TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS JESSICA CORREA PUERTA ANÁLISE DE CONTEÚDO DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA NOS LIVROS DE LITERATURA INFANTO-JUVENIL E SUA ABORDAGEM NO ENSINO DE CIÊNCIAS São Paulo – SP 2014 P976a PUERTA, Jéssica Correa. Análise de conteúdo de ciências e biologia nos livros de literatura infanto-juvenil e sua abordagem no ensino de ciências / Jéssica Correa Puerta. São Paulo: [s.n.], 2014. 35 f. : il. Orientador: Prof. Dr. André Perticarrari. Monografia (Licenciatura em Ciências Biológicas) - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, IFSP, 2014. 1. Literatura infanto-juvenil 2. Ensino de ciências 3.Educação I. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo II Título CDU 573.0 TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS JÉSSICA CORREA PUERTA ANÁLISE DE CONTEÚDO DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA NOS LIVROS DE LITERATURA INFANTO-JUVENIL E SUA ABORDAGEM NO ENSINO DE CIÊNCIAS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia, Campus São Paulo como um dos requisitos à obtenção do título de Licenciado em Ciências Biológicas. Orientador: Prof. Dr. André Perticarrari São Paulo – SP 2014 BANCA DE AVALIAÇÃO ____________________________________________ Orientador Prof. Dr. André Perticarrai Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) CCT/ Biologia ____________________________________________ Membro Titular Externo Profa. Msc. Anna Maria Nascimento Damiani Universidade Anhembi-Morumbi __________________________________________ Membro Titular Interno Prof. Msc. Miguel José Minhoto Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) CCT/ Biologia ____________________________________________ Suplente Externo Profa. Dra. Alessandra da Silva Augusto Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) - São Vicente ____________________________________________ Suplente Interno Prof. Dr. Paulo Henrique Netto de Alcântara Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) CCT/ Biologia São Paulo, 21 de Maio de 2014. Aos melhores pais que eu poderia ter. Ao namorado que me ama. Aos amigos que nunca me abandonaram. AGRADECIMENTOS Ao meu anjo da guardar, por me proteger e resguardar. Ao meu orientador Professor Doutor André Perticarrari, pela paciência na orientação e incentivo que tornaram possível a conclusão desta monografia. Ao Professor Paulo Henrique Netto de Alcântara, por ser mais que um professor, por ser alguém que podíamos rir e chorar. Aos meus pais, que sempre me ajudaram, apoiaram e principalmente me levaram no metrô, compraram tinta pra minha impressora e me sustentaram nesses últimos 5 anos. Ao André por sempre ter tido paciência comigo, mesmo quando eu queria socar tudo, chorar e desistir. A Mari, afinal é por ela que ingressei no mestrado. (Valeu!) As minhas professoras de Ballet e Jazz, por ter compreendido e aceito as várias e várias vezes que eu faltei nas aulas para poder estudar. E as minhas amigas de aulas que sempre permitiram que eu copiasse todos os Port de Bras e Padê Burrê. A todos os meus amigos do curso que de uma forma ou outra me ajudaram e me irritaram. Mais do que isso, digo obrigada aos meus amigos, aqueles que sempre estiveram comigo nos bons momentos comendo pizza do shopping D e nós maus momentos durante os exames. Obrigada gente. A literatura deveria ser um ramo da biologia. Trato as palavras como seres vivos que de uma hora para outra podem decolar do papel e sair por ai, sem autor, nem destino. (KLEIN, S. Poderosa. O diário da garota que tinha tudo na mão. Fundamento, 2006). RESUMO O ensino de Ciências é visto como uma área que requer constante leitura, por isso, é imprescindível que o professor forneça recursos didáticos de leitura para estimular o aluno a ler. Um exemplo de recurso de leitura em sala de aula é o livro didático, entretanto este tem pouco caráter lúdico e não entretém o leitor, desfavorecendo o processo de ensino-aprendizagem. Outro exemplo de recurso de leitura é o livro de literatura, que estimula o processo de leitura, interpretação e análise de textos. Além disso, por conter caráter lúdico, proporciona prazer e favorece o processo de ensinoaprendizagem. Todavia, o uso de livros de literatura ainda se restringem as disciplinas de português, raramente sendo utilizados interdisciplinarmente. Os Parâmetros Curriculares Nacionais propõem que os professores devam incentivar a leitura de obras infanto-juvenis sobre assuntos relacionados as Ciências Naturais, pois incentiva a leitura, promove o aprendizado interdisciplinar, posiciona o aluno como protagonista e tem relação direta com a gramática e ortografia. Portanto, esse trabalho teve por objetivo analisar os conteúdos de ciências e biologia nos livros de caráter infanto-juvenil como recurso didático de leitura. A análise das obras foi realizada através da análise de conteúdo proposta por Laurence Bardin e está organizada em três segmentos: 1) Pré-Análise, 2) Exploração do Material e 3) Interpretação dos resultados. PALAVRAS-CHAVE: LITERATURA INFATO-JUVENIL, ENSINO DE CIÊNCIAS, EDUCAÇÃO. ABSTRACT The Science teaching is a field that requires a constantly reading, for which reason makes indispensable that the professor provide didactics resources to stimulate the student to read. One example of reading resources in the classroom is the didactic book, however, it has a ludic character and it does not entertain the reader, been unfavorable to the teaching-learning process. Another example of reading resource is the literature book that stimulates the reading process, the interpretation and text analysis. Moreover, because it’s ludic character, the literature book provides pleasure and it favored the teaching- learning process. However, the use of literature books is still restrict to Portuguese disciplines, rarely cross curricular used.The National Curriculum Parameters proposes that professors should encourage the childrenyoung people about subjects related to Natural Science, because it encourages the reading, and promotes an interdisciplinary learning, it address the student as a protagonist and has a direct relationship with the grammar and orthography.The aim of this study was to evaluated the science and biology content at the children- young people books a didactic reading resource. The collected data analysis was made through the Laurence Bardin analysis and it is organized in three segments: 1) Pre analysis, 2) investigation of the material ex, 3) interpretation of the collected data. KEY-WORDS: LITERATURE BOOK, SCIENCE TEACHING, EDUCATION. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 1 2 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................... 3 2.1 ENSINO DE CIÊNCIAS ................................................................................................ 3 2.1.1 Um Breve Histórico do Ensino de Ciências no Brasil ................................... 3 2.1.2 Educação em Ciências..................................................................................... 4 2.1.3 Ensino e Aprendizagem de Ciências .............................................................. 5 2.2 A LITERATURA ........................................................................................................ 6 2.2. 1 A História da Literatura Infanto-Juvenil no Brasil......................................... 7 2.2.2 A Literatura Infanto-Juvenil como uma Arte Menor ...................................... 8 2.2.3 A Importância da Literatura na Formação de um Cidadão ........................... 9 2.2.4 A Literatura no Ensino de Ciências ................................................................ 9 3 MATERIAL E MÉTODOS ......................................................................................12 3.1TIPO DE PESQUISA..................................................................................................12 3.2 COLETA E ANÁLISE DE DADOS ...............................................................................12 3.2.1 Análise de Conteúdo ......................................................................................12 3.2.2 Pré- Análise .....................................................................................................13 3.2.2.1 LEVANTAMENTO DO MATERIAL .........................................................................13 3.2.2.2 Escolha dos documentos ...........................................................................13 3.2.3 EXPLORAÇÃO DO MATERIAL ................................................................................15 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................16 4.1 EXPLORAÇÃO DA OBRA DE BANDEIRA (2010) ..........................................................16 4.1.1 Ser Humano e Saúde ......................................................................................16 4.1.2 Ciências Naturais e Cidadania ......................................................................17 4.1.3 Método Científico ...........................................................................................19 4.2 EXPLORAÇÃO DA OBRA DE GÓES E SÁ (2010) .........................................................22 4.2.1 Abordagem CTSA ...........................................................................................22 4.3 EXPLORAÇÃO DA OBRA DE GAARDER (1997) ..........................................................24 4.3.1 Biologia Evolutiva ..........................................................................................24 5 CONCLUSÃO .......................................................................................................30 REFERÊNCIAS ................................................................................................................31 1 INTRODUÇÃO De acordo com Ferreira (2007), recurso didático é considerado todo componente de aprendizagem que estimula o aluno em sala de aula. Dessa forma, o professor pode utilizar diferentes recursos para preparar, melhorar ou aprimorar sua ação em sala de aula (SOUZA, 2007). Para Campos (2008), durante o ensino fundamental os principais recursos usados no ensino de ciências estão direcionados a idas aos laboratórios, elaboração de questionários e leitura de textos presentes no livro didático ou fornecido pelo professor. Todos são importantes, entretanto, é preciso ir além destas práticas de ensino e incorporar outros recursos que façam o aluno se sentir parte integrante do processo de ensino-aprendizagem. Estudos de Rabe (2010),mostram que o ensino de Ciências é visto como uma área que requer constante leitura e memorização de termos e nomes complexos, logo, é imprescindível que o professor forneça materiais instrucionais que influenciem os alunos a adquirirem o hábito de ler e interpretar textos. De acordo com Lopes e Salomão (2009) um recurso que, por sua vez, ainda, é usado somente como um complemento nas aulas são os livros de literatura infanto-juvenil. Na disciplina de português, por exemplo, o livro de literatura é considerado um recurso didático importante, pois ajuda a criança a aprender a ler, a escrever e a interpretar; além de conter caráter lúdico e proporcionar prazer, entretém favorecendo assim o processo de ensino-aprendizagem. Todavia o maior uso desta ferramenta didática ainda é nas disciplinas ligadas a língua portuguesa e é usado poucas vezes, interdisciplinarmente, em outras disciplinas escolares (LINSINGEN, 2008a; MIRANDA; LUCA, 2004). De acordo com Rabe (2010), o ato de ler faz parte da vida do ser humano, uma vez que se apresenta no cotidiano através de jornais, revistas, e-mail, televisão, entre tantos outros exemplos. Em seu livro, Freire (1989) nos mostra que ler um texto não implica só em aprender o seu significado, mas sim, trazer estre significado para a experiência de vida. Portanto, a leitura pode ser vista como um fator social, pois sua importância tem relação direta com a vida do leitor. Apesar da literatura não ser utilizada normalmente no ensino de ciências, livros inspirados na ciência surgiram há tempos atrás, com grandes escritores de clássicos infantis como, por exemplo: Irmãos Grimm, La Fontaine e Monteiro Lobato, sendo o último considerado um dos mais influentes escritores brasileiros. Além 2 disso, de acordo com Linsingen (2008b) atualmente são conhecidos vários títulos que tratam a temática científica em suas estórias: Viagem ao Centro da Terra (Julio Verne), Isaac Newton e Sua Maçã (Kjartan Poskitt), Ei! Tem alguém ai? (Joisten Gairden); entre outros títulos. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, p.81): [...] o professor deve incentivar a leitura de livros infanto-juvenis sobre assuntos relacionados às Ciências Naturais, mesmo que não sejam sobre os temas tratados diretamente em sala de aula, mas é uma prática que amplia os repertórios de conhecimento da criança, tendo reflexos em sua aprendizagem. Estudos de Linsingen (2008b) mostram que a literatura infanto-juvenil é um recurso bastante promissor porque, além de ser um bom recurso para o desenvolvimento de estratégias didáticas, também incentiva a leitura e promove o aprendizado interdisciplinar, já que muitas obras abordam aspectos geográficos, contextos históricos e relação direta com a gramática e ortografia. Além disso, a leitura se torna imprescindível na disciplina de ciências, uma vez que o educando precisar ler para interpretar conceitos, refletir e analisar para enfim adquirir novos conhecimentos. Desta forma, conclui-se que ler é indispensável para o ensino de ciências (LOPES; SALOMÃO, 2009; FILIPE, 2012). Ainda segundo Linsingen (2008a, p. 1): Uma das múltiplas possibilidades que se abrem para um Ensino de Ciências está em olhar para uma das matérias culturais menos lembradas quando se pensa nesta disciplina, e também uma das mais desprestigiadas no “mundo adulto”: a literatura infantil e juvenil. Deste modo o presente estudo pretende analisar os conteúdos de ciências e biologia nas obras literárias de caráter infanto-juvenil para serem usadas como recursos no ensino de ciências. 3 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 O ENSINO DE CIÊNCIAS 2.1.1 Um Breve Histórico do Ensino de Ciências no Brasil Segundo Trivelato e Silva (2011) o ensino de ciências é relativamente recente no Ensino Fundamental. A disciplina era ofertada somente nas duas últimas séries do antigo curso ginasial e somente com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação em 1961 se tornou obrigatória em todo ensino ginasial. A partir de 1971, com a Lei nº 5.692, a disciplina passou a ser obrigatória nas oito séries do antigo Primeiro Grau. De acordo com Krasilchik (2000) a evolução do ensino de ciências dependeu do processo histórico vivido na época. O resumo dessa evolução pode ser visualizada no quadro 1. Quadro 1: Quadro com resumo da Evolução da situação mundial e do ensino de ciências Tendências no Ensino de Ciências em diferentes momentos históricos Situação Mundial Objetivo do Ensino Concepção de Ciência Modalidades didáticas recomendadas 1950 Guerra Fria Formar Elite Atividade Neutra 1970 Guerra Tecnológica Formar Cidadãotrabalhador Evolução Histórica Pensamento Lógico 1990 2000 Globalização Formar Cidadãotrabalhador-estudante Atividade com implicações profissionais Aulas práticas Projetos e discussões Jogos: exercícios no computador. Fonte: Adaptado de Trilevato e Silva (2011). De acordo com Krasilchick e Marandino (2004) um dos principais objetivos do ensino de ciências atualmente é preparar o cidadão para pensar sobre questões que exigem um posicionamento e que são conflituosas. Conforme o crescimento da ciência e da tecnologia, associada a situações que agravam a miséria e a degradação ambiental, exigirá que os cidadãos estejam preparados para se posicionar e participar de forma ativa na política (TRILEVATO; SILVA, 2011). 4 2.1.2 Educação em Ciências Atualmente muito se fala sobre a importância da ciência em nossas vidas. Nos jornais, revistas e internet, encontramos diversas inovações tecnológicas que são atribuídas às pesquisas científicas (LINSINGEN, 2008a). Para que o cidadão consiga tomar parte nestas pesquisas, a base de seu conhecimento deve ser científica e tecnológica, em oposição ao conhecimento comum. Todavia para que o leitor consiga em primeiro momento ter acesso a esta informação, ele precisa estar inserido no mundo da leitura e ter conhecimento científico (MALHEIROS, 2010). Para Martins e Veiga (1999), o conhecimento científico e tecnológico é importante tendo em vista que: a) esclarece as múltiplas relações dos seres vivos entre si e com a natureza, orientando para uma intervenção da tecnologia que respeite esta natureza; b) fornece as bases que permitem avaliar os efeitos da tecnologia no ambiente; c) reconhecer as vantagens e as limitações da ciência e da tecnologia; d) promove adesão dos saberes (competências, atitudes e valores) que permitem adaptar-se às mudanças. Deste modo, devemos pensar não apenas em educação através da ciência, mas também educação em ciência, tentando abranger o máximo da população, sejam aqueles que querem seguir carreiras relacionadas com a mesma, seja para desenvolver uma boa compreensão da ciência e do mundo que a rodeia (FILIPE, 2012; COSTA; GONÇALVES,1988). Contudo, há autores que distinguem entre educação em ciências e ensino das ciências, como se pode observar em seguida, na tabela I. Tabela 1: Resumo sobre as diferenças entre a educação em ciência e o ensino das ciências. Educação em Ciências versus Ensino das Ciências Educação em Ciências Ensino das Ciências (Destina-se à formação do cidadãoalfabetização em ciências) Reconhecimento da natureza finalidade da ciência e da Tecnologia; e Aquisição de informação específica e especializada. Conhecimento dos processos da ciência; Compreensão do formalismo científico. Compreensão (interpretação resultados de experiências simples); de Aquisição capacidade e de desenvolvimento aprender e da aplicar 5 Conhecimento de domínios científicos conhecimento e processos. básicos; Aquisição da capacidade de crítica Desenvolvimento de atitudes positivas fundamentada. para com a ciência e para com a comunidade científica; Contributo para o desenvolvimento de valores como: tolerância, rigor, curiosidade, ceticismo informado, etc. Fonte: Adaptado de FILIPE (2012). Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Ciências Naturais (BRASIL, 1997) consideram não o ensino das ciências apenas para os alunos que pretendem seguir profissões científicas, mas também o ensino das ciências numa perspectiva de preparação para a vida numa sociedade cada vez mais científica e tecnológica. 2.1.3 Ensino e Aprendizagem de Ciências Existe hoje um debate no ensino de ciências que opõem as visões empiristas e não empiristas. Na tabela II abaixo se pode observar as diferenças entre as duas formas de visões. Tabela II. Comparação das visões empiristas e não empiristas Comparação entre as visões empiristas e não empiristas na Ciência e no ensino Perspectiva empirista Perspectiva não empirista Fazer As leis e princípios científicos Teorias e hipóteses são ciência emergem dos fenômenos decorrentes de interpretações da naturais, cabendo ao realidade que levam em conta não cientista extrair o só os objetivos, mas também as conhecimento que ali está visões pessoais, especulações, definido. expectativas, preferencias estéticas e motivações dos cientistas. Aprender O aluno aprende por O conhecimento adquirido pelo ciência aluno resulta de uma síntese absorção de informações que 6 já estão prontas no discurso pessoal, sendo uma reelaboração do professor e nos daquilo que é dito pelo professor fenômenos da natureza ou está no livro. Fonte: Adaptado de Trilevato e Silva (2011). Considerando a visão não empirista de ensino, o conhecimento é adquirido através de um pensamento construtivista. Segundo Antunes (2012) o construtivismo é uma corrente educacional que princípio que indivíduo deve atuar ativamente na construção do conhecimento a partir de buscas, experimentações, pesquisa e reflexão. Outra questão da visão não empirista bastante importante no ensino de ciências é o conflito cognitivo. De acordo com Trilevato e Silva (2011) a produção de conhecimentos é estimulada por situações conflituosas, que estimula o individuo a refletir, questionar, buscar informações, pesquisar alternativas e assim transformando as ideias. Para um bom ensino das ciências, é necessário que se recorra a métodos de ensino que promovam nos alunos o interesse pela ciência e pelo mundo que nos rodeia, permitindo uma maior compreensão do mesmo. É aqui que as escolas e os professores têm um papel de grande responsabilidade, obrigando a que se mudem práticas e estratégias, no sentido de dotar os alunos de um maior conhecimento e compreensão científica, se não for para seguirem profissões ligadas à ciência, pelo menos numa perspectiva de um cidadão mais critico e capaz de solucionar problemas do cotidiano (TRILEVATO; SILVA, 2011). 2.2 A LITERATURA A literatura está cada vez mais presente no cotidiano dos Brasileiros, seja pela quantidade de obras existente, ou pelas campanhas nacionais de incentivo à leitura. Esta competência acompanha o cidadão no dia a dia e em diversas áreas, desde as ciências, matemática, história, entre outras. O sucesso das obras de literatura é devido ao seu caráter lúdico e as liberdades artísticas dos escritores, tornando as estórias divertidas e prazerosas. 7 2.2.1 A História da Literatura Infanto-Juvenil no Brasil Durante o século XVII, o contexto histórico das crianças brasileiras era diferente dos que conhecemos atualmente. De acordo com Zilberman (2008) as crianças eram tratadas como adultos em miniatura; se vestiam como tal e não existiam leis contra o trabalho infantil, aprendiam a ler e escrever em casa e tinham participação efetiva nas vidas dos mais velhos, logo é de se esperar que não houvesse uma literatura específica destinada à infância. O que havia na época, segundo Moura (2010), eram livros destinados aos adultos com pouco teor imaginário e que logo chamou atenção do público infantil (LOPES; SALOMÃO, 2009). Neste mesmo século, com o aumento das indústrias e consequentemente o aumento da oferta de emprego de modo desigual acabou por refletir em diferentes classes sociais (PERES; MARINHEIRO; MOURA, 2012). A classe média do Rio de Janeiro passou a ter maior porte financeiro e a aspirar às melhorias da vida urbana, surgindo assim o estereótipo familiar com um pai que tem como responsabilidade o sustento econômico, a mãe como gerenciadora da vida doméstica e responsável pela educação dos filhos (ZILBERMAN, 2008). Segundo Zilberman (2008) é neste momento que o tratamento das crianças passa a ser visto de forma diferenciada, a fase da infância passa a ter valor e os filhos a possuírem metas de vida, surgindo assim produtos destinados a crianças como brinquedos e livros de caráter infanto-juvenil (LAJOLO; ZILBERMAN, 2006). De acordo com Lopes e Salomão (2009) foi assim que a literatura e a escola passaram a se comunicar pela primeira vez e com isso surge o interesse de publicar livros que agradem esta nova classe de leitores, como as estórias que ultrapassavam a realidade, os contos míticos, as lendas e as fantasias (PERES; MARINHEIRO; MOURA, 2012). No entanto, apesar da crescente popularização das obras infantis, a maior parte dos livros destinados ao público infantil brasileiro era de traduções de textos ou coletâneas publicados na Europa, porém, estes textos traziam estilos de vidas que não se aplicavam aos leitores brasileiros (MOURA, 2010). Olavo Bilac foi um dos percussores da nacionalização da literatura brasileira, que propunha a escrita de livros com realidades brasileiras que exaltassem o patriotismo. Porém, segundo Moura (2010), o processo efetivo de nacionalização da literatura infantil brasileira dependeu de Monteiro Lobato, que compreendeu a 8 necessidade de histórias para crianças numa linguagem que as interessasse. Em virtude deste problema em 1921 ocorre a publicação de A menina do narizinho arrebitado, história que se passava no Sítio do Pica-Pau Amarelo. Dez anos depois a obra foi ampliada com a incorporação de outros textos e a resultante constitui no livro Reinações de Narizinho, publicado em 1931 (PERES; MARINHEIRO; MOURA, 2012). De acordo com Zilberman e Lajolo (2006) foi por volta de 1975 teve início o grande período da literatura infantil brasileira, através da tradição estabelecida por Monteiro Lobato. Entre os autores de livros de literatura infanto-juvenil, podem ser destacadas escritoras, como Lygia Bojunga Nunes, Ana Maria Machado, Ruth Rocha e Fernanda Lopes de Almeida (ZILBERMAN, 2008). O fato mais importante é que as obras de autores brasileiros correspondem às necessidades de leitura do público infantil brasileiro, por apresentarem situações cotidianas e problemas sociais do contexto social que esta criança vive (ZILBERMAN, 2008). 2.2.2 A Literatura Infanto-Juvenil como uma Arte Menor Como visto, apesar da grande quantidade de obras brasileiras destinadas ao público infantil, segundo Morais (2010) a literatura infanto-juvenil não é considerada uma manifestação artística e sim um “brinquedo” para divertimento das crianças e não é tratada com a seriedade merecida. O principal motivo desta classificação segundo Antloga e Slogan (2012) é devido à liberdade artística e às adequações literárias que os autores realizam em suas estórias para proporcionar um caráter lúdico, todavia, cometendo assim erros científicos como: habitats que não acordam com aquelas espécies, morfologias erradas, entre outros erros. Estes erros conceituais podem ser considerados uma das causas do por que a literatura infanto-juvenil é raramente usada nas disciplinas científicas (ANTLOGA; SLOGAN, 2012). Apesar de alguns aspectos negativos, é importante o professor considerar a literatura infanto-juvenil como um recurso didático, pois é este tipo de literatura é a que contém a maior quantidade de caráter lúdico. Antloga e Slogan (2012) ressalta a importância do professor analisar estas obras para verificar se os pontos negativos podem ser prejudiciais ao processo de ensino-aprendizagem. Além disso, existem 9 várias obras infanto-juvenis que não contém erros conceituais e que podem ser aproveitadas como recurso didático de leitura (ZILBERMAN, 2008). 2.2.3 A Importância da Leitura na Formação de um Cidadão O ato de ler faz parte da vida do ser humano, por isso é tão importante à criança se interessar pelo universo da leitura. De acordo com Silva (2005) o cidadão aprende a ler antes mesmo de ser alfabetizado, pois a leitura se apresenta em todo o contexto cotidiano, como por exemplo: jornais, televisão, revistas, e-mails, internet e em todos os ambientes como igrejas, Shopping Center, entre outros. Mesmo uma criança que vive longe dos grandes centros urbanos, começa a compreender o mundo por meio de letras e imagens (LAJOLO; ZILBERMAN, 2006). A partir do primeiro contato com qualquer tipo de leitura, o ser humano nunca mais deixa de fazer parte de um ambiente letrado, pois o ato de ler inicia-se quando o indivíduo através de sua percepção toma consciência dos escritos existentes no mundo (FREIRE, 1989). De acordo com Zilberman (2008) não existe uma idade para o indivíduo começar a ler e cada fase da vida é um bom momento para levá-lo a gostar de livros, pois as histórias estimulam seu imaginário e fortalecem sua identidade, ajudando a pensar melhor e a resolver problemas (RABE, 2010). 2.2.4 A Literatura no Ensino de Ciências A metodologia tradicional aplicada para o ensino de ciências esta diretamente relacionada às idas em laboratório, elaboração de questionários e trabalhos com textos oferecidos pelos livros didáticos ou montados pelo próprio professor. Porém, é preciso ir além desta prática de ensino, é preciso fazer com que o aluno se sinta parte integrante do processo de ensino aprendizagem (ANTLOGA; SLOGAN 2012; RABE, 2010). Uma alternativa para a metodologia tradicional seria as atividades que possuem caráter lúdico como, saídas a campo, atividades de experimentação, brincadeiras, jogos e a promoção da leitura, que podem ajudar a posicionar o aluno como protagonista no processo de ensino aprendizagem (SILVA, 2005; RABE, 2010). Segundo Silva (2005) o ato de ler é uma necessidade concreta para a aquisição de significados e, consequentemente, de experiências nas sociedades na 10 qual a escrita se faz presente. Pensando nestas colocações, a leitura se torna indispensável na disciplina de ciências, a leitura interpretativa, a leitura de conceitos, a leitura que leva a reflexão, a análise e a aquisição de novos conceitos (RABE, 2010). Dentro das políticas do PCN (BRASIL, 1997) já se destaca a importância da literatura como ferramenta didática em um eixo chamado de leitura de textos informativos. De acordo com este eixo, o índice de reprovação nos 6º anos está relacionado ao fato de os professores terem a expectativa de que seus alunos saibam ler e escrever textos informativos, considerando que esses procedimentos tenham sido estudados nas séries anteriores. Isto mostra a necessidade de investir no ensino e aprendizagem da leitura e escrita de textos informativos. Neste mesmo eixo traz seguinte trecho: Incentivar a leitura de livros infanto-juvenis sobre assuntos relacionados às Ciências Naturais, mesmo que não sejam sobre os temas tratados diretamente em sala de aula, é uma prática que amplia os repertórios de conhecimento da criança, tendo reflexos em sua aprendizagem (BRASIL, 1997, p. 81). Infelizmente, nos livros didáticos pouco se valoriza a ideia do uso da literatura, limitando suas páginas a trechos e sugestões de leitura complementar, simplesmente como um suporte paradidático ou motivador (RABE, 2010). Parte desta atitude de não olhar a literatura como material de uso interdisciplinar está associada à origem da literatura infantil e seu estereótipo de que o livro infantil pertence a uma arte “menor” (LINSINGER, 2008b). Quando um indivíduo lê uma história, ele está lendo o registro feito pelo autor que provavelmente terá um efeito específico em cada leitor dependendo da sua idade e história de vida. Já os autores, quando escrevem o que ocorre em sua volta manifestam seus pensamentos de forma fictícia ou não. No meio deste turbilhão de pensamentos surgem os assuntos científicos. Entretanto um péssimo hábito apareceu nas aulas de ciências, na qual o professor não pode levar em consideração erros de português porque não é sua disciplina, fazendo que ocorra não apenas um, mas dois erros graves: o desconhecimento científico e literário (RABE, 2010). Linsingen (2008a) nos mostra a solução para esse problema: fazer o 11 caminho inverso ao já realizado pelos escritores que visitam a Ciência, visitar a literatura. 12 3 MATERIAL E MÉTODO 3.1. TIPO DE PESQUISA Trata-se de uma pesquisa de caráter qualitativo, que segundo Rosa (2010, p. 40): [...] se caracteriza por ser de natureza interpretativa. O pesquisador deve interpretar os dados obtidos a partir da pesquisa tendo como base a sua matriz cultural e seu referencial teórico. Para isso, neste tipo de pesquisa, o pesquisador deve estar imerso no universo estudado. A abordagem metodológica utilizada foi a pesquisa documental. Neste tipo de abordagem as informações necessárias à pesquisa estão presentes em documentos. Contudo, alguns aspectos merecem especial atenção: a escolha dos documentos, o acesso ao material e a sua análise (GODOY, 1995). Segundo a autora “A escolha dos documentos não é um processo aleatório, mas se dá em função de alguns propósitos, idéias ou hipóteses” (GODOY, 1995, p. 23). 3.2 COLETA E ANÁLISE DOS DADOS 3.2.1 Análise de Conteúdo Segundo Bardin (1977), a análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análises de comunicação que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição das informações contidas para fazer inferências válidas e reaplicáveis de dados, dentro de seus contextos. Os dados analisados podem ser vistos com base em diversas perspectivas. O mesmo autor ressalta ainda que os significados das mensagens não sejam, necessariamente, os mesmos para todos, uma vez que cada leitor possui uma interpretação da informação presente. Neste trabalho será utilizada a análise de conteúdo temático categorial, que funciona a partir do desmembramento do texto em unidades de categorias. A organização da análise de conteúdo deste trabalho ocorre em dois segmentos cronológicos: a) Pré-análise; 13 b) Exploração do Material; Ao final destes segmentos, gera-se a terceira etapa: a análise do material. Este é o resultado da exploração do material. 3.2.2 Pré-Análise 3.2.2.1 Levantamento de material Para selecionar os livros que tratavam de assuntos científicos, foram utilizados os seguintes critérios: a) Livros recomendados pelo PNBE - Plano Nacional da Biblioteca na Escola. O próprio programa indica quais obras podem ser desenvolvidas em quais disciplinas. b) Obras existentes no mercado editorial que abordam temas de ciências ou biologia. 3.2.2.2 Escolha dos documentos Ao todo foram levantadas 8 obras de caráter infanto-juvenil (tabela III). Para definir as obras que seriam analisadas, foram utilizados os seguintes argumentos: a) presença de conceitos científicos nas obras. Os livros escritos propositalmente para ter assuntos científicos em sua história foram classificadas na tabela como “conceitos escritos propositalmente”. As obras que continham conceitos científicos, mas que não era intensão dos autores tratar de ciências nas mesmas, foram classificadas como “conceitos não escritos propositalmente”. Por fim, nos livros que haviam pouquíssimos conceitos científicos, como por exemplo, alguns parágrafos no livro, foram classificados como “conceitos científicos insuficientes”. b) linguagem de fácil acesso e com vocabulário atual Tabela III: Argumentos utilizados para selecionas as obras a serem analisadas Tabela com os argumentos utilizados Obra A Culpa é das Estrelas Autor GREEN, J. Presença de conceitos Conceito científico insuficiente Linguagem de fácil acesso, vocabulário atual Selecionados para análise Não Não Selecionado 14 A Droga da Obediência BANDEIRA, P. Conceito não escrito propositalmente Sim Selecionado Ei” Tem Alguém ai? GAARDER, J. Conceitos escritos propositalmente Sim Selecionado Frankenstein SHELLEY, M. Conceitos escritos propositalmente Não Não Selecionado Natureza-Vida. Ciclo e Transformaçõe s GÓES, L. P. SÁ, E. Conceitos escritos propositalmente Sim Selecionado Peixonauta em o caso da água que fugiu CATUNDA, C. MISTRORIG O, K. Conceitos escritos propositalmente Reinações de Narizinho LOBATO, M. Conceito científico insuficiente Viagem ao Centro da Terra VERNE, J. Conceitos escritos propositalmente Não Selecionado Sim Sim Não Selecionado Não Selecionado Não A final foram selecionadas as seguintes obras (figura 1) a) BANDEIRA, P. A Droga da obediência. São Paulo: Ed. Moderna, 4ª ed., 2010. b) GAARDER, J. Ei! Tem alguém ai? São Paulo: Companhia das Letrinhas, 1997. c) GÓES, L.P. SÁ, E. Natureza-vida. Ciclo e Transformações. São Paulo: Sá, 2010. Figura 1: Capas das obras selecionadas 15 3.2.3 Exploração do Material Nesta etapa as obras foram divididas em unidades de análise. Para as obras de Bandeira (2010) e Gaarder (1997) foram usados trechos dos livros como unidades. Já na obra de Góes e Sá (2010) as unidades usadas foram os capítulos, pois os mesmos eram curtos e simplificados. Por fim, as unidades que continham temas semelhantes em cada livro foram agrupadas em categorias. 16 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 EXPLORAÇÃO DA OBRA DE BANDEIRA (2010) Durante análise desta obra, foram identificadas as seguintes categorias que abrangem o termo ciências: a) Ser Humano e Saúde b) Ciências Naturais e Cidadania c) Metodologia Científica 4.1.1 Ser Humano e Saúde Um dos conteúdos relacionados à saúde, abordado no Currículo de Estado de São Paulo (2010), é sobre as drogas. De acordo com Costa e Gonçalves (1988) a escola é um espaço privilegiado para o desenvolvimento de atividades preventivas, já que quase toda a população passa por ela numa idade e em circunstâncias altamente favoráveis à assimilação de certos hábitos, atitudes e conhecimentos. Tendo em vista esta afirmação, trabalhar o tema drogas durante a fase escolar é altamente favorável. O autor escreveu esta obra no intuído de apresentar aos educandos, pais e educadores, como as drogam ingressam na vida de crianças e adolescente. Um destes meios é através da oferta de pessoas do mesmo grupo social. “O grupo dos Karas estava à procura do oferecedor de drogas dentro do Colégio Elite. Um membro do grupo, Chumbinho, se distanciou dos colegas, o oferecedor vendo o menino isolado o abordou: Oferecedor: — Vamos lá, Chumbinho! É uma boa. Experimente! Você vai ver que legal! Chumbinho nem podia acreditar. Ele havia descoberto o oferecedor de drogas! Estavam num canto do pátio, e o pátio estava cheio de estudantes. Incrível! Era possível oferecer a droga no meio da multidão, sem qualquer risco.” No trecho o oferecedor era um desconhecido, todavia, hoje nas escolas as drogas são oferecidas por colegas e amigos. Segundo Moreira (2003), para o jovem participar de um grupo é importante, pois assim este assume uma identidade e passa a ser aceito pelos demais. Além que se mostra como uma possibilidade de fuga das dificuldades e promove a satisfação temporária. O trecho abaixo também demostra o oferecimento de drogas na escola. “O grupo dos Karas conversava sobre os acontecimentos: 17 — Então esse tal oferecedor de drogas que ele conhecia e em quem confiava... — começou Caiu. Crânio arrematou: — É daqui, de dentro do Elite! — Barbaridade! E ele vai agir de novo! Duas vezes! Talvez até já esteja agindo!” É preciso que o professor desenvolva a capacidade de decisão sobre as próprias ações, visando ao amadurecimento pessoal e do grupo a que pertence (BRASIL, 1997). Segundo Bravo (2000) é importante também para o professor trabalhar as diversas formas existentes das drogas como, cigarros, comprimidos e etc. “O criador da droga, questiona seus funcionários: — De que modo foi usada a droga? — Em comprimidos, Doutor Q.I. Mas o efeito da Droga da Obediência é o mesmo, qualquer que seja a forma de usá-la. Já experimentamos em pó, em comprimidos, em líquido, injetada, cheirada, aspirada e até fumada, na forma de cigarros. E os resultados foram sempre bons.” Os educandos precisam ter noção da variedade de perigos ao qual estão expostos. Isto é preciso, de acordo com Moreira (2003) já que existem drogas legalizadas, os jovens acham que as mesmas não fornecem perigo real de saúde, já que uma parte da população usa livremente. Somente as drogas ilegais fornecem perigo à saúde. 4.1.2 Ciências Naturais e a Cidadania Segundo Santana (2009) o ensino de Ciências não pode ser voltado a uma aprendizagem do futuro, ou seja, educar a criança hoje para que somente no futuro comece a exercer seus direitos como um cidadão. A participação social no presente, influência a criança em sua inclinação de participar de um futuro social. Mas para que isso ocorra a criança precisa compreender as regras, direitos e deveres do cidadão. O primeiro parágrafo do livro discute como era a rotina do Colégio Elite. “A campainha do Colégio Elite não soou dando o sinal para o recreio porque o Colégio Elite não tinha campainha. Um colégio especial como aquele, para estudantes muito especiais, não precisava de sinal. Todas as decisões no Elite 18 contavam com a participação direta dos alunos, que, por isso, cumpriam as regras sem precisar de qualquer comando. As regras eram deles.” O trecho traz um exemplo direto de como a participação social interfere no comportamento do cidadão. Quando existe uma organização social, os alunos podem manifestar seus interesses e desejos e essas novas regras inseridas no projeto político pedagógico. Este processo é conhecido também como pesquisa participativa (VASCONCELLOS, 1995). A importância da participação social do aluno no ensino de ciências é relacionada ao desenvolvimento de um aluno crítico. Vivemos em uma sociedade em que a supervalorização do conhecimento científico e a crescente intervenção da tecnologia no dia-a-dia faz necessário o desenvolvimento de um cidadão crítico (MARTINS; VEIGA,1999). No livro, a droga da obediência foi formulada e aplicada nos seres humanos sem um aval médico, conforme podemos observar. “— Como? Seres humanos? Gente? Não, não, não, Doutor Q.I. É muito cedo para testar a Droga da Obediência em seres humanos. Ainda mais agora que eu... — Pois você está atrasado, meu caro Caspérides. Já dei a ordem, e a Droga da Obediência está sendo aplicada em quem deve ser. Nada de ratos, camundongos ou papagaios. Gente, Caspérides, gente! — Gente?! O senhor já mandou testar a droga nos loucos? — Loucos? Loucos coisa nenhuma! Essa droga maravilhosa está sendo testada nos jovens mais saudáveis que pudemos encontrar! Caspérides empalideceu: — Gente? E gente sã? Mas esta é uma droga perigosa. Só poderia ser aplicada com ordem médica. E a ética proíbe ao médico aplicar medicamentos em um corpo são! — Ética médica, Caspérides? — riu-se o Doutor Q.I. — A única ética que me importa é a da Pain Control!” Segundo Menin (2002) é importante formar alunos capazes de refletir sobre os valores existentes. O professor deve criar situações de reflexões e críticas. No trecho abaixo, Miguel, entra em conflito com a lógica do Doutor Q.I e protesta contra suas atitudes. “— Não! — protestou Miguel. — A missão de uma indústria farmacêutica não é essa! — Você tem razão. A nossa missão é maior. Para a sociedade perfeita que planejamos, não é suficiente controlar a quantidade de doença ou de saúde que 19 regula a humanidade. Não! Nós queremos uma sociedade perfeita como a das formigas, onde cada um conheça o seu lugar e nele permaneça, produzindo aquilo que deve produzir, cumprindo as ordens que deve cumprir! — Isso é uma loucura! Isso... — Foi aí que nós descobrimos a Droga da Obediência. E essa droga maravilhosa vai abrir caminho para o nosso sonho de perfeição: a Pain Control vai transformar-se na Will Control!”. A formação prática para a moralidade deve ser trabalhada nos espaços escolares, na prática pedagógica, nas disciplinas, nos conteúdos e em todas as situações em que as relações humanas e seus conflitos pudessem aparecer e onde se pudesse refletir sobre as melhores situações para todos (RAZERA; NARDI, 2006). Além da participação social, o trabalho em equipe ou cooperação é indispensável em qualquer área e principalmente nas áreas científica em que grupos de estudos precisam estar em harmonia entre si para atingir um objetivo (SANTANA, 2009). No trecho, Chumbinho é confrontado pelo detetive Andrade se ele realmente foi o último a conversar com o último aluno raptado. “— Acho que fui eu, sim — ia dizendo o menino no momento em que Miguel cruzou os braços. Sim. Chumbinho sabia o que significavam os braços cruzados. Era o sinal de silêncio dos Karas. Equivalia a um dedo encostado nos lábios, só que ninguém sequer desconfiava. Era preciso ser um Kara, e Chumbinho, agora, era um deles.” Segundo Santana, (2009) os educandos que trabalham em clima de cooperação e solidariedade com outros membros de sua classe, favorecem a autoestima e a formação de vínculos entre os integrantes do grupo. 4.1.3 Método Científico Segundo Bizzo (2014) o método científico pode ajudar os alunos do ensino de ciências nas séries iniciais a pensarem de maneira lógica sobre os fatos do cotidiano e a resolverem problemas práticos. É importante para o professor oferecer condições reais ou imaginárias para o aluno vivenciar o método científico trabalhando de forma a redescobrir conhecimentos. No decorrer da dobra, os Kara usam o método científico, na tentativa de solucionar o mistério. “— Mas os sequestras... 20 — Não são seqüestras comuns. Há um método. Um método científico de amostragem. Estão sendo recolhidas três amostras de cada um de pelo menos dez diferentes colégios, todos do mesmo padrão. Pelo jeito, eles querem jovens da classe alta, bem alimentados, saudáveis, boas cabeças, atléticos...” Neste momento o grupo dos Karas seguem um método empirista na tentativa de solucionar o mistério, extraindo dos jornais as informações necessárias. Contudo, Trilevato e Silva descrevem que o método científico não é uma sequência linear de passos que necessariamente conduz a um resultado. Por isso é importante que o professor não apresente a atividade científica como uma espécie de receita infalível como parecem sugerir os livros didáticos. (MOREIRA; OSTERMANN, 1993). O livro também mostra que o método não é rígido, pois ao analisar melhor seus dados, o grupo dos Karas percebe uma discrepância nos dados. “Examinando as notícias dos jornais, Miguel verificou que o método da quadrilha era sequestrar todos os três estudantes de uma mesma escola antes de passar para a próxima. Isso queria dizer que o tal oferecedor infiltrava-se em uma escola, ganhava a confiança de três meninos ou meninas, oferecia a droga e depois abandonava aquela escola.” Aí estava um padrão: nove escolas haviam sido "visitadas" pelo tal oferecedor de drogas em pouco mais de dois meses. Isso queria dizer que o bandido ficava mais ou menos uma semana em cada colégio. Portanto, deveria ser um só. Se houvesse mais de um, certamente poderiam atacar mais de uma escola na mesma semana. “Crânio deu um tapa na testa: — É isso! Eu estava errado desde o início. A amostra que está sendo seqüestrada de cada colégio é de dois, e não de três estudantes. O terceiro é um falso aluno, que se matricula em uma escola por semana, fornece um endereço falso e provavelmente diz que vai trazer depois os documentos da escola anterior. Oferece a droga para dois colegas e depois desaparece!” Conceber o método científico como uma sequência rigorosa de passos é conceber de maneira errônea a atividade científica. É preciso superar a visão de ciência como uma rígida sequência de passos que começa com a observação e culmina em uma conclusão/descoberta (PÉREZ, et al., 2001). Na tabela IV são apresentados outros trechos destacados na obra. 21 Tabela IV: Outros trechos destacados da obra de Bandeira (2010) Trechos destacados da obra de Bandeira (2010 ) Chumbinho calou-se, e a hipótese mais terrível surgiu clara na cabeça de Miguel: — Então o Bronca tomou a droga por sua livre vontade? Nesse caso... — Nesse caso a droga foi oferecida a ele tranquilamente, por alguém que ele conhecia e em quem confiava — ajuntou Crânio. — E, se o Bronca estava no Elite sob o efeito da droga, o mais lógico é supor que ele tenha tomado a droga aqui dentro, não é? — É... Parece lógico. — Como? Seres humanos? Gente? Não, não, não, Doutor Q.I. É muito cedo para testar a Droga da Obediência em seres humanos. Ainda mais agora que eu... — Pois você está atrasado, meu caro Caspérides. Já dei a ordem, e a Droga da Obediência está sendo aplicada em quem deve ser. Nada de ratos, camundongos ou papagaios. Gente, Caspérides, gente! — Gente?! O senhor já mandou testar a droga nos loucos? — Loucos? Loucos coisa nenhuma! Essa droga maravilhosa está sendo testada nos jovens mais saudáveis que pudemos encontrar! Caspérides empalideceu: — Gente? E gente sã? Mas esta é uma droga perigosa. Só poderia ser aplicada com ordem médica. E a ética proíbe ao médico aplicar medicamentos em um corpo são! — Ética médica, Caspérides? — riu-se o Doutor Q.I. — A única ética que me importa é a da Pain Control! — Ora, Miguel, lá está você novamente olhando as coisas por um lado só. Não, meu caro, as coisas são relativas. A verdade tem várias facetas. Procure olhar do nosso lado e verá a maravilha de um mundo de paz, sem conflitos, sem turbulências. Eu sei que você dirá que só existe uma verdade. Nesse caso procure entender que essa verdade está nas minhas mãos! — Não! A obediência somente leva à repetição de velhos erros. Só o respeito pela liberdade de cada um pode garantir a sobrevivência da humanidade. Só o respeito pelas opiniões divergentes pode garantir o progresso. Só a desobediência modifica o mundo! 22 4.2 EXPLORAÇÃO DA OBRA DE GÓES E SÁ (2010) Durante análise desta obra, foi identificada a seguinte categoria. 4.2.1 Abordagem CTSA A obra de Góes e Sá (2010) aborda os problemas ecológicos relacionados ao lixo e prevê uma abordagem mais do que somente ecológica, e sim, social, científica e tecnológica ou abordagem CTSA – Ciência, Tecnológica, Sociedade e Ambiente. Esta abordagem surgiu a partir dos anos 50, com o agravamento dos problemas ambientais e diante de discussões sobre a natureza do conhecimento científico e seu papel na sociedade (SANTOS, 2007). Atualmente a abordagem CTSA está incluída no PCN (BRASIL, 2007) e é diretamente vinculada às expectativas de habilidades previstas no Currículo do Estado de São Paulo (2010). O objetivo central desse ensino na educação básica é promover a educação científica e tecnológica dos cidadãos, auxiliando o aluno a construir conhecimentos, habilidades e valores necessários para tomar decisões responsáveis sobre questões de ciência e tecnologia na sociedade e atuar na solução de tais questões (SANTOS, 2007). Uma habilidade prevista para o aluno do sexto ano é reconhecer as medidas que possam reduzir o consumo individual e coletivo. O trecho abaixo faz parte do capítulo “Porque produzimos tanto lixo?” “Você mal chega a aprender um jogo e já vem outro: compra uma roupa nova e a moda muda, então pede outra pra mamãe comprar... E o que fazer com tanta coisa que não usa mais? Joga no lixo? Quanto mais mercadorias compramos e mais recursos naturais consumimos, mais lixo geramos. Precisamos de mais água, mais energia, mais recursos para produzir mais e mais.” Segundo Santos (2007) é importante que o ensino de ciências seja trabalhado de forma contextualizada conforme se pode observar no trecho acima. A obra aborda o motivo do porque produzimos tanto lixo, além disto, discute em uma linguagem simples as implicações sociais do consumo descontrolado. 23 Silva e Araújo (2012) propõem que abordagem CTSA no ensino de ciências seja desenvolvida explorando as dimensões sociais nas quais os fenômenos estão inseridos. Um exemplo destas dimensões sociais abordadas na obra é sobre os catadores de recicláveis como um dos destinos do lixo. “Os catadores são pessoas que alimentam famílias inteiras com o dinheiro da venda dos materiais que descartamos. Essas pessoas fazem um trabalho essencial para a cidade, impedindo que parcelas significativas do nosso lixo acabem nos lixões já lotados e com pouco espaço e fiquem por lá centenas de anos, quando poderiam voltar à cadeia produtiva poupando os recursos naturais do planeta.” No Currículo do Estado de São Paulo (2010) é apontado como expectativa de habilidade identificar e caracterizar os principais métodos de coleta e de destinação, contudo o professor precisa ir além e trabalhar também os problemas sociais envolvidos como aterros irregulares, contaminação de solo e afluentes, falta de coletas seletivas, conforme podemos observar no trecho. “Não podemos nos esquecer de que grande parte do nosso lixo ainda é Depositada em rios, córregos e terrenos baldios de nossa cidade. O que é lamentável não só para a natureza, mas também para nós mesmos. As enchentes provocadas pela abundância de chuvas e que tanto castigam a população das cidades são muito agravadas pelo lixo que é jogado nas ruas entupindo bueiros e galerias.” Nesse sentido, Freire (1970) propõe que a visão crítica de CTSA de temas sociais leva a uma educação problematizadora de modo a assegurar um comprometimento social e de caráter reflexivo dos educandos. Na tabela V podemos observar outros trechos destacados na obra. Tabela V: Trechos destacados da obra de Góes e Sá (2010) Trechos destacados da obra de Góes e Sá (2010) Na verdade, o ser humano é apenas uma das espécies que habitam o planeta, uma das mais novas. No entanto, está conseguindo transforma-lo em um depósito de lixo. Muitos agem como se estivessem saqueando o planeta em busca de mais e mais recursos naturais, e com isso acabando com as matas e florestas, poluindo as águas, o solo e o ar. Qualquer coisa que consumismo interfere de alguma forma no planeta em 24 que vivemos. Consumir de forma consciente é ter clareza desses impactos. Devemos consumir pensando em poupar ao máximo os recursos do planeta. A produção de lixo está ligada aos nossos hábitos de consumo e ao nosso estilo de vida. Na maioria dos países, especialmente nos mais ricos, se consome muito sem a preocupação com o fato de nossos recursos serem finitos. Se todos os habitantes do planeta consumissem como os países mais ricos, precisaríamos de três planetas para continuar existindo. O processo de decomposição desses resíduos contamina a água subterrânea, o solo e o ar, exala mau cheiro, atrai ratos, insetos e vários tipos de doenças. Muitas pessoas, para sobreviver, ainda coletam materiais nos lixões para que possam ser vendidos ou reaproveitados, o que é altamente perigoso. 4.3 EXPLORAÇÃO DA OBRA DE GAARDER (1997) Durante análise desta obra, foi identificada a seguinte categoria que abrangem o termo ciências: a) Biologia evolutiva 4.3.1 Biologia Evolutiva O ensino da evolução nas escolas, e em especial o tema da evolução humana é considerado muitas vezes como uma atividade tensa para muitos professores de Ciências e Biologia, por ser um assunto favorável ao surgimento da polêmica entre criacionismo e evolucionismo (MOURA; SILVA-SANTANA, 2012). Assim, se o educando não compreender bem como ocorre o processo evolutivo é provável que ele não compreenda assuntos futuros relacionados à genética como, a variabilidade genética (BIZZO; OLIVEIRA, 2011). Sejam quais forem às dificuldades, o ensino da evolução humana é um importante componente curricular e romper tais barreiras é necessário para a formação integral do aluno (MOURA; SILVA-SANTANA, 2012). A obra de Gaarden (1997) conta a história de Joakim que encontra um menino de outro planeta chamado Mika. Apesar das estruturas físicas serem muito semelhantes, a origem evolutiva dos dois é diferente. Ao contrário do ensino habitual de evolução em que o professor precisa se vigiar ao usar termos que possam ofender as crenças dos alunos, a obra vai 25 naturalmente divertindo o leitor, sem força-lo a acreditar no evolucionismo, somente oferece fatos que podem ser aceitos ou não. “Mas será que os mamíferos também não precisam botar um ovinho para poder dar à luz um filho-te vivo?” Não pude deixar de rir outra vez, ao ver quanta coisa Mika não sabia sobre a vida neste planeta. Mas de certa forma ele tinha razão; eu é que não tinha pensado muito bem na pergunta. Os mamíferos também produzem pequeninos ovos, chamados óvulos, mas esses óvulos não precisam ter uma casca dura. E há um bom motivo para isso: eles se desenvolvem dentro da barriga da mãe. O ovo vai crescendo dentro dela até ficar pronto, e aí surge a criança viva. Essa última parte era tão difícil de compreender que eu nem tentei explicar direito para Mika. A verdade é que eu mesmo não compreendia muito bem. Sentado ao meu lado, Mika fitava a enseada e o mar ao longe — aquele mar de onde surgiu, um dia, a vida neste planeta. “Um ovo é um milagre”, disse ele por fim. No trecho, conforme acabamos de ver, Joakim tenta explicar a Mika como nascem os seres vivos no planeta Terra. Vale ressaltar neste trecho é a fala de Mika de que “o ovo é um milagre”, ou seja, ele não nega a existência do criacionismo, uma vez que a palavra milagre é relacionada à religião. Segundo Moura e Santana (2012) outro problema relacionado ao ensino de evolução é a falta de entusiasmo ao abordar o tema por parte dos livros didáticos. Para Desilva (2004) os livros didáticos não costumam apresentar debates sobre as novas descobertas e muitas vezes apresentam o assunto de maneira pesada. Ao contrário do que foi dito pelo autor a obra de Gaarden (1997) acontece através de diálogos e discussões entre os dois personagens. “Tem muitos animais assim por aqui?”, perguntou baixinho. Sentei na cama ao lado dele e falei: “Esses aí são dinossauros. Eram animais enormes que viviam aqui há milhões de anos. Daí aconteceu alguma coisa e todos eles morreram.” Mika abriu bem os olhos. “Antes de poderem se desenvolver?” Fiz que sim. “Antes de se transformarem em seres humanos?”, perguntou de novo. 26 Já naquela idade eu sabia bastante coisa sobre a história do nosso planeta. Mas essa pergunta me pareceu tão estranha que eu não sabia responder. Expliquei: “Nessa época ainda não existiam seres humanos por aqui.” Mika pôs o livro no colo e perguntou: “Então de onde você vem?” Essa forma de apresentação dos conteúdos torna a leitura mais leve e pode estimular o educando a gerar seus próprios debates sobre o assunto com os colegas, levando ao pensamento crítico, que conforme foi visto na abordagem CTSA que é fundamental para tornar o aluno membro participativo da sociedade. A obra também contém trechos que podem ser desenvolvidos junto com a disciplina de ecologia ou meio ambiente. “No seu planeta há muitos peixes no mar?” Mika me olhou com uma expressão melancólica. Parecia estar prestes a chorar. Só fez que não com a cabeça. Mudei de assunto depressa: “Bem, mas imagino que haja outros animais lá no seu mar. Vocês conseguem pegá-los?” Mas de novo Mika fez que não: “Antigamente, havia muitas plantas e animais no mar. Mas, há algumas centenas de anos, a água ficou tão poluída que tudo o que havia lá dentro morreu.” Isso me pareceu tão triste e terrível que fiquei com medo de começar a chorar também.” Além disto, como os personagens principais são crianças suas conclusões são divertidas e proporcionam prazer. “O que é isso?” “Um lagarto. É um réptil, e portanto o relacionam com os dinossauros. Mas existem répteis muito maiores. Em alguns países há répteis bem grandes, chamados crocodilos.” Ele arregalou os olhos: “E eles falam?”. “Não, eles não são tão evoluídos!” Quando chegamos perto dos arbustos de groselha, um gato preto veio correndo pelo jardim na nossa direção. Fiquei de cócoras, chamei o gatinho e ele se aproximou. Alisei seu pelo macio e sedoso. O gato miou por algum tempo e logo começou a ronronar. 27 “Não entendo o que ele está falando!”, disse Mika. “É porque os gatos não falam”, expliquei. “Mas eu ouvi quando ele disse miau, miau, e depois prrrrr! Será que ele pensa?” Em vários momentos, as falas são divertidas e os espaços são abertos para o leitor participar como o protagonista. “Foi só aí que eu reparei! E guardei essa grande notícia para lhe contar agora: Mika não tinha umbigo! Percebe, Camila? E você imagina o susto que eu levei? Todos os seres humanos têm um umbigo no meio da barriga. Isso porque, quando ainda estão dentro da mãe, recebem o alimento através de um tubo ligado ao umbigo, chamado cordão umbilical. Mas Mika não tinha umbigo. Sendo assim, como será que ele tinha nascido?” Ao convidar o leitor a tentar solucionar o motivo de Mika não ter umbigo, o aluno passa a ser o protagonista naquele debate, além que este passa a usar o método científico de observação e exploração do material que ele leu até aquele momento na tentativa de solucionar o mistério. Na tabela VI podemos observar outros trechos destacados na obra. TabelaVI: Trechos destacados da obra de Garrder (1997) Trechos destacados da obra de Gaarder (1997) As mudanças de geração em geração são minúsculas”, continuei. “Mesmo assim, essas mudanças podem ficar bem acentuadas quando o passar do tempo dá uma ajudazinha à natureza. E um bilhão, ou seja, mil milhões de anos, é uma bela ajuda! Mil milhões de anos é o mesmo que mil vezes mil vezes mil anos.” Ele compreendeu depressa. “Mas qual é a diferença entre um réptil e um anfíbio?” Eu sabia a resposta para isso: “Os anfíbios botam ovos na água, como os peixes. Mas os répteis botam ovos de verdade, ovos com uma casca dura em volta. Eles não precisam da água para se reproduzir, e por isso podem viver praticamente em qualquer lugar.” “Muito espertos!”, disse Mika. “E esses répteis já são bem adiantados? Eles falam?” Dei risada: “Não! Só os seres humanos têm essa capacidade”. Mas Mika não ficou satisfeito. Queria saber mais. 28 “E você, de que tipo de animal você descende?” “O ser humano é um mamífero”, expliquei. “E os mamíferos se desenvolveram a partir dos répteis. Só que os mamíferos não botam ovos. Eles dão à luz filhotes vivos. “O que é isso aí dentro?”, perguntou horrorizada, como se o peixe fosse um monstro perigoso. “É um peixe!” E logo me apressei a complementar: “É um vertebrado que só pode viver na água, porque não tem pulmões para respirar. Mesmo assim o relacionam comigo e com você, titia, porque todos nós descendemos dos répteis, os répteis descendem do anfíbios, e os anfíbios descendem dos peixes do mar!”. Mika continuou: “Antes de vir ao mundo eu estava dentro de um ovo, que minha mãe e meu pai punham numa almofada grande, num quarto bem aquecido. Eles nunca se atreviam a deixar o ovo sozinho quando queriam sair de casa. Sabe, lá em Eljo existem uns animais maldosos que vivem de roubar os ovos dos outros. Por isso, eles punham o ovo num carrinho e me levavam para todo lugar. Diziam que o ovo era o seu ‘tesouro’, e não eram os únicos pais que davam esse nome ao seu ovo. Em Eljo, um ovo é considerado o tesouro mais valioso que existe.” Eu tinha conversado com Mika quase o dia to-do, mas só agora compreendia de que maneira ele tinha nascido. Ele continuou: “Meus braços e pernas logo ficaram tão fortes que o ovo começou a rachar quando eu dava pontapés ou mexia os braços. Durante esse período, todos os meus parentes ficavam sentados em volta do ovo, observando com a maior atenção”. Respirei fundo e soltei o ar todo de uma vez. Falei então: “E aí... você... saiu do ovo?” Ele fez que sim. “Quer dizer, não me lembro de absolutamente nada. Mas acho que fiquei ofuscado com o brilho da luz. Dentro do ovo o escuro era quase total. E acho que também quase não entrava nenhum som ali. A única coisa que eu fazia era ficar enroladinho, chupando os dedos.” “Não se trata só de saber de onde viemos. A questão também é para onde vamos. Meu passado e o seu são diferentes, talvez muito diferentes. Eu sou um 29 mumbo, e você é um mamífero. Mas aos poucos, com o passar do tempo, meu povo e o seu foram ficando mais parecidos. Estávamos agora discutindo assuntos tão complicados que quase davam um pouco de medo. Mika disse então: “Tanto no seu planeta como no meu, a vida se desenvolveu a partir de organismos simples, de uma só célula. E de que outra forma ela poderia começar? A evolução foi então aperfeiçoando cada vez mais os sentidos e o sistema nervoso. A evolução vem se direcionando para um cérebro cada vez mais complexo e uma compreensão cada vez mais ampla do mundo em que vivemos. E que outra direção ela poderia tomar?”. 30 5 CONCLUSÃO Apesar da literatura frequentemente não ser utilizada como recurso didático de leitura no ensino de ciências os resultados das análises deste trabalho foram favoráveis. Através dos resultados finais, foi possível observar inúmeras possibilidades instrumentais que estas obras possam oferecer para o Ensino de Ciências, por exibir, entre outros aspectos: conceitos científicos, relações éticas e morais, introduções aos aspectos atuais de Educação Ambiental, Ciências e Tecnologias, ecologia e diversidades, promover o uso do método científico, influenciar na formação de um leitor crítico, entre outros aspectos discutidos na exploração do material. Apesar do objetivo deste trabalho não a execução desta investigação, os resultados obtidos com as análises são revelam possibilidades de futuros trabalhos. Desta forma, acredito que este trabalho possa servir de base ou inspiração para outras atividades, tais como a sua aplicação em sala com os mesmos ou outros livros infanto-juvenis. 31 REFERÊNCIAS ANTLOGA, D.C; SLONGAN,I. I. P. Ensino de Ciências e Literatura Infantil: uma articulação necessária. 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