Fátima Moura
Fátima Moura
Conversas de
Café
Talking about coffee
Conversas de Café
Talking about coffee
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1. Café:
bebida e local
2. Portugal
investigador
3. Portugal
produtor
4. Portugal
torrefator
5. Café
à medida
Notas finais
Coffee and cafés
Researching coffee
in Portugal
Producing coffee in Portugal
Roasting coffee in Portugal
Coffee, any way you want it
Final notes
p. 72
p. 170
p. 192
p. 232
p. 6
p. 54
p. 78 Brasil
Brazil
p. 114 Angola
Angola
p. 144 São Tomé
e Príncipe
São Tomé and Príncipe
O primeiro café do mundo
abre na Turquia
The end of the monopoly of cultivation
In 1592, Prospero Alpini, a Venetian botanist who became interested in the
coffee plant on a trip to Egypt, mentioned in De plantis Aegypti liber that «the
Turks have a black drink, which they take in big gulps, not during meals, but
after them as dessert»7. In the late fourteenth, early fifteenth century, it was
adopted by the Ottoman Turks, who certainly already knew the aromas of
the black beverage the Arabs cherished so much. They never parted from it
since, so much so that they took it with them on their military incursions
designed to expand their empire. When they arrived to Yemen in 1538 and
annexed Mocha, the export port of Arabian coffee, they got hold not only of
its trade, but also of its growing. The Arabs had held a monopoly of coffee
trading thanks to extremely cautious export methods. As it has already been
said, all the beans that were sent abroad were previously boiled in order to
remove the parchment, a thin film that surrounds it and which is essential
for it to germinate.
Café de Constantinopla,
cidade onde terá surgido o primeiro
café do mundo, o Kiva Ham.
A coffee house in Constantinople,
the city which saw the opening of the first
coffee house in the world, Kiva Ham.
The Turks resorted to the same trick. Yet the battle of the monopoly of cultivation was already lost by then: in the early seventeenth century, pilgrims
managed to secretly bring some fertile coffee beans to India on their return
from Mecca, which gave rise to its cultivation. A century later, the Dutch and
the French also tried to keep the monopoly of cultivation, weaving true stories of espionage and romance (on which more later).
São também peregrinos que, no regresso de Meca para a sua
terra natal, a Turquia, trazem a ideia de abrir um estabelecimento para servir café. Por esta altura, o império turco
parecia imparável, e Constantinopla (Istambul) fazia quatro vezes o tamanho de Paris. Diz-se que o Kiva Ham, o primeiro café do mundo, abriu portas ao público nesta cidade
em 1475, data não isenta de controvérsia, uma vez que há
quem situe o estabelecimento já no século xvi. A afluência
era grande e havia os que ficavam do lado de fora, a apanhar
o fresco da tarde, deitados sobre as esteiras que cobriam alguns bancos de alvenaria, numa antevisão da esplanada.
Na entrada do Kiva Ham aglomeravam-se os vendedores de
pães não levedados e de biscoitos – costume que mais tarde
será comum a todos os estabelecimentos deste tipo –, pois
o café em jejum faz mal, na opinião deste povo, crença que
poderá estar a origem do nosso hábito de o beber depois das
refeições. Se ali entrássemos depois do almoço, entre as três
e as quatro da tarde, teríamos dificuldade em encontrar lugar para tomarmos o nosso café, que sorveríamos em tragos
ruidosos, a escaldar, enquanto produziríamos «uma música
de sorvos assaz agradável»8 e bem audível até no exterior,
conforme nos conta Philippe Sylvestre Dufour, o autor de
um tratado de 1661.
O café ganhou enorme popularidade na Turquia. Nos lares,
ricos ou pobres, havia sempre um café para as visitas, exceto diurnamente durante o Ramadão. As mulheres não passavam sem o seu café caseiro, e se os maridos falhassem o
abastecimento haveria motivo oficial para divórcio.
Dufour conta-nos ainda que, se visitássemos uma casa rica
no verão, seríamos recebidos com café acompanhado de
sorvete, «uma poção assaz boa. Faz-se, no Egipto, de açúcar,
sumo de limão, almíbar, âmbar cinzento e água de rosas»9.
À nossa chegada, o dono da casa mandaria que os criados
nos trouxessem um defumador de perfume e nos cobrissem
com uma toalha, para evitar que os aromas se escapassem.
Depois, seríamos obsequiados com uma chávena de sorvete
e com uma outra, mais pequena, de café a escaldar.
19
The first coffee house in the world
opens in Turkey
Pilgrims from Mecca returned to their native Turkey with the idea of opening
an establishment where coffee could be served. The Turkish Empire seemed
unstoppable at the time. Constantinople (Istanbul) was four times as big as
Paris. It is said that Kiva Han, the first coffee house in the world, was established in Constantinople in 1475, a controversial date that is sometimes said
to be in the sixteenth century. The high patronage meant some people had
to stay outside, lying on the mats that covered some masonry benches in the
cool afternoon – the forefather of the terrace. Men selling unleavened bread
and biscuits used to gather at the entrance to Kiva Han (and to all coffee
houses later on): the locals though that having coffee with an empty stomach
is bad for you – a belief that may be at the origin of our habit of drinking coffee after meals. If you went in after lunch, between 3pm and 4pm, it would be
difficult to find a seat in order to sip your piping-hot coffee with noisy gulps,
thus producing «rather pleasant sipping music»8 which could even be clearly
heard outside, as Philippe Sylvestre Dufour says in his 1661 treatise.
Coffee became very popular in Turkey. There was always coffee for visitors
in both wealthy and poor households, except during the day in Ramadan.
Women would not do without their homemade cup of coffee, so much so that
there was ground for divorce if their husbands failed to supply it.
Dufour also tells us that, if you were to visit a rich household in the summer,
you would be welcomed with coffee accompanied by sorbet, «a rather good
potion. In Egypt, it is made with sugar, lemon juice, syrup, ambergris, and
rose water»9. Upon your arrival, your host would tell the servants to bring a
perfume incense holder close to you and cover both of you with a towel to
prevent the aromas from escaping. You would then be treated to a cup with
sorbet and a smaller one with piping-hot coffee.
Café: bebida e local Coffee and cafés
Bebida satânica ou remédio santo
Rapidamente, surgiram inimigos do café em Inglaterra: o governo, a quem a liberdade de
expressão que as tertúlias proporcionavam não agradava; os negociantes de bebidas alcoólicas, sobretudo de cerveja, que viram as suas vendas diminuírem; e as mulheres. Ainda que
os serviçais dos cafés pudessem ser do sexo feminino, as mulheres não tiveram, de início,
autorização para entrar. Elas ressentiam-se da presença constante dos maridos nos cafés
e acusavam a bebida de os deixar secos e enfraquecidos, tornando-os «tão estéreis quanto
um deserto árabe». Esta frase é retirada da petição de 1674, feita por mulheres, em que se
pede a proibição do consumo de café. A esta petição respondem os homens: «É o café que
nos mantém, ou que nos torna, sóbrios. E que as nossas mulheres se, daqui em diante, pensarem em fazer petições contra ele, fiquem condenadas à solidão durante toda a noite, e a
beberem apenas bonny clabber18 durante todo o dia.»
Uma portuguesa e a economia colonial fazem triunfar o chá
No século xviii, o café perde a luta contra o chá em Inglaterra, fruto das políticas fomentadas pela British East India Company. As colónias inglesas tinham começado a produzir muito chá, sobretudo após a terrível doença que destruiu todo o café do Ceilão, fazendo subir
o preço e as taxas do café. Pouco a pouco, surgiram por toda a parte as casas de chá, cujas
portas eram franqueadas às mulheres e às famílias.
Uma portuguesa que detestava café foi, em grande parte, responsável pelo prestígio e pela
imagem do chá enquanto bebida socialmente correta. Quando a filha de D. João IV, Catarina
de Bragança, desposou Carlos II de Inglaterra (1662), trouxe no seu dote uma arca de folhas
de chá e o título de posse da cidade e do porto de Bombaim, a ambicionada porta para o
comércio naquela região. A nossa infanta transformou o hábito de beber chá numa moda
que se popularizou entre a aristocracia inglesa, fazendo rapidamente surgir os Tea Gardens,
de ambiente familiar.
Companheiro da Revolução Industrial
Em meados do século xviii, a cerveja era parte essencial da alimentação dos camponeses
ingleses e alemães, que chegavam a consumir três litros diários desta bebida alimentícia à
base de cereais e com fraco teor alcoólico.
Pelo contrário, a nova bebida que vem ganhando popularidade, o café, não tem praticamente benefícios sob o ponto de vista nutricional. As suas vantagens residem na presença da
cafeína, que lhe empresta o estatuto de bebida excitante, mas com a grande vantagem de
conservar a sobriedade.
Não é por acaso que café e chá se tornaram tão populares neste século, em que os ritmos
de vida sofrem uma modificação radical. De um regime agrícola que segue o ritmo do sol,
passa-se para um trabalho que tem lugar em interiores escuros e cujo ritmo se apoia tão-só
na marcha dos ponteiros do relógio. São horas e horas de trabalho – muitas vezes 12 a 14,
seis dias por semana –, apenas possíveis se potenciadas pelo café, que mantém os operários
alerta e aumenta a produção sem lhes toldar a mente, e ainda proporciona o conforto de
32
Café: bebida e local Coffee and cafés
When you think of England today,
it is tea –another product that came
from the East roughly in the same
period – that immediately comes
to mind. However, the English preferred coffee in the seventeenth
and eighteenth centuries. The first
coffee house in Europe away from
Venice was opened in an annexe
of the Angel Inn, Oxford, by Jacob,
a Lebanese Jew, in 1650 or 1651.
Shortly after, in 1652, Pasqua Rosée,
born within the Greek community
in Ragusa, Sicily, opened another
coffee house, The Turk’s Head, in
the labyrinthine constituency of
Cornhill, in the centre of the City
of London. Pasqua had worked for
an English merchant who had businesses in Smyrna (the present-day
Turkish city of Izmir) before deciding to make it on his own. Coffee
houses began to open at a steady
pace. There were almost two thousand coffee houses in London less
than a century later.
Petição das mulheres inglesas
contra o café.
The English women’s petition
against coffee.
Drink from Hell or holy
medicine?
Coffee soon began to gather enemies
in England: the government (who
disliked the get-togethers’ freedom
of speech), those who traded in alcoholic drinks, especially beer, whose
sales decreased, and women as well.
Although they sometimes worked
in coffee houses, women were not
allowed to enter in the early days.
Women resented their husbands’
constant presence in coffee houses
and held the drink responsible for
drying them out, weakening them
and making them «as barren as an
Arabian desert». This sentence was
taken from a 1674 petition where
women call for the prohibition of coffee consumption. Men’s response to
the petition was as follows: «It is coffee that keeps us, or makes us, sober.
May our wives who henceforth consider petitioning against it be sentenced to solitude all night and drink
nothing but bonnyclabber18 all day.»
A Portuguese woman, colonial economy and the triumph of tea
Coffee lost the fight to tea in the eighteenth century as a result of the policies
led by the British East India Company. The English colonies had started to
produce large quantities of tea, especially following the terrible disease that
destroyed all the coffee from Ceylon, pushing up prices and taxes on coffee.
Tea houses, where women and families were welcome, gradually appeared
everywhere.
A Portuguese woman who hated coffee was largely responsible for the prestige and image of tea, a socially correct drink. When King João IV’s daughter
Catherine of Braganza married King Charles II of England in 1662, her dowry
included a chest containing tea leaves and the title deed of the city and the
port of Bombay, the coveted door to trade in the region. With the help of the
Portuguese Princess, having tea became fashionable among the English aristocracy. Tea Gardens, with a family-friendly atmosphere, soon began to open.
A companion of the Industrial Revolution
In the mid-eighteenth century, beer was an essential part of the diet of British
and German peasants, who drank up to three litres of this nourishing beverage made from cereal and with low alcohol content per day.
Conversely, as far as nourishing is concerned, the benefits of coffee, the new
drink that was becoming popular, are virtually none. Its advantages lie in
the presence of caffeine, which grants it its status as a stimulating drink.
Furthermore, it keeps you sober.
Coffee and tea did not become extremely popular in the eighteenth century by chance. It was a time of radical change in life cycles: an agricultural
Maquinaria de fábrica ao tempo
da Revolução Industrial.
Factory machinery in the days of the
Industrial Revolution.
system according to the sun gave way to working in dark interiors according
only to the hands of the clock. Very long work periods, frequently twelve to
fourteen hours per day over six days a week were only possible to achieve
if they were powered by coffee, which allows for an increase in production
while keeping the workers’ minds sharp and provides the comfort of a hot
drink. Coffee prices went down: it was now shipped more easily and quickly
on steamships, whose routes no longer depended on the whims of the wind.
It made its way to factories with a little help from their bosses. Operating expensive machines on a production line, in which stopping spelled huge losses, was not compatible with beer and other alcoholic beverages that workers
used to drink throughout the day.
The first vending machines only appeared in the workplace after World War
II, in 1946. A liquid coffee concentrate was diluted in hot water: coffee was
ready a few seconds later. In a couple of minutes, so was the worker, who then
returned to production, properly powered up. Coffee breaks boomed after a
campaign by the Pan-American Coffee Bureau for coffee in the workplace.
«Give yourself a Coffee-Break – and Get What Coffee Gives to You» was the slogan
of the group, which lobbied for coffee-related interests in South America.
Portugal
Das tabernas aos cafés
Venda de café
em Lisboa.
A coffee stand
in Lisbon.
Foi apenas no início do século xviii que chegaram ao nosso país as influências francesas
no que diz respeito a novas formas e locais de sociabilidade, embora entre nós o convívio
em locais públicos sempre tenha passado pela interação entre diferentes classes sociais.
Em botequins, tabernas ou tabolagens (ver p. 37) bebia-se muito álcool, discutia-se, lutava-se, tocava-se e, sobretudo, jogava-se. Nesses antros, a paixão pelo jogo – qualquer tipo de
jogo – juntava desde marginais a nobres, apesar de a lei ser bem clara no Regimento dos
Taberneiros de 1797:
«Nenhum taberneiro consentirá nas suas tabernas qualidade alguma de jogo às pessoas
que a elas forem comer; e muito menos aos criados de servir e escravos.»19
Consta ainda deste regimento a proibição de «ajuntamentos de mulheres dos quais possam
resultar as desordens que são próprias de quem frequenta similares casas». Da redação
deste regimento infere-se que o ambiente das tabernas e tavolagens, ou tabolagens, deixava
bastante a desejar, sendo frequentes as rixas que começavam dentro e extravasavam para
a rua.
Os cafés, enquanto espaços públicos das novas formas de
sociabilização, chegaram a Portugal mais tarde do que à
maioria dos países europeus, sobretudo no que diz respeito
ao ambiente de trocas intelectuais que os caracterizavam
em França ou em Inglaterra. Tinop desconsidera os primeiros estabelecimentos, afirmando que «entre nós, os cafés
têm sido apenas umas vezes a cópia grotesca, caricatural,
outras vezes a fotografia pessimamente retocada dos lá de
fora»20, em parte devido à apertada censura da Real Mesa
Censória e ao zelo da Intendência-geral da Polícia.
Quando os cafés finalmente chegaram gerou-se alguma
confusão com o conceito de botequim. Este, segundo o
Dicionário de História de Portugal, é uma loja onde se servem
vários tipos de bebidas21. A sua raiz será a mesma da bodega espanhola e terá dado origem ao boteco brasileiro, locais
onde se consomem bebidas alcoólicas e comidas. Assim foram também os cafés entre nós: além de chá e café, sempre neles se serviu álcool «fino», deixando para as tabernas
o tradicional vinho barato a copo. Os primeiros botequins
de Lisboa terão sido as casas Rosa e Madama Spencer, ambas na antiga Rua Nova (Rua dos Capelistas) e anteriores ao
Terramoto. A maior concentração destes estabelecimentos
situava-se no Largo do Regedor e em São Roque.
Por altura do aparecimento dos primeiros cafés em Portugal,
estava ultrapassada a moda do orientalismo no resto da
Europa, e o negócio concentrava-se na mão dos italianos. As
limonadas e a «neve» eram as maiores atrações dos cafés e,
ao contrário de França ou de Inglaterra, bebia-se bastante
chá até aos finais do século xviii. Até sob o ponto de vista
literário, poucas são as referências ao café-bebida.
Uma das épocas áureas da vida dos nossos cafés foram os
anos das guerras liberais, os que as precederam e se lhe
seguiram, e ainda os anos de viragem do século xix para
o século xx, com o fim da Monarquia e a implantação da
República. Segue-se uma história abreviada dos principais
estabelecimentos dos séculos xviii e xix.
Tabolagem
«É tomado do castelhano tablaje, que é casa de jogo.
Na ordenação chamam-se tabolagens às casas de
jogos proibidos. Dar tabolagem é dar em sua casa
naipes, dados e outras coisas concernentes ao jogo.
[...] El-rei D. João II mandou queimar a casa
de tabolagem, qual pagode, aonde em semelhanças
de idolatria se viram obedecidos e festejados por
oráculos da sorte, por efígies da Fortuna...»
Padre Rafael Bluteau,
Vocabulário Portuguez e Latino, vol. 8, p. 11
A modernização de Lisboa passa pelos cafés
Quando foi feita a reconstrução da cidade, Pombal, que
quis tornar Lisboa moderna sob todos os pontos de vista,
foi grande entusiasta da abertura de mais cafés, talvez até
porque, em público, seria mais fácil os seus esbirros aperceberem-se de como se ia formando a opinião pública. Diz-se
que o Marquês teria estado na inauguração do botequim de
Marcos Filipe, o primeiro a surgir após a remodelação da
cidade, tendo almoçado chá e torradas de pão de Meleças
com manteiga, e que seria frequentador do botequim do
Casaca, na Rua dos Capelistas. Talvez por experiência própria Pombal se tenha apercebido de que era necessário vigiar
os cafés, missão que o intendente de polícia Pina Manique
levou sempre muito a peito. Tão a peito que a maioria das informações que hoje temos acerca destes estabelecimentos
37
Portugal
From taverns to cafés
French influence regarding new socialising ways and places only came to
Portugal in the early eighteenth century, although social classes had always
interacted as they mingled in public places. In botequins, taverns or tavolagens (see below) there was plenty alcohol as well as arguing, fighting, playing
and mostly gambling. Outsiders, outlaws and noblemen gathered together
for their love of all sorts of games, although the 1797 Regimento dos Taberneiros
states very clearly that «no publican shall consent in his taverns any sort of
game to the people who go there to eat; much less to servants and slaves»19.
The Publicans’ Rule also states that «gatherings of women which may give
rise to brawls that are common among those who attend such houses» are
forbidden. It is implied that the atmosphere in taverns was far from good:
brawls that started inside and spread outside were a regular feature.
Cafés as public spaces for new ways of socialising came to Portugal later than
in most European countries, especially as far as the intellectual exchange
atmosphere that was a staple in France or England is concerned. Tinop disregards the first cafés, as he says that «among us, cafés have been nothing
but a grotesque copy, a caricature, sometimes a badly-retouched photograph
of the ones from abroad»20, partly due to the tight strict censorship – institutions such as the Real Mesa Censória [Royal Board of Censors] and the Police
itself. When cafés finally made their appearance, there was some confusion
with the concept of botequim. According to Dicionário de História de Portugal, a
botequim is a shop where several types of drinks are served21. The word comes
from the same origin as the Spanish bodega and is possibly the basis for
the Brazilian boteco, a place where alcoholic drinks and food are consumed.
Portuguese cafés were also like this: besides tea and coffee, «fine» alcoholic drinks have always been served there – run-of-the-mill cheap wine sold
by the glass was a tavern thing. The first botequins in Lisbon were possibly
Casa Rosa and Casa Madama Spencer, both on the former Rua Nova (Rua dos
Capelistas), before the 1755 earthquake. Most of them were located at Largo
do Regedor and São Roque.
By the time the first cafés opened in Portugal, the Orientalism craze in the
rest of Europe was long gone and business was in Italian hands. Lemonades
and ice cream were the major attractions in cafés. Unlike France or England,
a lot of tea was drunk until the late eighteenth century. Coffee was scarcely
mentioned even in literature.
One of the heydays of cafés in Portugal was the years before and after the
Liberal Wars in the early nineteenth century and the late-nineteenth century, early-twentieth century period, as Monarchy came to an end and the
Republic set in. A short history of the main eighteenth- and nineteenth-century cafés is presented next.
Tavolagem or tabolagem
«The word comes from the Spanish tablaje, meaning gambling house.
In law, tabolagens are houses where forbidden games are played.
Dar tabolagem means to hand out decks of cards, darts and other
gaming-related material in one’s house. [...] King João II ordered the
tabolagem house to be burned, like a pagoda, where oracles of luck and
effigies of Fortune were similarly worshipped, obeyed and celebrated...»
Padre Rafael Bluteau,
Vocabulário Portuguez e Latino, vol. 8, p. 11
Café: bebida e local Coffee and cafés
O polimento do Marrare
Os Vencidos da Vida, em 1888.
Da esquerda para a direita: sentados,
Guerra Junqueiro, conde de Sabugosa, Eça de Queirós,
conde d’Arnoso; de pé, marquês de Soveral,
Ramalho Ortigão, Carlos Mayer, conde de Ficalho;
na escadaria, Carlos Lobo d’Ávila e Oliveira Martins.
The Vencidos da Vida group in 1888.
Left to right: Guerra Junqueiro, the Count of Sabugosa,
Eça de Queirós and the Count of Arnoso (sitting);
the Marquis of Soveral, Ramalho Ortigão, Carlos Mayer
and the Count of Ficalho (standing); on the stairs,
Carlos Lobo d’Ávila and Oliveira Martins.
Foi o napolitano Antonio Marrare quem elevou o café do
século xix a outro estatuto. Homem ambicioso, é descrito
fisicamente de forma pouco elogiosa por Tinop:
«Pançudo, corado, inxundioso, meio adormecido, andava vagarosamente, amava com delírio os apetitosos produtos da
cozinha italiana, e superintendia, com os seus pequeninos
olhos de espertalhão, aos negócios botequinistas.»33
O empresário abriu quatro cafés no princípio do referido século: o de São Carlos (Rua Anchieta), o das Sete Portas (Rua
do Arco de Bandeira), o do Cais do Sodré e o do Polimento
(Chiado), mas foi este último que se tornou o mais exclusivo. Com o café da Rua Anchieta, Marrare fornecia São Carlos
e convivia com os dilettanti operáticos e, sobretudo, com as
cantoras líricas italianas, tendo-se apaixonado por uma das
bailarinas, Margarida Bruni. À moda das italianas seguir-se-ia, no fim do século, a das espanholas, que, «embora muito valorizadas pelo romantismo francês, nunca foram, entre
nós, sinal de distinção»34. Com estas, mas não só, se enchiam
os reservados do Tavares ao tempo de Eça de Queirós.
O Marrare do Polimento exibia decoração esmerada, tinha as
paredes revestidas com preciosas madeiras, brilhantemente
envernizadas, e possuía sala de bilhar de teto rematado em
claraboia. O café era servido em prataria, e a sua qualidade
muito gabada, ao abrigo das falsificações, tão correntes então.
Situava-se em pleno Chiado, que se tornara na época do «liberalismo vitorioso, mais do que um local, um sítio, ou o sítio
por excelência da capital»35, onde conviviam lado a lado clubes
aristocráticos, modistas, alfaiates, joalheiros, livrarias, lojas de
modas e de decoração e, claro, o Marrare do Polimento.
O viajante francês Olivier Merson comparou o Chiado a uma
petit Paris. Aqui «tinha expressão uma nova situação mundana que o liberalismo internacional trazia: o “dandismo” de
comportamento e traje, por elegância e snobismo de pose
– que de certo modo se opôs à tradição dos costumes “marialvas” que ao regime anterior cabiam, em prática miguelista...»36. Em julho de 1848, o Chiado foi a primeira zona de
Lisboa a receber a iluminação a gás, e o Marrare um dos primeiros estabelecimentos a obtê-la, o que facilitava o ver e o
ser visto. Mostrar-se tornara-se fundamental, nomeadamente através da frequência dos cafés e dos «passeios», numa
clara exibição da importância de uma vida pública.
45
Marrare do Polimento.
Marrare do Polimento.
Marrare
It was Neapolitan-born Antonio Marrare who led nineteenth-century cafés to
the next level. Tinop made a rather unflattering physical description of this
ambitious man: «Paunchy, ruddy, full of himself, half asleep, he walked slowly, delighted in the tasty products of Italian cuisine and oversaw his business
with his beady, smart-aleck eyes.»32
Marrare opened four cafés in the early nineteenth century: São Carlos
(Rua Anchieta), Sete Portas (Rua do Arco de Bandeira), Cais do Sodré, and
Polimento (Chiado). The latter became the more exclusive. His café on Rua
Anchieta supplied São Carlos Opera House. Marrare therefore mingled with
dilettanti and mostly with Italian opera singers. He fell in love with a ballerina,
Margarida Bruni. Italian women would be followed by another craze, Spanish
women, who, «although highly valued by the French romanticism, were never a sign of distinction among us»33. These and other women filled Tavares’s
private rooms in the days of Eça de Queirós.
Marrare do Polimento’s lavish interior featured walls covered in precious
woods with bright varnish finishing and a billiard room with a canopied ceiling. Coffee was served in silverware: its quality was much vaunted, miles
away from the forgeries that were so common in those days. The café was located in the heart of Chiado, which, in those days of «triumphant Liberalism
had become more than a place; it was the place in the capital»34 where, aristocratic clubs, dressmakers, tailors, jewellers, booksellers, fashion and decoration shops and, of course, Marrare do Polimento mingled.
Café: bebida e local Coffee and cafés
Pessoa e os cafés literários
The French traveller Olivier Merson
compared Chiado to a petit Paris.
Here, there was «a new mundane
situation brought by international
liberalism: “dandyism” in behaviour
and attire, with its elegant, snobbish – which in a way was opposed
to the womanising traditions of the
former Miguelist regime...»35 In July
1848, Chiado became the first area
in Lisbon to be fitted with gas lighting: Marrare was one of the first establishments, which made it easier
to see and be seen. Showing yourself
had become essential, especially by
attending cafés and strolling in gardens – a clear display of the importance of having a public life.
Pessoa and literary cafés
Unlike Tinop’s claims (see p. 39), Lisbon
cafés became hotspots for literary
get-togethers from the mid-nineteenth century onwards, as can be
seen from the many names in some
way linked to Fernando Pessoa. The
first that springs to mind is Brasileira
do Chiado, in front of which the
poet is sitting at a table, sharing it
with whoever sits by his side. The
café was established in 1905 and is
one of the few survivors that have
kept its splendour and popularity.
Its name is linked to the Brazilian
coffee (from Minas Gerais) that was
sold there by weight. You could also
enjoy a sample cup of coffee. The
famous logo of a toothless man indulging himself with a cup of coffee
dates back from the opening of the
café, together with the slogan «The
best coffee is from A Brazileira».
A Brasileira do Chiado,
em 1911.
A Brasileira do Chiado, 1911.
Contrariamente ao que afirmava Tinop (ver p. 38), os cafés lisboetas tornaram-se locais de
tertúlia literária a partir de meados do século xix. Exemplo disso são os muitos cafés de
Lisboa ligados ao nome de Fernando Pessoa. O primeiro que nos ocorre é a Brasileira do
Chiado, à porta da qual ainda hoje o escritor está sentado à mesa, partilhando-a com quem
quer que se acomode a seu lado. Foi fundada em 1905 e é um dos poucos sobreviventes desse tempo, mantendo o esplendor e a popularidade originais. O seu nome está relacionado
com o café do Brasil (Minas Gerais), que ali se vendia a peso e, como amostra, era oferecido
em chávena a quem o quisesse provar. O célebre logótipo do velhote desdentado a deliciar-se com um café data da abertura, juntamente com o conhecido slogan «O melhor café é o
da Brasileira».
O grupo da revista Orpheu, do qual também fazia parte Almada Negreiros, nascido numa roça
de café santomense, reunia em diversos cafés, e não apenas na Brasileira. Além do habitual
Martinho do Rossio, Pessoa também frequentou o Martinho da Arcada, onde a mesa na qual
gostava de se sentar está ainda assinalada. Nos anos 30, nos dias de fecho do Martinho, ao
fim de semana, Pessoa trasladava-se para o Café Montanha, na esquina da Rua do Arco de
Bandeira com a Rua da Assunção, perto do Marrare. Era também comum ver o escritor no
Café Royal, nascido em 1904 em pleno Cais do Sodré, decorado com belíssimos azulejos Arte
Nova. Muito procurada era a sua tabacaria para compra de jornais estrangeiros.
Gente da Brasileira do Chiado,
ilustração de Alberto de Souza, 1930.
Gente da Brasileira do Chiado [People from
A Brasileira do Chiado], an illustration
by Alberto de Souza, 1930.
A boémia
Em Lisboa também não faltavam os cafés pré e pós-teatro. Nas imediações da Avenida, concentrava-se grande parte da vida noturna de Lisboa. Teatros de revista no Parque Mayer, tão
populares até ao 25 de Abril, casas de fado e cabarés, como o famoso Maxime, debitavam
a sua clientela para o Café Lisboa, nascido na década de 40. Por lá passava Gago Coutinho,
depois das estreias das revistas, que nunca falhava; por lá se avistavam as coristas e os
encenadores; por lá se entrosavam pides, à coca de trocas de palavras ilícitas nos textos
insidiosos das revistas.
No antigo teatro Éden, a Chic era local de conúbio entre atores, de teatro e de revista, que lá
se restabeleciam com canjas e bifes.
Goles de informação
O aparecimento dos cafés em Lisboa, e mais tarde no resto do país, está indissoluvelmente
ligado a um novo tipo de sociabilidade e de convivência da população das cidades. Como
vimos mais acima, a Revolução Francesa é o golpe de misericórdia na vida da corte, fechada
sobre si mesma; ao mesmo tempo, franqueia o acesso de todas as classes sociais aos espaços públicos, como os restaurantes e cafés, e às vias de circulação, que começam a ser alvo
de cuidados especiais e recebem iluminação e policiamento. A missão do intendente Pina
Manique não se limitou à espionagem. Nesta época foi feito um grande esforço no sentido
de civilizar e tornar mais seguros os espaços públicos, nomeadamente as ruas. Foi no século
xix que, com algum atraso, abriram em Portugal os primeiros restaurantes e cafés, locais
privilegiados para conviver, mas também para mudar o mundo. Esta missão fê-los atravessar os tempos e manteve-os vivos até hoje. Diz-se que sem eles não teria havido Revolução
Francesa, nem, quem sabe, o triunfo do nosso liberalismo.
47
Café: bebida e local Coffee and cafés
The Orpheu group, which included other artists such as Almada
Negreiros, who was born in a coffee plantation in São Tomé, used
to meet in several cafés besides
Brasileira. Besides Martinho do
Rossio, Pessoa was also a regular of
Martinho da Arcada, where you can
still find the table where he used to
sit. When Martinho was closed for
the weekend in the 1930s, Pessoa
would go to Montanha, at the corner
of Rua do Arco de Bandeira and Rua
da Assunção, near Marrare. The author could also often be seen in Café
Royal, which was established in Cais
do Sodré in 1904 and was decorated with beautiful Art Nouveau tiles.
Its tobacconist’s was very popular
among those who bought the foreign press.
Bohemian life
There were plenty pre- and posttheatre cafés in Lisbon. Much of
the city’s nightlife was concentrated in the area around Avenida da
Liberdade. Revue theatres at Parque
Mayer, which were hugely popular
before the 25 April 1974 revolution,
fado houses and cabarets as the
famous Maxime reeled out their
customers onto Café Lisboa, established in the 1940s. The aviation
pioneer Gago Coutinho, who never
missed an opening night, used to
go there after the show. Chorus girls
and stage directors could also be
seen there, as well as members of
the secret police, always eavesdropping for illicit words on the show’s
insidious dialogues.
In the old Éden Theatre building,
Chic was the place to go for all kinds
of actors, who gained back strength
with chicken soup and steaks there.
Estufas de cafeeiros no CIFC, Oeiras.
CIFC coffee tree greenhouses in Oeiras.
a migrar e os trabalhadores ficaram entregues à miséria,
resultando as piores conturbações políticas e sociais. Houve
catástrofes de repercussão mundial, famílias destruídas,
homens que mataram e outros que se suicidaram.»5
Tão grave foi esta crise, que o Ceilão trocou o cultivo do café
pelo do chá, «a bebida que alegra, mas não inebria», conforme a colossal campanha feita em Inglaterra pela Companhia
das Índias Orientais (East India Company) para alcandorar o
chá a bebida nacional. Neste emaranhado de coincidências
e curiosidades, aqui fica mais uma: Ceilão chegou a ser território dos portugueses, que ali chegaram em 1505, à procura
da canela. Em 1658, fomos vencidos pelos holandeses, por
sua vez expulsos pelos ingleses em 1796.
Após esta epidemia no Ceilão, a ferrugem continuou o seu
trilho de destruição por vários países asiáticos, nomeadamente na colónia holandesa de Java e na Índia, e prosseguiu
para o continente africano. Poupados ficaram, por essa vez,
os cafeeiros sul-americanos.
CIFC, o início da caminhada
Alguns anos mais tarde, mais precisamente em 1951, numa
deslocação a São Tomé, Branquinho d’Oliveira confrontou-se com os assustadores estragos da ferrugem alaranjada,
conforme relatou por carta ao diretor do Instituto de Café
de Angola:
«Na Roça Amparo II, [deparei] com um intenso ataque de
Hemileia vastatrix que tinha quase desfolhado os cafeeiros
que restavam de uma plantação de Arábica, tal como eu
lera numa descrição do Ceilão. Desde essa época, em 1951,
tanto V. Exa. como eu ficámos vinculados às ferrugens do
cafeeiro.»6
Vinculado é um termo curioso, que traduz exatamente o
laço de devoção que prendeu Branquinho d’Oliveira à missão de salvar o cafeeiro da ferrugem e que iria doravante
nortear a sua vida e a da sua mulher, Maria de Lourdes
Oliveira, que trocou a sua carreira de médica para colaborar
nas investigações do marido.
CIFC: the journey begins
In 1951, Branquinho d’Oliveira met the daunting ravages caused by coffee rust on a journey to São Tomé, as he reported in a letter to the Director of the Instituto de Café de Angola: «In Amparo II Farm, [I came across] an intense attack of
Hemileia vastatrix which had almost caused the remaining coffee trees in an Arabica plantation to lose most of their
leaves, as I had read in a description of Ceylon. Since that time in 1951, both you and I are united by coffee tree rust.»6
United is an interesting word: it translates exactly Branquinho d’Oliveira’s devotion to his mission – saving coffee trees
from coffee rust– which from then on guided his life and that of his wife, Maria de Lourdes Oliveira, who left her medical career in order to collaborate with her husband in his research work.
Small coffee plants from São Tomé were inoculated with Hemileia vastatrix and brought to Portugal. Once in EAN’s
greenhouses, they were duly isolated, since it was not known at the time if the disease was able to attack species from
mainland Portugal’s flora. As this contamination turned out not to be possible, and since coffee is not grown in the
mainland territory, CIFC was able to conduct all the research without any danger.
Centro de Investigação
das Ferrugens do Cafeeiro (CIFC).
Centro de Investigação das Ferrugens do
Cafeeiro [Coffee Tree Rust Research Centre]
(CIFC).
at USD$ 116,600, which specialises in
research on coffee rust and was officially inaugurated on 24 April 1955.
What is coffee tree rust?
Coffee rust is caused by the
Hemileia vastatrix fungus. It
was first referenced in Kenya
in 1861. It became epidemic in
Ceylon (Sri Lanka) c. 1868: ten
years later, coffee growing in
the country collapsed, forcing
farmers to grow tea instead
of coffee.
This dreaded disease attacks
coffee tree leaves: they usually
fall off and weaken the plant,
leading to production loss and
possibly death. Round orangeyellow (rust-coloured) spots
appear on the lower part of
leaves. The closer the leaves are
to the ground, the hardest the
fungus attacks. A spot similar
to an oil stain appears on the
top part of the leaves.
Coffee rust is now endemic
in virtually all coffee-growing
countries. It made its
appearance in the American
continent in the 1970s. As a
consequence, production losses
in Brazil reached 30 percent.
Neste ponto, nova coincidência entra na história. Filho de médico, Wellman nascera e passara a sua meninice no sudeste de Angola, nos finais do século xix, na aldeia de Camundongo,
no Cuíto Cuanavale. Talvez também por essa forte ligação a Portugal, os norte-americanos
decidiram de imediato que seria no nosso país que se centralizariam os estudos relativos a esta doença. De diferentes países cafeicultores começaram a chegar ao CIFC amostras de ferrugem e de sementes de cafeeiro, para que, neste centro, pudessem encontrar-se
variedades resistentes à doença. Como alguns dos países produtores não tinham relações
diplomáticas com Portugal, todas essas amostras se concentravam nos EUA, sendo posteriormente enviadas para Oeiras.
Uma vez que, nessa época, as colónias portuguesas, sobretudo Timor, São Tomé e Angola,
eram grandes produtoras de café, havia todo o interesse nesses estudos. Um dos pilares do
acordo estabelecido entre Portugal e os EUA foi o financiamento por este último das estufas
do novo Centro de Investigação de Ferrugens do Cafeeiro (CIFC), no valor de 116 600 dólares.
A inauguração oficial do centro data de 24 de abril de 1955.
O que é a ferrugem alaranjada do cafeeiro
Causada pelo fungo Hemileia vastatrix, a ferrugem alaranjada foi referenciada pela
primeira vez no Quénia em 1861. Por volta de 1868 apareceu com caráter epidémico
no Ceilão (Sri Lanka): dez anos mais tarde, a cafeicultura deste país colapsou,
obrigando os agricultores a trocarem o café pelo chá.
Esta temível doença ataca as folhas do cafeeiro, que geralmente caem
e enfraquecem a planta, com consequente perda de produção e eventual morte.
Manifesta-se através de manchas circulares de cor amarelo-alaranjada, que se
concentram na parte inferior das folhas (semelhantes à cor da ferrugem). Quanto
mais próximas as folhas estiveram do chão, maior é o ataque do fungo. Na parte
de cima da folha, surge uma mancha semelhante a uma nódoa de óleo.
Atualmente a ferrugem é endémica em praticamente todos os países cafeicultores.
Na década de 1970, surgiu no continente americano, provocando no Brasil perdas
de produção na ordem dos 30%.
A ferrugem alaranjada e o prestígio internacional
«Mais de 90% das variedades comerciais de cafeeiro resistentes à ferrugem foram criadas,
directa ou indirectamente, através de estudos realizados no CIFC»8, nas palavras de Vítor
Várzea, investigador do CIFC. Será preciso dizer mais acerca do trabalho que este centro
vem desenvolvendo ao longo dos últimos quase sessenta anos?
Mas voltemos um pouco atrás na história. No início ou meados do século xx, e no seguimento de estudos em torno da ferrugem alaranjada, foi encontrado em Timor um cafeeiro
são no meio de um campo de plantas doentes. Este pé de cafeeiro revelou-se resistente a
todas as estirpes da doença conhecidas na altura, embora com a desvantagem de ser fraco
64
Portugal investigador Researching coffee in Portugal
Folha de cafeeiro
com sintomas
de ferrugem alaranjada.
A coffee tree
leaf showing signs
of rust.
Coffee rust and
international prestige
«Over 90 percent of the coffee
rust-resistant coffee tree commercial varieties were directly or indirectly created as an outcome of CIFC
studies»8, according to the words of
CIFC researcher Vítor Várzea. It is
needless to say more about the research the Centre has been doing for
nearly sixty years.
Let’s go back a bit in history. In the
early, mid-twentieth century, following studies on coffee rust, a healthy
coffee tree was found amidst a field
of diseased plants in Timor. It proved
resistant to all strains of the disease
known at the time, even though it
did not produce many berries. It was
named Timor Hybrid, as it was a
cross between Arabica and Robusta.
In 1957, CIFC began to cross it with
other coffee trees of good productive quality: new very resistant and
very productive varieties such as
Catimor (Caturra × Timor Hybrid) or
Coffee and milk
Costura dos sacos de café,
Fazenda Santa Rita,
1920.
Sewing sacks of coffee,
Santa Rita Farm,
1920.
Era uma época difícil para se imigrar para o cultivo do café, a crise de 29 estava à porta, e
com ela a ruína de poderosos cafeicultores.
Entre 1885 e 1896, tinham-se vivido os anos mais prósperos da cultura cafeeira. Longe iam
os tempos da austeridade da fazenda autossuficiente, em que os fazendeiros se gabavam de
só comprarem sal, querosene e pólvora.
Com os preços em alta e a possibilidade de dispor do dinheiro que anteriormente se destinava à
compra de escravos, os fazendeiros começaram a cultivar uma nova forma de vida, perpassada pelo luxo. Construíram grandes mansões na cidade de São Paulo, longe das fazendas, onde
só iam a contas, e rechearam-nas de objetos refinados e de coleções. À porta, alinhavam-se
os mais modernos automóveis. Lá dentro, tinham lugar as festas mais luxuosas e despreocupadas. Os filhos estudam em Coimbra ou em França e tinham fama de playboys, enquanto
os pais, barões, se divertiam em Paris e frequentavam o Tour d’Argent, onde tinham fama de
cresos. Quando não vão à Europa, mandam-na vir ao Brasil, como foi o caso das três magníficas tournées que a atriz Sarah Bernhardt fez à capital. O dinheiro do café transformou-se
também em mecenato, que iria tornar São Paulo a capital da cultura do Brasil.
108
Portugal produtor Producing coffee in Portugal
Imigrantes in São Paulo. She was
scared. The man from her hometown put his handkerchief between
his hand and Maria’s and did not
let go – not even when they sat on
the long benches in the crowded
waiting room where stifled clerks
and translators processed Italians,
Japanese and Germans. Maria was
lodged in one of the many rooms
where dozens of iron bunks were
lined up, made medical tests and
had jabs and then was on a train
again, heading for the farm where
she finally joined her parents.
Those were hard times to immigrate
to grow coffee: the 1929 crash was
just around the corner, bringing ruin
to mighty coffee producers.
The heyday of coffee growing was
between 1885 and 1896. The days of
austere, self-sufficient farms when
coffee farmers boasted they only
bought salt, kerosene and gunpowder were long gone.
Prices were high. The money that
used to be needed to buy slaves was
therefore available. Coffee farmers
indulged in luxury. They built big
mansions in São Paulo, away from
the farms where they would only
went to check the accounts, and
filled them with exquisite collection
items. State-of-the-art motorcars
lined up at the entrance. Luxurious,
carefree parties were held inside.
Their children studied in Coimbra
or France and had a playboy reputation. Their parents were barons who
lived the high life in Paris and were
regulars of the Tour d’Argent, where
they were seen as filthy rich. If they
were not able to go to Europe, they
would send for it, as was the case of
the three magnificent tours by Sarah
Bernhardt to the capital city. Coffee
farmers became patrons of the arts
and São Paulo became Brazil’s cultural capital.
The Empire ended when the republic was declared in 1898. Campos
Salles, the first president, immediately set up the «governors’ policy»,
commonly known as the «coffeeand-milk policy». The nickname
shows the economic power of the
states of São Paulo and Minas Gerais
due to coffee and cattle, respectively. Coffee barons and cattle ranchers
took turns in power.
Surpluses in coffee production led
to several crises in the late nineteenth century and early twentieth century. Brazil had benefitted
from the decline in Haiti, Java and
Ceylon and had 70 percent of worldwide production, even though it did
not produce quality coffee. In 1906,
Ensacamento do café,
Fazenda Santa Rita, 1920.
Sacking coffee,
Santa Rita Farm, 1920.
Passaporte de imigrante da menina
Maria Moreira Pedro, de 10 anos, vinda
de Mealhada, ao encontro dos pais, no
porto de Santos.
The immigrant passport from ten-year-old
Miss Maria Moreira Pedro, who travelled
from Mealhada to reunite with her parents
at the port of Santos.
Café,
Cândido Portinari,
1935.
Café [Coffee],
Cândido Portinari,
1935.
Café com leite
Em 1898, a implantação da República pôs fim ao Império. O primeiro presidente, Campos
Salles, instituiu desde logo a «política dos governadores», popularmente conhecida como
«política do café com leite», tradução do poderio económico dos estados de São Paulo, pelo
café, e de Minas Gerais, pelo gado vacum. Barões do café e ganadeiros alternavam-se no
poder.
O fim do século xix e o início do xx foram marcados por crises de excesso de produção de
café. No virar do século, aproveitando o declínio do Haiti, Java e Ceilão, o Brasil era responsável por setenta por cento da produção mundial, embora o seu café fosse considerado de
má qualidade. Em 1906, o Brasil produziu quase vinte milhões de sacas para um consumo
mundial que não excedia os dezasseis milhões – excesso de oferta que conduziria à queda
dos preços. Em resposta, o Estado financiou-se junto de bancos europeus para comprar e
guardar grandes stocks. Crise após crise, cada vez mais endividados junto das casas comissárias, os grandes latifúndios foram-se tornando inviáveis. Porém, o pior estava para vir, e
não tardaria muito. Em 1929, a crise da Bolsa de Nova Iorque paralisou o consumo e a economia mundiais. Os preços do café na Bolsa de Santos caíram para números nunca vistos, provocando o caos entre os cafeicultores e um número dramático de bancarrotas e suicídios.
Na vida dos imigrantes deram-se também grandes mudanças. Uns foram forçados a mudar-se para a cidade, enquanto outros aproveitaram a crise para comprar um quinhão das
grandes fazendas, desmembradas pelos bancos credores a fim de facilitar a venda, dando
início a grandes fortunas.
111
Portugal produtor Producing coffee in Portugal
A coffee blend for every house
Before landing in Novo
Redondo, Captain Reinaldo
dos Santos of Angolan airline
DTA, who was a friend of the
family, used to fly over Casa
Ferramenta. An employee
would then begin to grind the
pilot’s favourite blend in a ball
roaster made of metal and
send it straight away to the
airport. Coffee was a constant
feature in Angolan homes,
whether it was the delightful
Robusta – deemed one of the
best in the world – or a blend
of several varieties of Robusta,
maybe mixed with some
Arabica. Each family had its
favourite blend. Several jugs of
coffee were made throughout
the day; coffee was never
reheated. It was the ideal drink
for socialising, which was
cherished – preferably over
a meal.
Coffee:
science and technique
Armário com amostras de café
do escritório do Saldanha
da Marques Seixas, atualmente
no Jardim Botânico Tropical.
A shelf containing coffee samples
in Marques Seixas’ Saldanha office,
currently in Jardim Botânico Tropical.
140
Because of climate- and altitude-related conditions, ninety-eight percent of the coffee that was grown in
Angola came from Robusta (Coffea
canephora) coffee trees and only two
percent from Arabica (Coffea arabica). Robusta was deemed one of the
best in the world. It was grown in
several regions: Cabinda, Cazengo,
Ambriz and Amboim. The most famous – and the most expensive as
well – came from Amboim, southern
Kwanza, where the Seixas’s plantations were situated. Following a
long crisis during the ill-fated 1930s,
one of the best times for Angolan
Robusta was just after World War II
due to the popularity of instant coffee among American soldiers.
Portugal and Angola made a big effort to modernise the coffee-growing industry – Angola’s main export
– as far as processing and advice
for farmers were concerned and
Portugal produtor Producing coffee in Portugal
Ciência e técnica do café
Devido nomeadamente às condições climatéricas e de altitude, 98% do café cultivado em
Angola era de cafeeiros Robusta (Coffea canephora) e apenas 2% de Arábica (Coffea arabica). Considerado um dos melhores do mundo, o Robusta era cultivado em várias regiões
(Cabinda, Cazengo, Ambriz e Amboim), sendo o mais prestigiado e de preço mais elevado o
do Amboim, no Cuanza-Sul, onde ficavam as roças dos Seixas. Após um período de crise nos
fatídicos anos 30, o Robusta angolano conheceu os seus melhores dias logo após a Segunda
Guerra Mundial, devido à popularidade do café instantâneo junto dos soldados norte-americanos.
Portugal e Angola fizeram um grande esforço no sentido de modernizarem o cultivo do
café, a principal exportação da província, em relação à sua forma de beneficiamento, ao
aconselhamento a agricultores e sobretudo aos problemas científicos e técnicos que a sua
produção colocava. Mendes Ferrão sintetizou-os na seguinte passagem:
«A cultura dos cafeeiros em Angola encarou problemas de ordem técnica muito importantes. Entre eles referem-se os ataques de ferrugem alaranjada aos cafeeiros arábica, o
aparecimento da morte súbita, o esgotamento dos terrenos, exigindo, por vezes, apoio especializado. Por isso institucionalizaram-se ou intensificaram-se as colaborações científicas e técnicas com instituições nacionais e estrangeiras, devendo salientar-se dentre elas
o Centro de Investigação da Ferrugem do Cafeeiro e a Missão de Estudos Agronómicos do
Ultramar; e, localmente, o Instituto de Investigação Científica de Angola, que havia sido
criado em 1956, e a Direcção dos Serviços de Agricultura e Florestas.»5
especially regarding production-related scientific and technical problems. Mendes Ferrão summarised
them in the following passage:
«Coffee-tree cultivation in Angola
faced serious technical problems.
Coffee leaf rust in Arabica coffee
trees, sudden death and soil depletion – sometimes there was a need
for specialised support. Scientific
and technical collaborations with
national or foreign institutions
were established or intensified accordingly. These included Centro
de Investigação da Ferrugem do
Cafeeiro and Missão de Estudos
Agronómicos do Ultramar and, at a
local level, Instituto de Investigação
Científica de Angola, established
1956, and Direcção dos Serviços de
Agricultura e Florestas.»5
Terreiro de secagem de café
no Quitexe, distrito de Uíge,
Angola.
A coffee drying yard in Quitexe,
Uíge, Angola.
In three acts
Act One: the cane cycle
Terreiro
na dependência Bemposta
da Roça Novo Destino,
em Monte Café.
Coffee drying yard,
Novo Destino Plantation at Bemposta,
Monte Café.
Segundo ato: o ciclo do café
O cafeeiro foi introduzido nas ilhas pelo capitão-mor João Batista da Silva Lagos, em 1800,
embora Mendes Ferrão17 mencione um documento de 1789, existente no Arquivo Histórico
Ultramarino, em que se refere a introdução de mudas desta planta vindas do Brasil, numa
época em que o café já trepava pelo Vale do Paraíba. Na segunda metade do mesmo século,
inicia-se um novo período de colonização com a chegada de nova remessa de colonos, que
irão fundar grandes roças de café. Entre os mais conceituados cafeicultores santomenses
estão os nomes do já referido Francisco Assis Belard (Roças Santa Margarida, Monte Macaco
e Maiança); Manuel José da Costa Pedreira (fundador de uma das roças mais emblemáticas
e completas de São Tomé, a Monte Café); José Maria de Freitas (Roças Bela Vista, Santarém
e ilhéu das Rolas); João Maria de Sousa e Almeida, barão de Água-Izé (Roça Água-Izé); José
Constantino Dias, marquês de Vale-Flor (Roças Bela Vista e Rio do Ouro – esta última passou a Empresa Estatal Agro-Pecuária Dr. Agostinho Neto, em 1980), fundador da Sociedade
Agrícola Vale-Flor; e Francisco Mantero (Roças Porto Real, na ilha do Príncipe, e São Nicolau),
fundador da Sociedade Agrícola Colonial e da Companhia da Ilha do Príncipe. Refira-se ainda António Lobo de Almada Negreiros, da Roça Saudade, pai de José de Almada Negreiros,
que ali nasceu.
Sugar cane plantations in São Tomé
were based on Brazilian plantations,
plus the knowledge resulting from
the previous experience in Madeira,
where sugar cane had been grown
since the early fifteenth century.
The appearance of sugar meant an
increase in the number of slaves
and in the crown’s interest. Grants
were replaced by direct control by
captains and later by governors.
The cane cycle lasted less than
two centuries. Its end is linked to
poor-quality sugar, as opposed to
quality sugar from Brazil, rather
than to Angolar upheavals, which
are usually held responsible for its
decay. They were not the only troubles to befall on the islands during
the period. There was a devastating
cyclone in 1585. French and Dutch
pirates invaded the islands several
times in the seventeenth century;
the latter occupied São Tomé from
1641 to 1644. As in Angola, freedom
came from Brazil.
Only in the eighteenth century did a
new monoculture appear – one that
made new farmers rich: coffee.
Act Two:
the coffee cycle
Coffee trees were introduced in
São Tomé and Príncipe by Captain
General João Batista da Silva Lagos
in 1800, although Mendes Ferrão16
mentions a document written in
1789 from the Arquivo Histórico
Ultramarino that refers to the introduction of coffee seedlings from
Brazil at a time when coffee was
already moving northwards on the
Paraíba Valley. A new colonisation
period began in the second half of
the eighteenth century with the arrival of new settlers, who will establish large coffee plantations. Some
of the best-known coffee farmers
from São Tomé were Francisco Assis
Grupo de trabalhadores
da Roça Novo Destino,
em Monte Café.
A group of workers
of Novo Destino Plantation,
Monte Café.
163
Portugal produtor Producing coffee in Portugal
O papel libertador da fronteira
Hoje cruzamos a fronteira entre Portugal e Espanha sem sequer nos apercebermos. A raia pode passar despercebida no
meio de uma ponte que atravessamos de carro, no centro de
um rio que passamos de barco, ou numa curva de qualquer
estrada poeirenta. É assim desde que entrámos na CEE, ainda lá não vão trinta anos. Longe ficaram os nossos pavores
de desafiar a Guarda Fiscal com um par de alpercatas e um
saco de caramelos comprados em Ayamonte.
Porém, durante muitos séculos, foi a situação fronteiriça que definiu Campo Maior. Conquistada aos mouros
em 1230 pelas nossas forças combinadas com as de Leão, a
vila acabou por ficar do nosso lado da fronteira. Fortificada,
participou em constantes escaramuças com os espanhóis, e
foi local de passagem de invasores, que atravessavam para
cá e novamente para lá.
Ao funcionar como linha de proibição, a fronteira abriu a
possibilidade de um negócio marginal à rígida estrutura
agrária: o contrabando, que, com o tempo, mudará completamente a face da vila. Apesar de não ser uma profissão
– uma vez que, em geral, os contrabandistas mantinham o
seu trabalho de assalariados, comerciantes ou até de guardas fiscais –, o contrabando permitiu-lhes escapar à dependência total dos latifundiários, senhores que detinham o
poder económico, o poder político e o estatuto social.
Contudo, as histórias de contrabando que ainda hoje se contam com paixão e frontalidade em Campo Maior não são de
heróis, mas sim de homens em luta pela sobrevivência através de uma atividade paralela baseada na astúcia, na força
física e na determinação.
The liberating role of the border
These days, you cross the border between Portugal and Spain without even
realising it. It may go unnoticed in the middle of a bridge you cross in your
car, half way along a river you sail on or on a curve on a dusty road. It has
been like this ever since we joined the EU, not a mere thirty years ago. Far
behind us are our fears of defying the Guarda Fiscal with a pair of espadrilles
and a bag of caramels bought just across the border in Ayamonte.
Yet Campo Maior was defined by its border situation for many centuries.
Conquered from the Moors in 1230 by Portuguese forces combined with those
from Léon, Campo Maior eventually became on this side of the border. The
fortified town played a part in the constant skirmishes with the Spaniards
and was a place of passage of invaders, who crossed it there and back again.
By operating as a prohibition line, the border opened up the possibility of
a business outside the rigid agrarian structure: smuggling. This eventually
changed the town completely. Even though it was not strictly a profession,
as, generally speaking, smugglers stuck to their jobs as rural workers, traders or even Guarda Fiscal officers, smuggling allowed them not to be totally
dependent on landowners, who were masters of the economic and political
power as well as social status.
Nonetheless, the stories of smuggling that are still told passionately and
boldly in Campo Maior to this day are not those of heroes, but of men fighting
for survival through a parallel activity based on cunning, physical strength
and determination.
Zona fronteiriça de Campo Maior.
Ao fundo, já é Espanha.
The border area near Campo Maior.
Spain lies in the distance.
O método invertido
Balão ou vacpot
No método descrito em cima, o líquido começa a cair através da gravidade antes do fim do
tempo de infusão, podendo levar a um café subextraído. Para o evitar, há quem prefira o
«método invertido», que produz um café mais encorpado. Rega-se o filtro de papel, coloca-se no porta-filtros e reserva-se. Introduz-se o êmbolo dentro da base, com o anel de borracha a tocar no n.º 4, ou seja, as duas partes quase completamente separadas, com a abertura
da base virada para cima. Introduz-se o funil e deita-se o café na base através deste. Rega-se
com um pouco de água, até atingir o nível 3. Mexe-se durante 10 segundos e deita-se o resto
da água, até atingir o nível 2. Enrosca-se o filtro na base e espera-se 20 segundos. Vira-se
todo o conjunto com cuidado, sobre uma caneca ou cafeteira em vidro, e faz-se pressão com
o êmbolo, lenta e continuadamente, até atingir o pó.
Moagem média a grossa
Aeropress
Medium grind
15 g coffee powder per 200 ml water
Aeropress is one of the latest coffeemakers. It works like a puzzle, maybe
because it was designed by a toymaker, Alan Adler, in 2005. There may be only
three pieces in the puzzle (base, plunger and filter holder), but the way they
connect to each other and how it works are not intuitive. Once you understand the concept, though, Aeropress is easy to operate. The set also includes
a filter holder, a measuring spoon and a funnel.
Aeropress works by air pressure (hence the name). It extracts the properties
of coffee while keeping the essential oils. The resulting coffee has a medium
intensity and full flavour.
Water up the filter (a paper disk) with a little hot water, place it in the filter
holder and screw the base. Flip the base so that the filter is on the bottom
side and place it on a glass jar or a mug strong enough to stand the pressure
on the plunger. Pour in the dust through the black funnel. Remove the funnel.
Drizzle it slowly with hot water (80ºC) until it reaches the desired level. Let
it set for ten seconds. Stir it carefully for ten seconds with a spatula. Wait
for twenty seconds. Water the plunger rubber ring and insert it in the base
carefully so that it may slide better. Press gently with both hands until you
reach the powder: the coffee will drip onto a jar or a mug. For weak coffee,
simply add hot water. Disassemble the Aeropress and wash each component.
The inverted method
In the method described above, the liquid drips by gravity before the end of
the infusion time. This may lead to under-extracted coffee. To prevent this,
some people prefer the «inverted method», which produces full-bodied coffee. Rinse the paper filter, place it in the filter holder and set aside. Place the
plunger in the base. Make sure the rubber ring reaches level 4, i.e., both parts
are almost completely separated, and the opening of the base is facing up.
Insert the funnel and use it to pour coffee into the base. Rinse with a little
water until it reaches level 3. Stir for ten seconds and pour the remaining water until it reaches level 2. Screw the filter to the base and wait for 20 seconds.
Turn the whole set upside down carefully over a mug or a glass coffeemaker
and press the plunger slowly and steadily until it reaches the coffee powder.
40 g de pó para 400 ml de água (10%)
No centro da mesa, o balão atrai as atenções de todos e revela a transparência de um ritual
alimentado pelo calor da chama e pela convivialidade.
Este método foi desenvolvido por Robert Napier, engenheiro naval, em 1849. Muito apreciado no Japão, funciona através da criação de vácuo, que faz subir a água, justificando o seu
outro nome: vacpot ou máquina de café por vácuo. O balão é constituído por dois recipientes em vidro de forma arredondada, que se acoplam em altura através de uma borracha
vedante e encaixam num apoio metálico. Deita-se a água no balão inferior, de preferência
já bem quente, para diminuir o tempo do processo, e aquecida pela chama de uma mecha,
geralmente alimentada a álcool. Quando a água começa a fazer bolhas, encaixa-se bem o
recipiente de cima (funil), já com o café em pó, e deixa-se a água subir. Nessa altura, mexe-se com uma colher e deixa-se em infusão durante 30 a 40 segundos. Retira-se a lamparina
e, logo que se inicia o arrefecimento, a água começa a descer por sucção, passando pelo
filtro, geralmente em flanela (lavável ou substituível). O café resulta com doçura e pouca
intensidade.
Máquina de café de lamparina,
antiga variante do balão.
A lamp coffeemaker,
an old variation of the jug.
Glass jug or vac pot
Medium to coarse grind
40 g coffee powder per 400 ml water (10%)
In the middle of the table, a glass jug will draw everyone’s attention and reveal the transparency of a ritual powered by a flame and by socialising.
The method was created by the naval engineer Robert Napier in 1849 and is
very popular in Japan. Vacuum makes water rise – hence its other name, vac
pot, vacuum coffeepot. The glass jug is made up of two round glass containers linked height-wise through a rubber seal and joined to a metal pod. Pour
the water into the lower jug, preferably hot, so as to reduce the processing
time. It is heated by a wick’s flame, usually using alcohol. When the water
starts bubbling, join the top part container (the funnel) and the coffee powder
already inside tight and let the water rise. Stir with a spoon and let it brew for
30-40 seconds. Remove the lamp. As soon as it starts to cool down, the water
will begin to go down by suction through the filter (which is usually made of
flannel and can be washed or replaced). The end result will be a sweet, low
intensity coffee.
Balão.
Jug.
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Café à medida Coffee, any way you want it
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Apresentação - Conversas de Café