, que determinava multas às pessoas que não se
vacinavam. Esse modelo, apesar de ter cometido alguns excessos, melhorou muito o controle
de epidemias na sociedade brasileira. Apenas de 1930 em diante é que, com uma estrutura
básica de saúde pública, começam as ações de finalidade curativa. A partir desse período,
inicia o surgimento de institutos de previdência, muito embora os serviços oferecidos por
esses institutos beneficiassem somente a categoria profissional que a eles fosse vinculada
(BARROSO, 2009, p. 12). Isto é, não havia universalização da saúde pública, fato que mudou
com a redemocratização do Brasil e, em conseqüência, com a promulgação da Constituição
Federal de 1988, com a configuração do Estado Socioambiental e a criação do SUS.
O direito à saúde é previsto na nossa atual Constituição em diversos dispositivos e
aparece expressamente, no art. 196, como direito de todos e como dever do Estado. Nesse
contexto normativo, todas as pessoas têm direito à saúde e é tarefa do Estado otimizar, em
grau máximo, o acesso aos serviços de saúde. Mas não só. O Estado tem que ir mais além.
Apenas garantir a “ausência de doenças” não é suficiente; é preciso promover níveis mínimos
de dignidade aos cidadãos, através do desenvolvimento de políticas sociais e econômicas que
busquem a prevenção de doenças e de outras ofensas.
Um aspecto que aparece, de forma acentuada, na Constituição (quando trata das
atribuições do SUS, no art. 200, especialmente incisos II e VIII) é a relação entre saúde e
meio ambiente, uma vez que no contexto do Estado contemporâneo, consagrado como Estado
Socioambiental e Democrático de Direito, é imprescindível
...definir e construir um conjunto de indicadores que propiciem subsídios
para os processos de tomada de decisão e planejamento de políticas públicas
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não só centradas nos efeitos sobre a saúde, mas que incorpore a compreensão
do quadro socioeconômico e das mudanças ambientais e possibilite avançar
em ações intersetoriais. (FRANCO NETTO (et. al.), 2009, p. 55).
A proteção ambiental é indispensável para a concretização do direito à saúde, na
medida em que, por exemplo, o acesso à água potável, garantido por meio do saneamento
básico, é elemento integrante do conteúdo do direito à saúde. A própria Constituição
brasileira, no art. 225, situa o ambiente equilibrado como “essencial à sadia qualidade de
vida”. Reforçando tal entedimento, destaque-se a Lei 6.938/81, sobre a Política Nacional do
Meio Ambiente, que conceitua o meio ambiente, no art. 3°, I, como “o conjunto de conjunto
de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite,
abriga e rege a vida em todas as suas formas”, e dispõe que poluição, no art. 3°, III, a, é a :
“degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:
prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população.” Apesar de já evidenciado o
elo entre qualidade ambiental e saúde humana, cabe referir a lei 8.080/90, a qual estabelece
que a garantia de condições de bem-estar físico, mental e social fazem parte das ações de
saúde (art. 3°, parágrafo único) e que o meio ambiente é um dos fatores determinantes e
condicionantes da saúde (art. 3°, caput).
O Estado Social de Direito, em sentido contrário a concepção liberal do século XIX,
reclama uma crescente posição ativa do Estado na esfera econômica e social, tornando-se
responsável por assegurar aos cidadãos a fruição dos direitos prestacionais. No entanto, diante
do contexto atual, impõe-se a superação do modelo de Estado Social de Direito, com a
consequente adoção do modelo de Estado Socioambiental e Democrático de Direito, uma vez
que os reflexos do progresso tecnológico e da degradação ambiental ensejam a transformação
da teoria dos direitos fundamentais, agora vista à luz de uma sociedade vulnerável, em
infinitos aspectos, aos riscos ocasionados pelo desequilíbrio ambiental. O Estado Social agora
compreende uma dimensão ambiental, que certamente será fonte de auxílio na concretização
de direitos sociais básicos. Essa nova proposição de Estado tem o condão de conciliar a
realização dos direitos sociais e a proteção ambiental.
E diante dessa nova conformação político-ideológica do Estado, importa saber qual
feição deve ser assumida pela políticas-públicas de modo a atender, de forma satisfatória, aos
respectivos deveres e direitos daí decorrentes, bem como qual papel a ser assumido pelos
tribunais na realização e concretização desse novo e promissor horizonte normativo.
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Introdução
Dentre os direitos sociais, o direito à saúde merece maior reflexão, seja pelo
expressivo debate ocasionado pelas ações judiciais que pleiteiam a prestação de serviços
públicos na área da saúde, seja pelo recente ramo de estudo que vem sendo aprimorado – a
saúde ambiental – devido à grande importância das determinantes socioambientais e de seus
impactos para a implementação de políticas públicas que satisfaçam as necessidades sociais.
Tendo em vista a vinculação entre a saúde humana e a proteção ambiental,
Fensterseifer (2008, p. 77) afirma, “é imperiosa uma ampliação do âmbito de proteção do
direito à saúde (em vista de uma vida digna e saudável), o qual deve abandonar qualquer olhar
reducionista que vislumbre o ser humano dissociado do ambiente que integra e o constitui...”.
Considerando o novo paradigma atual do Estado contemporâneo, caracterizado pelo
constitucionalismo socioambiental, o objetivo da presente pesquisa é fazer uma análise da
proteção pública da saúde frente às novas e crescentes necessidades da cidadania no contexto
do Estado Socioambiental e Democrático de Direito. Entende-se que o projeto jurídicopolítico proposto pelo Estado Social não é mais suficiente para enfrentar as demandas atuais,
por isso, torna-se necessário redefinir essa concepção de Estado. A proposta do modelo de
Estado Socioambiental, “com sua base democrática fundada na democracia participativa e seu
marco axiológico fincado no princípio constitucional da solidariedade, há, na sua essência,
uma tentativa de conciliação e diálogo normativo entre a realização dos direitos sociais e a
proteção ambiental...” (FENSTERSEIFER, 2008, p. 27).
Dada a presente contextualização, assume relevância verificar a concretização do
direito à saúde como condição para a efetivação plena do equilíbrio nas relações
socioambientais em um Estado Democrático de Direito.
Metodologia
1- Método de abordagem:
O caminho para a construção do conhecimento científico em pauta será percorrido através
do método hermenêutico fenomenológico, como revisão crítica dos temas centrais
transmitidos pela tradição jurídico-filosófica através da linguagem. A hermenêutica é
concebida como a teoria ou a arte da interpretação e se preocupa com o fato e o fenômeno da
compreensão (CORDON, 1995, p. 93). A compreensão acontece em um contexto
determinado por diversas condicionantes, o que Gadamer intitula “consciência exposta aos
efeitos da história” (wirkungsgeschichtliche Bewusstein), ou seja, “a compreensão cumpre-se
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em e mediante uma fusão de horizontes”, pois aplicamos o que nos foi transmitido
historicamente ao mesmo tempo que criamos algo próprio (idem, p. 196). A palavra
“fenomenologia”, na perspectiva heideggeriana, “exprime uma máxima que se pode formular
na expressão: “às coisas em si mesmas!”– por oposição às construções soltas no ar, às
descobertas acidentais, à admissão de conceitos só aparentemente verificados (...)”
(HEIDEGGER, 2004, p. 57).
2- Métodos de procedimento:
Será adotado o método comparativo na pesquisa, na medida em que será verificado
como países europeus têm se manifestado em relação ao tema proposto. É relevante analisar a
postura que está sendo adotada por Estados que estão em diferentes estágios de
desenvolvimento, para que seus exemplos no tocante ao tema da pesquisa possam ser
aplicados à realidade brasileira, em caráter eventual, é claro, pois não podemos esquecer que
suas experiências se realizam em um contexto sócio-cultural diferenciado. Andreas Krell
(2002, p. 42) alerta para o perigo de transpor teorias utilizadas em sociedades desenvolvidas
para países periféricos, uma vez que textos e procedimentos jurídicos semelhantes podem
causar efeitos totalmente diversos dependendo das condições econômico-políticas do lugar
onde são aplicados.
O procedimento de análise histórica, que consiste na investigação dos acontecimentos
passados, também será empregado na pesquisa, pois é imprescindível para uma compreensão
mais ampla da atualidade.
3- Técnicas de Pesquisa:
Como técnica principal será utilizada a pesquisa instrumental, que divide-se em:
doutrinária, baseada principalmente em teorias elaboradas por juristas cujo objetivo reside em
expor ou interpretar o direito; e jurisprudencial, voltada à coleta de decisões emanadas de
órgãos do Poder Judiciário. O procedimento básico da pesquisa doutrinária é a busca de
material bibliográfico, enquanto o empregado na pesquisa jurisprudencial consiste no exame
de documentos (MONTEIRO, 2001, p. 57-58). A revisão bibliográfica será composta de
comentários analítico-descritivos sobre as obras referentes ao assunto, ou seja, será a base de
fundamentação da investigação.
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Resultados (ou Resultados e Discussão)
A pesquisa encontra-se em seu estado incial de coleta e seleção de material. Após esta
fase, pretende-se a leitura e análise crítica da literatura colacionada, com vistas à redação do
trabalho. Tem-se como meta a publicação de artigos científicos, os quais permitam a
divulgação das conclusões alcançadas.
Referências
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Revista de Direito Sanitário, São Paulo, v. 9, n. 3, p.109-114, nov. 2008/fev. 2009.
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