XV CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA
26 a 29 de julho de 2011 | Curitiba (PR)
Grupo de Trabalho: GT 29
Título do trabalho: Os administradores em comum: uma análise comparada
dos capitalismos Europeus em rede
Autor: Davide Carbonai
Professor adjunto na Universidade Federal do Pampa;
e-mail para contato: [email protected]
Resumo: os capitalismos contemporâneos são formalmente coordenados
através do uso e da difusão dos “interlocking directorates” (ou seja, os laços
entre empresas criados por aqueles administradores em comum entre elas).
Estes administradores representariam, de qualquer forma, laços entre atores
econômicos concorrentes e, portanto, de acordo com a teoria da concorrência
perfeita, um elemento de distorção do mercado. A partir de um banco de dados
referido às empresas listadas nas principais bolsas europeias, a análise das
redes sociais mostra as principais características “estruturais” destes
capitalismos.
Palavras-chave: análise de redes sociais – interlocking directorates – Europa –
variedade dos capitalismos.
Abstract: contemporary capitalisms are formally coordinated through the use
and diffusion of «interlocking directorates» (i.e., members of a corporate board
of directors serving on the boards of multiple corporations). Anyway, according
to the theory of perfect competitions, linkages between economic competitors
represent a serious market-distorting factor. Based on a large listed companies
data-set of European economies, social network analysis highlights main
«structural» features of these capitalisms.
Keywords: social network analysis - interlocking directorates – Europe – variety
of capitalisms.
1
Introdução
No caso dos “interlocking directorates” (ID), o diretor em comum entre
conselhos de administração (“boards of directors”) de diferentes empresas,
representa um laço (“interlock”) que as une entre si. Geralmente, a literatura
considera este tipo de laço como um elemento de distorção do mercado, pois
este criaria uma clara interdependência entre agentes que, pelo menos em
linha teórica, deveriam atuar em contexto de atomicidade e competição.
Conforme Chiesi (1982), o estudo desses laços – a rede gerada pelos ID –
representa uma valida tentativa de análise dos mercados e da competitividade
de um sistema econômico1.
Já a literatura clássica critica o uso estratégicos dos ID, feito pelas
empresas; neste sentido, Dembitz Louis Brandeis, conselheiro do presidente
americano Wilson, em 1914 (ano da aprovação da Lei Clayton, que proíbe nos
Estados Unidos os ID entre empresas concorrentes), escrevia:
A prática dos interlocking directorates é a raiz de muitos males. Ela
ofende as leis humanas e divinas. Aplicada às empresas rivais, ela
tende à supressão da concorrência e à violação da lei Sherman.
Aplicada às empresas que lidam umas com as outras, ela tende à
deslealdade e à violação da lei fundamental que nenhum homem
2
pode servir a dois senhores.
O princípio invocado por Brandeis é claro: a difusão dos ID violaria o
principio de atomicidade e independência dos atores econômicos, tal qual é na
teoria da concorrência perfeita. De fato, conforme Adam Smith – no Livro I de A
Riqueza das Nações – seria suficiente apenas uma conversa entre
empresários para alterar o funcionamento de reequilíbrio do mercado feito pela
“mão invisível”:
As pessoas da mesma profissão raramente se reúnem, mesmo que
sejam para momentos alegres e divertidos, mas as conversas
terminam em uma conspiração contra o público, ou em algum
incitamento para aumentar os preços. Efetivamente, é impossível
1
Entre os vários textos, ver também Wilson (2002).
“The practice of interlocking directorates is the root of many evils. It offends laws human and
divine. Applied to rival corporations, it tends to the suppression of competition and to violation of
the Sherman law. Applied to corporations which deal with each other, it tends to disloyalty and
to violation of the fundamental law that no man can serve two masters” (Brandeis, 1914: 51),
2
2
evitar tais reuniões por meio de leis que possam vir a ser cumpridas e
se coadunem com espírito de liberdade e de justiça. Todavia, embora
a lei não possa impedir as pessoas da mesma ocupação de se
reunirem às vezes, nada deve ser feito no sentido de facilitar tais
3
reuniões e muito menos de torná-las necessárias.
Ou mais recentemente, o relatório da OECD (2009):
Participações minoritárias e “interlocking directorates” podem ter
efeitos negativos sobre a concorrência, seja reduzindo o incentivo dos
acionistas minoritários para competir (efeitos unilaterais), seja ou
4
facilitando a convergência (efeitos coordenados).
Além disso, o relatório da OCDE (2009) mostra que, embora com as
autoridades nacionais antitruste levantando a questão (isto é, a difusão dos ID
poderia afetar o regular funcionamento de um mercado), os legisladores não
adotaram uma política antitruste adequada.
Ao longo do tempo, a importância do tema fomentou muitos estudos,
que levaram até um conjunto progressivamente melhor de técnicas de análise:
desde os anos setenta, os pesquisadores desenvolveram novas ferramentas
analíticas
e
aplicações
matemáticas
a
partir
da
teoria
dos
grafos,
5
implementando o conjunto das técnicas de análise de rede disponíveis . Estas
pesquisas permitiram, por exemplo, medir a conectividade de uma rede, a sua
amplitude e densidade, a posição estrutural de uma empresa (se for
estratégica, marginal, periférica ou central), identificar subgrupos com
características semelhantes, pôr em relação às medidas de rede algumas
estatísticas econômicas.
Ao longo do tempo, a literatura especialista desenvolveu outras medidas,
também ao fim de comparar entre si redes de diferentes amplitudes. Desde
então, esta abordagem metodológica tornou-se útil na comparação dos
capitalismos, e, portanto, no estudo da political economy comparada,
destacando por cada tipo de capitalismo as suas caraterísticas estruturais.
3
«People of the same trade seldom meet together, even for merriment and diversion, but the
conversation ends in a conspiracy against the public, or in some contrivance to raise prices. It is
impossible indeed to prevent such meetings, by any law which either could be executed, or
would be consistent with liberty and justice. But though the law cannot hinder people of the
same trade from sometimes assembling together, it ought to do nothing to facilitate such
assemblies; much less to render them necessary» (Smith, 1776: Livro I, 10, § 82).
4
«Minority shareholdings and interlocking directorates can have negative effects on
competition, either by reducing the minority shareholder’s incentives to compete (unilateral
effects), or by facilitating collusion (coordinated effects)» (OECD, 2009).
5
Entre os muitos textos de introdução às técnicas de análise de redes sociais, cf. Wassermann
e Faust (1994) ou Chiesi (1999).
3
Obviamente, este tipo de análise crítica os assuntos principais da teoria
econômica neoclássica: não é possível entender a organização econômica sem
reconduzi-la às influências autonomamente exercidas pelas redes de relações
sociais dentro das quais os atores econômicos e sociais são inseridos.6
1. O capitalismo em rede
Segundo Mizruchi (1996), cooptação e monitoramento entre empresas
representam as três principais razões da função dos
ID ao nível
interorganizacional. Por exemplo, através da cooptação e do monitoramento, a
empresa absorve em si os elementos externos de potencial distúrbio ao fim de
reduzir a incerteza do ambiente e manter a sua posição dominante no
mercado. De fato, os ID atuam como “mídias interorganizacionais” entre
concorrentes, enquanto, no caso de concorrência perfeita, as empresas
deveriam atuar isoladamente, combinando de maneira mais eficiente os fatores
produtivos ou introduzindo inovações de processo ou produto.7 Por isso que
torna-se importante a medição dos ID – “quanto” estes estão presentes em
uma economia – e a forma da rede que os ID – “laços” da rede – estruturam
com as empresas (ou seja os “vértices”, ou “nós” da rede).
Para melhor explicar o funcionamento da rede no seu conjunto e permitir
uma comparação entre capitalismos, são propostas em seguida (capítulos 2 e
3), de forma sucinta, algumas estatísticas de rede, relatadas aos casos dos
principais capitalismos europeus.
1.1. A economia, dentro das redes sociais
Conforme o novo estruturalismo em sociologia econômica, não é
possível entender a organização econômica sem reconduzi-la às influências
exercidas autonomamente pelas redes de relações sociais, dentro das quais os
6
Cf. os textos clássicos de Mark Granovetter (1985; 2002; 2004).
7
Cf., por exemplo Carbonai (2006).
4
atores – econômicos e sociais – são inseridos. A ação é definida a partir do tipo
de rede no qual estas empresas são inseridas e a posição que elas ocupam na
rede – ou seja, a “posição estrutural” (Granovetter, 2004). Obviamente, esta
abordagem desenvolve, ao longo do tempo, uma crítica ao mercado e à sua
função de regulação institucional. Segundo Swedberg (1994), por exemplo, os
mercados poderiam ser considerados como grupos exclusivos de empresas –
fornecedoras e compradoras – que se observam e controlam-se mutuamente.
De acordo com Baker (1984), quando o número de operadores for mais
alto, os mercados das opções acionárias não ficariam automaticamente mais
competitivos e os preços mais estáveis (como na lógica de mercado
competitivo).
Este
mercado,
aparentemente
“saturado”
de
uma
forte
racionalidade econômica, é influenciado na realidade pelas relações pessoais
dos operadores de bolsa (Baker, 1984).
Também no mercado do trabalho, por exemplo, onde por meio dos laços
fracos (weak ties) ou os contatos menos frequentes com pessoas em situações
de trabalho diferentes, fica disponível com toda a probabilidade uma
informação
inesperada
relativa
às
novas
oportunidades
de
trabalho
(Granovetter 1974: 54).
Gerar confiança e reforçar a própria “reputação social” é estratégico,
pois as relações comerciais se misturam com as sociais (Macaulay, 1963: 6164), e assim no setor das tecnologias emergentes, fortemente influenciado por
relações informais de tipo confidencial (Darr e Talmud, 2003; Armbrüster e
Glückler, 2003). Eccles (1981: 340) nota que em muitos países os projetos na
indústria da construção não estão sujeitos a regras institucionais que
necessitem de propostas competitivas: os relacionamentos com o fornecedor
são estáveis e constantes durante períodos de tempo relativamente longos e
só raramente são regulados por ofertas concorrenciais. Este tipo de “quaseintegração” entre organizações é o que Eccles chama de “quase-empresa”,
caracterizada por extensos relacionamentos de longo prazo com as empresas
subcontratadas, segundo uma forma de organização intermediária entre o
mercado e a empresa verticalmente integrada (Eccles, 1981: 340).
Estes laços dão origem a um complexo sistema relacional que atravessa
os níveis internos de uma organização (intra-organizacional) e que ultrapassa
as suas fronteiras (inter-organizacional). O enraizamento social é visto em
5
termos estruturais; presume-se, portanto, que a ação seja “network oriented”,
ou, basicamente influenciada pelas redes de relações em que os atores
econômicos estão envolvidos. Redes estáveis de relações sociais constituem
uma estrutura que deve ser reconstruída para avaliar os efeitos sobre o
comportamento econômico.
Como também Kees van Veen e Jan Kratzer (2011) destacam, é difícil
de encontrar uma análise comparada dos capitalismos de rede. Geralmente, as
pesquisas reconstroem as redes de ID em um país ou em um setor econômico,
sem comparação, tentando marcar o numero médio de ID por diretor ou a
centralidade das empresas. Por exemplo, Chiesi (1982; 1985) observa que, na
Itália, um número significativo de administradores tem cargos em mais de um
conselho: os conselhos de administração originam 3427 cargos ocupados por
2452 pessoas. Entre as 223 empresas listadas, os administradores podem
entrar em contato com outros diretores, em média, através de 4,2 graus de
separação. Em comparação, os diretores das primeiras 1000 empresas dos
Estados Unidos citadas pela revista Fortune entram em contato com outras
empresas através de 4,6 graus de separação.
A prática dos ID não é recorrente só no caso Europeu ou nos Estados
Unidos mas generalizada também no Brasil; por exemplo, em 2003, 74% das
319 empresas de uma amostra apresentaram pelo menos um diretor de outra
empresa. Um administrador tem na média de 1,26 cargos de direção (SANTOS
et al., 2009).
Entre as análises comparadas, no estudo de Stokman e Ziegler (1985), o
sistema anglo-americano de governance mostra a menor proporção de
diretores múltiplos e a menor acumulação de cargos; o sistema Alemão
(Áustria, Alemanha, Holanda e Suíça) ocupa uma posição intermediária; e,
finalmente, os países com um sistema latino (Bélgica, França, Itália e Finlândia)
possuem a maior proporção de ID com maior acumulação de cargos.
A literatura apresenta geralmente várias abordagens de análise ao
estudo dos ID. Não existe uma clara convergência metodológica, nem ao
respeito das estatísticas que podem ser escolhidas para avaliar uma hipótese
ou caracterizar uma rede, nem respeito ao tipo de empresa que deve ser
incluída ou excluída na análise. Infelizmente, como destacado por Marques
(2007), dado o nível de detalhes envolvidos, a análise de redes trabalha
6
sempre com estudos de caso, assim, “apenas a realização de muitos estudos
comparativos de redes em situações sociais distintas pode, no médio prazo,
sugerir quais os tipos de influências que elas provocam, dadas as
circunstâncias e os processos presentes”.
1.2. Os capitalismos Europeus em redes
Enquanto Kees van Veen e Jan Kratzer (2011) comparam os principais
capitalismos Europeus a partir de uma amostragem das maiores empresas,
este estudo inclui todas as empresas listadas. Os dados sobre a composição
dos conselhos de administração são coletados em janeiro 2010, pelo sistema
Amadeus Bureau van Dijk Electronic Publishing (BvDEP) 8. Os dados Amadeus
derivam das coletas realizadas por institutos nacionais de pesquisa. Estes
levantam as informações, geralmente, a partir de um questionário entregue às
empresas e preenchido por um funcionário9.
Embora o sistema Amadeus Bureau van Dijk Electronic Publishing
(BvDEP) permita visualizar nome e cargo dos membros dos conselhos de
administração das empresas listadas, não é possível extrair separadamente os
membros “executive” dos membros que pertencem ao “supervisory board”.
Enquanto algumas pesquisas destacam as diferenças entre os dois tipos de
cargo, outras analisam os dois sem distinção, incluindo os membro dos
“supervisory board” entre os potenciais administradores em comum: neste
estudo, conforme a própria operacionalização de “ID”, os administradores “nonexecutive” podem representar um ID entre empresas.
Neste estudo, a cada vez que um diretor comparece em duas empresas,
há um ID. Os dados são elaborados na perspectiva da empresa (ou seja, por
meio de “matrizes de adjacências”, com em linha e coluna, as empresas
daquele respetivo país); de fato, a finalidade deste estudo é verificar a hipótese
8
Os dados aqui apresentados representam uma antecipação dos resultados de um estudo
ainda em andamento iniciado no setembro 2009 com o apoio do Institut de Science du travail
da Université Catholique de Louvain-la-neuve.
9
Embora se o banco de dado Amadeus oferece a oportunidade de disponibilizar uma grande
quantidade de informações, não permite verificar a data certa de coleta das informações.
Todavia, é razoável pensar que os conselhos de administração permaneçam no cargo por um
longo período de tempo.
7
de atomicidade conforme a teoria da concorrência perfeita e por isso debater
as conexões entre as empresas (ou seja os agentes que atuam no mercado).10
Seja no sistema de corporate governance “monista” (“one-tier”, como na
Irlanda, Grã-Bretanha, Espanha e Grécia) ou “dualista” (“two-tier”, vertical,
como Áustria, Dinamarca, Alemanha, ou horizontal-misto, como na Itália e
Portugal) o “supervisory board” (os administradores “non-executive”) é
escolhido pela assembleia dos acionistas, não é um mero observador:
geralmente detém tarefas que afetam a atividade do órgão executivo.
Tabela 1 – Tipos de corporate governance na Europa
Modelo
Monista
Itália
Grã-Bretanha
Irlanda
Alemanha
Áustria
Holanda
Dinamarca
Suécia
Noruega
Finlândia
Bélgica
Portugal
Grécia
França
Espanha
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Modelo
dualístico
vertical
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Modelo
dualístico
horizontal
•
•
•
•
Além disso, o “supervisory board” monitora e certifica que a informação
financeira seja precisa, que os controles financeiros e de gestão de risco sejam
robustos e defensáveis. Os administradores não executivos são responsáveis
por determinar os níveis adequados de remuneração dos “executivos” e detêm
um papel importante no processo de nomeação e, se necessário, de remoção
de cargos (Bosetti, 2009). Dependendo do tipo de “corporate governance”, o
“supervisory board” tem poder de veto sobre as decisões do “executive board”.
10
Ver também Stigler (1957).
8
Em linha teórica, o membro do “supervasory board” da empresa x pode
ser ao mesmo tempo “executive” na empresa y e z (Frinz, 2006): por isso
também que é preciso levar em conta os administradores “non-executive”.
2. As medidas “macro”
Basicamente, um gráfico é constituído de “nós” (n) – conhecidos também
como “vértices” – e de “ligações” (l) – ou seja, as “arestas” que conectam os
nós. Geralmente, na teoria dos grafos, as ligações podem consideradas “nãodirecionais” ou “direcionais”, à medida que uma aresta parte de um ator
(origem) e termina em outro (destino). No caso das redes de ID, os laços são
geralmente considerados “não-direcionais”.
Figura 1- Exemplo de grafo
Nota: o gráfico da figura tem seis vértices (amplitude da rede). Na rede
está presente um sub-gráfico de três vértices conectados entre eles
(onde a densidade é máxima, ou seja, uma “ligação”, composta por 1-25). O gráfico consiste de vértices conectados diretamente ou
indiretamente por meio de outros vértices (como 1 e 6, conectados por
meio de 5 e 4). O vértice 4 representa uma “ponte de ligação”, pois a sua
ausência desconectaria o gráfico em duas partes.
Ucinet V (BORGATTI et al., 2002) permite calcular dois tipos de
estatísticas: um primeiro conjunto respeito às propriedades estruturais – ou
“macro” – da rede (2.1 e 2.2), um segundo refere-se à centralidade de cada
vértice – nível “micro” – na rede (3.1 e 3.2).
9
2.1. Densidade
Em relação ao primeiro tipo de estatísticas, o gráfico da figura 1 é
composto por 6 nós, ou seja, a “amplitude” da rede. Neste caso, o número
máximo de ligações é 15. De fato, em uma rede com o número de atores igual
a N, o número máximo de ligações em um grafo não-direcional poderá ser
encontrado utilizando a seguinte expressão:
L max 
N ( N  1)
2
Eis a densidade em um grafo “não direcional”, obtida pelo número de
ligações reais, dividido pelo número máximo de ligações possíveis nesta rede.
Posto que o número de ligações no grafo da figura 1 é de 7, a densidade seria
igual a 0,33: 7 (laços) divididos por 21 (número máximo de ligações na rede).
Torna-se possível, então, distinguir as redes densas, nas quais há uma grande
quantidade de ligações, das redes esparsas, nas quais há poucas conexões.
Além do caso da Bélgica, a tabela 2 (Apêndice ao texto) mostra que
geralmente os níveis de densidade são geralmente baixos; isto é devido à alta
amplitude das redes que, de fato, mantém a densidade baixa ou muito baixa.
Em linha com outras pesquisas, esta análise também destaca que é mesmo
por meio de outras estatísticas que se torna possível descrever a “atomizaçãoconluio” entre as empresas11.
11
Considerado que entre empresas poderiam existir dois ou mais administradores em comum a
tabela 2 mostra a densidade calculada a partir dos valores “pesados” (“valued ties”) – que
tomam em conta a presença de dois ou mais administradores em comum – e “não-pesados”
que considera só à presença ou ausência do laço; neste segundo caso, a densidade é
calculada a partir de uma matriz dicotómica, que não considera quantos ID unem as duas
empresas, mas só a presença ou ausência de ID.
10
2.2. Fragmentação
Na teoria da concorrencia perfeita, as empresas atuam isoladamente
sem laços entre si. No caso das redes de ID, os administradores em comum
representam laços entre conselhos diferentes, assim que as empresas fomam
entre si grupos ligados por meio de laços direto – ou seja, a distância 1 – ou
indiretamente por meio de outras empresas (a distância maior de 1). As
empresas ligadas entre si, diretamente ou indiretamente por meio de outras
empresas, formam uma “componente”.
Em linha teorica, no caso da concorrencia perfeita, o numero de
componentes seria igual ao numero de nós presentes na rede: em outros
termos, pois não deveriam existir laços entre empresa, não poderiam se criar
componentes. Daqui o calculo da fragmentação, como relação entre
componentes e número de nós na rede (a sua amplitude). No caso que o
número de vértices seja igual ao número de componentes a fragmentação seria
máxima, ou seja, igual a 1 (ver figura 2). Neste caso a competitividade seria
máxima.
Fig. 2 – A competitividade do sistema: uma medida de fragmentação
1.
2.
3.
Notas: o grafo 1 representa um caso no qual a competitividade é máxima
(máxima «fragmentação» do sistema): cada nó representa um
componente. Neste caso, a fragmentação é igual 1: ou seja, 6
(componentes) dividido por 6 (nós). No grafo 2, a fragmentação é menor
(0,5): 3 (componentes) divididos por 6 (nós). No grafo 3 a competitividade
do sistema é mínima, pois cada nó pertence à mesma componente.
11
No caso da França, por exemplo, 912 empresas originam 520
componentes (tabela 2): neste caso, a fragmentação é igual a 0,57 – mais alta
que na Itália (0,44) e em Portugal (0,44). Na Suécia (0,31) e na Finlândia (0,4)
se observam valores de fragmentação mais baixos (menor competitividade).
Note-se que na Suécia o 59% das empresas cabe na componente principal;
53% na Itália, 52% na Finlândia. Além da Grécia, e em medida menor a Irlanda,
Áustria e Dinamarca, nos demais capitalismos, as empresas tendem a
centralizar as relações sociais em um núcleo central de empresas direita ou
indiretamente interligadas (o componente principal).
Mas é mesmo na Grã-Bretanha que a fragmentação é mínima: 323
componentes, 1775 nós na componente maior, fragmentação baixa (0,15), 82%
dos vértices incluídos na componente maior (tabela 2, Apêndice 1).
3. As estatísticas “micro”
Este estudo analisa também algumas estatísticas “micro”, definidas a
partir dos vértices: o grau de centralidade (“degree”) do nó (“vértice”) x, a sua
“betweenness”, a amplitude da rede dos Ego-network, a atitude a participar de
“clãs”.
3.1. Degree e betweeness
A centralidade no “Degree” identifica o número de ligações (ID) entre a
empresa x e as outras empresas (ver figura 3)12. A estatística é definida pelo
número de laços entre x e os nós adjacentes a x: para obter o grau de um
determinado nó, g(ni), é preciso contar o número de laços do nó x. Neste caso,
é também possível que duas empresas sejam ligadas por meio de mais
12
No caso de “Degree normalizado”, a centralidade no “Degree” é dividida pela amplitude da
rede.
12
administradores em comum13. A “size” (ou tamanho da rede de Ego) indica
quanto ampla seja a rede das empresas adjacentes a x (Ego), ou, em outros
termos, o número de empresas relacionadas com Ego.
A “betweenness” indica o número de “caminhos geodésicos” – os
caminhos mais curtos que juntam dois vértices quaisquer de uma rede – que
passam pela empresa x. Neste caso, esta estatística mede o número de vez
que um “caminho geodésico” passa por x. Também neste caso, a “betweeness”
é normalizada: dividida pelo valor máximo possível de beetweenes nesta rede.
Figura 3 – Exemplo de grafo
Neste caso, a empresa 4 é a mais “central” em termos de “degree”: que
neste caso é igual a 3 (pois está ligada com 3, 5, 6). Todavia, embora se
não seja a mais central em termos de “degree”, a empresa 5 ocupa uma
posição estratégica, pois interceptaria os fluxos de comunicação –
“caminhos geodésicos” - que unem os outros vértices da rede: a empresa
2 para entrar em contato com 6 passa por 5, a empresa 1 para entrar em
contato com a empresa 4 passa por 5, etc. Neste caso, a empresa 5 é um
“actor in the middle”, ou seja uma empresa no meio de potenciais fluxos de
comunicação que atravessam a rede. A “betweennes” mede o numero de
caminhos breves – “caminhos geodésicos” – que passam por cada vértice
i.
Em média, cada empresa Italiana listada na bolsa nacional compartilha 3,31
administradores; na Espanha 3,26; na Áustria 3,07. No capitalismo grego (0,94)
e romeno (0,57) se encontram os valores mais baixos entre os considerados.
Considera-se enfim que estes valores provavelmente subestimam a ocorrência
13
Sobre o uso dos “Degree” e da “betweeness” ver Freeman (1979).
13
dos ID, pois não é possível avaliar se essas pessoas servem também como
diretores em empresas privadas não listadas ou não obrigadas a divulgar
informações sobre a composição do conselho.
Também neste caso, como destacado em outras pesquisas, os valores
de “betweeness” resultam correlados com os de “degree”.
3.2. 2-clãs
Um 2-clã é uma tríade de vértices ligados entre si a distância igual ou inferior a
2 (ver a figura 4).
Figura 4 – Exemplo de grafo
Notas: no grafo são presentes dois componentes e três clãs: 6-4-3, 5-4-3,
6-4-5.
Também neste caso (ver tabela 3) a estatística é normalizada pela
amplitude da rede.
N-clãs, n-cliques, k-core são medidas geralmente pouco usada neste
tipo de estudo. A escolha dos N-clãs, ao invés, por exemplo das n-cliques,
deriva mesmo das finalidade deste estudo: não é preciso que o sub-grupo seja
denso – como no caso das “cliques” – para alterar a função regulatória do
mercado, mas é suficiente uma conexão “longa” – como no caso dos 2-clãs –
que une as empresas indiretamente (Mokken, 1979).
14
Estas estatísticas, seja as “micro” que as “macro”, analisada no seu
conjunto – ver tabela 2, 3 e scatter 1 e 2 – destacam que a tipologia de Hall e
Soskice (2001) – definida pelas economias “coordenadas” e “não-coordenadas”
de mercado – não funcionaria em relação das redes de ID. E além desta
tipologia, também a forma da corporate governance – se for “monista” ou
“dualista” – não explica o uso e a difusão dos ID na Europa.
4. “Workable competition”?
Em linha teórica, embora seja suposto que os ID atuem como formas
internas de solidariedade e confiança recíproca, existiria sempre um limite à
sua difusão, além do qual o mercado perderia sua função de regulação,
deixando às lógicas relacionais a produção de bens e sua comercialização.
Embora
esses
laços
influenciem
o
comportamento
competitivo,
geralmente, as autoridades nacionais antitruste carecem de instrumentos
normativos para reduzir o impacto dos ID. Aliás, as leis nacionais não
sancionam a difusão dos ID senão indiretamente por meio das medidas sobre o
“minority-sharing” (OECD, 2009); então, na melhor das hipóteses, as empresas
adotam códigos de conduta de autolimitação dos ID. Todavia, esta análise
mostra que é mesmo por meio de “poucos” laços que cria-se o conluio: embora
se a densidade esteja geralmente baixa, os “poucos” laços (ver, por exemplo,
as estatísticas de “degree”) criam conluios (conforme as estatísticas relativas
às “componentes”, à “fragmentação”, ao 2-clãs). No caso da economia de rede,
é preciso de “poucos” laços para conectar um capitalismo: o problema de
regulação permanece pois os códigos de conduta não limitam a difusão dos ID.
Na melhor das hipóteses, se for o caso, a abordagem dos legisladores é “actor
oriented”: orientada a limitar o numero de ID por administrador ou empresa.
Mas, como mostrado, o problema deveria ser posto em termos relacionais: é a
rede, na sua configuração geral que se torna razão de conluio.
Este tipo de “quase-integração” entre organizações é o que Eccles
chama de “quase-empresa” (Eccles, 1981: 340). Em número geralmente
elevado, conforme as estatísticas de “fragmentação”, as empresas estão
15
conectadas dentro de um mesmo grupo (“componente”), em quase todos os
capitalismos Europeus. A pergunta surge espontaneamente: neste caso, a
empresa difere ou coincide com uma compontente? Considera-se que se for o
caso que considerarmos a “componente” como uma empresa, o número de
agentes no mercado reduzir-se-ia poderosamente.
Embora não exista uma medida certa do nível máximo aceitável de
difusão dos ID – em cima do qual a presença destes laços seria de sério
obstáculo à livre concorrência de mercado – os estudos destacam, geralmente,
um provável excesso destas interdependências, enquanto os governos liberais,
como os social-democratas, não implementam política de redução destes
conluios. Então, neste mercado, de rede, assim como definidos, o nível de
“concorrência-conluio” entre agentes é “tolerável”? Trata-se de uma “workable
competition” ou mais simplesmente de um grupo social, coeso, que atua em
conformidade de próprias normas sociais e fora da regulação institucional do
mercado?14
Obviamente, este tipo de abordagem leva em conta ulteriores dimensões
de crítica. Por exemplo, ligado à questão dos efeitos “extremos” destas
distorções do mercado, o crack da Parmalat, que em 2003 envolve 150 mil
famílias italianas que nunca foram reembolsadas integralmente do seu
investimento em obrigações, consideradas de baixo risco, e apoiados por
muitos bancos interligados por ID com a Parmalat. A mesma coisa ocorreu no
escândalo Cirio em 2003: setores diferentes mas mutuamente interrelacionados, geralmente por meio de poucos graus de separação. Banco e
finança que trocam administradores entre si, e com as empresas de produção e
a indústria da mídia, exercendo sobre estas uma potencial influência.
14
Sobre o conceito de “workable competition” ver Clark (1940).
16
Referências
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19
Apêndice 1
Tabela 1 – Capitalismos e estatísticas “macro”
Fragmentação
Nós na
(número de Percentual de nós
Amplitude Densidade da Densidade
Número de
componente
componentes na componente
(Size) rede (“valued”) (“dycotomic”)
componentens
maior
dividido pela
maior
amplitude)
Alemanha
942
0,0012
0,0012
135
572
0,61
0,14
França
912
0,0018
0,0018
309
520
0,57
0,34
Grã-Bretanha
2155
0,0031
0,0027
1775
323
0,15
0,82
Itália
243
0,0107
0,0074
128
107
0,44
0,53
Espanha
696
0,0038
0,0038
215
324
0,47
0,31
Romênia
834
0,0006
0,0006
22
675
0,81
0,03
Holanda
194
0,0058
0,0058
58
118
0,61
0,3
Grécia
275
0,0025
0,0025
9
198
0,72
0,03
Portugal
59
0,0286
0,198611
24
26
0,44
0,41
Bélgica
165
0,0452
0,313889
126
40
0,24
0,76
Suécia
464
0,0048
0,0048
276
146
0,31
0,59
Áustria
97
0,032
0,021
36
52
0,54
0,37
Bulgária
261
0,0022
0,0022
8
207
0,79
0,03
Dinamarca
170
0,0075
0,0075
18
100
0,59
0,11
Finlândia
126
0,0137
0,095139
65
51
0,4
0,52
Irlanda
68
0,0127
0,088194
17
42
0,62
0,25
Notas - Principais cargos presents no banco de dados Amadeus Bureau van Dijk Electronic Publishing (BvDEP): Alemanha
(Member, Advisor), Áustria (Member, Advisor), Bélgica (Administrator, Director, Chairman of the Board of Directors), Espanha
(President of the Board, Administrators), Finlândia (Managing Director, Chairman of the Board, Member of the Board), França
(Diretores), Grã-Bretanha (Company Secretary, Management Consultant, Company Director, Chartered Accountant), Grécia
(Representative, Marketing Manager, Sales Manager, Finance Manager, Shareholder), Holanda (Director, Chairman, Vicepresident, Director), Irlanda (Director, Company Secretary), Itália (General Manager, Member of the Board, attorney), Noruega
(Board Member, Employees Representative), Portugal (Purchases Dir., Human Resources Director, Chairman, Vice-Chairman,
Administrator), Romania (Administrative Manager, Member of the Board of Directors, Member of the Board of Directors),
Suécia (Regular member, Managing Director)
20
Tabela 2 - Capitalismos e estatísticas “micro”
2-Clãs
2-Clãs (normalizado)
Alemanha
165
França
238
Reino Unido
1551
Itália
77
Espanha
164
Romênia
56
Holanda
49
Grécia
25
Portugal
14
Bélgica
43
Suécia
190
Áustria
28
Bulgária
15
Dinamarca
26
Finlândia
43
Irlanda
13
0,175
0,26
0,71
0,31
0,23
0,067
0,252
0,09
0,23
0,26
0,40
0,288
0,057
0,152
0,34
0,19
Size
(Ego
network)
Centralidade
(Degree)
Deegre
Normalizado
Betweeness
Betweeness
Normalizado
1,13
1,439
0,019
46,279
0,01
1,65
2,112
0,029
216,601
0,052
5,81
6,588
0,044
3273,098
0,141
2,59
3,317
0,137
100,996
0,346
2,66
3,267
0,067
172,899
0,072
0,53
0,573
0,023
1,047
0,000
1,11
1,32
0,114
26,49
0,143
0,68
0,945
0,058
0,516
0,001
1,66
2,508
0,721
9,119
0,552
7,42
8,776
0,572
83,194
0,622
2,23
2,366
0,17
522,97
0,489
2,04
3,072
0,64
46,485
1,019
0,57
0,774
0,099
0,245
0,001
1,27
1,871
0,277
2,4
0,017
1,71
1,825
0,73
64,746
0,835
0,85
1
0,299
4,882
0,221
Notas - Principais cargos no banco de dados Amadeus Bureau van Dijk Electronic Publishing (BvDEP): Alemanha
(Member, Advisor), Áustria (Member, Advisor), Bélgica (Administrator, Director, Chairman of the Board of Directors),
Espanha (President of the Board, Administrators), Finlândia (Managing Director, Chairman of the Board, Member of the
Board), França (Diretores), Grã-Bretanha (Company Secretary, Management Consultant, Company Director, Chartered
Accountant), Grécia (Representative, Marketing Manager, Sales Manager, Finance Manager, Shareholder), Holanda
(Director, Chairman, Vice-president, Director), Irlanda (Director, Company Secretary), Itália (General Manager, Member
of the Board, attorney), Noruega (Board Member, Employees Representative), Portugal (Purchases Dir., Human
Resources Director, Chairman, Vice-Chairman, Administrator), Romania (Administrative Manager, Member of the
Board of Directors, Member of the Board of Directors), Suécia (Regular member, Managing Director)
21
Apêndice 2
Scatter 1 – Empresas na componente maior (%) e Fragmentação
Reino Unido
Empresas na componente maior (%)
0,80
Bélgica
Suécia
0,60
Finlândia
Itália
Portugal
Áustria
0,40
Holanda
Irlanda
Espanha
0,20
Alemanha
Dinamarca
Grécia
Bulgária
0,00
0,20
0,40
0,60
Romênia
0,80
Fragmentação (%)
Scatter 2 – Tamanho do Ego-network e Fragmentação
8,00
Bélgica
Size (Ego-network)
6,00
Reino Unido
4,00
Itália
Espanha
Suécia
Áustria
2,00
Portugal
Finlândia
Alemanha
Dinamarca
Grécia
Irlanda
Bulgária
Romênia
0,00
0,20
0,40
0,60
0,80
Fragmentação
22
Download

Os administradores em comum