Notas Internacionais (Volume 4) Prefácio 1 Ricardo Seitenfus Embora breves, as considerações que seguem são feitas com satisfação e prazer. A razão é simples: este volume das Notas Internacionais além de abordar temas pertinentes o faz trazendo contribuições originais de jovens pesquisadores de Relações Internacionais da Faculdade Santa Marcelina. Trata-se de contribuição indispensável à afirmação de nossa disciplina indisciplinada. Estudos sistemáticos sobre as RI tardaram a surgir no âmbito universitário. Foi somente após a Primeira guerra mundial que algumas academias da Europa ocidental e dos Estados Unidos debruçaram-se sobre estes temas. O caso brasileiro foi ainda mais tardio já que sequer completou uma geração. Muito fizemos deste então. Contudo muito resta a fazer. Especialmente na criação do conhecimento. Este é o grande desafio. Não podemos continuar veiculando teorias sobre as RI – quando menciono no plural saliento que há muitas maneiras de se relacionar com o mundo e formas diferenciadas de apreendê-lo – sem sequer questioná-las. Ora, tanto o interior de nossa casa quanto a janela que abrimos para olhar o exterior abrigam características próprias. Delas, nascem necessidades específicas que devem orientar políticas singulares. Uma academia efetivamente brasileira de estudos internacionais não pode contentar-se com a subalternidade imposta pela condição de mera reprodutora e divulgadora de conhecimento produzido alhures. Uma academia que não almeja ser mais do que uma correia de transmissão é desmerecedora dos títulos que ostenta. O Brasil finalmente, diríamos nós, deixou de ser um mero espectador frente ao espetáculo do mundo. Abandonou seu caráter reativo e conservador. Atualmente o Brasil toma iniciativas, elabora e operacionaliza propostas, dialoga sobre temas e com parceiros antes desconsiderados. Este mundo dos esquecidos nos aguardava ansiosamente. Ao lembrar-nos dele nos transformamos em ator incontornável no plano regional e importante país no cenário internacional. Espera-se muito do Brasil, e, para que tais expectativas não se frustrem, muito se espera daqueles que se dedicam aos estudos das Relações Internacionais. Ora, se não nos interessarmos pelo mundo, o mundo certamente interessa-se por nós. Assim, temos obrigação de dialogar com o mundo; de entendê-lo, observar o que acontece – e, mais do que isso, compreender o que acontece no lugar em que vivemos. Só assim é possível um diálogo entre pessoas diferentes, entre diferentes nações, entre diferentes mundos, tornando complexo, necessário e ao mesmo tempo fascinante o estudo das relações internacionais. Não basta a reivindicação do espaço brasileiro no sistema internacional; nem a proliferação de suas ações externas, que, nos últimos anos, têm sido numerosas e relevantes. Agora é primordial que se publique, se discute, se reflita sobre as Relações Internacionais: a mídia, a opinião pública, e, principalmente, a academia. Existe produção considerável na área, desde o afloramento do tema, em meados do século 1 Doutor em Relações Internacionais pelo Instituto Universitário de Altos Estudos Internacionais da universidade de Genebra. Professor Titular da Universidade Federal de Santa Maria, Diretor da Faculdade de Direito de Santa Maria (FADISMA) e Membro da Comissão Jurídica interamericana (CJI) da OEA. XX. Trata-se, entretanto, de literatura estrangeira, que nem sempre dá conta dos desafios aqui enfrentados – ou, ainda, sua linguagem não traduz nossos dilemas, que em muito contribuiriam para a formação de novos conceitos e paradigmas. Evidentemente que não se trata de uma barreira idiomática, a qual pode ser facilmente resolvida. Trata-se de uma forjar uma doutrina, ou ao menos de dialogar em uma linguagem que reflita as Relações Internacionais sob um prisma bastante particular – de jovens investigadores e egressos brasileiros da área. Isso porque cabe justamente à academia servir de contraponto ao Estado: questioná-lo, confrontá-lo, e debater com a sociedade suas ações. Mas também a ela cabe, na condição de grupo devidamente qualificado, lapidado, após anos debruçado sobre o mesmo tema – e ao mesmo tempo, transversalmente, sobre tantos outros –, a função primordial de servir de farol às ações estatais, viabilizando que o Brasil, tão incipiente em suas Relações Internacionais, possa usufruir, com justiça e sabedoria, da sua posição de ator regional; e que suas ações externas sejam pautadas em respeito não só aos princípios de direito internacional, mas, fundamentalmente, a princípios humanistas, em especial, de solidariedade. Assim, um dos grandes méritos da obra reside no pioneirismo que ainda consiste a publicação de textos em Relações Internacionais no Brasil. O trabalho merece ainda louvor por se tratar de textos de egressos, que não se intimidaram perante o desafio de trilhar caminhos inexplorados, parcamente sinalizados, a fim de, logo mais, aplicarem na prática os conhecimentos reunidos. Notas Internacionais está ocupando seu espaço nos estudos de nossa área fazendo com que possa existir um verdadeiro e franco diálogo entre agentes do Estado, academia, mídia e sociedade. Os textos abordam questões diversas de profunda atualidade, que interessam não só aos especialistas, pois presentes na mídia, na atual agenda brasileira, nas discussões acadêmicas e na opinião pública em geral. O presente volume cumpre a meta estabelecida pela coleção Notas Internacionais percorrendo um caminho inexplorado com originalidade e ousadia aportando sua contribuição à construção de uma escola brasileira de RI. Santa Maria, 20 de agosto de 2007.