Rev Bras Cardiol. 2012;25(3):192-199 maio/junho Artigo Original 4 Pedroso et al. Polimorfismos da ECA e Reposição de GH na DGH Artigo Original Polimorfismos do Gene da Enzima Conversora de Angiotensina e Avaliação Cardiovascular em Adultos com Deficiência do Hormônio do Crescimento Angiotensin Converting Enzyme Gene Polymorphisms and Cardiovascular Evaluation in Growth Hormone Deficient Adults João Manoel de Almeida Pedroso1, Ana Beatriz Winter Tavares2, Flávia Lucia Conceição2, Beatriz Vaz de Melo Mendes3, Rosane Silva4, Turan Peter Urmenyi4, Mario Vaisman2, Edson Rondinelli1, Nelson Albuquerque de Souza e Silva1 Resumo Abstract Fundamentos: A enzima conversora da angiotensina (ECA) é importante reguladora da pressão arterial (PA). Polimorfismos no gene da ECA estão associados a alterações na PA. Não existem ainda estudos sobre a reposição de hormônio do crescimento (GH) em adultos com deficiência do hormônio do crescimento (DGH) de acordo com os genótipos da ECA. Objetivo: Avaliar a resposta cardiovascular ao GH em adultos com DGH de acordo com o seu genótipo da ECA. Métodos: Avaliados 18 pacientes com hipopituitarismo de acordo com o genótipo da ECA no basal e 24 meses após reposição com GH de acordo com parâmetros clínicos e cardiovasculares. Resultados: Dez mulheres e 8 homens foram avaliados (média de idade 44,9±10,9 anos). Distribuição genotípica encontrada: genótipo DD: 7 (38,9%) pacientes; genótipo ID: 11 (61,1%) pacientes. Frequência cardíaca, PA sistólica e diastólica, carga pressórica sistólica e diastólica, e funções sistólica e diastólica foram normais em todos os pacientes. Na avaliação basal, pacientes com genótipo DD demonstraram níveis de PA sistólica, diastólica diurna e nas 24 horas mais altos (p<0,05); carga pressórica diastólica maior (p<0,05). Comparando-se os dois genótipos ao final do estudo, os pacientes com genótipo DD evidenciaram: redução estatisticamente significativa da pressão diastólica diurna e nas 24 horas, da carga pressórica sistólica e diastólica diurna e nas 24 horas; e aumento da frequência cardíaca noturna (p<0,005). Conclusão: Os resultados sugerem que pacientes com DGH e genótipo DD apresentam maiores benefícios com a reposição com GH em relação ao controle da PA. Background: The angiotensin-converting enzyme (ACE) is an important blood pressure (BP) regulator, and ACE gene polymorphisms are associated with alterations in BP. No studies have yet been conducted on growth hormone (GH) replacement in adults with GH deficiency (GHD) according to ACE genotypes. Objective: To evaluate cardiovascular response to GH treatment in adults with GHD according to their ACE genotype. Methods: 18 patients with hypopituitarism were evaluated by baseline ACE genotype and after 24 months of GH replacement, compliant with clinical and cardiovascular parameters. Results: 10 women and 8 men were evaluated (mean age 44.9±10.9 yrs). The distribution of the ACE genotype was: DD genotype: 7 patients (38.9%); and ID: 11 patients (61.1%). Heart rate, systolic and diastolic BP, diastolic BP load, and systolic and diastolic functions were normal in all patients. For the baseline evaluation, DD genotype patients demonstrated higher levels of diurnal and 24-hour systolic and diastolic BP (p<0.05), and higher diastolic BP loads (p<0.05). Comparing the two genotypes at the end of the study, DD genotype patients showed a statistically significant decrease (p<0.005) in: 24-hour and diurnal diastolic BP, 24-hour and diurnal systolic and diastolic BP load; and also an increase in nocturnal heart rate (p<0.005). Conclusion: The results suggest that patients with GHD and DD genotype present more benefits from GH replacement in relation to BP control. 1 2 3 4 Serviço de Cardiologia - Hospital Universitário Clementino Fraga Filho - Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - Rio de Janeiro, RJ - Brasil Serviço de Endocrinologia - Hospital Universitário Clementino Fraga Filho - Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - Rio de Janeiro, RJ - Brasil Instituto de Matemática - Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - Rio de Janeiro, RJ - Brasil Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho - Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - Rio de Janeiro, RJ - Brasil Correspondência: Ana Beatriz Winter Tavares E-mail: [email protected] Rua Barão de Lucena, 135 ap. 202 - Botafogo - 22260-020 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil Recebido em: 13/02/2012 | Aceito em: 18/05/2012 192 Pedroso et al. Polimorfismos da ECA e Reposição de GH na DGH Artigo Original Rev Bras Cardiol. 2012;25(3):192-199 maio/junho Palavras-chave: Peptidil dipeptilase A/genética; Hormônio do crescimento humano/deficiência; Adulto; Polimorfismo genético; Sistema renina-angiotensina Keywords: Peptidyl – dipeptidase A/genetics; Human growth hormone/deficiency; Adult; Polymorphism, Genetic; Renin-angiotensin system Introdução Portanto, o objetivo deste trabalho foi avaliar a resposta cardiovascular ao tratamento com GH em adultos com DGH de acordo com seu genótipo. Já está bem documentado o aumento da morbimortalidade cardiovascular em adultos com deficiência do hormônio do crescimento (DGH)1,2. Esses pacientes apresentam maior incidência de aterosclerose prematura, alterações na composição corporal (aumento da massa gorda e diminuição da massa magra), piora do perfil lipídico (aumento do LDL e redução do HDL), redução da densidade mineral óssea, diminuição da capacidade ao exercício e disfunção endotelial3. Adultos jovens com DGH desde a infância têm massa de ventrículo esquerdo (VE) menor e função sistólica prejudicada4. A enzima conversora de angiotensina (ECA) tem um papel central na regulação da pressão arterial (PA) e no balanço hidroeletrolítico, através do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA)5. Em 1990 foi descoberto um polimorfismo de inserção (I) / deleção (D) no íntron 16 do gene da ECA que é responsável pela variação da concentração sérica da ECA na população normal. Indivíduos podem ser homozigotos para o alelo de deleção (DD), heterozigóticos (ID), ou homozigotos para o alelo de inserção (II). Indivíduos com genótipo DD têm concentração sérica da ECA aproximadamente duas vezes maior que aqueles com o genótipo II6. O genótipo DD está associado a maior risco de infarto do miocárdio7, disfunção endotelial8, crescimento de VE relacionada ao exercício9, níveis mais elevados de lipoptoteína(a)10. Os polimorfismos do gene da ECA não foram relacionados a alterações no perfil lipídico, apolipoproteína B (apoB), apolipoproteína A-I e índice de massa corporal10. Estudo sobre o prognóstico de diabéticos do tipo 2 com maior risco renal e cardiovascular mostrou que o genótipo da ECA não teve impacto no prognóstico renal e cardiovascular11. Os genótipos da ECA já foram relacionados à resposta terapêutica em pacientes com nefropatias proteinúricas crônicas, hipertensão arterial e disfunção endotelial, demonstrando melhores resultados terapêuticos em pacientes com o genótipo DD com o tratamento com inibidores da ECA (iECA)12,13. Os benefícios da reposição do hormônio do crescimento (GH) no perfil lipídico, na função cardíaca e endotelial em adultos com DGH estão bem documentados14,15. Entretanto, não existem estudos sobre a reposição de hormônio do crescimento (GH) em adultos com DGH de acordo com os genótipos da ECA. Metodologia Foram estudados 18 adultos com DGH em reposição com GH pelo período de dois anos, no ambulatório de Endocrinologia do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho. Os critérios de inclusão no estudo foram: a) DGH confirmada por pelo menos 1 ano (DGH isolada ou múltiplas deficiências hipofisárias). A confirmação da DGH foi determinada por teste estimulatório [teste de tolerância à insulina (ITT)] com pico de GH <3ng/mL; b) pacientes que já haviam feito tratamento prévio com GH e estavam há pelo menos 1 ano sem reposição; c) pacientes com outras deficiências hipofisárias em reposição adequada por pelo menos três meses (levotiroxina, prednisona e/ou esteroides sexuais). Os critérios de exclusão foram: doença mental, gravidez, diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica não controlada, doença aguda grave, doença hepática ou renal crônica, história de malignidade, doença cardíaca. A reposição de GH foi feita em todos os pacientes com GH recombinante Norditropin® da Novo Nordisk (3UI/mg). A dose inicial de GH foi 0,015mg/kg/ semana, subcutâneo, ao deitar. O ajuste da dose ocorreu de acordo com o fator de crescimento insulinasímile (IGF-I), quando necessário. Considerou-se a dose ideal aquela que manteve o nível sérico de IGF-I no limite superior da normalidade para a idade. Os pacientes foram avaliados antes e 24 meses após a reposição de GH, em relação às seguintes variáveis: genótipo da ECA; idade (anos); sexo; peso corporal (kg); altura (cm); superfície corporal [SC=pesox4+7)/90 + peso) (m2)]; índice de massa corporal (IMC=kg/m2); pressão arterial (mmHg); frequência cardíaca (bpm); tabagismo; consumo de bebidas alcoólicas e/ou medicamentos. O consumo de álcool foi avaliado da seguinte forma: ≥4x/semana; 1-3x/semana; raramente (<1x/semana). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, sob o nº 077/98 e todos os pacientes 193 Rev Bras Cardiol. 2012;25(3):192-199 maio/junho participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Avaliação laboratorial A dosagem de IGF-I foi realizada através de método imunorradiométrico (DSL-5600 ACTIVE TM ). Os coeficientes de variação intra e interensaio variaram entre 1,5–3,4%, e 1,5–8,2%, respectivamente. O valor mínimo de detecção foi 0,8ng/mL. O valor máximo de referência de acordo com a idade foi: 20-40 anos: 494ng/mL; 40-50 anos: 303ng/mL; 50-70 anos: 258ng/mL. A dosagem de GH foi feita através de ensaio imunorradiométrico em substrato quimioluminescente IMMULITE – DPC. Os coeficientes de variação intra e interensaio variaram entre 5,3-6,5%, respectivamente, com valores de GH variando entre 1,7–3,1ng/mL. O valor mínimo de detecção foi 0,01ng/mL. Avaliação cardiovascular Para a avaliação cardiovascular foram utilizados: eletrocardiograma (ECG); monitorização ambulatorial da pressão arterial em 24 horas (MAPA); e ecocardiograma uni e bidimensional com Doppler. O ECG com 12 derivações foi realizado em repouso e avaliado por dois cardiologistas. Caso as análises fossem discordantes, um consenso era definido pelos dois cardiologistas. O MAPA foi realizado com o monitor Tycos Quiet Track de método auscultatório através de aferição indireta (não invasiva) da PA sistólica e diastólica durante o período de 24 horas, durante atividades habituais do paciente. As leituras ocorreram a cada 10-15 minutos durante o período diurno e a cada 20-30 minutos durante o período noturno. Considerou-se o período diurno entre 8:00h e 22:59h, e o noturno entre 23:00h e 7:59h. Foram analisados: PA sistólica e diastólica média, carga pressórica sistólica e diastólica e análise da queda da PA durante a noite (descenso noturno). Os resultados foram interpretados de acordo com o II Consenso Brasileiro para o uso da Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial16. Para a avaliação ecocardiográfica utilizou-se ecocardiógrafo bidimensional com Doppler colorido (marca Interspec, modelo Apogee). Todos os exames foram realizados por um investigador que desconhecia o perfil genético dos pacientes. As medidas foram feitas nos três ciclos cardíacos, de acordo com as recomendações da Sociedade Americana de Ecocardiografia: espessura da parede 194 Pedroso et al. Polimorfismos da ECA e Reposição de GH na DGH Artigo Original posterior do ventrículo esquerdo (VE) em diástole (PPVEd) e sístole (PPVEs), do septo interventricular em diástole (SIVd) e a dimensão do ventrículo esquerdo em diástole (VEd) e sístole (VEs), o diâmetro da raiz da aorta e do átrio esquerdo. A massa de ventrículo esquerdo foi calculada pela fórmula de Devereux 17, e o índice de massa do ventrículo esquerdo (IMVE) determinado pela razão entre a massa do ventrículo esquerdo e a área da superfície corporal (ASC). A função sistólica global do ventrículo esquerdo foi avaliada pelo modo-M, através do cálculo da fração de ejeção pela fórmula: [(VE diastólico 2 –VE sistólico2) / VE diastólico2] x 100 (%) – considerandose função sistólica normal quando a fração de ejeção ≥55%. A fração de encurtamento sistólico foi calculada através da fórmula: [(VEd–VEs)/Ved] x100. A função diastólica foi investigada com medida do fluxo mitral, através dos picos de velocidade no início da diástole (onda E) e no final da diástole (onda A), sendo calculada, em seguida, a relação da onda E/A. Os tempos de desaceleração (DT), tempo necessário para o pico da velocidade E cair à linha de base, e de relaxamento isovolumétrico (TRIV), período entre o fechamento da válvula aórtica e a abertura da válvula mitral, também foram medidos. Detecção do polimorfismo da ECA A extração genômica do DNA foi realizada através da técnica de Miller et al.18. Os genótipos da ECA foram determinados pela reação de polimerização em cadeia (PCR), conforme descrito por Cambien et al.19. A análise dos genótipos foi realizada por eletroforese em gel de agarose 1% após eletroforese, e visualização em coloração com brometo de etídio. O genótipo foi demonstrado pela presença de um fragmento de 190bp (de deleção, alelo D), e um fragmento de 477bp (de inserção, alelo I). Análise estatística O estudo foi realizado em amostra de conveniência. Para comparação de dados numéricos entre os dois grupos (genótipo DD e ID) foi aplicado o teste não paramétrico de Mann-Whitney. Para análise da variação significativa entre os dados numéricos do período basal e de 24 meses após tratamento com GH utilizou-se o teste de Wilcoxon. Foram aplicados testes não paramétricos devido à grande dispersão de algumas variáveis (carga pressórica) e pelo pequeno tamanho da amostra em cada grupo de genótipo. Pedroso et al. Polimorfismos da ECA e Reposição de GH na DGH Artigo Original Rev Bras Cardiol. 2012;25(3):192-199 maio/junho O critério de determinação de significância adotado foi o nível de 5%. A análise estatística foi processada pelo software estatístico SAS® System. Utilizou-se o modelo linear de efeitos mistos20 para comparar a resposta terapêutica ao GH nos diferentes genótipos. O modelo foi ajustado pelo método “REML”, que aumenta a verossimilhança. Resultados Dezoito pacientes [10 (55,5%) mulheres e 8 (44,5%) homens] foram avaliados durante dois anos de reposição de GH. Nenhum paciente apresentava sintomas cardiovasculares no início do estudo, e apenas 1 (5,6%) paciente era portador de hipertensão arterial sistêmica leve em uso regular de anti-hipertensivo (nifedipina de ação prolongada 20mg/dia). A média de idade foi 44,9±10,9 anos (22-65 anos). A duração média da DGH foi 10,2±9,14 anos. O valor médio do pico de GH no teste de estímulo foi 0,29±0,32ng/mL; e o valor médio do IGF-I sérico basal foi 82,91±61,40ng/mL. Apenas 1 paciente era tabagista e 2 pacientes relataram consumo de álcool em baixas doses uma vez por semana. A avaliação eletrocardiográfica basal e final foi normal em todos os pacientes. A frequência cardíaca, PA sistólica e diastólica, carga pressórica diastólica, e função sistólica e diastólica ao ecocardiograma foram normais em todos os pacientes no início e ao final do estudo. A distribuição do genótipo da ECA foi: genótipo DD: 7 (38,9%) pacientes; genótipo ID: 11 (61,1%) pacientes. Nenhum paciente tinha o genótipo II. A frequência do alelo D foi 69,4% e do alelo I, 30,6%. Não houve diferença entre os genótipos DD e ID com relação a: pico de GH no teste provocativo, níveis de IGF-I basal, idade, duração de DGH, IMC basal e superfície corporal (Tabela 1). A dose de GH e os níveis de IGF-I durante o tratamento foram semelhantes em ambos os grupos. Ao final do estudo, a dose média de GH foi 0,65mg/dia e a média do IGF-I foi 430,1ng/mL no genótipo DD; enquanto o genótipo ID obteve uma dose média de GH de 0,73mg/dia, e a média do IGF-I foi 438,6ng/mL, sem significância estatística. A variação no IMC e na superfície corporal não foi diferente entre os dois grupos. No início do estudo, não houve diferença na frequência cardíaca média (diurna, noturna ou no período de 24 horas). Pacientes com o genótipo DD demonstraram níveis de PA sistólica e diastólica diurna e nas 24 horas estatisticamente mais elevadas (p<0,05); carga pressórica diastólica diurna, noturna e nas 24 horas mais elevadas (p<0,05); e uma tendência a níveis mais altos de carga pressórica sistólica nas 24 horas (p=0,058) (Tabela 2). A análise ecocardiográfica (diâmetros cavitários, funções sistólica e diastólica de VE) não mostrou diferença entre os dois genótipos. Após 24 meses de reposição de GH, os pacientes com genótipo DD apresentaram carga pressórica sistólica noturna mais alta (24,83±22,93%) que o genótipo ID (4,75±6,11%) – p<0,05, e houve uma tendência (p=0,072) a níveis pressóricos sistólicos noturnos mais altos no genótipo DD Tabela 1 Características basais dos pacientes de acordo com o genótipo Idade (anos) Genótipo Média ± DP DD 47,14 ± 9,81 Mínimo 38 Máximo p 65 0,82 ID 43,45 ± 11,74 22 IMC (kg/m2) DD 26,67 ± 4,27 18,3 30,6 59 19 30,3 ID 24,40 ± 3,88 SC (m2) DD 1,70 ± 0,31 1,2 2,1 ID 1,68 ± 0,16 1,5 1,9 Duração DGH (anos) DD 9,43 ± 8,52 2 25 ID 10,82 ± 9,89 1 Pico GH no teste DD 0,30 ± 0,28 0,05 provocativo (ng/mL) ID 0,28 ± 0,36 IGF-I (ng/mL) DD 90,99 ± 63,24 28 219 ID 77,26 ± 62,84 20,1 202 DP=desvio-padrão; IMC=índice de massa corporal; SC=superfície corporal 0,05 0,27 0,67 0,99 30 0,77 0,81 1,3 0,49 195 Rev Bras Cardiol. 2012;25(3):192-199 maio/junho Pedroso et al. Polimorfismos da ECA e Reposição de GH na DGH Artigo Original Tabela 2 Diferenças basais entre os genótipos DD e ID, Genótipo DD (média ± DP) Genótipo ID (média ± DP) p PA diastólica diurna (mmHg) 84,83 ± 9,91 71,50 ± 8,37 0,014 PA sistólica diurna (mmHg) 123,67 ± 10,23 113,2 ± 8,93 0,038 PA diastólica 24 horas (mmHg) 82,33 ± 10,01 69,4 ± 7,24 0,019 PA sistólica 24 horas (mmHg) 119,5 ± 10,71 109,2 ± 7,05 0,05 Carga pressórica diastólica diurna (%) 28,83 ± 23,68 6,88 ± 9,93 0,023 Carga pressórica diastólica noturna (%) 41,33 ± 38,19 1,63 ± 3,54 0,045 Carga pressórica diastólica 24 horas (%) 27,2 ± 19,88 4,56 ± 6,6 0,008 Carga pressórica sistólica 24 horas (%) 15,67 ± 11,78 6,22 ± 5,63 0,058 DP=desvio-padrão; PA= pressão arterial ( 11 3 , 1 7 ± 8 , 2 8 m m H g x 1 0 2 , 7 ± 9 , 8 1 m m H g ) . A frequência cardíaca e a avaliação de outros parâmetros do MAPA não mostraram diferença estatística entre os dois genótipos. A análise ecocardiográfica também não evidenciou diferença estatística entre os genótipos ao final do estudo. Todos os parâmetros foram reavaliados usando variação relativa (em percentual) ajustada para os valores basais. Os resultados mostraram consistência, ou seja, as mesmas conclusões foram encontradas. Os pacientes com genótipo DD demonstraram diminuição estatisticamente significativa (p<0,005) de: PA diastólica nas 24 horas; PA diastólica diurna; e carga pressórica sistólica e diastólica diurna e nas 24 horas; e também um aumento estatisticamente significativo na frequência cardíaca noturna (p<0,005) após dois anos de reposição com GH (Tabela 3). Entretanto, não houve diferença estatística na pressão arterial sistólica e diastólica final entre os dois genótipos. O modelo linear de efeitos mistos evidenciou que algumas variáveis apresentaram resposta diferente ao tratamento com GH de acordo com o genótipo: o genótipo DD demonstrou uma diminuição estatisticamente significativa na PA diurna e nas 24 horas, na carga pressórica diastólica nas 24 horas, e aumento na frequência cardíaca noturna (p<0,05). Tabela 3 Variações estatisticamente significativas entre os genótipos DD e ID após reposição com GH (Δ final – basal) Genótipo Média ± DP p PA diastólica 24 horas (mmHg) DD -11,17 ± 3,23 0,042 ID -0,3 ± 2,87 0,90 PA diastólica diurna (mmHg) DD -11,67 ±3,49 0,042 ID +0,5 ± 3,31 0,82 Carga pressórica sistólica 24 horas (%) DD -5,33 ± 2,60 0,042 ID -0,33 ± 2,52 0,99 Carga pressórica sistólica diurna (%) DD -11,67 ± 4,35 0,031 ID -3,13 ± 3,23 0,31 Carga pressórica diastólica 24 horas (%) DD -14,0 ± 3,78 0,042 ID -0,78 ± 3,48 0,90 Carga pressórica diastólica diurna (%) DD -18,0 ± 6,54 0,031 ID -1,75 ± 5,41 0,84 Frequência cardíaca noturna (bpm) DD +9,65 ± 2,86 0,031 ID +0,78 ± 2,58 0,84 IGF-I (ng/mL) DD +339,16 ± 44,87 0,015 ID +361,34 ± 23,98 0,002 DP=desvio-padrão; PA=pressão arterial 196 Pedroso et al. Polimorfismos da ECA e Reposição de GH na DGH Artigo Original Discussão Este é o primeiro estudo a avaliar a resposta cardiovascular à reposição com GH em adultos com DGH de acordo com o genótipo da ECA. Apesar de o estudo ter sido realizado em um pequeno grupo de pacientes, o estudo mostrou que houve uma diferença estatisticamente significativa entre os genótipos DD e ID. A farmacogenética do GH tem sido estudada a fim de avaliar a resposta à terapia com GH. Polimorfismos na região promotora (-202 A/C) da proteína ligadora de IGF tipo 3 (IGFB-3) e no gene receptor do GH já foram correlacionadas com a resposta ao tratamento com GH21-23, com uma grande variedade de respostas ao GH de acordo com os diferentes polimorfismos. A resposta da reposição com GH em adultos com DGH grave de acordo com os polimorfismos da ECA não tinham sido estudados até então. Diferentes estudos farmacogenéticos demonstraram que indivíduos com genótipo DD da ECA apresentam uma maior redução nos níveis de colesterol com o uso de fluvastatina24 e em diabéticos com proteinúria em uso de inibidores da ECA13, quando comparados com os genótipos ID e II. Portanto, tem sido observada importante correlação entre os polimorfismos da ECA e respostas terapêuticas, com o uso cada vez maior de estudos de farmacogenética. O presente estudo demonstrou que adultos com DGH em tratamento com GH que tinham o genótipo DD apresentaram redução estatisticamente significativa na PA diastólica após a reposição hormonal. No início do estudo, a PA diastólica era significativamente menor no genótipo ID, e o genótipo DD apresentou redução maior nesse parâmetro ao final do tratamento com GH, provavelmente por ter níveis diastólicos mais elevados no início do estudo. Os efeitos fisiológicos do GH no sistema cardiovascular são modulados pelo IGF-I, que induz a liberação de óxido nítrico (NO) pelo endotélio3,25. Como o genótipo DD já foi correlacionado com disfunção endotelial8,12, e consequentemente com maior resistência vascular periférica, isso poderia justificar o benefício da reposição com GH nesse grupo de pacientes. Embora este estudo não tenha analisado diretamente os níveis de NO, os resultados corroboram a hipótese da presença de disfunção endotelial, principalmente nos pacientes com genótipo DD. A maior mortalidade em adultos com DGH1,2, assim como em indivíduos com o genótipo DD da ECA26, pode ter como substrato básico a disfunção endotelial que, em adição com o aumento da PA e da resistência Rev Bras Cardiol. 2012;25(3):192-199 maio/junho vascular periférica constituem o mecanismo patológico para o desenvolvimento da aterosclerose. Níveis pressóricos sistólicos e diastólicos mais elevados em indivíduos com o alelo D já foram demonstrados em estudos prévios27,28, como aqui observado em pacientes com o genótipo DD neste estudo. Apesar de não se ter encontrado diferença estatística na PA sistólica e diastólica entre os genótipos DD e ID, pacientes com o genótipo DD demonstraram uma diminuição significativamente maior nesse parâmetro após a reposição com GH. A análise cardíaca morfológica, avaliada através de ecocardiograma, não mostrou diferença significativa entre os genótipos. As funções sistólica e diastólica foram normais em todos os pacientes estudados, tanto antes quanto após a reposição com GH. Dessa maneira, os resultados sugerem que a identificação do genótipo do gene da ECA em pacientes com DGH ajude a guiar a terapia com GH quando o intuito é obter benefícios nos parâmetros cardiovasculares, uma vez que os achados sugerem que os pacientes com hipopituitarismo e genótipo DD da ECA tenham maiores benefícios com a reposição com GH. Entretanto, não se pode descartar que variáveis com maiores alterações no início do tratamento se tornem os principais alvos terapêuticos para casos individuais29, já que a terapia com GH apresenta mais benefícios em pacientes com DGH clínica e bioquimicamente mais graves30. Um estudo com um grupo maior de pacientes será capaz de confirmar se o genótipo DD pode realmente ser considerado fator prognóstico e critério de inclusão para tratamento com GH. Conclusão Em conclusão, o principal achado foi que o genótipo D/I da ECA influencia a resposta ao tratamento com GH em adultos com DGH grave, já que o genótipo DD demonstrou maiores reduções na pressão arterial diastólica e na carga pressórica sistólica e diastólica. Esse polimorfismo é aparentemente relacionado à variação interindividual em resposta ao tratamento com GH. Agradecimentos Ao Sr. Félix Schmidt e Cláudio Nunes Pereira pela assistência técnica. Potencial Conflito de Interesses Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes. 197 Rev Bras Cardiol. 2012;25(3):192-199 maio/junho Fontes de Financiamento O presente estudo foi parcialmente financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). Vinculação Acadêmica Este artigo representa parte da tese de Doutorado em Cardiologia de João Manoel de Almeida Pedroso pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. 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