A LIVRARIA PEDRO QUARESMA E O MERCADO DE LIVROS INFANTIS: A CONSTITUIÇÃO DE UM NOVO PÚBLICO LEITOR Aline Danielle Batista Borges Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ UERJ Bolsista FAPERJ E-mail: [email protected] Ilzani Valeira dos Santos Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ UERJ Bolsista FAPERJ Email: [email protected] PALAVRAS-CHAVE: Livraria Quaresma, Literatura Infantil, História do Livro “Tudo quanto tenho feito imprimir, pertencente a essas coleções, não é original, não é novo – nem como tal eu e os editores apresentamos. Mas é verdade também que foi sòmente depois do grande e incomparável sucesso que obtivemos, que outros tiveram a mesma idéia.” PIMENTEL, Figueiredo, 1959, p.7 Nas décadas finais do século XIX e iniciais do século XX, a circulação de livros infantis veiculada no Rio de Janeiro era quase toda importada de Portugal. Neste cenário, dominado por editores estrangeiros, surge Pedro da Silva Quaresma, nascido na região Fluminense do Rio de Janeiro. Este editor tornou-se o novo proprietário da Livraria do Povo, em 1879, a qual, anos mais tarde, tornou-se a Livraria Quaresma, situada na Rua São José, centro da Corte Imperial. Este trabalho, resultante de pesquisa em andamento, objetiva compreender a contribuição deste sujeito no processo de diferenciação e caracterização das produções literárias destinadas ao público infantil, através do "abrasileiramento" das publicações destinadas a elas. Apesar de inicialmente vender edições importadas da Europa, Quaresma logo se engajou nos projetos em disputa pela busca de uma identidade nacional, num momento em que se tornou imprescindível, para o mercado editorial em constituição, que os livros fossem escritos, editados e impressos no Brasil, colaborando para o processo de nacionalização destes. Os livros de Pedro Quaresma eram particularizados, já que o editor decidiu por realizar uma série de modificações nas obras, desde a seleção de textos, privilegiando histórias que despertassem maior identificação no público infantil brasileiro, como também na linguagem, forma e abordagem dos materiais. Sob o ponto de vista comercial, os livros se tornaram mais baratos, tornando-se também mais atrativos, e a inserção de gravuras e ilustrações encantavam ainda mais crianças e adultos interessados em uma história intrigante, com seres místicos e mundos imaginários. Segundo El Far (2004, p. 94), “a impressão das palavras era feita com ‘letras de fantasia’ e a capa criptografada em cores...”, mostrando toda a magia que perpassava estes exemplares. Sem dúvida, as novas tecnologias de impressão e formatação oxigenaram o mercado de livros, pois com o auxílio dos novos tipógrafos foi possível elaborar livros com maior rapidez, flexibilidade e a custos reduzidos. Destarte, criou-se a partir deles, a possibilidade de confeccionar livros mais populares, menos luxuosos e requintados, logo, mais acessíveis a outras camadas da população. Com a vulgarização do texto impresso, surgem neste novo cenário, personagens que em tempos de outrora não eram contemplados. Públicos dantes silenciados passam a ganhar notoriedade, tendo os textos que se adaptarem, portanto, a esta nova demanda. Mulheres, crianças, e “pessoas com pouca instrução já eram vistas com livros nas mãos” (EL FAR, 2006, p. 9). Exemplares com enredos arrebatadores, impactantes e muitas vezes desaconselháveis aos mais recatados eram vendidos aos montes nesta livraria, permitindo-lhe atingir altas tiragens e reedições, e revelar ao mundo literário alguns autores não muito bem quistos pela sociedade literária dita tradicional. Neste contexto, ganha visibilidade a iniciativa de Pedro Quaresma, editor que se destacou pela seleção de textos com conteúdos e formas “abrasileirados”, revelando uma preocupação em “inventar tradições” nacionais, produzindo mitos, heróis brasileiros e estórias típicas de nossa terra. Segundo EL FAR (2006, p. 25), “Quaresma publicou livros para crianças, numa época em que ainda não havia literatura infantil brasileira nas prateleiras”. Portanto, buscamos compreender a contribuição deste sujeito para o mercado editorial brasileiro, e, como metodologia, optamos por nos debruçarmos sobre alguns exemplares da Coleção Biblioteca Infantil da Livraria Quaresma, cujo primeiro volume foi lançado em 1894, sob a organização do jornalista Figueiredo Pimentel1. A partir de alguns volumes desta coleção, elencaremos uma série de elementos que nos permitirão entender os significados destes impressos para o seu público destinatário, público este ainda pouco explorado pela concorrência. Quaresma, portanto, passa a ocupar um espaço antes pouco movimentado, e alcança grande sucesso em suas aspirações. Até então, conforme palavras de BORGES LEÃO (2004, p. 2): “Os livros aqui editados não traziam símbolos pátrios, bandeiras, datas comemorativas, biografias e feitos de heróis ou letras de hinos. Eles bem poderiam difundir, fora das práticas pedagógicas, modelos de condutas, sensibilidades e sentimentos.” Sendo assim, em um mercado paralelo àquele glamouroso da rua do Ouvidor, com sua elegante e requintada clientela, viajaremos pela Livraria Quaresma, e pelos livros infantis por ela lançados, esmiuçando suas obras e analisando as informações que nos parecerem pertinentes. Em um primeiro momento, cabe informarmos que todos os exemplares contêm, antes de suas respectivas dedicatórias, a frase personalizada que caracteriza o pertencimento da obra, conforme o exemplo: “Os contos da Carochinha são de única e exclusiva propriedade da LIVRARIA QUARESMA.” (grifo nosso). Tal iniciativa já nos fornece vestígios de que havia tensões, embates e disputas neste mercado, ressaltado pelo interesse do proprietário da Livraria em registrar tal informação, e, podemos ler nas entrelinhas, que seu projeto soa como pioneiro, com um quê de diferencial. De acordo com Borges Leão (2004, p. 7): “Quaresma sempre pedia aos leitores que se certificassem da autenticidade dessas obras, que deveriam vir com o selo da editora, o 1 Importante ressaltar que, na ocasião do lançamento desta coleção, Figueiredo Pimentel já tinha ganhado mais visibilidade no meio literário, devido a sua bombástica obra “O aborto”, obra esta não recomendada a moças de boa conduta. que acaba revelando a forte concorrência pelo gênero das publicações populares e a disputa por um mercado cativo.” Fornece-nos um indício de que, apesar de haver outros livros destinados ao público infantil, os exemplares de Quaresma eram especiais, pois traziam consigo uma marca específica, particularizada, a partir de uma perspectiva diferenciada, e portanto, únicos e exclusivos. Isto pode ser confirmado pelas palavras abaixo, retiradas do exemplar Contos da Carochinha: “As obras, nesse gênero, que havia em português, ou eram mal escritas, e até imorais, ou destinavam-se ao estudo de nossa nacionalidade. (...) ao mesmo tempo que deleita as crianças, interessando-as com a narração de contos morais muito bem traçados, lhes desperta os sentimentos do Bem, da Religião e da Caridade, principais elementos da educação da infância.” (PIMENTEL, Figueiredo, 1959, p. 7,8) Percebemos que o conteúdo do prefácio acima visa reafirmar e legitimar o uso do livro, ressaltando os benefícios, atributos, e seu caráter para além do puro entretenimento, revelando, também, seu cunho moral, cujo caráter formativo objetiva incentivar no mais tenro leitor os princípios morais valorizados em sua época. Em um período em que era muito raro que livros fossem reeditados, alguns livros da Biblioteca Infantil tiveram inúmeras edições esgotadas, como é o caso desta obra da qual mencionamos, cujas edições ultrapassaram o valor de vinte. Conforme o próprio autor relata: “Tão grande número de edições, em pouco espaço de tempo, é a prova mais cabal de sua aceitação...” (PIMENTEL, Figueiredo, 1959, p. 9) “Para quem conhece o que é o pequeno movimento literário no Brasil, o fato de uma obra qualquer chegar à segunda edição, é garantia certa do seu sucesso indiscutível.” (PIMENTEL, Figueiredo, 1959, p. 5) A segunda citação encontra-se na obra Histórias do Arco da Velha, que alcançou, pelo menos, mais de dez edições. E esta não é uma experiência isolada, e sim presente em toda a coleção. Após quatro anos de seu lançamento, “já em 1898, todos os livros da coleção atingiam a sexta edição, havendo alguns na décima, e até, na décima oitava” (BORGES LEÃO, 2003, p.6), fomentando ainda mais o mercado editorial. Um outro elemento importante, e que acaba por se tornar uma estratégia da Editora Quaresma é o favorecimento à tradição oral, como bem registram seus autores em suas clássicas palavras iniciais, conforme o trecho abaixo de Histórias do Arco da Velha: “Esplêndida coleção dos mais célebres contos populares, morais e proveitosos de vários países, (...) e outros recolhidos diretamente da tradição oral.” PADILHA, Viriato, 1959, p.3 A legitimação das obras ocorre sob vários aspectos: 1. através da incorporação de alguns exemplares pelas escolas, 2. através dos elogios públicos de alguns conceituados profissionais – professores abalizados, jornalistas distintos, literatos eminentes, pais e mães de família – que endossavam o discurso de que este novo formato apresentado pela Editora em ascensão era o mais apropriado às crianças, e 3. através das altas vendagens de suas obras. No livro Contos do País das Fadas, temos a seguinte frase que apenas ratifica nossa afirmação: “Uma comissão de homens de letras, oficialmente designada, classificou esta obra entre as dez melhores, escritas no Brasil, para crianças.” (FONSECA, Gondim da, 1960, p.4) No prólogo do livro acima citado, encontramos uma fala do autor que nos remete ao movimento de abrasileiramento dos livros, pontuando que os textos não foram extraídos da literatura francesa, como grande parte das obras produzidas à época. Lê-se, portanto: “São histórias populares da Romênia (...) achei-as muito mais encantadoras do que todos os contos de fadas recolhidos em França ou traduzidos em francês, que são os que andam vulgarizados entre nós (...) diz o ditado: quem conta um conto acrescenta um ponto. Eu, por vezes, abusei da licença. Tendo de contar para o nosso povo de calça curta e em língua nossa, claro que contei à minha moda, alterando o que me apeteceu e remodelando por vezes muita coisa.” (FONSECA, Gondim da, 1960, p.5,6) Neste sentido, podemos identificar como linha mestra desta proposta da editora Quaresma, que ganhou grande notoriedade, adeptos e simpatizantes de diversos grupos sociais é o fato de que se estava remodelando e expandindo o lugar da criança enquanto leitora e enquanto consumidora de livros. E quando falamos de criança, importante lembrar que o alvo comercial de Quaresma estava focado nas camadas mais populares, o que demandava da editora uma preocupação em relação aos custos do livro, e até mesmo ao próprio conteúdo do mesmo. No exemplar de Teatrinho Infantil, percebemos claramente que o público contemplado também passa pelas camadas mais desprovidas de renda: “... próprio para serem representadas por crianças de ambos os sexos, dispensando-se despesas com cenários, vestimentas e caracterização...” (grifo nosso) (PIMENTEL, Figueiredo, 1959, p. 3) Notemos que apesar da brandura das palavras, este mercado prossegue em tensão, palco de disputas e jogos de interesses, no intuito de angariar leitores fiéis, e altas vendas de seus exemplares. “A maneira como o livro, cada vez mais, passava a ser visto: como uma mercadoria lucrativa...” (EL FAR, 2004, p. 47), acaba por nos revelar que o cunho econômico também influenciava as escolhas, preferências e deliberações de editores em relação a alguns formatos e conteúdos, alterando, no fim do processo, os preços dos exemplares. Por exemplo, na Livraria Quaresma, um exemplar da Biblioteca Infantil poderia ser adquirido por um leitor por cr$ 80,00, preço este bem abaixo do mercado da época. Tal empreitada organizada por Quaresma, permitiu a ele um alto acúmulo de capital, tamanha era a vendagem de seus exemplares e o sucesso que seus gêneros faziam. O movimento e as disputas entre os grupos está bem sinalizado, conforme o trecho abaixo: “O presente volume (...) não é uma obra literária que desperte interêsse e curiosidade pelo seu valor artístico, pelo seu entrecho, pelo oportunismo de sua publicação, ou ainda por qualquer nota escandalosa que pudesse aguilhoar a atenção do público...” (grifo nosso) (PIMENTEL, Figueiredo, 1959, p. 5) Importante mencionarmos que se estabelece um canal com a escola, com os novos métodos pedagógicos por ela adotados, revelando o quão sintonizados os livros estavam, adquirindo, portanto, segundo os próprios autores, o status de obra pioneira. Em Histórias Brasileiras, o autor Tycho Brahe se intitula “partidário do ensino intuitivo”, que é natural, sem ficções e que sua escrita para as crianças tem o objetivo de ensinar distraindo. Dentro desta perspectiva, opta pela fábula, vocábulo latino, que remete a “uma pequena narração de acontecimentos fictícios, que tem dupla finalidade: instruir e divertir.” (CARVALHO, 1982, p.42). Nas obras Álbum das crianças e Teatrinho Infantil, Figueiredo Pimentel compartilha com o leitor uma das vertentes de sua visão pedagógica: o ato de decorar como sendo uma das prioridades desta metodologia de ensino. Na primeira tem-se: “Contendo esplêndidas e admiráveis poesias (...) dos melhores autores brasileiros e portugueses, próprias para serem lidas e decoradas por crianças, que assim aprendem a recitar e a declamar...” Na seguinte: “Primeiro que tudo, aprendem a decorar, tomam gosto em decorar, porquanto não se trata da lição obrigada para a aula (...) Representando em casa, ou nos colégios, o aluno adquire inconscientemente certo desembaraço, sangue-frio e presença de espírito, abandonando o acanhamento peculiar da idade.” Em entrevista no ano de 2001, Marisa Lajolo afirmou que “a literatura sempre concorreu com outras formas de lazer”2. Se hoje, o que percebemos é que outras fontes de conhecimento e divertimento concorrem com a leitura de livros, quiçá em um período em que o hábito de ler ainda não estava totalmente disseminado, sedimentado e vulgarizado. Esse público infanto-juvenil ainda estava em constituição, e portanto, esta prática da leitura ainda estava em fase de alimentação. Pensando sob este ponto de vista, fica ainda mais ressaltado que, ainda que o contexto se assemelhasse ao acima exposto, a credibilidade e o gosto pelos livros da Editora Quaresma apenas se ampliavam, pois as tiragens eram altíssimas para a época, o que nos permite saber que este público, apesar de sua tenra formação, já se tornara cativo e fiel da Livraria em estudo, intitulada às portas do estabelecimento como “Livraria do Povo” (EL FAR, 2004, p. 31). Havia um público presente, à espera de uma nova obra ou até mesmo à espera de uma nova edição de sua obra predileta, pois, de acordo com alguns autores dos livros, era dada como certa a satisfação dos leitores, pois sempre a uma nova edição, novos elementos era incorporados, como por exemplo, a inserção de ilustrações. Interessante notar que a própria Livraria Quaresma se dispõe no mercado editorial como sendo a favorita entre os pequeninos, o que pode ser verificado no trecho abaixo, extraído de Histórias do Arco da Velha: 2 A entrevista completa pode ser vista em http://www.educabrasil.com.br/eb/exe/texto.asp?id=454. “Continuamos impávidos, satisfeitos, dos esforços que temos feito, porque as crianças brasileiras já conhecem, e só procuram, e só pedem a BIBLIOTECA INFANTIL” (PADILHA, Viriato, 1959, p. 6) Há ainda outros elementos que merecem ser trabalhados nesta pesquisa, como a utilização do livro como ferramenta de propagação de ideários nacionais, com vistas à vindoura modernidade em detrimento dos tempos de atraso de outrora, e a disseminação da religião católica, através da inculcação de determinados hábitos, costumes e comportamentos tidos como desejáveis à época. Um dos exemplares que mais caracteriza esta afirmação acima é Histórias Brasileiras, cujo autor, sintonizado com um pensamento do período em questão - fim do século XIX e início do XX - buscou incorporar em sua escrita, uma espécie de manual para os “brasileirinhos”, conforme abaixo: “...além de ensinos de moral e cívica, visando despertar nas crianças o interesse pelos acontecimentos da terra natal, em detrimento de fatos acontecidos em países estrangeiros.” (BAHE, Tycho, 1959, p. 5) “Quisemos sair fora dos moldes velhos”, afirma Figueiredo Pimentel (1956, p.5). Para descrever em linhas gerais as obras, os autores se apropriam de uma linguagem que revela as vicissitudes de um projeto nacional de desenvolvimento. Palavras como moderno, novidade, inéditos... compõem a escrita destes autores, ressaltando ainda mais que estavam empenhados em integrar o vigoroso movimento em direção ao processo de constituição do Estado Nacional e de um "povo" que pudesse bem representá-lo. Fica latente em alguns dos livros que havia um interesse, por parte da edição dos mesmos, que se incentivasse através da leitura a constituição de uma identidade nacional, visto que, movidas por interesses os mais difusos possíveis, sucedia-se um “abrasileiramento” do Brasil. Com efeito, passou-se a ver o livro não apenas como fonte de rendas e lucros, mas também como veículo de uma ideologia nacionalista. Se no século XVIII, conforme nos indica Márcia Abreu (2004, p.2), “aqueles que viviam aqui recorriam com freqüência à importação para obter os livros de que necessitavam”, sendo, além de muito custoso (ou seja, para um público muito restrito), era também muito cansativo; agora, com a sedimentação deste novo modo de comercializar livros, os chamados “Livros para o Povo”, este cenário é ampliado e algumas fronteiras são vencidas. Estes livros, que de acordo com El Far (2004, p.4), tinham o intuito de alcançar “uma camada urbana assalariada e alfabetizada que crescia diariamente”, acaba por conquistar os infantes desta classe, minimizando a carência de livros infantis voltados para esta camada da população. O burburinho causado pelos exemplares pode ser visto no trecho abaixo: “...uma freguisia perguntona, espalhafatosa, vozeiruda (...) que arrancava notas de dois e cinco mil réis do fundo de lenços de chitas, muito sujos, armados em carteiras, para comprar as brochurinhas, postas em capas de espavento.” EDMUNDO, Luiz apud EL FAR, 2004, p.8 Percebe-se, portanto, a presença das mães e pais como freqüentadores da Livraria, compartilhando, também, papéis neste cenário de comercialização de livros infantis. Inclusive, alguns autores se referem a eles no início de suas obras, escrevendolhes em particular, como em Histórias da Baratinha: “Venho recomendar-vos, senhoras brasileiras que tendes filho, a Biblioteca Infantil, editada pelos Senhores Quaresma & Cia. livreiros na Capital Federal”(...) É porque eu amo as crianças, que vos recomendo livros para crianças. Tudo quanto se diz respeito aos pequeninos me interessa sobremodo. São os cidadãos de amanhã, são as futuras mães e esposas. Neles a pátria confia, e deles tudo espera.” GUERRA, Olavo, 1896, p.5,6 Nota-se, também, a valoração da religião na maioria das obras desta coleção, sempre ressaltando a moralidade tão preservada pela sociedade de então, potencializando os saberes inerentes ao cristianismo, dando voz a personagens tipicamente conhecidos por seus feitos em prol desta religião em nossa nação. Valores como obediência, altruísmo, companheirismo recheiam as histórias e permitem abordar estes comportamentos de forma diluída e agradável no texto. A família também protagoniza algumas histórias, aparecendo como instituição que deve ser privilegiada pelo infante. Philippe Ariès, retrata a infância como um longo caminho percorrido. De pequenos adultos a serem assexuados insignificantes, ao longo da história adquire o status de classe etária diferente e com interesses próprios. Quando esta infância passa a ser particularizada no século XIX, privilegiando a família, a literatura também assume este ideal, o que acaba por ser retratado nos livros. Sendo assim, mesmo que este trabalho seja fruto de uma pesquisa em curso, e, portanto, incipiente, pudemos já perceber que a coleção representou uma inovação no campo das obras destinadas à infância, pois, ao alterar o corpus das obras, alterou-se, também a percepção do leitor, seu modo de interagir com as obras, suas expectativas, representações e distintas apropriações em relação a elas. Desta forma, procuramos não apenar dar visibilidade às ações do senhor Pedro Quaresma, como também projetar luzes a este público infantil, hoje consolidado – vide bienais, feiras de livros etc. Quaresma e seus parceiros, como Figueiredo Pimentel, utilizando-se de diversos mecanismos, artifícios e técnicas, conseguiram conquistar, cativar e incentivar à boa leitura o mais tenro leitor. Portanto, parece-nos justo finalizarmos este estudo com as palavras do renomado senhor Gondim da Fonseca: “Escrevi para crianças e não para folcloristas. Não gosto de gente grande( abril de 1932)3 ” 3 FONSECA, Gondim da. Contos do País das Fadas. Biblioteca Infantil da Livraria Quaresma. Rio de Janeiro: Livraria Quaresma, 1960. p. 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABREU, Márcia. Impressão Régia do Rio de Janeiro: novas perspectivas. Convergência Lusíada, n. 21. Real Gabinete Português de Leitura. Centro de Estudos Pólo de Pesquisa sobre Relações Luso-brasileiras, 2005. ARIÈS, Philippe. História da Criança e da Família. Tradução de Dora Flaksmam. 2.ed. Rio de Janeiro: Livros técnicos e Científicos,1981. BAHE, Tycho. Histórias Brasileiras: Contos para Crianças. 4ª edição. Biblioteca Infantil da Livraria Quaresma. Rio de Janeiro: Livraria Quaresma, 1959. BORGES LEÃO, Andréa. Brasil em imaginação: livros, impressos e leituras infantis (1890-1915). XXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – BH/MG, 2004. CARVALHO, Bárbara Vasconcelos de. A literatura infantil: visão histórica e crítica. 2ª edição. São Paulo: Edart, 1982. 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