Concepção do papel profissional do psicólogo na perspectiva de estudantes de Psicologia Área: Psicologia Pedro Augusto Crocce Carlotto * Nádia Kienen * Financiada pelo PUIC – Programa Unisul de Iniciação Científica – Curso de Psicologia – Campus Grande Florianópolis Introdução Pesquisas sobre a formação do psicólogo indicam deficiências que parecem dificultam a capacitação desse profissional. A opção pela área clínica, por parte dos estudantes de Psicologia, por exemplo, e a sua motivação para atuar nela eram predominantes entre os estudantes (CARVALHO E KAVANO, 1982; CAMPOS, LARGURA E JANKOVIC, 1999; MAGALHÃES, STRALIOTTO, KELLER E GOMES, 2001). Apesar dos esforços para incentivar os estudantes a optarem também por outras áreas de atuação (ou atuarem na clínica usando moldes e concepções de atuação diferentes das tradicionais), tendo em vista a constatação de saturação deste tipo de serviço (e de sua inadequação à realidade brasileira [MELO, 1996]) no mercado, há ainda insistência dos estudantes para atuar neste tipo de modalidade específica. Carvalho (1982) afirma que um dos fatores que influencia a concepção de atuação psicológica dos estudantes é a formação universitária, incluindo o contato com os professores, colegas, outros cursos e etc. Botomé (1988), ao refletir sobre a atuação psicológica, propõe que a multidisciplinaridade seja foco da profissão, bem como a necessidade de identificar e intervir sobre as demandas sociais (advindas de necessidades da população) e não meramente nas demandas mercadológicas (necessidades das empresas, do mercado de trabalho). O autor também afirma que é necessário que o psicólogo não atue apenas nos âmbitos de atuação de menor alcance social (curativo), mas também em âmbitos mais sofisticados e com maior alcance social (preventivo e no relativo à promoção de saúde). Com base neste contexto, houve a necessidade de pesquisa acerca da concepção dos estudantes sobre o papel profissional que o psicólogo tem frente à sociedade, baseando-se inclusive nas variáveis concepção do campo de atuação profissional, concepção de âmbitos de atuação do psicólogo, relação com as diferentes teorias psicológicas e com seus objetos de estudo – pouco investigadas nas pesquisas anteriores referentes à formação do psicólogo. Objetivos 4. Objetivos 4.1. Objetivo geral: Caracterizar a concepção do papel profissional do psicólogo para estudantes ingressantes e finalistas do curso de graduação em Psicologia de universidades públicas e privadas. 4.2. Objetivos específicos: a) Caracterizar a concepção de estudantes de fases iniciais do curso de graduação em Psicologia de Universidade Privada acerca do papel profissional do psicólogo; b) Caracterizar a concepção de estudantes de fases finais do curso de graduação em Psicologia de Universidade Privada a respeito do papel profissional do psicólogo; c) Caracterizar a concepção de estudantes de fases iniciais do curso de graduação em Psicologia de Universidade Pública acerca do papel profissional do psicólogo; d) Caracterizar a concepção de estudantes de fases finais do curso de graduação em Psicologia de Universidade Pública a respeito do papel profissional do psicólogo; e) Comparar as concepções de estudantes de fases iniciais e finais, de Universidades Públicas e Privadas, acerca do papel profissional do psicólogo. Metodologia Foram selecionados 92 estudantes de Psicologia (14 da segunda fase da Universidade Pública, e 23 das 9ª e 10ª fases desta mesma Universidade; 15 da segunda fase da Universidade Privada e 40 da 10ª fase desta mesma Universidade) para compor a população desta pesquisa. Cada estudante respondeu a um questionário contendo, em sua maioria, questões objetivas (total de 16 perguntas). Os dados foram tratados a partir de cálculo percentual ,dividindo o total de respostas para cada questão pelo número total de sujeitos da pesquisa (92), de acordo com a fase e com o tipo de Universidade (pública ou privada). Resultados 100 O mesmo fenômeno sob óticas diferentes 90 80 70 O mesmo fenômeno sob a mesma ótica 60 Fenômenos diferentes sob óticas diferentes 50 40 Fenômenos diferentes sob a mesma ótica 30 20 Outra 10 0 2ª fase 9ª e 10ª fases UNIVERSIDADE PÚBLICA 2ª fase 10ª fase UNIVERSIDADE PRIVADA Figura 1 – Distribuição do percentual de estudantes pela concepção deles acerca dos objetos de estudo das diferentes teorias em Psicologia, por fases e por tipo de universidade. É possível verificar que 63% dos estudantes afirmam que as diferentes teorias estudam os mesmos fenômenos psicológicos. Trinta e quatro por cento deles afirmam que cada teoria em Psicologia estuda um tipo de fenômeno psicológico específico. Bock, Furtado e Teixeira (1999) afirmam que cada teoria em Psicologia estuda um objeto de estudo específico. Os estudantes parecem afirmar diferentemente desta concepção. A sua maioria afirma que as diferentes teorias em Psicologia, ainda que sob óticas e pressupostos teóricos diferentes, estudam os mesmos fenômenos psicológicos. Este percentual, pelo que parece, aumenta entre estudantes de décima fase (de ambas as Universidades) e é maior na Universidade Privada (principalmente na décima fase) do que na Universidade Pública. Uma parcela pouco menor afirma que as diferentes teorias estudam fenômenos diferentes, posição defendida por Bock, Furtado e Teixeira (1999). Este percentual não aumenta de forma significativa das segundas para as décimas fases pesquisadas e é maior na Universidade Pública. 100 90 Curativo 80 70 Promoção de saúde 60 Manutenção de estados de saúde 50 40 Prevenção de fenômenos perturbadores à saúde psíquica 30 20 Não cita âmbitos, mas sim atividades ou contextos 10 0 2ª fase 9ª e 10ª fases UNIVERSIDADE PÚBLICA 2ª fase 10ª fase Âmbito varia de acordo com certas variáveis UNIVERSIDADE PRIVADA Figura 2 - Distribuição do porcentual de estudantes pelas suas afirmativas a respeito dos âmbitos de atuação nos quais hoje o psicólogo atua, por fases e por tipo de universidade. A maioria (88%) deles afirma que hoje o psicólogo foca sua atuação no âmbito da promoção de saúde; 31,5% afirmam que o âmbito focado, atualmente, pelo trabalho do psicólogo é o da prevenção de fenômenos psíquicos psicopatológicos. Dezessete por cento apontam o âmbito curativo como sendo o foco do trabalho do psicólogo nos dias de hoje, e 12%, o da manutenção de um estado ótimo de saúde psíquica. É possível verificar que, na atualidade, pelo que parece, os estudantes parecem estar cônscios da necessidade de o psicólogo sair do âmbito meramente curativo (compensação de danos, recuperação de organismos lesados, atenuação de sofrimento psíquico), como colocava Botomé (1988), e adotar outros âmbitos também para sua prática profissional. Os âmbitos mais citados pelos estudantes conferem com os propostos por Botomé (1988) como sendo necessários à profissão: o da prevenção de fenômenos psicopatológicos (impedir a sua ocorrência) e o da promoção de saúde psíquica (aperfeiçoamento de comportamentos já saudáveis e promoção de processos psíquicos saudáveis). É possível perceber que o percentual de afirmações relativas ao âmbito da prevenção de fenômenos psicopatológicos é maior na Universidade Privada, principalmente na décima fase. O percentual referente à promoção de saúde é encontrado com freqüências parecidas em ambas as Universidades, tendendo a aumentar das segundas para as décimas fases. Conclusões Pode-se concluir que os estudantes parecem cônscios da necessidade da postura científica na profissão do psicólogo (seja em qual área de atuação for), da importância da pesquisa científica para a profissão e vice-versa, da necessidade de atuar em âmbitos de atuação mais sofisticados e da complementaridade que as diferentes teorias em Psicologia trazem para a Psicologia como ciência. No entanto, pode-se ressaltar que os estudantes carecem de uma concepção de atuação psicológica de forma mais empreendedora, ou seja, de atuar com segurança ao completar sua graduação em diferentes áreas, contextos e situações que requerem intervenção psicológica. É necessário que seja mais enfatizada a importância da pesquisa científica na formação do psicólogo (nos moldes propostos por Felippe [1993], que afirma que a profissão de psicólogo tem caráter investigativo) e da generalização dos conhecimentos aprendidos a outras situações e contextos de atuação profissional, bem como a identificação de necessidades sociais nas quais o psicólogo possa estar intervindo (e não apenas na repetição de formas de atuação já conhecidas ou postas pelo mercado de trabalho). Há excessiva ênfase dos estudantes pesquisados na necessidade de formações extracurriculares e no empreendedorismo como derivado de características pessoais dos estudantes (motivação, força de vontade, iniciativa em correr atrás de novos conhecimentos ou em empreender na profissão, etc.). Botomé e Rebelatto (1999) afirmam que a capacidade de atuar de tal maneira não depende somente dos estudantes em si, mas também da Universidade, que deve resguardar seu papel como centro de ensino superior e fornecer aos estudantes condições não apenas para atuarem de tal forma, mas também incentivando-os a descobrir novas possibilidades de atuação profissional. É possível perceber que, de um modo geral, não há grande diferença entre os estudantes pesquisados, com exceção no que se refere a Referências Bibliográficas: 1. BOCK, A.M.B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M.L.T.. Psicologias: uma introdução ao estudo de Psicologia, 13ª ed. ref. e amp.. São Paulo: Saraiva, 1999. 2. BOTOMÉ, Silvio Paulo. Em busca de perspectivas para a Psicologia como área de conhecimento e como campo profissional. In: Quem é o Psicólogo Brasileiro? Conselho Federal de Psicologia. São Paulo: EDICON, 1988. 3. BOTOMÉ, Silvio Paulo; REBELATTO, José Rubens.. Fisioterapia: possibilidades de redefinição da atuação profissional em relação ao objeto de trabalho, ao conhecimento e ao ensino superior. In: Fisioterapia no Brasil: fundamentos para uma ação preventina e perspectivas profissionais, 2ª ed. São Paulo: Manole, 1999. 4. CAMPOS, L.F.L.; LARGURA, W.A.N.; JANKOVIC, A.L.. Efeito da graduação em Psicologia nas escolhas profissionais de seus estudantes. In: PSICO, Porto Alegre, v.30, n.2, p.29-44, jul/dez 1999. 5. CARVALHO, A.M.A.; KAVANO, E.A.. Justificativas de opção por área de trabalho em Psicologia: uma análise da imagem da profissão em psicólogos recém-formados. In: Psicologia, 1982, 8(3), p.1-18. 6. CARVALHO, A.M.A.. A profissão em perspectiva. In: Psicologia, 1982, 8(2), p.5-17. FELIPPE, Wanderley Chieppe. O psicólogo e sua formação profissional. In: Cad. Psicol. Belo Horizonte, vol.1, n.2, p.93-98, dez/93. 7. FELIPPE, Wanderley Chieppe. O psicólogo e sua formação profissional. In: Cad. Psicol., Belo Horizonte, vol.1, n.2, p.93-98, dez/93. 8. MAGALHÃES, M.; STRALIOTTO, M.; KELLER, M., GOMES, W. B. Eu quero ajudar as pessoas: a escolha vocacional da Psicologia. Psicologia ciência profissão (online). Junho 2001, vol. 21, nº 2, p. 10-27, 22 de Abril de 2007. Disponível em: < http://scielo.bvspsi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932001000200003&lng=pt&nrm=iso >. Acesso em: 13 de Setembro de 2008. 9. MELO, Silvia Leser de. A formação do psicólogo. In: Cad. Psicol. Belo Horizonte, v.4, n.5, p.11-17, dez/96. Apoio Financeiro: Unisul