Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS: UM ESTUDO SOCIOLINGUÍSTICO SOBRE O CONTATO LINGUÍSTICO EM SANTO ANTÔNIO DO SUDOESTE/BRASIL Ana Maria Bonk MASSAROLLO1 Sanimar BUSSE2 RESUMO: Este trabalho tem o objetivo de apresentar uma análise preliminar do estudo sobre o contato linguístico na fronteira Brasil/Argentina, especificamente, nas cidades de Santo Antonio do Sudoeste – Paraná, Brasil, e San Antonio – Misiones, Argentina. A partir dos dados sobre crenças e atitudes linguísticas coletados em Santo Antonio do Sudoeste para o Projeto Crenças e Atitudes Linguísticas: um estudo da relação do português com línguas em contato (AGUILERA; SELLA, 2009), pretende-se identificar o posicionamento do falante diante das línguas e culturas em contato e desenvolver algumas discussões e análises iniciais da pesquisa de Mestrado, do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras, Mestrado e Doutorado, da Unioeste, sobre a fala nas duas localidades. As análises tomam como referência o fato de as crenças e as atitudes poderem explicar as mudanças linguísticas em uma sociedade (CANALÍS & REY, 2006). Santo Antônio do Sudoeste está localizado na região sudoeste do Paraná e faz fronteira com San Antonio Provincia de Misiones – Argentina. Dois mundos de ninguém, como eram conhecidas na região as duas cidades, no início do século XX. As respostas e os comentários serão analisados com o objetivo de identificar quais fatores podem ser descritos como condicionadores dos fenômenos linguísticos e em que direção os componentes cognoscitivos, afetivos e conativos podem ser tomados como categorias que orientam os fenômenos de conservação e inovação linguística da fala. PALAVRAS-CHAVE: Sociolinguística; Contato Linguístico; Crenças e Atitudes. RESUMEN: Este trabajo tiene como objetivo presentar un análisis preliminar del estudio de lenguas en contacto en el Brasil / Argentina, específicamente en las ciudades del suroeste de Santo Antônio - Paraná, Brasil, y San Antonio - Misiones, Argentina. A partir de los datos sobre Creencias y Actitudes Linguísticas reunidos en Santo Antonio do Sudoeste para el proyecto Creencias y Actitudes Linguísticas: un estudio de la relación del portugués con lenguas en contacto (Aguilera, SELLA, 2009), tiene como objetivo identificar el posicionamiento del hablante hacia lenguas y culturas en contacto y desarrollar debates y un análisis iniciales del programa de investigación a nivel de Maestría de estudios de postgrado en Literatura, Maestría y Doctorado, de Unioeste, sobre el habla de los dos lugares. Los análisis toman como referencia el hecho de que las creencias y actitudes pueden explicar los cambios linguísticos de una sociedad (CANALÍS & REY, 2006). Santo Antônio do Sudoeste se encuentra en la región del sudoeste del Paraná y hace frontera con San Antonio Provincia de Misiones - Argentina. Dos mundos de nadie, como se les conocía en la región de las dos ciudades a principios del siglo XX. Las respuestas y los comentarios serán analizados con el Mestranda da UNIOESTE, do Programa Pós-Graduação Stricto Sensu – Mestrado e Doutorado em Letras, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste - campus de Cascavel – PR. 2 Professora Doutora do Curso de Letras e do Programa Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado e Doutorado em Letras, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste - campus de Cascavel – PR. Bolsista CAPES/PIBID. 1 1 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 fin de identificar los factores que puede ser descrito como el acondicionamiento de los fenómenos lingüísticos y en qué dirección lo cognitivo componentes, afectivo y conativo, puede tomarse como categorías guía de los fenómenos de conservación y innovación linguística del habla. PALABRAS CLAVE: Sociolinguística; Contacto lingüístico; Creencias y Actitudes. 1 Introdução Este trabalho tem o objetivo de apresentar resultados preliminares do estudo sobre contato linguístico na fronteira Brasil/Argentina, especificamente, nas cidades de Santo Antonio do Sudoeste – Paraná, Brasil, e San Antonio – Misiones, Argentina. Pretende-se, a partir da descrição e análise dos dados que revelam o posicionamento do falante diante das diferentes línguas e culturas presentes na localidade, identificar as crenças e atitudes dos falantes da comunidade. Os dados analisados foram retirados do projeto Crenças e Atitudes Linguísticas: um estudo da relação do português com línguas em contato (AGUILERA; SELLA, 2009). A consciência a respeito da diversidade linguística da comunidade, do contato entre culturas, línguas e diferentes falares, é determinada pelo prestígio que as variantes assumem na localidade. Por ser uma região de fronteira, e Santo Antonio do Sudoeste fazer divisa com Argentina, foi necessário levantar informações sobre a formação histórica da localidade. Esse estudo não pode estar desvinculado da dimensão histórico-social da linguagem, considerandose que é no âmbito do grupo social que as variantes são disseminadas ou ficam confinadas, conforme destaca Labov (1976). Segundo o autor, pressões sociais são exercidas constantemente sobre a língua, não de qualquer ponto de distância passada, mas são sob forma de uma força social imanente e presentemente ativa. Heye (1986; 2003) trata os estudos sobre bilinguismo como um fenômeno relativo, levando em consideração alguns fatores que são responsáveis pela caracterização de situações bilíngues: a comunidade linguística, o status dos falantes e das línguas, os papéis e as funções sociais, o tópico referente ao domínio linguístico e social, assim como as condições linguísticas, formais ou informais, e culturais em que o bilinguismo se desenvolve. Verifica-se, claramente, que as vivências e experiências culturais e históricas, não só exploram os recursos linguisticamente disponíveis para a formação de novos itens lexicais da língua em contato, como também criam e recriam novas palavras, inserem expressões linguísticas, semânticas e pragmáticas de seus sentimentos, de suas origens sociogeográficas quando do falar interlinguístico. Nesse sentido, foram analisadas nesta esta pesquisa, de um universo de 48 perguntas do projeto Crenças e Atitudes Linguísticas: um estudo da relação do português com línguas em contato, as respostas para as questões: Qual é a língua mais bonita? Qual É a língua mais feia? Qual é a melhor língua? Qual é a pior língua? A análise focalizará as dimensões diassexual e diagenérica, com o objetivo de identificar os fatores que atuam mais diretamente sobre as crenças e atitudes linguísticas dos falantes do município de Santo Antonio Sudoeste PR. 2 Crenças e Atitudes Linguísticas As crenças e atitudes linguísticas podem ser tomadas como indicadores da relação que se estabelece entre língua, falante e sociedade. 2 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 Aguilera (2008) destaca que as crenças e atitudes linguísticas são um campo ainda pouco explorado, “embora a Sociolinguística insista na importância do estudo desse campo”. Os estudos sobre crenças e atitudes linguísticas, segundo Gómez Molina (1987), podem auxiliar na identificação dos elementos que atuam de forma ativa sobre as mudanças e alternância de línguas, os aspectos que são fatores decisivos na formação da consciência linguística e na explicação da competência dos falantes. Por meio da identificação das crenças e atitudes linguísticas, podem-se conhecer as reações subjetivas diante da língua e/ou línguas que usam os falantes e sua influência na aquisição de segundas línguas (GÓMEZ MOLINA, 1987, p. 25). Para uma descrição e análise dos dados coletados toma-se como necessário o estudo da relação entre língua e cultura na comunidade. No Brasil há mais de 200 línguas minoritárias3, entre elas indígenas, afro-brasileiras, de imigração e de hispano-falantes. As línguas nessas comunidades sofrem diversas ações que agem sobre a identidade linguística dos falantes. Para Moreno Fernández (1998), outras funções podem ser verificadas nas atitudes, elas também: Influenciam decisivamente os processos de variação e mudança linguística que se produzem nas comunidades de fala. Uma atitude favorável ou positiva pode fazer com que a mudança linguística se realize mais rapidamente, que em certos contextos predomine o uso de uma língua em detrimento de outra, que o ensino-aprendizagem de uma língua estrangeira seja mais eficaz, que certas variáveis linguísticas se confinem a contextos menos formais e outras predominem nos estilos mais monitorados. Uma atitude desfavorável ou negativa pode levar ao abandono de uma língua ou impedir a difusão de uma variável ou de uma mudança linguística. (MORENO FERNÁNDEZ, 1998, p. 179, tradução nossa)4. A partir das palavras de Fernández (1998) pressupõe-se que a atitude é uma conduta, uma reação ou resposta a um estímulo, isto é, a uma língua, uma situação ou características sociolinguísticas determinadas (tradução nossa). Ou seja, ao ouvir um indivíduo falar, já se identificam a sua origem e sua posição social. Para Lambert & Lambert (1972, p.93), existem três princípios que regem as crenças e suas consequentes atitudes sociais, são eles: (i) associação – princípio pelo qual se evita o contato com pessoas ou coisas que nos desagradem e nos aproximamos daqueles que nos trazem coisas agradáveis; (ii) transferência, pois transferimos nossas expectativas para determinados fins; e (iii) satisfação de necessidade, quando procuramos nos aproximar de pessoas que associamos a coisas agradáveis. Com os princípios propostos pelo pesquisador é possível perceber que os falantes de uma comunidade procuram se aproximar de coisas ou pessoas com as quais se identificam e pelas quais sentem empatia. 3 Para melhor compreensão do texto, podemos dizer que língua minoritária, é a língua falada por um grupo de pessoas num país que tem uma língua nacional diferente. 4 Influyen decisivamente en los procesos de variación y cambio lingüísticos que se producen en las comunidades de habla. Una actitud favorable o positiva puede hacer que un cambio lingüístico se cumpla más rapidamente, que en ciertos contextos predomine el uso de una lengua en detrimento de otra, que la enseñanza-aprendizaje de una lengua extranjera sea más eficaz, que ciertas variantes lingüísticas se confinen a los contextos menos formales y otras predominen en los estilos cuidados. Una actitud desfavorable o negativa puede llevar al abandono y el olvido de una lengua o impedir la difusión de una variante o un cambio lingüístico. (MORENO FERNÁNDEZ, 1998, p. 179). 3 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 Podemos afirmar, assim, que o falante possui crenças valorativas em relação ao mundo e, consequentemente, sua conduta será condizente com esse saber ou crença, uma vez que são estímulos reforçados pelo meio. As falas regionais são particularmente suscetíveis ao histórico da região, e isto é um determinante das relações socias exercidas pelos grupos presentes nas localidade. Segundo Orsi (2010), O modo em que uma atitude se desenvolve está imersso no contexto social, por tanto pre existe na sociedade um sistema de crenças, valores, costumes e normas compartilhadas. Assim, se adquirem durante o proceso de socialização, por meio do qual o indivíduo as internaliza. (ORSI, 2010, p.7). Segundo Lambert & Lambert (1966), uma atitude é uma maneira organizada e coerente de pensar, sentir e reagir em relação a pessoas, grupos, questões sociais ou, mais genericamente, a qualquer acontecimento ocorrido em nosso meio circundante. A consciência linguística a respeito da diversidade linguística da comunidade, do contato entre culturas, línguas e diferentes falares, é determinada pelo prestígio que as variantes assumem na localidade. Algo que se tem ou se demonstra, mas também é algo que se concede. O prestígio poderia ser definido como um processo de concessão de estima e respeito a indivíduos ou grupos que reúnem certas característias e que leva a imitação de condutas e crenças desses indivíduos ou grupos. (FERNÁNDEZ, 1998). A consciência a respeito da diversidade linguística da comunidade, do contato entre culturas, línguas e diferentes falares, é determinada pelo prestígio que as variantes assumem na localidade. O que ocorre é que em virtude de muitos fatores linguísticos e principalmente extralinguísticos5 línguas passam por uma classificação, onde ela é tida como a melhor ou pior, a mais feia ou a mais bonita, dando uma maior prestigio para uma língua do que a outra. 3 Línguas em Contato/Língua em Mudança Quando falamos sobre as condições de variação e mudança linguística, é necessário deixar claro em quais condições os fenômenos são possíveis e ocorrem. Para dar conta da descrição, avaliação e análise da mudança linguística e do comportamento linguístico de uma comunidade, deve-se dispor de dados que ofereçam um panorama detalhado da fala. Weinreich, Labov e Herzog, (2006) veem a transição, ou seja, a mudança de um estado da língua a outro, como um mistério: se uma língua tem de ser estruturada para funcionar, como as pessoas continuam falando enquanto a língua muda? Ainda segundo os autores, um mesmo falante usa ora uma forma, ora outra, sem se ater ao fato de que a língua (aquela categoria) está mudando. Nesse estágio de transição, uma forma alternativa passa a ser utilizada em alguns contextos, até ser primordial em todos e tornar a outra obsoleta. Buscamos, neste trabalho, identificar elementos representados nas crenças e as atitudes que possam atuar sobre as mudanças linguísticas, pois, ao passo que a língua muda, ou adquire novas formas, traz consigo novos elementos que são incorporados a esta nova 5 Os fatores extralinguísticos são fatores externos, que estão correlacionados ao uso de variantes nos diferentes níveis da língua. 4 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 língua, elementos estes que não podem deixar de serem estudados e analisados quando falamos em mudança da língua. Em uma comunidade de fronteira, como é o caso de Santo Antonio do Sudoeste/Brasil e San Antonio/Argentina, as variáveis são muitas, mas a pergunta é como estas duas comunidades convivem com as mudanças linguísticas? E, quais são os fatores que mais influenciam na ocorrência da mudança? Segundo os autores citados anteriormente, são os fatores linguísticos e sociais que irão dar respostas a muitas perguntas já feitas por vários estudiosos da língua, que já nos anos 50 e 60 despertaram o desejo de buscar respostas que a linguística Saussuriana não deu conta de responder, e que impulsionaram a criação da sociolinguística, que possibilitou novos olhares para o estudo da língua em transição. 4 Dados históricos das localidades O município Santo Antônio do Sudoeste está localizado na região sudoeste do Paraná, na fronteira com a Argentina. A localidade conta com 18. 912 habitantes, que residem na sede e em três distritos. Além de San Antonio (Misiones), na Argentina, Santo Antônio do Sudoeste tem como vizinhos municípios da região sudoeste: Ampere, Bom Jesus do Sul, Pinhal de São Bento, Pranchita e Salgado Filho. Os primeiros moradores a se instalarem na região, onde hoje se localiza o município de Santo Antônio do Sudoeste, foram Dom Lucca Ferera e João Romero, oriundos da vizinha República do Paraguai, ali chegados em 1902. Mari (2002), nos relatos históricos, informa que a primeira igreja da região foi construída na Argentina e que os brasileiros iam até San Antonio rezar nos domingos e dias santos. Segundo Mari, como não haviam escolas até terminar a década de 1920, muitos brasileiros foram alfabetizados pelos professores argentinos, aprendiam a língua espanhola, participavam dos eventos cívicos e culturais e até eram submetidos as leis daquele país para que pudessem continuar os estudos. Separados por um rio, brasileiros e argentinos compartilham histórias de lutas e conquistas. Unidos por laços de crenças, costumes e atitudes que nos levaram a identificar quais fatores atuam mais diretamente sobre as crenças e atitudes linguísticas dos falantes desta região. San Antonio é um municipio argentino da provincia de Misiones, situado dentro do departamento de General Manuel Belgrano. Seitua-se a 26° 03' Lat. Sul e a 53° 43' Lat. Oeste. O município conta com uma população de 8.331 habitantes (Censo 2001 INDEC). Seu patrono é San Antonio de Padua. San Antonio, que na atualidade conta com aproximadamente 12.000 habitantes, como outros povos da região, teve sua origem na exploração da erva mate. Os ervateiros naturais de San Antonio, foram descobertos em parte pelo explorador italiano Carlos Boseti no final do século pasado e por sua importância desde o ponto de vista econômico refletiu na Regulamentação no ano de 1903. A criação e posterior surgimiento de San Antonio, data aproximadamente de 1906, quando chega à zona Lucas Ferreyra, paraguaio, que havía conhecido lugares em oportunidades de ser integrante como vaqueano, da comissão encarregada de fixar os limites entre Argentina e Brasil. As mencionadas comissões davam cumprimento ao falho do presidente dos Estados Unidos Grover Cleveland que no ano de 1895 falho em laudo arbitral pela questão de limites, encontrando-se ambas sobre o canal do Rio San Antonio, eles concordaram que o local serviu como uma reunião e levaria o mesmo nome. O que a posterior, com o passar do tempo e dada a crise imobiliária foi dado o nome do lado argentino San Antonio e Santo Antonio do lado brasileiro. 5 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 San Antonio tem efeito como uma cidade, por volta de 1924-1925, quando se coloca o engenheiro Luis Paztoriza, colocando vários empreendimentos econômicos. Hoje, a única coisa que continua sendo o limite da fronteira para estas duas localidades é a ponte sobre o rio Santo Antônio e as aduanas dos dois lados dos países. 5 Análise e Discussão dos Dados Os dados analisados foram retirados do Projeto Crenças e Atitudes Linguísticas: um estudo da relação do português com línguas em contato, coordenado pela pesquisadora Vanderci de Andrade Aguilera, numa parceria entre pesquisadores das Universidades Estaduais do Oeste do Paraná/Unioeste, de Londrina/UEL, de Ponta Grossa/UEPG e de Maringá/UEM. Dentre os objetivos do projeto destacam-se a descrição e a análise de crenças e atitudes linguísticas dos falantes do português localizados em comunidades que registram contato linguístico no Estado do Paraná. Com base nas questões selecionadas retiradas das entrevistas do projeto, apresentamos, a seguir, uma análise preliminar das respostas registradas pelos informantes. No gráfico 01 apresentamos a resposta dos informantes do sexo masculino para a pergunta: Qual é a língua mais bonita? GRÁFICO 01 Grande parte dos informantes identifica o português como língua mais bonita. Nos comentários, podemos observar que a avaliação é orientada, muitas vezes, pelo conhecimento sobre a língua. No recorte A, o informante condiciona sua avaliação ao conhecimento da língua: A) “Não eu acho tudo (inint) bonita né, então depende assim como que é a maneira que eles fazem né (inint) mais feia, mas todas as (inint) são bonitas né... são a gente vai fundo pra estudar ganhar mais um poco né”. (Informante de 77 anos. Ensino Médio) A mesma postura é registrada em B, em que para o informante a mistura do espanhol e do português estaria relacionada à aprendizagem das línguas. Neste comentário podemos obsevar uma visão normatizante da língua, em que se desconsideram os dialetos e falares. 6 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 B) “Eu acho assim a língua espanhol é se ela fosse bem orientada pra ser falada aqui na nossa região acho que sim mais aqui o pessoal mistura muito fala o portunhol na mesma hora eles estão falando espanhol outra hora o português de volta”. (Informante de 41 anos. Ensino Fundamental) No comentário, a seguir, novamente reitera-se o conhecimento da língua como critérios para avaliar uma língua como feia ou bonita. C) “Acho feio ou bonito assim, se é feio ou bonito já desisti,tem que obter finalidades, entendendo basta né”. (Informante de 26 anos. Superior Completo) Em D e E, os informantes apenas identificam as línguas. O primeiro faz referência ao espanhol, enquanto o segundo registra o castelhano. Essa distinção pode ser tomada como indicativo da visão mais negativa do falante da fronteira, que apresenta em sua fala a mistura de elementos do espanhol e do português. D) “O espanhol é bonito, não é feio não”. (Informante de 51 anos. Ensino Primário) E) “O castelhano fala feio. Ah tem coisa que não dá nem para... é a língua mais feia. A mais bonita, o português, né.” (Informante de 21 anos. Ensino ?????) Na sequência, no gráfico 02, nas respostas das mulheres à pergunta sobre qual é a língua mais bonita, podemos observar uma sensibilidade maior das informantes para o contexto multilíngue da comunidade. Ao responderem que todas são bonitas, incluem, além do português, as outras línguas, como os dialetos do alemão e do italiano. Nesse contexto multilíngue, a separação do espanhol pode ser um indicador de que a presença de falantes da língua na comunidade é vista com certa distinção, também porque se trata de uma área de fronteira. GRÁFICO 02 A seguir, podemos observar em A, B e C apenas a identificação das línguas. A) “Todas as línguas são bonitas.” (Informante de 54 anos. Ensino Médio completo). 7 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 B) “Eu acho todas bonitas (risos).” (Informante de 17 anos. Ensino Médio). C) “Eu acho todos os idiomas bonitos. É a sua origem, eu não discrimino nenhum.” (Informante de 42 anos. Pós Graduada) Em D, também há a identificação das línguas, porém, justifica-se a avaliação a partir do conhecimento da língua. D) “O espanhol é uma língua difícil, mais eu gosto. E o italiano é bonito (risos) O alemão eu acho feio, porque eu não intendo nada o que falam em alemão nada, nada. Não sei nem...” (Informante de 30 anos. Terceiro grau completo) No comentário de E é explícita a necessidade de conhecer a língua para estabelecer um vínculo mais próximo. E) “O espanhol é maravilhoso, quero... já quero fazer um curso de espanhol, quero sim. O alemão é esquisito, na minha... eu acho. (risos) O italiano eu tamém acho muito lindo, gosto muito. O árabe também.” (Informante de 49 anos. Terceiro Grau Completo) Nas respostas para a questão qual é a língua mais feia, os informantes femininos e masculinos explicitam uma postura diferente diante da língua e dos falantes. Pois, enquanto os homens identificam as línguas mais feias, as mulheres não. Essa afirmação nos leva a crer que existem conotações nas respotas, atitudes e crenças que as levaram a dar tais respostas. Poderiamos então dizer que a variável sexo nos mostra aqui a existencia de atitudes diferentes dos homens e das mulheres em face ao comportamento social no que se refere a língua mais bonita ou mais feia, sendo que a língua é apenas um dos comportamentos sociais. No gráfico 03, nas respostas dos informantes do sexo masculino, as línguas identificadas como feias são aquelas faladas na comunidade e na área da fronteira com a Argentina. GRÁFICO 03 8 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 Nos comentários, a seguir, registram-se posicionamentos diferentes sobre as línguas presentes na comunidade dos falantes. Em A, a avaliação do informante sobre a língua mais feia está relacionada também ao conhecimento da língua. A) “Não eu acho tudo (inint) bonita né..., então depende assim como que é a maneira que eles fazem né (inint) mais feia, mas todas as (inint) são bonitas né... são a gente vai fundo pra estudar ganhar mais um poco né... A nossa né... A língua portuguesa né.., é a mais bonita. A mais feia eu falei, o alemão lógico, né...” (Informante de 77 anos. Ensino Médio) No recorte B, a questão está mais centrada na comunicação, no conhecimento da língua. B) “O alemão vou falar pra você que eu não entendo, então, às vezes pode até ser mais bonito que os outros, só que eu não entendo.” (Informante de 51 anos. Ensino Fundamental) A mesma postura é registrada em C. A postura do informante é mais incisiva, pois se trata de conhecimento da língua. C) “Acho feio ou bonito assim, se é feio ou bonito já desisti,tem que obter finalidades, entendendo basta né... Acho feio ou bonito assim, entendendo basta né...” (Informante de 26 anos. Ensino Superior Completo) Para a questão qual é a língua mais feia ou a mais bonita, os informantes inquiridos na localidade registraram que as melhores línguas são, além do português, a língua da fronteira, o espanhol argentino, e dos descendentes de imigrantes europeus.. Os informantes do sexo masculino, conforme gráfico a seguir, identificaram o espanhol/argentino e o italiano. Não houve menção ao português. GRÁFICO 04 9 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 As respostas dos informantes revelam outra postura diante da língua. Em A, trata-se apenas de identificar uma língua. Provavelmente a língua com a qual o informante tenha mais contato. A) “Ahh..., hoje, acho que sei lá... acho que é os argentinos.” (Informante de 77 anos. Ensino Médio) No comentário B, o informante não avalia a língua a partir do seu conhecimento somente, mas do que julga ser mais fácil de divulgar. B) “Eu diria que é os italiano. Porque é mais fácil de você divulgar ela. Eu acho que é o alemão, não é, que fala pior. É mais difícil de entender. Pra mim vai ser mais fraco. O castelhano eu entendo bem, não falo mas entendo. O alemão eu não entendo. Além de não falar não entendo também.” (Informante de 51 anos. Ensino Primário) Em C, além do conhecimento da língua, o informante registra a questão dos falares, como no português falado no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro, que podem comprometer a língua. C) “Eu não tenho assim conhecimento bem do espanhol, do italiano né. Tento um pouco mais da língua espanhola acho que pra mim falar me adapitaria melhor com o espanhol. Todos que o nosso português a gente não tinha hábitos diferentes pra falar né..., lá no Rio Grande lá eles tem uma formação então a gente acha que é erro, o do Rio de Janeiro por exemplo puxa mais um “s” né..., então acho que o português é bonito como é mal falado né...” (Informante de 41 anos. Ensino Fundamental) GRÁFICO 05 As mulheres, por sua vez, na sua grande maioria identificaram o português com a melhor língua falada na comunidade. Os dados indicam uma divisão nas opiniões: em que homens entendem que a melhor língua é o italiano, enquanto as mulheres destacam a língua portuguesa como sendo a melhor, apesar de afirmarem que não existe uma língua melhor que a outra. Nos comentários é possível observar uma visão mais normativa com relação à língua. Em A e B, a avaliação sobre recai sobre o contato do português com outras línguas. 10 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 A) “A eu sei lá, eu acho que cada um na tua língua fala bem, né... mais agente que não entende as outra acha que o brasileiro é mais bem falado. Quem fala pior, o que eu não entendo nada é de alemão, ...(inint) eu to falando é que é pra mim os alemão que falam pior, que é difícil, mais difícil de entender né.... Ah! quem fala o português, porque o italiano é pocos que sabe né... que intende mais o português. Os que falam o português, só o português, falam melhor, agora, aqueles que falam o misturado, ali falam... uma hora tão falano italiano outra hora o português, aí já falam meio embrulhado.” (Informante de 52 anos. Ensino Fundamental). B) “Fala melhor quem fala o Português com certeza. Também o português, por que os que têm aqui não sabem falar perfeitamente a língua certa.” (Informante de 54 anos. Ensino Médio completo). Por ser uma região de fronteira, e Santo Antonio do Sudoeste fazer divisa com Argentina, foi necessário apontar situações históricas relevantes. Esse estudo não pode estar desvinculado da dimensão histórico-social da linguagem, considerando-se que é no âmbito de um grupo social que as variantes são disseminadas ou ficam confinadas. Segundo Busse e Sella (2012, p. 78-79), o modo como se concebe o outro em seu cotidiano pode ser percebido a partir de ações e “representações” sociais e culturais da comunidade externadas pelo falante, pois, ao se tomar “a língua como um conjunto estruturado, no qual estão representadas as relações sociais e a organização dos grupos, reconhecemos que ela é determinada pelas condições de existência do homem no tempo e no espaço”. Por meio dos registros históricos e nas respostas dos informantes é possível identificar a presença de falantes descendentes de alemães e italianos, falantes de espanhol argentinos e paraguaios, que nos mostram um quadro linguístico representativo da formação históricocultural dessa região. 6 Considerações Finais Neste trabalho, foram apresentados resultados preliminares da pesquisa sobre crenças e atitudes linguísticas, com base no projeto Crenças e Atitudes Linguísticas: um estudo da relação do português com línguas em contato, coordenado pela pesquisadora Vanderci de Andrade Aguilera, em Santo Antonio do Sudoeste/PR. Nas respostas dos informantes sobre língua bonita, língua feia, língua melhor ou língua pior, foi possível observar e elaborar gráficos em que é possível constatar que existe uma dicotomia linguística entre homens e mulheres quando se refere aos falares linguísticos. As avaliações são produzidas a partir de crenças e atitudes sobre o outro, vinculadas geralmente a laços culturais e ao prestígio linguístico. Nos dados, a Língua Espanhola ou Castelhano, como é citada, aparece com uma perspectiva linguística favorável, com certo prestígio linguístico, enquanto que as línguas alemã e a italiana são avaliadas, sob alguns aspectos, negativamente. Esta avaliação hora é percebida como a língua utilizada pelos falantes e hora ela é avaliada pela postura do falante ou da sociedade. Fato muito importante para ser estudado no decorrer deste trabalho. Os dados reforçam ainda mais a necessidade de darmos continuidade à pesquisa, para buscarmos compreender quais fatores atuam mais diretamente sobre as crenças e atitudes linguísticas dos falantes nesta região de fronteira, que nos remetem a tais resultados. 11 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 Referências AGUILERA, V. de A. Crenças e atitudes linguística: um estudo do português com línguas de contato. 2009. BUSSE, Sanimar; SELLA, Aparecida Feola. Uma análise das crenças e atitudes linguísticas dos falantes do Oeste do Paraná. Revista Signum. Nº 15/1, 2012. Londrina: EDUEL, 2012. LABOV, William. Padrões Sociolinguísticos. Tradução Marcos Bagno, Maria Marta Pereira Scherre, Caroline Rodrigues Cardoso. São Paulo, Parábola Editorial, 2008. HEYE, J. Línguas em contato: considerações sobre bilinguismo e bilingualidade. In:RONCARATI, C.; BRAÇADO, J. (Orgs.). Português brasileiro: contato linguístico, heterogeneidade e história. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2003, p. 229-235. CALVET, Louis-Jean, Sociolinguística: uma introdução crítica. Tradução de Marcos Marcionilo. São Paulo: Parábola, 2002. FISHMAN, Joshua A. Handbook of language and ethnic identity. New York: Oxford University Press, 2001[1999]. GÓMEZ MOLINA, J. R. Actitudes lingüísticas en una comunidad bilíngüe y multidialectal: area metropolitana de Valencia. Anejo n.o XXVIII de la Revista Cuadernos de Filología. Valencia, Universitat de Valencia, 1998. GREGORY,Valdir. Os eurobrasileiros e o espaço colonial: migrações no oeste do Paraná (1940-70). Cascavel: Editora da Unioeste, 2002. LAMBERT, Willian e Wallace. O significado Social das atitudes. Capítulo 4. In: Psicologia Social. Tradução: Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1972, p. 76-106. LAMBERT, William W.; LAMBERT, Wallace E. Psicologia Social. Rio de Janeiro: ZAHAR, 1966. MARI; Marilce. No Silêncio da Fronteira. Riagraf. Santo Antonio do Sudoeste, 2002. MORENO FERNÁNDEZ, Francisco. Lengua, geografía y sociedad. In: JORNADAS DE LINGÜÍSTICA, 4, 1998, Alcalá de Henares. Anais... Alcalá de Henares: Universidad de Alcalá, 1998. p. 53-76. ORSI, Laura. Estereotipos y Actitudes: similitudes y diferencias. Universidad Nacional del Sur. 2008. WEINREICH, Uriel; LABOV, William; HERZOG, Marvin L. Fundamentos empíricos para uma teoria da mudança linguística. São Paulo: Parábola, 2006 [1968]. 12