Brasília, junho de 2008 Ministério da Educação (MEC) Ministro da Educação Fernando Haddad Secretário-Executivo Jose Henrique Paim Fernandes Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) Presidente Reynaldo Fernandes Diretor de Avaliação da Educação Básica Amaury Patrick Gremaud Representação da UNESCO no Brasil Representante Vincent Defourny Coordenadora da Área de Educação a.i. Marilza Regattieri Coordenador Editorial Célio da Cunha Os autores são responsáveis pela escolha e apresentação dos fatos contidos neste livro, bem como pelas opiniões nele expressas, que não são necessariamente as da UNESCO, nem comprometem a Organização. As indicações de nomes e a apresentação do material ao longo deste livro não implicam a manifestação de qualquer opinião por parte da UNESCO a respeito da condição jurídica de qualquer país, território, cidade, região ou de suas autoridades, nem tampouco a delimitação de suas fronteiras ou limites. © 2008. Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). edições UNESCO Revisão: Reinaldo de Lima Reis e Leandro Bertoletti Jardim Diagramação: Fernando Brandão Capa e Projeto Gráfico: Edson Fogaça © INEP, UNESCO 2008 Construindo caminhos para o sucesso escolar / organizado por Bernardete Gatti. – Brasília : UNESCO, Inep/ MEC, Consed, Undime, 2008. 164p. Textos e conclusões do Seminário Internacional “Construindo caminhos para o sucesso escolar” realizado, de 24 a 26 de junho de 2007, em Brasília-DF, organizado por Inep, UNESCO, Consed e Undime 1. Repetência – Educação – Brasil 2. Rendimento escolar – Brasil 3. Avaliação educacional – Brasil I. Bernardete, Gatti, Org. II. Brasil. Ministério da Educação III. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira IV. UNESCO BR/2008/PI/H/25 CDD 371.28 SUMÁRIO Apresentação ..................................................................................................................................... 7 1. Relatório do seminário internacional “Construindo caminhos para o sucesso escolar” ..................................................................................................................... 9 Bernardete Angelina Gatti 2. Avaliação em larga escala e fatores associados ao desempenho escolar ..................... 27 Creso Franco 3. Caminhos para o sucesso escolar na escola pública ........................................................ 37 José Francisco Soares 4. Repensando a escola: um estudo sobre os desafios de aprender, ler e escrever ....... 45 Vera Esther Ireland (Coord.) 5. Identificação de boas práticas nas redes municipais de ensino que influenciam o desempenho dos alunos na Prova Brasil .................................................. 63 Suhas D. Parandekar 6. Aprova Brasil. Observando e ouvindo a escola, na perspectiva do direito de aprender .............................................................................................................................. 95 Maria de Salete Silva 7. Quality issues in primary and second level education: the Ireland experience ......... 109 Eamon Stack 8. Compartilhando experiências, melhorando a aprendizagem ...................................... 121 Maria Auxiliadora Seabra Rezende 9. Avaliação: uma proposta educacional .............................................................................. 141 Maria Nilene Badeca da Costa 10. Alianzas estratégicas para el desarrollo educativo local: el caso de la red de escuelas de campana ............................................................................................................ 147 Laura Fumagalli Anexo Programação do Seminário Internacional: Construindo caminhos para o sucesso escolar .. 161 5 APRESENTAÇÃO O sucesso escolar está intimamente associado à qualidade da educação oferecida, que reflete tanto no que diz respeito ao percurso dos alunos na escola como nas aquisições de conhecimentos, habilidades, valores, atitudes e hábitos. As avaliações de sistemas educacionais têm mostrado sistematicamente problemas associados quer quanto ao percurso escolar, quer quanto às aquisições de conhecimentos e habilidades. Superar essa condição é o desafio que se apresenta ao país, a cada região, a cada cidade. Em decorrência surge a questão de como se podem utilizar essas avaliações e estudos sobre o desempenho escolar e as condições de ensino para construir uma escola que ofereça, de fato, aos alunos, a formação indispensável à vida em sociedade, ao trabalho e ao exercício da cidadania. Pensar sobre fatores associados ao sucesso escolar e discutir alternativas foi o objetivo do Seminário Internacional “Construindo Caminhos para o Sucesso Escolar”. Os conteúdos dos textos desta coletânea mostram o teor dos estudos apresentados e das iniciativas bem-sucedidas discutidas. Representam uma contribuição para se compreender fatores que precisam ser considerados ao se traçar políticas e ao se implementar ações que visem à melhoria da escola e ao encaminhamento bem-sucedido de crianças e jovens na direção da conquista de aprendizagens essenciais à vida cidadã. Quando se analisam aspectos ligados à educação básica no Brasil, à sua qualidade, estamos tratando de aproximadamente 60 milhões de crianças e jovens matriculados em algum nível dessa educação, a grande maioria em escolas estaduais ou municipais. Num país de sistema federativo de governo, com três instâncias de decisões autônomas – união, estados, municípios –, heterogêneo ao extremo em suas condições sociais e culturais, esse número pode nos dar uma idéia do volume de diferenciais a considerar quando se pensa mudar as condições das escolas na direção de uma qualidade mais adequada às exigências do mundo contemporâneo. Levando em conta que tivemos grandes avanços na incorporação de crianças e jovens ao sistema escolar, ainda são preocupantes os patamares de qualidade a galgar. Como incorporar, em cada escola, a equitatividade nas oportunidades formativas para todos os cidadãos, ainda não oferecida, de acordo com os dados, por nossas políticas e sistemas educacionais. Basta lembrar que ainda temos uma taxa de analfabetismo em torno de 11% entre as pessoas de 15 anos ou mais, a segunda maior do continente; mais, essa taxa varia entre 6% nos áreas urbanas das Regiões Sudeste e Sul e 38% no Nordeste rural; que também a educação infantil e o ensino médio estão bem longe de atender a demanda; o fluxo escolar de quem entrou na escola melhorou, mas as reprovações determinam distorções ainda grandes na relação idade/série; e as avaliações de desempenho sinalizam o pouco proveito do tempo escolar para aprendizagens 7 significativas. Esses indicadores mostram que são necessárias iniciativas urgentes, bem delineadas e dirigidas, para que os sistemas e suas escolas tenham condições de superar essa situação, tendo-se por meta uma escolarização bem-sucedida. Há muito que avançar em relação à educação oferecida no dia-a-dia da escola, procurando-se prover com eficácia conhecimentos e motivação para os estudos. Para que maior qualidade educacional seja atingida, sem dúvida, tem-se que caminhar mais no desenvolvimento de algumas políticas e ações públicas, que se reflitam em iniciativas concretas em relação ao desenvolvimento do currículo em sala de aula e nas condições de trabalho em cada escola. Espera-se que esta coletânea possa estimular gestores e professores numa caminhada consistente na direção do sucesso escolar das crianças e jovens brasileiros. Vincent Defourny Amaury Patrick Gremaud Representante da UNESCO no Brasil Diretor de Avaliação da Educação Básica do Inep 8 RELATÓRIO DO SEMINÁRIO INTERNACIONAL “CONSTRUINDO CAMINHOS PARA O SUCESSO ESCOLAR” Bernardete Angelina Gatti* INTRODUÇÃO Traduzir em um relatório sintético todo clima das falas, escutas e debates deste Seminário não é simples. Determinados os objetivos de: 1. “A partir da análise de dados sistematizados e experiências desenvolvidas por setores públicos de educação, sinalizar fatores que poderão contribuir para a melhoria da qualidade da educação, de modo geral, e do desempenho escolar, de modo particular.” 2. “Sistematizar condições e propostas de ação passíveis de serem desenvolvidas por órgãos públicos responsáveis pelos sistemas de educação no país.” Assistiu-se a um conjunto de exposições de especialistas nacionais e internacionais e de relatos de experiências bem sucedidas em gestão educacional, com sinalização dos “possíveis” e do “alcance” que se pode esperar em situações tão complexas como são as das redes de ensino. Verificou-se a obtenção de resultados palpáveis, não deixando de lado as dificuldades e as lacunas. Com base nas exposições e nas experiências e vivências dos participantes, foram realizadas discussões em oito grupos menores, que resultaram em sete conjuntos de proposições, visto dois grupos terem se fundido durante esse trabalho.” Desde a questão da educação como direito humano inalienável às articulações estratégicas no sistema e inter e intra-institucionais, passando pelas concepções e implicações de modelagem explícita ou implícita de políticas ao sentido de indicadores e sinalizadores de desempenho educacional e escolar, aos sinais do aprender – aprender conteúdos, comportamentos, compartilhar valores, atitudes, sentimentos – às vicissitudes do mobilizar/mobilizar-se para uma educação de qualidade, percorreu-se um caminho denso de pressupostos e proposições, na direção de um movimento coletivo com vistas à melhoria das condições e resultados da educação escolar no país, em que as escolas e o direito de todas, e de cada criança aprender, foram a tônica. * Relatora da Comissão Organizadora. Graduada em Pedagogia pela Universidade de São Paulo (USP), doutora em Psicologia pela Université de Paris VII - Université Denis Diderot, pós-doutora pela Pennsylvania State University e pela Université de Montreal. Atualmente é coordenadora do departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas, consultora da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), membro do Conselho Consultivo do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), consultora da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em psicologia da Educação. Atua principalmente nos seguintes temas: aprendizagem, dinâmica de grupo, personalidade, aconselhamento, orientação educacional e desenvolvimento infanto-juvenil. 9 MOMENTO PROPÍCIO Observamos que houve, até certo ponto, o compartilhamento da idéia de que estamos, no país e em cada uma de suas regiões, transitando por um momento em que se vislumbra a possibilidade de articulações em diversos níveis, visando a melhoria da situação do ensino oferecido a amplas camadas da população e construindo caminhos para o sucesso escolar de crianças e jovens pela dinamização de aprendizagens efetivas e integradoras. O estado federativo brasileiro é heterogêneo, e a responsabilidade pelos sistemas educacionais é distribuída entre os três poderes – União, Estados, Municípios – conforme nossa Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Começa a emergir a consciência de que distribuição de atribuições não deve significar fragmentação e disputa entre poderes, mas que a superação das imensas desigualdades de oportunidades educativas entre diferentes camadas da população brasileira depende de uma articulação efetiva entre esses poderes. Educação é questão de direito público e não área de disputa político-partidária. Experimentamos há décadas o sabor amargo dos resultados de avaliações educacionais expondo a fragilidade das aprendizagens em nossa educação básica. No entanto os diferentes atores envolvidos com a questão escolar pareciam até há algum tempo e, mesmo ainda hoje, em alguns casos, passar ao largo dessas fotografias em nada bonitas. Constata-se que, pela insistência, talvez, na disseminação desses resultados pelos órgãos governamentais e pela mídia, por novas configurações político-sociais, pela vivência da via democrática e, pelo amadurecimento de novas gerações de educadores, começa-se a dar maior atenção ao que se está oferecendo como escolarização no país e às aprendizagens efetivamente alcançadas pelas nossas crianças e jovens. A consolidação de organismos como o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação e a União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação que favorecem a interface de diferentes vertentes de idéias e experiências em política educacional, criando fóruns de trocas e debates, interações e influências mútuas, mostra-se, de um lado, como fator de exposição de diferenças, e de outro, como meio ativo na busca de solução para impasses no setor de educação e de seu financiamento a seus resultantes. A melhoria dos indicadores educacionais e dos desempenhos escolares tem sido um grande desafio para as políticas educacionais. Ao lado da grande expansão das redes de ensino no que se refere ao ensino fundamental, fica aberta a necessária ampliação de dois outros níveis importantes: a educação infantil e o ensino médio. Mas é questão candente a qualificação mais adequada quanto à educação oferecida e às aprendizagens necessárias a serem adquiridas. Os administradores públicos da educação escolar, em diferentes níveis e modalidades, estão sendo chamados a contemplar a educação com políticas e ações coerentes com as necessidades postas pelo exercício da cidadania, do trabalho e pelas demandas de um país que quer superar suas grandes desigualdades e mostrar-se socialmente avançado. A importância social da educação vem, finalmente, conseguindo impor-se a diferentes segmentos da sociedade brasileira, firmando-se aos poucos como questão central da nação. Pais de camadas sociais menos favorecidas movimentam-se pela educação escolar de seus filhos. Voltam-se para as questões educacionais empresários, grandes e pequenos, pessoal da saúde pública, investidores 10 em diferentes setores, juízes, promotores, escritores, jornalistas etc. Manifestam-se entidades como a OAB, o CNM, a CNT, a Força Sindical, a CUT, a CNBB, as entidades metodistas e presbiterianas, evangélicas em geral, a Federação Nacional das Indústrias e a do Comércio, entre tantas outras. Com as perplexidades ante a situação do desempenho escolar de grande parcela da população brasileira estudantil – situação crítica pelo seu nível –, há um clima favorável aos empreendimentos que tenham por objetivo a busca da reversão desse quadro na direção de melhor qualificação das aprendizagens escolares, bem como há a cobrança clara de ações nessa direção por parte dos poderes públicos e de mais verbas para a consecução desse objetivo. Assim, os gestores educacionais em suas formas de atuação têm que desenvolver e mostrar novas perspectivas quanto à escola e todos com ela envolvidos, escolhendo e executando ações estratégicas que permitam impulsionar as aprendizagens escolares, viabilizando uma concreta democratização da disseminação do conhecimento sistematizado a parcelas mais amplas da população. Trata-se aqui de pensar aprendizagens efetivas, domínio de linguagens e saberes diversos, diminuindo ou eliminando a perversa equação: para uns, conhecimentos aprofundados, para outros conhecimentos superficiais. O modelo que esteve vigente no país por muitos anos de só se preparar escolarmente de modo adequado à elite, com alta seletividade, precisa ser superado de vez. Esse modelo não pode ser sustentado num cenário que se quer democrático, em um país em que a extensão territorial e o crescimento populacional apresentam desafios contundentes, e em um país que tem como perspectiva o desenvolvimento de todos e a eqüidade e a paz sociais. Respirou-se neste Seminário, o que o Representante da UNESCO no Brasil, Sr. Vincent Defourny, ao encerrar os trabalhos, traduziu como restauração da crença de que podemos fazer alguma coisa para mudar o quadro de baixos desempenhos escolares, que podemos fazer propostas e implementá-las, e fazer hoje, fazer já! Criar um movimento sinérgico na direção de articulações frutíferas, com metas e acompanhamento adequados visando assegurar para cada criança e jovem o direito de aprender, como expressou o sr. ministro da Educação. Um pacto com foco na aprendizagem buscando-se o desenvolvimento integral das crianças e jovens, a partir de uma formação básica sólida. REVISITANDO AS EXPOSIÇÕES Ressaltar alguns pontos abordados nas diferentes exposições e algumas das questões que apareceram nos debates, nos parece importante para o pensar caminhos factíveis na direção de melhoria de desempenho escolar, questão que ocupou o centro dos trabalhos neste seminário. PRIMEIRA VERTENTE: ESTUDOS E SUAS DECORRÊNCIAS Na conferência de abertura, Ricardo Hévia trouxe a questão do conceito de qualidade, considerando-a traduzida em cinco dimensões: eqüidade (acesso, processos e resultados), 11 relevância (dar significado ao aprender a conhecer e ao aprender fazer), pertinência (pedagogia da diversidade), eficácia (atingimento de metas concretas) e eficiência (uso adequado dos recursos). Destacou alguns focos estratégicos no que diz respeito à instauração de melhoras significativas do desempenho escolar, a partir de estudos e discussões do grupo de especialistas da UNESCO/Orealc-Chile: a construção de um currículo que dê sentido à educação, o fortalecimento da função docente, mudanças na cultura das escolas, flexibilização dos sistemas para funcionamento mais eficiente. Como direito humano, a gratuidade e a obrigatoriedade da educação fundamental devem ser garantidas bem como, a bem da justiça, é preciso diminuir as desigualdades nas oportunidades de aprendizagem e a excessiva seletividade dos sistemas. Grupos vulneráveis de crianças e jovens devem merecer atenção especial, estando os sistemas de ensino atentos à diversidade cultural e social. Políticas integradas e distribuição mais eqüitativa de recursos devem ser privilegiadas. Cabe considerar que as políticas e ações nas direções acima apontadas precisam respaldarse em dados concretos para não se tornarem apenas discursos. Nesse sentido, a apresentação de Amaury Gremaud veio contribuir com a explicitação de um indicador que começa a se tornar referência para escolas, municípios e estados – o Ideb –, que possibilita situar as condições de desempenho escolar combinando o desempenho dos alunos na Prova Brasil e no fluxo escolar. É um indicador simples, compreensível e pode ajudar gestores e escolas a fixarem metas de melhoria, sendo que essa melhoria pode ser acompanhada ao longo do tempo. Permite detectar escolas ou redes de ensino cujos alunos mostram baixo desempenho escolar (nota baixa na prova externa e/ou taxas altas de reprovação) e permitirá acompanhar no tempo essas escolas e redes. A proposta é que com esse indicador cada escola e os sistemas venham a adotar medidas que melhorem tanto o fluxo escolar como o rendimento escolar. Outros dados são disponibilizados pelo Ministério da Educação e também por alguns estados, mas eles precisariam ser utilizados por gestores e professores para situar com mais precisão suas ações e práticas. Para Creso Franco, apesar das avaliações de mais larga escala do desempenho escolar e fatores a ele associados procurarem oferecer acompanhamento ao longo do tempo da qualidade da educação e servirem de apoio à formulação de políticas educacionais, tem-se demandado nos sistemas que se produzem informações que permitam melhor interlocução com as unidades escolares e os professores. É o caso da Prova Brasil, com a qual a avaliação passa a ter bastante transparência, permitindo situar escolas e municípios, vez que não é amostral, trazendo a idéia de responsabilização por resultados. Situam-se tanto pelo Ideb como pela Prova Brasil, diferenças entre escolas e entre municípios. Mas o que Franco vai destacar é uma questão ainda pouco explorada pelas análises das avaliações, que é a questão da desigualdade intraescolar, produzida às vezes por mecanismos explícitos, outras vezes por mecanismos sutis. A desigualdade dentro da mesma escola também precisa ser considerada. A diminuição ou a superação da desigualdade de desempenho escolar de alunos que freqüentam a mesma classe, tal unidade é altamente relevante para a qualidade educacional. Por estudos que cita, dentro das escolas encontram-se desigualdades enormes de aprendizagens escolares. O que é importante para a redução dessas diferenças dentro das escolas? Segundo os estudos revisados, na situação brasileira, em função das condições físicas das escolas, são fatores de qualidade das condições de infra-estrutura, dos equipamentos e da sua conservação bem como a presença 12 de recursos pedagógicos e financeiros, e sua utilização adequada. Outro fator destacado é o efeito positivo da liderança do diretor para a eficácia da escola bem como a responsabilidade compartilhada entre os professores quanto aos resultados dos alunos. Mostra efeito positivo no clima acadêmico da escola, com primazia atribuída ao ensino e à aprendizagem, ao interesse, dedicação e nível de exigência dos professores: e o efeito negativo: o absenteísmo dos docentes, e o dos discentes também. Na trilha de enfatizar o papel primordial de cada escola na melhor qualificação das aprendizagens escolares, Francisco Soares destaca a importância de um projeto para a escola que se sustente nas várias dimensões que se entrecruzam para a melhoria dos resultados nas aprendizagens escolares. Em função de seus estudos e reflexões, traz a necessidade da compreensão por parte dos educadores da complexidade associada ao desempenho (não há um fator único que o determine, que o melhore). O desempenho escolar integra (compõe-se não apenas de mera soma) fatores associados ao aluno, família, sociedade, escola, sala de aula e interações. A escola pode ser tomada como foco integrante desses fatores, com dimensões próprias a ela: projeto pedagógico, recursos físicos e pedagógicos, comunidade escolar, gestão. Destaca aspectos relevantes para o desempenho escolar, como: a) o projeto pedagógico, em cuja elaboração se tem a oportunidade de refletir sobre os valores básicos da escola, em que se podem escolher métodos de ensino e gestão e material instrucional e definir rotinas: uso do tempo, definição de turmas, monitoramento; mas só com compartilhamento a realização e o compromisso com esse projeto é possível; b) a comunidade escolar: as interações recíprocas, a motivação, o envolvimento, a participação, as lideranças; c) recursos: infra-estrutura física (adequada, cuidada, agradável) e salários. Propõe que, a partir do que se sabe em relação a desempenho escolar, é preciso ter ações centradas nas escolas, com “metas ambiciosas e amplo apoio” (querer chegar mais longe, ser melhor). Ao levantar aspectos para política de melhoria dos resultados escolares, lembra algumas dificuldades estruturais como leis e direitos adquiridos que são inconsistentes com o sucesso dos alunos; dificuldades para concretizar apoio às escolas e problemas associados a modelos pedagógicos que se disseminam com inconsistências grandes. Um grupo de autores coordenados por Vera E. Ireland apresentou alguns dados de pesquisa em regiões metropolitanas lançando um olhar sobre o aprender, ler e escrever, cujas análises conduziram à questão: que são sucesso e fracasso escolar? Verificaram que o fracasso é atribuído à própria criança, de diferentes maneiras, por professores, pelos pais e pelos próprios alunos; o sucesso, para os professores está associado ao alcance de objetivos, sair-se bem em situações competitivas, formar valores e atitudes e obter aprovação e promoção; para os alunos parece depender de características inatas como dom, inteligência, vontade etc...; para os pais aparecem como fatores de sucesso o dom, a disciplina, o esforço, porém não definidos como aspectos a serem cultivados pela família e pela escola. Aparece para todos, como condição do sucesso, a atratividade da escola. Como fatores para o fracasso há variações: aparece o despreparo dos professores, a falta do lúdico na escola, o absenteísmo docente, turmas grandes, a escola não saber lidar com a violência e os adolescentes. Os autores apontam a necessidade de atenção à qualidade das interações intra-escolares, à construção de compromisso coletivo na escola para com os alunos e a aprendizagem, o apoio mútuo, o suporte externo e o investimento financeiro necessário (“a despesa sagrada”) para ter equipamentos adequados, infra-estrutura 13 decente, manutenção em dia; construção de lideranças para dinamizar a escola e suas relações internas e externas, para levá-la a cumprir seu papel. Fazer a escola e os estudos mais atraentes. O estudo de Suhas D. Parandekar realizado com 50 municípios brasileiros, a partir de dados da Prova Brasil, mostrou que vários arranjos diferentes de diferentes características dos sistemas e das escolas podem propiciar sucesso escolar, não havendo propriamente um modelo padrão. A junção de alguns fatores propícios, nem todos iguais para os vários municípios, conduz a melhores resultados. O fundamental parece ser o fato de se ter uma visão clara de aonde se quer chegar em nível de sistemas, de escolas e de conjunto de escolas. Associa-se à construção dessa visão a capacidade de entendimento entre os atores, a continuidade das equipes gestoras e dos professores, o partilhar responsabilidades. Revelamse como exigências: plano de carreira, salário favorável e professores comprometidos, capacidade de liderança do diretor. Propõe a necessidade de as secretarias municipais de educação aproximarem-se bastante das escolas, oferecerem suportes adequados e necessários, não superfluidades, cuidarem da qualificação dos diretores, enfim, terem uma concepção de serviços que devem ser oferecidos às escolas e ofertá-los. Os vínculos com a comunidade são relevantes, e essas relações precisam ser desenvolvidas, o que permite compartilhar a tarefa de educar de modo mais amplo com o exemplo e o cultivo de valores sociais e morais, pelos cuidados de todos – os “de dentro” e os “de fora” – com a escola e com seu entorno. Escola e comunidade, seguindo caminhos comuns pela igualdade de oportunidades para desenvolver aprendizagens, maximizam as condições de sucesso escolar. Por último, buscar uma visão mais ampla, olhar no entorno – outras escolas, o sistema do município vizinho, outros mais distantes – o que há de bom, quais experiências aproveitar, adaptar, contar com o outro e com outras escolas que têm a mesma missão: levar a aprender o que é necessário a uma vida melhor, aproximar-se de quem está na melhor direção. Adentrando a perspectiva do direito de aprender, Maria de Salete Silva destaca o olhar para o interior da escola, o que envolve considerar aspectos referentes aos tempos, práticas e conteúdos do currículo. O estudo que expõe situou inicialmente, a partir da Prova Brasil, escolas que tivessem desempenho acima da média do país, mas não necessariamente as maiores médias de desempenho, e sim o mais alto efeito escola, ou seja, escolas que efetivamente têm impacto sobre o aprendizado das crianças, cuja freqüência acrescenta um diferencial grande para elas (IEE – Índice de Efeito Escola). A pesquisa orientou-se pelo marco dos direitos, procurando identificar aspectos que poderiam contribuir para o bom desempenho dessas escolas em termos de efeito positivo. Foram visitadas e analisadas 33 escolas em 14 estados da federação e no DF. O resultado mostrou que os atores escolares atribuem o bom desempenho das crianças aos professores, aos próprios alunos, às práticas pedagógicas desenvolvidas e à participação da comunidade. Cada escola com seu estilo e suas escolhas, dentro de suas possibilidades. Os aspectos que se destacaram nas entrevistas, reuniões e conversas, como razões para o bom desempenho das crianças, na percepção dos atores presentes na escola, de modo geral, podem ser assim identificados: a) professores: empenho, competência, capacitação, interesse, abertura para criar atividades e estimular os alunos; b) meninos e meninas: sujeitos ativos na aprendizagem, razão de sucesso e não de problemas, imagem de alta positividade, todos têm confiança em suas capacidades; c) práticas pedagógicas: variedade dos recursos utilizados, criatividade dos professores, projetos que envolvem as 14 vezes as famílias, quebra da rotina de sala de aula e da organização dos espaços e mobiliário, enfatiza-se também a boa organização da escola; d) famílias e comunidade: participação na gestão, presença nas parcerias, orgulho da escola, ajuda informal. Com os dados puderam-se configurar cinco dimensões do aprender. A primeira (a que tem maior destaque), associada às práticas pedagógicas, diferenciadas, onde se evidenciam as estratégias de trabalho dos educadores, projetos de ensino, uso e produção de materiais didáticos, processos de avaliação continuada e recuperação da aprendizagem, trabalho coletivo, mudanças nos espaços e tempos de aulas, atividades externas. A segunda dimensão diz respeito à importância atribuída ao professor, que é reconhecido e que também recebe apoios diversos, formação continuada, mobilização para busca de informações. A terceira, gestão mais democrática e participação da comunidade escolar: participação representativa na gestão da escola, interlocução rica com órgãos centrais, conselhos, com as áreas de assistência social, saúde, esportes e cultura. Como quarta dimensão, alunos e alunas atuantes no dia-a-dia da escola como protagonistas, desde sua integração em atividades pedagógicas (por exemplo, no reforço escolar) até na elaboração de jornais murais, rádio-escola, grêmio estudantil. A quinta dimensão são as parcerias externas: mostra a compreensão de que a garantia da formação integral, o direito à vida, à saúde, à liberdade, à convivência familiar e comunitária são resultado de inúmeros organismos, governamentais ou não, e a parceria das escolas com esses organismos é mais que relevante para a educação; encontraram-se parceiros para diversas atividades seja do setor empresarial, bancos, universidades, ONGs, sindicatos, associações comunitárias e de moradores, outras escolas, etc. O desafio está em disseminar essas experiências e consolidar a idéia, dentro e fora da escola, de que crianças e jovens têm o direito de aprender. As trocas entre pesquisadores e participantes do evento na discussão dos estudos apresentados permitiram esclarecimentos, ampliação de informação e debates vívidos. Apareceu a questão da cultura escolar que enrijece concepções – de aprendizagem, do papel do professor, dos direitos, sobre os pais, os próprios alunos – e as dificuldades de mudar, incorporar novas práticas e atitudes. Tocou-se na questão da formação de professores e nos novos modos de ser das crianças e jovens, nos problemas com o currículo e nas dificuldades de se implementar a cultura do planejamento escolar coletivo. O trabalho em equipe parece ser uma das grandes dificuldades, devendo-se nesse caso considerar os tempos atribuídos pelas redes aos professores para poderem desenvolver essa forma de cooperação. Esse tempo muitas vezes não é dado, ficando-se nas escolas sem espaços para trocas efetivas, integração curricular e de práticas. Em outros casos, quando é dado, não é bem aproveitado por falta de orientações e suportes. A questão da aquisição de habilidades de leitura e interpretação foi muito destacada, lembrando-se de que o desenvolvimento dessas habilidades é responsabilidade de todos os docentes, não só dos alfabetizadores e dos professores de língua portuguesa. A importância da iniciação na escrita e na leitura foi considerada fundamental, defendendo-se a idéia de que essa aquisição percorre todo o ensino fundamental e envolve todas as disciplinas, embora tenha maior ênfase nas quatro primeiras séries. Ao vir à tona a consideração de que o trabalho com as duas primeiras séries parece estar claro para os professores, mas o trabalho com as terceiras e quartas já não é tão claro em seus objetivos, conteúdos e práticas necessárias, causou certa preocupação entre os presentes. Ponto que certamente merece mais atenção dos gestores e professores e estudos por parte dos investigadores educacionais. 15 SEGUNDA VERTENTE: PROPOSTAS EM REDES DE ENSINO Outra vertente deste seminário foi contar com gestores educacionais que trouxeram à discussão propostas realizadas em redes municipais e estadual. Contou-se também com relato sobre a experiência da Irlanda na implementação de ações para a melhoria do desempenho educacional naquele país bem como uma proposta desenvolvida na Argentina, no município de Campana, trazendo ambos um contraponto às iniciativas nacionais. Comecemos pela experiência irlandesa. Eamon Stack, Inspetor Chefe do Departamento de Educação e Ciência da Irlanda, descreveu aspectos da estrutura educacional irlandesa, as reformulações realizadas e a implementação de ações estratégicas nos últimos anos que conduziram ao sucesso escolar revelado pelas avaliações procedidas. Apontou seis fatoreschave que acredita terem influenciado significativamente a qualidade da educação na Irlanda. Primeiro, o alto valor que tradicionalmente os pais atribuem à educação, tida como um passaporte para maior qualidade de vida. Segundo, a incorporação da idéia de parcerias sociais para melhorar empreendimentos: trabalhar juntos para “fazer o bolo crescer” para o bem de todos e cada um. Existe norma definida em 1998 exigindo que consultas múltiplas devem ser feitas a todos os parceiros da educação antes de o ministro fazer qualquer regulamentação, qualquer mudança em orientações, o que per mite consensos compromissados. O terceiro ponto é a alta valorização da profissão de professor, o que atrai pessoas muito bem qualificadas. A seleção para os cursos de formação de professores é altamente competitiva, a carreira é muito procurada, e os critérios para sua seleção exigem alta performance. Há três caminhos pelos quais se formam professores, todos exigentes com a qualificação. A carreira é bem paga e bem procurada. Assim, um dos fatores decisivos que influenciam positivamente o desempenho dos estudantes é a qualidade dos professores e a qualidade de seu ensino. O quarto ponto diz respeito ao currículo e sua implementação. Há um currículo nacional implantado em todas as escolas, sendo ele considerado elementochave para o sucesso do ensino e das aprendizagens. Acredita-se que é muito importante que o professor tenha clareza quanto ao que deve ensinar. O quinto ponto, que traz como causando efeitos sobre a qualidade do desempenho escolar, são os exames nacionais, a partir do secundário, que são obrigatórios para as certificações de continuidade dos estudos na educação básica, e as avaliações de acompanhamento, longitudinais, realizadas a cada quatro ou cinco anos, abordando a língua inglesa e matemática. Não há divulgação pública dos resultados, por acordo no Education Act de 1998. O sexto ponto: o provimento de suportes para as escolas e os professores. São oferecidos continuamente programas de aperfeiçoamento aos professores, formação em liderança e em gestão escolar. O Serviço de Inspeção acompanha as escolas, avalia-as em vários aspectos, fazem sugestões e produzem guias, sempre em consonância com os parceiros e de modo transparente. A idéia básica da inspeção hoje, é ser formativa, trabalhando com as escolas e os professores como coprofissionais. Os focos desse trabalho, em cada escola, são gestão escolar, planejamento escolar, oferta curricular, aprendizagem e ensino na sala de aula e suportes oferecidos aos estudantes. Os desafios ao sistema escolar são: contribuir para manter a competitividade internacional da Irlanda e ajudar a incrementar a coesão social, o que inclui a integração de estudantes com necessidades educacionais especiais. Por isso priorizam a inclusão social de modo geral, com o programa “Oferecendo Igualdade de Oportunidades.” 16 Maria Auxiliadora S. Rezende trouxe as experiências educacionais da rede estadual de Tocantins, da qual é secretária. Tocantins, estado de criação mais recente, é pluriétnico e multicultural. Dadas as condições de estado em formação, com escassez de recursos, desenvolveu-se um plano de ação em etapas priorizando-se inicialmente os investimentos em infra-estrutura, em seguida cuidando-se da ampliação de oferta do ensino fundamental e, gradativamente, do ensino médio, ao lado da formação inicial e continuada de professores. No momento, o foco está dirigido para a melhoria da qualidade do ensino. Os investimentos entre 2002 e 2006 foram grandes, e a taxa de escolarização das crianças de 7 a 14 anos atingiu 97%, e a de jovens entre 15 e 17 anos chegou a 85%. Considerando-se como fundamental para se propiciar o sucesso escolar, uma boa gestão e uma gestão compartilhada, este é o aspecto central da política educacional do Tocantins. As ações empreendidas foram: a) mobilizar a rede com o repensar das políticas educacionais no estado; b) realizar avaliação em todas as escolas de ensino fundamental e médio da zona urbana, em língua portuguesa e matemática, aplicando questionário informativo, para, por meio de associações de fatores, identificar as reais causas do fracasso escolar construindo indicadores para tanto; c) a partir dos resultados definiram-se políticas para a rede e políticas voltadas à formação continuada de professores; d) adesão à metodologia de planejamento do Fundescola, com elaboração do Planejamento Estratégico da Secretaria, com criação do Grupo de Sistematização para planejar, executar, acompanhar, apoiar e avaliar a gestão da Seduc; e) definição de metas e planos de ação. Os objetivos são: melhorar o desempenho do sistema estadual de ensino, promover a profissionalização, a responsabilização e valorização dos profissionais da educação, reestruturar, modernizar e consolidar a gestão e implantar programa permanente de avaliação. Destacam-se algumas ações em cada um desses pontos: a reorganização curricular, a implementação de programas formativos de professores e gestores, a correção do fluxo escolar, o combate ao abandono escolar, implementação em etapas de modelo de gestão compartilhada nas escolas, porcentagem de reajustes salariais dos professores bem acima do IGPM. Cada uma dessas ações foi desenvolvida com programas específicos e com equipes com atribuições claras utilizando-se várias parcerias. Destaca-se: envolvimento da rede; diagnóstico e acompanhamento; recursos; programas ativos e realizáveis em várias etapas sucessivas; avaliação de gestão e revisão de planejamento. Os dados mostram crescimento significativo na média de proficiência em matemática e língua portuguesa (comparativo 2001 – 2005) no ensino fundamental, 4ª. série, como também no ensino médio. Na Prova Brasil, em 2005, para a 4ª série, o estado alcançou a primeira colocação na região tanto em matemática como em língua portuguesa, ocupando em nível nacional o 13º lugar em língua portuguesa e 14º em matemática. Os dados de abandono escolar revelaram diminuição substantiva, e a correção de fluxo mostra uma regularização entre 2002 e 2006 muito grande e promissora entre a 1ª e a 8ª série. Essa correção vem sendo observada também no ensino médio, em que a distorção idade/série passou do índice de 68% para o de 54%, mantendo a tendência de queda. A conclusão é: mesmo com imperfeições e impasses, próprios à realidade social, trabalhar com metas claras, programas de ação bem coordenados e gestão participativa rende frutos. Os próximos desafios, sem deixar as ações anteriores, são: trabalhar a gestão da sala de aula e situar focos de insucesso e intervir, em parceria com a comunidade escolar. Questões candentes que a Secretária levanta: como trabalhar as questões de sala de 17 aula? Como equacionar a relação professor-aluno diante da falência moral da sociedade contemporânea? Como redefinir a gestão de sala de aula em função das transformações dos padrões de conduta, dos novos comportamentos e das exigências que caracterizam a sociedade contemporânea? Relatando a proposta de trabalho, que mudou a face das escolas e do desempenho escolar, realizada no município de Campo Grande, Maria Nilene B. da Costa define a avaliação como motor para a melhoria do processo de ensino e de aprendizagem obtida com o trabalho desenvolvido. Como princípio de gestão foram assumidos quatro compromissos que nortearam o plano implementado com o objetivo explícito de melhorar o desempenho da rede municipal de ensino: compromisso com o aluno, em primeiro lugar, compromisso com a família, com os profissionais da educação e com a escola. Visou-se garantir aprendizagem com conhecimentos mínimos em cada componente curricular implantando mecanismos de acompanhamento do rendimento escolar de forma a corrigir, durante o período letivo, as defasagens de aprendizagem escolar. Com ações já desenvolvidas criouse em 2000 o Sistema Municipal de Avaliação Educacional, em 2001 implantou-se o Departamento de Planejamento e Avaliação, em 2002 fez-se a adequação da seqüência didática à realidade da rede municipal de ensino, elaborando as diretrizes curriculares, e procedeu-se à primeira avaliação das primeiras séries. Naquele período capacitaram-se professores regentes para elaborar itens de prova, técnicos (professores) da secretaria em avaliação educacional, iniciou-se a estruturação do banco de itens e, em parceria com o Inep/MEC, realizou-se aprimoramento técnico. A opção por montar o sistema de avaliação, além de ter como motivo a obtenção de dados para subsidiar as políticas de gestão da educação escolar e os encaminhamentos pedagógicos, também permitia dar transparência aos processos e resultados das atividades educacionais e oferecer a cada escola informações sobre seus indicadores, visando seu uso para aprofundar seu projeto pedagógico, focalizar a atuação nos aspectos críticos da aprendizagem e melhorar as condições de gestão autônoma da unidade escolar. Os componentes curriculares avaliados foram língua portuguesa, produção de texto e matemática. O processo avaliativo gerou, entre outras ações, a revisão do programa de ensino, orientações para as escolas na melhoria de seus critérios de avaliação, identificação das escolas com dificuldades e baixo desempenho e apoio a elas, intervenção gerencial em escolas com problemas, identificação de professores sem perfil adequado como alfabetizador e suas substituições. Nas escolas propiciou-se adoção de medidas para melhoria do ensino e da aprendizagem, identificação de dificuldades dos professores e proposição de medidas de ajuda, construção de indicadores para a elaboração do planejamento escolar. Nas salas de aula permitiu-se um olhar para os alunos com desempenhos mais baixos, com recursos de recuperação e identificação de fatores que interferiam no processo de aprendizagem desses alunos. A SME atuou intensamente com sua equipe pedagógica junto à rede, foram elaborados materiais pedagógicos de apoio e desenvolvidas capacitações de professores. Efeitos: crescimento de 34,28 pontos em língua portuguesa nas avaliações nacionais (4ª série) em 2005 em relação a 2003, e de 29,34 pontos em matemática. Na última edição da Prova Brasil, as escolas de Campo Grande mostraram média de desempenho na 4ª série, tanto em português como em matemática, muito acima da média das capitais dos estados e bem acima da média nacional. 18 Outra experiência bem sucedida em município foi trazida por Laura Fumagalli, que expôs uma estratégia para a promoção de desenvolvimento curricular em nível local, realizada na cidade de Campana, Argentina. A finalidade foi ampliar as oportunidades de aprendizagem de crianças e jovens. O processo foi realizado com a assistência técnica do IIPE/UNESCO Buenos Aires, por solicitação do município. O projeto da Rede de Escolas é uma proposta situada em plano local e começou a ser gestado em 1999. As ações começaram em 2000. A estratégia baseou-se no trabalho em cooperação: escolas, organismos de governo e organizações da sociedade civil local. A estratégia é em rede porque se consolidou e desenvolveu como processo principal de trabalho e o da cooperação interinstitucional. Esta foi a força motora na condução das mudanças levantadas como necessárias à melhoria das escolas, na idéia de que cooperar permite fortalecer a relação da escola com a comunidade e as relações escolaescola, permite melhor identificar problemas educacionais locais e elaborar coletivamente propostas para abordá-los envolvendo vários segmentos; facilita detectar e divulgar entre as escolas boas práticas de ensino e identificar os aspectos a serem melhorados. A chave: cooperar com os outros é uma forma de aprender a viver juntos. O foco do trabalho foi o ensino fundamental (nove séries: seis da primária e três da secundária). O ciclo do trabalho cooperativo foi: diagnóstico, desenho, desenvolvimento, divulgação, redesenho, e seguindo, implicou agirrefletir-agir, produzindo de forma cooperativa entre as escolas novas estratégias de ensino, usando as novas estratégias em sala de aula, analisando os registros de uso e os resultados obtidos, produzindo materiais de ensino. O processo de instauração e realização das estratégias em rede foi implementado entre 2000 e 2006, período assessorado por profissionais mobilizados para tanto. A fase de conclusão foi de um ano (agosto 2005 a agosto 2006) em que se consolidou e transferiu a estratégia desenvolvida a institutos de formação docente. Com a proposta, 81% das escolas locais foram envolvidas, 80% dos diretores participaram do projeto, 720 docentes foram capacitados (79%), 14 mil alunos envolvidos em sala de aula, quatro folhetos didáticos sobre identidade local produzidos e publicados, 16 módulos de desenvolvimento curricular produzidos e 9 mil exemplares distribuídos nas escolas. Cem por cento das escolas tiveram sua média elevada em matemática e língua nos dispositivos provinciais de avaliação. Reduziu-se a diferença entre as médias mais baixas e as mais altas, sinalizando maior eqüidade em termos de apropriação de saberes. Experiência na direção do desenvolvimento de escola integrada está sendo realizada no município de Belo Horizonte, e foi relatada neste evento por Macaé Maria Evaristo. O projeto Escola Integrada vem com a perspectiva de articular a cidade com a educação (cidadeeducadora). Estende a jornada escolar (9 horas/dia) e se realiza com a co-participação de várias secretarias municipais. A proposta é ampliar as ações de formação em diferentes áreas e diferentes espaços do bairro e da cidade. Em 2007 o projeto está envolvendo 29 escolas, nove regiões, 10 mil alunos, promovendo 200 atividades com a Universidade Federal de Minas Gerais (trabalhando diversas áreas do conhecimento) e 50 com agentes culturais. Agregam-se atividades mapeadas pelas escolas nas suas comunidades (exemplo: oficinas de artes plásticas). Há alimentação, atividades de relaxamento e mobilidade dos estudantes e acompanhamento do “para casa”. Ao iniciar, nem todos os alunos das escolas participantes são envolvidos, cerca de 40% são integrados à proposta, através de um cadastro informativo, propondo-se para o próximo ano o envolvimento de 60% e ampliando. A escola organiza a 19 matriz de atendimento e atividades para os alunos. É a escola que, com um professor especialmente designado, faz o mapeamento de espaços e potencialidades da vizinhança (instituições, ONGs, artesãos), e é através delas que se implementa a perspectiva de instituição de redes locais de referência e apoio; o professor que articula o projeto na escola é docente da própria escola e se encarrega da relação com os estagiários e os oficineiros. A escola faz também o acompanhamento da freqüência. Há o objetivo de envolver na proposta, sobretudo, crianças com maior vulnerabilidade social. As experiências relatadas geraram muitas questões de esclarecimento e complementação de informações, sobre a facitabilidade de algumas iniciativas, sobre como se contornaram alguns entraves burocráticos sobre custos e parcerias. Centraram-se nas condições próprias aos diferentes sistemas escolares, ao histórico de cada um desses sistemas e das políticas educacionais mais gerais ou locais. Abordaram-se as questões de disciplina escolar e violência de alunos, e as dificuldades no relacionamento professores-alunos. A idéia de redes locais em prol da melhor qualificação da educação escolar, pelo desenvolvimento e compromisso com mudanças educativas em plano local, e as questões de apoio de profissionais para sua instauração, chamaram a atenção dos participantes que levantaram muitas questões de esclarecimentos e informações. Foi grande a discussão sobre a formação dos professores, problematizando-se os cur-sos de graduação oferecidos, tanto para o professor polivalente como para os das disciplinas, as inadequações curriculares e as fragilidades formativas para uma prática profissional foram bem evidenciadas. Destacou-se a questão da formação a distância criticando-se propostas ligeiras, mas que titulam. Na expressão de participantes, estamos vivendo na área de formação de professores a era dos “diplomas vazios”. Alerta-se que os órgãos competentes precisam melhorar sua atenção para o estímulo e credenciamento/reconhecimento desses cursos. Verificar melhor o quê e como estão desenvolvendo a formação. Os gestores ressentem-se no chão das redes dos vácuos formativos dessas propostas de formação de professores. REFLETINDO COM AS EXPOSIÇÕES: PRESSUPOSTOS RELEVANTES Idéias de fundo são importantes porque levam a predisposições para ação. Elas se constituem em pontos de referência que dão sentido às nossas proposições e realizações. Algumas premissas estiveram explícita ou implicitamente presentes tanto nas exposições quanto nos debates. Poderíamos sintetizá-las como segue. 1. Educação é prioridade pública essencial, e é fator de coesão social. 2. A escola tem uma função específica e diferenciada na sociedade e, portanto, deve ser foco central tanto na discussão sobre educação básica como para ações estratégicas. 3. Na escola o destaque é para as crianças e jovens que lá estão e que são a sua razão de ser. 4. A educação escolar visa o desenvolvimento de aprendizagens – as linguagens, humanidades, artes, ciências – na integração de conteúdos, valores e atitudes, buscando-se com elas um melhor viver humano: sobreviver, desfrutar, compartilhar para preservar a vida. 20 5. A escola realiza concretamente o direito humano de educar-se, instruir-se, formar-se para participar de uma civilização. 6. Há um acúmulo de impasses e problemas historicamente construídos e acumulados na educação e no ensino, que precisam ser enfrentados. Esse enfrentamento não poderá ser apenas no nível de decretos e normas, sob pena de repetirmos mais uma vez um comportamento recorrente em nossa história educacional, comportamento pouco produtivo, como mostram os fatos. Ele deverá ser produzido sobretudo no cotidiano da vida escolar e, para isso, nossa criatividade está sendo desafiada. 7. Os problemas que se enunciam, e nos desafiam, não têm um sentido em si, mas sim no cenário em que vivemos e no cenário que projetamos. As implicações do quadro de dificuldades relativas à qualidade da educação, só podem ser dimensionadas à medida que se tem um projeto de cidadania, de um modo de ser e de viver numa cidade, numa região, num país. Ou seja, elas adquirem sentido diante das necessidades que se vislumbram face ao que queremos ter como nação, como espaço e formas de existência como seres humanos. 8. Ao querermos a construção de uma democracia plural numa nação que se equipare às demais “ombro a ombro”, é preciso reconhecer que isso só é possível com todos os cidadãos sendo capazes de se informar, de ampliar essa informação, de situar-se e mover-se no mundo do trabalho, dentro de um viver ético, com responsabilidades partilhadas. Sem escolarização bem qualificada para todos isso não é possível. 9. O desejo de edificar cidadãos em condições de participar socialmente, não como sujeitos, mas como agentes capazes de interagir e criar alternativas para as novas formas de relações na produção de nossa sobrevivência social e cultural põe as questões de educação na linha de frente. Mas é necessário reconhecer que não se pode fazer educação e ensino sem professores devidamente preparados para esse trabalho. 10. Intervenções por ações governamentais em educação trazem resultados em mais largo prazo, devendo-se considerar que mudanças em formas de pensar e em hábitos não são simples de fazer e que não se faz milagre com a formação humana, mesmo com toda tecnologia disponível. Não dá para implantar um chip de conhecimentos no ser humano e... pronto! Por isso, o mote é: fazer já, fazer direcionado, fazer bem, continuar fazendo! Mas ter a paciência histórica para com as mudanças e os resultados. AÇÕES PLANEJADAS A CONSIDERAR Com essas premissas como pano de fundo, algumas estratégias foram definidas para o desenvolvimento de ações na direção da melhoria da qualidade da educação escolar. Podemos enunciá-las sinteticamente como segue. 1. Buscar articulações entre instâncias de gestão é fundamental. 2. Estabelecer vínculos cooperativos com setores da sociedade civil que permitam à escola aprofundar seu trabalho educativo e ampliar possibilidades de aprendizagens. 21 3. Incentivar a comunidade a valorizar a educação e a escola por diferentes meios disponíveis in loco e no geral. 4. Melhorar a carreira docente e os estímulos aos professores. Tornar a carreira mais atraente. 5. Em todos os níveis administrativos, é necessária a existência de um programa de ações estratégicas para a educação, que tenha metas de qualidade claras e bem definidas, com um planejamento e cronograma de trabalho a serem implementados com base na realidade para a qual se destina. Essa base advém não de julgamentos pessoais, mas de levantamentos, estudos e avaliações, os quais fornecem dados necessários à seleção de aspectos a serem melhorados. Bons planejamentos têm bons fundamentos, poucas metas, e metas factíveis em determinado tempo. 6. Utilizar os dados educacionais disponibilizados por publicações ou na internet e outros meios (população escolarizada, segundo faixa de idade, resultados de avaliações, fluxo escolar etc.) para a região ou localidade para objetivar metas e acompanhar o que ocorre. 7. Considerar projetos em tempos bem distribuídos para que as ações possam ser bem implementadas, tenham visibilidade e possam ser bem acompanhadas e monitoradas, revistas e aprimoradas. 8. Olhar no entorno, orientar-se e aprender com outros gestores, outros educadores, cujos caminhos já deram alguns resultados positivos, é iniciativa relevante que ajuda em idéias e possibilidades, gerando também uma rede de suporte para alvos comuns. 9. Estimular que as escolas se voltem para outras escolas, mais próximas, menos próximas, em busca de alternativas já experimentadas e bem sucedidas para lidar com o ensino e melhorar as diversas aprendizagens necessárias às crianças ou jovens, formando grupos de interlocução interescolas. 10. Propiciar a continuidade das equipes gestoras e dos professores. A rotatividade excessiva de umas e outros, as mudanças bruscas de rumos e projetos, de estilos de trabalho têm sido detectadas em estudos qualitativos como vilões para o bom trabalho das escolas. 11. Explicitar melhor os conteúdos curriculares necessários e relevantes para a educação básica determinando-se metas de aprendizagem. Mostra-se indispensável aos alunos a aquisição de uma base de domínio especifico de conhecimento, bem organizada, porém flexível. Isso requer domínio ampliado de fatos, símbolos, conceitos e regras que são a base de cada campo de conhecimento. Essa base é que cria a possibilidade de inter e transdisciplinaridade. 12. Os professores precisam ter maior clareza sobre o que devem ensinar em cada momento do desenvolvimento de seus alunos. Buscar consenso social sobre essa questão é fundamental. 22 13. Estimular e orientar procedimentos didáticos que despertem o interesse dos alunos pelo conhecimento, que propiciem o desenvolvimento de motivação e de habilidades de busca, de aproximação de problemas, de caminhos diversificados e sistemáticos de abordagem de questões. 14. Buscar construir uma cultura escolar que propicie a superação das desigualdades, a não-discriminação e a inclusão. 15. Cuidar mais atentamente da formação dos docentes: só diplomar não adianta. É preciso melhorar substantivamente a formação graduada dos professores, o que exige políticas nacionais mais bem dirigidas. 16. Atuar forte e imediatamente nos currículos de formação de professores no que se refere ao “saber fazer”, tanto para a formação de alfabetizadores competentes como para as disciplinas específicas. Para isso, construir articulações entre participantes em redes de educação básica e pessoal de ensino superior, que detenha alguma experiência na educação básica. 17. Examinar e monitorar mais acurada e adequadamente os cursos de formação à distância de professores. OUTROS ASPECTOS Destacamos aqui alguns aspectos que afloraram nos trabalhos e que se constituem também como fatores de melhor qualificação da educação escolar. Ficou claro que em nosso país, dadas as condições físicas precárias de escolas, dos equipamentos, de sua manutenção, de alguma forma essas condições associam-se também a problemas no desempenho de escolas. O cuidar de prédios, água, banheiros, luminosidade, carteiras, bancos, lousas, livros, mapas, materiais pedagógicos, quadras, espaços de recreio, insumos (papel, giz...) etc. não é supérfluo. Criar um ambiente que dê realmente condições de estudo para os alunos e condições de trabalho para os professores, onde se sinta gosto em estar, faz parte de um projeto de melhoria da educação. O suporte às escolas em nível financeiro necessita de alternativas de solução e de orçamento próprio adequado às necessidades. Quando as escolas podem cuidar de modo rápido e imediato de problemas de infra-estrutura e equipamentos, de recursos didáticos e podem dar apoio a iniciativas novas e projetos, a eficácia é maior. Os diversos órgãos gestores do ensino precisam adquirir a cultura e a capacidade de serem bons oferecedores de serviços suprindo-as com apoios pedagógicos, com recursos, com formação. Assumir um papel de ajuda, não de mandante, dando efetivamente suportes de diferentes naturezas à rede, conforme necessidades detectadas ou manifestas, suprindo para diferentes situações, diferentes recursos. O gestor necessita estar atento à diversidade de condições em sua rede seja quanto às escolas, em seus vários aspectos, seja quanto aos alunos, professores, famílias e comunidades. Além disso, apontou-se a importância da clareza das informações, de seu detalhamento, de informações transmitidas a tempo. 23 Disseminar nas redes informações sobre as melhores práticas experimentadas observadas na própria rede, ou em outras redes, estimula e oferece bagagem aos atores educacionais para seu próprio trabalho. Também não é demais lembrar que, muito útil é planejar e executar ações e intervenções dirigidas aos cenários mais problemáticos, com foco neles bem especificamente. Também mostrou-se a grande importância, de um lado, da liderança segura, porém flexível, de diretores e do compartilhamento de responsabilidade entre o diretor e professores pelo aprendizado dos alunos que estão sob sua responsabilidade profissional. A criação de um clima acadêmico, de espaço de aprendizagem efetiva, como vocação compartilhada por todos, faz diferença na direção de aprendizagens significativas. Não dá para deixar de dar ênfase a aspectos negativos para o bom desempenho escolar, pautados nos trabalhos apresentados e nas participações: o absenteísmo excessivo de professores, também o absenteísmo de alunos com certa recorrência, o alto grau de reprovações escolares (que se repetem para os mesmos alunos, mostrando que repetir ano nem sempre garante progressão posterior), o fluxo escolar ainda comprometido com distorções idade/série relativamente grandes em muitas redes. Essa defasagem altera a relação da criança ou do adolescente com seu grupo de idade, com o significado da escola e do conhecimento e não favorece seu desenvolvimento social e afetivo. Não se trata do “aprovar de qualquer jeito”, mas sim, do buscar alternativas para a progressão desses alunos garantidas as aprendizagens necessárias. Buscar meios para que essa defasagem diminua é ação que se demanda aos gestores e professores. Nas experiências relatadas neste Seminário encontramos várias vias percorridas para solucionar o problema. Caminhos há. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nos últimos anos, considerando a seqüência histórica, os resultados educacionais do país mostram a construção de um caminho de recuperação do tempo perdido, de séculos, na verdade. Porém os esforços na direção do desenvolvimento da educação básica ainda devem ser muito grandes e bem direcionados. Políticas conseqüentes, nacionais, regionais e locais são mais do que necessárias, são imperativas. Em artigos especializados encontramos críticas contundentes ao não-privilegiamento do desenvolvimento da educação básica no Brasil nas décadas cruciais dos anos 60, 70 e 80, comentando-se o atraso que isso determinou na formação da maior parte de nossa população adulta, no impacto negativo nas novas gerações e no próprio desenvolvimento do país. Pesquisas de educadores naquele período já sinalizavam tais problemas, porém nem sempre as orientações das políticas educacionais foram guiadas por dados analíticos seguros, prevalecendo decisões apoiadas em opiniões deste ou daquele nicho de influência junto aos governos, ou conforme certos interesses predominantes. Com o conjunto de dados agora disponíveis é muito viável a elaboração de bons planejamentos em políticas educacionais bem como a constituição de meios para bem executá-los. 24 Hoje, temos a sinalização de que, se avançamos na incorporação de mais crianças e jovens no sistema educacional, temos ainda muito que avançar em relação ao completamento dessa incorporação e à adequação do percurso desses alunos nas séries escolares. Reprovações, abandonos e retornos tardios influem nos resultados da escolarização. Nesse sentido, parece que algumas políticas e ações públicas precisam ser revistas, e iniciativas concretas em relação ao desenvolvimento do currículo em sala de aula estão se mostrando necessárias. O balanço educacional dos anos recentes é, sem dúvida, positivo: aumentou o atendimento na educação infantil; o acesso ao ensino fundamental foi quase universalizado, e a grande expansão do ensino médio teve impacto na demanda pelo ensino superior. No entanto precisamos lembrar que nossos indicadores educacionais sempre foram excessivamente baixos e continuam precários, pois tivemos séculos de descaso para com a educação no Brasil, fenômeno associado ao tipo de colonização a que fomos submetidos, e depois à continuidade do domínio de certas oligarquias regionais que mantiveram a preocupação com a educação da população fora dos planos de governos. A expansão do atendimento educacional, apesar dos discursos e propostas de vários grupos desde o início do século XX, só vem a se dar a partir da década de 1950. Assim, chegados ao século XXI, estamos longe de obter bons indicadores de conclusão do ensino fundamental por problemas no fluxo dos alunos e também bons indicadores de desempenho escolar. Após o início dos anos 1990, começamos a ter maior atenção para com a escolarização da população, pelos movimentos sociais diversificados que colocaram a questão na pauta de governos e adquiriram voz. Mudanças sociais e políticas contribuíram para colocar a educação em foco no país. Políticas educacionais foram renovadas, e novas ações estratégicas lançadas em campo tanto em nível nacional como estadual e municipal. Porém não atingimos a fundo a qualidade das aprendizagens necessárias à cidadania. Hoje estamos, sem dúvida, em momento de superação de nossa carga histórica de defasagens educacionais, de falta de atenção e de investimentos em educação, investimentos que cheguem de fato às redes, às escolas. Educação, desenvolvimento de habilidades cognitivas, construção de conhecimentos têm impacto em aspectos importantes para a vida humana, como por exemplo, para os cuidados com a saúde, a criação de crianças e jovens pelas famílias, o cuidado com o meio ambiente, a participação social e cultural, o trabalho etc. O escopo dos processos educativos é mais amplo e é essencial à coesão social e à realização das pessoas na sociedade contemporânea. A preocupação com a aprendizagem escolar de crianças e jovens transforma-se no assunto do dia e estimula gestores em diferentes instâncias a buscar soluções para melhorar a qualidade da educação oferecida em nossas escolas. O desafio é grande, mas como vimos nestes dias de trabalho, há possibilidades concretas de atingirmos níveis melhores para essas aprendizagens. As avaliações estimulam o debate e também podem oferecer pistas para encaminhamento de soluções. Muitos desses encaminhamentos foram abordados nestes dias, seja pela reflexão de pesquisadores, seja pela reflexão e ações de gestores. Não há solução única, modelo milagroso, mas há possibilidades a escolher e outras a criar, dentro das condições de cada rede, de cada escola, tendo-se por objetivo “crescer”, fazer as aprendizagens acontecerem e ... aparecerem. 25 Finalmente, gostaria de concluir que educar sem perspectivas sociofilosóficas claras, tornase um fazer fragmentário, um amontoado de fazeres sem um pensamento que articule modos de ser e realizar. Assim, podemos refletir com Anísio Teixeira sobre o sentido do educar e do educar-se: A única finalidade da vida é mais vida. Se me perguntarem o que é essa vida, Eu lhes direi que é mais liberdade e mais felicidade. São vagos os termos. Mas, nem por isso eles deixam de ter sentido para cada um de nós. À medida que formos mais livres, que abrangermos em nosso coração e em nossa inteligência mais coisas, que ganharmos critérios mais finos de compreensão, nessa medida, nos sentiremos maiores e mais felizes. A finalidade da educação se confunde com a finalidade da vida. (1934) 26 AVALIAÇÃO EM LARGA ESCALA E FATORES ASSOCIADOS AO DESEMPENHO ESCOLAR1 Creso Franco* INTRODUÇÃO Um indicador de demanda por avaliação da educação é a existência de artigos específicos sobre o tema na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996. Enquanto o tema da avaliação da escola é tratado no artigo 24 da Lei no 9.394/962, o artigo 9o da mesma lei, ao tratar das atribuições da União, inova em relação aos textos legais precedentes, ao atribuir à União a função de “assegurar o processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria do ensino”. Freqüentemente, novidades legais decorrem de incorporação pela legislação de práticas sociais correntes. É precisamente o caso do texto da LDB que atribui à União a responsabilidade de avaliar a educação nacional objetivando a definição de prioridades, razão pela qual menciono o texto legal apenas como um indicador de demanda por avaliação. Desde 1988 vinha-se constituindo um sistema de avaliação da Educação Fundamental, que logo foi estendido de modo a abranger a avaliação do Ensino Básico (Saeb). O processo de institucionalização do Saeb e as estratégias dos diversos agentes sociais que participaram da sua constituição foram estudados por (BONAMINO, 2001). Face aos propósitos do presente trabalho, limito-me a assinalar que os diversos objetivos proclamados durante o processo de institucionalização do Saeb resolviam-se em torno de duas questões: (a) o acompanhamento ao longo do tempo da qualidade da educação, freqüentemente referida nos textos oficiais como o “monitoramento da qualidade da educação”; e (b) a definição de subsídios para a formulação de políticas educacionais voltadas à qualidade e à eqüidade em educação. Mais adiante argumentarei que objetivos relacionados com cada um desses pontos fazem exigências muito distintas, por vezes antagônicas, sobre os projetos de avaliação. * Graduado em Física pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), mestre em Educação pela PUC-RJ e doutor em Educação pela University of Reading. Atualmente é professor associado da PUC-RJ. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Política e Sociologia da Educação, e atua principalmente nos seguintes temas: eqüidade, reforma educacional e avaliação da educação. 1 Versões preliminares deste texto foram apresentadas em eventos promovidos pelo Consed e pelo Inep. 2 Sobre a mudança no modo pelo qual o texto legal lida com o tema da avaliação na escola consulte-se, por exemplo, (FRANCO; FERNANDES; BONAMINO, 1999). 27 A demanda por avaliação em larga escala não se tem limitado à avaliação nacional: diversos estados têm procurado montar e estabilizar seus sistemas de avaliação (BONAMINO, BESSA & FRANCO, 2003). Além dos objetivos já proclamados pela avaliação nacional, os gestores estaduais têm insistido na importância de a avaliação em larga escala produzir informações que permitam interlocução com cada unidade escolar. Essa perspectiva foi aprofundada no ano de 2005 quando o Governo Federal implantou a Prova Brasil, programa que abrangeu a avaliação da 4ª e da 8ª séries do ensino fundamental das escolas públicas urbanas que matriculavam 30 ou mais alunos em cada uma das mencionadas séries. Nesse contexto, para além dos já mencionados propósitos de monitoramento da qualidade e de subsídio à formulação de políticas, a avaliação passa a relacionar-se com os temas da transparência e da responsabilização por resultados. Muitos aspectos da avaliação nacional podem ser atingidos por meio de exercícios de avaliação de base amostral. Em avaliações amostrais, define-se claramente a população de interesse da avaliação, mas testa-se apenas uma amostra relativamente pequena da população. O Saeb é uma avaliação de base amostral, apta a produzir resultados relevantes para o país e para diversos subgrupos de interesse, tais como as unidades da federação e, dentro da maior parte delas, para as diversas dependências administrativas (estadual, municipal e privada). Há, no entanto, aspectos que não podem ser tratados no âmbito de avaliações de base amostral, como os resultados para cada município e para cada unidade escolar. Avaliações de base amostral ocorrem em pequena fração do universo de escolas e não produzem resultados representativos de municípios (no caso do Saeb, algumas edições focalizaram a capital de estados como um subgrupo de interesse). A Prova Brasil é um exercício de avaliação de base censitária, que focaliza as escolas públicas urbanas. Na edição de 2005 a Prova Brasil focalizou as escolas que matricularam pelo menos 30 alunos nas séries avaliadas (4ª série do ensino fundamental e 8ª série do ensino médio). Na edição de 2007, incluirá as escolas públicas urbanas que matriculam pelo menos 20 alunos nas séries avaliadas, além de tomar medidas especiais para garantir que a avaliação nacional ocorra nos pequenos municípios cujas escolas urbanas matriculam poucos alunos. Por sua abrangência, a Prova Brasil produz indicadores para os municípios brasileiros. Recentemente, o Inep integrou os resultados da Prova Brasil e do Censo Escolar, de modo a viabilizar o Indicador de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), cujo princípio básico é o de que qualidade da educação envolve que o aluno aprenda e passe de ano. A aprendizagem é medida por meio da Prova Brasil e a aprovação por meio do Censo Escolar. De modo sintético: IDEB = (1/T ) . Nota Onde: T é o número de anos que, em média, os alunos de uma rede de ensino, de um município, de um estado ou do país, levam para completar uma série. Quando o fluxo escolar é perfeito, (1/T) assume valor 1, e o Ideb equivale à nota; quanto maior a reprovação e o abandono maior será T e (1/T) assumirá valores menores do que a unidade, apenando o Ideb. Para o cálculo da 4ª série, calcula-se T com base no fluxo escolar dos alunos até a 4ª série (5º ano); e para o cálculo da 8ª série, calcula-se T com base no fluxo da 5ª à 8ª série (6º a 9º ano). Nota é a média da Prova Brasil para a rede de ensino, o município, o estado ou o país, transformada de modo a ser expressa por valores entre 0 e 10. 28 O sítio do Inep apresenta o Ideb para cada município brasileiro. Para além da ênfase na progressão dos alunos com aprendizado, o Ideb, ao permitir o acompanhamento público do indicador de qualidade da educação por município e por rede de ensino, relaciona-se com os conceitos de transparência e de responsabilização. EFICÁCIA E EQÜIDADE ESCOLAR OS CONCEITOS DE EFICÁCIA E DE EQÜIDADE ESCOLAR De acordo com Mortimore, escola eficaz é aquela que viabiliza a seus alunos apresentarem desempenho educacional além do esperado, face à sua origem social e à composição social do corpo discente da escola (MORTIMORE, 1991). A investigação que assume a definição de Mortimore busca identificar as unidades escolares que possuem alto desempenho educacional, após a filtragem dos efeitos atribuíveis às características individuais dos alunos e à composição social do corpo discente das escolas. Uma abordagem alternativa é a que, em vez de procurar identificar as unidades escolares eficazes, busca caracterizar quais políticas e práticas escolares podem explicar o alto desempenho educacional de escolas, sempre após filtrar os efeitos atribuíveis às características individuais dos alunos e à composição social do corpo discente das escolas (RAUDENBUSH; BRYK, 2002). Neste artigo procuramos identificar políticas e práticas escolares associadas a alto desempenho escolar de alunos da 4ª série do ensino fundamental nos testes de matemática do Saeb 2001. O conceito de desigualdade intra-escolar refere-se ao processo de produção de desigualdade no desempenho escolar de alunos que freqüentam a mesma unidade escolar, muitas vezes via mecanismos sutis, outras vezes por meio de mecanismos explícitos, como o exemplificado na epígrafe do presente artigo. Fatores promotores de eqüidade intra-escolar são aqueles que propiciam a moderação (e, eventualmente, a superação) da desigualdade no desempenho escolar de alunos que freqüentam as mesmas unidades escolares. Buscamos identificar características escolares que moderam o efeito da origem social dos alunos – neste artigo focalizamos especificamente eqüidade socioeconômica, mas a discussão conceitual aqui apresentada pode ser usada no contexto de eqüidade racial ou de eqüidade de gênero – sobre o desempenho em matemática nos testes do Saeb 2001. O conceito de eqüidade intra-escolar não deve ser considerado de modo independente do conceito de eficácia. O cenário mais positivo ocorre quando as características associadas à eqüidade intra-escolar também estão associadas à eficácia escolar. Nesse caso, um mesmo conjunto de práticas escolares atua concomitantemente no sentido de aumentar o desempenho médio das escolas e de promover distribuição mais equânime do desempenho escolar dos alunos que freqüentam as mesmas unidades escolares. Já o mesmo não ocorre quando uma característica que modera o efeito da origem social no desempenho escolar está associada a baixo desempenho escolar, pois não faz sentido considerar como pró-eqüidade prática educativa que está associada a baixo desempenho escolar. Finalmente, faz-se necessário considerar a situação em que as mesmas políticas e práticas escolares estão associadas simultaneamente ao aumento da eficácia escolar e à diminuição da eqüidade intra-escolar. Examinaremos esse caso mais complexo mais à frente, à luz de resultados obtidos. Por 29 enquanto, apenas adiantamos que este último caso só poderá ser tratado adequadamente em quadro conceitual que inclua um conceito adicional, nomeadamente o de eqüidade no sistema educacional, que será operacionalizado mais à frente, a partir da consideração conjunta tanto do efeito pró-eficácia quanto do efeito antieqüidade intra-escolar de certas políticas e prática educacionais. PESQUISAS PRÉVIAS NO BRASIL No cenário internacional, a tradição de pesquisa sobre eficácia e eqüidade escolar já está bem consolidada, e há algumas revisões clássicas da literatura internacional (SAMMONS; HILLMAN; MORTIMORE, 1995; LEE; BRYK; SMITH, 1993; MAYER; MULLENS, 2000). Para uma releitura dessas revisões e considerações sobre o contexto educacional brasileiro pode-se consultar (FRANCO et alii, 2003). Ainda que a utilização dos dados disponibilizados no Brasil a partir das experiências de sistemas de avaliação da educação esteja aquém do desejável, já começa a se constituir um núcleo de publicações sobre eficácia escolar baseado em dados brasileiros3. Esta seção está dedicada à revisão desta literatura brasileira, ainda que, mais à frente, recuperemos os aspectos da literatura internacional que se mostram relevantes para a discussão dos achados da presente investigação. Para além das variáveis relacionadas com a composição social da escola, que devem ser consideradas como variáveis de controle, os fatores escolares associados à eficácia escolar descritos na literatura brasileira podem ser organizados em cinco categorias: (a) recursos escolares; (b) organização e gestão da escola; (c) clima acadêmico; (d) formação e salário docente; (e) ênfase pedagógica. Cada um desses temas é apresentado abaixo.4 RECURSOS ESCOLARES No Brasil, equipamentos e conservação do equipamento e do prédio escolar importam. Resultados neste sentido, com base nos dados do Saeb 2001, 8a série, foram reportados por (FRANCO; SZTAJN; ORTIGÃO, 2007) e por (SOARES, 2004)5. Na mesma linha, (LEE; FRANCO; ALBERNAZ, 2004) encontraram efeito positivo da infra-estrutura física da escola 3 4 5 Em sentido estrito, a investigação sobre eficácia escolar é baseada em dados longitudinais de painel, de modo a evitar as bem conhecidas limitações de investigação de relações causais com base em dados secionais. Face à inexistência de dados longitudinais de painel de boa qualidade no contexto brasileiro, a produção nacional ainda está baseada em dados secionais. Não incluímos na presente revisão estudos que deixaram de implementar controle pelo nível socioeconômico do corpo discente da escola, pois sem o mencionado controle a análise tende a produzir muitos resultados “falsos positivos”, devido à alta correlação entre boas condições escolares e alto nível socioeconômico da escola. Além disso, concentramos nossa revisão em trabalhos que passaram por processo de revisão por pares (artigos de periódicos e trabalhos apresentados em eventos que avaliam previamente os trabalhos publicados e/ou apresentados). Outros tipos de trabalho foram considerados apenas nos casos em que ajudavam a esclarecer polêmicas relacionadas com os trabalhos que passaram pela revisão de pares. (SOARES, 2004) optou por investigar o efeito de cada um dos fatores escolares por ele considerados separadamente, testando o efeito de cada variável escolar em um modelo básico, que consistia em um modelo com as variáveis usuais de nível-1 e o controle de nível-2 por tipo de escola e composição social da escola. Os demais autores considerados nesta seção incluíram diversas variáveis escolares simultaneamente em seus modelos básicos, que eram, tipicamente, semelhantes ao modelo básico de (SOARES, 2004). 30 sobre o desempenho em leitura dos alunos brasileiros que participaram do Pisa 2000. (ESPÓSITO; DAVIS; NUNES, 2000) encontraram resultados positivos para o efeito das condições de funcionamento de laboratórios e espaços adicionais para atividades pedagógicas. (ALBERNAZ; FERREIRA; FRANCO, 2002) reportaram o efeito negativo da falta de recursos financeiros e pedagógicos sobre a eficácia escolar, a partir de dados do Saeb 1999, 8a série. O mesmo resultado foi obtido tanto por (FRANCO; SZTAJN; ORTIGÃO, 2007) quanto por (SOARES, 2004) a partir de dados do Saeb 2001, 8a série. Em muitos países, recursos escolares não são fatores de eficácia escolar. A razão é que o grau de equipamento e conservação das escolas não varia muito, e que praticamente todas possuem recursos básicos para funcionamento. No Brasil, ainda persiste bastante variabilidade nos recursos, o que explica os resultados reportados acima. Deve, ainda, ser enfatizado que a pura e simples existência dos recursos escolares não é condição suficiente para que façam diferença: faz-se necessário que eles sejam efetivamente usados de modo coerente. ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA ESCOLA Em estudo baseado em dados do Saeb 2001, 8a série, tanto (FRANCO; SZTAJN; ORTIGÃO, 2007) quanto (SOARES; ALVES, 2003) reportaram que o reconhecimento por parte dos professores da liderança do diretor é característica associada à eficácia escolar. Tanto (ESPÓSITO; DAVIS; NUNES, 2000), com base em dados do Saresp quanto (SOARES, 2004), a partir de dados do Saeb 2001, reportaram efeito positivo sobre a eficácia escolar de variável que captava responsabilidade coletiva dos docentes sobre os resultados dos alunos. Na mesma linha, mas a partir dos dados do Pisa 2000 para o Brasil, (LEE; FRANCO; ALBERNAZ, 2004) registraram que a responsabilidade coletiva dos docentes, medida pelo empenho coletivo dos docentes quanto ao aprendizado dos alunos, é fator relevante para a eficácia escolar. Esses resultados estão em sintonia com os achados de pesquisas conduzidas internacionalmente. CLIMA ACADÊMICO Diversas características escolares relacionadas com a ênfase acadêmica da escola – isto é, com a primazia do ensino e da aprendizagem, a despeito de as escolas eventualmente lidarem com outras demandas sociais mais amplas – mostraram-se associadas à eficácia escolar. A ênfase em passar e corrigir dever de casa foi reportada por (FRANCO; SZTAJN; ORTIGÃO, 2007), em estudo baseado no Saeb 2001, 8a série, e por (MACHADO SOARES, 2003; 2005) em estudos baseados em dados da avaliação estadual mineira de 2002, 4a série. Nos mesmos estudos citados, Machado Soares enfatizou ainda o efeito positivo tanto do interesse e dedicação do professor quanto do nível de exigência docente sobre o desempenho médio das escolas. Face à forte conexão conceitual entre essas variáveis – o que sugere alta correlação entre elas –, a concomitante presença das três variáveis mencionadas nos estudos de Machado Soares indica a alta relevância de variáveis relativas ao clima acadêmico da escola. Ademais, a exigência docente foi também reportada por (LEE; FRANCO; ALBERNAZ, 2004) em investigação 31 baseada nos dados do Pisa 2000. Os estudos de (SOARES, 2003; 2005) enfatizaram que o absenteísmo docente tem efeito regressivo sobre a eficácia escolar, e o estudo de (LEE; FRANCO; ALBERNAZ, 2004), baseado em dados do Pisa 2000, indicou o efeito regressivo do absenteísmo discente tanto sobre a eficácia escolar quanto sobre a eqüidade intra-escolar, já que nas escolas em que o absenteísmo discente era problema, essa variável estava associada não só a menor desempenho médio dos alunos, mas também ao aumento do efeito do nível socioeconômico dos alunos em seus resultados escolares. Na mesma linha, (SOARES, 2004) reportou efeito positivo sobre a eficácia escolar e a eqüidade intra-escolar de escala construída a partir de variáveis que mediam tanto a ausência de absenteísmo discente e docente quanto de problemas disciplinares e violência.6 FORMAÇÃO E SALÁRIO DOCENTE Diferentemente dos temas acima considerados, os achados relacionados com formação e salário docente são esparsos, a magnitude dos efeitos é relativamente pequena, e a significância estatística dos achados pode não ser tão robusta quanto as anteriormente mencionadas, como ficará claro mais à frente. (ALBERNAZ; FERREIRA; FRANCO, 2002) reportaram efeito positivo sobre a eficácia escolar para a variável nível de formação docente, em estudo baseado em dados do Saeb 1999. Neste mesmo estudo, os autores reportaram também efeito positivo para a variável “salário do professor”, mas ambas as variáveis perdiam significância estatística se incluídas conjuntamente no mesmo modelo, resultado que sugere a existência de alta correlação entre nível de formação e salário de professores. A partir de dados do Saeb 2001, (SOARES, 2004) reportou resultados convergentes com os de (ALBERNAZ; FERREIRA; FRANCO, 2002). Face à relevância do tema, é recomendável que outros autores investiguem-no a partir de outras bases de dados. Já o estudo de (MENEZES; PAZELLO, 2004) faz uso de dados do Saeb de 1997 e 2001 para investigar o efeito do Fundef sobre salários e desempenho nos testes do Saeb. Trata-se, portanto, de investigação que foge à configuração geral dos estudos de eficácia escolar, mas que, ainda assim, é revisto aqui face à íntima relação do tema com a eficácia escolar. A metodologia dos autores baseia-se na adoção de um grupo de controle – as escolas privadas – com o qual é comparado o grupo de escolas que poderiam ser influenciadas pelo Fundef. Os resultados indicaram a diminuição, no período considerado, da diferença em favor das escolas privadas tanto do salário de professores quanto do desempenho dos estudantes. Esse efeito foi particularmente relevante na região nordeste. 6 O tema da literatura brasileira sobre equidade e equidade intra-escolar é amplo, e seu tratamento vai além dos objetivos dessa revisão. Resultados empíricos sobre equidade intra-escolar na dimensão socioeconômica, racial ou de gênero podem ser encontrados em (ALBERNAZ; FERREIRA; FRANCO, 2002; FRANCO; MANDARINO; ORTIGÃO, 2002; ANDRADE; FRANCO; CARVALHO, 2003; SOARES, 2004; BONAMINO; FRANCO; ALVES, no prelo; FRANCO; SZTAJN; ORTIGÃO, no prelo). Este último trabalho elabora também a distinção entre equidade intraescolar e equidade no sistema escolar, apresentando referencial para a interpretação da situação na qual variável escolar promove, simultaneamente, eficácia escolar e desigualdade intra-escolar. 32 ÊNFASE PEDAGÓGICA (FRANCO; SZTAJN; ORTIGÃO, 2007) obtiveram resultados positivos em investigação sobre o efeito de “ênfase em ensino orientado pela reforma da educação matemática”, isto é, ênfase em raciocínios de alta ordem e em resolução de problemas genuínos e contextualizados, no desempenho em matemática dos alunos testados pelo Saeb 2001, 8a série. Usando a mesma base de dados, mas com estratégia distinta de construção da variável sobre estilo pedagógico do professor, com especificação distinta do modelo no qual o efeito da variável que caracterizava o estilo pedagógico era testado e tendo analisado os dados da 4a e 8a séries do ensino fundamental e da 3a série do ensino médio, (SOARES, 2001) encontrou, antes da implementação de controle pelo nível socioeconômico médio da escola, efeito positivo associado aos métodos ativos de ensino. No entanto o efeito tornou-se estatisticamente nulo quando da implementação do controle pelo nível socioeconômico médio das escolas. A discrepância dos resultados deve estimular os pesquisadores a investigarem o assunto de modo mais sistemático e profundo. Em resumo, a revisão da literatura brasileira sobre eficácia escolar tem achados convergentes sobre o efeito positivo dos recursos escolares – ainda que os pesquisadores entendam que recursos só podem ser eficazes quando efetivamente utilizados -, da organização e gestão da escola baseadas em liderança do diretor e em comprometimento coletivo do corpo docente com o aprendizado de seus alunos – e do clima acadêmico orientado para as exigências acadêmicas do processo de ensino e de aprendizagem. A literatura examinada produziu também evidências, ainda que mais esparsas, em favor do efeito positivo do nível educacional de professores, do salário de professores e de estilo pedagógico sintonizado com o movimento de renovação do ensino de matemática. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nos últimos 17 anos houve enorme desenvolvimento da avaliação em larga escala da educação básica. Ao longo desse processo houve marcos importantes, tais como: • a implantação da avaliação nacional em base amostral no início dos anos 1990; • a transição para um sistema que permitisse comparar os resultados ao longo do tempo, modificação implantada em 1995; • o desenvolvimento de estudos de fatores associados ao desempenho escolar, a partir de 1997; • a implantação da avaliação em base censitária, em 2005; • o desenvolvimento de pesquisas que investigaram o nexo entre variação do desempenho e mudanças no fluxo escolar; • o desenvolvimento de um indicador que sintetizasse os aspectos relacionados a desempenho e a fluxo (Ideb). 33 REFERÊNCIAS ALBERNAZ, A.; FERREIRA, F.; FRANCO, C. Qualidade e equidade no ensino fundamental brasileiro. Pesquisa e Planejamento Econômico. . Rio de Janeiro: Ipea, v. 32, n. 3, 2002. ANDRADE, M.; FRANCO, C.; CARVALHO, J. B. P. Gênero e desempenho em matemática ao final do ensino médio: quais as relações? 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Embora os objetivos da educação sejam, em todas as circunstâncias os mesmos, cada estrutura tem suas particularidades. Neste texto estaremos interessados apenas na escolar, aquela parte da educação que ocorre nos estabelecimentos de ensino. Neste caso, a ênfase é na aquisição de competências cognitivas. Ao afirmar que é natural enfatizar a aquisição de competências cognitivas, não estamos sugerindo a concentração apenas nessas competências, mas a escola se legitima socialmente principalmente quando os seus alunos adquirem tais competências. RESULTADOS ESCOLARES Assumimos, portanto, que todos os estudantes buscam aprender algo. Suas famílias têm também a mesma expectativa. Para fixar as idéias, usarei a metáfora da leitura. A aquisição dessa habilidade é o resultado escolar que servirá de referência para toda a discussão subjacente. Assumimos que aprender é um direito do aluno e que só através da aquisição da competência leitora o estudante poderá se tornar um cidadão com plena capacidade de participar da sociedade. Ou seja, o aprendizado como resultado escolar é primeiramente uma exigência da cidadania, ainda que tenha outras finalidades igualmente fundamentais como capacitar o estudante para o mundo do trabalho. * Graduado em Matemática pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mestre em Estatística pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada, doutor em Estatística pela University of Wisconsin - Madison e pós-doutor em Educação pela University of Michigan Ann Arbor. Atualmente é professor titular da UFMG, no Departamento de Ciências Aplicadas à Educação e membro do Conselho Consultivo do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Sua atuação acadêmica está concentrada na área Avaliação de Sistemas, Instituições, Planos e Programas Educacionais, com ênfase em medidas de resultados educacionais e cálculo e explicação do efeito das escolas de ensino básico brasileiras. 37 Como os alunos são muitos, a única maneira socialmente viável de verificar se o direito ao aprendizado está sendo atendido em uma situação específica, é necessário organizar testes padronizados. Que captam de forma aproximada, mas sem vícios, o nível da competência leitora adquirida pelos alunos. O uso dos resultados dos alunos para avaliar a escola é opção metodológica ainda polêmica que encontra muita resistência entre os professores e gestores dos sistemas escolares. DETERMINANTES DE RESULTADOS ESCOLARES Se por um lado a escola deve ser avaliada pelos resultados de seus alunos, por outro é preciso deixar claro que esses resultados não dependem apenas da escola. Nesse sentido a escola é uma organização com grande especificidade. Para o melhor ou pior resultado do aluno concorrem também suas características pessoais, as opções de sua família, os condicionantes sociais a que está submetido no seu nível micro e macro. Assim sendo, há muitas estratégias possíveis para a melhoria dos resultados escolares. Embora estejamos interessados apenas nas estratégias escolares, é preciso pelo menos registrar as outras possibilidades. FATORES ASSOCIADOS AO ALUNO Os estudantes de uma escola ou sistema são muito diferentes. Já no seu ingresso, trazem consigo características inatas ou que lhes foi imputada pela sociedade, que afetam o seu aprendizado. A literatura nacional e internacional possibilita conhecer e medir os impactos no desempenho de fatores inatos ou adquiridos como gênero, cor/raça, saúde, trajetória escolar prévia. Embora a influência desses fatores seja inquestionável, o direito ao aprendizado não fica, obviamente, diminuído pela presença de uma ou oura característica. FATORES ASSOCIADOS À FAMÍLIA Desde o relatório Coleman e as muitas pesquisas que o seguiram, sabe-se, além da dúvida razoável, que as características culturais das famílias estão fortemente associadas ao desempenho dos alunos. No Brasil esse fato é potencializado pelas condições econômicas das famílias. Tais constatações criaram, sobretudo a partir da assimilação pouco crítica da obra de Pierre Bourdieu, um forte pessimismo pedagógico. Difundiu-se a idéia de que a escola seria mera reprodutora das desigualdades sociais que os alunos trazem. Assim a escola pouco poderia fazer para mudar esse quadro. Foge ao objetivo deste texto discutir mostrar que o menor impacto da escola diante das forças sociais não é uma lei determinística, e isso não exclui a busca da melhoria do aprendizado através de políticas escolares. 38 FATORES ESCOLARES As características dos alunos e respectiva estrutura familiar têm grande influência sobre o desempenho dos estudantes, mas não podem ser mudadas com facilidade, ou só muito lentamente. Assim sendo, pensar a melhoria do desempenho acadêmico com intervenções nos alunos ou nas famílias é frequentemente impossível ou opção com resultados muito lentos. Além disso, considerando a grande quantidade de recursos que a sociedade brasileira investe nos sistemas escolares, interessa saber como a escola pode melhorar o aprendizado dos seus alunos. Assim examinamos no restante deste texto apenas os fatores que serão classificados em fatores associados ao estabelecimento escolar e fatores associados aos sistemas escolares. SISTEMAS ESCOLARES Neste texto chamamos de sistema escolar a um conjunto de escolas com alguma organicidade administrativa ou pedagógica. Assim podemos nos referir como sistema ao conjunto de escolas municipais, ou ao conjunto de escolas que adotam um mesmo material didático, ou ainda às escolas de uma mesma denominação confessional. Essa definição é diferente daquela adotada pela LDB. MODELOS EXPLICATIVOS Há na literatura vários modelos que procuram explicar como os fatores escolares se relacionam com o aprendizado dos alunos. Naturalmente, a adoção de um modelo, ainda que não explicitado, é necessária para a tomada de decisões administrativas ou pedagógicas. Todos os modelos consideram com maior ou menor ênfase quatro grandes estruturas escolares: a gestão dos processos escolares; os recursos físicos, pedagógicos e humanos, notadamente os professores; o projeto pedagógico; e organização do ensino efetivada no âmbito da sala de aula. Melhorar o desempenho dos alunos implica modificar todos ou alguns desses quatro macrofatores. GESTÃO ESCOLAR Este fator é usualmente associado à pessoa do diretor, de forma que muitos autores sintetizam a boa escola, como a escola dos bons diretores. A gestão escolar deve se organizar a partir da centralidade do processo de ensino-aprendizagem. Como esse processo é implementado com a participação essencial dos professores que precisam de independência para reagir às muitas contingências da sala de aula, os métodos de gestão baseados apenas na idéia de padronização não se aplicam facilmente à organização escolar. A gestão escolar deve ter um viés pedagógico incluindo o cuidado com os recursos físicos e as ações para a manutenção do clima escolar necessário para o desenvolvimento de ações pedagógicas. 39 INFRA-ESTRUTURA Está se tornando muito comum desenfatizar este tema, usando como justificativa uma literatura escrita em sociedades onde as escolas têm infra-estrutura privilegiada. Isso não ocorre no Brasil. Aqui ainda há muito que precisa ser feito para a melhoria da infra-estrutura das escolas. Basta verificar que ainda há escolas funcionando sem bibliotecas. No entanto, em muitos locais no Brasil, a etapa de provimento de condições mínimas já se completou. Assim, a questão crucial de hoje é saber como usar melhor os recursos já colocados à disposição da escola, ao mesmo tempo em que se continua a expansão seletiva dos recursos à disposição. PROJETO PEDAGÓGICO A função privilegiada da escola e pela qual ela se legitima socialmente é o aprendizado de seus alunos, que só se efetiva através do processo de ensino-aprendizagem. O projeto pedagógico consiste na explicitação na rotina da escola do quê e como ensinar. Sem absoluta clareza nesses aspectos e cuidado rotineiro na sua implementação, é difícil que o aprendizado ocorra. Paradoxalmente, de maneira geral, as escolas não têm projeto pedagógico. Nos últimos anos foram feitos vários esforços de desenvolvimento de projetos, que, no entanto, não enfatizaram o processo de ensino-aprendizagem, mas as outras funções da escola. O comum na escola pública é que cada professor decida e implemente sua forma de ensinar. Raramente verifica-se se a adequação da opção feita. Como não há projeto, os treinamentos dos professores, quando ocorrem, são organizados em termos muito gerais e assim com pouca utilidade. Surpreende o contraponto das escolas privadas que, em grande número, adotam projetos pedagógicos desenvolvidos em empresas. Nessas escolas o ensino está muito mais estruturado, e os treinamentos e capacitações são específicos e com possibilidade de impacto imediato. O PROFESSOR Todos sabemos que é na sala de aula, ou nas atividades didáticas que ocorre o essencial da escola, i.e, o aprendizado. Esses momentos consistem na interação do professor com também o coletivo de seus alunos. Ambos impactam decisivamente o sucesso escolar. Há uma vasta literatura mostrando quais características dos professores estão associadas a melhor aprendizado dos alunos. Também se sabe que estes se influenciam mutuamente. São favorecidos os estudantes que estão em escolas onde os seus pares valorizam e pressionam para a obtenção de resultados cognitivos. Além das características e satisfação do professor, a qualidade de sua instrução é um fator decisivo e que pode ser ampliado, seja pela formação inicial seja por oportunidades de treinamento e capacitação. No entanto essas atividades só produzem impacto se ocorrem de forma articulada com o projeto pedagógico e forem implementadas de forma segura e rotineira. Isso raramente ocorre. Assim os muitos recursos gastos em programas de capacitação ou treinamento de professores que já aconteceram no Brasil não produziram os efeitos esperados. 40 EFEITO DA ESCOLA A literatura sobre efeitos da escola já mostrou que, isoladamente, quaisquer das centenas de fatores agregados nas quatro grandes categorias descritas acima têm pequeno efeito sobre o desempenho dos alunos. Só se observa efeito substancial na presença de certa harmonia organizacional. Isso ocorre nas situações as mais diversas possíveis. Recentemente dois grandes estudos empíricos realizados no Brasil constataram esse fato. O primeiro realizado pela UNESCO, cujo texto resultante está sendo lançado neste evento, e o realizado pelo UNICEF, que recebeu o nome de “Aprova Brasil”. Ambos mostram que é possível observar o sucesso escolar nas mais diferentes situações, com poucos ou muitos recursos físicos, com baixos ou altos salários de professores, com projetos educacionais singelos ou elaborados. Essa evidência empírica sugere que os fatores escolares podem substituir uns aos outros. O que importa para um bom aprendizado é a consistência da combinação final. Usando uma linguagem matemática, o aprendizado depende dos fatores escolares de uma forma complexa e pode assumir valores altos com combinações muito diferentes dos fatores. Ou seja, não há um tipo ideal e único de organização escolar. Outras evidências, obtidas nas análises dos dados das avaliações nacionais e estaduais mostram grande variação nos efeitos entre escolas de um mesmo sistema educacional, mesmo quando os alunos têm o mesmo nível socioeconômico. Essas evidências demonstram que projetos de intervenção escolar podem melhorar substancialmente o desempenho dos alunos brasileiros. Por outro lado, essas mesmas avaliações demonstram que é pequeno o número de escolas que o conseguiram. Qual é o motivo para esta situação? UM POSSÍVEL DIAGNÓSTICO A mera listagem das escolas com bons resultados, por exemplo, na Prova Brasil, mostra que existem mais escolas de sucesso em cidades pequenas, onde a escola está em intima associação com as outras estruturas sociais. Além da localização, a análise dos casos de sucesso indica que, atrás de cada escola exemplar há sempre o heroísmo, expresso na dedicação especial de algumas pessoas. Essas condições, raras como são, produzem um número muito pequeno de escolas de sucesso. Não se pode esperar a ocorrência de eventos tão raros para se produzir melhorias significativas no aprendizado dos alunos brasileiros. Outras soluções devem ser buscadas. A FUNÇÃO DOS SISTEMAS ESCOLARES Se a melhoria do aprendizado só ocorre na escola, a escola pública brasileira sozinha não conseguirá produzir as mudanças necessárias. Elas precisam do apoio e parceria dos seus respectivos sistemas. Estes, freqüentemente, constituídos de estruturas com enorme contingente de funcionários, não percebem sua função precípua: garantir o direito de todos os alunos ao aprendizado. Ensimesmados não produzem os incentivos necessários para que as escolas implementem mudanças efetivas, não têm processos de verificação dos resultados nem formas de apoio ao desenvolvimento e implementação do projeto pedagógico. Em suma, 41 os sistemas educacionais públicos deveriam ser o representante radical dos direitos ao aprendizado dos alunos. A realidade é, com freqüência, o oposto: os interesses defendidos não são os dos alunos, mas de corporações variadas. POLÍTICAS ESCOLARES É preciso que haja cobrança. Com freqüência, as escolas públicas não consideram o desempenho dos alunos na sua rotina diária. Se os alunos não aprendem, a resposta fácil, mas rotineira, é dizer que os fatores extra-escolares são os responsáveis ou usar dificuldades reais de alguma outra escola. Por exemplo, as dificuldades de infra-estrutura que continuam a existir são usadas para justificar o baixo desempenho em cidades que já transformaram por meio de investimentos sucessivos suas escolas. Também as enormes dificuldades de funcionamento das escolas em áreas violentas das periferias das grandes cidades são usadas para todas as escolas públicas. Compete aos sistemas trazer de forma clara o desempenho dos alunos para o centro das preocupações das escolas, através da organização de sistemas de avaliação que mostrem para cada uma a sua situação real e a distância em que se encontram em relação a metas socialmente definidas. É preciso que os sistemas forneçam meios de gestão para as escolas. A tradição brasileira implementou sistemas públicos de ensino organizados de forma excessivamente centralizada. Com isso criou nas escolas a cultura de que tudo que ocorre em cada escola é de responsabilidade de alguém externo, da Secretaria de Educação, por exemplo. São folclóricos os pedidos feitos aos órgãos centrais para o conserto dos banheiros e limpeza das calhas do telhado. Apareceriam mais escolas com melhores resultados se essa tradição imobilista fosse rompida, junto com a provisão de recursos efetivos de gestão. No entanto não se devem minimizar as dificuldades para que isso ocorra. A escola pública não controla o seu pessoal docente ou de apoio, já que os contratos são firmados com os governos. Assim, os problemas ocorrem localmente, por exemplo, as faltas dos professores, mas a solução só pode ser obtida nos órgãos centrais. O sistema escolar precisa apoiar a escola na especificação de seu projeto pedagógico. Embora cada instituição deva ter o seu, a experiência internacional mostra que os projetos de escolas de um mesmo sistema têm com freqüência muitas similaridades. Os sistemas devem oferecer exemplos concretos de projetos pedagógicos, i.e., a linha pedagógica e sua implementação em materiais de instrução e estruturas de apoio para a implementação. Não é razoável esperar que todas as escolas optem por um mesmo projeto. Assim todos os sistemas escolares públicos devem apoiar alguns modelos que possam atender à diversidade dos alunos e também às diferentes tradições pedagógicas de seus professores. Como dito antes, são muitos os caminhos para o sucesso escolar. MODELOS DE AÇÃO As políticas educacionais necessárias ao Brasil devem ser pensadas com um duplo foco na escola e no sistema. 42 Em relação à escola, há uma grande e adequada literatura sobre a escola eficaz, onde se podem encontrar exemplos de intervenções já testadas, que propiciam melhores resultados cognitivos para a maioria dos alunos. Naturalmente essa literatura assume que as escolas têm os meios necessários para implementar suas opções pedagógicas e organizacionais. Isso não ocorre satisfatoriamente na escola pública brasileira. No entanto o sucesso de muitas escolas públicas mostra que é possível obter sucesso mesmo nas atuais condições de pouca autonomia. Essa literatura precisa ser mais difundida. Infelizmente sua penetração no sistema de graduação e pós-graduação em educação no Brasil é ainda muito pequena, como se pode constatar consultando-se as bases de dados sobre a produção acadêmica educacional do Brasil. É necessário, e mesmo urgente, mudar a forma de tratamento das escolas pelos seus respectivos sistemas. Não se deve, entretanto, minimizar as dificuldades legais e políticas que qualquer projeto de mudança enfrentará. O gigantismo das secretarias de educação e sua concentração em questões distantes do aprendizado atendem a poderosos interesses corporativos. A falta de tradição em considerar também os resultados dos alunos na interação dos sistemas com as escolas dificulta a introdução das mudanças necessárias. Assumindo que uma transformação ocorrerá, a relação entre os sistemas e suas escolas poderia seguir modelo recentemente proposto pelo Prof. David Hopkins, que consiste de seis dimensões. • Metas ambiciosas A escola deve ter a clareza que seus alunos devem atingir patamares de desempenho definidos socialmente. Essas metas são expressas por uma distribuição das proficiências dos alunos. Ou seja, construídas admitindo que, sendo os alunos diferentes, seus desempenhos também devam ser diferentes. No entanto as variações devem ocorrer dentro de patamares que permitam a expressão da cidadania de todos os alunos. • Descentralização – autonomia A atividade escolar tem sempre especificidades locais ou contingências ocasionais com esquemas centralizados de gestão que impedem o seu funcionamento adequado. • Informação detalhada Os resultados de aprendizado e outros eventos relevantes que ocorrem na escola devem ser conhecidos por todos. • Acesso ao conhecimento das melhores práticas Escolhido o projeto pedagógico, o sistema deve oferecer à escola informações detalhadas para a sua implementação baseada na melhor evidência disponível. • Prestação de contas A escola deve incorporar a exigência de transparência das democracias atuais e se abrir para a sociedade mostrando claramente o que está fazendo e os resultados que está obtendo. 43 • Intervenção inversamente proporcional ao sucesso As escolas que apresentam bons resultados devem ter cada vez maior liberdade de ação. Intervenção ao sistema escolar deve ficar restrita àquelas que sistematicamente não conseguem atender aos direitos de aprendizado de seus alunos. CONSIDERAÇÕES FINAIS Vivemos hoje no Brasil, em relação à educação, um momento quando se consolida um amplo consenso sobre a seriedade dos problemas educacionais, principalmente aqueles relativos ao baixo aprendizado dos alunos de ensino básico, mesmo das competências necessárias para o exercício da cidadania. Também é cada vez mais amplamente aceita a idéia de que o aprendizado é um direito que, na reflexão apresentada na abertura deste seminário, é um direito humano inalienável. Entretanto não há ainda um consenso sobre as transformações necessárias nos sistemas e nos ordenamentos legais que regem a educação brasileira para a mudança deste quadro. Em um país diverso como o Brasil, muitas soluções terão de ser usadas. Mas todas devem ser debatidas e submetidas aos duros testes da pesquisa científica. Nesse sentido este seminário tem um papel decisivo, pois cria oportunidade de difusão de idéias oriundas de várias matrizes de pensamento pedagógico. Nessa dimensão, espero ter dado minha contribuição e agradeço aos organizadores a oportunidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS SOARES, J. F.. Melhoria do desempenho cognitivo dos alunos do ensino fundamental. Cadernos de Pesquisa. Fundação Carlos Chagas, v. 37, p. 135-160, 2007. HOPLKINS, D. Realising the Potential of System Reform. [s.l.]: [s.n.], 2007. (mimeo) 44 REPENSANDO A ESCOLA: UM ESTUDO SOBRE OS DESAFIOS DE APRENDER, LER E ESCREVER7 Vera Esther Ireland (Coord)* Bernard Charlot, Candido Gomes, Divonzir Gusso, Luiz Claudio R. de Carvalho, Mariana Fernandes, Ridha Ennafaa, Walter Garcia Este é um relato de pesquisa sobre o tema do sucesso e do fracasso escolar, realizada nas regiões metropolitanas das capitais das seguintes unidades da federação: Roraima, Amazonas, Rio Grande do Norte, Sergipe, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso e Distrito Federal. Os dados coletados referem-se ao ensino fundamental, concentrando-se nas escolas públicas que participaram dos exames do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) no ano de 2003. Uma das linhas organizativas do trabalho de pesquisa foi a das habilidades de leitura, pelos alunos, ao final da 4a série do ensino fundamental. A pesquisa utilizou duas abordagens: quantitativa e qualitativa. Pela primeira, foi formada uma base de dados recolhidos nas 225 escolas que participaram da pesquisa, composta de questionários respondidos por 17.023 alunos de 4a série, 1.329 professores de 4a e de 2a série, 317 diretores escolares e seus vices e 325 técnicos (coordenadores pedagógicos, supervisores, orientadores educacionais, psicólogos escolares e assistentes sociais escolares). Pela abordagem qualitativa, foi formada, também, uma base de dados recolhidos em 21 das escolas referidas, composta de entrevistas com professores e gestores bem como de grupos focais com alunos de 4a e de 2a série e seus pais. Em termos teóricos, os pesquisadores entenderam fracasso escolar como uma situação em que se encontram determinados atores sociais nas sociedades contemporâneas, nas quais tornou-se um problema também social e econômico, além de ser questão pedagógica e relacional. Nesse sentido, o fracasso e o sucesso não foram entendidos como fatos isolados, mas sim, como situações construídas ao longo da história institucional, cultural, social, relacional e pessoal dos alunos, cujos sentidos precisavam ser explicitados. A pesquisa buscou identificar elementos objetivos e subjetivos que permitissem melhor compreender essas situações. * Graduada em Letras pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), graduada em Psicologia pelo Centro Universitário de João Pessoa, especialista em Planejamento Educacional pela UNESCO, especialista em Educação de Adultos pela University of Manchester, mestre em Educação de Adultos pela University of Manchester e doutora em Educação pela University of Manchester. Atualmente é membro da equipe docente do Espaço Psicanalítico Estudos e Clínica, professora voluntária da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e sócia da Sociedade Psicanalítica da Paraíba. Tem experiência na área de Educação. 7 Versão resumida de publicação feita pelo Inep/UNESCO. 45 No que se refere ao conhecimento já disponível sobre o sucesso e o fracasso escolar, os pesquisadores entendem que alguns princípios já se encontram estabelecidos, a saber: • Diante e dentro da escola há uma desigualdade de classe, de sexo, de cultura, etnia, raça. • Essa desigualdade origina-se em bases materiais, financeiras, institucionais. Portanto, o combate ao fracasso escolar requer uma atuação contra a desigualdade social, a miséria, a fome etc. Uma teoria pedagógica que desconhecer esse aspecto do problema corre o risco de cumprir uma função ideológica e mistificadora: dar a entender que o problema do fracasso seria resolvido se os alunos pobres e sua família se esforçassem. Entretanto essas bases não podem explicar tudo. Com efeito, a desigualdade escolar repousa sobre bases sociais objetivas, mas produz os seus efeitos por intermédio de processos subjetivos. Não é por ser pobre que o aluno fracassa, é por não estudar o suficiente. Porém isso não significa dizer que a pobreza pouco importa: se o aluno não estuda o suficiente, muitas vezes é porque é pobre e tem outras preocupações que não a escola. A cadeia completa é a seguinte: é pobre, luta para sobreviver, não estuda muito, fracassa. É um erro desconhecer a influência da pobreza, é outro erro desprezar a implicação do sujeito na produção do sucesso ou fracasso escolar. Ignorá-la é, na maioria das vezes, substituir o trabalho paciente de transformação real das situações atuais por uma denúncia sociopolítica legítima, mas impotente. Além disso, é preciso deixar claro que sujeito e social não são duas palavras opostas, uma vez que cada um de nós é ao mesmo tempo ser humano, membro de uma sociedade e uma cultura (ou várias) e sujeito singular, original e insubstituível. O problema contemporâneo do sucesso e fracasso escolar inclui-se nessas tensões entre o que é social e o que é mais especificamente escolar, o que remete às relações sociais estruturais e o que se refere à vida psíquica do sujeito. O aluno é, ao mesmo tempo, e indissociavelmente, humano, social, psíquico (CHARLOT, 2000; 2005). • O ser humano não é objeto e nunca pode ser reduzido a esse estado, mesmo se ele próprio o quisesse. Portanto, não é pertinente considerar o aluno fracassado como vítima passiva das classes dominantes. Ele vive uma experiência que interpreta e, conforme o sentido que confere a essa situação de fracasso, ele age e reage de maneira diferente. • Que o ser humano não seja objeto, traz outra conseqüência: nunca é suficiente conhecer sua posição social objetiva, embora seja útil, e sempre é preciso saber qual é sua posição social subjetiva (CHARLOT, 2000). Cada ser humano ocupa na sociedade uma posição que pode ser levantada e analisada de fora, com base em uma categorização objetiva, mas há de se levar também em consideração o sentido que o aluno confere, subjetivamente, à posição social objetiva que ocupa. Ser objetivamente filho de operário, de desempregado, de negro, de índio etc. é uma posição social que pode ser vivenciada de várias maneiras: com amargura, orgulho, vontade de lhes mostrar (aos demais) o nosso valor etc. É essa posição subjetiva que incide na mobilização escolar da criança, e às vezes da sua família, e não a posição atribuída na classificação estatística do IBGE. 46 • A escola é uma instituição de formação, de cultura, de transmissão e apropriação de saber, e não apenas um lugar de reprodução social. Como já mencionado, não é por ser pobre que se reprova, mas por não ter adquirido os saberes e construído as competências atinentes a um determinado nível de escolarização. Portanto, a questão é compreender por que alunos, proporcionalmente mais numerosos nos meios populares, não conseguem atingir o nível esperado. • Aprender requer uma atividade intelectual. Pode-se ensinar, ajudar, acompanhar quem aprende, mas ninguém pode aprender em lugar do outro. Por sinal, talvez essa seja a maior fonte de sofrimento dos docentes: são cobrados pelos resultados do ato de ensino/ aprendizagem, apesar de não poderem produzir diretamente esses resultados (CHARLOT, 2005). Assim, é a atividade intelectual do aluno que produz o saber aprendido – a atividade do professor, as condições materiais, financeiras, institucionais, etc. incidem nas práticas do professor e do aluno, mas não as determinam. Em outras palavras: o saber e as atividades do aluno e do professor se constroem na encruzilhada entre, por um lado, exigências cognitivas e epistemológicas (que decorrem da natureza do saber a ser apropriado) e, por outro, as condições materiais, financeiras, institucionais. Mas é a atividade do aluno que é o ponto de articulação entre os demais elementos do ato de ensino/aprendizagem. • O conceito de mobilização passou a ser prioritário nos debates contemporâneos sobre a escola e o sucesso escolar. Em primeiro lugar, pesquisas mostraram que a mobilização da família é um elemento essencial nas histórias de êxito. Quando os pais encontram os professores, valorizam a escola e o que ela ensina, as chances de o filho ser bem-sucedido são maiores. São maiores também quando os pais são militantes (pouco importa para quê), uma vez que os militantes valorizam o saber. Em segundo lugar, as pesquisas sobre a relação com o saber mostraram a importância da mobilização do próprio aluno. Charlot e a sua equipe tentaram entender por que certos jovens se mobilizam em uma atividade intelectual, enquanto outros permanecem indiferentes ao que a escola ensina. Falam de mobilização e não de motivação, por considerarem que se motiva alguém de fora ao passo que se mobiliza a si mesmo de dentro. O que importa é o motor interno do movimento que leva a pessoa a adentrar a atividade intelectual. (BEILLEROT et alii, 1996) pesquisaram essa questão dos desejos, conscientes e inconscientes, que sustentam a relação com o saber. Só aprende quem entra numa atividade intelectual e só entra quem está animado por um desejo. Essa mobilização depende do sentido que o aluno confere à escola, a saber, ao fato de aprender, quer na escola quer fora dela. Portanto, esta pesquisa confere grande importância à questão do sentido e da mobilização, seja entre os alunos, obviamente, mas também entre os professores e na comunidade circundante. • Para aprender é preciso se mobilizar intelectualmente, mas também desenvolver uma atividade eficaz. Alexis Leontiev, colega e seguidor de Vygotsky, define a atividade como uma unidade entre três elementos: um motivo, um objetivo (ou um resultado antecipado) e uma ação (constituída por uma seqüência de operações). Segundo ele, o sentido é a relação entre o motivo e o objetivo, e a eficácia, a relação entre a ação e o objetivo 47 (LEONTIEV, 1984). Essa conceituação da atividade evidencia que, por necessária que seja a mobilização do aluno, não é suficiente. Estar com a vontade de saber é um bom ponto de partida, mas não garante o sucesso na chegada. A questão da eficácia da atividade de aprendizagem não ficou ausente desta pesquisa, mas permaneceu nas suas margens. A pesquisa focalizou a questão do sentido, da mobilização e não entrou diretamente nos aspectos epistemológicos, metodológicos ou didáticos da atividade dos alunos e de seus professores. Esse aspecto é relevante, mas exigiria a construção de uma rede de pesquisa mais ampla, provida de maiores recursos e, sobretudo, com grande disponibilidade de tempo para novas investigações. UMA SELEÇÃO DE DADOS OBTIDOS PELA PESQUISA SÃO APRESENTADOS A SEGUIR SOBRE AS ESCOLAS PESQUISADAS • As condições físicas, à época do exame do Saeb/2003, revelavam, em sua maioria, e de um modo geral, estado de conservação considerado adequado ou regular8. Entretanto chamou a atenção dos pesquisadores o fato de que, em algumas dessas escolas, não existissem cozinha, banheiro e telhado, mesmo que em pequena representação numérica. Nenhuma associação foi encontrada entre o estado de conservação das escolas e a unidade federada em que se localiza – isto é, havia escolas com boa e escolas com má conservação física em todos os locais onde a pesquisa do Saeb aconteceu. Tampouco foi encontrada associação, nesse quesito, por local urbano ou rural, ou por dependência administrativa – estadual ou municipal. Já em 2005 – ano da coleta de dados desta pesquisa –, na percepção dos pesquisadores de campo, algumas escolas visitadas encontram-se em estado de conservação precário, com paredes pichadas, portas e janelas danificadas, iluminação insuficiente. As salas de aula às vezes foram descritas como locais não atraentes para as crianças. Mas um item relativo à infra-estrutura física que chamou a atenção dos pesquisadores, no campo real da pesquisa, foi o da conservação e uso dos banheiros, os quais pareciam independer do estado geral em que se encontram as escolas observadas. São poucos os relatos onde os banheiros, quando citados, eram considerados bem conservados. Na maioria das escolas, quando não estavam interditados, suas condições de uso eram muito precárias ou sem as necessárias condições de higiene. • Ainda no item “infra-estrutura das escolas”, uma queixa freqüente de professores, diretores e técnicos entrevistados foi relativa ao espaço físico: pedem-se salas de aula que comportem, com conforto ambiental, a quantidade de alunos que assistem aulas – mas pede-se, também, mais quintal para o recreio, quadra de esporte e salas para atividades específicas tais como artes, informática, ciências, biblioteca e sala de leitura. 8 Em questionário aplicado pelo Saeb 2003, o estado de conservação dos prédios escolares foi investigado a partir de uma lista de nove itens, cada qual sendo avaliado por uma escala com quatro opções: adequado, regular, inadequado e inexistente. Por adequado, entendia-se que o estado era bom; por regular, que necessitava de pequena reforma; por inadequado, que necessitava de grande reforma. Os itens foram: telhado, paredes, piso, portas, janelas, banheiros, cozinha, instalações hidráulicas e instalações elétricas. 48 • No quesito “infra-estrutura pedagógica”, os professores entrevistados ressentemse de materiais diversificados de apoio ao ensino, desde livros didáticos ou de literatura, vídeos, jogos, até o mais convencional, simples e direto – nas palavras de uma professora seriam: “lápis, borracha, apontador e cadernos. Sem isso realmente não dá pra trabalhar. (...) Muita criança aqui dentro da escola é de classe baixa, então, ou eles compram um lápis, ou eles compram um pão e, então, claro que a gente dá preferência pro pão e, então, a [escola] tem que ceder o lápis”. • Quanto ao livro didático usado em sala de aula, 68,4% dos professores o declaram bom/muito bom. Mas também não deixa de ser expressivo o fato de que 20% o consideram r uim/muito r uim. Além disso, chama a atenção o fato da responsabilização contraditória pela escolha do livro didático: enquanto 17,3% dos professores dizem não saber quem fez tal escolha, 42,2% dos técnicos e 45,4% dos diretores dizem que foram os próprios professores que escolheram os livros didáticos utilizados no ano da pesquisa (2005). Por outro lado, apenas 8,6% dos professores responderam que sim, foram eles mesmos que fizeram essa escolha. Ainda nesse quesito, ressalte-se haver associação entre o livro ser considerado bom e sua escolha ter sido feita pelo conjunto dos educadores da escola; entre ser considerado ruim e ter sido escolhido pela Secretaria de Educação; entre ser considerado muito ruim e não se saber quem o escolheu. • Dentre os equipamentos mencionados nas entrevistas, ressente-se, com muita freqüência, da falta de computadores, com acesso à internet. Além disso, chama a atenção o número de vezes que professores e gestores mencionam a necessidade das escolas virem a possuir, também, uma fotocopiadora. • Em relação ao ensino da leitura, os professores e gestores reivindicam, principalmente, bibliotecas/salas de leitura e alguém designado especificamente para cuidar desse ambiente. • Toda uma gama de novos perfis de servidores vem sendo reivindicada para as escolas, principalmente o bibliotecário e o técnico em informática. Mas também, e prioritariamente, para o trabalho especializado com alunos que, em relação aos seus pares, apresentam atraso na aprendizagem da leitura/escrita, pedem-se mais condições de um efetivo trabalho paralelo. • A questão das vagas para ingresso de novatos e dos critérios de formação de turmas ainda suscita dificuldades: em muitos lugares, a população busca por escolas, ao tempo em que professores reclamam de inchaço nas turmas. Entretanto, verificada a possível relação entre tamanho das turmas e proficiência da escola, identificouse, ao contrário, que essas duas variáveis não se relacionam – ou, quando o fazem, essa relação não tem potencial explicativo: há associação entre menor proficiência da escola e a turma ter menos que 20 ou mais que 41 alunos. Este resultado reitera a literatura mais recente, segundo a qual turmas muito ou pouco numerosas têm impacto negativo sobre o rendimento escolar (CASASSUS, 2002; GOMES, 2005). 49 • Chama a atenção, nas entrevistas realizadas, a freqüência com que professores, diretores e técnicos se referem à questão da família dos alunos: muito do que acontece de bom e de ruim na escola é explicado pela origem familiar. Pergunta do tipo “como você avalia o nível de leitura dos alunos da 4a série..”. é respondida mutatis mutandis da seguinte forma: “eles são fracos, não sabem ler muito bem, não gostam de ler, porque em casa ninguém incentiva”. Raramente é identificada a função primordial da escola na tarefa de ensinar a ler a qualquer aluno, de qualquer origem familiar ou social. SOBRE OS ALUNOS • No que tange à idade, a pesquisa reiterou o conhecimento já existente de que, na trajetória escolar, as meninas estão à frente: sua idade média (10,4 anos) na 4ª série é mais aproximada da esperada do que a dos meninos (10,7). Isso reflete o fato de que os meninos tendem a retardar mais sua trajetória, com reprovações ou interrupções. Entre as meninas, apenas 10% delas se encontram defasadas mais de dois anos na seriação, enquanto vai a 16% dos meninos este mesmo contingente. Na idade própria – com nenhuma ou com defasagem compatível com entrada mais precoce – estão quase dois terços das meninas contra 54% dos garotos; e nos onze anos, um quinto delas e um quarto deles. • Quanto às características étnicas, estas foram autodeclaradas a partir de escolha de itens conforme classificação do IBGE. Deve ser lembrado, primeiramente, que no Censo Demográfico de 2000, em cada cem brasileiros 53 declararam-se “brancos”, 41 optaram pela designação “pardo”, apenas cinco, em cem, declararam-se “pretos”, e os restantes se distribuíram quase igualmente entre “amarelos” e “indígenas”. Já nas escolas pesquisadas em 2005, essas porcentagens foram bem diferentes: 37,7 dos alunos declararam-se brancos, 37,2 escolheram a opção de “pardo”, 12,6 disseram-se pretos, 7,2 indígenas, e 5,3 amarelos (orientais). Assim, enquanto no Censo de 2000 a maioria dos brasileiros declarou-se de cor branca (53%), entre os alunos da 4a série do ensino fundamental, sujeitos desta pesquisa, essa taxa foi de 37,7%: a maioria agora se considerou como “não-brancos” (62,3%). • Embora já seja de domínio público a importância da educação infantil, em si mesma, e já esteja evidenciado por pesquisas que alunos que passaram pela pré-escola tendem a apresentar desempenho algo melhor nas primeiras séries do ensino fundamental, o Brasil ainda tem muito a melhorar nesse quesito. Assim, para uma parte considerával de alunos – entre 52% e 58%, nos grupos com mais de 11 anos de idade –, porém, mais entre os meninos do que entre as meninas da mesma faixa etária, não houve oportunidade de atendimento em educação infantil. Registre-se, ainda que, dentre os que tiveram experiência pré-escolar, havia melhor perfil de relação entre idade e série, destacandose, novamente, as meninas nessa situação. Se se analisa apenas a situação dos que não tinham defasagem idade-série, encontra-se que cerca de ¾ dos alunos, de ambos os gêneros, tiveram oportunidade de atenção pré-escolar. E o efeito dessa atenção tende a ser mais acentuado em unidades federadas como Minas Gerais, Paraná e São Paulo – ainda aí, há maior proporção de atendidos em pré-escola dentre os não tão bem sucedidos no ensino fundamental. 50 • Quanto à probabilidade da associação entre gênero/cor/idade e ter ou não ter sofrido percalços na trajetória escolar, a pesquisa identificou que alunos de idade igual ou superior a 11 anos têm 6,5 vezes mais chances de haverem sofrido reprovações, expulsões ou evasão do que os alunos que têm menos de dez anos de idade. Meninos sofrem mais percalços do que as garotas, assim como os “não-brancos” em relação aos “brancos”. Neste sentido, para a maioria das unidades federadas (exceto RN e RR quanto aos meninos e SE, AM e MT quanto às meninas) o fator “cor/raça” se torna elucidativo: há mais alunos “não-brancos” sofrendo maiores percalços. • Os resultados da análise comparada das disparidades dos indicadores de percalços na trajetória escolar entre as unidades federadas conduzem, também, à identificação do que se poderia denominar de estigmatizados da escola, ou seja, aqueles que já acumularam eventos de reprovação, expulsão e abandono da escola: não ultrapassam 2% do efetivo de alunos que chegaram até a 4ª série, no entanto quem já sofreu pelo menos algum desses eventos representa cerca de um quarto do total da amostra expandida (161.345 alunos). • Absenteísmo: esta é uma dimensão a afetar o aproveitamento discente. Manter disciplinadamente um elevado nível de freqüência certamente é uma condição necessária ao alcance de bons níveis de aprendizagem. Ademais, é preciso que a escola mantenha elevado o empenho dos alunos em participar produtivamente das atividades de aprendizagem. Olhando a superfície do sistema escolar, não parece que haja um problema grave de absenteísmo: em cada cem alunos, 15 declaram jamais ter faltado por razões de saúde e quase um quarto deles declara jamais faltarem sequer por doença. Malgrado isso, gera-se alguma preocupação quando se constata que a declaração de que os motivos de saúde provocaram – para três em cada dez alunos – ausências que, acumuladas, superam o equivalente a mais de uma semana de aulas. E mais ainda, quando um quarto dos alunos diz faltar pelo mesmo lapso de tempo por várias outras razões que não esta. Vale mencionar que os professores apresentam uma apreciação um pouco diferente do fenômeno. Eles informam que uns poucos alunos (até seis numa turma) são menos assíduos; e perfazem mais de cinco dias de faltas – desde o início do ano até o momento da entrevista. E nos grupos focais o tema foi amplamente tratado, como se o absenteísmo discente ganhasse maior importância ou incidência. Entretanto constatou-se, por meio desses grupos focais, que uma parte das ausências dos alunos tem a ver com as ausências dos professores e com o fato de estas serem ou não compensadas mediante substituição por outro colega, quando a escola tem essa possibilidade. • As razões para o aluno ausentar-se da escola: as condições climáticas – expressas no termo “por estar chovendo” – aparecem com destaque, superando em dobro a proporção da informação “nunca faltei”. Problemas por doenças – mais graves ou mais simples – também provocam, tradicionalmente, decisão ou tolerância dos pais relativamente a faltar à escola, e seria quase inevitável a incidência desse motivo. Além disso, porém, alguns motivos reais podem estar subjacentes aos declarados, quando o aluno está bem de saúde, porém, sem empenho para ir à escola, e a variedade dessas declarações pode dificultar a compreensão daqueles motivos reais. Extraindo-se dos dados os casos apenas dos faltosos e um nexo entre motivo declarado e extensão da ausência, o segundo fator que se mostra de maior evidência é a chuva: tanto pela vulnerabilidade da criança em 51 face da intempérie e das dificuldades para mobilizar-se nesses dias (inclusive o custo de transporte) quanto pela conjunção da falta do aluno com a do professor9. Vários dos outros fatores, no entanto, podem estar articulados à maior ou menor motivação para participar das atividades escolares. É certo que ajudar em casa ou no trabalho dos pais – presente em quase um terço dos casos – pode ser uma questão estrutural. As demais alegações, no entanto, são predominantemente comportamentais ou subjetivas e tendem a associar-se, pois, à atratividade da escola e/ou à mobilização do aluno (e da família) para educar-se. Doença e chuva, por outro lado, incidem em casos de ausência eventual e de “curta duração”; faltas mais numerosas tendem a associar-se aos demais motivos. Ao cabo, deve ser chamada a atenção para a incidência do absenteísmo por causas motivacionais como um fator que se ajustaria apropriadamente dentro da capacidade governativa da escola, seja na sua prevenção – como parte das relações escola-família – seja em sua redução ou eliminação, mediante práticas pedagógicas e de gestão escolar mais efetivas e comprometidas com o sucesso do aluno na aprendizagem. • O tempo extra-escolar do aluno – um meio auxiliar essencial: se por um lado são preponderantes os meios e criatividade de que os professores dispõem para amparar suas atividades docentes e promover as condições básicas de aprendizagem, há, de outro lado, evidências fortes de que os alunos precisam também de apoio familiar às suas atividades escolares. E esse apoio vem tanto das interferências diretas – especialmente das mães e irmã(os) mais velha(os) – nas tarefas escolares, quanto da estimulação ambiental de que a criança pode usufruir para ampliar seu interesse e capacidade de aprender na escola. • Escola, trabalho infantil, “ajudar em casa”: embora vários estudos mostrem que o engajamento em atividades de ganho possa aumentar a partir dos nove/dez anos de idade, principalmente em famílias de renda mais baixa, esta amostra não parece alinharse com essa tendência mais agregada. Os próprios alunos declaram que apenas 5% deles “trabalham fora de casa”. Ou seja, podem colaborar em alguma função de ganho da família, mas não na rua. Animadoramente, dois terços declaram apenas “estudar e brincar”, enquanto um outro terço participa das tarefas familiares. Como se verifica dos dados, este último segmento é formado principalmente pelas meninas maiores de 11 anos – aliás, conforme uma tradição em declínio nos domicílios de sítios urbanos de maior porte. Ajudar nas tarefas familiares e trabalhar fora de casa claramente afetam de modo desfavorável o tempo disponível para complementar as atividades escolares – e, por vezes, também a disposição para ativamente delas participar. Não é incomum o engajamento nessas “obrigações” estar associado, ao mesmo tempo, com a renda familiar e a perda de estímulo para manter os filhos na escola, ante o insucesso escolar. Daí os dados revelarem que, nas condições específicas da população amostrada, alunos com retardo escolar acumulado estão sujeitos a uma probabilidade 1,6 vez maior de se ver compelido a “ajudar nas tarefas familiares” e/ou “trabalhar fora de casa” do que seus 9 Esta conjunção é mais intensamente evidenciada na pesquisa qualitativa. Já os transtornos são ilustrados pelos dados relativos ao Paraná; Curitiba notoriamente tem um clima peculiar que se reflete na maior incidência do motivo chuva para as faltas à escola. 52 colegas situados em melhor posição no seu histórico de percurso escolar. O contexto local pode influir sobre a destinação do tempo da criança fora da escola. Há maiores proporções de alunos que ajudam nas tarefas de casa em SP, SE e MT do que de alunos que apenas estudam e brincam (caso de RS, RR, MG, DF e PR). Nota-se, também, que “trabalho fora de casa” ocorre com maior freqüência em São Paulo. SOBRE OS PROFESSORES E GESTORES • Sexo e faixa etária: inicialmente destaca-se a grande diferença quanto ao número de professores, diretores e técnicos do sexo feminino frente aos do sexo masculino. Os professores e técnicos do sexo feminino corresponderam, respectivamente, a 95,2% e 93,8% da amostra pesquisada. Essa diferença também ocorreu entre os diretores, porém o número de diretores do sexo masculino já não é tão exíguo: corresponde a 13,3%. Com relação à faixa etária, a maior concentração de docentes (39,4%) e de gestores (42,1% dos diretores e 41,7% dos técnicos) encontra-se na faixa de 36 a 45 anos de idade. Já os professores foram os que apresentaram a maior freqüência de profissionais com menos de 35 anos, correspondendo a 28,7% da respectiva amostra, enquanto os diretores e técnicos, nesta mesma faixa etária, corresponderam a 14,9% e 18,2% nas respectivas amostras. • Cor/Raça: as três categorias de sujeitos da pesquisa tendem a se autoclassificar como brancos (50,4% dos professores, 56,3 dos diretores e 60,60 dos técnicos). Em seguida, classificam-se como pardos (40,9%, 34,5 e 41,90, respectivamente) e, mais a distância, como pretos (7,1%, 7,9 e 6,3). Amarelos (orientais) e indígenas ocupam uma porcentagem mínima. • Formação escolar dos professores, diretores e técnicos: 56,7% dos professores da amostra possuem ensino superior com formação pedagógica (licenciatura), 5,1% têm curso superior, porém sem formação pedagógica, e 19,3% possuem algum curso de pós-graduação, provavelmente em nível de especialização. No que se refere aos professores com formação no ensino médio, observa-se que 15,3% possuem formação pedagógica e 2,4% não a têm. Finalmente, pode-se constatar que 1,2% da amostra tem apenas o ensino fundamental. • Escolha profissional: os entrevistados referem-se à opção pelo magistério como algo interno, uma vocação ou, então, porque sempre gostaram de estar com crianças ou, ainda, porque brincava de professora desde pequena. Um outro fator diz respeito à influência exercida pela família: os entrevistados geralmente relatam que a maioria ou parte dos membros de sua família (pai, mãe, irmãos ou tios) atua ou já atuou na área educacional. Mas há, também, relatos de ingresso na área educacional por não haver outras opções ou, então, porque representava uma área onde as oportunidades de trabalho eram mais viáveis. • Tempo de magistério e de experiência no cargo: os professores podem ser divididos em três grupos: os que têm mais de dez anos de docência, que correspondem a 69,8% da amostra; os que têm entre seis a dez anos de experiência docente, 53 representados por 16,8% da amostra e, finalmente, os que atuam no magistério há menos de cinco anos, cujo grupo corresponde a 13,4% dos professores pesquisados. Em síntese, a grande maioria (86,6%) já possui uma experiência que pode ser considerada como bem sedimentada. Os dados relativos à experiência dos diretores apresentam um quadro que difere da situação dos professores: esse grupo apresenta um percentual maior de indivíduos com menos de cinco anos de experiência (62,9%) e também o de maiores percentuais nas faixas etárias mais altas, ou seja, apesar de mais velhos são os com menor experiência. Também foram recolhidas informações dos professores sobre o tempo de experiência como docentes da 4ª série e dos gestores sobre o tempo de experiência como docentes do primeiro segmento do ensino fundamental. Os resultados indicaram que 38% têm mais de seis anos de experiência com a 4ª série, e 62,1% menos de cinco anos, sendo que, dentre estes, 35% tem menos de dois anos de atuação na série. • Rotatividade de professores na escola: 32,9% dos professores estavam na escola há menos de dois anos e, por outro lado, 31,2% estavam há mais de oito anos. Tomandose por base o início do período letivo (fev./mar./2005) até a coleta de dados (set/ nov/2005), observa-se que 73,4% dos professores estavam com suas turmas desde o início do ano letivo, 17,3% entraram em substituição a outro professor, e 9,3% substituíam um segundo professor, isto é, eram o terceiro professor a assumir a turma nesse período. Ao se agrupar os percentuais relativos às substituições tem-se que 26,6% das turmas pesquisadas tiveram os professores que iniciaram o ano letivo substituídos por outros professores. • Utilização do tempo livre: praticamente não foram identificadas diferenças entre professores e gestores quanto à utilização do tempo livre. As atividades mais freqüentes são assistir à televisão, ler (revistas, jornais e livros), visitar parentes ou amigos e ir à igreja, ou seja, atividades características das pessoas convencionalmente chamadas de caseiras. • Absenteísmo de professores e gestores: existem diferenças percentuais bastante significativas entre professores e gestores quanto aos períodos de ausência ou de presença na escola. Observa-se que 52,5% dos diretores e 41,8% dos técnicos assinalaram que puderam vir trabalhar todos os dias, enquanto somente 33,9% dos professores assinalaram esse item. Quanto ao período de ausência, tem-se, por exemplo, que 21,3% dos professores deixaram de dar aulas por mais de uma semana. • Quem ensina aos alunos bem e mal sucedidos? Cruzados os dados, a pesquisa identificou que não fazem diferença significativa o tempo de experiência, a titulação, a familiaridade com a escola, a experiência na série lecionada. Ouvidos os professores, eles apontam dificuldade de avaliar as competências e identificam com objetividade os fatores que estimulam ou dificultam tais aquisições. Mais preocupante é a evidência de que, para muitos, falta formação pedagógica básica para compreender como se dá o processo de aprendizagem e que os problemas não se restringem à pobreza dos alunos ou da sua escola. 54 OS ATORES DA ESCOLA SE ENTREOLHAM • O bom aluno: combinando dados quantitativos e qualitativos, a pesquisa revelou que o bom aluno, para os próprios discentes, é aquele que obedece à professora. Para professores, técnicos e diretores, predominou o esforço, para dar conta das tarefas escolares. Essa característica parece lançar a responsabilidade para os próprios alunos (esforço = sucesso) e desviar as atenções para o cumprimento das tarefas para ser promovido. E para aprender? Coerentemente, o alunado se atribui a culpa quando reprovado, encontrando eco na maioria dos docentes. • O bom professor e o bom gestor: para professores, técnicos e diretores, o bom professor é o que tem compromisso com os seus alunos, secundarizando o domínio dos conteúdos e a capacidade didática. Quanto ao bom gestor, a principal característica é ser “democrático na tomada de decisões”. A liderança veio em quarto lugar. • Sucesso escolar: os professores tiveram respostas politicamente corretas (“os pobres podem ser bem sucedidos”), embora enfatizassem as dificuldades relativas à família e às origens sociais dos alunos. Entretanto os alunos em suas dificuldades são ajudados pela família, apesar do nível de escolaridade dos pais, muitas vezes mais baixo que o dos filhos. Os irmãos mais velhos têm interessante papel. Faltam relatos sobre o apoio concreto da escola, a não ser durante as aulas e quando professores devotados permanecem após os horários letivos com os alunos. Ainda assim, os docentes defendem que os deveres são planejados para serem realizados sem maiores dificuldades. • Acompanhamento pedagógico dos alunos: diversas falas demonstram o caráter burocrático do acompanhamento pedagógico, de caráter ritual. Também não se encontraram referências a programas de reforço e de recuperação paralela ou final, esta obrigatória por lei desde 1971. Com isso a escola corre o risco de formar um círculo virtuoso e outro vicioso: aos que têm, mais é dado, e aos que não têm, menos é oferecido. • Que fazer? Se os alunos não aprendem a ler e a escrever, os professores se queixam de turmas numerosas e heterogêneas, o que exige muito mais qualificações docentes. A heterogeneidade das turmas decorre da reunião daquelas seguintes às iniciais, sobretudo quando os ciclos terminam na segunda e quarta séries. Por seu lado, as bibliotecas e salas de leitura não existem ou são insuficientes para desenvolver as habilidades de leitura (faltam acervo, espaço, pessoal etc.). Para além do livro, as novas tecnologias da comunicação se encontram presentes em não poucas escolas, porém não há menções ao seu uso. Em poucas escolas se desenham estratégias para melhorar o ensino. O mais comum é planejar a escola, fazer a tarefa do projeto pedagógico, sem estratégias para implementá-lo. Os depoimentos de professores sugerem que a competência deles é mais importante que a titulação e a qualificação. Vale mais amalgamar os conhecimentos e as qualificações com entusiasmo, ter gosto com o que faz e manter compromisso com resultados. A escola de modestos resultados se enquista, não se abre para além dos seus muros com atividades culturais. Com isso os alunos têm desinteresse pela leitura e tendem ao conflito, à indisciplina. 55 O DIA-A-DIA NA ESCOLA • Por que os alunos vão à escola? Quatro quintos declaram ir à escola com muita vontade, apesar de essa vontade ser menor para o grupo de 9-10 anos de idade bem como para os que tiveram reprovação, foram expulsos e apresentaram distorção idade-série (possíveis fatores de desistência). Os motivos mais indicados foram as aulas, os professores, “para não ficar em casa ou na rua”, os amigos e, por fim, a merenda. Talvez por estar institucionalizada, a merenda tenha deixado de ser um fator de atração. A sua falta ou a baixa qualidade são reiteradamente mencionadas. • Aprovação/reprovação: reprovação parece mau remédio, contudo são numerosas as menções ao incômodo dos atores escolares, inclusive os pais, quanto à progressão sem aquisição de conhecimentos de leitura e escrita, resultando em alunos analfabetos na quarta série. • Relações professor/alunos: o tratamento dispensado pelos professores aos alunos é reconhecido de modo geral como positivo, se bem que parte ponderável dos alunos com defasagem idade-série queixa-se de humilhações, injustiças e preferência por alunos bem- comportados e com bom aproveitamento. Quase um terço declarou ter medo do professor e quase dois terços, do diretor. Ainda assim, as escolas foram avaliadas por quase todos os alunos, professores, técnicos e diretores como boas/muito boas. A qualidade do ensino pelos educadores foi julgada pelo desempenho de ex-alunos e egressos, pelo preparo dos professores e pelo trabalho coletivo docente. • Vontade de ir à escola: quanto a ir trabalhar, diretores, técnicos e professores, nesta ordem, manifestaram ter muita vontade. Menos de um décimo (maior incidência nos docentes) pensa em desistir do trabalho. O grupo menos motivado tende a ser o dos professores mais jovens, com menor experiência e que, por sinal, registraram maior absenteísmo. Para os mestres em geral, pontos positivos da escola são o trabalho coletivo, o comprometimento de todos os atores, bibliotecas, salas de vídeo, infra-estrutura em geral e possibilidades de diversificação do trabalho em sala. Já os aspectos negativos são as dificuldades de trabalhar em equipe, a ausência de recursos diversificados, a pouca participação dos pais e os alunos com dificuldades de aprendizagem e indisciplina. Fatores prejudiciais são também a falta de apoio da gestão escolar e educacional e a descontinuidade do trabalho docente (absenteísmo). O SABER: APRENDIZAGEM X BAGUNÇA • Os grupos focais revelam que os alunos têm uma visão bipartida da escola: é lugar onde se senta e brinca e lugar em que se fazem coisas, como ler, escrever, fazer tarefas (prazer x dever?). Indagados sobre o que gostariam de aprender na escola, eles respondem “muitas coisas” e “aprender a estudar”. A primeira resposta denota dificuldade de se lembrarem do que aprenderam recentemente, ao passo que aprender a estudar pode ser entendido como aprender a fazer o que deve ser feito na escola, isto é, a atividade escolar (na escola, se aprende a escola, ou seja, um processo fechado sobre si). As 56 crianças definem dois pólos: bagunçar e fazer. A bagunça se compara ao que os filósofos e a pedagogia tradicional chamam de emoções e paixões (Khora x logos). A bagunça para os discentes é o que conduz à punição por diretores e professores, às brigas em que os alunos se machucam e o que explica a dificuldade de aprender (não se aprende por bagunçar, bagunça é o contrário de fazer as tarefas). Dessa forma, a relação que os alunos desenvolvem com o que aprendem, ou deveriam aprender, não se fundamenta na sua compreensão, mas na sua execução. Fazem independentemente de ter compreendido o quê e por que o fazem. Essa falta de compreensão com o que aprendem parece refletir-se na realização dos deveres de casa: para os professores, os alunos podem fazê-los sozinhos; na realidade, a maioria recorre à família, de cuja participação os próprios docentes reclamam. • Aprender para quê? Os dados qualitativos mostram que as escolas não estariam conseguindo demonstrar aos seus alunos para que servem leitura e escrita. Sem isso, os alunos não se mobilizam para adquiri-las, reduzem-se à rotina. As manifestações dos alunos se referem ao futuro trabalho e ao seu emprego na vida familiar. Falta prazer de ler e escrever. No que concerne aos pais, lamentam que a escola de hoje seja diferente da sua, mas precisa ser preservada. Eles manifestam exigências de políticas que tragam resultados efetivos quanto à qualidade do ensino. Preocupam-se com o baixo rendimento dos filhos e não concordam que eles, filhos, sejam promovidos sem recuperação, sem aprenderem. Assim, não são compradores de ilusões. A AVALIAÇÃO DAS HABILIDADES DOS ALUNOS • Leitura: perguntou-se aos professores o que pensam sobre a capacidade de leitura de seus alunos, a partir de uma afirmação reiterada pelos meios de comunicação, isto é, que cerca de 55% dos alunos da quarta série não possuem as capacidades de leitura exigidas para essa série. Observou-se que, confrontados com esse dado da avaliação externa, 53,1% dos professores concordaram que a maioria dos seus alunos não tem as devidas capacidades em leitura. • Escrita: outra pergunta do questionário procurou saber se, na opinião dos professores, os alunos das suas respectivas escolas sabem escrever como eles esperariam. Nesse caso, os professores foram mais favoráveis na sua avaliação: para 54,6% a maioria dos seus alunos sabem escrever como deveriam (comparados com 42,1% dos que teriam as devidas habilidades de leitura). O otimismo é surpreendente, pois as habilidades de escrita dependem intimamente das de leitura, e poderia ser atribuído à menção, na pergunta anterior, do resultado do Saeb. QUE SÃO SUCESSO E FRACASSO? • As visões conflitantes: os dados qualitativos mostram um diálogo de surdos entre educadores, alunos e pais, que redunda na responsabilização à criança pelo seu fracasso (a vítima, ainda que muito amada). Afinal, que é o sucesso para eles? As visões dominantes 57 dos educadores são o alcance dos objetivos, os alunos se saírem bem nas situações competitivas, formar valores e atitudes e obter a aprovação e promoção. São fatores favoráveis para lá chegar: o compromisso e a preparação dos pais, a redução do hiato entre as realidades do aluno e da escola, os recursos escolares e o interesse e estímulo dos alunos (algo que aparentemente vem de dentro, mas a escola não parece ver a sua missão de despertar). Já para os alunos o sucesso depende de características aparentemente inatas, que explicam também o fracasso: dom, inteligência, vontade, atenção e disciplina (quem quer aprende; quem não quer faz bagunça e não aprende). É uma visão correspondente ao “interesse do aluno”, ressaltado pelos docentes. Os pais, por sua vez, ficam perplexos com as diferenças da escola de hoje e de “antigamente”. Concordam que a família é importante, todavia as expectativas da escola podem não ser correspondidas (menor escolaridade e falta de tempo dos pais). Os alunos novamente surgem como culpados: o sucesso provém do dom, da vontade, do esforço e da disciplina, que parecem nascer com eles, em vez de cultivados pela escola e a família. Uma visão secundária dos educadores caracteriza o sucesso não como resultado e, sim, como fatores envolvendo o aluno: satisfação e gosto do aluno pela escola, decorrentes de experiências gratificantes. Pequena parte dos alunos já duvida da sua culpa: apesar da atenção, pode não ocorrer aprendizagem. • Construindo o sucesso: aprofundando essa caracterização, que ações os educadores, alunos e pais apontam como favoráveis ao sucesso? O consenso de todos girou em torno do amor ao magistério, do conhecimento da vida dos alunos e da sua pessoa como um todo, da aproximação da cultura e realidade do aluno e da repetição dos docentes quantas vezes for preciso, corrigindo até o discente aprender. Lazer, artes, atividades culturais e esportivas e excursões são outros denominadores comuns. Além desses, são consensuais a ênfase aos aspectos lúdicos da educação, a proximidade professor-aluno e o uso de quadras esportivas, biblioteca e computadores para tornar a escola mais atrativa. A atratividade da escola é palavra-chave nos novos tempos. • Construindo o fracasso: quanto às ações conducentes ao fracasso, o consenso foi menos amplo: não aproveitar a bagagem do aluno, a desvalorização do magistério e o despreparo deste para a nova mentalidade das crianças. Afora isso, os pais assinalaram o absenteísmo docente, as turmas superlotadas e o desinteresse pelos alunos. Ainda para os pais, são fatores negativos os educadores não gostarem do aluno, castigarem-no física ou simbolicamente, ignorar violências e trabalhar só por dinheiro. Os educadores apontaram o seu próprio despreparo, o mau humor, a falta de alegria e a separação das turmas por aproveitamento, entre outras ações. AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS Dentre as constatações e sugestões da pesquisa, uma em particular é categórica: a semente do fracasso é lançada muito cedo na escola, sob a forma de falta de afetividade e valorização do aluno pelo professor evitando situações humilhantes ou depreciativas. Não se trata de amar o aluno e culpá-lo, mas de cuidar da fina tessitura do relacionamento social na escola e 58 na sala de aula para não gerar o fracasso com base em estereótipos. E, para que ele tenha professores comprometidos, freqüentes à escola, atualizados, há necessidade das políticas correspondentes e integradas. Abordagens tópicas em educação até podem servir de vitrina, mas se perdem no tempo e na teia complexa dos sistemas de ensino. É preciso gerar a sinergia entre as intervenções, em vez de seguir receitas de bolo. E cabe acrescentar: boas políticas não fazem bodes expiatórios. Não se trata de culpar diretores, professores, alunos, pais, no jogo de empurra retratado pelos dados. Puxa-se o fio à meada não pela culpa, e sim, pela responsabilidade de todos. Responsabilidade com sujeito e predicado, clara conforme a lei, para as autoridades cumprirem e fazerem cumprir. Fica claro que é elevada a importância da escola para o desenvolvimento socioeconômico – e vice-versa. Entretanto, uma só andorinha não faz verão. Nem se pode esperar que a educação resolva os problemas sociais, nem que a pobreza diminua para despontar, caído do céu, o paraíso de uma nova escola. Alunos e pais valorizam a educação pública e merecem a continuidade das suas políticas públicas, na visão de Estado, não de governos. É doloroso repetir, já a caminho de um século, o que os pioneiros da Educação Nova publicavam nas décadas de 20 e 30. E o que Rui Barbosa, deputado do Império, escreveu, lá se vai mais de um século. A realidade das escolas exige dinheiro, a “despesa sagrada”, segundo Miguel Couto na Constituinte de 33-34. Não, porém, despesas astronômicas, e sim, dinheiro rigorosamente aplicado segundo prioridades. Banheiros sujos e mal cuidados são um exemplo de tradição mantida até hoje por instituições a quem cabe o dever de educar (pelo exemplo). Que falta para alterar isso? Material de limpeza, efetivamente usado, reformas ou construções executadas segundo os contratos, contratos adequadamente feitos e supervisionados. Pessoal não-docente a quem o contribuinte paga. Autoridade e liderança para obrigar todos e cada um a cumprir o seu papel, pelo exemplo do cumprimento do seu. Questões antigas, não sujeitas ao vórtice das modas, na compressão pós-moderna do tempo e do espaço. Quanto a uma escola atrativa, qual o valor efetivo do livro e da biblioteca na escola? Se a biblioteca é um recanto descuidado, espelha a falta de tradição de uma cultura letrada. Ler e escrever são tarefas para cumprir programas, não para a vida. O que não é para a vida é pouco útil. Se um revólver clandestinamente comprado por um adolescente lhe for mais útil, em termos de prestígio social, renda e poder, a sua opção será o revólver. E as quadras, as brincadeiras, as instalações e equipamentos mínimos para fazer uma escola digna do nome? E a informática que funcione, que não seja um sacrário hermético ao lado de um cemitério de equipamentos deixados de lado por falta de peças e de serviços. Apesar de estarem à venda, até na esquina! Não se faz escola apenas com aluno e professor. Se é inaceitável para países no último estrato da economia terem escolas em choupanas, por que um país com o porte de fazer alianças e dialogar com o G8 pode aceitar a precariedade? Além disso, existe aquela fina tessitura das relações sociais na escola. Toda a educação se assenta sobre valores, sejam eles quais forem. Quais são os da educação presente? Uma das alternativas usuais é a formação continuada dos educadores, buscando tapar buracos da formação inicial ou falta dela. Em princípio, ótimo. Porém, quantas pesquisas mais precisam 59 ser ouvidas para se mudar a rota, no sentido de trabalhar com as mãos na massa, aproveitando, sugando e renovando todo o conhecimento e experiência prévios do educador? Quanto se gasta com a formação inicial e continuada que não faz diferença? Tudo isso depende de nós. REFERÊNCIAS BEILLEROT, J.; BLANCHARD-LAVILLE, C.; MOSCONI, N. Pour une clinique du rapport au savoir. Paris: L’Harmattan, 1996. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. A educação no Brasil na década de 90. Brasília: MEC/Inep, 2003a. _____. _____. _____. Sistema nacional de avaliação da educação básica – Saeb. 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A escola de qualidade para todos: abrindo as camadas da cebola. Ensaio: Avaliação de Políticas Públicas em Educação, v. 13, n. 48, p. 281-306, jul./set. 2005. 60 LAHIRE, B. Sucesso escolar nos meios populares: as razões do improvável. São Paulo: Ática, 1997. LEONTIEV, A. N. Activité, conscience, personnalité. Moscou: Ed. Du progrès, 1984. PATTO, M. H. S. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo: 2002. PEREIRA, L. O professor primário metropolitano. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura/Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos/Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, 1963. _____. A escola numa área metropolitana: crise e racionalização de uma empresa pública de serviços. São Paulo: Pioneira, Ed. da Universidade de São Paulo, 1967. PLATÃO. A República. São Paulo: Martin Claret, 2002. SAVIANI et al. O legado educacional do século XX no Brasil. Campinas, SP: Autores Associados, 2004. UNESCO. 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Essa forma de raciocinar parece pouco aceitável por dois motivos: primeiro, uma função fundamental da educação é a de modificar o círculo vicioso de pobreza; aliás, o sistema educacional deve contribuir para que as crianças saiam do entorno social de seu nascimento e desenvolvam habilidades e destrezas que lhes possibilitem ter uma vida melhor do que a de seus pais. Sem isso não há desenvolvimento social do país. Segundo, não é verdade que todas as crianças que vêm de famílias pobres têm desempenho baixo. Muitas delas obtêm bons resultados, pelo próprio esforço, pela atenção de seus pais e pela contribuição do Estado, sendo esse último o assunto de nossa pesquisa, descrito brevemente neste relatório. Buscamos identificar as boas práticas de gestão em nível de município, que levam a rede escolar a obter um resultado melhor do que o esperado por suas condições socioeconômicas. O que está sendo feito nessas redes que leva seus alunos a obter sucesso no aprendizado? Para tanto, desenvolvemos uma metodologia qualiquantitativa: quantitativamente, usamos a base de dados da Prova Brasil e outras bases de dados referentes à dimensão socioeconômica, para identificar as redes bem-sucedidas; qualitativamente, fizemos uma pesquisa de campo com entrevista em profundidade com os responsáveis pelas redes escolares. Se fôssemos ao campo para investigar apenas os municípios que tiveram resultados inesperadamente bons na Prova Brasil, dadas suas condições socioeconômicas, ficaria impossível atribuir a boas práticas os resultados encontrados. Para fazer tal associação, precisávamos saber se as mesmas práticas * Banco Mundial 10 Pesquisa desenvolvida por equipe MEC/BIRD. Co-autoria de Isabel de Assis Ribeiro de Oliveira, Professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 63 não seriam observadas nos municípios com resultados pouco satisfatórios. Também consideramos a possibilidade de existirem práticas notáveis nos municípios cujos alunos tiveram desempenho relativamente fraco que deveriam ser consideradas como fatores explicativos. Com esse intuito, fizemos regressões da média das notas da 4ª série das escolas municipais e por região, nas provas de português e matemática. Calculamos o valor estimado da regressão, e dele subtraímos o valor atual do município para calcular o valor de resíduo. Os efeitos da política educacional estão, por hipótese, representados nesse resíduo. Estabelecemos uma lista de três grupos de redes municipais, definidos por valor positivo (municípios “bons”), valor zero (municípios do grupo de controle 1) e valor negativo de desvio (municípios do grupo de controle 2). Escolhemos, por região, municípios nos seguintes estados: (i) NE – Bahia, Pernambuco e Maranhão; (ii) SE – São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais; (iii) N – Pará; (iv) CO – Goiás; (v) SUL – Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Em cada estado escolhemos dois municípios desviantes positivos, 1 desviante zero e 1 desviante negativo, que não estivessem muito distantes da capital (por uma questão de logística), e que contassem com 10 a 60 escolas. Ao longo da pesquisa, dez outros municípios foram agregados para a pesquisa estritamente qualitativa. O desvio positivo de uma rede municipal pode resultar da combinação de dois motivos: (a) porque a rede tem algumas escolas com resultados muito bons, que levam a que tenha média melhor, apesar de ter escolas com resultados não tão bons; (b) porque a média das escolas da rede é melhor em geral, e não somente pela presença de algumas escolas excelentes. Na Tabela 1A, os dados mostram que os municípios desse grupo em geral têm grande proporção das escolas com desvio positivo. Esse fato é vital para a pesquisa de boas redes, porque a identificação de boas práticas no nível da rede aplicada para todas as escolas da rede poderia ser diferente de boas práticas da rede com apenas algumas escolas excelentes. A Tabela 1B apresenta a descrição do segundo grupo das redes. O desvio não era exatamente zero, mas era perto de zero. Nesse grupo, menos de metade das escolas das respectivas redes eram escolas com desvio positivo. 64 TABELA 1A – Pesquisa do Campo – Mostra dos Municípios Bons 65 TABELA 1B – Pesquisa do Campo – Mostra Grupo Controle 1 (Desvio Zero) Finalmente, na Tabela 1C estão os municípios de grupo de controle 2. É preciso enfatizar que nesse grupo não estão municípios realmente ruins, e sim municípios com resultados um pouco (média de 8 pontos) inferiores ao esperado pela suas condições capturadas nas regressões. Em geral, municípios desse grupo há poucas escolas com desvio positivo, um fato simétrico à observação de haver poucas escolas de desvio negativo no primeiro grupo apresentado na Tabela 1A. TABELA 1C – Pesquisa do Campo – Mostra Grupo Controle 2 (Desvio Negativo) 66 Visitamos cada um desses 50 municípios em um período aproximadamente de duas semanas – as últimas duas semanas do mês de novembro de 2006. Por razões operacionais, os dados tabelados são provenientes de amostra menor de municípios, tendo sido retirados do primeiro grupo os seguintes municípios: Tramandaí, Balneário Camboriú, Campo Bom, Brusque, Novo Hamburgo e Santa Cruz do Capibaribe; do grupo de controle 1, foi retirado o município de Parobé; e, finalmente, do grupo de controle 2, foi retirado o município de Goiana. O marco conceitual para a pesquisa de campo foi sendo constituído a partir de uma constatação e de uma premissa: verificamos que a diferença entre o grupo de municípios com desvio positivo e os grupos de controle estava em torno da metade de um desvio padrão; percebemos também que a variação dos resultados era máxima entre alunos dentro da mesma escola. Nossa premissa é a de que por trás da heterogeneidade dos resultados existe uma heterogeneidade grande de contexto local, envolvendo a historia, a política e a estrutura social e cultural em que se situa cada rede que pesquisamos. Uma rede municipal de educação, mesmo sendo relativamente pequena, com dez escolas ou com 2.000 alunos, é um sistema complexo e adaptativo – isso significa que as diferentes partes do sistema interagem entre si de diversas formas e que o sistema sempre está se alterando em função da adaptação às mudanças no seu entorno.11 O mais importante, entretanto, é que o sistema compõe-se de seres humanos – os alunos e suas famílias, a comunidade, os professores e demais funcionários da escola e da administração da rede, os provedores de bens e serviços, e os atores governamentais. Assim, se buscamos descobrir padrões e atributos comuns para o grupo de municípios de desvio positivo, o fazemos lembrando da complexidade e, portanto, evitando estabelecer conclusões simplistas. Quando ressaltamos a importância da capacitação dos supervisores, dos núcleos gestores e dos professores, estamos atentos para a natureza do programa de capacitação, sua utilidade, sua adequação à especificidade de cada grupo. Da mesma forma, ao identificar os processos pelos quais os diretores são escolhidos, sabemos que a indicação política, ou a escolha pela comunidade são termos que abrigam práticas distintas, com significados e resultados variados. De resto, foi o reconhecimento dessa complexidade que nos levou a escolher o estudo de caso como complemento indispensável à melhor compreensão do processo administrativo diretamente relacionado ao aprendizado. Na seção seguinte, Seção 2, apresentamos uma caracterização da visão e de planejamento das SMEs, responsáveis pela implementação de suas políticas educacionais, e, na seção 3, falamos dos programas federais, estaduais e municipais. Na Seção 4, enfatizamos os aspectos de liderança. A Seção 5 continua com uma discussão sobre a equipe central da SME. A Seção 6 apresenta informação obtida relativamente ao contexto escolar, particularmente sobre o tema de apoio e acompanhamento da SME para as escolas. A Seção 7 está dedicada a uma breve caracterização sobre o compromisso dos professores; e a Seção 8 para análise da gestão escolar, voltando-se a penúltima (Seção 9) a discutir o assunto primordial de relacionamento da SME com a comunidade. 11 Sistema Complexo e Adaptativo é a tradução em português do conceito formulado em inglês como Complex Adaptive System (CAS), definido, por exemplo, no livro HOLLAND, J. A ordem oculta: como a adaptação gera a complexidade. [s.l.: Editora Gradiva, 1997. 67 VISÃO E PLANEJAMENTO VISÃO PROSPECTIVA: AONDE SE QUER CHEGAR Pode-se sustentar que o rumo da educação fundamental é dado pela visão que a liderança educacional do município tem acerca do que seja um ensino de qualidade. Como era de se esperar, isoladamente ou associada a outra função pública, como saúde e infraestrutura, mais de 75% dos entrevistados afirmaram que educação é prioridade no município. Apenas sete redes escolares (sendo três delas, do grupo de controle 2) não conquistaram lugar de centralidade na agenda dos prefeitos,12 havendo ainda três casos em que não ficou clara a prioridade da política municipal. Como educação é termo polissêmico, o fato de a maioria das secretárias lhe conferirem importância ainda não nos esclarece sobre o empenho na prestação desse serviço. De fato, ao solicitar que explicitassem o significado conferido a uma educação de qualidade, defrontamo-nos com uma diversidade de interpretações, própria à heterogeneidade cultural das cidades brasileiras. A Prova Brasil estabelece um critério claro para definir a educação de qualidade, que é a que leva ao domínio de conteúdos básicos em português e matemática. Em consonância com essa visão, encontramos, em muitos municípios, o acionamento de termos afins para conceituar uma boa educação. Em uma das secretarias que adota o programa Rede Vencer, a definição foi idêntica à proposta pela instituição por ele responsável: “aquela que garante o acesso, a permanência e o sucesso do aluno”. A identificação de um papel social para a escola também esteve presente na concepção da educação de qualidade, como em Caraguatatuba (SP), bem como a ênfase conferida às necessidades básicas da criança, caso do município de Caxias (MA), onde “servir café da manhã além da merenda escolar para atender a realidade municipal” é considerado um “mal necessário” à boa educação. A desestrutura familiar foi citada mais de uma vez como fator preponderante do fracasso escolar: a Secretária de Pedreiras (MA) reclamou que a escola vem tendo de assumir o lugar dos pais e que com isso perde suas características principais. Finalmente, cabe notar a posição da Secretária de Itapecuru Mirim (MA), para quem uma educação de qualidade significa “professor preparado e compromissado; professor responsável, que trabalhe, mas não apenas pelo salário: educação é professor”. Para ela, “um município com poucos recursos econômicos, muitas vezes leva as pessoas a escolherem a profissão de educador, não por “dom (vocação), mas por causa da remuneração”. 12 A análise dos casos com esse perfil, sugere que se a SME está atenta para as condições de funcionamento de sua rede, recaindo a ênfase de sua política mais nos aspectos disciplinares e na qualidade das condições materiais de ensino – prédios escolares bem cuidados, merenda muito bem controlada, do que no aprendizado dos alunos. 68 Em geral, observamos que a visão da liderança educacional contempla múltiplos temas e não só a qualidade da educação; definitivamente não está pautada pelas notas resultantes da Prova Brasil. As redes boas têm uma preocupação que vai além do rendimento dos alunos. A educação é entendida como função do estado voltada para a formação da cidadania, e temas relacionados à ética, à compensação necessária dada a precariedade da estrutura familiar, ao esporte e a atividades lúdicas e artísticas compõem o conceito de um ensino de qualidade, como fica claro no Plano Diretor de uma rede boa: A educação deve ser entendida como processo que se institui na vida familiar, no exercício da sociabilidade, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, no empreendedorismo, nas organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais, devendo ser fundada nos princípios de liberdade, das vocações culturais e territoriais e nos ideais de solidariedade humana, tendo por finalidade o pleno desenvolvimento do cidadão no campo da ética, da cidadania e da qualificação profissional. Constata-se uma grande distância da “simples” idéia de melhorar a aprendizagem do aluno em disciplinas básicas igualmente medidas através de avaliações padronizadas. A Tabela 2 mostra a variedade de perspectivas, independentemente do tipo de rede, revelando a inexistência de consenso básico sobre prioridades no campo educacional, o que nos leva a supor que, efetivamente, não existe uma preocupação focalizada quanto aos rendimentos dos alunos numa avaliação como a da Prova Brasil. TABELA 2 – Visão da Educação por Tipo de Rede Outros: incluem os seguintes temas: questões étnico-raciais, eqüidade da qualidade da rede, merenda escolar, transporte escolar, gestão escolar, alunos com necessidades especiais, ampliação da oferta de vagas no Ensino Fundamental, educação popular e democrática e mães crecheiras. Obs.: B: rede “desvio de regressão positiva” C1: rede “desvio de regressão zero” (controle 1) C2: rede “desvio de regressão negativa” (controle 2) 69 De qualquer modo, constatou-se não apenas que poucas vezes a questão das habilidades cognitivas propugnadas como centrais para a avaliação do ensino fundamental apareceu de forma explícita na visão da liderança, como também o fato de que muitas não tiveram conhecimento dos resultados da Prova Brasil. Mesmo sabendo com antecedência de pelo menos alguns dias que a SME seria visitada por pesquisador voltado para o tema, algumas secretárias não conseguiram ou procuraram obter informação sobre a avaliação de sua própria rede escolar. Nota-se ainda que essa proporção é maior entre as piores redes. O fato é indicativo do grau de relação maior ou menor das SMEs com o MEC e suas políticas, portanto merece análise cuidadosa. Todavia, inicialmente, vale ressaltar que muitas secretárias, como a de Timbó (SC), já estão usando os resultados da Prova Brasil precisamente para atender o objetivo principal dessa avaliação: conferir atenção especial para as escolas que tiveram resultado ruim. Em segundo lugar, cabe salientar a situação precária de muitas das SMEs que desconheciam a prova, como aquelas em que, como Gandu (BA), nem mesmo a SME está digitalmente incluída. Mas é importante notar o alinhamento existente entre o MEC e as escolas, quando se verificou que em muitos casos foram as diretoras que trouxeram ao conhecimento das suas respectivas SMEs os resultados da prova Brasil realizada nas próprias escolas. Com base nessa realidade, fica registrada a importância de se associar as políticas de avaliação do ensino a uma política de conscientização da necessidade desse procedimento bem como do desenvolvimento de ferramentas adequadas para sua utilização. PLANEJAMENTO Uma política educacional planificada expressa, em geral, não apenas a relevância conferida à educação, mas também um modo racional de tratá-la, uma vez que o planejamento requer identificação de objetivos (em princípio, referidos a um diagnóstico do contexto educacional), especificação das metas, bem como critérios para avaliação dos esforços feitos. Nesse sentido, buscou-se identificar os diversos níveis de planejamento da política, em termos de Plano Plurianual (PPA), Plano Municipal de Educação (PME) e plano de governo. Como se vê na tabela abaixo, 29 das 41 redes têm um PPA, e 18, o PME. Planos de governo em geral não são formalizados, mas os municípios do Pará e um, do Maranhão, têm no Plano Diretor Urbano suas diretrizes educacionais. TABELA 3 – Planejamento por tipo de rede 70 De um modo geral, o PPA é o instrumento de planejamento educacional mais utilizado pelas 41 redes escolares da amostra, ainda que não tenha sido possível identificar com clareza as redes escolares que utilizam exclusivamente o PME como instrumento específico de planejamento setorial. É relativamente baixa a proporção de municípios que contam com PME e, embora não tenha sido possível ter acesso a todos os planos municipais existentes, grande parte daqueles por nós analisados contemplavam um excesso de metas, correspondendo a diretrizes e objetivos genéricos, fato que parece dificultar a execução e o acompanhamento das ações de política educacional. Não é surpreendente, portanto, que aparentemente seja tênue a associação entre resultados positivos na Prova Brasil e a existência de instrumentos formais de planejamento educacional: o número de dez municípios dos grupos de controle 1 e 2 que elaboraram o PME é bastante próximo do total de oito municípios bons que também contam com um plano. O que parece ser mais evidente é que nas redes boas existe uma visão sobre o que o governo municipal quer alcançar como meta de educação – uma visão sobre qualidade e eqüidade. Em alguns casos essa visão é traduzida em um plano, mas não simplesmente um plano formal com perspectiva de muitos anos. Onde há visão e liderança, tipicamente nas boas redes, se usa um plano operacional que nem sempre tem o nome de um plano. PROGRAMAS FEDERAIS, ESTADUAIS E MUNICIPAIS Encontramos em nossa amostra o uso de amplo espectro de programas federais com forte presença da política nacional voltada para a educação de jovens e adultos (EJA), implementado por 34 redes escolares municipais da amostra, ou seja, cerca de 80% do total investigado. A tabela a seguir mostra também o uso freqüente de programas de alfabetização. TABELA 4 – Principais programas federais por tipo de rede * Outros Programas: Os 14 programas que são implementados por um total de pelo menos cinco redes estão no quadro acima. Os demais foram agrupados nesta categoria: Pró-Infantil, PNLD, Saberes da Terra, Universidade Aberta, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, Escola de Fábrica, Pró-Uni, Pró-Info, BB-Educar, BB-Comunidade, Jovem Aprendiz, Qualiescola, Se Liga, Educação no Campo, Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares, Projeto Catavento, Panae-Projeto de Atendimento Escolar e Formação Continuada. 71 Merecem ainda destaque outros programas federais implementados pelas SMEs: o Fundo de Fortalecimento da Escola (Fundescola) e seus produtos como a Escola Ativa, Gestar, PDE e outros, direcionados para alunos das áreas urbanas e rurais das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Todas as redes escolares pesquisadas nos estados do Nordeste (Bahia, Pernambuco e Maranhão) implementam o Fundescola; no Pará, são três redes, e em Goiás apenas uma: a do município de Itaberaí. O Fundescola com seus produtos configura-se como a ação educacional mais proativa para as redes escolares das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Se considerarmos o programa de EJA, além dos programas Brasil Alfabetizado (implementado por nove redes escolares municipais com vistas a alfabetizar indivíduos com 15 anos ou mais), o programa Alfabetização Solidária (implementado por três redes escolares, também para alfabetização de alunos de áreas pobres rurais e urbanas) e o programa de Aceleração da Aprendizagem e Correção de Fluxo (implementado por 13 redes escolares com o objetivo de assegurar o atendimento aos alunos que apresentam defasagem idade-série de dois ou mais anos), teremos que os programas federais mais expressivos implementados pelas redes escolares municipais investigadas possuem função corretiva em relação às deficiências educacionais dos alunos da rede publica. Os programas estaduais implementados pelas secretarias municipais de educação, estão na tabela a seguir. TABELA 5 – Principais programas estaduais por tipo de rede * Outros Programas: Os sete programas implementados por pelo menos duas redes, estão no quadro acima. Os demais foram agrupados na categoria de outros, a saber: Gestar, Alfabetização Solidária, Oficina de Contadores de Estórias, Alfabetização Cidadã, Telessala, Se Liga, PróInfantil, Ensino Fundamental de 9 anos, Semeando, Entre na Roda, Projeto Brincar, Projeto Escrevo o Futuro, Caravana do Conhecimento, Agenda 21, Pré-vestibular Social, Alfabetização Rio Grande, Erradicação de Drogas, Novos Horizontes, Alimentação. O conteúdo dos programas estaduais implantados pelas redes municipais da amostra consiste em quatro temas fundamentais: alfabetização, gestão escolar municipal, capacitação de professores e avaliação dos sistemas de ensino e conteúdo curricular. Muitos municípios desenvolveram programas próprios. Em geral, programas sem acréscimo significativo de despesa, ou aqueles em que o secretário tomou iniciativa para obter recursos adicionais. Devido 72 ao grande número, à diversidade substantiva e às suas variadas designações, optou-se por agrupá-los em categorias temáticas de acordo com o conteúdo. A utilização desse critério permitiu identificar 18 categorias temáticas, como pode ser visto na tabela a seguir. TABELA 6 – Principais programas municipais por tipo de rede * Outros Programas: Os 18 programas que são implementados por mais de duas redes estão no quadro acima; os demais são: EJA, Saúde e Higiene, Resistência às drogas e à violência, Atendimento psicológico e auto-estima, Enriquecimento curricular, Projeto Curumim, Pró-Rural, Educação a Distância, Capacitação das Merendeiras, Ética, Educação para o Trânsito, Transporte escolar, Melhoria da qualidade escolar, Empreendedorismo, Programa para Quilombos, Bolsa universitária e História. A análise dos programas educacionais implantados pelas 41 secretarias municipais de educação indica alguns pontos interessantes: os principais programas federais selecionados por esses órgãos como parte do planejamento educacional municipal são de caráter corretivo e compensatório, isto é, são ações que buscam minimizar as conseqüências negativas decorrentes de um processo de alfabetização e aprendizagem deficiente, ou então, inexistente. Isso indica que o papel do MEC na oferta e apoio técnico para implementação de políticas compensatórias está sendo bem sucedido. Por outro lado, os principais programas educacionais estaduais adotados pelas redes escolares visitadas privilegiam o aprimoramento da qualidade da oferta pública do ensino: adoção de procedimentos de gestão do sistema de ensino e de ações estratégicas que deverão incidir sobre o sistema escolar, além da capacitação dos professores. Os programas educacionais municipais são direcionados mais para obterem maior equilíbrio entre a qualidade da oferta e da demanda do ensino, enquanto os de caráter corretivo e compensatório são realizados com apoio dos governos federal ou estadual. 73 A pesquisa revelou, também, a importância relativa dos recursos materiais disponíveis, se contrastados com recursos simbólicos, pelos quais se discernem caminhos alternativos para o aprimoramento do ensino. Em outras palavras, mesmo sem dinheiro a criatividade pode operar a favor do aprendizado. Não se trata aqui de minimizar a importância dos recursos materiais. O que queremos assinalar é o caráter relativo da limitação imposta por essa escassez. Mesmo em uma rede muito pobre, cujos resultados ficaram abaixo do esperado, a secretária verificou que, em um universo de 18 mil crianças, cerca de 10% tinham dificuldades extremas de leitura. Tomou então a iniciativa de criar o contraturno, projeto desenvolvido em parceria com a Faculdade de Letras local: um sistema de monitoria cujos graduandos foram treinados para atender 32 crianças, 16 em cada turno por duas horas, todos os cinco dias letivos da semana, por noventa dias. Ao final do projeto, 70% das crianças mostraram melhora significativa no processo de ensino-aprendizagem. LIDERANÇA A visão da educação de qualidade e a liderança para imprimir mudanças no ensino e na aprendizagem estão intimamente associadas ao perfil do Secretário Municipal de Educação. O perfil dos responsáveis pelas secretarias municipais de educação por nós entrevistados revela a competência necessária para ocupação do cargo. No que concerne à qualificação de seus titulares pode-se afirmar, com base em nossos resultados, que todos são graduados, uma minoria com pós-graduação. A maior parte já havia tido experiência com administração pública, particularmente na área educacional, havendo também uma minoria que saiu diretamente de uma trajetória profissional no espaço escolar para a gestão da SME. Um título de nível pós-graduado não é garantia de boa liderança; mas nós observamos a quase ausência de pós-graduados nos grupos C1 e C2. No entanto, com base nas conversas com os entrevistados, podemos dizer que, em geral, o fato de ser pós-graduada assinala a energia da pessoa para procurar aperfeiçoamento pessoal e profissional. Do ponto de vista da política voltada para o aprimoramento da educação, não podemos sugerir, simplesmente, que se dissemine um critério de escolha pautado na qualificação profissional formal do secretário municipal; ou seja, que só possa ser secretário quem tenha pós-graduação. Mas podemos dizer que seria importante que o prefeito, ao avaliar os candidatos, paute sua escolha levando em consideração a razão pela qual o candidato obteve (ou não) um título de mestre ou doutor. Um outro aspecto interessante é a experiência pregressa no magistério e, especificamente, como diretor da escola. Havia secretários com essa experiência nos três grupos de municípios. Mas os secretários com esse tipo de experiência do grupo B (ou seja, as ‘boas redes’) certamente aproveitaram melhor a experiência adquirida na resolução de problemas administrativos para efetivar, liderando, um processo de mudança e reforma. É interessante ressaltar que a experiência pregressa do(a) secretário(a) e sua capacidade de enfrentar as situações adversas quando na função de direção da escola tem efeito surpreendente no desempenho atual do cargo à frente da SME. Foram identificadas várias situações que moldaram a experiência 74 dos(as) secretários(as) tais como, desde a direção de escolas funcionando em igreja ou mesmo bares, onde não havia prédio escolar, até, mais freqüentemente, em edifícios mal construídos em bairros carentes; escolas com muito conflito interno ou com pouca atenção ao processo de aprendizagem. Todas essas experiências anteriores parecem contribuir fortemente na forma como os secretários das SMEs tomam decisões e enfrentam crises no sistema de ensino sob sua responsabilidade. Merece destaque, aqui, a atuação da Secretária Municipal de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, tanto por sua formação (Mestra em Educação Especial) quanto experiência pregressa (diretora de escola, por catorze anos). A primeira providência que tomou, assim que assumiu a SME, quando corria o rumor de que haveria demissões em massa, foi o de preparar uma pequena pesquisa sobre o posicionamento de seus 80 funcionários, 50 diretores escolares e 1.500 professores, em relação à educação. Com isso, obteve informações preciosas não apenas acerca das dificuldades da rede que começara a administrar, como também das sugestões e propostas do pessoal sob sua responsabilidade. “Uma líder que gosta de escutar”, capaz de sistematizar toda esse insumo em diretrizes para estabelecer sua política de reforma do aparato educacional, devidamente discutida com todos os que se interessaram em se envolver mais fortemente com o ensino e a aprendizagem, é um exemplo a ser seguido. O processo, uma vez deslanchado, resultou em cortes de pessoal e mudanças na direção escolar, mas como todos foram ouvidos e tiveram a oportunidade de apresentar os próprios pontos de vista, a mudança contou com apoio geral de toda sua equipe de trabalho. Observamos em mais de um caso em que a secretária municipal teve experiência anterior como diretora que essa experiência certamente contribuiu para suas idéias como: (i) a idéia de uma organização bem sucedida com uma visão transformacional sobre onde ela gostaria de chegar; (ii) a idéia de que uma organização não pode fornecer resultados sem funcionários qualificados e motivados e a intenção de atrair e reter tais funcionários; (iii) a importância de ter uma identidade de grupo alinhada por trás da visão da organização; (iv) o papel crucial representado pela empatia e pelo contato humano para o funcionamento diário de uma organização; (v) a importância de uma aliança entre o governo municipal e a comunidade local. Mas o modo pelo qual o responsável pela secretaria se articula com os principais agentes da cena educacional não depende apenas de sua qualificação e experiência. Entram aqui fatores diversos, como seu envolvimento com os partidos locais, especialmente o do prefeito, sua relação com o ambiente escolar etc. Alguns entrevistados destacaram laços pessoais com o chefe do executivo (envolvendo, inclusive, afinidades políticas) e, praticamente, todos ressaltaram que o critério para sua escolha foi o mérito, ainda que não tenham usado essa palavra, e sim que tinha experiência no campo, experiência esta reconhecida pela comunidade escolar e na esfera política. As modalidades de administração também variam, cabendo ressaltar aqui duas delas: a modalidade mais racional e técnica, com o poder mais concentrado nas mãos da secretária, e a modalidade participativa, que privilegia o comprometimento político de todos os atores relevantes do contexto educacional. Dois casos típicos, ambos propiciando bons resultados em termos do desenvolvimento das habilidades cognitivas dos alunos da rede, merecem destaque. 75 Em Timbó, o desenvolvimento profissional dos professores é garantido pela obediência a critérios técnicos de avaliação de resultados, envolvendo racionalização no uso de recursos administrativos e centralização do poder nas mãos da secretária, que já está ocupando o cargo pela segunda vez. Todos os integrantes de sua equipe, à exceção da nutricionista e da secretária, são professores efetivos da rede escolar, indicados por critérios exclusivamente de qualificação. A título de curiosidade, informou que ninguém dentro da SME é filiado a qualquer partido político. Todos possuem graduação na área de educação e diversos tipos de especialização. Também são graduados todos os professores, sendo que boa parte possui especialização. Ordenadora de despesas, em regime de co-responsabilidade com o prefeito, para elaborar o orçamento da educação no município, conta com a contribuição técnica do contador. Os critérios para alocação de recursos se baseiam nas prioridades delineadas no PPA, e sempre há reserva orçamentária para emergências. A secretária considera extremamente eficiente o sistema de gestão financeira. Há reuniões internas mensais, com a controladoria do município, que orienta os secretários nessa seara. Também são mensais as reuniões de professores, diretores, coordenadores pedagógicos e membros da SME, para discutir os principais resultados alcançados pela rede e buscar maneiras de aprimorá-los. Nesses encontros, contam com assessoria especializada de uma universidade, firmada em convênio há cerca de três anos. Seu conceito do que seja educação de boa qualidade é: “aquela que garante o aprendizado de todos os alunos matriculados, independente de ser escola rural ou central”; e deve ser dada a todas as crianças, atendendo às especificidades da região em que se localiza a escola, se as crianças têm condições distintas, a SME busca oferecer a cada comunidade o que ela realmente necessita. Relativamente aos resultados da Prova Brasil, ressaltou que para a escola que se desviou negativamente das demais já foi elaborado um programa de intervenções extraclasse. No que diz respeito à questão dos equipamentos para a implementação dos planos, a secretária considera ser privilegiada. Ao se observar a estrutura da SME bem como as duas escolas da rede municipal visitadas, pode-se constatar que a estrutura é adequada. O banco de dados da SME é informatizado, todas as escolas têm ar-condicionado, pintura e escultura fazem parte do currículo, e há um programa de reciclagem de material. As escolas do município são dirigidas por um núcleo gestor composto por um diretor, um auxiliar de direção e um coordenador pedagógico, sendo os diretores nomeados pela secretária, com base nos mesmos critérios técnicos a partir dos quais selecionou sua equipe: sempre professores da rede municipal. No que concerne à distribuição das crianças pelas escolas, a SME segue o previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, que determina que a criança deva ser matriculada na escola mais próxima de sua residência. Essa é uma rede administrada de forma centralizada, onde não são repassados recursos para as escolas nem se tem maior envolvimento da comunidade com o contexto escolar. E os resultados são muito bons. Também com bons resultados, a rede a ser sumariamente descrita a seguir está organizada em moldes muito distintos, pois sua qualidade é assegurada pelo envolvimento político dos agentes educacionais com a educação fundamental. 76 O secretário é pós-graduado em biologia, tendo feito carreira política, presidindo em 1990 a Câmara de Vereadores, quando rejeitou as contas do governo, levando à cassação do prefeito. Acredita que o “recurso público tem que ser utilizado da forma correta”. Sua atuação política pautou-se também por trabalhos comunitários. Em seu tempo de universitário produzia um jornal comunitário, tendo conseguido residência custeada pela prefeitura para os jovens que estudavam na universidade em Belém, mantendo ainda um cursinho pré-vestibular gratuito para os candidatos locais. Organizava ainda feiras de ciências para os níveis fundamental e médio. Mantendo boa relação, formal e profissional, com a prefeita, tem muitos amigos vereadores, e se dá bem com todos da administração municipal e da câmara. Nunca foi criticado, nem pela oposição, diz ele. O orçamento é participativo, tendo sido feito um plano diretor, que envolveu toda a comunidade (urbana e rural) em sua discussão; o sindicato dos professores considerou inédito o convite para participar da elaboração do Plano Municipal de Educação e negociar a questão salarial. A relação da prefeitura com o atual governo do estado também é muito boa, algo importante porque a municipalização ocorreu somente de 1ª a 4ª séries. A prefeita conseguiu trazer a Escola de Pesca, projeto do governo estadual, já em construção, que atenderá filhos de pescadores de 5ª a 8ª séries em todo o período diurno. O foco central da política educacional é a integração da escola com a comunidade, priorizando a participação e presença da família. O secretário cita o exemplo de professores que, enquanto faziam curso superior subsidiado pela prefeitura, realizavam pesquisas científicas sobre a educação no município. Eram os próprios profissionais observando seu trabalho, suas deficiências e gerando soluções, devolvendo assim para a comunidade o que foi investido neles. Uma educação de boa qualidade na opinião do Secretário é “quando as pessoas conseguem viver socialmente e preservando o meio ambiente, além de ter um conhecimento básico”. Isso requer uma estrutura mínima na escola, a participação da família, docentes bem-formados e diretores comprometidos, algo que acontece em sua rede escolar. Os resultados da Prova Brasil foram uma surpresa, por ser um município do interior do estado: “a gente não acredita nem no potencial da gente”. A seu ver, são devidos à metodologia que está sendo aplicada, pois os professores passam por cursos de aperfeiçoamento em suas áreas específicas. Além disso, as crianças convivem com a multidisciplinaridade nos projetos especiais: música, inglês, informática e xadrez, disciplinas ministradas no período regular. Existe também a orientação da SME para que os professores tirem uma semana no mês para treinamento. Trata-se da Semana da Prática, voltada, no caso de português, para a prática de leitura e interpretação de texto e, no caso da matemática, para a prática das operações. Ele comenta o projeto Aprender a Ler em um Bimestre para crianças com dificuldade de leitura. Explica também como superou o problema da 1ª série devido às modificações implantadas na educação infantil do município, que era assistencialista e sem um projeto pedagógico apropriado. Hoje as crianças chegam alfabetizadas ao ensino fundamental. O mais importante, a seu ver, são os professores e a comunidade extremamente engajados na melhora do aprendizado. Se o modelo burocrático e o participativo igualmente resultam em educação de qualidade, há que se ressaltar que em ambos os casos aqui tratados as secretarias acionam corretamente os programas de capacitação do corpo docente e de atendimento aos segmentos mais necessitados do corpo discente. No entanto a capacitação para o planejamento educativo é 77 dada apenas na rede de formato burocrático e gestão centralizada, anteriormente analisada. Por contraste, os professores da rede participativa podem influir no conteúdo da capacitação, isto é, podem obter qualificação adicional na área em que se consideram menos capacitados. O que a análise dos casos sugere é que se o controle federal sobre o desempenho escolar fora fundamental, não faz sentido impor um único formato para que atendam ao que delas é esperado. Mas como o modelo participativo opera adequadamente quando há um comprometimento ideológico com a educação, comprometimento este que não tem como ser produzido pela ação federal, os mecanismos de caráter formal e legal sobressaem como aqueles sobre os quais a instância federal pode exercer algum controle. Mas é preciso lembrar, como notam Smith & Rowley (2005), que o controle burocrático pode levar à redução do comprometimento pessoal do professor para com seus alunos. É um aspecto, portanto, que deve ser tratado com muito cuidado. EQUIPE CENTRAL DA SME Mesmo quando encontramos um líder excepcional, a boa gestão de sua rede depende também de sua equipe na secretaria municipal. Na grande maioria dos casos examinados, são equipes pequenas, formadas por professores concursados da rede, com competência para oferecer treinamento aos núcleos gestores e aos professores. E a escolha dos colaboradores é expressiva da qualidade da liderança, pois poucas vezes foram mencionadas questões relativas à sua remuneração. Nesse sentido, chamou nossa atenção a motivação da equipe da SME de Santa Cruz do Capibaribe, com senso aguçado para as peculiaridades do trabalho conjunto. O apoio às escolas e feito por uma equipe técnica que cuida do planejamento e implementação de atividades diretamente voltadas para professores e alunos com o objetivo de tornar a “escola prazerosa” e combater a cultura da repetência. A equipe trabalha diretamente com os supervisores, havendo monitoramento permanente e encontros regulares para avaliação dos problemas e identificação de soluções para cada situação escolar. A SME utiliza um sistema permanente de monitoramento e avaliação considerando os seguintes elementos: (i) adequação da proposta pedagógica; (ii) processo de formação docente; (iii) infra-estrutura da escola; e (iv) os indicadores de aprendizagem. Os agentes do sistema de monitoramento são: (i) Equipe de Supervisão – (representação da SME); Grupos de Estudos – (representantes da unidade escolar) e o Conselho Escolar – (representantes da unidade escolar). A distribuição do tempo da equipe entre trabalho administrativo e desempenho das funções mais diretamente ligadas à educação parece satisfatória, sendo o padrão mais recorrente o de uma proporção de horas igualmente dedicadas às duas atribuições. Também foram raros os casos de mudanças radicais de equipe que, sem dúvida, provocaram problemas sérios para os novos líderes. A principal dificuldade encontrada no desempenho das funções próprias à SME decorre da pouca ou quase nenhuma formação em administração pública, propriamente dita. Treinamentos voltados para administração pública, e, em especial, para o domínio da informática que permita a esses líderes se apropriarem das informações disponíveis na internet, não apenas de dados e textos, mas também da oferta de programas, de parcerias com empresas e de ONGs, certamente trariam resultados expressivos. 78 A questão da continuidade pode ser trabalhada a partir do caso de Brusque, cujo projeto político-pedagógico iniciou-se na gestão de 2001. A saída do secretário municipal de educação, eleito para a Câmara de Vereadores, não implicou descontinuidade, pois não apenas a pessoa que então ocupava o cargo de diretor do ensino infantil assumiu a chefia da SME como houvera poucas alterações na equipe. Assim, o projeto está tendo continuidade no presente, reformulando-se a proposta apenas para dar conta de mudanças que ocorreram desde sua formulação inicial. É claro que a continuidade pode não ser boa se a equipe que continua tiver sido uma equipe de baixo desempenho. O que torna o caso exemplar é que a continuidade foi a de políticas e programas, cuja efetivação já se institucionalizou. A continuação de algumas pessoas auxilia no processo, mas somente como parte de um programa de reforma que é necessariamente complexo. A atividade de supervisão gerenciada pela equipe central da SME envolve o acompanhamento das tarefas de cunho administrativo bem como do ensino propriamente dito. Em princípio, pode-se supor que escolas livres para adotar o método que lhes pareça mais conveniente no sentido de se adequarem às características de seus alunos estão mais habilitadas a oferecer ensino de qualidade do que as que obedecem a uma única proposta pedagógica, definida pela SME. No entanto, se a secretária tiver bom conhecimento de sua rede, ela, mais do que qualquer escola individualmente, dispõe de mais recursos para qualificar seus supervisores de modo a não apenas acompanhar os desenvolvimentos no campo específico da pedagogia como também a auxiliar os diretores de escola a solucionar problemas escolares. 13 Feita essa primeira caracterização, cabe assinalar o resultado que obtivemos para uma das hipóteses que levamos a campo, qual seja, a de que um secretário com boa liderança e poder próprio no governo municipal deveria ser o ordenador das despesas para a rede educacional. Pelo menos a metade dos secretários é ordenador de despesa, conforme os dados da Tabela 7. TABELA 7 – Ordenação de despesa e tipo de rede 13 A relação da proposta pedagógica com as peculiaridades da localidade é assunto crítico: se a criança aprende na escola algo muito dissociado do que vive, é possível que decida que o mundo é mais importante do que o irrealismo da sala de aula (WROBEL, 1999). 79 A autonomia financeira da SME foi ressaltada para análise na suposição de que a ela se associaria uma condição mais favorável para o desenvolvimento de boas práticas educacionais. Os resultados obtidos não permitem avaliar essa suposição. Ressalte-se o caso de um secretário que, trabalhando com uma prefeita extremamente ativa e controladora, achou ótimo não precisar perder seu tempo com a burocracia envolvida na lida com aspectos financeiros da administração. Sua colega de ofício em município igualmente bom, no sentido que estamos dando ao termo neste relatório, concordaria com ele, pois durante a entrevista, ela voltava-se continuamente para sua preocupação maior: o fechamento da folha de pagamento dos professores. Nesse município, a folha tem que ser dividida em três; os professores nunca sabem em qual delas consta seu nome, o que vem gerando tensões entre professores, sindicato e SME. Ser ordenadora não significa ter controle sobre a administração financeira nem implica racionalidade contábil. Essa mesma secretária afirmou que, no caso de emergências, por se tratar de uma cidade onde todos se conhecem, faz a compra do material necessário e depois “pensa como vai pagar”. APOIO E ACOMPANHAMENTO DAS ESCOLAS O conceito de autonomia escolar não deve ser compreendido como independência da escola relativamente à rede institucional em que se inscreve. A autonomia remete mais precisamente para a valorização da iniciativa e autodeterminação da gestão escolar, não apenas obedecendo a um conjunto de normas que a transcendem, mas também recebendo apoio imprescindível à atenção que busca dar a cada um de seus alunos e à capacidade que é outorgada à escola em adaptar sua proposta pedagógica às necessidades dos alunos e da comunidade. É também a autoridade conferida à escola em termos da distribuição do material didático, dos reparos realizados a tempo no espaço físico, no controle dos insumos necessários a uma boa merenda escolar e na assistência técnico-pedagógica. A maneira pela qual a SME está organizada já é indicação do quanto se empenha nesse acompanhamento cuidadoso das escolas. O caso de Cabo Frio (RJ) merece destaque por contar com um departamento de apoio ao aluno contemplando nutrição, saúde escolar, programas sociais, apoio estrutural e informática educativa. Além disso, cada nível educacional, além da educação especial e da EJA, conta com uma equipe de supervisão no departamento técnico-pedagógico, que contempla ainda uma equipe de inspeção e orientação. O monitoramento da aprendizagem dos alunos e acompanhamento da escola foi tratado pelo instrumento de pesquisa como parte do tema de supervisão, que geralmente é associada a duas funções: apoio pedagógico e apoio administrativo. Em muitas redes boas, o apoio pedagógico é feito de forma permanente, por uma ou mais pedagogas que trabalham dentro da escola. A presença dessa(s) pessoa(s) produz uma diferença significativa no aprendizado, pois acompanha(m), com fichas de avaliação, os avanços e dificuldades demonstrados; tais anotações permitem que os pedagogos fiquem bem fundamentados para conversar com os professores e procurar, com eles, desenhar as estratégias a serem adotadas para cada aluno. Um processo de avaliação permanente traz 80 benefícios particularmente para os alunos que precisam de atenção adicional ou diferenciada. Também traz para a escola um clima e mística de trabalho, em que a avaliação e aprendizado assumem um lugar central nas atividades da escola. Uma equipe altamente qualificada de especialistas pedagógicos da Secretaria de Parobé (RS) realiza, todos os anos, um processo de exaustiva avaliação de desempenho do aluno em cada escola, utilizando-se de um processo denominado “triagem pedagógica”, realizado em uma maratona de um dia, quando se encontra uma equipe de especialistas pedagógicos, incluindo profissionais, especializados em avaliação do estudante e em educação especial, e funcionários da escola. Cada professor é convocado para a reunião, juntamente com o diretor, o coordenador pedagógico e o supervisor. Todos analisam o histórico do aluno junto a cada professor, com ênfase na distorção de ano escolar por idade e na capacidade de o aluno acompanhar o currículo escolar. O objetivo desse exercício é identificar os alunos que necessitam de atenção especial e determinar o que pode ser feito para ajudálos. Em termos de eficácia econômica de curto prazo, se houvesse o objetivo de melhorar a média das provas, talvez fosse mais produtivo investir recursos nos estudantes que estão no limite ou abaixo dele, mas que não necessitam de atenção especializada; pequenas mudanças por aluno, multiplicadas por um grande número de estudantes que se enquadrariam nessa categoria, possam talvez conduzir a uma melhora geral. Contudo, se existe uma preocupação direcionada em relação à dispersão, dever-se-ia então concentrar esforços nos alunos mais deficientes, academicamente falando. No entanto, em geral, seria mais caro cuidar dos alunos que normalmente têm problemas de desenvolvimento, levando-se em conta, porém, que o problema em si pode variar em profundidade ou gravidade da deficiência. Normalmente, não há um número grande desse tipo de aluno, conseqüentemente, melhorias de desempenho não alterariam drasticamente a média do sistema. Novamente, em Parobé, os alunos com pior desempenho recebem grande atenção e cuidado. Na maioria dos casos, são provenientes de famílias mais pobres ou sofrem de algum tipo de carência social, apesar de esse fator não ser uma regra geral válida para todos. Como acontece numa triagem médica, o grau de necessidade de atenção especial para cada aluno é discutido durante a reunião com os professores e outros especialistas. Na maioria dos casos, chega-se à conclusão de que a atenção especial da própria professora, com relatório para os pais (por exemplo, quando o aluno precisa ser incentivado para se esforçar mais), e a própria estratégia do professor é considerada uma ação corretiva suficiente, apesar de o monitoramento ser mantido durante todo o semestre para garantir que o diagnóstico inicial não esteja errado. Em outros casos, é estipulado que o aluno precisa de uma atenção especializada e identifica-se o tipo de atenção necessária, por exemplo, o professor pode precisar da ajuda de um psicólogo ou de um fonoaudiólogo, e assim por diante. Essas conclusões são registradas em um documento para posterior acompanhamento. Em alguns casos extremos, chega-se à conclusão de que avaliações especializadas de acompanhamento são fundamentais, com a ajuda dos pais e de especialistas médicos, se necessário. Esse processo de avaliação é repetido no ano seguinte, com o uso de sistemas para solucionar problemas que podem surgir no decorrer do ano. 81 A partir de certo porte/tamanho da escola, a maior parcela de responsabilidade pelo desempenho do estudante está por conta das coordenações pedagógicas localizadas em cada escola. Mesmo sem os dados relativos ao ensino fundamental fornecido pela rede estadual, e tendo ainda em mente os limites de nossa amostra, é possível sustentar que a existência de pessoas dedicadas aos assuntos pedagógicos, apoiando a direção da escolar e a professora, de modo a que ela não se sinta sozinha em sua tarefa, é fator crucial na qualidade do ensino. Principalmente nas primeiras séries, cuja tarefa de alfabetização encontra sérias dificuldades enfrentadas por professoras, em geral recémingressas na escola, confrontando a realidade do universo infantil com o que aprenderam na faculdade, o acompanhamento pedagógico é de valor inestimável. Cabe ressaltar a importância da dedicação conferida aos alunos que enfrentam o desafio da repetência, com aulas no contraturno, quando é possível para o professor lhes dar atenção individualizada. Essa é uma prática bastante disseminada, cabendo ressaltar o caso de Ipojuca (PE), onde fomos surpreendidos com o fato de que em uma das escolas visitadas, na Escola Nossa Senhora do Ó, a diretora iria realizar aulas de reforço escolar no contraturno, para as crianças que tinham mais dificuldades, com ajuda da supervisora da SME, que fica durante a semana na escola. Verifica-se nesse caso que a autonomia pedagógica da escola pode fazer florescer práticas educativas de alta relevância e pertinência para o desenvolvimento da aprendizagem, mesmo quando não incentivadas pela SME, como o caso da escola anteriormente mencionada. Outro exemplo notável é o de Campo Bom (RS), onde atenção especial vem sendo dada a uma concepção de educação como força de equalização social. Na formulação da política educacional da SME consta o seguinte: Atender crianças e adolescentes priorizando atendimento aos que encontram-se em situação de risco e vulnerabilidade social, oferecendo-lhes atividades educacionais, esportivas, recreativas, culturais e de lazer, no turno oposto às aulas, num ambiente de respeito e cooperação mútua, através de atividades que exerçam forte fascínio, desenvolvendo habilidades, valores e posturas que contribuam para um crescimento harmônico e para a formação da cidadania. Nessa rede, as crianças são levadas à praia, a algumas horas de distância do município. Filhos de operários, essa é, geralmente, a primeira vez que a oportunidade lhes é dada de ver o mar, um programa de caráter compensatório que leva a uma ligação forte do estudante com o contexto escolar. Outro programa com objetivo similar é o que propicia um dia inteiro na escola para crianças de todas as idades nos Centros de Atendimento Integral à Criança e ao Adolescente. Localizados nos bairros mais pobres, os Caica oferecem oportunidade para leitura, esporte e lazer no contraturno. A atenção a alunos portadores de deficiência também já está presente nas políticas educacionais da maioria dos municípios pesquisados. Em Votuporanga (SP) existem três unidades para abrigá-los, as “salas de recursos” que oferecem apostilas em braile e computadores com som para deficientes visuais (o professor da sala é um deficiente visual), além de atendimento psicológico para alunos com deficiências mentais e dificuldades cognitivas. Todas as escolas têm rampa, banheiros e carteiras adaptadas. 82 Há pelo menos três benefícios que resultam da atenção dedicada para a educação inclusiva: (i) a presença de crianças com necessidades especiais em escolas regulares, cujo exemplo de consideração por elas demonstrado pelas autoridades da escola serve para divulgar o valor da dignidade humana para todas as crianças e é visto como a concretização de um papel didático cidadão; (ii) os protocolos e sistemas que são necessários para identificar as crianças com necessidades especiais, cujo progresso serve para fortalecer todo o sistema de avaliação; (iii) para professores, administradores da escola, funcionários da SME, pais e comunidade (por meio de atividades tais como o Coral Municipal Vozes da Inclusão, atividade da comunidade com atenção prestada a pequeninos detalhes, como os pré-requisitos de que os membros do coro mantenham desempenho acadêmico além de comportamento disciplinar), o foco na educação especial transmite mensagem catalisadora reforçando a visão do coro como intervenção decisiva rumo à eqüidade social. Os três benefícios colaterais – para crianças, para avaliação e para o acompanhamento do aluno e para todos os professores do sistema – podem ser vistos como similares ao valor de determinadas espécies de animais (tais como sapos de dardos venenosos) como um índice da saúde em um ecossistema cujos benefícios sociais de atenção à conservação de uma espécie de animal superam a avaliação econômica das espécies individuais. Os computadores e a internet são essencialmente vistos como multiplicadores de força de apoio pedagógico no ensino em sala de aula. A internet é vista como ferramenta que auxilia e amplia as possibilidades de colaboração entre os membros da comunidade educacional de Brusque por meio de seus sítios de rede organizados para uma interação eletrônica. Mesmo com orçamentos municipais razoavelmente robustos, buscam-se parcerias com firmas locais e organizações voluntárias para equipar escolas com computadores e conexões à internet. A SME tem um programa a longo prazo chamado “Espaço Pedagógico Informatizado” (Espin), que procura fornecer os inputs humanos em aditamento ao hardware e à conectividade. Trata-se de um caminho multidisciplinar para aprendizagem, e por ele os professores técnicos em trabalhos de TI trabalham em colaboração com professores regulares para desenvolverem atividades em que computadores e internet possam ser utilizados para ampliar a experiência de aprendizagem para as crianças. Com a visão da rede de comunicações que a SME tem implementado, colaborações bem sucedidas podem facilmente ser compartilhadas com outros professores e outras escolas. Como muitos professores não dominam TI, a SME organiza sessões de treinamento todo mês. O uso de TI promove o processo de colaboração entre os atores municipais, e isso serve como um input pedagógico decisivo para a aquisição de habilidades cognitivas e outras habilidades por parte dos alunos. COMPROMISSO DOS PROFESSORES COM A EDUCAÇÃO Em sociedades de mercado, o melhor modo de valorizar uma prática é remunerá-la adequadamente. O Plano de Carreira, ao associar a remuneração à qualificação, constitui mecanismo importante para essa valorização, sendo que a maior parte das redes pesquisadas conta com um plano de cargos e carreira já bem sedimentado, como mostra a Tabela 8. 83 TABELA 8 – Existência de plano de carreira por tipo de rede A diversidade de critérios e a heterogeneidade dos planos coletados levaram a que destacássemos apenas quatro critérios para promoção estipulada na carreira docente. A tabela a seguir mostra a freqüência dos referidos critérios, pelos três tipos de rede. TABELA 9 – Critérios para promoção por tipo de rede O aspecto mais importante a ser ressaltado é a ênfase conferida à qualificação profissional. Como se verá mais adiante, todas as redes estão preocupadas com seu quadro de professores, sendo sua qualificação um objetivo de praticamente todas as políticas educacionais municipais. O tempo de serviço também merece consideração, tendo em vista o fato de que, se uma renovação da equipe docente é salutar em termos de modernização do ensino, sua permanência na mesma escola também o é, para que se criem laços de lealdade para com a comunidade escolar (SMITH; ROWLEY, 2005). Um exemplo de Plano de Carreira com processo institucionalizado de avaliação é observado no município de Tramandaí (RS). Professores municipais que trabalham 30 horas por semana, (24 em sala de aula e seis na preparação de aulas) podem receber o valor de R$ 1.600 como salário-base, valor este muito além da média-Brasil. E talvez seja o mais importante sob a perspectiva de política pública, Tramandaí está entre os dois municípios que pagam melhor aos professores da região geográfica do litoral do Rio Grande do Sul14. O secretário estimou 14 É interessante que no Balneário de Camboriú, um município de economia similar, significa que não gasta o suficiente de sua renda com salários para professores, mas mesmo um professor com qualificações de pós-graduação receberia um salário-base de não mais do que R$ 1.050 por 30 horas, e a maioria dos professores trabalham 40 horas por semana, uma categoria que estava além das 30 horas do limite máximo em Tramandaí. Pesquisas quantitativas futuras precisam ser direcionadas com objetivo de examinar mais detalhadamente a remuneração do professor em municípios brasileiros, aqueles relacionados com o desempenho em avaliações tais como a Prova Brasil. 84 aproximadamente que 90% do orçamento educacional foi vinculado ao salário de professores, uma cifra que é geralmente citada em literatura como um indicador de erro na alocação de recursos além de outras contribuições educacionais. Entretanto, no caso de Tramandaí, apresentou resultados, como no Prova Brasil, o que nos levou a visitar esse município em primeiro lugar. Em complementação ao salário-base, os professores recebem pagamento adicional por ensinar em condições de difícil acesso ou em educação especial. O recrutamento inicial de professores é feito por meio de concurso público, com procedimentos e normas previamente estabelecidos para garantir a seleção dos melhores candidatos disponíveis no mercado. O Plano de Carreira para Professores especifica sete classes para a promoção com três níveis dentro de cada classe. O progresso depende de uma combinação de experiência (período mínino requerido em sala) e mérito. Também em Sta. Cruz do Capibaribe a formação inicial do professor é considerada fator inquestionável para a qualidade do ensino. A prefeitura dá bolsa de estudos para que os professores da rede que ainda não têm curso universitário o concluam, pois o Plano de Cargos e Carreira exige esse nível de formação bem como o concurso público. É gratificante perceber a atenção cuidadosa dirigida aos procedimentos em relação à avaliação dos professores por mérito. Os termos de referência para os professores mencionam, especificamente, a centralidade do processo de aprendizagem, para que os professores avaliem e registrem as diferentes necessidades dos estudantes, especialmente daqueles com necessidades especiais, para garantir que esses estudantes façam bom uso dos recursos disponíveis, além de uma variedade de planejamento e atividades extracurriculares que vão além de simplesmente permanecer em sala de aula. Um comitê de avaliação, constituído por membros da Secretaria de Administração (SME), um membro do Conselho Educacional Municipal, um membro da equipe de apoio pedagógico e um representante de professor eleito avaliam cada caso de promoção. Por mérito é considerada uma combinação de fatores que incluem: desempenho eficiente no trabalho, dedicação, pontualidade, responsabilidade, realização de projetos e trabalhos especializados, assim como cursos de atualização do conhecimento e desenvolvimento profissional. Cada escola tem um coordenador pedagógico que trabalha com o professor no desenvolvimento de registros sobre o progresso pessoal de cada estudante, e esses registros, em grande parte, são decisivos para a avaliação do professor. A noção de monitoramento individualizado do desempenho do estudante foi observada em um número de municípios visitados; em Tramandaí, esse processo está vinculado ao processo formal da avaliação do professor e, por sua vez, à sua remuneração. Um dos aspectos mais notáveis de abordagem é a do treinamento baseado na demanda, onde os técnicos da SME trabalham em conjunto com as autoridades das escolas em sua atenção com o âmago do processo de ensinar-aprender. As necessidades de treinamento são identificadas com base nos acontecimentos, nas reuniões regulares entre escolas e entre SME e escolas, bem como na comunicação proveniente dos funcionários da SME que estão permanentemente baseados nas escolas. A maior fragilidade nos programas tradicionais de treinamento de professores é vista pela SME de Brusque. Como orientação geral na montagem dos treinamentos, a SME dá preferência a auxiliar os professores 85 com os problemas que aparecem em seu dia-a-dia, em termos de dificuldades do aprendizado dos alunos, identificando quais os conceitos que deverão ser reforçados, por exemplo, como ensinar frações para a 4a série. Uma das formas como o treinamento é organizado é por meio de workshops, relacionados a um problema pedagógico particular, identificado por uma determinada massa crítica de professores, em que é observado que a intervenção especializada com auxílio externo é necessária (e o treinamento necessário não é tão comum, o sistema de rede permite que os professores estejam em contato com seus examinadores que tenham resolvido problemas similares, ou com peritos dentro da SME que possam auxiliar o professor em particular ou os professores sem a necessidade de um programa de treinamento formal que envolva múltiplos professores). A SME trabalha com as universidades locais, com outros níveis de governo e com contatos informais e formais para identificar especialistas na área, que são então trazidos para auxiliar na direção de um workshop determinado, cujo formato deve proporcionar ampla oportunidade para discussões e feedback. É difícil ver como tal treinamento pode ser replicado em outros municípios, sem o processo participativo de freqüência e institucionalização que tem ocorrido em Brusque, mas definitivamente parece uma prática notável para melhorar o desempenho dos professores. Com relação ao treinamento são significativos os esforços colaborativos das autoridades municipais que coordenam seus esforços com outros municípios nessa área para construir economia de escala e utilizar os serviços oferecidos por universidades locais bem como com os governos estaduais e federal (exemplo, por meio do programa do MEC Parâmetros em Ação, um programa que visa o processo de aprendizado coletivo do professor). Existe a disponibilidade de tempo para o desenvolvimento de atividades profissionais, adotando-se uma política de substituição de professores e encorajando o aprendizado no trabalho, com ajuda de outras agências. Um programa de treinamento em matemática e ciências parece ser bem popular para os professores – esse programa vincula oficinas periódicas em finais de semana ou horas fora da escola com atividades em sala de aula, e a coordenadora de treinamento trabalha de forma colegiada com grupos de colegas. Assim como outras atividades, a prática do treinamento incorpora definição de objetivos específicos e a documentação de progresso do professor, de forma que o treinamento reflita o que cada aprendiz deve fazer (e aparentemente implementaria na prática) com seus próprios estudantes. Faz-se necessário notar o processo avaliativo pelo qual o aprendiz se candidata (de forma voluntária, caso estejam interessados no treinamento ou por reconhecimento profissional ou pessoal, em termos de salário e outros ganhos). É fato que o treinamento inclui um processo de avaliação notável. A maneira como esse processo é desenvolvido fala por si só da natureza do resultado educacional. Principal Instrumento de Avaliação: o Caderno de Registro – Todo professor participante deverá ter um caderno para fazer anotações pessoais, escrever conclusões das atividades, documentar as sínteses das discussões, formular perguntas que não foram respondidas para serem exploradas nas sessões seguintes, construindo, assim, um registro do percurso de formação ao longo de curso. 86 – A intenção pedagógica dessa solicitação é que através desse Caderno de Registro, o professor possa refletir sobre o que está sendo discutido no curso, rever conceitos e projetar novas aprendizagens, além de criar outros meios para melhor organização dos estudos e concretização das experiências vividas. A GESTÃO ESCOLAR A estruturação do contexto escolar pode ser tomada como variável interveniente entre a política da secretaria e o ensino efetivamente propiciado em sala de aula. Nele, é a gestão escolar que ganha proeminência. Diretora, orientadora pedagógica, secretária e outros auxiliares propiciam um clima mais ou menos favorável ao ensino de qualidade, pois suas ações afetam significativamente a conformação do ambiente escolar. Quando um professor é bem recebido na escola onde começa sua carreira, conta com a atenção e a compreensão do núcleo gestor para as dificuldades que encontra e tem espaço para influir na prática educacional, ficará bem mais disposto a exercer com qualidade sua função. O primeiro aspecto a ser destacado é a distribuição das redes cujas escolas são administradas apenas pelo diretor, relativamente às que contam com núcleo gestor, nas três categorias de rede com as quais estamos trabalhando. São tantas as redes onde existe um núcleo gestor quanto aquelas onde as escolas funcionam só com diretor. Em geral, se deve ao tipo de escola que predomina na rede – as escolas grandes precisam de um núcleo gestor. A diferença entre os tipos de redes se manifesta nas tarefas atribuídas ao núcleo gestor. De modo geral, podemos dizer que existe uma preocupação grande, nas boas redes, quanto ao apoio pedagógico na escola, com pedagogos/as que trabalham junto à diretora e aos professores com o objetivo de melhorar as práticas de ensino na sala de aula. O caso de Balneário Camboriú, a ser detalhado mais adiante, apresenta uma relação entre SME, supervisores e núcleos gestores que pode ser nomeada como relação em rede 15, com predominância de não um comando hierárquico ou radial, mas de interação múltipla, podendo-se atribuir aos supervisores pedagógicos o papel crucial na manutenção desse formato, certamente produtivo de qualidade. Decorre dessa constatação nossa sugestão de que a figura dessa pessoa ou pessoas que se dedicam ao apoio pedagógico seja analisada com mais profundidade, em pesquisa desenhada com tal finalidade, e, a próxima seção, tenta analisar a questão da gestão escolar. Nessa parte da pesquisa se tentou verificar se as escolas contavam ou não com núcleo gestor (diretor, orientador pedagógico, secretário escolar etc. bem como a forma de seleção desse núcleo gestor ou do diretor, quando é o caso, e o grau de formação do diretor da escola). 15 Entende-se, aqui, por rede, não o conjunto de escolas, mas o sistema que articula a instância municipal responsável pela política educacional com as instâncias estadual e federal bem como com o núcleo gestor da escola. Para apresentação e uso do conceito na análise de políticas urbanas, cf. (MARQUES, 2006). 87 TABELA 9 – Gestão escolar por tipo de rede Considere-se agora a qualificação exigida para ser diretor escolar nos três tipos de rede. Os dados da Tabela 10 mostram que a licenciatura plena é requerida para 75% das redes examinadas, sem variar de forma significativa com os tipos de rede. TABELA 10 – Qualificação do Diretor e Tipo da Rede Os dados indicam a irrelevância do requisito, no que concerne ao diferencial entre redes boas e ruins. Quanto ao processo de escolha do diretor, aspecto importante no que tange à autonomia do contexto escolar relativamente à SME e ao prefeito, também não há nenhuma relação entre indicação política, prática usual e diferencial na qualidade da aprendizagem, conforme os dados da Tabela 11. Tabela 11 – Escolha do Diretor e Tipo de Rede 88 Cabe notar, entretanto, que, para os fins deste relatório, não foi possível discriminar as indicações políticas propriamente ditas daquelas que implicaram avaliação técnica prévia dos candidatos ao cargo, como foi o caso de muitas redes visitadas. Além disso, é necessário enfatizar que em muitas cidades o desconforto com a indicação política, propriamente dita, é manifesto, podendo-se, portanto, antecipar mudanças no processo de escolha da direção escolar. Foi o caso, por exemplo, de Novo Hamburgo (RS). Ao iniciar sua gestão, a secretária constatou a diversidade de caminhos que levaram à constituição do conjunto de diretores escolares: indicação política de diferentes siglas partidárias; apadrinhamento; relações pessoais; competência profissional; liderança no grupo. Diretores exercendo a função com posturas diversas: buscando a qualidade do ensino; respeitando a opinião do grupo de professores, coordenação pedagógica e comunidade; outros com autoritarismo e desrespeito; sem comprometimento com a qualidade do ensino; promovendo favorecimentos entre os colegas. Essa percepção levou-a a iniciar um processo radical de mudança nos núcleos gestores, por meio de uma consulta a toda a comunidade escolar. Num processo eleitoral de dez escolas em dez dias, cada escola escolheu três candidatos ao cargo de direção, e cada um teve que entregar sua proposta de administração da escola, no dia em que seriam entrevistados pela secretária. Os candidatos que estivessem envolvidos com o contexto escolar conseguiriam formalizar em uma proposta seus pontos de vista. A metodologia incorporou tanto métodos democráticos como critérios técnicos sobre o conhecimento e capacidade de gestão para diretores que podem ser reeleitos. Não se pode afirmar com segurança que o fato de os diretores serem escolhidos pelas comunidades escolares garante a qualidade da rede, como no caso de Bezerros (PE). Ainda assim, vale a pena relatar brevemente esse caso, pois expressa bem os resultados inesperadamente bons de uma rede que confere autonomia a suas escolas. De acordo com a secretária, os professores, diretores e a comunidade levam a educação a sério. O sindicato de professores é atuante, e a comunidade participa ativamente nas escolas da rede, mesmo não havendo conselhos escolares. Os recursos são distribuídos para as escolas uma vez ao ano. Os professores, tão ou mais bem pagos que os estaduais, são todos concursados, tendo a maioria graduação completada, e boa parte já fez pós-graduação. De resto, é política da SME permitir que 10% do corpo docente se licencie, com vencimentos, para fazer pós-graduação. É interessante notar que os professores tendem a permanecer nas próprias escolas, criando assim um espírito de corpo favorável ao exercício da autonomia escolar. Finalmente, o projeto pedagógico é de responsabilidade de cada escola, que o desenvolve em consonância com a realidade social e cultural das crianças contemplando projetos de música e de arte. Uma variável imprescindível como gestão escolar é a relacionada com o processo de avaliação e planejamento sistêmico. Exemplo destacado relativo a essa concepção de planejamento está na aplicação do Programa Gestão Nota 10, apoiado pela Fundação Ayrton Senna, no município de Campo Bom (RS). Esse programa, que existe em 35 municípios em todo o Brasil, funciona em outro município por nós pesquisado (Sapiranga, RS). Apoiado nele, Campo Bom estabeleceu suas metas, que são acompanhadas por meio de sete indicadores – (i) freqüência do aluno; (ii) freqüência dos professores; (iii) dias letivos; (iv) alfabetização na 89 1º série; (v) aprovação na 1ª-4ª séries; (vi) aprovação na 5ª-8ª séries; e (vii) distorção da idadesérie. É feita a coleta de dados e sua análise, turma por turma, escola por escola, para toda a rede municipal. As fichas são preparadas a cada mês, e as escolas e a SME organizam reuniões para discutir os avanços, identificar problemas, propor soluções e dar continuidade à política. Um dos aspectos mais interessantes desse processo é o que se refere à alfabetização nas primeiras e segundas séries. Além de duas provas escritas aplicadas para todas as crianças das 1as e 2as séries, em português e matemática, duas vezes por ano, existem metas ligadas ao processo de alfabetização e de aprovação. Começando com fichas por aluno, as professoras fazem fichas para a turma, sistematizam as informações para o nível da escola e da rede. A cada mês é realizado o acompanhamento de metas sobre três atividades de aprendizagem: (i) leitura; (ii) escrita; e (iii) produção de texto. É impressionante a qualidade e quantidade de informação tão rica sobre o aprendizado – para a leitura, por exemplo, é registrado o número absoluto e relativo dos alunos que lêem silabando, lêem palavra por palavra ou lêem com fluência, além do número de livros lidos no mês. Essa informação comparativa permite localizar o problema: em qual escola e, em qual turma, a média é inferior ou superior à média do município. Essa informação permite à equipe pedagógica dotar materiais (livros para a biblioteca, por exemplo), identificar e prover capacitação e acompanhamento da professora dentro da aula. Ajuda ainda no processo de definir metas para o ano seguinte. A maneira profissional de implementação desse programa parece equivaler ao de qualquer empresa internacional que usa as ferramentas modernas de gestão com eficiência e eficácia. VÍNCULO DA SME COM A COMUNIDADE A pesquisa permitiu observar uma diversidade de níveis de vinculação com a comunidade, contemplando desde o acesso direto do cidadão à secretária ou mesmo ao prefeito (casos em que nos era dito que não havia necessidade de um sistema de ouvidoria, pois todos na cidade se conheciam) até a existência de conselhos formalmente estabelecidos, com representação setorial. Cabe destacar também o fato de que programas municipais ou mesmo desenvolvidos apenas no âmbito de algumas escolas, mais freqüentes nos municípios bons, voltados para a educação artística e para desportes, além de desenvolver habilidades nas crianças e nos jovens, também geram e/ou estreitam os laços entre a comunidade e a escola fortalecendo a idéia de uma comunidade escolar. Um dos casos que chamou nossa atenção, no que tange ao envolvimento da comunidade no programa municipal, foi o do Balneário Camboriú. A idéia parece estar enraizada em todos os aspectos da política de opinião nesse município de que a comunidade precisa estar intimamente envolvida no processo de produzir serviços educacionais. Isso é feito através de recursos formais, tais como o conselho municipal de educação, o conselho para o Fundef (que agora seria o conselho do Fundeb) e o conselho para programas nutricionais e o do processo participativo orçamentário do município. O melhor exemplo do envolvimento da comunidade com as escolas aparece por meio da atenção à educação física, uma atividade que envolve tipicamente adultos da comunidade em uma cultura de esporte orientado, e a SME investe recursos para fornecer equipamentos de esporte e uniformes para todas as escolas (a aquisição é feita por meio de 90 licitação competitiva, e o recrutamento de professores é feito por meio de um processo de recrutamento público, um exemplo de como boas práticas de governo geralmente estão juntas). Investimentos similares são aplicados em atividades relacionadas à música e à dança, o que envolve tipicamente shows que as escolas levam para a comunidade. A lógica pedagógica formal apresentada pela SME, em apoio a essas atividades, desassociada dos benefícios educacionais, é a concepção do desenvolvimento de múltiplas inteligências nas crianças – lingüística (palavra e escrita), naturalista (percepção sobre ambientes), musical, sinestésica (corporal e especial), intrapessoal (auto-estima) e interpessoal (sociabilidade). O melhor exemplo de compromisso com a comunidade, que também fala da visão transformacional relacionada à educação, é evidenciado pelo exemplo interessante da “Escolinha de Surf”. O Balneário Camboriú é um destino doméstico e internacional muito popular, com praias múltiplas, onde as montanhas encontram-se com o mar, e é também um lugar famoso para o surfe. Em geral o surfe é visto como um passatempo de crianças (ou de adultos) ricas. À parte do custo do equipamento tal como o traje de banho neoprene para a água fria e as próprias pranchas de surfe, o custo da oportunidade do tempo bem como o custo direto de aprender a praticar surfe põem a atividade fora do alcance das crianças da maioria das famílias pobres. A SME teve a idéia de propiciar a possibilidade às crianças nas escolas públicas como atividade extracurricular, com investimentos em equipamentos e professores e no número de classes oferecidas, dependendo da demanda. Grande atenção é prestada nesse programa a pequenos detalhes, o que é um aspecto revelador de política de implementação no município, com referência à educação física e às atividades curriculares. Como exemplo, a idéia de que times de voleibol das escolas não deveriam sentir-se inferiores a clubes privados. Daí a preocupação de que, além dos uniformes e dos equipamentos, as crianças deveriam ser providas de garrafas de água mineral, da mesma forma que outras crianças. O valor da garrafa de água mineral contribui para o espírito de escola e para o bem-estar das crianças e vai além de ser simplesmente outro input dentro da função de produção educacional. Algo para se pensar a respeito. No que concerne aos vínculos formais, os Conselhos da Merenda e do Fundef são positivamente avaliados. O mesmo não se aplica ao Conselho Municipal de Educação (CME): raramente funciona a contento. Como aponta a literatura especializada (AZEVEDO, 2002), as municipalidades procuram garantir a existência formal dos conselhos municipais de Educação como meio de cumprir a norma legal, o que talvez explique a freqüência de respostas que tivemos quanto ao fato de que o CME estava sendo reformulado. Nossos resultados corroboram a dependência das SMEs relativamente aos prefeitos: a maior parte das redes pesquisadas conta com CME implantado em mais da metade delas, mas em apenas nove mostrou ser de alguma relevância aos olhos da SME. Em Igarapé, por exemplo, o CME não apenas avalia os resultados da política educacional como participa das decisões do executivo. Cuida também de controlar os recursos do Fundef. O conselho de São Pedro da Aldeia conta com a participação do vice-prefeito. A população, entretanto, não está envolvida em suas atividades. Três Rios, Piedade, Aparecida, Farroupilha e Sapiranga são os municípios onde parecem ser mais ativos, e influenciam os conselheiros na formulação da política municipal de educação. 91 A existência de um conselho atuante é considerada um fator positivo, pois em tal instância seria, em princípio possível articular as opiniões não apenas dos representantes da comunidade escolar como de líderes das organizações da sociedade civil, e dos próprios políticos com mandato representativo. Da interlocução deveria resultar um consenso sobre prioridades, metas e sistemas de acompanhamento (accountability). A pequena taxa de associativismo que caracteriza a sociabilidade brasileira, acrescida da pouca relevância conferida às câmaras de vereadores, não raro produz instâncias consultivas formais, como parece ser o caso dos municípios aqui em análise quando não envolvem processos co-optativos. Sob extrema dependência da liderança executiva, na figura do secretário municipal, esses conselhos são geralmente instituídos por iniciativa do Executivo; funcionam em suas dependências, como no caso de Entre Rios, e, portanto, comparecem como um nó a mais no imbróglio institucional do que como fórum para apoio da política educacional. Cabe, portanto, atenção especial ao tópico. Na maioria das redes existem conselhos escolares (CE), com decisivo papel no fortalecimento dos vínculos entre núcleo gestor, professores, funcionários, alunos e seus pais. Só três redes boas, e uma do grupo C216, têm suas escolas geridas sem instância destinada a acatar sugestões e orientações dos pais e professores 17. PARCERIAS COM OUTROS ATORES DO MUNICÍPIO E DE OUTROS MUNICÍPIOS Uma outra modalidade de vinculação entre escola e comunidade se efetiva pelo uso extensivo e intensivo de faculdades locais (públicas e privadas) ou situadas na capital do estado, para treinamento, levando a que os universitários se integrem mais fortemente com o contexto escolar. Alguns municípios estabeleceram canais de comunicação regulares entre si, com vistas a trocar experiências, disseminar práticas e se articular para pressionar os governos estadual e federal a atender suas demandas. Por essa articulação, os municípios reduzem custos e viabilizam obras que são descomunais para um município, mas tornam-se perfeitamente factíveis para um conjunto deles. O relatório do IBGE constata seu aumento, atribuído ao comprometimento do setor privado com sua responsabilidade social. Finalmente, atenção particular deve ser dada à Undime, que teria influenciado decisivamente o significado atribuído à municipalização do ensino fundamental (AZEVEDO, 2001). Alguns secretários entrevistados, entre eles a Secretária de Santa Cruz de Capibaribe, destacam o papel da Undime como órgão estratégico para a informação e o debate sobre os grandes temas nacionais de relevância para a educação, a troca de experiências entre os(as) secretários(as) municipais, e um fórum permanente de 16 17 Igarapé, Bezerros, Rio Real e Garibaldi; esta, a ruim. Foram coletados dados sobre as atribuições dos CE, mas o pouco controle sobre a qualidade desses dados (disponibilizados pela SME e não por todos os CE) recomenda cautela em seu uso. 92 suporte à educação municipal. O tópico é particularmente relevante por ser a associação entre SMEs a melhor proteção para a qualidade da autonomia escolar, pois quanto mais individualizado o ensino fundamental mais visível se torna o espelhamento com seus pares. Merecem ser destacados os casos de Vale do Rio dos Sinos (RS), Região dos Lagos (RJ) e Agreste Pernambucano (PE). Parcerias entre a SME e instituições da sociedade civil já existem em cerca de 10% dos municípios, de acordo com o Perfil dos Municípios Brasileiros (IBGE, 2002). Tais parcerias contribuem para diminuir os custos de formação de professores, facilitam a obtenção de material para manutenção e desenvolvimento pedagógico, dentre outros. O projeto “Paixão de Ler”, desenvolvido pela SME de Cabo Frio (RJ) em parceria com a Petrobras, reúne não somente os alunos mas também os educadores, familiares dos alunos e pessoas da comunidade com interesse em participar mais ativamente da vida escolar. São criadas salas ou cantinhos de leitura, e desenvolvidas atividades que incitam a criatividade, aprimoram o senso crítico e induzem à reflexão. Entretanto o mais comum é o convênio, com setor público e privado, o que é mais freqüente quanto maior foi o tamanho do município. Encontramos casos de um e outro tipo de parceria, mas o instrumento por nós desenvolvido não possibilitou compreensão mais completa das condições que propiciam essas relações, ou de seu efeito sobre o aprendizado. Uma parceria que também tem se destacado nos municípios da amostra, é a desenvolvida com o Sistema S, principalmente com o Sebrae, Sesi, Senac e Sesc, com prioridade na oferta de treinamento para o mercado de trabalho e no resgate dos alunos que voltam à escola em idade bem avançada. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DESIMONE, L. et al. How do district management and implementation strategies relate to the quality of the professional development that districts provide do teachers? Teachers College Record, v. 104, n. 7, p. 1265-1312, Oct. 2002. GADOTTI, M. Sistema Municipal de Educação: estratégias para a sua implantação. Cadernos de Educação Básica. Brasília: MEC/Inep, v. 7, 1994. JACOBI, P. R. Educação, ampliação da cidadania e participação. Educação e Pesquisa, v. 26, n. 2, jul./dez. 2000. MARQUES, E. C. Redes sociais e poder no Estado brasileiro: aprendizados a partir de políticas urbanas. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 21, n. 60, p. 15-42, fev. 2006. OLIVEIRA, I. A. R. Pressupostos ideológicos da administração participativa. Revista de Administração Pública, n. 1, p. 44-53, jan./mar. 1987. PENA, M. V. J.; SANTOS, M. R. (Orgs.). Pobreza, exclusão e risco social em cinco estados brasileiros. Brasília: Banco Mundial, 2004. 93 SCHWARTZMAN, S. As avaliações de nova geração nas sociedades contemporâneas. In: MELO SOUZA (Org.). Dimensões avaliação educacional. Petrópolis: Vozes, 1990. _____. Políticas públicas de educação. In; SEMINÁRIO INTERINSTITUCIONAL PARA A AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO - ESTUDOS E METODOLOGIAS, Belo Horizonte, 20-23 nov. 2002. Anais... Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2002. SOARES, J. A.(Org.). O orçamento dos municípios no nordeste brasileiro. Brasília: Paralelo 15, 1998. TENDLER, J. Bom governo nos trópicos. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1998. WROBEL, V. O silêncio da escola pública. Jornal O Globo, 12 set. 1999. 94 APROVA BRASIL: OBSERVANDO E OUVINDO A ESCOLA, NA PERSPECTIVA DO DIREITO DE APRENDER18 Maria de Salete Silva* Ao identificar boas práticas relacionadas com aspectos tangíveis e intangíveis das escolas, o estudo fortaleceu nossa visão de que escolas têm corpo e alma. Inseparáveis e complementares, corpo e alma são fonte geradora de aprendizagens. Mas é a alma da escola que faz com que todos e cada um dos integrantes da comunidade escolar vivenciem a bela experiência humana de aprender um pouco mais a cada dia. Essas são as palavras de encerramento do Aprova Brasil: O Direito de Aprender, uma publicação lançada em dezembro de 2006 pelo UNICEF e pelo MEC, contendo os resultados de um estudo realizado em 33 escolas públicas situadas em 14 estados e no Distrito Federal.19 A idéia dessa iniciativa conjunta do Ministério da Educação e UNICEF tem origem nos resultados da Prova Brasil, e sua inspiração e motivação vêm do compromisso com a garantia do direito de aprender de todas as crianças e jovens brasileiros. APROVA BRASIL Realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – Inep, em 2005, a Prova Brasil foi a primeira avaliação em caráter universal realizada nas escolas públicas urbanas que oferecem a 1ª fase e/ou a 2ª fase do ensino fundamental, com mais de 30 alunos na série avaliada. Foram aplicadas provas aos alunos de 4ª e 8ª séries com o objetivo de avaliar seu desempenho em língua portuguesa (leitura) e matemática. No total, realizaram a prova 3.306.378 alunos de 40.290 escolas localizadas em 5.398 municípios de todas as regiões brasileiras. * Consultora de Educação do UNICEF e Coordenadora do Estudo “Aprova Brasil: o direito de aprender.” 18 SILVA, 2007. 19 Idem. 95 Esse tipo de avaliação permitiu a divulgação dos resultados por unidade escolar. Conhecendo os resultados obtidos pelas escolas na Prova Brasil, gestores, dirigentes escolares e a sociedade podem se mobilizar em busca de melhorias no ensino, tomando como base o desempenho das escolas do seu estado, seu município, sua rede escolar ou demais escolas de seu bairro, e aumentando a responsabilidade das escolas, professores e dirigentes em relação ao desempenho dos seus alunos.20 UNICEF E O DIREITO DE APRENDER A base para a cooperação do UNICEF e das demais agências do sistema ONU, no âmbito do Marco de Assistência das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Undaf), são a criação e o desenvolvimento das capacidades dos detentores dos direitos e dos responsáveis pela garantia desses direitos, com os quais os países-membros comprometeram-se, ao ratificar a Convenção dos Direitos da Criança e, no caso brasileiro, ao aprovar o Estatuto da Criança e do Adolescente. O Programa de País do UNICEF para o período 2007-201121 pretende apoiar o Brasil no cumprimento de suas obrigações de garantir os direitos de cada criança e cada adolescente, desenvolvendo cinco programas, denominados Sobreviver e se Desenvolver, Aprender, Proteger-se do HIV/Aids, Crescer sem Violência e Ser Prioridade nas Políticas e Orçamento Públicos. As perspectivas de eqüidade de raça/etnia e gênero e de participação dos adolescentes permeiam todos os programas. O foco da atuação do UNICEF concentrar-se-á nas áreas onde se encontram as crianças mais vulneráveis e excluídas: o Semi-árido Brasileiro, a Amazônia e as Comunidades Populares de Grandes Centros Urbanos. O Brasil quase atingiu o 2º Objetivo do Milênio – Ensino Fundamental Universal – com 98% das crianças de sete a 14 anos matriculadas. Os 2% significam ainda que cerca de 800 mil crianças nessa faixa de idade permanecem fora da escola, das quais 500 mil são negras. A situação das crianças indígenas expressa ainda maior iniqüidade: cerca de 21,5% delas, de sete a 14 anos, estão fora da escola. Persistem também grandes desigualdades regionais: enquanto no Norte e Nordeste somente 40% das crianças terminam o ensino fundamental, no Sul e no Sudeste essa proporção sobe para 70%.22 O Brasil tem 21 milhões de adolescentes com idade entre 12 e 18 anos, representando 11% da população. Mais de 3,5 milhões deles estão fora da escola. De cada cem estudantes que entram no ensino fundamental, 82 concluem a 5ª série, 59 terminam a 8ª série e apenas 40, o ensino médio.23 20 21 22 23 Mais informações sobre a Prova Brasil podem ser obtidas no sítio <http://www.inep.gov.br/basica/saeb/anresc.htm>. Nos 155 países onde o UNICEF atua, suas ações se realizam por meio de Programas de Cooperação, com duração de cinco anos cada. Esses programas de cooperação são preparados com a participação do governo e de diferentes atores da sociedade civil, incluindo as próprias crianças e os adolescentes. O documento do Programa de País (PP), resultado desse processo de discussão, é assinado com os governos nacionais e serve de aval para atuação do UNICEF no país. IBGE; PNAD, 2004; BRASIL, 2005. Idem. 96 Diante dessa situação marcada pela desigualdade e iniqüidade no acesso e na qualidade da educação, o Programa de País do UNICEF concentra o foco de sua atuação na busca de educação de qualidade para todas as crianças e todos os adolescentes de até 17 anos, e em garantir o acesso de 800 mil crianças de sete a 14 anos que estão atualmente fora da escola assim como o acesso ao ensino médio para 8 milhões de adolescentes de baixa renda e baixa escolaridade. A INDISSOCIABILIDADE ENTRE EDUCAÇÃO DE QUALIDADE E APRENDIZAGEM Aprender a dirigir o foco da mobilização em torno da educação de qualidade tem sido cada vez mais freqüente no Brasil. Dois exemplos de grandes mobilizações da sociedade civil demonstram esse movimento. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que tem a participação de diversas organizações sociais, estabelece como foco de sua ação a qualidade da educação para que o aprendizado seja efetivo. O Compromisso Todos pela Educação, envolvendo setores da sociedade civil, empresas e governo, estabeleceu cinco metas para 2022 (Bicentenário da Independência), todas elas fortemente relacionadas com as possibilidades de aprendizagem de meninos e meninas nas escolas públicas. Pensar na aprendizagem como resultado de uma educação de qualidade envolve os aspectos relacionados com os tempos, práticas e conteúdos da escola. Significa também pensar em educação integral, em articulações sistêmicas entre políticas públicas e programas de atendimento a crianças, famílias e comunidades. Uma educação de qualidade deve garantir o direito de aprender. UM UNIVERSO A SER OBSERVADO Os resultados da Prova Brasil abriram um rico campo de observação sobre situações que podem levar à aprendizagem da leitura, dos cálculos e raciocínio matemáticos em escolas públicas de ensino fundamental. O estudo realizado pelo MEC e UNICEF partiu de uma idéia-chave: as respostas para as indagações referentes à aprendizagem das crianças podem estar nas próprias escolas. Mais do que isso, elas devem surgir de observações e reflexões com participação ativa dos atores, protagonistas do fazer escolar. Quais as características presentes nas escolas onde os alunos alcançaram bom desempenho na Prova Brasil? Que escolas deveriam ser observadas e estudadas? Para identificar as diversas dimensões da gestão, organização e funcionamento de escolas que podem ter contribuído para a melhor aprendizagem dos alunos, foram selecionadas 3624 escolas das cinco regiões geográficas brasileiras, segundo critérios socioeconômicos e de desempenho na Prova Brasil. 24 Foram visitadas 36 escolas, mas em três delas foram identificadas práticas de seleção para ingresso. Como isso estabeleceria um diferencial discriminatório em relação às outras escolas, essas três não foram incluídas nos resultados do estudo. 97 As escolas foram escolhidas a partir de seus resultados na avaliação, sendo também consideradas as informações sobre a situação socioeconômica dos alunos que participaram da prova e dos municípios em que elas se localizam. Com isso foi possível comparar as escolas não só observando a nota média obtida por seus alunos mas também o quanto a própria escola pode ter contribuído efetivamente para o seu desempenho na prova. É o que se chamou de Índice de Efeito Escola (IEE) que mede o impacto que a escola tem na vida e no aprendizado da criança. Por isso as escolas visitadas não são as que obtiveram maiores notas, em valores absolutos, mas aquelas com o mais alto efeito-escola. Elas situam-se em municípios ou bairros onde moram famílias de baixa renda, seus alunos apresentam alta vulnerabilidade para a exclusão social e, mesmo assim, nessas escolas, eles aprendem. Chegou-se então a um grupo de escolas que apresentaram resultados de desempenho na Prova Brasil sempre acima da média nacional e também superiores em relação às escolas da mesma região e com características semelhantes, segundo os critérios utilizados pelo UNICEF e MEC. AS ESCOLAS ANALISADAS Foram visitadas e analisadas 33 escolas de ensino fundamental, sendo 20 municipais e 13 estaduais, em 32 municípios de 14 estados e DF. 98 PRINCÍPIOS NORTEADORES DO PROJETO Alguns princípios orientaram a direção do olhar sobre as escolas, na perspectiva de identificar em que medida elas estão garantindo os direitos da criança, em especial o direito de aprender. • o direito à educação é direito de todas e de cada uma das crianças e adolescentes; • o direito à educação deve observar os princípios da universalidade; progressividade; indivisibilidade e interdependência; exigibilidade e participação; • todas as crianças e adolescentes têm direito à educação de qualidade, independente de origem étnica, racial, social ou geográfica; • a escola é parte integrante do sistema de garantia de direitos das crianças e adolescentes; • a escola é lugar privilegiado para assegurar a cada criança e adolescente o direito de aprender; • a gestão escolar deve ser democrática garantindo a alunos, professores, funcionários, famílias e comunidade o direito à participação. APROVA BRASIL: UMA EXPERIÊNCIA DE OBSERVAÇÃO PARTICIPATIVA Com um olhar orientado pelo marco de direitos, o projeto buscou identificar que aspectos podem ter contribuído para o bom desempenho das escolas, que certamente não se deve a um único fator ou dimensão da gestão escolar. Cada escola tem história, rotinas, projetos e formas de trabalho construídas ao longo do tempo. As escolas visitadas situam-se em municípios e comunidades com características culturais, sociais e econômicas diferenciadas pertencendo a redes também diversas. Portanto, para anunciar os resultados da pesquisa como “boas práticas de educação pública” foi preciso ir além da identificação de um ou outro fator, descrevendo, ainda que sucintamente, os processos e atividades por meio dos quais essas práticas se efetivam e o contexto onde elas se inserem. O estudo lançou mão de uma metodologia denominada “pesquisa rápida” (rapid assesment), que parte da investigação de um núcleo central de interesse – no caso, as escolas selecionadas – para levantar elementos que permitam identificar questões relevantes do universo pesquisado. Para realizar a pesquisa em campo, foram selecionados 12 pesquisadores, a partir de edital público. O grupo tinha formação bastante diversificada e experiência também diferenciada em pesquisa e avaliação. Os pesquisadores foram incentivados e capacitados para ter um olhar o mais aberto e amplo possível, grande disponibilidade para a escuta e observação, além de muita determinação e disciplina para registrar cada momento da visita. Todo o trabalho nas escolas foi baseado em um “Caderno de Campo”, organizado de maneira a orientar os contatos e possibilitar o registro das observações, conversas, entrevistas e reuniões. 99 Os pesquisadores buscaram, nos dois dias que passaram em cada escola, conversar com todos os atores que poderiam contribuir – e como contribuíram! – para o entendimento das razões do bom desempenho das crianças na Prova Brasil. Para entender o processo do aprender dos alunos, buscava-se a visão mais ampla e multifacetada possível. A inspiração para essa postura aberta e para a necessidade de captar a diversidade das faces e dimensões da escola veio de um poema de Paulo Leminsky: Quando eu vi você Tive uma idéia brilhante Foi como se eu olhasse De dentro de um diamante E meu olho ganhasse Mil faces num só instante25. Além de ver essas “mil faces”, era preciso ouvir cada uma delas. E essa escuta foi inspirada em um texto de Leonardo Boff: Ler significa reler e compreender, interpretar: Cada um lê com os olhos que tem. E interpreta a partir de onde os pés pisam. Todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê, é necessário saber como são seus olhos e qual é a sua visão de mundo. Isso faz da leitura sempre uma releitura. A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam. Para compreender é essencial conhecer o lugar social de quem olha. Vale dizer: como alguém vive, com quem convive, que experiência tem, em que trabalha, que desejos alimenta, como assume os dramas da vida e da morte e que esperanças o animam. Isso faz da compreensão sempre uma interpretação26. Os atores, com os quais obrigatoriamente o pesquisador deveria fazer contato, seja por meio de observação de práticas, entrevistas, reuniões ou mesmo conversas mais informais, foram a direção, a coordenação pedagógica, os professores, os alunos, suas famílias, funcionários e membros do Conselho Escolar. Complementarmente poderiam ser ouvidos parceiros externos da escola, dirigentes municipais de educação, membros da comunidade do entorno da escola. Todo o processo de escuta tinha como coluna vertebral uma questão central, que deveria ser respondida por todos os atores: Esta escola teve um desempenho na Prova Brasil – Matemática e Língua portuguesa na 4ª e/ou 8ª série – acima da média das escolas públicas brasileiras. A que pode ser atribuído esse resultado? 25 26 LEMINSKY, 1991. BOFF, 1999. 100 O Caderno de Campo, guia desse processo de observação e escuta, foi elaborado de maneira simples e adequada à metodologia de pesquisa rápida e estava dividido em três blocos: • quadros com registro de informações quantitativas sobre o município e a escola; • roteiros para observação, entrevistas, conversas, reuniões, com orientações de caráter geral e indicações específicas para cada um dos atores participantes; • formulários para registro de informações qualitativas do pesquisador. O roteiro de observação e contato com os atores foi construído a partir da publicação “Indicadores de Qualidade na Educação”, 27 que tem como objetivo incentivar a comunidade escolar a avaliar a qualidade da educação em sua escola. Nela são propostas sete dimensões de avaliação que serviram de base para a construção do caderno de campo: ambiente educativo; prática pedagógica; avaliação; gestão escolar democrática; formação e condições de trabalho dos profissionais da escola; ambiente físico escolar e acesso, sucesso e permanência na escola. Durante as visitas às escolas, os alunos, crianças e adolescentes, tiveram um papel central: eles conduziram os pesquisadores, mostraram e opinaram sobre os espaços, contaram sua percepção sobre as aulas e atividades desenvolvidas, seus processos de aprender, as relações entre os atores e os resultados da Prova Brasil. Por que a nossa escola foi bem no Prova Brasil: – Por causa do bom desempenho dos alunos. – Porque tem professores inteligentes. – Porque as cantineiras são boazinhas e fazem uma merenda gostosa. – Porque os professores são criativos e trazem coisas novas como músicas, livros, pesquisas e não fica aquela aula cansativa. – Porque temos muitas tarefas na sala de aula. – Porque a avaliação é por trimestre e estimula o aluno a estudar o ano todo. – Porque a supervisora é maravilhosa, uma fada. (Alunos da 8ª série da Escola Municipal Desembargador Aprígio Ribeiro de Oliveira - São Brás do Suaçuí/MG) A PERCEPÇÃO DOS ATORES SOBRE AS RAZÕES DO BOM DESEMPENHO DAS CRIANÇAS As respostas à questão central da pesquisa revelam a percepção dos atores sobre as causas do bom desempenho das crianças de cada escola visitada. A maioria dos que participaram das entrevistas, reuniões e conversas atribuiu o bom desempenho das crianças aos professores, aos próprios alunos, às práticas pedagógicas desenvolvidas e à participação da comunidade. 27 BRASIL et alii, 2004. 101 • O professor: atitudes, capacidades, formação Empenho, competência, capacitação, interesse, dedicação, abertura para criar atividades e estimular os alunos. Essas foram as características destacadas por todos os que consideraram o professor como o principal responsável pelo bom desempenho das crianças. “Os professores são criativos e trazem coisas novas, como músicas, livros, pesquisas e não fica aquela aula cansativa”. (Alunos da 8ª série da Escola Municipal Desembargador Aprígio Ribeiro de Oliveira – São Braz do Suaçuí/ MG). • Meninos e meninas: sujeitos ativos da aprendizagem A atitude dos participantes em relação aos alunos é francamente positiva. Eles são parte ativa do sucesso das escolas e não a razão de seus problemas, como muitas vezes posicionamse setores da comunidade escolar. Essa atitude repercute na auto-estima e auto-imagem dos alunos que, em muitas das escolas pesquisadas, afirmam que confiam nas suas capacidades, consideram-se inteligentes e que têm facilidade para aprender. “A prova foi fácil e nós somos inteligentes”. (Alunos da Escola Estadual Coronel Antônio Trindade – Aquidauana/MS). • Práticas pedagógicas: inovações, interação com outros ambientes As atividades pedagógicas desenvolvidas nas salas de aula ou em outros ambientes são consideradas como um dos fatores decisivos para o bom desempenho das crianças, embora muitas dessas atividades e propostas não cheguem a configurar um projeto pedagógico formal e estruturado. A variedade de recursos utilizados, os tempos dedicados à aprendizagem – no turno de estudo e em atividades complementares no turno oposto –, a mobilização e participação de alunos e até mesmo das famílias nos projetos, a quebra da rotina de sala de aula ou da forma de organizar os espaços e o mobiliário escolar foram citados por muitos dos que participaram da pesquisa. Além desses aspectos, muitos atores se referiram à disciplina e à organização da escola como elementos que impulsionam e valorizam a aprendizagem. “Aqui os alunos, pais e professores são cobrados e cobram com muito rigor e disciplina” (Diretora de uma das escolas visitadas). • Famílias e comunidade: parte do cotidiano da escola Em muitas das escolas analisadas, a participação das famílias e da comunidade foi considerado um fator indiscutível para o desempenho escolar das crianças. Pelos depoimentos foi possível verificar que essa participação acontece de três formas: na gestão da escola, no envolvimento e presença dos pais de alunos e nas parcerias firmadas com instituições como empresas, organizações sociais, associações de moradores, universidades e ONGs, entre outras. 102 Vista como um fator que interfere positivamente na aprendizagem, a gestão democrática e participativa aponta para a ampliação do processo educativo para além da estrita relação educador-educando, envolvendo outros territórios, o contexto social e comunitário, e outros tempos, além do tempo escolar. “Sei que a escola tirou o primeiro lugar na Prova Brasil. Têm um outdoor aqui na frente da escola. Acho que isso foi possível pelo jeito que os professores ensinam as crianças. Eles sabem ensinar e os alunos têm mais liberdade de perguntar quando têm dúvidas.” (Pai de aluno da escola Professor Guiomar Gonçalves Neves – Trajano de Moraes/RJ). AS BOAS PRÁTICAS DAS ESCOLAS: INSPIRAÇÃO PARA MELHORAR A APRENDIZAGEM No estudo “Aprova Brasil, o direito de aprender”, a expressão “boas práticas” tem o significado de procedimentos, atividades, experiências e ações que apresentam resultados positivos na aprendizagem de crianças e adolescentes. A sistematização de práticas apresentada na publicação foi feita a partir da análise da coerência pedagógica, da coerência com os princípios norteadores do estudo, da sintonia com a abordagem dos direitos das crianças e adolescentes, da sua relação com o dia-a-dia da escola e do potencial de disseminação para outras escolas. A metodologia e desenvolvimento do estudo não permitem atribuir o bom desempenho dos alunos das escolas analisadas exclusivamente às práticas relatadas. Mas é possível destacá-las como relevantes e significativas para a escola, para os atores que participaram da pesquisa e, principalmente para os resultados na aprendizagem das crianças. O estudo as apresenta como sugestões ou boas idéias, não como receitas ou fórmulas prontas. Elas terão cumprido um papel central se servirem de inspiração para políticas, programas, diretrizes ou projetos que possam contribuir para a melhoria da qualidade da aprendizagem de crianças e adolescentes alunos de escolas públicas brasileiras. CINCO DIMENSÕES DO APRENDER: OS ACHADOS DO APROVA BRASIL Complementando a resposta à questão central, todos os participantes do estudo – direção, professores, coordenadores, alunos, famílias, funcionários e membros da comunidade – foram solicitados a descrever uma ou mais práticas desenvolvidas na escola que contribuíam efetivamente para a aprendizagem das crianças. Ao analisar e sistematizar as boas práticas apontadas pelos atores participantes nas 33 escolas pesquisadas, foi possível agrupá-las, por similaridade, em cinco blocos, que foram chamados de “dimensões do aprender”. 103 DIMENSÃO 1: Práticas pedagógicas, a caminho da educação integral O maior número de atividades citadas refere-se a práticas pedagógicas, envolvendo estratégias de trabalho dos educadores, projetos de ensino, uso e produção de materiais didáticos, processos de avaliação e recuperação da aprendizagem. Verificou-se que elas não nascem no vazio ou da intenção ou desejo isolados de um ou mais setores da comunidade escolar. Elas são fruto de uma conjunção de condições objetivas e do compromisso da equipe e da comunidade escolar com a aprendizagem dos alunos. Sua força e efetividade dependem de uma atitude atenta e cuidadosa de todos no planejar, realizar e avaliar cada passo. Essas práticas não são eternas nem imutáveis. A publicação apresenta essas boas práticas agrupadas em sete grupos temáticos, seja por características de gestão ou forma de desenvolvimento, seja por tipo de atividades desenvolvidas. São eles: • Trabalho coletivo, em equipe, compartilhado, coordenado Muitas das escolas estudadas desenvolvem experiências de planejamento coletivo, de encontros e centros de estudo, de articulação e de intercâmbio de experiências entre educadores. • Projetos de ensino Todas as escolas analisadas desenvolvem projetos de ensino próprios, nas salas de aula ou em outros espaços da escola ou externos. Muitos envolvem mais de um professor ou mais de uma turma e disciplinas diferentes. Tomam forma de oficinas de teatro ou música, de produção de textos, de programas de rádio e de informática. Alguns acontecem no turno oposto ao de aulas regulares, outros são apresentados para a comunidade, na forma de eventos socioeducativos. Os projetos descritos apresentam forte potencial de mobilizar a participação dos alunos, de propiciar a interdisciplinaridade, de abrir portas para a integração com a comunidade. Mais do que isso, interferem positivamente na mudança dos processos de avaliação do desempenho dos alunos. “Os projetos são uma inovação, mas não fazemos nada mirabolante, trabalha-se com aquilo que se tem. A maior dificuldade é colocar os projetos no papel e registrar cada passo e os resultados, pois falta hábito ao professor. Mas os projetos são sempre um trabalho conjunto, interdisciplinar, e tem ajudado na melhoria do ensino e aprendizagem.” (Professoras de Matemática e Português da Escola Estadual Cristóforo Myskiv – Prudentópolis/PR). • Inovações na organização da escola Aqui estão algumas experiências de mudança na organização espacial das salas de aula e de outros espaços educativos, no aumento e na forma de distribuição dos tempos escolares, na integração entre disciplinas. 104 • Ensino contextualizado A forma, o conteúdo e o material didático utilizado nas atividades de ensino consideram a realidade dos alunos e de sua comunidade. Em muitas das escolas há materiais construídos pela própria equipe, muitas vezes com participação dos alunos. Todas utilizam o livro didático, mas, na maioria delas, o projeto da própria escola determina a ordem dos temas, o momento e a forma de utilização dos livros pelos alunos. • Novas formas de avaliação e acompanhamento da aprendizagem Experiências de programas de recuperação paralela ao período de aulas, aulas de reforço, atenção individual, algumas realizadas com parceiros externos. • Atividades externas com alunos Programas que abrem as portas da escola, permitindo que as crianças conheçam sua cidade e outras escolas. Idas ao cinema e teatro, atividades de educação ambiental e até mesmo viagens para outros municípios são relatadas nesse bloco. • Incentivo à prática de jogos e esportes Em muitas escolas as crianças jogam xadrez, damas, participam de torneios e campeonatos de esportes coletivos, muitos deles com a participação da comunidade. DIMENSÃO 2: A importância do professor Em todas as escolas houve relatos de boas práticas relacionadas ao professor, sejam aquelas voltadas para sua formação inicial e continuada, sejam as que relatam experiências que comprovam seu compromisso, entusiasmo, dedicação e criatividade. As boas práticas relatadas são agrupadas em dois blocos: Formação e Valorização. No primeiro, são relatadas experiências de formação inicial e continuada, e mobilização dos professores para a busca de informações. No segundo, formas de valorização no campo da remuneração e do reconhecimento. DIMENSÃO 3: Gestão democrática e participação da comunidade escolar O estudo confirmou a importância da participação, como processo constitutivo da democracia. Portanto, boas práticas de participação ampliam e qualificam a gestão democrática da escola. Nas escolas analisadas foram identificados processos diferenciados e criativos de participação. O maior reflexo na aprendizagem é decorrente do aprimoramento da interlocução da gestão da escola com seus atores e da escola com interlocutores externos, como os órgãos de gestão municipal ou estadual da educação, e de outras políticas e programas de interesse da comunidade escolar, como os da assistência social, saúde, esportes e cultura. 105 Mais do que a existência de espaços de participação, como reuniões, colegiados, informativos eficientes, o estudo verificou o incentivo e o exercício dessa participação, concretizada em conselhos escolares atuantes e presentes na vida da escola, na participação ativa das famílias e dos alunos nos processos de decisão e acompanhamento da gestão escolar. DIMENSÃO 4: Alunos e alunas atuantes no dia-a-dia da escola As práticas apontadas nas escolas, envolvendo participação de alunos, extrapolam os limites do simbólico – quando as crianças participam de ações concebidas, planejadas e realizadas por adultos – demonstrando o protagonismo e centralidade das ações dos alunos. Mais do que um direito, a participação de meninos e meninas é uma condição essencial para o desenvolvimento de práticas pedagógicas construtoras de aprendizagens. Eles e elas podem e devem ser protagonistas e sujeitos ativos no ambiente social e comunitário, no ambiente escolar e na gestão da escola. Nas escolas analisadas, muitas foram as formas de participação de alunos, em atividades pedagógicas, como no apoio a reforço escolar, elaborando jornais murais, produzindo a rádioescola. Grêmios atuantes, com presença ativa e efetiva na escola, também foram comprovados. DIMENSÃO 5: As parcerias externas A idéia de parcerias externas vem da compreensão de que a escola sozinha não é capaz de garantir a totalidade dos direitos de crianças e adolescentes. A garantia do direito à vida, à saúde, à liberdade, à convivência familiar e comunitária é resultado da ação de inúmeros organismos, governamentais ou não, das esferas públicas e privadas. A parceria dessas instituições com a escola, além de contribuir para o fortalecimento da própria escola, contribui efetivamente para a garantia de alguns desses direitos e principalmente com o direito de aprender. As escolas analisadas exercitam ricas experiências de parcerias com instituições da comunidade, do município e até mesmo regionais ou nacionais. Os parceiros têm perfís diferenciados, são do setor empresarial (bancos, empresas de comunicação ou pequenos comerciantes), outras escolas, fundações, ONGs, universidades, sindicatos e associações comunitárias ou de moradores. A maioria delas apóia projetos realizados pelas próprias escolas, como laboratórios de informática, programas de empreendedorismo e segurança no trânsito, combate à violência, apoio a famílias, preservação ambiental e atividades artísticas. Além de viabilizar projetos, elas criam atuantes espaços de mobilização social pela qualidade na educação. PROVA BRASIL: PONTO DE PARTIDA PARA... Mais do que ponto de chegada, o Aprova Brasil é ponto de partida para compreender e disseminar as condições e o potencial de aprendizagem nas escolas públicas brasileiras. O estudo deixou questões em aberto, novas possibilidades de estudos e pesquisas. Aspectos como a importância do clima da escola, o ambiente escolar e as relações entre as pessoas, 106 foram citados muitas vezes como fatores que estabelecem boas condições para a aprendizagem. Aparece também um novo olhar sobre a organização da escola, disciplina, normas de convivência, vistos mais como elementos condições para o bom funcionamento e para os resultados atingidos pelas escolas e menos como formas de coerção ou impeditivas da participação. Um outro campo de observação aberto pela pesquisa é o das relações entre escolas e sistemas ou redes e seus organismos e modelos de gestão. O estudo não teve como objetivo recolher ou sistematizar as dificuldades que as escolas enfrentam para desenvolver suas práticas. No entanto essas dificuldades foram citadas pelos participantes da pesquisa afetando diferentes áreas e momentos da vida da escola, como nas condições de infra-estrutura e na disponibilidade de espaços, equipamentos e materiais; no isolamento entre escolas da mesma rede ou no território do município; nas demandas que as diferentes esferas do poder público impõem à escola; na expectativa e dificuldades na relação com famílias; na distância e descrédito da comunidade sobre a escola. Voltando ao conceito inicial, de corpo e alma da escola, verificou-se que, embora seja o lado mais visível, da materialidade da escola, infra-estrutura, equipamentos, espaços, são mais capazes de impulsionar a aprendizagem quando estão integrados como meios a projetos e atividades pedagógicas consistentes, concebidos e realizados pelos atores da própria escola. O desafio que se descortina para o UNICEF e MEC, assim como para todos os parceiros e instituições comprometidos com a qualidade da educação, é disseminar as experiências e práticas dessas 33 escolas, fazendo do Aprova Brasil um impulso mobilizador que inspire novas práticas e experiências em escolas públicas desse Brasil. O objetivo central da caminhada da qualidade da educação pública no Brasil deve ser o de garantir, como finalidade essencial da escola, o direito de aprender para todas as crianças e jovens brasileiros. O foco no direito de aprender pode reposicionar e dar novo significado à dimensão material e às possibilidades geradas pelas condições objetivas e subjetivas do fazer escolar. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOFF, L. A águia e a galinha: metáfora da condição humana. Petrópolis: Vozes, 1999. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pequisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo escolar, 2005. Brasília: MEC/Inep, 2005. _____. _____. _____ et alii. Indicadores de qualidade na educação. São Paulo: MEC/Inep, UNICEF, PNUD, Ação Educativa, 2004. LEMINSKY, P. Amor bastante. Brasília: Ed. Brasiliense, 1991. Disponível em: < http:/ /www.insite.com.br/rodrigo/poet/leminski/amorbast.html>. SILVA, M. de S. Aprova Brasil: o direito de aprender. Cadernos Cenpec, n. 3, jan./jul. 2007. Disponível em: <http://www.unicef.org/brazil/finalaprovabrz.pdf>. 107 QUALITY ISSUES IN PRIMARY AND SECOND LEVEL EDUCATION: THE IRELAND EXPERIENCE Eamon Stack* Good morning Madam Chairperson, ladies and gentlemen. I would like to say how delighted I am to be here in this beautiful city of Brazilia, your capital, discussing issues in relation to the quality of education in my own country, Ireland. I thank UNESCO for their invitation and for the warmth of their welcome. I feel very much at home here already. Your Minister spoke in very positive terms at the opening of the Conference last evening about the new possibilities for education in Brazil. His specific references to teacher education, curriculum development, co-operation and social responsibility all reflect some of the thoughts I will share with you in this session. It is indeed a long way to travel from Ireland to Brazil and I hope that my presentation this morning will justify that trip. My presentation covers three main areas: • Ireland today – some facts and figures in brief. • The legislative framework and the goals of Irish education as well as the structures of education at primary and second level. • I will outline for you some of the factors which I believe have impacted on the quality of Irish education. Finally, if time permits, I will spend a little time talking about the challenge of social exclusion and the role education can play in helping to alleviate it. Otherwise you may raise questions on this or any other area I have raised in the ‘Questions and Debate’ section that follows this presentation. I am very pleased to participate in that debate with you. * Chief Inspector at the Irish Department of Education and Science and member of that Department's top Management Advisory Committee since 1997. He chaired the Planning Group that led to the establishment of the National Educational Psychological Service in 1998 and the Planning Group that recommended the establishment of the National Council for Special Education (NCSE) in 2003. He was also involved in the planning for, and establishment of, the Irish State Examinations Commission (SEC) in 2003. He is also head of the Irish delegation to the intergovernmental Board of Governors of the European Schools. He served on a number of National Council for Curriculum and Assessment syllabus committees over the years and had a lead role within the Department in the implementation of the Post-Primary Senior Cycle reforms in the mid nineties. 109 The following are six of the factors I believe are of major significance in looking at the quality of Irish education today: • Irish society’s traditional value on education; • Social partnership at all levels; • Teacher supply and quality; • Curriculum development and implementation; • State examinations and assessment – influence and impact; • Supports for schools/teachers including inspection of schools. I will return to these in more detail later. So starting with – some facts and figures about Ireland. We are a very small country on the periphery of Western Europe with a population of four and a quarter million people. The main language spoken is English. Irish is also spoken in a number of areas and several other languages are spoken by newcomers to our country. 87% of the Irish population is Roman Catholic. Of the four and a quarter million people in Ireland, almost one million (25%) is in fulltime education. Two million are in employment. The age distribution of our population is also interesting with 35% of the population under the age of 24. Ireland, in fact, has the youngest population in Europe. The inflow and outflow of people, to and from Ireland, has also changed dramatically. In 1989, over 40,000 Irish people emigrated from Ireland whereas in 2006 that picture is completely reversed with almost 70,000 net migrants into the country. This is just one of the indicators of the changing economic circumstances that Ireland has experienced in the last 15 years. Our GDP growth in 2006 was 5.6% and our average annual growth, in GDP terms over the last number of years, has been in the order of 7.9% per annum. Our labour force has been expanding at an annual rate of over 4½%. In a nutshell, what this means is that the Irish economy has out performed all other European economies since the 1990s. The employment, by economic sector, of the two million people at work in Ireland also is interesting. Over the years, there has been a significant decline in the numbers involved in agriculture while the percentage of the labour force engaged in the services has increased dramatically. For example, education and health services involves 16½% of the labour force and financial and other business services account for 13½%. Looking more closely at the 1 million people in fulltime education, almost 50% are in the primary sector, 36% at second-level and about 15% at third level (i.e. 18+). And on the right hand side of the screen, this is broken down under the various ISCED levels with which you are familiar. 110 This is just a brief comparison of Ireland today compared to 40 years ago. Forty years ago (in 1966) one third of children left school after primary, whereas today almost 100% of children transfer from primary to second-level. In 1966, just 20% of the age cohort completed second-level education and now over 81% complete second-level – (that is at the age of 17/18). And finally in 1966, 11% was the transfer rate to third-level education. This has increased five fold since then with over 55% of the age cohort now going on to study at third-level. So Ireland is a very different place today - from an educational perspective, from an economic perspective and from a social perspective. But of course we still have challenges in all three areas and I will refer briefly at the end to some of the challenges we face in education. I now want to outline for you the legislative framework that underpins Irish education, the goals of the Irish education system and the structure of primary and second-level schooling in Ireland. In the last 10 years, there has been a significant amount of legislation enacted in relation to education. That contrasts sharply with little legislation in the area of education over the previous 40 years. The significant pieces of legislation in the last 10 years are listed on the slide. The central piece of legislation is the Education Act 1998. This sets out the respective rights and responsibilities of all those involved in education. Three other pieces of significant legislation you see listed are: – the Education Welfare Act, which deals with the attendance at school of students, the Education for Persons with Special Educational Needs, which deals with the inclusion of special education needs children in our education system; and the Equal Status Acts which give recognition to the status of all individuals under the law in terms of equality and their rights and entitlements. The goals of the Irish Department (or Ministry) of Education and Science are set out in a Strategy Statement. In the current statement there are five. • To deliver an education that is relevant to each individual’s personal, social, cultural and economic needs. • To support a socially inclusive society with equal opportunities for all. • To contribute to Ireland’s economic prosperity, its development and our international competitiveness. • To improve the standard and quality of education particularly by promoting best practice in classrooms, schools and colleges and other centres for education, and finally • To support the delivery of education by quality planning, policy formulation and customer service. 111 A new Strategy Statement is now being prepared following the formation of a new Government this month. The administrative structures for primary and second-level schools in Ireland are fairly simple. First of all, there is no major regional or local administrative structure – no regional authorities or boards, for example. Each individual school has its own Board of Management and a Trustee/Patron. Each of our 4,000 schools, with the exception of about 250 of them, deals directly with the Department of Education and Science for things such as finance, staffing, grants, buildings and so on. In fact, only 1% of the overall education budget goes on the central administration of the system at primary and second level in Ireland. The figures quoted on the slide are for 2006, when the total net expenditure on education in Ireland was over 10 million US dollars. In the current year it has increased to over US$12 million. You will see that the 1% on administration that I mentioned already – the primary sector accounts for about 38% of the expenditure, the second-level 38% and the third-level 23%. At the very end of the slide you see the expenditure per pupil in 2005. At primary that was over US$7,000, at second-level almost US$10,000 and at third-level almost US$13,000 per student. The compulsory period of schooling is from 6 to 16 years of age, with the primary sector ranging from 4 – 12, second-level from 12 to 18 and third-level and further education after that. Looking more specifically at the primary sector, you will see that we have over 3,300 primary schools, almost 450,000 pupils and 26,000 teachers. While the compulsory attendance is from 6 to 16, almost 46% of 4 year olds and almost 99% of 5 year olds are enrolled in our primary schools. 98% of our primary schools are privately owned or controlled but are State funded. We have many small schools – about 40% of primary schools have 4 teachers or fewer. 95% of our primary schools are under the patronage of the Roman Catholic Church. We also have schools that are multidenominational. We have Church of Ireland (Presbyterian) schools, some Methodist, Jewish and Muslim schools also. 261 schools are all-Irish (Gaelic) medium schools. The student to teacher ratio is 17:1 – the fifth highest reported ratio in the EU 27 countries - and the average class size of 24 - the second highest among the reporting EU 27 countries. Turning to second-level schooling, the number of schools in 2004/05 was 742. There are over 335,000 students at second level with over 25,000 teachers, giving a student to teacher ratio of 13:1. 55% of the age cohort now transfer to third level. This level of participation has resulted from the access to second level education being made available to all students back in 1967 and it was supported by a national school transport scheme provided to get students to the nearest second-level school. 112 In addition to formal second-level schools, we have a number of other educational pathways, or out-of-school settings, where education is provided for students. One such example is Youthreach. These centres are for students who do not remain in the traditional school after 14/ 15 years of age. The programmes provided are more flexible providing a combination of general education, vocational training and work experience all as part of the one programme. Many of the students in the Youthreach Centres also participate in the State Examinations. Over 70% of the students in Youthreach progress to further education, training or employment. Approximately 90% of second level schools, while privately owned, are State funded. 95% of students attend non-fee paying schools in Ireland. While there are three types of secondlevel schools, the curriculum in all is a unified curriculum. In other words, it is the same curriculum regardless of the type of school. Furthermore, the teacher qualifications in the different kinds of schools are broadly the same. In the last few years, Ireland has developed a national framework of qualifications in order to provide recognition for all learning achievements through education and training in Ireland. This provides us with a structure that enables learning achievements to be measured and related one to the other. It is a ten level framework designed to simplify the equivalences of different educational qualifications within Ireland. Maximising participation and retention in education are key priorities. On the left hand side on the screen you can see the percentage of the population enrolled in the different age categories and just to highlight one or two of them. Over 45% of 4 year olds are in fact enrolled in primary schools and that increases at 5 to 99%. There is a retention of 85% of 17 year olds in the system. Typically students sit the Leaving Cert examinations at 17 or 18 years of age. The school leaving certificate exam completion is over 81% at present and adding to that the 5% who complete their education in ‘out-of-aided school’ situations, the true rate of retention is over 86%. There is a national objective to increase this rate to 90%. 55% of the age cohort transfer from second level to third level – that is to universities or institutes of technology - institutions that provide primary degrees and post-graduate programmes. A further 15% transfer to further education and about 5% follow on to apprenticeships and other courses. In summary, over 85% of persons aged 20 – 24 in 2006 had completed second-level education or higher and we now have less than 4% of school leavers who leave school without a qualification. But this 4% of school leavers is a concern for us and is the focus of a new initiative called Delivering Equality of Opportunity in Schools (DEIS). The number of students at third-level has increased five fold in the last forty years. Of the 25 – 34 year olds, over 40% now hold a third-level qualification. In addition, there is a significant involvement of other young people in further education either in post-leaving certificate courses or various back-to-education initiatives. All of these initiatives, aimed at increasing participation and retention in education, are provided as a contribution to increasing our competitiveness by having a well educated workforce. Turning now to the six key factors which I believe have had, and continue to have, a significant influence on the quality of our education. 113 1. IRISH SOCIETY’S TRADITIONAL VALUE IN EDUCATION Traditionally, Irish parents have placed a significant value on the influence of education. It has been seen by parents and by society in general in Ireland as a passport to a better quality of life. There is a strong tradition in Ireland that parents regard education as the one thing they can give to their children regardless of their own material wealth. So a high value has been placed on education for individual economic and social success. Consistent with that a high value has been placed on teaching as a profession. So it has always attracted quality applicants and indeed still does. Education is very much seen in Ireland as giving individuals a competitive edge, particularly in employment, not just nationally but also internationally. There is generally a national political consensus on most of the core issues in education. In fact most issues of any debate around education in Ireland revolve around the resourcing of education. Finally, there is a very strong media interest in all aspects of education in Ireland including progress of students in State examinations. 2. SOCIAL PARTNERSHIP Social Partnership has become the way of doing business in most aspects of economic and social activity in Ireland since the late 1980s. In the ’80s Ireland went through a very difficult economic time with high levels of unemployment with most of the economic indicators being unfavourable. A partnership approach, rather than a confrontational model was adopted by government, trade unions, employers and the various social partners in order to advance the national interest. The concept of collectively working together to grow the ‘national cake’ rather than having battles over who gets what slice of the existing cake became the focus. The concept of social partnership is now very much embedded in how business is done in Ireland. Generally these national agreements last between 3 to 5 years. The latest one has a timeframe of 10 years. The titles of the national agreements since 1987 tell their own story. The first one, for example, was a programme for national recovery, followed by a programme for economic and social progress. Then the next programme focussed on competitiveness and work and that was followed in 2000 with a programme which put the emphasis on prosperity and fairness. The programme just ended was entitled Sustaining Progress and the latest programme for the next nine years is called Towards 2016. When it comes to education the partnership concept in national agreements also applies. The Education Act 1998 gives expression to this. It requires that consultation takes place with the education partners before the Minister regulates under the Act. So significant changes in education policy and practice happen only after an intensive and inclusive process of consultation. The overall aim here is to get broad agreement in the major areas of development in education prior to implementation whether they are in curriculum, teacher education, evaluation or other education policies. 114 3. TEACHER SUPPLY AND QUALITY When we look at teaching as a profession in Ireland we see a profession that has always been held in very high regard. We have high quality entrants into the teaching profession. It is very competitive. For example, there are three applicants for every place in one particular post graduate teacher diploma course. The high standard of entry to such a course requires teachers to have a second class honours degree at least. For those students who apply for teacher training directly from second level school, they require around 460 points from the total of 600 in their final examination when leaving school. I will explain later the significance of this. There has been a 20% increase in the number of applicants into teacher training colleges in the current year. All our teachers are graduates; all have primary degrees with a growing number having honours degrees and post graduate qualifications. Teachers are relatively well paid in Ireland. They are the eight highest in the 31 OECD countries and the teacher salary scale ranges from a basic US$47,000 to US$81,000 per annum. In addition all teachers receive annual qualification allowances which are in addition to these basic figures. Teacher unions in Ireland, of which there are three main ones, are very influential in Irish education. They are part of the partner group in education and they are concerned with the professional as well as the typical trade union issues in education. There are some changes taking place in the teaching profession. For example, there are moves to more collaborative team work in a whole school context. There has in recent years been a fairly dramatic decline in religious personnel in teaching and in management of schools and while that is a loss in many ways, it has also opened up leadership and management positions for lay teachers in our schools. There are now more specialist career paths for teachers than ever before. This includes guidance counsellors, special education teachers, learning support teachers, home school community liaison teachers and others. A feature of the teaching profession, in recent years in Ireland, is that female teachers now significantly out-number male teachers, particularly at primary level even though there has been some rebalancing of that in the last year or two. A Teaching Council has recently been established in Ireland to regulate the profession. In Ireland we now see three elements to teacher education. First of all there is the initial teacher education. We have two models of training teachers in Ireland, one is called the ‘concurrent model’ and the other the ‘consecutive model’. The concurrent model is where the subject matter of the degree and the teaching practice happen at the same time. The consecutive model means that the teacher gets a degree in a subject area first and then does teaching methodology as a separate diploma after the degree. We also have national pilot projects in place for the induction of newly qualified teachers. There is a critical phase in the new teachers life, particularly their first year, when newly qualified teachers benefit from additional support and help in order to gain the maximum benefit from their initial teaching training. 115 There is a growing need for continuing professional development for teachers and in recent years we have invested significant resources in upskilling our teachers by the provision of a whole range of professional development courses both in school and out of school. The challenge here is the continuous upskilling of knowledge, skills and competencies of teachers in order to keep pace with developments in the knowledge society. One of the most important factors in positively influencing student outcomes is the quality of teachers and the quality of their teaching. 4. CURRICULUM DEVELOPMENT AND IMPLEMENTATION The fourth issue that I mentioned as being an important factor in quality education in Ireland is the curriculum, its development and implementation. Curriculum is developed in Ireland centrally by the National Council for Curriculum and Assessment. That is a statutory body that advises the Minister on all curriculum change. It is the Minister who approves the curriculum that is taught in all our schools. We have an integrated curriculum for all our primary schools. At second level, we have a unified curriculum for all our second-level schools with some limited options within it. The implementation of the curriculum in all schools is supported by a high level of continuous professional development for the teachers. We believe it is very important that teachers are clear on what is to be taught. So a lot of investment and time is spent on curriculum design and implementation. We are not inclined to chop and change our curriculum that frequently. Curriculum design in Ireland is conducted in a very inclusive way. The National Council for Curriculum and Assessment is a representative body made up of teacher representatives, school management representatives, employer representatives, parent representatives, the teaching profession and people appointed by the Minister. So it is a very inclusive approach to curriculum design. We regard curriculum as a key agent of quality. At primary level we phased in a revised curriculum, beginning in1999. As you will see on the right hand side of the screen the curriculum is divided into seven curriculum areas. These are further subdivided into subjects. Religious education is the responsibility of the different Church authorities. A feature of the curriculum is that it is an integrated content across the various curriculum areas as outlined. Recommended times are given to schools for each of the areas and there is also some discretionary time for schools to use in whatever areas they see fit to best implement the curriculum. The Irish primary curriculum is characterised by a number of defining features. Breath and balance, relevance, coherence and adaptability. I will expand on what these mean later if you wish. There is throughout the curriculum a strong focus on literacy and numeracy as this is regarded as central to effective learning in every area of the curriculum. The focus is on learning so a broad range of teaching approaches are recommended. 116 The curriculum at second level provides for a general and balanced education programme for all. It is worth noting that we do not have a binary system of education at second level in Ireland. There is no distinction made between a discrete academic programme on the one hand and a vocational programme on the other. Both of these are combined into the overall second level curriculum. The curriculum is divided into two main sections, the Junior Cycle for students aged 12 – 15 and the Senior Cycle for students aged 16 – 18. Within the senior cycle there is a number of options. One such programme is the Transition Year. This is a year where the curriculum is designed mainly by the schools themselves. In all other cases the curriculum is prescribed by the Department. 5. EXAMINATIONS AND ASSESSMENT The impact of the State Examinations on the quality of education at second level is significant. Students sit the Junior Certificate Examination at around 15 years of age but more importantly they sit a Leaving Certificate - their final examination at the end of Senior Cycle. This is a major high-stakes external examination that has a very high ‘currency’ in Ireland. It is regarded as a pivotal examination for students and for their progress. It is used as the common entry system for the vast majority of higher education institutions. The way the system works is that points are awarded for the six best subjects in the examination. That means that a candidate can achieve a maximum of 600 (100 x 6) points. You will see on the right hand side of the screen a sample of the points required for some third level courses. You will see that one of the highest is medicine which requires 575. But very important, from the point of view of teaching, is the number of points required to gain direct entry into primary teaching. Entry to the Bachelor of Education degree requires 460 points. 18% of students achieve 450 points or more in the Leaving Cert and 19% of thirdlevel courses require that number of points to gain entry. So those students who wish to become primary teachers, for example, come from the top 20% in the ability range of students who do the Leaving Cert examination. I think Ireland is very fortunate that teaching is so attractive to so many young people as a career. There are no official State Examination League Tables in Ireland. This is a matter of some controversy in the media from time to time. League tables of examination results are specifically excluded by the Education Act. The main arguments against league tables are that they are crude form of assessing school performance and a very limited form of measuring school achievement. They can lead to ghettoising of schools in disadvantaged areas in particular. They can also lead penalising schools that have inclusive enrolment policies. League tables can encourage an even greater emphasis on exams and a ‘teaching to the test approach’ at the expense of other valuable school activities that contribute significantly to the holistic development of students. The various extra curricular activities and efforts the schools make to give students an all round education would not get reflected in a measurement of exam league tables. 117 There are no State examinations at the end of primary schooling since the primary certificate was abolished in 1967. We do have longitudinal national surveys of English reading conducted generally every four to five years since 1972 and also longitudinal national surveys of maths are conducted every four to five years. Schools from this September will be required to administer standardised tests in English reading and maths at two points during primary education. The focus of these tests will be on the assessment for learning (to guide the students’ future learning) as well as the assessment of learning (achievements of the student at a point in time). The overall point I am making in relation to this is that the amount of testing done in the Irish schools system is not very great when compared to other countries. Ireland participates in the Programme for International Student Assessment (PISA) and the key outcomes for Ireland in 2003 are on the screen. Of the 40 participating countries, Ireland was seventh in reading literacy, sixteenth in scientific literacy and twentieth in mathematical literacy. One of the other interesting findings that I list is that less variation was found between schools in Ireland in terms of the average achievement than in most OECD countries. 6. SUPPORTS FOR SCHOOLS AND TEACHERS Finally, I want to talk briefly about support for schools and teachers. The Department of Education and Science provides a number of professional services to schools and teachers to help improve the quality of education. We have a School Development Planning Service for schools, we provide significant level of continuous professional development for teachers and we have a special programme on leadership training for principals, deputy principals and middle management in schools. These various Department of Education support services are available nationwide to assist all schools. The Inspectorate, for which I have responsibility as Chief Inspector, conducts external evaluations in schools. We conduct whole school evaluations, subject inspections where we look at how a subject is being taught and the learning experience of pupils and some thematic evaluations such as the use of ICTs in schools, literacy and so on. Inspection of schools in Ireland is now a transparent process. We have worked hard in recent years in reforming, restructuring and refocusing the inspectorate and in revising all our inspection processes. This involved, of course, consultation with the education partners. We published Looking at our School evaluation criteria and Guides to Whole School Evaluation, Codes of Practice and Appeals Procedures. All of this makes the process of inspection very transparent and schools and teachers know exactly what is involved. The dominant philosophy of our inspection system today is formative where we work with schools and teachers as co-professionals. It is important for me to emphasise to you the purposes of inspection. It is about assuring quality and providing an external perspective on the work of schools. We affirm good practice, we constructively identify areas for improvement, we facilitate school self-evaluation and we like to feel that the recommendations we make provide a school with a platform for development. In essence, it is about quality assurance rather than quality control. 118 There can be negative associations with the concept of inspection and this was also the experience in the past in Ireland and elsewhere when inspection was seen as a rigorous form of control inspection. In the past rigorous inspection was associated with harsh treatment, dominance and even oppression. It suggested the control of others for its own sake. But high quality evaluation must have rigorous procedures, that is effective co-ordination and planning, meaningful engagement with the stakeholders, the criteria used should be valid and recommendations made by inspectors in their reports should be traceable to the original evidence found in the school. Just briefly to give you a sense of what a whole school evaluation is about the process looks at and reports on five main areas, school management, school planning, the provision of the curriculum, the learning and teaching in the classrooms and the supports provided for students. All of these areas are interrelated and play a part in the quality of education provided. The process then involves meetings with the management and staff of the school, with parents and with the pupils at second level. The presentation of findings and recommendations for development are provided in a detailed report. School inspection reports are now published on the Department’s website. Almost 1,000 reports have been published in the last year. CONCLUSION So that has been a bit of a whirlwind tour of Irish education at primary and second level. I will conclude now by just mentioning some key challenges going forward for us in Ireland. Firstly, education has an important contribution to make in helping to maintain Ireland’s international competitiveness. We have challenges in the areas of mathematics, science and technology. We also have the challenge going forward in embedding ICTs in a meaningful way into teaching and learning in our schools and classrooms. The second overarching challenge for our education system is helping to improve social cohesion. This includes the successful integration of students with special education needs into schools as well as responding to the educational needs of newcomers so that they become fully integrated into Irish society. In addition we continue to address the issue of social inclusion through a range of measures including through the programme ‘Delivering Equality of Opportunity’ (DEIS) in schools. I thank you for your attention. I thank the interpreters for their work in communicating my message to you and I now look forward to the discussion that follows. 119 COMPARTILHANDO EXPERIÊNCIAS, MELHORANDO A APRENDIZAGEM Maria Auxiliadora Seabra Rezende* 1. PARÂMETROS SOBRE QUALIDADE DA EDUCAÇÃO NO BRASIL O questionamento que paira entre os estudiosos da educação no Brasil tem girado em torno de indagações sobre o que fazer para melhorar a qualidade da educação. Para refletir sobre esse tema faz-se necessário, primeiro, definir o que é qualidade para a educação no Brasil. O Sistema Nacional de Avaliação (Saeb) avalia a qualidade educacional por intermédio da proficiência dos educandos, em conformidade com o nível de ensino, nas disciplinas de língua portuguesa e matemática. O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), que está sendo implantado pelo Ministério da Educação, consiste num conjunto de metas a serem alcançadas a curto, médio e longo prazo, com foco na melhoria da qualidade da educação. Três mecanismos marcantes merecem destaques no PDE. O primeiro é o Ideb, considerando o seu alcance como ferramenta de monitoramento; o segundo é o foco, por meio das metas que foram estabelecidas pelo Plano (Tabela 1 e 2); e o terceiro, o financiamento de ações estratégicas para o alcance das metas. O PDE definiu um novo indicador para medir a qualidade da educação: o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), uma combinação de informações de desempenho em exames padronizados (Prova Brasil ou Saeb) – obtido pelos estudantes ao final das etapas de ensino (4ª e 8ª séries ou 5° e 9° anos, do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio) – com informações sobre rendimento escolar (aprovação) e a taxa/média de permanência do educando na escola. * Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Goiás, (UFG), especialista em Educação e mestre em Educação Escolar Brasileira, também pela UFG; doutoranda em Gestão Educacional pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Foi diretora de Educação/Seduc-TO; implantou o Campus da Universidade do Tocantins (Unitins), na cidade de Arraias; assessora acadêmica do Centro Universitário de Porto Nacional (TO) e assessora técnica da pró-reitoria acadêmica da Unitins. Atualmente, secretária de estado da Educação e Cultura do Tocantins e presidente do Conselho Nacional de Secretários da Educação (Consed). 121 Esse novo indicador sinaliza que só haverá qualidade se houver desenvolvimento educacional, ou seja, uma educação inclusiva e que todos os educandos alcancem o sucesso escolar. Estabelecidas as metas e os instrumentos de avaliação, a pergunta a ser formulada é: o que fazer para melhorar a qualidade do ensino, proporcionando aprendizagem com inclusão social? O Ideb aponta caminhos. E se estes forem considerados, as políticas educacionais devem ser pautadas por uma boa gestão pedagógica que contemple o desenvolvimento das habilidades e competências, consideradas nos descritores do Saeb, associadas à melhoria das taxas de aproveitamento, por intermédio da redução da reprovação e do abandono escolar. Considerando as dimensões geográficas e a diversidade do Brasil, os obstáculos desses caminhos são inúmeros, com maior ou menor grau de dificuldades, dependendo da localidade. Porém o principal desafio é o mesmo em todo o país: a permanência com sucesso do educando na escola. Todavia, com novas preocupações: a inclusão social com eqûidade. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – Inep, em 2007, o Ideb permitirá identificar as escolas e/ou redes de ensino com baixa proficiência em todo o país. Esse diagnóstico norteará o foco das políticas educacionais, dos governos federal, estaduais e municipais. TABELA 1 – Índice de desenvolvimento da educação em 2005 e projeções para o Brasil até 2021 Fonte: Saeb 2005 e Censo Escolar 2005 e 2006. 122 TABELA 2 – Índice de desenvolvimento da educação em 2005 e projeções para o Tocantins até 2021. Fonte: Saeb 2005 e Censo Escolar 2005 e 2006. 2. BREVE HISTÓRICO SOBRE A EDUCAÇÃO TOCANTINENSE Para melhor compreensão das experiências gestadas pelos educadores do Estado do Tocantins, apresentamos um breve relato dos aspectos demográficos e sociais do estado e de nossas ações, com foco na gestão compartilhada. 2.1. TERRA DE TODOS Localizado no centro do país, o Tocantins possui uma extensão territorial de 277.620.014 km 2 e um contingente populacional de aproximadamente 1.305.728 habitantes.28 Sua população atual é formada por pessoas oriundas de diversas regiões do Brasil, que se somaram à antiga população do norte goiano, composta em sua origem pela miscigenação de indígenas e remanescentes de quilombos. Hoje se apresenta como um estado pluriétnico e multicultural, que justifica a frase cunhada em tupi guarani, Co Yvy Ore Retama (essa terra é nossa), no brasão do estado. A implantação, no final da década de 80, possibilitou a migração de pessoas de todo o país, que vieram em busca de trabalho e melhoria de qualidade de vida, sendo a maioria com baixa escolaridade. Por outro lado, a população nativa do norte goiano vivia desde o final do século XVI em total abandono, privada de direitos básicos, como a educação. Não se estranha, nesse sentido, que no final do século XX 31,42% da população fosse analfabeta, segundo dados do IBGE.29 Diante desse cenário étnico e sociocultural, da escassez de recursos financeiros e de infra-estrutura básica, o estado priorizou, inicialmente, os investimentos na infra-estrutura. Posteriormente, paralela aos investimentos na área social, veio a ampliação da oferta do ensino fundamental e, gradativamente, do ensino médio, seguida da formação inicial e continuada dos professores. Hoje, o foco está voltado para a melhoria da qualidade da educação básica. 28 29 IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – PNAD. Brasília: IBGE, 2005. IBGE. PNAD; 1991 a 1999. 123 Atualmente o estado apresenta um quantitativo de matrículas equivalente a 446.517 alunos, na educação básica, distribuídos em 2.119 escolas: sendo 241.342 em 540 estaduais: 172.833 em 1.422 municipais: 30.840 em 155 escolas privadas e 1.502 em duas escolas federais30. A taxa de escolarização31 da população tocantinense no período de 2004/2005, das pessoas de cinco ou seis anos era de 65,3%; de 7 a 14 anos, 96,7%; de 15 a 17anos, 84,9%; de 18 a 24 anos 38,9%; e de 25 anos ou mais de 10,2%; e a taxa de analfabetismo era de 17,60%.32 Os investimentos da educação no período de 2002 a 2006 (Tabela 3), totalizaram R$ 1.897.467.703,67 (um bilhão, oitocentos e noventa e sete milhões, quatrocentos e sessenta e sete mil, setecentos e três reais, sessenta e sete centavos): destes 94,14% foram oriundos do Tesouro Estadual, correspondendo a R$ 1.786.339.357,00 (um bilhão, setecentos e oitenta e seis milhões, trezentos e trinta e nove mil e trezentos e cinqüenta e sete reais). TABELA 3 – Evolução dos investimentos em educação no período de 2002 a 2006 Tocantins O foco da política educacional do Tocantins é a gestão compartilhada, por considerar que uma boa gestão é fator primordial para o sucesso de qualquer organização e, quando participativa, tem mais chances de acerto. Partindo dessa premissa, a Secretaria da Educação e Cultura do Tocantins – Seduc-TO priorizou o fortalecimento da gestão participativa para o enfrentamento dos desafios, comuns à maioria dos estados brasileiros, porém, com um diferencial, que no Tocantins tudo estava começando. 30 31 32 Brasil. Ministério da Educação. Instituto de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo escolar. Brasília: MEC/ INEP, 2006. Taxa de escolarização das pessoas de 5 anos ou mais de idade, por grupos de idade, segundo as Unidades da Federação2004-2005 - Pesquisa por Amostragem realizada pelo IBGE, 2005. IBGE. Censo demográfico de 2000. Disponível em: <www.ibge.gov.br>. Brasil. Ministério da Educação. Inep. Censo escolar. Brasília: MEC/INEP, 2000. 124 2.2. GESTÃO DO FUTURO COM AS DECISÕES NO PRESENTE No início do novo milênio os educadores tocantinenses foram convidados a repensar as políticas educacionais, com ênfase na melhoria da qualidade da educação. Inicialmente foi realizada uma avaliação em todas as escolas do ensino fundamental e médio da zona urbana, onde se concentrava o maior número das unidades escolares, utilizando-se da mesma base do Saeb, nas disciplinas de língua portuguesa e matemática, em parceria com a Fundação Cesgranrio e o Inep. Nessa avaliação pretendeu-se identificar as reais causas do fracasso escolar bem como construir os indicadores educacionais que permitissem melhor compreensão dos fatores que influenciavam no desempenho dos alunos. O universo avaliado contemplou os alunos de 4ª a 8ª séries do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio, totalizando 417 escolas e 1.605 turmas. Foram avaliados 39.639 alunos, o que representou cerca de 80% de comparecimento em relação ao previsto. Esses alunos realizaram em dezembro de 2001 testes de múltipla escolha nas áreas de conhecimento de língua portuguesa e matemática. Além dos testes, foram também aplicados instrumentos de coleta de dados para caracterização socioeconômica, perfil e prática da gestão escolar dos diretores e ainda condições de estrutura física das escolas. Pretendeu-se, com esses instrumentos, sobretudo, obter informações que permitissem identificar o nível de aprendizagem. A partir do resultado foi possível definir as políticas públicas para a educação, principalmente as voltadas para a formação continuada dos professores. Considerando que o Fundescola oferecia apoio técnico às secretarias de educação, das regiões Norte e Nordeste do país, com a finalidade de promover a elevação da capacidade institucional dos sistemas educacionais, por meio da elaboração do Planejamento Estratégico da Secretaria (PES), a Seduc-TO aderiu a essa metodologia de planejamento. A partir dessa tomada de decisão, foi criado o Grupo de Sistematização, instância consultiva e deliberativa que tem como atribuição planejar, executar, acompanhar, apoiar e avaliar a gestão da Secretaria. Para realizar a análise situacional, definir a missão, os valores, os objetivos e as metas do Plano Estratégico da Secretaria (PES), o Grupo ouviu os servidores das escolas e da sede da Seduc. O PES foi elaborado com o foco na visão estratégica e no plano de suporte estratégico. O primeiro define os valores a serem alcançados no futuro, a missão define a razão de ser da Secretaria, e os objetivos estratégicos são os grandes alvos a serem alcançados a curto, médio e longo prazo. A primeira etapa do PES foi pactuada para o período de 2003 a 2007, com revisões anuais. No plano de suporte estratégico foi definido, a partir dos objetivos, um conjunto de metas e planos de ação que visam transformar a visão estratégica em realidade. 125 A estrutura operacional do PES é constituída pelo Grupo de Sistematização, composto pelas lideranças formais da Secretaria de Educação e Cultura; pelo Coordenador do PES, indicado pelo Secretário de Educação; pelos líderes de objetivos e gerentes dos Planos de Ação que são indicados pelo grupo de sistematização. Os objetivos do PES são: melhorar o desempenho do Sistema Estadual de Ensino; promover a profissionalização, a responsabilização e valorização dos profissionais da educação; reestruturar, modernizar e consolidar a gestão; e implantar programa permanente de avaliação. 2.2.1. Promoção da melhoria do desempenho do Sistema Estadual de Ensino Dentre as ações executadas para a melhoria do desempenho do Sistema Estadual de Ensino, no período de 2001 a 2006, destacam-se a reorganização curricular da educação básica, com a elaboração das Propostas Curriculares do Ensino Fundamental e Médio, a implementação dos Programas da Formação Continuada dos professores e gestores educacionais, Correção de Fluxo e de Combate ao Abandono Escolar. 2.2.1.1. Programa de Formação Continuada para a melhoria do desempenho dos professores da Educação Básica No início do ano 2000, a Seduc aderiu aos Parâmetros em Ação – Programa de Desenvolvimento Profissional Continuado – do Ministério da Educação, em parceria com a Fundação Universidade do Tocantins – Unitins. O objetivo era estimular o desenvolvimento profissional dos professores e especialistas em educação num espaço de aprendizagens coletivas e de incentivo à prática e partilha de experiências, por intermédio do estudo dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) documento encaminhado pelo MEC a partir de 1996, mas que, até então, não era utilizado de forma efetiva pelos professores. Inicialmente, participaram do estudo dos PCNs, 6.932 professores da educação infantil, ensino fundamental e EJA do 1º e 2º segmentos e 258 coordenadores pedagógicos. Em 2002, por meio de uma parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação – Undime-TO, a Seduc ampliou o Programa dos PCNs do ensino fundamental e educação de jovens e adultos para os 139 municípios tocantinenses. Foram atendidos 8.936 professores e 313 coordenadores pedagógicos, durante aquele ano. No mesmo ano iniciou também, o processo de elaboração da Proposta Curricular da EJA e do Ensino Fundamental, com a participação dos professores, tendo como referência principal os Parâmetros Curriculares Nacionais. No ano de 2003, considerando os resultados da Avaliação acima mencionada, a Seduc, instituiu o Programa de Formação Continuada para os Professores do Ensino Fundamental, em parceria com a Fundação Cesgranrio, com foco nos conteúdos de língua 126 portuguesa e matemática, de 4ª e 8ª séries do ensino fundamental, tendo em vista que os alunos apresentavam maior quantidade de erros nas avaliações em questões cujos conteúdos os professores demonstravam dificuldades em ensinar. Em 2004 o Programa foi ampliado para as 3ª, 5ª, 6ª e 7ª séries do ensino fundamental e em 2005 estendeu-se para o ensino médio, tendo como referência a Proposta Curricular do Ensino Fundamental, o livro didático e a construção da Proposta Curricular do Ensino Médio. Os encontros foram sistematizados para ocorrerem três vezes ao ano, com os consultores da Cesgranrio e coordenadores de Grupos das Diretorias Regionais de Ensino (DREs), em Palmas, capital. Posteriormente, foram realizados os estudos com os professores em conformidade com as datas estabelecidas no calendário escolar, a partir de 2004, contemplando 16 dias (incluindo dois de planejamento), totalizando 128 horas de estudos presenciais. Naquele momento, foram instituídas as avaliações formativas, elaboradas pela Cesgranrio, que foram respondidas pelos alunos com a finalidade de avaliar o desempenho dos educandos. Foram aplicadas após os professores trabalharem, em sala de aula, os conteúdos que receberam na formação continuada. Vale lembrar que no período de 2002 a 2006 a Seduc implantou diferentes projetospilotos, dentre eles o Programa de Gestão da Aprendizagem Escolar (Gestar) de autoria do Fundescola, para 125 professores de 1ª a 4ª série do ensino fundamental, também com foco voltado para as disciplinas apontadas como críticas: matemática e língua portuguesa. No mesmo período foi também implantado em sete escolas do município de Palmas o Programa Praler – apoio à leitura e escrita, do Ministério da Educação, experiência-piloto para 50 professores de 1ª a 4ª séries do ensino fundamental, dois orientadores, 12 coordenadores pedagógicos e dois auxiliares de biblioteca. A partir de 2007, o Gestar foi ampliado para os professores do 6º ao 9º ano, do ensino fundamental, com foco nas disciplinas mencionadas, anteriormente. A proposta do Gestar contempla a formação continuada em serviço para formadores e professores, desenvolvida por meio de estudos individuais e coletivos, utilizando materiais de aprendizagens autoinstrucionais (cadernos de teoria e prática), oficinas presenciais e acompanhamento pedagógico de situações didáticas, apoiadas nos pressupostos da língua materna e na natureza dos conteúdos matemáticos, com foco em metodologias, planejamento, monitoramento e avaliação da aprendizagem. As equipes de formadores existentes em todas as diretorias regionais de ensino têm como atribuições: • coordenar todas as atividades de execução, avaliação e implementação que se fizerem necessárias; • envolver os gestores e coordenadores pedagógicos no processo de formação dos professores, capacitar e avaliar o desenvolvimento dos professores cursistas; 127 • orientar e motivar os professores para a leitura individual e coletiva dos cadernos de teoria e prática, antes dos encontros presenciais; • promover os plantões pedagógicos que consistem em um atendimento individual e coletivo com o objetivo de sanar as dificuldades específicas dos professores. Esses plantões serão realizados por ocasião dos encontros presenciais, na escola e/ou a distância. O trabalho é orientado pelas seguintes diretrizes: • trabalhar o programa de maneira a suprir as reais necessidades da Rede de Ensino do Estado do Tocantins; • valorizar a articulação entre a Formação Continuada em Serviço e o Projeto Político Pedagógico da escola; • estimular a reflexão, desenvolver a autonomia e facilitar a dinâmica de autoformação do professor; • considerar os saberes dos professores e os valores da comunidade; • compreender a experimentação e inovação da prática pedagógica como aspecto relevante à formação continuada do professor; • respeitar o tempo necessário para a promoção de mudanças; • trabalhar as especificidades das disciplinas numa perspectiva interdisciplinar; • orientar os professores na elaboração de itens de avaliação que contemplem as propostas de contextualização e interdisciplinaridade. Participam do Gestar 1.258 professores de língua portuguesa e matemática, pertencentes a todas as escolas estaduais que oferecem a segunda fase do ensino fundamental. 2.2.1.2. Programas de melhoria do desempenho dos gestores educacionais A partir de 2002, a Seduc firmou parceria com o Conselho Nacional dos Secretários de Educação e Ministério da Educação (Consed/MEC) e, posteriormente, com a Fundação Lemann com a finalidade de promover a melhoria do desempenho dos gestores educacionais. Com essa parceria, promove-se a capacitação a distância e em encontros presenciais através do Progestão. O curso tem por objetivo a melhoria da prática da gestão escolar, principalmente nos aspectos pedagógicos da sala de aula. Cursam o Progestão, gestores escolares, professores, secretários de escola, coordenadores de vídeo, de biblioteca e coordenadores pedagógicos das escolas estaduais e municipais. Foram capacitados 4.526 professores, sendo que 2.090 deles já fizeram a complementação equivalente à especialização. A parceria com a Fundação Lemann, instituída a partir de 2005, visa formar, em exercício e a distância (on line), gestores das escolas públicas estaduais, tendo como objetivo a melhoria do desempenho acadêmico do aluno. Foram capacitados 123 gestores escolares. 128 Os dois cursos contam com tutores para o suporte técnico-pedagógico e situações de aprendizagem auto-instrucionais, atividades individuais e coletivas, ministradas através de encontros presenciais. 2.2.1.3. Processo Seletivo de Diretores A Seduc, a partir de 2001, adotou processo seletivo dos diretores com a finalidade de melhorar o perfil dos gestores educacionais. Esse processo vem sendo aprimorado constantemente com aplicação de entrevistas, provas de conhecimentos teóricos e práticos (resoluções de problemas). 2.2.1.4. Programa de correção de fluxo e de aceleração No que se refere à correção de fluxo e à melhoria do desempenho dos educandos e professores do 1º ao 5º ano do ensino fundamental, a Seduc implantou em parceria com o Instituto Ayrton Senna os programas Se Liga, com o objetivo de corrigir as deficiências da alfabetização dos educandos, e o Acelera, com a finalidade de reduzir a distorção idade-série. Durante a execução desses programas, observou-se que seria necessário promover ações preventivas com o objetivo de evitar novas incidências. Assim, foi implantada a tecnologia do Programa Circuito Campeão, também, em parceria com o Instituto, que visa monitorar a aprendizagem dos educandos, matriculados do 1º ao 5º do ensino fundamental. Acredita-se que os expressivos resultados alcançados sejam frutos da sistemática de acompanhamento e avaliação realizada pelas equipes de monitoramento localizadas na sede da Seduc e em todas as diretorias regionais de ensino. Uma vez por semana, um técnico acompanha in loco as turmas onde foram implantados os programas Se Liga e Acelera, permanecendo durante quatro horas em cada sala de aula. O objetivo é apoiar e observar a atuação do professor, identificar dificuldades e problemas que surgirem, fazendo as inter venções pedagógicas necessárias. Também realizam reuniões pedagógicas, quinzenais com os professores e coordenadores pedagógicos. O Programa Se Liga possibilitou um índice de aproveitamento, na alfabetização dos alunos do 1º ao 5º ano, de 96,8% em 2005 e 98,6% em 2006. Já no programa Acelera Brasil, o índice dos alunos acelerados do 6º ao 9º ano, foi de 96,7% em 2005 e 82,9% em 2006. O programa Acelera contribuiu com a redução da taxa de distorção idade-série. No ensino fundamental, de 1ª a 4ª série, foi de 31,97% em 2002 para 20,04% em 2006; e de 5ª a 8ª série, de 49,58% em 2002, para 32,41% em 2006; e, no ensino médio de 67,93% em 2002, para 53,66% em 2006, representando uma redução de 37,31%, 34,63% e 21%, respectivamente, nas taxas de distorção idade-série na educação básica. (Seduc/PES/2006). No período de 2004 a 2006, os dois Programas, atenderam 7.071 alunos e contaram com a parceria de 76 municípios. 129 GRÁFICO 1 – Redução da taxa de distorção idade-série no ensino fundamental e médio – Rede Estadual / TO – 2002 a 2006 No que se refere aos resultados do Programa Circuito Campeão, no período de 2005 a 2006, foram atendidos somente os 2ºs e 3ºs anos, do ensino fundamental, conforme tabela 4 a seguir. A partir de 2007 houve a expansão do atendimento para todas as turmas de 1º ao 5º ano do ensino fundamental. TABELA 4 – Comparativo dos resultados alcançados pelo Programa Circuito Campeão, nos 2os e 3os anos do ensino fundamental, no período de 2005 a 2006 – Tocantins 130 2.2.1.5. Programa de redução do abandono escolar – Um gesto de percentual de alunos que não lêem Dentre as ações de redução do abandono escolar destaca-se a Rede de Proteção do Direito à Educação, composta pela Secretaria da Educação e Cultura em parceria com o Ministério Público Estadual, Conselhos Tutelares e de Direito, Tribunal de Justiça e prefeituras municipais conforme propõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, envolvendo o poder executivo, o judiciário, e a sociedade civil, para garantir o acesso e a permanência de crianças e adolescentes na escola33. Essa rede está materializada por meio do Programa Evasão Escolar: Nota Zero com o objetivo de aumentar a freqüência e o rendimento escolar nas redes de ensino público dos municípios tocantinenses, contribuindo para reduzir as taxas de abandono, evasão e distorção idade/série bem como ampliar a consciência política da sociedade para com a educação. A gestão da rede é conduzida por um grupo executivo composto por representantes das diversas instituições. O Programa está no seu quarto ano de implantação em todo o estado. Assim, a comunidade escolar está conseguindo dar nota zero à evasão escolar e, conseqüentemente, à distorção idade-série. A Rede estimula a comunidade escolar a desenvolver o sentimento de solidariedade, ao zelar pela garantia do direito das crianças e dos adolescentes à educação. Esse cuidado começa com o líder da sala de aula, que tem como atribuição a vigilância pela permanência com sucesso do colega na escola. Mas essa obrigação é partilhada com os professores caso encontre dificuldades. Quando a escola detecta que o aluno não está comparecendo às aulas, reúne a equipe de trabalho para discutir o caso. Na maioria das vezes, um grupo formado por líderes de classe, gestores escolares, orientadores educacionais, coordenadores pedagógicos, apoio escolar, professores e voluntários vão à casa do aluno faltoso para conversar com a sua família e saber os motivos pelos quais ele não está indo à escola. Se essa iniciativa não for o suficiente, a escola passa o caso para o Conselho Tutelar, que procura os pais ou responsáveis para resolver o problema. Se o Conselho Tutelar sentir dificuldades para solucionar o caso, aciona o Ministério Público Estadual. Todo esse processo é acompanhado pela escola através da Ficha de Comunicação do Aluno Infreqüente – Ficai e pela Secretaria da Educação e Cultura por meio de relatórios e instrumentos de acompanhamento e avaliação encaminhados pela Diretoria Regional de Ensino. Os procedimentos utilizados pelas unidades escolares estão basicamente relacionados a visitas domiciliares permanentes pela equipe escolar, projetos de intervenções das disciplinas críticas, acolhimento personalizado para os alunos com dificuldades educacionais em horários alternativos, acompanhamento sistemático do processo ensino e aprendizagem dos educandos. 33 Marcos Legais: Constituição Federal (arts. 206, I; 208, § 3º); ECA - Lei 8.069/90 (arts. 53, I; 56, II; 101, III; 249); LDB - Lei 9.394/96 (arts. 3º, I; art. 5º, III; art. 12, VIII; art 24, VI); Lei 10.287/01 (altera art. 12, VIII, da LDB); PNE - Lei 10.172/01 (2.3, metas 3 e 10). 131 Ao longo dos quatro anos de atuação dessa Rede, por intermédio do Programa Evasão Escolar, observa-se pela Tabela 5 que cerca de 80% dos alunos retornam à escola após um gesto de solidariedade da comunidade escolar: uma visita à residência do aluno. TABELA 5 – Casos identificados e solucionados por ano – 2001 a 2006 por intermédio do Programa Evasão Escolar: Nota Zero – (Tocantins) Nota 1: os dados de 2001 a 2002 referem-se somente à capital Palmas. Nota 2: Segundo dados do Sistema PES - Evasão Escolar 2006, casos solucionados, o Ministério Público se destacou nas seguintes diretorias regionais de ensino: Dianópolis (Dr. Paulo Afonso Mendes), Porto Nacional (Dr. Delveaux Vieira Prudente Júnior), Tocantinópolis (Dr. Guilherme Gozeling), Paraíso (Dra. Maria Cotinha Bezerra Pereira) e Arraias (Dr. João Alves de Araújo). Fonte: Seduc/Superintendência de Educação/Coordenadoria de Fortalecimento da Escola/2006 a) Surgem novas demandas para o enfrentamento do abandono escolar Para conhecer o perfil dos alunos que abandonaram o ensino médio e EJA, em 2002, a Seduc firmou parceria com a Secretaria da Juventude e Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas – UNIRG/FAFICH, de Gurupi, no sentido de pesquisar as possíveis causas do abandono escolar, no nível e modalidades de ensino acima mencionados. Na pesquisa, constatou-se que o trabalho é o principal motivo interveniente do abandono escolar, seguido do compromisso no sustento familiar e gravidez na adolescência. Observou-se ainda, segundo a Pesquisa de Saúde Materno-Infantil do Estado do Tocantins/2003 – Pesmito, que houve aumento da gravidez na adolescência, passando a zona urbana de 36,1% para 53,3% e zona rural de 47% para 59%, em relação à primeira Pesmito realizada em 1996, evidenciando uma ascendência percentual significativa. Esses indicadores contribuem com o aumento das taxas de abandono, evasão escolar, distorção idade/série, dentre outros desdobramentos que reduzem a chance da promoção qualitativa pessoal e social dos jovens, bem como conduzem para a distorção dos valores morais, éticos, e da percepção de cidadania como algo possível, dentre outros prejudiciais à auto-estima. A Secretaria da Educação e Cultura, em parceria com a Secretaria da Saúde, Ministério da Saúde e UNESCO, já haviam implantado um projeto-piloto, intitulado Escola 2000, em 2002, com a finalidade de reduzir a vulnerabilidade de crianças e jovens em relação às DST/Aids e Uso Indevido de Drogas, por meio da educação para a vida, em duas unidades escolares, sendo uma localizada em Palmas e a outra em Porto Nacional. 132 Essa experiência mostrou que as referidas temáticas merecem atenção especial na formação continuada dos profissionais da educação. Diante disso, a Seduc realizou uma sondagem, em 2003, por meio da disponibilização da metodologia do Projeto Escola 2000, para todas as unidades escolares de 5ª a 8ª séries e ensino médio da Rede Estadual de Ensino. Cento e seis UEs manifestaram interesse, requerendo a implantação de projetos com este foco. A partir desses indicadores, em 2004, foi implantado o Projeto Sexualidade & Drogas: o que eu preciso saber? em parceria com a Secretaria da Saúde, Conselho Estadual Antidrogas e Superintendência Regional da Polícia Federal, que, preocupados com essa situação de vulnerabilidade das crianças e adolescentes tocantinenses aos fatores de risco, articularam entre si estratégias visando concretizar, dentro de suas políticas, intervenções para que tivéssemos, a médio prazo, adultos mais qualificados pessoal e socialmente, através de ações contínuas junto às escolas. A finalidade do Projeto é de assessorar as unidades escolares da Rede Estadual de Ensino na elaboração, execução e avaliação de projetos sobre orientação sexual e prevenção do uso indevido de drogas, por intermédio da capacitação da equipe gestora das unidades escolares bem como dos técnicos das diretorias regionais de ensino, que acompanham os projetos apresentados pelas unidades escolares. No período de 2004 a 2006 foram capacitados 1.293 pessoas envolvidas no Projeto, entre educadores e lideranças estudantis. Para melhor compreender as necessidades das escolas, a Seduc, conjuntamente com os parceiros, realizou uma pesquisa com a finalidade de replanejar as suas ações. Essa pesquisa está em fase de consolidação. Observa-se, na Tabela 6, que houve uma redução de 16,21% na taxa de gravidez na adolescência, após a implantação desse projeto, no período de 2003 a 2006. TABELA 6 – Índices de gravidez na adolescência no período de 1998 a 2006, por faixa etária * Dados atualizados até 8 de janeiro de 2007. Fonte: Sistema Nacional de Nascidos Vivos (Sinasc). 133 Quanto ao impacto dessas ações na redução das taxas de abandono, segundo dados do Planejamento Estratégico da Secretaria – PES, no período de 2002 a 2006, a redução do abandono no ensino fundamental, de 1ª a 4ª série (7,89%, em 2002, para 1,27%, em 2006) e de 5ª a 8ª série (10,44%, em 2002, para 4,99%, em 2006) alcançou 83,90% e 52,20%, respectivamente. Na educação de jovens e adultos alcançou-se no 1º segmento uma redução de 36,51% para 21,96 representando uma variação de 39,85%. No 2º segmento, a variação foi de 23,38% para 22,16 % reduzindo o índice em 5,22 pontos percentuais. Quanto à taxa no ensino médio houve uma variação de 19,01% para 15,91% representando uma redução na taxa de 16,31%. GRÁFICO 2 – Redução da Taxa de Abandono Escolar, na Educação Básica Rede Estadual – TO (2002 a 2006) 2.2. PROMOÇÃO DA PROFISSIONALIZAÇÃO, RESPONSABILIZAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO No que se refere ao objetivo de “promover a profissionalização, responsabilização e valorização dos profissionais da educação”, foi implantado o Plano de Cargos, Carreiras e Subsídios bem como Estratégias de Formação Continuada desses profissionais, que são oferecidas pela Secretaria de Educação e Cultura e/ou Secretaria de Administração, que mantém cursos permanentes de formação continuada aos servidores do Estado do Tocantins. O PES possibilitou diversos estudos para melhorar o salário dos servidores da educação. A tabela 7 mostra que os percentuais dos aumentos salariais, em todos os cargos foram acima do índice da inflação, (IGPM, medido pela Fundação Getúlio Vargas), no período em que ocorreram os aumentos salariais, de janeiro de 2003 a dezembro de 2006. 134 TABELA 7 – Comparativos dos percentuais de reajustes salariais com o índice do IGPM, no período de 2003 a 2006 – Tocantins *IGPM NO PERÍODO DE JAN/03 a DEZ/06 – 29,05% Fonte: Fundação Getúlio Vargas. A folha de pagamento representa atualmente cerca 75,66% do orçamento da educação. No que se refere à responsabilização e certificação de professores o Grupo de Sistematização ainda não avançou sobre essa temática, entretanto está em pauta na reformulação do PES para os próximos anos. 2.3. REESTRUTURAÇÃO, MODERNIZAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DA GESTÃO Dentre as ações do objetivo de reestruturar, modernizar e consolidar a gestão destacase a descentralização de recursos financeiros para a manutenção das escolas bem como para a execução de obras até R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais), por intermédio do Programa Escola Comunitária de Gestão Compartilhada. 2.3.1. Modelo de Gestão implantado nas Escolas da Rede Pública Estadual O Programa Escola Autônoma de Gestão Compartilhada tem por missão democratizar a gestão educacional34, visando dar agilidade e autonomia para a elaboração e implantação do projeto político pedagógico, em conformidade com a realidade e as necessidades de cada unidade escolar do estado. Através desse Programa o governo estadual repassa os recursos financeiros, mensalmente, às unidades escolares, por meio das Associações de Apoio à Escola, as quais são constituídas por membros da comunidade escolar e local, em conformidade com o número de alunos, localização (nos municípios sede das DREs e nos municípios fora das DREs), para custear as despesas com: 34 Em conformidade com o Artigo 14 da Lei de Diretrizes da Educação (LDB). 135 a) Manutenção; b) Ações pedagógicas, previstas no Projeto Político Pedagógico; c) Reformas e ampliações de prédios escolares no valor de até R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais). Para cobrir os custos com a manutenção das escolas estaduais e conveniadas, o Programa repassa os recursos financeiros em conformidade com o número de alunos distribuídos em três referências de cálculos, de forma cumulativa, sendo: 1. Referência 1 – até 300 alunos multiplica-se por R$ 11,00; 2. Referência 2 – de 301 a 1.000 alunos multiplica-se por R$ 6,50; 3. Referência 3 – acima de 1.000 alunos multiplica-se por R$ 4,50. Exemplos: Uma escola com 1.030 alunos recebe: 300 alunos x 11,00 = 3.300,00 700 alunos x 6,50 = 4.550,00 30 alunos X 4,50 = 135,00 Total a receber = R$ 7.985,00 por mês Além desses recursos também são repassados alguns acréscimos às unidades escolares que possuem: a) quadras poliesportivas: R$ 170,00 (cento e setenta reais); b) laboratórios de informática: R$ 17,50 (dezessete reais, cinqüenta centavos) por máquina; c) auxílio financeiro para custear as despesas de deslocamento dos diretores de unidades escolares que residem fora dos municípios-sede das diretorias regionais de ensino, em conformidade com o número de alunos; d) turmas de tempo integral. São beneficiadas com um acréscimo de 50% sobre o valor correspondente ao número de alunos de tempo integral. As escolas agrícolas recebem o valor per capita de R$ 105,00 (cento e cinco reais) por aluno matriculado mais os acréscimos acima mencionados, se estiver contemplada nos critérios estabelecidos. No que se refere ao financiamento das ações pedagógicas previstas no Projeto Político Pedagógico até 2006, os recursos eram repassados em uma única parcela às unidades executoras, com base no número de alunos. A partir de 2007, estão aptas a receber essa complementação as unidades escolares que apresentarem um Projeto de Aprendizagem com o propósito de fortalecer a prática pedagógica, de acordo com as demandas anuais e das metas estabelecidas no Planejamento Estratégico da Secretaria (PES) e Projeto Político Pedagógico da escola. 136 Para o biênio 2007/2008, o foco é direcionado para as disciplinas críticas, Língua Portuguesa, da Área de Códigos e Linguagens, e Matemática, da Área de Ciências da Natureza. O valor máximo do Projeto é correspondente ao número de alunos constantes no módulo de lotação dos servidores da escola, revisado no mês de agosto do ano anterior, multiplicado pelo valor per capita de R$ 15,05. A transferência dos recursos fica condicionada à aprovação do Projeto de Aprendizagem da escola pela Diretoria Regional de Ensino. O repasse é realizado automaticamente, sem a necessidade de convênios. O monitoramento e avaliação dos projetos de aprendizagem das escolas serão realizados pela equipe das diretorias regionais de ensino, por meio de avaliação in loco, análise de desempenho acadêmico e outros, tendo como foco as metas do PES, e, quando possível, fazendo cruzamento com as avaliações externas. A Secretaria da Educação e Cultura fará o acompanhamento e avaliação do desempenho acadêmico das diretorias regionais de ensino com o objetivo de subsidiálas no aperfeiçoamento do processo. O Programa Escola Autônoma de Gestão Compartilhada completa, nesse exercício de 2007, dez anos. Dentre os resultados alcançados, observa-se que a escola tocantinense hoje está mais comprometida com os resultados educacionais. Acredita-se que a partir do momento em que a escola assume a sua autonomia pedagógica, administrativa e financeira para implantar e implementar o seu projeto político pedagógico, passa a ser também responsável direta pelos resultados por ela alcançados. TABELA 8 – Comparativo do nº de escolas atendidas e valores repassados pelo Programa Escola Autônoma de Gestão Compartilhada, no período de 2002 a 2006 – TO 137 2.4. IMPLANTAÇÃO DE PROGRAMAS PERMANENTES DE AVALIAÇÃO Quanto ao objetivo de “implantar programas permanentes de avaliação”, ressalta-se o Sistema de Avaliação do Estado do Tocantins – Saeto, que realizou em 2001, a primeira avaliação censitária, conforme mencionado anteriormente. 2.4.1. Sistema de Monitoramento e Avaliação A partir da experiência com a metodologia desenvolvida pelo Instituto Ayrton Senna, no acompanhamento e avaliação das turmas de 1º ao 5º ano do ensino fundamental, observou-se que as que receberam acompanhamento obtiveram melhores resultados. Partindo dessa lógica, as equipes pedagógicas da Seduc, na sede e nas diretorias regionais de ensino, estão implementando, desde o início de 2007, uma sistemática de acompanhamento para toda a Rede Estadual de Ensino, o que vem sendo feito por meio de monitoramento a distância e in loco.35 O acompanhamento a distância ocorre por intermédio da análise dos dados do Planejamento Estratégico da Seduc (PES), bimestralmente, e das avaliações externas, com a finalidade de identificar quais são as escolas que apresentam baixo desempenho e altos índices de reprovação, abandono e distorção idade-série bem como as que apresentam baixo desempenho nas disciplinas críticas, tendo como parâmetro as escalas do Saeb/ Prova Brasil/2005. A partir desse diagnóstico as equipes fazem as intervenções necessárias junto às diretorias regionais de ensino e/ou unidade escolar, se julgar necessário. 2.4.2. Sistema de Acompanhamento e Avaliação do PES A Secretaria informatizou a coleta de dados para o monitoramento das taxas de aproveitamento: aprovação, reprovação e abandono, e de distorção idade-série. Bimestralmente, esses dados são coletados e avaliados, por escola, município, regional e estadual, pelo grupo gestor. Quando necessário, propõem intervenção para atingir as metas estabelecidas no Plano Estratégico. Esses dados são consolidados e analisados, anualmente, conforme tabela anexa. Além desse Sistema de Monitoramento o grupo gestor dispõe ainda de outros instrumentos para o acompanhamento e avaliação das metas do PES. 2.5. OS IMPACTOS NA APRENDIZAGEM No período de 2001 a 2005, as escolas da rede estadual do Tocantins, nas avaliações qualitativas, por amostragem, obtiveram um crescimento na média de proficiência em matemática, nas 4as séries do ensino fundamental, de 159,9 (2001) para 169,7 (2005); e em língua portuguesa, de 145,4 (2001) para 161,2 (2005) representando uma variação na média de 6,13% e 10,87%, respectivamente.36 35 36 Para essas atribuições foram criadas, no novo organograma da Seduc, as Coordenadorias de Avaliação e Acompanhamento do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Publicação Série Histórica MEC/SAEB/2005 – período de 1995 a 2005. 138 Os resultados dos 3ºs anos do ensino médio, da rede pública, relativos aos anos de 2001 e 2003, não foram divulgados na publicação da Série Histórica do MEC/SAEB/ 2005. Entretanto, se comparadas às médias de proficiência de língua portuguesa de 234,07 e matemática 244,57, constantes na publicação acima mencionada, referente ao ano 2005, com as de 2003, divulgadas na publicação anterior Saeb/2003, (língua portuguesa, 228,4 e matemática, 239,8), observa-se que houve crescimento. Outro aspecto apresentado, referente às avaliações dos 3ºs anos do ensino médio, nessa publicação, a ser ressaltado é fato de a rede de ensino tocantinense ter apresentado melhorias na proficiência em língua portuguesa, situação ocorrida apenas em três estados da federação, e em matemática, ter se colocado entre os cinco que apresentaram melhorias. Na avaliação censitária, Prova Brasil, realizada pelo MEC, em 2005, nas 4ªs séries do ensino fundamental, as escolas estaduais atingiram a média de proficiência em matemática de 177,33 e em língua portuguesa de 173,58, alcançando a primeira colocação em matemática e em língua portuguesa, entre os estados das regiões Norte e Nordeste. No ranking nacional, o Tocantins ocupa o 13º em língua portuguesa e 14º em matemática (Prova Brasil 2005). Nas avaliações da Prova Brasil (2005), das 8ªs séries do ensino fundamental, a Rede Estadual do Tocantins também obteve resultados superiores aos da média de desempenho da Região Norte, nas disciplinas de língua portuguesa e matemática. 2.6. REVISÃO DO PLANO Os resultados apresentam impactos significativos no processo ensino aprendizagem, o que nos leva a concluir que esse modelo de gestão tem sido eficaz. Atualmente, a Secretaria da Educação, por intermédio do Grupo Gestor, está realizando a revisão do Plano Estratégico para o período de 2007 a 2009. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS As experiências do Estado do Tocantins, que ressaltamos aqui, exemplificam que trabalhar com planejamento, estabelecendo metas reais, é um significativo caminho para se atingir a educação com qualidade que a sociedade brasileira almeja. Certamente que ainda temos muito por fazer diante dos desafios que se fazem presentes para os tocantinenses, no âmbito da educação. Contudo acreditamos que, por meio da continuidade nas políticas de formação continuada dos ser vidores da educação, em particular, as que se destinam aos professores, e do monitoramento permanente da aprendizagem, por meio de instrumentos quantitativos e qualitativos, continuaremos avançando. 139 Nesse caminhar, a perspectiva de gestão participativa continuará sendo um dos principais vetores na direção da melhoria do ensino e aprendizagem. Os investimentos e as parcerias na capacitação da equipe gestora, bem como a articulação com a comunidade, deverão pautar cada vez mais o modelo que adotamos. Portanto, é com foco, planejamento e sustentado no tripé formação, monitoramento e gestão que o Estado do Tocantins “constrói seus caminhos na direção do sucesso escolar”. 140 AVALIAÇÃO: UMA PROPOSTA EDUCACIONAL Maria Nilene Badeca da Costa* Na busca incessante de qualidade no ensino da rede municipal de Campo Grande-MS, perante as diversas dificuldades apresentadas no âmbito institucional referentes ao baixo desempenho dos alunos, à evasão e repetência escolar, buscou-se por meio de uma experiência avaliativa, detectar as dificuldades encontradas pelos alunos para posterior alteração desse quadro, em que a aquisição do domínio de habilidades e competências fosse a prioridade na rede municipal de ensino. Por acreditar na avaliação como um instrumento para a melhoria do processo de ensino e de aprendizagem, iniciou-se essa prática avaliativa no ano de 1997, estendendo-se até o ano de 2004, conforme Quadro 1, com os alunos das 1as séries do ensino fundamental, cujos processos de avaliação foram elaborados e realizados pela Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande-MS. QUADRO 1 – Contexto Educacional da Rede Municipal de Ensino de Campo Grande-MS Fonte: Departamento de Planejamento e Avaliação – Semed. Nesse percurso, alguns desafios se apresentaram para que a avaliação fosse, realmente, efetivada. Ante esses desafios quatro grandes compromissos foram estabelecidos: 1 – compromisso com o aluno; 2 – compromisso com a família; 3 – compromisso com os profissionais da educação; 4 – compromisso com a escola. Para garantir aprendizagem com conhecimentos mínimos em cada componente curricular, foram implantados mecanismos de acompanhamento do rendimento escolar de forma a corrigir, durante o ano letivo, as deficiências do aluno, tendo em vista que a Semed tinha por * Secretária de Educação do Estado do Mato Grosso do Sul. 141 missão melhorar o desempenho da rede municipal de ensino fortalecendo a escola e estimulando a participação da comunidade. Situação educacional da rede municipal de ensino de Campo Grande-MS, segundo os dados obtidos pelo IBGE 2006, e de acordo com a população: • População de Mato Grosso do Sul ................. 2.971.981 habitantes. • População de Campo Grande ............................. 765.792 habitantes. • População de 0 a 14 anos...................................... 188.792 habitantes RETROSPECTIVA DO PROCESSO AVALIATIVO Partindo do propósito de ampliar, melhorar e reestruturar a avaliação educacional, essas ações foram dimensionadas e superpostas de acordo com as reais necessidades. Portanto, elas ocorreram na seguinte simultaneidade: • 2000 – Criação do Sistema Municipal de Avaliação Educacional; • 2001 – Alteração na estrutura da Semed, criando o Departamento de Planejamento e Avaliação; • 2002 – Adequação da Seqüência Didática à realidade da Reme, elaborando as Diretrizes Curriculares; • 2002 – 1ª avaliação das 1as séries (mês de novembro). Cabe, aqui, registrar que a Seqüência Didática, documento elaborado pelos técnicos da Semed, era composto dos eixos temáticos, conteúdos e habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos. Esse documento contemplava todas as áreas do conhecimento e serviam de norteador para os professores desenvolverem sua prática docente em sala de aula, dado que tinham por referência os PCNs. Outras ações concomitantes ao processo avaliativo foram desenvolvidas para estruturação do sistema, tais como: 1 – capacitação dos professores regentes para elaboração de itens; 2 – capacitação de técnicos (professores) da Semed em avaliação; 3 – início da estruturação do banco de itens em parceria com o Inep/MEC para aprimoramento técnico. Esse processo decorreu do entendimento de que a avaliação educacional é um conjunto de ações e procedimentos para levantar informações que orientem a tomada de decisões na área educacional, aliado à idéia de que esse processo avaliativo consiste em uma apreciação com base em informações coletadas por meio de procedimentos de aferição e mensuração. Dentro dessa abordagem, considera-se que a avaliação é, sem dúvida, um instrumento que possibilita um panorama geral onde se possam cruzar os dados daí resultantes. Por outro lado, pôde-se dar transparência aos processos e resultados das atividades educacionais e oferecer às escolas informações sobre seus indicadores, para aprofundar seu projeto pedagógico e as condições de gestão autônoma da unidade escolar. 142 Outras prioridades da avaliação foram consideradas: subsidiar as políticas de gestão da Reme; focalizar a atuação nos aspectos críticos da aprendizagem, como ainda, modernizar as estruturas de gestão do sistema, centrando sua atenção na melhoria da qualidade do ensino no desempenho acadêmico. FLUXO DA AVALIAÇÃO NA REME A Semed, por meio do Departamento de Planejamento e Avaliação, solicita à escola informações sobre as séries que serão avaliadas, os conteúdos ministrados pelos professores, e as habilidades e competências desenvolvidas nos alunos. Posteriormente, consolida as informações selecionando os descritores com maior incidência e os que são imprescindíveis aos alunos ao final de cada série avaliada, devolvendo os resultados da rede para as escolas. Há uma seleção do número de itens de Minas Gerais, do Inep e da própria Semed, que estrutura a prova, que em seguida é aplicada pela instituição parceira, a qual corrige e elabora informações por meio de relatório geral e por escola. Devido à participação e interesse apresentados pelas escolas com relação ao desempenho dos alunos, elaborou-se um caderno de apoio ao professor com linguagem pedagógica, orientando-os como trabalhar os conteúdos necessários para desenvolvimento das habilidades não apreendidas pelos alunos. Esse elo pedagógico complementava o processo de avaliação da Reme. Os dados resultantes da avaliação agora estavam pedagogizados. Com isso espera-se obter os seguintes resultados: • melhoria do nível de aprendizagem dos alunos da 1ª série; • desenvolvimento da cultura e avaliação da Reme; • estruturação do banco de itens da Reme; • desenvolvimento da competência técnica dos profissionais envolvidos na avaliação; • reorganização da prática pedagógica com a utilização dos dados e informações gerados; • oferecimento à escola de um retrato de seu desempenho, evidenciando os conteúdos apreendidos pelos alunos; • conhecimento e domínio das habilidades e competências estabelecidas para a série avaliada; • utilização de dados e informações nas tomadas de decisões pela rede e escola. Os componentes curriculares avaliados foram: língua portuguesa com produção de texto e matemática. A média exigida na rede municipal de ensino: 6,0. O instrumento avaliativo tem a seguinte estrutura: eixos temáticos; 13 a 15 itens de múltipla escolha; 3 itens discursivos em língua portuguesa avaliam a leitura e a escrita; produção de texto. Entretanto a elaboração de itens obedece à matriz de referência do componente curricular e às especificidades técnicas repassadas nas capacitações oferecidas pelos técnicos da Semed. 143 Para melhor compreensão dos resultados obtidos na avaliação, a exposição de dados fazse pertinente para uma leitura complementar, apresentada no Quadro 2, abaixo. QUADRO 2 – Resultado da avaliação nas 1as séries – 2002 Fonte: Relatório das Avaliações – Estatística Semed. As informações obtidas no Quadro 2 subsidiaram tomadas de decisões em vários segmentos, as quais foram de grande relevância, uma vez que tanto os resultados das avaliações dos alunos quanto os dados relativos ao trabalho e à formação dos professores são referências basilares para os formadores e gestores dos sistemas de ensino na medida em que permitem situar a própria experiência no quadro geral do país. Nessa óptica, é um tipo de avaliação indispensável, porém um grande desafio, pois, avaliar um sistema, não é apenas considerar um conjunto amplo de indicadores, dispor de critérios precisos, reunir a maior quantidade possível de dados relevantes ou fazer a somatória de análises dos dados coletados: é acima de tudo, interpretar também as relações entre eles, hierarquizá-los, colocá-los a serviço de adequados encaminhamentos de indicadores (BRASIL, 1999). Disso decorre a possibilidade de fato diagnosticar, aferir o valor dos resultados alcançados, constituir-se em referência, permitir mudanças necessárias, como se pôde detectar nos seguintes segmentos: 1. Na Secretaria Municipal de Educação • adequação do programa de ensino; • adoção de normas que auxiliam a escola na definição de seus critérios de avaliação; • intervenção gerencial em escolas com problemas; • identificação de turmas e alunos com problemas na aprendizagem; • cruzamento das informações com resultado do final de ano letivo com os resultados da avaliação; • identificação de professores sem perfil de alfabetizador, nas três avaliações (2002, 2003 e 2004); • desenvolvimento da competência técnica das equipes envolvidas. 144 2. • • • Na escola utilização dos resultados para “ensalamento” das turmas; adoção de medidas corretivas no processo de ensino e de aprendizagem; identificação das dificuldades dos professores e proposição de medidas saneadoras. 3. Na sala de aula • identificação de alunos que não dominam habilidades, competências e conteúdos exigidos no final da 1ª série; • identificação de causas e fatores internos e externos que interferem na aprendizagem dos alunos; • indicadores para elaboração do planejamento escolar. É oportuno registrar que Campo Grande-MS é pioneira em 2002, na avaliação da 1ª série do ensino fundamental na perspectiva de habilidades e competências. Disso resultou o desdobramento da avaliação da 1ª série, como se mostra no Quadro 3. QUADRO 3 – Resultado da avaliação dos alunos das 2as séries em 2003 e 2004 Fonte: Relatório das Avaliações – Estatística Semed. A leitura desse quadro permite observar um melhor índice em 2004 com relação ao ano de 2003. Cumpre dizer, ainda, que os trabalhos desenvolvidos nas turmas de 2as séries que apresentaram baixo desempenho tiveram como ponto de partida a capacitação dos professores que atuam na série; o assessoramento pela equipe pedagógica da Semed (específica) com reuniões quinzenais; o material de apoio pedagógico (apostilas). As ações realizadas por meio de intervenções nas 1as e 2as séries no ano de 2002 e 2003 possibilitaram uma elevação de pontos, como mostra o Quadro 4, com o resultado da Prova Brasil – 2005, para os alunos da 4ª série, que em 2002 estavam lotados na 1ª série, e em 2003 cursavam a 2ª série. QUADRO 4 – Resultado da Prova Brasil – 2005 (4ª série) Fonte: Departamento de Planejamento e Avaliação (Semed). 145 Os dados expostos no quadro acima comprovam que a avaliação como instrumento educativo é imprescindível, uma vez que possibilita diagnosticar questões relevantes, aferir resultados alcançados considerando os objetivos propostos e identificar mudanças de percurso necessárias. Para tanto, sabe-se que inovar, reformular, refazer no processo avaliativo é preciso. Entretanto o sucesso dessa empreitada depende da vontade de todos os educadores na busca de alternativas e possibilidades de escolha de um novo fazer educativo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Referenciais para formação de professores. Brasília: MEC/SEF, 1999. _____. _____. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Prova Brasil: avaliação do rendimento escolar, 2005. Brasília: MEC/Inep, 2005. MATO GROSSO DO SUL. Departamento de Planejamento e Avaliação SEMED: relatórios da avaliação externa., s.d. 146 ALIANZAS ESTRATÉGICAS PARA EL DESARROLLO EDUCATIVO LOCAL: EL CASO DE LA RED DE ESCUELAS DE CAMPANA Laura Fumagalli* PRESENTACIÓN Esta ponencia, ha sido elaborada como contribución al Seminario Internacional “CONSTRUINDO CAMINHOS PARA O SUCESSO ESCOLAR” organizado por MEC/ INEP/UNESCO/CONSED/UNDIME. En la misma se presentan los supuestos que han orientado el diseño y la puesta en acción de una estrategia de desarrollo educativo de base local. El caso que ha dado origen al desarrollo de esta estrategia es el proyecto de la “Red de Escuelas de la ciudad de Campana” que ha sido diseñado y gestionado con la asistencia técnica del IIPE UNESCO Sede Regional Buenos Aires y de la Oficina Internacional de Educación de la UNESCO (OIE). Esta presentación está organizada en torno a una serie de cuestiones que, desde nuestra perspectiva, resultan elementos claves para pensar el diseño de políticas de desarrollo educativo y curricular en el plano local que tengan efectos positivos en los procesos de aprendizaje de los alumnos y en el logro equidad educativa. 1. ¿QUÉ ES EL PROYECTO DE LA RED DE ESCUELAS? El proyecto de la Red de Escuelas es un proyecto de desarrollo curricular situado en el plano local que se propuso mejorar las oportunidades de educación de los niños, niñas y jóvenes que asistían a las escuelas de educación primaria y secundaría básica37 de la ciudad de Campana38. * Especialista en las áreas de formación continua y currículo. Licenciada en Ciencias de la Educación, por la Universidad de Buenos Aires, con maestría en Educación y Sociedad en la FLACSO de Argentina. Entre 1987 y 1993 trabajó en el área de Educación de la FLACSO y también en el área de formación continua de la Secretaría de Educación del Gobierno de la Ciudad de Buenos Aires. Entre 1993 y 1999 trabajó en el Ministerio de Educación de la Nación en el área de currículo y en 2000 en el mismo Ministerio se desempeñó como Coordinadora Nacional de la Red Nacional de Formación Docente Continua. Desde el año 2000 es consultora del IIPE UNESCO donde coordina diversos proyectos de asistencia técnica y de formación continua. 37 La educación primaria es de una duración de 6 años y corresponde al grupo etario de 6 a 11 años. La secundaria básica es de una duración de 6 años y corresponde al grupo erario de 12 a 14 años. Primaria y secundaría básica son equivalentes “Ensino Fundamental” de Brasil. 38 La ciudad de Campana está situada a orillas del Río Paraná en la provincia de Buenos Aires, República Argentina, a unos 70 kilómetros de la Capital Federal Es sede de numerosas empresas entre las que se destacan TenarisSiderca del grupo Techint, Esso Petrolera Argentina y Minetti. Es una ciudad de unos 100.000 habitantes. Para más datos entrar a www.campana.gov.ar (página web Municipalidad de Campana). 147 Se comenzó a gestar en el año 1999, en el marco del diseño del Plan de Desarrollo Estratégico de la Ciudad de Campana39 en cuya elaboración participaron la Intendencia y diferentes organizaciones de la sociedad civil local. En el año 2000, integrantes de la “comisión de educación” del Plan de Desarrollo Estratégico de Campana presentaron ante las autoridades del gobierno educativo de la provincia de Buenos Aires 40 la propuesta del programa educativo del citado plan y acordaron desarrollar acciones para la consecución de los objetivos allí propuestos. Para ello, solicitaron la asistencia técnica y académica del IIPE UNESCO Sede Regional Buenos Aires. Este Instituto, en cooperación con la Oficina Internacional de Educación de la UNESCO, desarrolló la propuesta de proyecto de trabajo que diera origen a la Red de Escuelas. 41 El proyecto inició sus acciones en Agosto de 2000 con la firma de un convenio de cooperación interinstitucional 42 en el que se formalizó una alianza estratégica entre organismos de gobierno, organizaciones de la sociedad civil local y escuelas. Estas instituciones se unieron tras el propósito de mejorar la educación en el nivel local. 2. ¿QUÉ CARACTERIZA LA ESTRATEGIA EN RED? El proyecto de la Red de Escuelas de Campana se propuso construir una estrategia reticular para la gestión del cambio educativo en el plano local. La estrategia es reticular o en red porque se consolidó y desarrolló en torno a un proceso clave de trabajo: la cooperación interinstitucional. La red es entonces, en primera instancia, una trama de instituciones que se proponen realizar un trabajo cooperativo La cooperación se establece entre: a) Los diversos niveles de gestión del sistema educativo local (la escuela), los organismos de gobierno y las organizaciones de la sociedad civil (esquema 1). 39 40 41 42 La Intendencia es el órgano de gobierno equivalente a la Prefeitura en Brasil. El nivel de gobierno provincial en Argentina equivale al nivel de gobierno estadual en Brasil. El proyecto fue diseñado en su etapa inicial por la Doctora Cecilia Braslavsky quien en ese momento integraba el staff del IIPE UNESCO Sede regional Buenos Aires. El convenio fue firmado entre la Dirección General de Cultura y Educación de la provincia de Buenos Aires – organismo de Gobierno de la Educación-, la Municipalidad de Campana -organismo de gobierno local – la empresa SIDERCA – sector privado del empresariado local – la fundación Fundes Argentina ONG integrante del Plan de Desarrollo Estratégico- y el la Oficina Internacional de Educación (OIE). 148 ESQUEMA 1 – Relaciones de cooperación que configuran la red b) Las instituciones del sistema educativo local que cooperan entre si (esquema 2) ESQUEMA 2 – Relaciones de cooperación que configuran la red 3. POR QUÉ COOPERAR ENTRE ESCUELA, ORGANISMOS DE GOBIERNO Y ORGANIZACIONES DE LA SOCIEDAD CIVIL LOCAL? La promoción del cambio educativo supone una dinámica que está íntimamente asociada a lógica de toma de decisiones en gestión y política educativa. En este sentido, la estrategia en red propone una dinámica para el cambio educativo que intenta contribuir a la superación del debate aún inconcluso entre las dinámicas top-down y bottom-up43; pues supone una lógica de toma de decisiones que implica relaciones de cooperación horizontales entre escuelas, organismos de gobierno y organizaciones de la sociedad civil. 43 Los sistemas educativos nacionales y las escuelas modernas se desarrollaron sobre la base de dos modelos de gestión y política educativa: el “comunal” y el “estatal”. El modelo “comunal”, que predominó en el mundo anglosajón, supuso una concepción de cambio educativo de tipo “bottom up”, de abajo hacia arriba. Las escuelas tomaban una enorme cantidad de decisiones referidas a qué y a cómo enseñar, tenían una vinculación muy fuerte con la sociedad civil y una gran capacidad para responder a sus demandas. El modelo estatal, que predominó en Latinoamérica, supuso una concepción de cambio educativo de tipo “top down”, de arriba hacia abajo. Primó en este modelo una lógica piramidal en la toma de decisiones, las escuelas debían cumplir las directivas del Estado. Desde nuestra perspectiva, el debate inconcluso acerca de las fortalezas y de las debilidades de las dinámicas “top down” y “bottom up” está indicando que es necesario construir una nueva dinámica para la gestión del cambio en la educación escolar que resulte una alternativa superadora de ambos modelos (BRASLAVSKY; FUMAGALLI, 2005). 149 Esas relaciones están destinadas principalmente a fortalecer la relación entre escuela y comunidad mediante la construcción de un sentido compartido para la educación en el plano local. La cooperación interinstitucional en el plano local resulta imprescindible para: a) Lograr que la responsabilidad de la educación de las jóvenes generaciones sea compartida en el conjunto de la sociedad. Proponer la responsabilidad compartida en el conjunto de la sociedad no significa quitar la responsabilidad de la educación de las jóvenes generaciones al sistema educativo público o plantear su reemplazo por otras alternativas de educación a cargo de diversas instituciones u organizaciones de la sociedad civil. El sistema educativo público es el espacio que posibilita el acceso a saberes de la cultura elaborada cuya transmisión no pueden garantizar los grupos sociales de pertenencia y como dimensión ineludible de los procesos formativos desarrollados en un ámbito de socialización extra familiar. Cuando se alude a la responsabilidad compartida en el conjunto de la sociedad se asume y se propone el desafío de diseñar nuevas formas de trabajo que complementen y fortalezcan la alianza entre sistema educativo público y aquellas organizaciones de la sociedad civil que estén comprometidas y puedan contribuir a la educación de los niños, las niñas y los jóvenes. b) Lograr equidad en las oportunidades de aprendizaje de niños y jóvenes. En particular en contextos de gran desigualdad y de exclusión social, las condiciones en las que los niños, niñas y jóvenes llegan a las escuelas - protección familiar, alimentación, salud- resultan factores que disminuyen las oportunidades de aprendizaje. La articulación de sistema educativo público con la acción de otras instituciones de la sociedad civil en el plano local posibilita un abordaje intersectorial que resulta necesario para el logro de una mayor equidad en las oportunidades de aprendizaje de niños y jóvenes. c) Aprender a vivir juntos Articular la acción del sistema educativo con otras instituciones de la sociedad civil puede contribuir a reconstruir un sentido compartido de la educación desde múltiples perspectivas y diferentes puntos de vista. La cooperación implica sumar esfuerzos y complementar acciones, pero también supone dar lugar al debate democrático, al pluralismo de ideas y a la aceptación de la diversidad y de las diferencias. En este sentido, el trabajo cooperativo que estamos proponiendo resulta una estrategia que contribuye a aprender a vivir juntos. 4. ¿POR QUÉ COOPERAR ENTRE ESCUELAS? Sabido es que la mejora de la educación no se promueve solo desde la introducción de cambios en el curriculum prescripto y que requiere además que esa mejora se ponga en evidencia en los procesos de desarrollo cunicular que llevan adelante los equipos docentes en las escuelas. 150 Pero las escuelas por lo general trabajan aisladas unas de otras y esta situación hace gran parte del saber pedagógico que los docentes construyen no se comparta ni se divulgue entre colegas. El aislamiento tampoco permite superar los aspectos débiles que cada escuela presenta pues la propia mirada institucional es sesgada y no suele alcanzar para superar un problema que se encuentra relacionado con esa mirada propia. Por tanto mejorar los procesos de enseñanza y de aprendizaje, resulta necesario que los equipos docentes de diferentes escuelas se junten para llevar adelante un trabajo de desarrollo curricular cooperativo que divulgar las buenas prácticas y tomar conciencia de aquellas que deben ser mejoradas. El modelo reticular para la gestión del cambio educativo se propuso por tanto contribuir a la instalación de un proceso de desarrollo curricular que implicó procesos de trabajo pedagógico cooperativo entre escuelas en el plano local. Esos procesos de trabajo pedagógico cooperativo entre escuelas posibilitan: a) Identificar los problemas educativos locales y diseñar propuestas para abordarlos El trabajo entre escuelas privadas y públicas, entre escuelas que atienden a poblaciones marginales y otras que atienden a sectores medios o altos de la población puede contribuir a que los docentes identifiquen y asuman conjuntamente los problemas de inequidad educativa en la localidad. La posibilidad de definir esos problemas es un paso necesario para poder abordarlos desde múltiples perspectivas y para hallar soluciones alternativas que impacten en todas las escuelas. b) Detectar y divulgar buenas prácticas de enseñanza e identificar los aspectos que deben ser mejorados Diferentes factores pueden contribuir al mejoramiento de la calidad de la educación escolar, pero uno de ellos es clave: la introducción de mejoras en los procesos de enseñanza44 que se llevan a cabo en las salas de clase. Esos procesos presentan fortalezas que pueden ser potenciados pero también debilidades que necesitan ser modificadas mediante en un proceso de trabajo conjunto que impacte en la calidad de la educación local. La interacción entre equipos docentes de diferentes escuelas posibilita la toma de conciencia de esas fortalezas y debilidades y la hacerlo contribuye también a la construcción de un cuerpo de saber pedagógico común que recupere las buenas prácticas pero compense sus aspectos débiles. Sobre la base de estos supuestos el proyecto de la Red de escuelas se planteó dos objetivos generales de trabajo 1. Contribuir al mejoramiento de la calidad y la equidad educativa en el nivel local 2. Lograr mejoras en los proceso de enseñanza, en los proceso de aprendizaje de los alumnos y en la convivencia escolar. 44 Ver innovación curricular (ANGULO RASCO; BLANCO, 1994). Para mejora (BOLÍVAR, 1999). 151 En pocas palabras que todos los niños, niñas y jóvenes de la localidad aprendan más, aprendan mejor y lo hagan en un clima de respeto y alegría. El trabajo se focalizó en escuelas de educación general básica, en los ciclos de enseñanza primaria y secundaria básica equivalen a Ensino Fundamental en Brasil. (Esquema 3) ESQUEMA 3 – Foco de trabajo En cuanto al proceso de planeamiento de las acciones, el proyecto se desarrolló en tres fases (Esquema 4) ESQUEMA 4 – Fases de planeamiento y acciones principales 152 5. ¿CÓMO SE DESPLIEGA LA COOPERACIÓN? EL CICLO DE TRABAJO COOPERATIVO La cooperación se desplegó a través de una serie de fases de trabajo que, de modo cíclico y en su conjunto, estuvieron destinadas a dejar capacidad instalada en los actores locales para llevar a cabo procesos de planeamiento estratégico del desarrollo curricular. (Esquema 5) ESQUEMA 5 – El ciclo de trabajo cooperativo En la fase diagnóstica actores locales en alianza con organismos de gobierno y actores del sistema educativo definen prioridades de desarrollo curricular local. Se delimitan problemas, se analizan resultados de aprendizaje y se justifican las prioridades de desarrollo curricular. En la fase de diseño: se establecen propósitos, con los docentes, los directivos e inspectores se seleccionan las prioridades de capacitación. Se diseña el plan de trabajo y las actividades principales. En la fase de desarrollo se realizan acciones de capacitación de las que participan los equipos docentes y los directivos de diferentes escuelas y en las que se producen materiales de desarrollo curricular. Los materiales de desarrollo cunicular son módulos producidos de modo colectivo por los docentes en el contexto de la capacitación por este motivo son firmados por todos los docentes que participaron de la formación. Los profesores a cargo de la capacitación son los encargados de coordinar el proceso de elaboración de dichos materiales y de hacer el trabajo final de redacción. En la fase de divulgación se distribuyen los materiales producidos en el contexto de la capacitación. Todas las escuelas reciben los materiales que se produjeron y cada uno de los docentes que participó de la elaboración de esos materiales recibe un juego propio. 153 Con los materiales, ya en las escuelas, se instalan procesos sistemáticos de capacitación entre pares, generalmente coordinados por los equipos directivos. En esta fase también se divulgan las acciones y productos del proyecto en la comunidad mediante artículos que se publican en la prensa local. Fase de rediseño de acciones: se propone la continuidad del proyecto sobre la base de la evaluación de resultados Se vuelve a la etapa de diseño. 6. ¿CÓMO SE CAPACITAN LOS DOCENTES Y DIRECTIVOS EN LA RED? : PRINCIPIOS ORGANIZADORES DE LA ESTRATEGIA DE FORMACIÓN CONTINUA La estrategia de capacitación que se ha diseñado en este proyecto está al servicio del desarrollo curricular, se trata entonces de una capacitación que intenta fortalecer las capacidades y saberes que los docentes ponen en juego cuando llevan a cabo los procesos de desarrollo curricular. En este sentido, en el transcurso de las fases del ciclo del trabajo cooperativo, la estrategia de capacitación acompaña y promueve un proceso de desarrollo curricular. • En las etapas de diagnóstico y diseño se definen las prioridades del desarrollo curricular y se organiza un proceso de capacitación docente y directiva que atiende a dichas prioridades. • En la etapa de desarrollo de las accionasen la capacitación se producen, de modo colectivo, los materiales de desarrollo curricular que luego pasarán a formar parte del corpus pedagógico de la Red. • En la etapa de divulgación se promueven procesos de capacitación entre pares sostenidos en el uso de los materiales de desarrollo curricular. El propósito explícito de capacitar a docentes y directivos para el desarrollo curricular supone asumir que los procesos espontáneos de trabajo pedagógico cooperativo que se dan entre docentes en algunas escuelas no son condición suficiente para lograr mejoras en los procesos de enseñanza y de aprendizaje. Es decir que no basta con que cooperen entre si sino que hay que apoyar esa cooperación desde la mirada crítica y los aportes que puede realizar el proceso de capacitación. En contextos de discontinuidad de la políticas públicas para el sector docente como el Latinoamericano, se ha dado un proceso de desprofesionalización del cuerpo docente, y resultado de ello es probable que haya disminuido también la posibilidad de que tanto docentes como directivos, de modo autónomo y sin apoyo externo, logren producir procesos de desarrollo curricular que impliquen mejoras en los procesos de enseñanza y aprendizaje. 154 Por este motivo, en el proyecto se optó por desarrollar un proceso de formación continua que abordara de modo directo a las capacidades que constituyen el “saber profesional docente” 45 requerido para el desarrollo curricular. La estrategia, por lo tanto, puso su foco en el “saber hacer” de los docentes y los directivos y tuvo una vinculación directa con las prácticas de la enseñanza, El principio organizador del trabajo fue el de acción-reflexión-acción Este principio organiza el trabajo de capacitación en torno al análisis critico de las propias prácticas de enseñanza. El principio se desarrolla en un proceso de trabajo que puede representarse esquemáticamente en el siguiente esquema ESQUEMA 6 – Principio organizador de la estrategia de capacitación 45 Diversos autores (CARR; KEMMIS, 1988; SCHULMAN, 1989; BRASLAVSKY; BIRGIN, 1992; PORLÁN, 1998; SCHÖN, 1992) han caracterizado al saber profesional docente desde diferentes perspectivas. Sin embargo, en esas diversidad de caracterizaciones es posible identificar la referencia a tres dimensiones del saber profesional: una dimensión académica o proposicional (saber), una dimensión práctica del saber profesional (saber hacer) y una dimensión actitudinal (querer hacer). 155 Se ha optó por este principio organizador de la capacitación por diversas razones: • En primer lugar porque en el proceso de producción y de análisis crítico de las estrategias de enseñanza los docentes pueden tomar conciencia de los saberes que ponen en acción al tomar decisiones en la enseñanza. Existe en las prácticas de enseñanza una racionalidad para la toma de decisiones que se en sustenta en la capacidad de articular distinto tipo de saberes en la acción. Esa racionalidad se revela en un “saber práctico”46 que “pone en acto” saberes académicos y actitudes. Más allá del grado de conciencia discursiva que los docentes posean sobre el saber que fundamentan su toma de decisiones, para mejorar ese proceso de toma de decisiones es imprescindible tomar conciencia de los saberes implícitos en la acción. Esa toma de conciencia requiere de un trabajo de reflexión sobre la propia acción. • En segundo lugar porque la producción de estrategias de enseñanza en el marco de la capacitación contribuye a elaborar un saber pedagógico común para el desarrollo curricular en el plano local. Los materiales de enseñanza que resultan de los procesos de formación continua pueden constituirse en referentes para las prácticas de otros colegas y no solo para los que han participado de su elaboración pues son producciones hechas por unos docentes y directivos para otros docentes y directivos. Elaboradas con la supervisión y orientación de los capacitadores, todas estas producciones conforman un corpus pedagógico de la Red. Por lo tanto, su divulgación resulta un requisito indispensable tanto para ampliar el alcance de las acciones como para fortalecer los procesos de capacitación entre pares. 7. LOS RESULTADOS Destinado a un universo de 37 establecimientos de EGB de la localidad, el proyecto de la Red de Escuelas contó con una amplia y continuada presencia de escuelas y directivos y docentes, aún teniendo en cuenta fue de participación voluntaria. A lo largo de los 5 años en que desarrolló sus actividades el proyecto logro la siguiente cobertura • 81% de las escuelas de la localidad participaron del proyecto. Tanto de gestión publica como de gestión privada.47 46 47 El saber práctico de los profesores ha sido definido por diversos autores entre otros (SCHÖN, 1992; 1998) habla de conocimiento tácito, (GIMENO SACRISTÁN, 1988) los define como esquemas prácticos de acción, Es un saber que se expresa en ciertos principios de actuación. Teniendo en cuenta que la participación fue voluntaria - tanto para las escuelas como para los docentes- estos porcentajes indican una lata valoración del proyecto por parte de sus destinatarios. 156 • 80% de los directores de la localidad participaron del proyecto • 79,5% de los docentes de la población objetivo fueron capacitados (720 personas) • 140000 alumnos fueron involucrados en las actividades de sala de aula En cuanto a las producciones de materiales de desarrollo curricular se produjeron: • 4 folletos sobre identidad local. Y fueron distribuidos 2000 ejemplares en escuelas • 16 módulos de desarrollo curricular. Y fueron distribuidos 9000 ejemplares en las escuelas. Desde el punto de vista presupuestario el proyecto fue sostenible pues contó con un presupuesto total de aproximadamente 200.000 dólares americanos distribuidos en 5 años de implementación de acciones. En términos de impacto en los procesos de aprendizaje de los alumnos48, se han dado los siguientes resultados. • El 100% de las escuelas mejoraron los resultados obtenidos por los alumnos en las pruebas de matemática y lengua. • Se redujo la brecha entre las medias más bajas y las más altas a los largo de los diferentes operativos (lo que indica una mayor equidad en términos de distribución y de apropiación de saberes) Pero quizás uno de los logros más importante del proyecto es que ha promovido una forma de trabajo basada en la cooperación interinstitucional que permanece aún cuando el proyecto como tal ha finalizado sus acciones. En la actualidad en la Agencia de Desarrollo Local, se están diseñando nuevos proyectos de desarrollo educativo en Red que se han inspirado en la forma de trabajo que instalara el proyecto de la Red de Escuelas. A MODO DE CIERRE Tres ideas fuerza pueden ser presentadas como corolario de este breve trabajo. 1. El desarrollo educativo local constituye una excelente oportunidad para poder articular esfuerzos, ideas, recursos en la identificación, la atención y la resolución de problemas educativos propios de la localidad. 2. Las alianzas entre diferentes actores locales, establecidas con el propósito de superar problemas educativos que les atañen a todos es también una excelente oportunidad para aprender a vivir juntos, en un clima de respeto y aceptación de la diversidad de opiniones y puntos de vista. 48 Se analizó la evolución de los resultados obtenidos por las escuelas de la localidad, en los operativos realizados en los años 2000, 2002 y 2004 por el Sistema Evaluación de la Calidad Educativa de la provincia de Buenos Aires. 157 3. La multiperspectividad presente en el trabajo en red, enriquece además la elaboración de ideas y la producción de soluciones alternativas a problemas educativos, que eran imposibles de pensar desde la limitación de los propios puntos de vista. Pero más allá de sus fortalezas el trabajo en red en el plano local, no es un trabajo sencillo de resolver pues podría decirse que resulta casi “contracultural” en una sociedad en la que los lazos solidarios y sociales se han deteriorado, en una sociedad donde el espacio público ha retrocedido frente al avance de lo privado. Pero si consideramos que la educación es un bien público, parte de nuestro desafío profesional es afrontar estas dificultades tomándolas como objeto de intervención y trabajar donde haya que hacerlo en la reconstrucción de una educación pública de calidad con equidad para todos. BIBLIOGRAFÍA ANGULO RASCO, F.; BLANCO, N. Innovación, cambio y reforma: algunas ideas para analizar lo que está ocurriendo. In: ANGULO RASCO, F.; BLANCO, N. Teoría y desarrollo del currículo. Málaga: Aljibe, 1994. BIDDLE, B.; GOOD, T.; GOODSON, I. (Orgs.). La enseñanza y los profesores, tomos 1, 2 y 3. Madrid: Paidós, 2000. BOLÍVAR, A. Cómo mejorar los centros educativos. 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Alternativas para superar desde la formación docente la fragmentación curricular en la educación secundaria. In: SEMINARIO INTERNACIONAL “LOS FORMADORES DE JÓVENES EN AMÉRICA LATINA EN EL SIGLO XXI: DESAFÍOS, EXPERIENCIAS Y PROPUESTAS PARA SU FORMACIÓN Y CAPACITACIÓN, Uruguay, 2000. Documento de trabajo. Uruguay: BIE/UNESCO-ANEP/ CODICEN, 2000 POPKEWITZ, T. (Org.). Modelos de poder y regulación social en pedagogía: crítica comparada de las reformas contemporáneas de la formación del profesorado. Barcelona: Ediciones Pomares-Corredor S.A., 1994. PORLAN, R.; RIVERO, A. El conocimiento de los profesores. Sevilla: Díada Editores, 1998. PEREZ GOMEZ, A. La función del profesor en la enseñanza para la comprensión. In: GIMENO SACRISTÁN, J.; PÉREZ GÓMEZ, A. Comprender y transformar la enseñanza. Madrid: Morata, 1992. RANDY, J.; CORNO, L. Los profesores como innovadores. In: BIDDLE, B.; GOOD, T.; GOODSON, I. (Org.). La enseñanza y los profesores III . [S.l.]: [s.n.], 2000. STENHOUSE, L. Investigación y desarrollo del curriculum. Madrid: Morata, 1984. _____ La investigación como base de la enseñanza. Madrid: Morata, 1987. 159 ANEXO Programação do Seminário Internacional: Construindo caminhos para o sucesso escolar DIA 25 DE JUNHO (segunda-feira) 16h00 19h30 Credenciamento Abertura Ministro da Educação • CONSED • UNDIME • UNESCO Conferência: Educação de qualidade para todos: um assunto de direitos humanos Ricardo Hevia (UNESCO/OREALC - Chile) Lançamento da publicação Repensando a escola: um estudo sobre os desafios de aprender, ler e escrever Coquetel DIA 26 DE JUNHO (terça-feira) 8h30 – 9h30 Coordenação: Bernardete A. Gatti (Coordenadora do Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas): • Educação Básica: indicadores de qualidade – Reynaldo Fernandes (Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP/MEC) • Fatores que promovem a qualidade e a eqüidade na Educação Brasileira - Creso Franco (PUC-RJ) 9h30 – 10h00 Questões e Debates 10h00 Café 10h15 – 12h00 Coordenação: Reynaldo Fernandes (Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP/MEC) • Melhoria do desempenho cognitivo dos alunos no ensino fundamental – José Francisco Soares (UFMG) • Qualidade na Educação Básica: a experiência da Irlanda – Eamon Stack (Departamento de Educação e Ciência da Irlanda) 161 12h00 – 12h30 Questões e Debates 12h30 Almoço 14h00 – 15h00 Coordenação: Maria do Pilar L. A. e Silva (Secretária de Educação Básica do Ministério da Educação). • Aprender, ler e escrever: ainda um enorme desafio – Vera Esther Ireland (Universidade Federal da Paraíba), Candido Alberto Gomes (Universidade Católica de Brasília), Ridha Ennafaa (Universidade Paris 8) • Redes com resultados – Suhas D. Parandekar (Banco Mundial) 15h00 – 15h30 Questões e Debates 15h30 Café 15h45 – 16h30 Coordenação: Cleuza Rodrigues Repulho (Secretária Municipal de Educação de Santo André-SP) • Compartilhando experiências, melhorando a aprendizagem – Maria Auxiliadora Seabra Rezende (Secretária de Educação do Estado de Tocantins e Presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação - CONSED) 16h30 – 17h15 Questões e Debates DIA 27 DE JUNHO (quarta-feira) 8h30 – 10h00 Coordenação: Haroldo Corrêa Rocha (Secretário de Educação do Estado do Espírito Santo) • Alianças estratégicas para o desenvolvimento educativo local: o caso da Rede de Escolas de Campana – Laura Fumagalli (IIPE UNESCO, Argentina) • Conhecer as mil faces da escola para ampliar o direito de aprender - Maria de Salete Silva (UNICEF) 10h00 – 10h30 10h30 10h45 – 11h30 Questões e Debates Café Coordenação: Amaury Patrick Gremaud (Diretor de Avaliação da Educação Básica - INEP/MEC) • Avaliação - um instrumento para a melhoria do processo de ensino e aprendizagem: a experiência de Campo Grande – Maria Nilene Badeca da Costa (Secretária de Educação do Estado do Mato Grosso do Sul). 162 11h30 – 12h15 12h15 14h00 – 15h00 Questões e Debates Almoço Coordenação: Maria Corrêa da Silva (Secretária de Educação do Estado do Acre) • Escola Integrada - Hugo Vocurca (Secretário Municipal de Educação de Belo Horizonte) 15h00 – 15h30 15h30 15h45 – 16h30 Questões e Debates Café Grupos de Trabalho Coordenação: Bernardete A. Gatti (Fundação Carlos Chagas) • Formação de grupos para elencar, em função das exposições e debates, caminhos e ações viáveis para a administração pública da educação, na direção do sucesso escolar de crianças e jovens Exposição das idéias dos grupos e debates 16h30 – 18h00 Comissão Organizadora Bernardete Angelina Gatti (FCC): Amaury Patrick e Luiza Massae Uema (MEC/INEP). Maria Auxiliadora Seabra Rezende: Marília Miranda Lindinger (CONSED). Justina Iva de Araújo Silva: Vivian Ka Fuhr Melcop (UNDIME). Célio da Cunha: Marilza Regattieri (UNESCO). Comitê de Apoio Técnico e Operacional Alessandra Faria de Britto, Alexsandra França Andrade, Ana Thereza Botafogo Proença, Danielle Ros Leal, Maria Cristina Badke e Mônica Salmito Noleto. 163