Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 10-18, jan./mar. 2011 DOI: 10.4260/BJFT2011140100002 Comportamento reológico de constituintes do ovo The rheological behaviour of whole egg constituents Autores | Authors Sueli Marie OHATA Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) Faculdade de Engenharia Campus II Rod. Dourados Itahum, Km 12 Caixa Postal: 533 CEP: 79804-970 Dourados/MS - Brasil e-mail: [email protected] Luiz Antonio VIOTTO Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) Departamento de Engenharia de Alimentos Caixa Postal: 6121 CEP: 13083-862 Campinas/SP - Brasil e-mail: [email protected] Autor Correspondente | Corresponding Author Recebido | Received: 01/06/2009 Aprovado | Approved: 12/01/2011 Resumo O comportamento reológico do ovo integral, da gema e da clara de ovo nas formas pasteurizada e reconstituída foi estudado utilizando-se um reômetro de tensão controlada (Carrimed CSL2 500, 1995), em estado estacionário, na faixa de temperatura entre 5 e 60 °C, com geometria cone e placa para a gema reconstituída e cilindros concêntricos para as outras amostras, sendo ambas as geometrias em aço inox. Apresentaram comportamento Newtoniano as amostras de ovo pasteurizado, clara pasteurizada e reconstituída, enquanto que as amostras de ovo reconstituído, gema pasteurizada e reconstituída apresentaram comportamento pseudoplástico. As amostras reconstituídas de gema e ovo apresentaram viscosidades mais elevadas em relação às amostras pasteurizadas. Os dados experimentais da tensão de cisalhamento em função da taxa deformação foram ajustados pelos modelos de Ostwald-de-Waelle, Newtoniano, Casson e Herschel-Bulkley, sendo os parâmetros dos modelos determinados por análise de regressão não linear. O efeito da temperatura sobre a viscosidade aparente e o índice de consistência foram descritos pela relação de Arrhenius. Palavras-chave: Ovo; Gema; Clara; Reologia. Summary The rheological behaviour of pasteurized and reconstituted whole egg, egg yolk and egg white were studied using a rheometer with controlled stress (Carrimed CSL2 500, 1995) in the steady state, in a range of temperatures (5-60 °C), with cone and plate geometry for the reconstituted egg yolk and concentric cylinders for the other samples, both geometries in stainless steel. The samples of pasteurized whole egg, pasteurized egg white and reconstituted egg white presented Newtonian behaviour, while the reconstituted whole egg, reconstituted egg yolk and pasteurized egg yolk, pseudoplastic behaviour. The samples of reconstituted egg yolk and whole egg presented higher viscosities than the pasteurized samples. The experimental data for shear stress versus shear rate were fitted to the Ostwaldde-Waelle, Newtonian, Casson and Herschel-Bulkley models. The parameters of these models were determined by a nonlinear regression analyses. The effect of temperature on the apparent viscosity and consistency index was described by the Arrhenius relationship. Key words: Whole egg; Egg yolk; Egg white; Rheology. www.ital.sp.gov.br/bj Comportamento reológico de constituintes do ovo OHATA, S. M. e VIOTTO, L. A. 1 Introdução Os ovos são ingredientes de grande importância na indústria de alimentos, sendo fundamentais na fabricação de produtos, como maionese, massas, produtos de panificação e confeitaria (STADELMAN e COTTERILL, 1990). A gema e a clara de ovo são ingredientes extensamente utilizados em muitos produtos alimentícios devido às suas propriedades polifuncionais, tais como formação de espuma, coagulação pelo calor, emulsificação e adesão (MINE, 1995; VADEHRA e NATH, 1973). Devido à sua perecibilidade, é comum a indústria de alimentos utilizar os ovos já submetidos a algum tipo de processamento, como é o caso da desidratação e da pasteurização, que proporcionam um aumento na vidade-prateleira, além de permitir uma maior facilidade de manuseio, estocagem e transporte. O processamento deste produto exige uma série de informações a respeito de suas propriedades físicas e químicas, pois será submetido a várias operações unitárias, tais como bombeamento, agitação, transporte em tubulações, troca térmica e secagem. Dentre essas características, segundo Ibarz et al. (1996), o comportamento reológico do produto ocupa posição de destaque, sendo útil não só como medida de qualidade, mas também em projetos, avaliação e operação de equipamentos utilizados. Na literatura, são relatados resultados de pesquisas abordando o comportamento reológico do ovo integral sob as mais variadas condições (TUNG et al., 1970; TUNG, 1978; PITSILIS et al., 1984; IBARZ e SINTES, 1989; OHATA e VIOTTO, 2000, 2001; TELIS‑ROMERO et al., 2006), mas nenhum deles comparando o ovo integral, a gema e a clara nas formas pasteurizada e reconstituída. A maioria dos fluidos alimentícios apresenta comportamento não Newtoniano, ou seja, geralmente as suas propriedades reológicas, a uma temperatura constante, dependem da tensão aplicada ou podem ainda depender também do tempo de cisalhamento. Assim, a maioria destes fluidos não se caracteriza somente pela viscosidade, já que esta não é constante, necessitando para sua caracterização ao menos de dois parâmetros e modelos mais complexos do que o de Newton (HOLDSWORTH, 1971). Os modelos reológicos mais utilizados e adequados para alimentos expressam a relação entre a tensão de cisalhamento e a taxa de deformação. A maioria deles sustenta-se em bases empíricas ou semiempíricas, e outros, em considerações moleculares, segundo Brodkey (1971). Todos eles representam um mecanismo específico que explica a reação do fluido perante o efeito da tensão cisalhante. O objetivo deste trabalho foi estudar o comportamento reológico do ovo integral, da gema e da clara nas formas pasteurizada e reconstituída, entre 5 e 60 °C, bem como analisar os dados através dos modelos de Ostwald-de-Waelle, Newtoniano, Casson e Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 10-18, jan./mar. 2011 Herschel-Bulkley, e avaliar o efeito da temperatura sobre a viscosidade aparente e o índice de consistência através da relação de Arrhenius. 2 Material e métodos 2.1 Matéria-prima As amostras pasteurizadas e desidratadas de ovo integral, gema e clara foram cedidas pela SOHOVOS INDUSTRIAL LTDA (Sorocaba/SP - Brasil). As amostras desidratadas foram reconstituídas segundo a recomendação do fabricante – para cada 10 g de amostra em pó, utilizaram-se os seguintes volumes de água destilada: 32 mL (ovo), 12 mL (gema) e 74 mL (clara). As medidas em triplicata do pH e a determinação dos sólidos totais foram realizadas segundo a AOAC (1995). 2.2 Métodos 2.2.1 Reometria As medidas reológicas das amostras foram realizadas no escoamento em estado estacionário através de um reômetro de tensão controlada Carrimed CSL2 500, com temperatura controlada por um banho termostatizado. O reômetro foi conectado a um computador para controlar a sua operação, registrando os dados de tensão de cisalhamento, taxa de deformação, viscosidade e temperatura. A taxa de deformação empregada foi especificada entre 0 e 300 s -1 em três varreduras: crescente, decrescente e novamente crescente, para verificação do comportamento reológico dependente do tempo. Todas as medidas experimentais foram realizadas em triplicata. 2.2.2 Reômetro de cilindros concêntricos O tipo de sistema de medida utilizado para todas as amostras, com exceção da gema reconstituída, foi o Recessed end. O reômetro utiliza duas camisas termostatizadas (cilindro externo e base Peltier) acopladas a dois banhos térmicos. O espaço anular mede 1,17 mm, o raio externo 15 mm e a altura do cilindro interno possui 32 mm, sendo necessários 9 mL de amostra. As medidas foram realizadas a 5, 15, 25, 40 e 60 °C. 2.2.3 Reômetro de cone e placa O sistema utilizado para a gema reconstituída foi o de cone e placa, devido à consistência pastosa da amostra, sendo o diâmetro do cone de 4 cm, o ângulo α utilizado de 1° 58’ e a distância entre o cone (móvel) e a placa, de 0,053 mm, sendo necessário 0,60 mL de amostra. A borda do cone do reômetro foi lubrificada com graxa de silicone para evitar o ressecamento da amostra e, consequentemente, interferências nos resultados 11 www.ital.sp.gov.br/bj Comportamento reológico de constituintes do ovo OHATA, S. M. e VIOTTO, L. A. obtidos. Tal procedimento foi adequado somente até 40 °C, pois a 60 °C não foi possível a realização do ensaio para a amostra. 2.2.4 Modelos reológicos Para a análise dos dados experimentais, foram escolhidos os modelos reológicos de Ostwald-de-Waelle, Newtoniano, Casson e Herschel-Bulkley pelo fato de serem relativamente simples, apresentando de 1 a 3 parâmetros, facilitando assim a aplicação na engenharia (STEFFE, 1996). Modelo de Ostwald-de-Waelle Também conhecido como Modelo da Lei da Potência, representado pela Equação 1, é muito simples e utilizado extensamente em aplicações de engenharia (RAO e ANANTHESWARAN, 1982; RAO, 2005). . n τ= K γ (1) na qual: τ = tensão de cisalhamento (Pa); K = índice de consistência (Pa.sn); γ⋅ = taxa de deformação (s-1), e n = índice de comportamento do fluido (adimensional). Modelo Newtoniano No caso de fluidos Newtonianos, o índice de comportamento do fluido (n) tem valor unitário e a Equação 1 pode ser simplificada, sendo a tensão de cisalhamento (τ) diretamente proporcional à taxa de deformação e (K) o valor da própria viscosidade do fluido (η), conforme apresentado pela Equação 2. . τ = η γ (2) Modelo de Casson Modelo aplicado para suspensões de partículas em meio Newtoniano, considerando-se que as mesmas interagem entre si (HOLDSWORTH, 1993; RAO, 2005). É representado pela Equação 3. O valor do parâmetro Koc foi utilizado para estimativa do parâmetro de tensão inicial (τoH) do modelo de Herschel-Bulkley. do parâmetro da tensão inicial de cisalhamento (HOLDSWORTH, 1993; RAO, 2005). nH . τ = τ0H + K H γ (4) na qual: τ = tensão de cisalhamento (Pa); τoH = tensão inicial de H-B (Pa); KH = índice de consistência de H-B (Pa.sn); γ⋅ = taxa de deformação (s -1), e τ = índice de comportamento do fluido (adimensional). Os parâmetros foram determinados utilizando-se o software ORIGIN versão 4.1, através da regressão não linear. Para o cálculo referente a cada amostra a uma dada temperatura, foram obtidos cem pontos médios, a partir da triplicata da média das curvas crescente (primeira) e decrescente. A escolha do modelo mais adequado baseou-se nos menores valores de χ2 (qui-quadrado) e R2 (coeficiente de determinação) próximos a 1. 2.2.5 Influência da temperatura sobre o índice de consistência (K) e a viscosidade aparente (η) A influência da temperatura sobre os parâmetros reológicos K e ηap, foi calculada pela relação de Arrhenius (RAO, 2005; SINGH e HELDMAN, 2001; STEFFE, 1996), expressa pela Equação 5. E A 0 exp a (5) ηap ou K = RT na qual: A0 = parâmetro de ajuste; Ea = energia de ativação do escoamento (kJ.mol-1); R = constante dos gases ideais (8,314 J / mol K), e T = temperatura absoluta (K). Os valores dos parâmetros reológicos K e η ap, obtidos nas diferentes temperaturas foram ajustados ao modelo, a uma taxa de deformação (γ⋅) de 150 s-1 para todas as amostras estudadas, possibilitando a determinação dos parâmetros A0 e Ea. 3 Resultados e discussão 3.1 Resultados de pH e sólidos solúveis Os valores médios de pH e de sólidos totais para as amostras pasteurizada e reconstituída são mostrados na Tabela 1. 1 1 .2 τ 2= K 0C + K C γ (3) A Equação 4 representa uma forma modificada do modelo de Ostwald-de-Waelle, com a introdução Tabela 1. Valores médios de pH e sólidos totais, determinados para o ovo integral, a gema e a clara pasteurizados e reconstituídos. Amostras pH % sólidos totais Ovo integral pasteurizado 7,20 ± 0,10 24,21 ± 0,06 Ovo integral reconstituído 8,74 ± 0,09 22,48 ± 0,58 Gema pasteurizada 6,60 ± 0,10 44,31 ± 0,02 Gema reconstituída 5,88 ± 0,13 45,00 ± 0,18 Clara pasteurizada 8,90 ± 0,10 12,30 ± 0,01 Clara reconstituída 9,64 ± 0,13 11,06 ± 0,13 Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 10-18, jan./mar. 2011 12 na qual: τ1/2 = tensão de cisalhamento (Pa)1/2; Koc = tensão inicial de Casson (Pa)1/2; Kc = viscosidade plástica de Casson (Pa.s)1/2, e γ⋅ 1/2 = taxa de deformação (s-1)1/2. Modelo de Herschel-Bulkley www.ital.sp.gov.br/bj Comportamento reológico de constituintes do ovo OHATA, S. M. e VIOTTO, L. A. 3.2 Comportamento reológico b) Reconstituído As Tabelas 2, 3, 4, 6, 8, 10, 11, 12 e 13 mostram os parâmetros reológicos obtidos por regressão não linear para as amostras de ovo integral, gema e clara nas formas pasteurizada e reconstituída, quantificadas entre 5 e 60 °C, considerando-se os modelos mais adequados. De modo geral, observa-se que o valor do índice de consistência (K) diminuiu com o aumento da temperatura, significando diminuição da η com o aumento da temperatura, como pode ser verificado pelo gráfico da viscosidade (η ou ηap) versus taxa de deformação (γ⋅), apresentadas pelas Figuras 1, 3, 5, 7, 9 e 11. A partir dos resultados apresentados na Tabela 4, observa-se que o índice de comportamento (n) para o ovo integral reconstituído apresentou valores entre 0,73 e 0,79, caracterizando um comportamento não Newtoniano, tipicamente pseudoplástico. O modelo de Ostwald-deWaelle descreveu muito bem as amostras de ovo integral reconstituído, sempre apresentando valores de R2 acima de 0,99 e χ2 iguais a zero, como pode ser verificado pela Tabela 4. Esse material também não necessita de tensão inicial para escoar, conforme já discutido anteriormente. Através da Figura 3, γ⋅ = 200 s -1 e a 15, 25, Os resultados do ajuste através da relação de Arrhenius aos dados da viscosidade aparente (ηap) e do índice de consistência (K) são apresentados nas Figuras 2, 4, 6, 8, 10 e 12, e através das Tabelas 5, 7 e 9, que mostram os valores estimados de energia de ativação (Ea), dos parâmetros K0 e η0 e respectivos coeficientes de correlação (R 2). Através da E a, é possível avaliar o efeito da temperatura sobre os parâmetros K e ηap. Quanto maior for o valor de Ea, maior será a influência da temperatura sobre a amostra estudada. Desta forma, observa-se que as viscosidades aparentes das amostras de ovo reconstituído e da gema pasteurizada foram as mais afetadas em relação às demais amostras estudadas, enquanto que a viscosidade da clara reconstituída, a menos afetada. De modo análogo, verifica-se que o índice de consistência (K) da amostra de clara pasteurizada foi o mais afetado em relação às demais amostras analisadas. 40 e 60 °C, têm-se para o ovo integral reconstituído viscosidades aparentes de 0,08; 0,07; 0,04, e 0,03 Pa.s. A ηap do ovo reconstituído foi cerca de 5 a 8 vezes maior em relação ao ovo pasteurizado. Segundo Bergquist Tabela 3. Parâmetro reológico do ovo integral pasteurizado para o modelo Newtoniano. T (°C) R2 η (Pa.s) χ2 5 0,014 0,003 0,999 15 0,010 0,000 0,999 25 0,009 0,000 0,999 40 0,009 0,000 0,999 60 0,006 0,000 0,999 0,030 3.2.1 Ovo Integral Verifica-se através da Tabela 2 que o índice de comportamento (n) para o ovo pasteurizado apresentou valores próximos a 1. Segundo Scalzo et al. (1970), quando as grandezas de n são próximas a 1, pode-se caracterizar o fluido como Newtoniano nos cálculos de engenharia. Neste caso, o modelo que representa esta amostra é o n, conforme mostra a Tabela 3. Através da Figura 1, γ⋅ = 200 s -1 e a 15, 25, n (Pa.s) a) Pasteurizado 0,025 0,020 0,015 0,010 0,005 0 50 100 150 200 250 300 350 Taxa de deformação (1/s) 5 ºC 15 ºC 25 ºC 40 ºC 60 ºC 40 e 60 °C, têm-se para o ovo integral pasteurizado viscosidades de 0,01; 0,009; 0,007, e 0,006 Pa.s. Figura 1. Relação entre a viscosidade (η) e a taxa de deformação (γ⋅) para o ovo integral pasteurizado. Tabela 2. Parâmetros reológicos do ovo integral pasteurizado para o modelo de Ostwald-de-Waelle . T (°C) K (Pa.sn) n (dimensional) R2 χ2 5 0,020 0,926 0,000 0,999 15 0,012 0,968 0,000 0,999 25 0,012 0,951 0,000 0,999 40 0,011 0,926 0,000 0,999 60 0,006 0,983 0,000 0,999 Tabela 4. Parâmetros reológicos do ovo integral reconstituído para o modelo de Ostwald-de-Waelle. T (°C) K (Pa.sn) n (adimensional) R2 χ2 5 0,394 0,734 0,000 0,999 15 0,279 0,762 0,000 0,999 25 0,243 0,756 0,000 0,999 40 0,126 0,790 0,000 0,999 60 0,105 0,764 0,000 0,999 Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 10-18, jan./mar. 2011 13 www.ital.sp.gov.br/bj Comportamento reológico de constituintes do ovo OHATA, S. M. e VIOTTO, L. A. Tabela 5. Parâmetros estimados pela Equação de Arrhenius para o ovo integral reconstituído (γ⋅ = 150 s-1). Ea (kJ.mol-1) A0 R2 K (Pa.s) 19,42 -9,353 0,96 ηap (Pa.sn) 17,39 -9,760 0,98 Figura 2. Efeito da temperatura sobre a viscosidade do ovo integral pasteurizado (150 s-1). 0,8 nap (Pa.s) 0,6 0,4 3.2.2 Gema 0,2 a) Pasteurizada 0,0 0 50 100 150 200 250 300 350 Taxa de deformação (1/s) 5 ºC 15 ºC 25 ºC 40 ºC 60 ºC Figura 3. Relação entre a viscosidade aparente e a taxa de deformação para o ovo integral reconstituído. ln ηap (Pa.s) –2,000 –2,500 ln ηap = 2092/T – 9,7603 R2 = 0,978 a –3,000 0,0029 0,0031 0,0033 0,0035 0,0037 1/T (K–1) –0,500 –1,000 –1,500 ln K = 2336,343/T – 9,353 R2 = 0,958 b –2,000 –2,500 0,0029 Neste caso, também foram obtidos valores de tensões iniciais baixos, indicando que a gema pasteurizada pode ser representada pelo modelo de Ostwald-de-Waelle, cujos valores de R2 foram superiores a 0,99 e de χ2 muito baixos. O índice de comportamento (n) apresentou valores próximos a 0,9 conforme se observa na Tabela 6, indicando que a gema pasteurizada apresentou comportamento pseudoplástico. Através da Figura 5, γ⋅ = 200 s-1 e temperaturas a 15, 25 e 40 °C, observa-se que se têm, para a gema pasteurizada, viscosidades aparentes de 0,20; 0,17 e 0,11 Pa.s. b) Reconstituída –3,500 –4,000 ln K (Pa.s) Tabela 6. Parâmetros reológicos da gema pasteurizada para o modelo de Ostwald-de-Waelle. T (°C) K (Pa.sn) n (adimensional) R2 χ2 5 0,497 0,892 0,114 0,995 15 0,304 0,903 0,087 0,995 25 0,250 0,904 0,060 0,995 40 0,152 0,908 0,029 0,995 60 0,141 0,903 0,004 0,999 0,0031 0,0033 0,0035 0,0037 1/T (K–1) Não foram considerados os dados referentes à gema reconstituída ensaiada a 60 °C, pois houve ressecamento intenso da amostra, paralisando o registro de dados durante o ensaio. As amostras foram descritas mais adequadamente pelo modelo de Ostwald-deWaelle, que apresentou melhores valores de R2. A gema reconstituída apresentou valores entre 0,351 e 0,379 (Tabela 8), caracterizando um comportamento não Newtoniano, tipicamente pseudoplástico. Através da Figura 7, γ⋅ = 200 s-1 e temperaturas (1977), essa diferença pode ser devida ao fato de o ovo integral apresentar alto conteúdo de lipídios (10,5 a 11,8%) e quando, desidratado e reconstituído, não retornar à sua estrutura original, ocasionando um aumento na viscosidade. a 15, 25 e 40 °C, têm-se, para a gema reconstituída, viscosidades aparentes de 2,69; 2,32, e 2,29 Pa.s, cerca de 13 a 20 vezes maior em relação à gema pasteurizada. Assim como no caso do ovo integral, essa diferença pode ser atribuída ao fato de a gema apresentar alto conteúdo de lipídios (31,8 a 35,5%) e, quando desidratada e reconstituída, não retorna à sua estrutura original, ocasionando um aumento na viscosidade (BERGQUIST, 1977). Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 10-18, jan./mar. 2011 14 Figura 4. Efeito da temperatura: a) viscosidade aparente (150 s-1) e b) índice de consistência do ovo integral reconstituído. www.ital.sp.gov.br/bj Comportamento reológico de constituintes do ovo OHATA, S. M. e VIOTTO, L. A. Tabela 8. Parâmetros reológicos da gema reconstituída para o modelo de Ostwald-de-Waelle. T (°C) K (Pa.sn) n (adimensional) R2 χ2 5 90,02 0,374 6,061 0,999 15 72,79 0,379 5,194 0,999 25 65,72 0,370 2,619 0,999 40 71,30 0,351 182,670 0,992 0,45 0,40 0,35 nap (Pa.s) 0,30 0,25 0,20 0,15 0,10 1000 0,05 0,00 50 100 150 200 250 300 350 400 Taxa de deformação (1/s) 5 ºC 15 ºC 25 ºC 40 ºC 60 ºC Figura 5. Relação entre a viscosidade aparente e a taxa de deformação para a gema pasteurizada. ln ηap (Pa.s) 10 1 –1,000 a –1,500 0 –2,000 0,0031 0,0033 0,0035 0,0037 50 100 150 200 250 300 Taxa de deformação (1/s) ln ηap = 2035,621/T – 8,590 R2 = 0,989 –2,500 –3,000 0,0029 100 nap (Pa.s) 0 5 ºC 15 ºC 25 ºC 40 ºC Figura 7. Relação entre a viscosidade aparente e a taxa de deformação para a gema reconstituída. 1/T (K–1) b –1,000 1,500 –1,500 ln K = 2141,512/T – 8,540 R2 = 0,922 –2,000 –2,500 0,0029 0,0031 0,0033 0,0035 0,0037 ln ηap (Pa.s) ln K (Pa.s) –0,500 1/T (K–1) 1,100 ln ηap = 976,728/T – 2,171 R2 = 0,942 0,900 0,700 0,0031 0,0032 0,0033 0,0034 0,0035 0,0036 0,0037 Figura 6. Efeito da temperatura: a) viscosidade aparente (150 s-1) e b) índice de consistência da gema pasteurizada. 1/T (K–1) ln K (Pa.s) Tabela 7. Parâmetros estimados pela Equação de Arrhenius para a gema pasteurizada (γ⋅ = 150 s-1). Ea (kJ.mol-1) A0 R2 K (Pa.s) 17,80 -8,540 0,92 ηap (Pa.sn) 16,92 -8,590 0,99 a 1,300 4,600 b 4,400 ln K = 1309,378/T – 0,223 R2 = 0,968 4,200 4,000 0,0033 0,0034 0,0035 0,0036 0,0037 1/T (K ) –1 3.2.3 Clara a) Pasteurizada Figura 8. Efeito da temperatura: a) viscosidade aparente (150 s-1) e b) índice de consistência da gema reconstituída. O índice de comportamento (n) apresentou valores em torno de 1, conforme se observa na Tabela 10, indicando que a clara pasteurizada apresentou comportamento Newtoniano e, desta forma, pode ser representado pelo modelo Newtoniano, cujos dados estão apresentados na Tabela 11. A γ⋅ = 300 s-1 e temperaturas a 15 e 25 °C, têm-se, para a clara pasteurizada, viscosidades de 0,007 e 0,006 Pa.s, conforme mostra a Figura 9. Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 10-18, jan./mar. 2011 15 www.ital.sp.gov.br/bj Comportamento reológico de constituintes do ovo OHATA, S. M. e VIOTTO, L. A. K (Pa.s) ηap (Pa.sn) 10,89 8,12 -0,223 -2,171 Tabela 10. Parâmetros reológicos da clara o modelo de Ostwald-de-Waelle. T (°C) K (Pa.sn) n (adimensional) 5 0,012 0,944 15 0,008 0,973 25 0,007 0,981 40 0,005 1,017 60 0,002 1,170 0,97 0,94 pasteurizada para χ2 0,000 0,000 0,000 0,000 0,001 R2 0,999 0,999 0,999 0,999 0,996 Tabela 11. Parâmetro reológico da clara pasteurizada para o modelo Newtoniano. T (°C) R2 η (Pa.s) χ2 5 0,009 0,001 0,999 15 0,007 0,000 0,999 25 0,007 0,000 0,999 40 0,005 0,000 0,999 60 0,005 0,004 0,991 Tabela 12. Parâmetros reológicos da clara reconstituída para o modelo de Ostwald-de-Waelle. T (°C) K(Pa.sn) n (adimensional) R2 χ2 5 0,006 0,999 0,000 0,999 15 0,005 1,018 0,000 0,999 25 0,005 1,012 0,000 0,997 40 0,004 1,034 0,001 0,997 60 0,004 1,024 0,001 0,997 Tabela 13. Parâmetro reológico da clara reconstituída para o modelo Newtoniano. T (°C) R2 η (Pa.s) χ2 5 0,006 0,000 0,999 15 0,006 0,000 0,999 25 0,005 0,003 0,994 40 0,005 0,006 0,989 60 0,004 0,008 0,992 –4,600 –4,800 ln η (Pa.s) Tabela 9. Parâmetros estimados pela Equação de Arrhenius para a gema reconstituída (γ⋅ = 150 s-1). Ea (kJ.mol-1) A0 R2 –5,000 –5,200 ln η = 1169,598/T – 8,937 R2 = 0,968 –5,400 0,1 –5,600 0,0029 0,0031 0,0033 0,0035 0,0037 1/T (K ) Figura 10. Efeito da temperatura sobre a viscosidade da clara pasteurizada (150 s-1). 0,01 0,1 n (Pa.s) n (Pa.s) –1 0,001 50 100 150 200 250 300 350 400 0,001 Taxa de deformação (1/s) 5 ºC 15 ºC 25 ºC 40 ºC 0,01 60 ºC Figura 9. Relação entre a viscosidade e a taxa de deformação para a clara pasteurizada. 0 50 100 150 200 250 300 350 400 Taxa de deformação (1/s) 5 ºC b) Reconstituída 15 ºC 25 ºC 40 ºC 60 ºC Figura 11. Relação entre a viscosidade e a taxa de deformação para a clara reconstituída. Para a clara reconstituída, o índice de comportamento (n) também apresentou valores em tor no de 1, confor me se observa na Tabela 12, indicando que a clara reconstituída também apresentou comportamento Newtoniano e, desta forma, também pode ser representado pelo modelo Newtoniano, cujos resultados estão apresentados na Tabela 13. Através da Figura 11, γ⋅ = 300 s-1 e temperaturas a 15 e 25 °C, têm-se para a clara reconstituída viscosidades de 0,0055 e 0,0049 Pa.s, indicando que a viscosidade da clara Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 10-18, jan./mar. 2011 16 www.ital.sp.gov.br/bj Comportamento reológico de constituintes do ovo OHATA, S. M. e VIOTTO, L. A. 3.3 Análise de tixotropia –5,000 ln η (Pa.s) –5,200 –5,400 ln η = 691,576/T – 7,667 R2 = 0,941 –5,600 –5,800 0,0029 0,0031 0,0033 0,0035 0,0037 Em algumas temperaturas de amostras de gema reconstituída, foram encontradas presença de tixotropia (Figuras 13 e 14). A tixotropia ocorre quando um fluido é submetido a uma variação da taxa de deformação e há presença da uma histerese, ou seja, a viscosidade do sistema sujeita a uma tensão de cisalhamento por um tempo t não é a mesma, quando medida no mesmo tempo t, depois de cessada a ação da força de cisalhamento (SKELLAND, 1967). 1/T (K–1) Tensão de cisalhamento (Pa) Figura 12. Efeito da temperatura sobre a viscosidade da clara reconstituída (150 s-1). 600 500 400 Descida Subida 2 Subida 1 300 O ovo pasteurizado apresentou comportamento Newtoniano, enquanto que o reconstituído, comportamento pseudoplástico, nas condições estudadas. O modelo de Ostwald-de-Waelle descreveu adequadamente o comportamento reológico do ovo reconstituído e o modelo Newtoniano descreveu o comportamento do ovo pasteurizado, apresentando bons ajustes de R2 e χ2. As amostras de gema pasteurizada e reconstituída apresentaram comportamento pseudoplástico. O modelo de Ostwald-de-Waelle foi o que melhor descreveu o comportamento de ambas as amostras, cujos valores de R2 foram acima de 0,99 e de χ2 muito baixos. 200 100 0 0 50 100 150 200 Taxa de deformação (1/s) Figura 13. Reograma da gema reconstituída (5 °C). Tensão de cisalhamento (Pa) 4 Conclusões 600 Subida 1 500 Subida 2 Descida 400 300 200 100 0 0 50 100 150 200 250 300 Taxa de deformação (1/s) Figura 14. Reograma da gema reconstituída (15 °C). reconstituída foi cerca de 1,25 vezes menor em relação à clara pasteurizada. Como a clara é praticamente isenta de lipídios (0,03%), quando desidratada e reconstituída, aproxima-se muito mais da sua estrutura original, não ocasionando alterações significativas na viscosidade (BERGQUIST, 1977). Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 10-18, jan./mar. 2011 As duas amostras de clara apresentaram comportamento Newtoniano, descritas muito bem pelo modelo Newtoniano, que apresentou bons ajustes de R2 e de χ2. Os valores de viscosidade do ovo integral e da gema reconstituída foram, respectivamente, cerca de 5 e 8, sendo 13 a 20 vezes maior em relação às amostras pasteurizadas nas condições estudadas; portanto, este aumento deve ser considerado nos projetos de engenharia. Segundo Bergquist (1977), essa diferença pode ser atribuída ao fato de as amostras apresentarem alto conteúdo de lipídios, as quais, quando desidratadas e reconstituídas, não retornam à sua estrutura original, ocasionando um aumento na viscosidade. As viscosidades das amostras de ovo pasteurizado e gema pasteurizada foram as mais afetadas pela influência da temperatura, cujos valores de E a foram 17,39 e 16,92 kJ.mol -1 , respectivamente. Note-se que o índice de consistência (K) da amostra da clara pasteurizada foi o mais afetado pela temperatura, cujo valor de Ea foi igual a 23,48 kJ.mol-1. Agradecimentos Os autores agradecem ao CNPQ pelo apoio financeiro concedido. E à Sohovos Industrial Ltda pelo fornecimento das amostras. 17 www.ital.sp.gov.br/bj Comportamento reológico de constituintes do ovo OHATA, S. M. e VIOTTO, L. A. Referências BERGQUIST, D. H. Egg Dehydration. In: STADELMAN, W. J.; COTTERILL, O. J. Egg Science and Technology. 2nd ed. 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