XXVI Reunião Anual sobre Evolução, Sistemática e Ecologia Micromoleculares Instituto de Química, Universidade Federal Fluminense, 1 a 3 de dezembro de 2004 XXVI RESEM P37 Como as empresas brasileiras de cosméticos estão utilizando o conhecimento tradicional e as plantas medicinais § Vera Maria Costa Marinho (PG) § Escola de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Cidade Universitária, 22640-000, Rio de Janeiro, RJ [email protected] As empresas da industria de cosméticos caracterizam-se, entre outras coisas, pela necessidade continua de pesquisas de novos insumos e introdução de inovações em suas linhas de produtos. Nos últimos anos, tem sido bastante expressivo o crescimento da busca de tais insumos a partir de elementos presentes em plantas pertencentes a diferentes ecossistemas. No caso do Brasil, a biodiversidade existente, principalmente na Amazônia e redutos remanescentes da Mata Atlântica, tem atraído a atenção de pesquisadores e empresas de todo o mundo. O uso de princípios ativos a partir de floras nativas na industria cosmética acabou por tornar comum a adoção de uma nova denominação: a cosmecêutica, que vem se tornando um segmento bastante atrativo para novos negócios. Algumas empresas no Brasil, notadamente a NATURA (fabricante de cosméticos) e a EXTRACTA (pesquisadora de novas moléculas) são experiências bem sucedidas de empreendedorismo e inovação a partir do potencial terapêutico da flora brasileira. Introdução A indústria de cosméticos pode ser descrita como um segmento da indústria química cujos produtos são voltados para limpeza ou embelezamento do ser humano e que mantem importantes ligações com outras atividades químicas e farmacêuticas. Um fator de extrema importância para a competitividade no setor de cosméticos é o desenvolvimento de novos insumos (essências, princípios ativos) cuja incorporação aos seus produtos represente diferencial competitivo. No caso do uso de plantas medicinais e fitoterápicos, os mercados nacional e internacional tem crescido de forma bastante expressiva nos últimos 20 anos. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de 60% dos medicamentos lançados nos últimos anos foram obtidos, de forma direta ou indireta, a partir de pesquisas realizadas na flora. A ascensão da busca por cosméticos com objetivos terapêuticos a partir do uso de princípios ativos químicos (os produtos “cosmecêuticos”) abriu um importante segmento de mercado para novas oportunidades de negócios no setor. Analisando o faturamento liquido da industria química brasileira no período 1990-2003, pode-se observar que o segmento “higiene pessoal, perfumaria e cosméticos” exibiu taxas de crescimento anual nos últimos 14 anos de 5,2% a.a. Ao serem analisados os dados de comercio exterior para tais produtos, no mesmo período, fica demonstrado um crescimento acumulado de 103,4% nas exportações 1999 e 2003, enquanto que as importações diminuíram 47,3% no mesmo período. Em 2003, o superávit atingiu US$ 80,5 milhões, um crescimento de 91% sobre 2002. Com relação à biodiversidade, o Brasil conta com importantes ecossistemas, inclusive o amazônico, com um verdadeiro arsenal de plantas com uso comprovado ou potencial na industria de cosméticos. No Brasil, embora seja predominante a presença das grandes empresas internacionais do setor, pode-se observar a existência de um grande número de empresas de capital nacional, algumas das quais tem, progressivamente, realizado atividades de desenvolvimento de produto no pais, buscado a aplicação de produtos derivados da flora nativa em cosméticos e adotado estratégias no sentido de incrementar sua atuação internacional. No presente trabalho são citadas algumas experiências brasileiras no uso da flora nativa para fitocosméticos, enfatizando-se os casos da empresa Natura (principalmente através XXVI Reunião Anual sobre Evolução, Sistemática e Ecologia Micromoleculares Instituto de Química, Universidade Federal Fluminense, 1 a 3 de dezembro de 2004 da linha de cosméticos EKOS) e da empresa Extracta (que embora não seja uma empresa do setor, tem tido um papel bastante importante na disponibilização de moléculas a partir da biodiversidade brasileira). Material e Métodos O presente trabalho baseou-se em pesquisa realizada em documentos e sites da INTERNET que representassem uma visão atualizada do uso de princípios ativos originários da flora brasileira na industria de cosméticos. A bibliografia utilizada foi selecionada no intuito de se obter fontes diversificadas de informações sobre o tema, a saber, entidades acadêmicas, entidades governamentais, associações de classe, pesquisadores, investidores e outros. O primeiro segmento do trabalho busca mostrar características da industria de cosméticos e sua inserção no cenário industrial brasileiro. O segmento seguinte levanta alguns exemplos da flora brasileira com uso potencial ou real na industria de cosméticos. O ultimo segmento cita exemplos de sucesso de empresas de cosméticos brasileiras no uso de princípios ativos encontrados nas plantas nativas. Algumas das empresas citadas já fazem parte da tradição nacional no setor enquanto outras tem alcançado, nos últimos anos, patamares bastante significativos baseadas na inovação. resinóides; produtos de perfumaria ou de toucador preparados e preparações cosméticas). As empresas do setor podem ser classificadas, segundo a natureza da sua atuação, em: • Diversificadas: também fabricam outros produtos, principalmente nos setores de perfumaria, higiene pessoal, medicamentos e alimentos e se beneficiam das economias de escala e de escopo na fabricação e na comercialização; • Concentradas: concentram esforços em cosméticos e perfumaria, buscando soluções inovadoras e produtos mais sofisticados, se beneficiando da diferenciação. Um outro fator que diferencia as empresas e a estratégia escolhida para comercialização e distribuição dos produtos, ou seja, via canais tradicionais (farmácias, supermercados), canais específicos (lojas especializadas) ou venda direta. A regulamentação para o setor é feita, normalmente por órgãos ligados a saúde publica como o FDA (Food and Drugs Administration, nos Estados Unidos) e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no Brasil). De acordo com dados da ANVISA, em 2003 existiam no Brasil 1.123 empresas atuando no mercado de produtos de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, sendo que 15 empresas de grande porte representavam mais de 70% do faturamento total. A distribuição das empresas no território nacional é mostrada na figura 1. Discussão 1. A industria de cosméticos Quando são analisados setores industriais, normalmente os estudos são baseados em dados obtidos a partir de uma dada classificação. As duas classificações em uso são as seguintes: • A classificação CNAE (classificação nacional da atividade econômica) utilizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e outros órgãos. Nela, a fabricação de produtos cosméticos esta incluída no código 2473-2 (Fabricação de artigos de perfumaria e cosméticos); • A classificação NCM (nomenclatura comum mercosul), onde os cosméticos estão inseridos no Capítulo 33 (Óleos essenciais e Figura 1 – distribuição das empresas de produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos em território brasileiro –dados de 2003 XXVI Reunião Anual sobre Evolução, Sistemática e Ecologia Micromoleculares Instituto de Química, Universidade Federal Fluminense, 1 a 3 de dezembro de 2004 A Indústria Brasileira de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos apresentou um crescimento médio deflacionado composto de 6,5% nos últimos 5 anos, tendo passado de um faturamento líquido de impostos sobre vendas de R$ 5,9 bilhões em 1998 para R$ 11,0 bilhões em 2003. A manutenção das vendas em dólares reflete a maxi desvalorização ocorrida em 1999, em 2001 (principalmente em setembro e outubro) e em 2002 no segundo semestre, o que pode ser visualizado na figura 2. Figura 2 – faturamento da industria de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos no período 1999-2003 A tabela 1 mostra os resultados da balança comercial dos produtos de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos nos últimos cinco anos, demonstrando um crescimento acumulado de 103,4% nas exportações e diminuição de 47,3% nas importações. Tabela 1 - balança comercial higiene pessoal, perfumaria e cosméticos - % de crescimento importações exportações -26,2 28,4 2000 6,6 10,5 2001 -9,7 8 2002 -24,3 11,8 1999 2003 -2 18,8 %Cresc.1999/2003 -47,3 103,4 % Médio 1999/2003 -12 15,3 Fonte: SECEX 2. Itens da cosmético flora brasileira de uso Os mercados nacional e internacional de plantas medicinais e fitoterápicos estão em franca expansão desde meados da década de 80. As principais indústrias farmacêuticas do mundo realizam pesquisas a partir de plantas e delas provem, direta ou indiretamente, 2/3 dos medicamentos lançados nos últimos anos nos EUA. O Brasil tem uma biodiversidade de 55.000 espécies de plantas superiores e muitas plantas medicinais fazem parte do arsenal terapêutico da população. Pesquisas nas Universidades e Institutos de Pesquisa, revelam substâncias ativas em câncer, aids, analgésicos, antibióticos e cosméticos. O país contém ecossistemas diversos que incluem representantes de mais de 70% dos organismos vivos do planeta, dos quais cerca de 20% são encontrados somente aqui. A Amazônia, considerada por muitos como o mais importante ecossistema do mundo, conta com inúmeras espécies vegetais com potencial aplicação na industria de cosméticos e cuja identificação tem sido feita através de estudos acadêmicos baseados no conhecimento popular. Faz-se necessário enfatizar que o desenvolvimento do uso de plantas medicinais e fitoterápicos depende, alem da qualidade da matéria prima, de um desenvolvimento rural sustentável e que, portanto, a extração das espécies da floresta precisa ser feita baseada na elaboração de planos de manejo de modo a ser o menos danosa e predatória possível. Abaixo são listados alguns exemplares da flora nativa que já tem sido utilizados na fabricação de cosméticos ou tem apresentado potencial para tal: • Açaí: seu uso foi objeto da tese de mestrado de Gracilene Barros dos Santos em Ciências Farmacêuticas (na Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)), sob a orientação do professor Fábio de Sousa Menezes. Foram comprovadas propriedades antioxidantes e antimicrobianas que podem ser utilizadas em produtos contra o envelhecimento da pele e para prevenção de infecções dermatológicas. • Água de Cheiro: A empresa CHAMMA DA AMAZÔNIA desenvolveu o Banho de Chamma, com raiz de priprioca. O “cheiro” é uma mistura de cascas de árvores e raízes, que são raladas e depois dosadas de acordo com o aroma de cada uma. As raízes utilizadas são: o patchuli e a priprioca. As cascas são de Macacaporanga, Casca Preciosa, Mucuracaá, Cipó Catinga, Japana, XXVI Reunião Anual sobre Evolução, Sistemática e Ecologia Micromoleculares Instituto de Química, Universidade Federal Fluminense, 1 a 3 de dezembro de 2004 Mangerona, Catinga de Mulata, Trevo Mangericão, Pataqueira, Cumarú, Oriza. • Aperta-Ruão: A empresa SIAMA ECO ESSÊNCIAS DA AMAZÔNIA procura parceiros para produzir em escala industrial e comercializar o remédio fitoterápico “Dermo Dilapiol” (extraído do arbusto Aperta-Ruão), planta endêmica em toda a Amazônia. O remédio foi desenvolvido e testado nos laboratórios do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA), sendo que os testes em animais apresentaram resultados animadores no combate a caspas, seborréias, frieiras, impinges e vários tipos de micoses. A fórmula (pertencente a Robert Mause, pesquisador e diretor da SIAMA), já está registrada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). • Buriti: devido à sua composição graxa, o óleo de buriti possui propriedades emolientes, que proporcionam maciez e um toque sedoso à pele. • Guaraná: em produtos para o corpo, o extrato de guaraná é usado por suas propriedades adstringentes e tonificantes, promovendo sensação de vigor durante e depois do banho. • Juazeiro: pesquisado pelo Laboratório de Tecnologia Farmacêutica (LTF), da Universidade Federal da Paraíba. O estudo químico do extrado hidroalcoólico levou ao isolamento e identificação do ácido betulínico, do ácido oleanólico e de uma saponina (substancia com usos em xampus e medicamentos). • Macela do Campo: o extrato de macela possui flavonóides e óleos essenciais que atuam como antiinflamatório e anti-séptico, protegendo o couro cabeludo. • Manteiga de Cupuaçu: triglicerídeo extraído das sementes do cupuaçu apresenta excelente capacidade de absorção de água (estabiliza emulsões e auxilia nas propriedades de hidratação) e um certo grau de absorção de raios UV. Tem sido utilizada em xampus, condicionadores, cremes para pele, batons e cremes dermatológicos. Entre os países que a importam para uso cosmético, estão a Inglaterra, Estados Unidos, Polônia, Japão e Chile. • Mulateiro da Várzea: contém fenóis com forte potencial antioxidante que impedem o envelhecimento das células ao deter a ação dos radicais livres.O princípio ativo foi isolado por pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (UNESP) que estudavam cerca de 1.200 espécies vegetais nativas do cerrado e de florestas tropicais. A empresa PRONATUS (do Centro de Incubação e Desenvolvimento Empresarial (CIDE) da Amazônia.) pesquisa os efeitos desta planta e já tem a comprovação de que ela protege efetivamente dos raios solares, estimula o crescimento do cabelo, suaviza rugas de expressão e clareia manchas de pele. • Óleo de Andiroba: Com propriedades emolientes, deixa a pele macia e lisa. Entre os vários produtos cosméticos que o utilizam, destacam-se produtos para o banho e loções repelentes de insetos. Na França, ele é utilizado em loções para celulite. • Óleo de Babaçu: rico na cadeia graxa láurica, é largamente utilizado em todo o mundo na geração de tensoativos para uso cosmético e industrial. É uma excelente alternativa para os óleos minerais quando se quer formular exclusivamente com produtos vegetais. É fácil de emulsionar e tem odor e cor facilmente mascarados nas formulações. Além de sabonetes, destacam-se produtos para cabelos e óleos bronzeadores entre os produtos finais que o utilizam. • Óleo de Buriti: O buriti é a maior fonte natural conhecida de carotenóides (próVitamina A) que tem propriedades protetoras para a pele. Estudos adicionais demonstram que o óleo também é muito útil para o cuidado dos cabelos, especialmente os danificados. O uso do óleo em condicionadores pode ajudar a recuperar a força e maleabilidade dos fios. Utilizado em produtos solares, pré e pós-solares e maquilagens. • Óleo de Castanha do Brasil (Brazil Nut Oil): obtido através da prensagem das amêndoas, contém fitoesteróis e ácido linolêico na sua composição graxa. Excelente para a pele, protegendo-a da perda transepidérmica de água e melhorando a hidratação superficial. Utilizados nos mais diversos produtos cosméticos para pele e cabelo • Óleo de Maracujá: A análise da distribuição de ácidos graxos do óleo de maracujá mostra aproximadamente 77% de ácido linolêico, normalmente presente na pele humana (e que se perde com o uso de sabonetes) e importante fator o equilíbrio hidro-lipídico da mesma. A presença de bioflavonóides o torna um ótimo emoliente para pele e couro cabeludo. Tem sido XXVI Reunião Anual sobre Evolução, Sistemática e Ecologia Micromoleculares Instituto de Química, Universidade Federal Fluminense, 1 a 3 de dezembro de 2004 utilizado em óleos de banho, xampus e sabonetes. • Pau Rosa : É da madeira desta árvore que é extraída a mais cobiçada substância da indústria de fragrâncias, o linalol, óleo que serve como matéria-prima para a fabricação do famoso perfume francês Chanel nº 5 (em conjunto com outras fragrâncias). Como a arvore encontra-se em extinção, tem sido pesquisadas alternativas à sua exploração. • Pitanga: com propriedades adstringentes devido a seu teor de taninos, o extrato de pitanga ajuda a controlar a oleosidade do cabelo. Sua composição é rica em vitaminas e alfa-hidroxiácidos, o que ajuda a recuperar a vitalidade dos fios, deixando o cabelo com aspecto natural e saudável. • Urucum: Desde 1995, os índios iauanauá são fornecedores exclusivos de urucum para a AVEDA (empresa de cosméticos naturais dos Estados Unidos, comprada pela francesa ESTÉE LAUDER). O urucum iauanauá é usado na fabricação de um batom especial, vendido na Europa e nos Estados Unidos como produto genuinamente natural e de alta qualidade, enquanto o pó do urucum está sendo testado num tipo específico de condicionador de cabelo. 3. Exemplos de sucesso de empresas brasileiras no uso da biodiversidade para pesquisa de novas moléculas e fabricação de produtos cosméticos • Chamma da Amazônia: O comerciante libanês Oscar Chamma criou a Casa Chamma nos anos 50, desenvolvendo perfumes e cosméticos derivados de produtos da Amazônia, como o patchuli, a priprioca e a alfazema. Anos depois, após diversos reveses, a sua filha conclui que o ingresso numa Incubadora de Empresas seria a melhor forma de recuperar a marca CHAMMA. A empresaria participou de eventos do setor, analisou o mercado e as possibilidades dos produtos e obteve recursos junto à Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP). A pequena casa de cosméticos cresceu a partir de 1996, participando do Programa de Incubação de Base Tecnológica da Universidade Federal do Pará. Atualmente, a CHAMMA DA AMAZONIA dispõe de representações em várias capitais brasileiras e, em 2001, recebeu o Prêmio FINEP como a melhor empresa da Região Norte do País e as colônias "Banho de Cheiro" (inspiradas na tradição do povo paraense em colher ervas e preparar um banho aromático) foram consideradas os melhores produtos pela FINEP. Outro diferencial da empresa é o incentivo ao trabalho de famílias ribeirinhas, que produzem as embalagens feitas da palmeira Miriti. A CHAMMA DA AMAZONIA também envolve artesãos na confecção de uma linha de acessórios (as "biojóias" são feitas de sementes não germinadas de Açaí, Bacaba, Morototó, Inajá, Tucumã e outras). • Leite de rosas: o seringalista amazonense Francisco Olympio de Oliveira mudou-se para o Rio de Janeiro disposto a criar um produto para a preservação da beleza feminina. Um amigo farmacêutico ajudou-o no desenvolvimento de uma fórmula que foi batizada como “Leite de Rosas”. Em sua própria casa, somente auxiliado pela esposa, produziu e envasou as primeiras unidades do produto. O primeiro registro, datado de 1929, conferiu à empresa "F. O. de Oliveira", o direito de produzir e comercializar o “Leite de Rosas”. Na década de 30 a empresa, de forma inovadora, passou a divulgar o produto através de meios de comunicação até então pouco explorados: cartazes de propaganda nos postes das ruas, anúncios no rádio e presença constante nas revistas mais famosas da época, patrocinando grandes eventos artísticos e introduzindo o conceito de grandes promoções para os consumidores no país. A marca “Leite de Rosas” acabou se tornando sinônimo de glamour e sucesso. O “Leite de Rosas”, no mercado há 75 anos, é uma das marcas mais tradicionais do Brasil. O desenho do produto encontrado na embalagem plástica (produzida na própria empresa) e registrado como marca no INPI tem sido motivo de cópia por várias concorrentes. • Perfumarias Phebo S/A: Em 1930 o português Mário Santiago e seu primo Antonio criaram um sabonete transparente, à base de glicerina, comparável ao Pear´s Soap (sabonete inglês de grande aceitação na época). Foram pesquisadas diversas essências naturais da região até chegarem a uma mistura que combinava óleo de paurosa com 145 essências distintas (sândalo, XXVI Reunião Anual sobre Evolução, Sistemática e Ecologia Micromoleculares Instituto de Química, Universidade Federal Fluminense, 1 a 3 de dezembro de 2004 cravo-da-índia, canela-de Madagascar entre outras). No início, as dificuldades eram grandes. O sabonete Phebo viajava de navio para o Rio de Janeiro e São Paulo, onde era oferecido em consignação, a comerciantes que não tinham muito interesse em comprar um sabonete que custava cinco vezes mais que os sabonetes nacionais da época. Hoje, a Perfumarias Phebo S/A é uma das maiores fabricantes de produtos de perfumaria do Brasil, emprega cerca de 1800 funcionários, com faturamento da ordem de US$ 80 milhões. Em 1988 a marca Phebo foi vendida para o grupo Procter & Gamble do Brasil, e em 1998 para a Sara Lee DE / Household & Bodycare do Brasil Ltda. Hoje os sabonetes Phebo são fabricados em Belém do Pará, pela Casa Granado Laboratórios, Farmácias e Drogarias Ltda. para a atual detentora da marca. Embora, na década de 80, tenham sido lançados os novos perfumes Patchouly, Naturelle e Amazonian, com a mesma base e formulação original. o sabonete Phebo Odor de Rosas continua sendo o principal produto da empresa. • NATURA: começou com uma pequena loja em São Paulo no ano de 1969 e no final dos anos 70 já havia se tornado uma empresa viável. Na década de 80, a NATURA se consolidou como um dos maiores complexos nacionais de produção e distribuição de cosméticos, competindo com marcas multinacionais de longa tradição no mercado brasileiro. Uma expansão alicerçada por três fundamentos: investimento em tecnologia; qualidade e criação de novos produtos, e ágil esquema de distribuição por meio de venda pessoal. A NATURA se vê constantemente obrigada a atender um ritmo acelerado de lançamento de produtos que possam renovar a linha existente, buscando inovar e surpreender os consumidores e , para tal, conta com um quadro de 350 profissionais ligados a vicepresidência de inovação. Sua linha conta com mais de 400 itens e a cada três dias um novo produto é lançado. Dados publicados pela empresa revelam que 4% de sua renda líquida é aplicado em seu centro de pesquisa e desenvolvimento de cosméticos, considerado o maior do Brasil. Através de intercâmbio sistemático com outros centros de excelência em todo o mundo, a empresa se mantém ligada aos principais avanços nas áreas farmacêutica, química e bioquímica. Em 1996, 40% do faturamento foi obtido com produtos que não existiam dois anos antes. A empresa ganhou por 4 anos consecutivos (de 1995 a 1998) o titulo de melhor empresa brasileira do setor (pela publicação “Melhores e Maiores da Exame”). A NATURA adota, atualmente, o conceito de “Cosmética Terapêutica” que pode ser traduzido como “preservação da saúde e da beleza do corpo, através da utilização de produtos baseados em princípios ativos naturais e tratamentos coordenados”. Em maio de 2004, a NATURA colocou a venda (através da BOVESPA) 18,582 milhões de ações ordinárias (com direito a voto), que representam 21,75% do capital da empresa. A procura pelas ações superou em 10 vezes a oferta. O sucesso da operação foi assegurado pelo interesse dos investidores estrangeiros e de pessoas físicas locais. Os investidores estrangeiros levaram a maior fatia dos papéis: 70%, sendo 40% para americanos e 30% para europeus. Mais de 4,8 mil investidores individuais brasileiros ficaram com 17% da oferta, quase chegando ao limite de 20% que havia sido reservado a eles. Até poucos anos atrás, o investimento da empresa era voltado para a síntese de produtos cosméticos e tradicionais (vitaminas e ácidos). O recente investimento no conhecimento das propriedades dos produtos da biodiversidade brasileira teve, como principal retorno, o sucesso da linha NATURA EKOS, composta com ingredientes da flora brasileira. Essa linha, lançada em agosto de 2000, representa, atualmente, 10% do faturamento da empresa. Os itens seguintes são dedicados a linha de cosméticos EKOS da NATURA: • criada a partir da pesquisa entre as plantas dos diversos ecossistemas do país. • as fórmulas contêm guaraná, andiroba, buriti, maracujá, castanha-do-pará, macela do campo, pitanga e cupuaçu. • extraídos das matas, campos e cerrados brasileiros, os ativos da linha provêm de áreas de cultivo e reservas extrativistas registradas no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). • para lança-la, a empresa fez um investimento na ordem de R$ 11 milhões em XXVI Reunião Anual sobre Evolução, Sistemática e Ecologia Micromoleculares Instituto de Química, Universidade Federal Fluminense, 1 a 3 de dezembro de 2004 pesquisa, desenvolvimento e esforços de marketing. • Entre os produtos da linha EKOS destacam-se loções pós-barba (à base de óleo de copaíba e mentol, apresentam efeitos adstringente, refrescante e cicatrizante); condicionadores de cabelos (à base de açaí, retiram a oleosidade excessiva); águas de colônia (com raiz de patchouli e fixador nativo da Amazônia); desodorante corporal (com raiz de priprioca e semente de cumaru) e xampus (com andiroba, para dar maior elasticidade aos fios e camu camu, para dar maior brilho a cabelos danificados). • Os produtos têm propriedades comprovadas em laboratório - e às vezes superiores às dos produtos que dominam o mercado. É o caso, por exemplo, da manteiga de cupuaçu, um dos melhores hidratantes naturais conhecidos, que e extraída da semente da fruta, dispensando qualquer processamento químico. • EXTRACTA MOLÉCULAS NATURAIS: A empresa EXTRACTA, que tem como diretor geral o Prof. Antonio Paes de Carvalho, tem como objetivos acessar, catalogar e analisar a grande variedade de esqueletos químicos derivados de produtos naturais da Biodiversidade brasileira. Empresa de P&D, com relações estreitas com a comunidade científica se propõe a suprir a indústria farmacêutica e agroquímica com tecnologia que irá promover o desenvolvimento de novos produtos inovadores, passíveis de proteção intelectual. A estratégia da empresa está centrada em duas atividades distintas. A primeira envolve a coleção e organização de uma biblioteca de produtos naturais que represente a diversidade química do país. A segunda é a disponibilização desta vasta coleção de moléculas a empresas com alvos biológicos definidos, através da triagem de atividade biológica em alta velocidade no primeiro sistema robotizado de alta velocidade da América Latina. O Banco Extracta de Diversidade Química é uma coleção de extratos e compostos naturais puros, isolados de plantas que compõem a Biodiversidade dos vários ecossistemas do Brasil e da América Latina. Funciona como uma estrutura aberta ao depósito por parte da EXTRACTA ou outras instituições capacitadas, bem como cientistas da comunidade acadêmica. O deposito na coleção física de amostras acumuladas terá seu perfil químico e biológico estabelecidos, e será associado a um banco de dados que propicie um estudo sistemático e científico da biodiversidade brasileira com ênfase na busca de novos agentes terapêuticos. A EXTRACTA também propõe uma nova mentalidade de parceria com a comunidade científica, reconhecendo o valor por ela agregado em suas descobertas e invenções, e proporcionando mecanismos de interação das diversas áreas de conhecimento científico para o desenvolvimento de novos fármacos. O principal contrato já obtido pela EXTRACTA for firmado com a farmacêutica GLAXOSMITHKLINE. Depois de três anos de pesquisas, a empresa entregou dez moléculas isoladas a partir da sua coleção e o contrato inclui participação nas vendas caso as moléculas levem a novos medicamentos. Em abril de 2004, o grupo ULTRA (através da empresa OXITENO) deu um passo surpreendente na direção de uma maior diversificação dos seus negócios ao investir R$ 1,5 milhão na EXTRACTA. Conclusões Alguns cuidados devem ser tomados quando se utiliza as classificações CNAE (para o caso de empresas multiproduto ou empresas multiplantas) e NCM (alguns produtos, tais como sabonetes, alguns insumos e embalagens não estão inseridos como cosméticos. A crescente tendência para os produtos cosmecêuticos, alem de criar novos segmentos de mercados, intensifica a importância dos fatores tecnológicos nos padrões de produção e de competição do setor e a necessidade do rigor na regulamentação. A imensa biodiversidade brasileira, com todo seu potencial terapêutico (inclusive no setor cosmético), pode ser plenamente utilizada como fator de geração de vantagem competitiva para empresas brasileiras nos mercados nacional e internacional. A manutenção de uma parcela leal de mercado para empresas tradicionais no uso do conhecimento popular e produtos da flora nativa, bem como, o surgimento de empresas inovadoras bem-sucedidas no segmento, demonstra a existência de um mercado XXVI Reunião Anual sobre Evolução, Sistemática e Ecologia Micromoleculares Instituto de Química, Universidade Federal Fluminense, 1 a 3 de dezembro de 2004 consumidor disposto a adquirir produtos diferenciados em cosmética. Embora ainda tímidas, as iniciativas de empresas de caráter inovador na pesquisa e uso das plantas brasileiras, tem se mostrado animadoras como uma fonte de negócios a ser explorada. No segmento da cosmeceutica, como no setor de cosméticos como um todo (da mesma forma que em diversos outros setores da industria brasileira) as interações com os setores acadêmicos e o apoio/fomento (inclusive de natureza regulatoria) das instituições governamentais são partes essenciais para o desenvolvimento das empresas nacionais. Oliveira, A. C. 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