DETERMINAÇÃO DA FORÇA CRÍTICA DE FLAMBAGEM DE TUBOS CILÍNDRICOS DE PAREDES FINAS Thiago Pereira Braçal1, Renato Bertolino Junior2 1 Aluno de Graduação, Curso de Engenharia Civil, UNESP-Campus de Ilha Solteira 2 Prof. Titular, Depto de Engenharia Civil, UNESP-Campus de Ilha Solteira Resumo - O presente trabalho tem como objetivo analisar o comportamento de tubos cilíndricos de paredes finas submetidas a uma força axial de compressão, determinando a sua força crítica de flambagem e o seu comportamento pós-crítico, considerando a não linearidade geométrica. A determinação do valor da força critica foi efetuada através da analise numérica utilizando-se o programa computacional ANSYS, e também através de ensaio de compressão axial efetuado no Laboratório de Engenharia Civil. O corpo de prova, tanto para a análise numérica como para o ensaio de laboratório, foi obtido através de latas de alumínio vendidas comercialmente, considerando uma espessura de 0,104 mm e diâmetro e altura variáveis. Compararam-se os valores obtidos das análises numéricas e dos ensaios de laboratórios e também com os respectivos valores teóricos da força critica de flambagem. 1 - Introdução A flambagem é um fenômeno que ocorre em peças esbeltas quando submetidas a um carregamento de compressão axial, e é considerado um fenômeno de instabilidade. Deste modo, a peça pode perder sua estabilidade sem atingir a tensão de escoamento. Estruturas de cascas finas são amplamente utilizadas na engenharia moderna, tal como em aeronaves, torres de resfriamento, reatores nucleares, silos e tanques de aço para armazenamento de sólidos e líquidos a granel. Essas estruturas sofrem muito com o efeito de flambagem devido à esbeltez de sua parede, isto é, a relação largura/espessura. Deste modo, para minimizar tal efeito é muito importante o estudo do comportamento dessas estruturas. 1 A maneira como a flambagem ocorre depende do modo como à estrutura é carregada e de suas propriedades geométricas e materiais. O conceito de estabilidade está diretamente ligado ao conceito de equilíbrio de uma estrutura, que é caracterizada pelos valores dos deslocamentos dos seus nós. O surgimento da instabilidade é caracterizado por uma bifurcação de equilíbrio (instabilidade bifurcacional) ou pela ocorrência de um ponto limite (instabilidade por snap-through). A instabilidade por “snap-through” ocorre quando a carga crítica é alcançada e mantida sobre a estrutura, dessa forma a estrutura se deforma e entra em colapso instantaneamente. Elementos do tipo casca, como calotes esféricos e arcos podem possuir um estado não linear de pré-encurvadura caracterizado por deslocamentos e rotações, estando à tensão crítica de bifurcação associada à ocorrência simultânea de dois modos de instabilidade: o modo axissimétrico - caracterizado pela não existência de semi-ondas circunfernciais - e o assimétrico - caracterizado pela existência de semi-ondas longitudinais e circunferenciais, de acordo com o mostrado na figura 1. Figura 1 – Modo de Instabilidade Axissimétrico e Assimétrico respectivamente [Ref. 2]. Segundo Bushnel (1989, p 20) o problema de flambagem de cascas cilíndricas finas submetidas à compressão axial recebeu muita atenção em relação à maioria dos problemas na mecânica estrutural por causa das discrepâncias que havia entre os testes e a teoria. Durante um teste, constatou-se que um cilindro entrou em colapso com tensão consideravelmente menor do que o valor previsto pela teoria. Experimentos feitos em cilindros sujeitos a compressão axial demonstraram que quanto maior é a razão entre raio e espessura do cilindro, mais 2 dispersos ficam os valores de tensão de flambagem do material, como mostrado na figura 2. Figura 2 – Comparação entre valor teórico da carga de flambagem e experimental [Ref. 1]. Ainda segundo Bushnel, essa tendência fornece o indício de que a discrepância de resultados surge a partir da extrema sensibilidade da carga crítica às imperfeições iniciais. Um dos pioneiros no estudo da influência das imperfeições geométricas iniciais à carga critica de flambagem foi Donnell e Wan [Ref. 1]. Contudo, foi à teoria de Koiter, que durante a apresentação de sua tese de doutoramento, em 1945, apresentou os fundamentos da Teoria Não Linear da Estabilidade Elástica (Teoria da Pós-Encurvadura de sistemas estruturais contínuos em regime elástico) forneceu a prova irrefutável que as imperfeições geométricas influenciavam as cargas críticas. A tensão de colapso das cascas cilíndricas pode ser consideravelmente menor à correspondente tensão crítica, devido o fato do comportamento inicial de pós-encurvadura das cascas cilíndricas serem extremamente instável, o que implica uma grande sensibilidade às imperfeições geométricas (REIS e CAMOTIM, 2001, p. 2, citado por Fonseca, et al.). 3 Figura 3 – Diagrama Carga-Deformação Mostrando Limite de Carga e Ponto de Bifurcação [Ref. 4]. A carga crítica de flambagem de cilindros de paredes muito finas (R/t > 250) pode ser estimada, de acordo com os métodos clássicos, pela seguinte expressão: Sendo: E: módulo de elasticidade do material : coeficiente de poison, que para materiais comum, t: espessura da parede do cilindro R: raio do cilindro Segundo Timoshenko (1961), esses valores da tensão de compressão no cilindro correspondem a situações de equilíbrio onde a parede do mesmo pode apresentar deflexões laterais muito pequenas e tais deflexões laterais são admitidas como tendo uma forma senoidal, apresentada na figura 3. 4 Figura 4 – Forma das Ondas Admitidas na Teoria Clássica [Ref. 5]. Sem esquecer que a rigidez da parede fina é muito maior quando trabalhada como membrana (rigidez proporcional a área, ou a t) do que em seu trabalho à flexão (rigidez proporcional a t³, com t pequeno), e não se deve estranhar que o resultado expresso por (1) seja bastante superior aos resultados experimentais. As experiências mostram que o cilindro atinge o colapso em um tempo muito pequeno, partindo-se de um cilindro sujeito apenas à compressão simples, e chegando-se a uma forma poliédrica constituída por faces triangulares que se compõem em losangos (Ricardo, 1963). Assim, pode-se concluir que, além da compressão simples, existe outra maneira de absorver as deflexões axiais, que corresponde à superfície poliédrica, que requer uma energia de deformação baixa, haja vista que as tensões de deformação são pequenas, exigindo assim uma menor carga axial. 2 - Material e Método O material a ser utilizado na determinação da força critica de flambagem teórica, experimental e numérica, terá como referência as geometrias das latas de alumínio, vendidas comercialmente, com as suas dimensões indicadas na tabela 1. 5 Tabela 1 – Dimensões da lata de alumínio Descrição Comprimento (mm) Diâmetro (mm) Espessura (mm) Pequena 122,00 56,85 0,104 Média 122,81 65,65 0,104 Grande 157,44 65,00 0,104 Média - 62,50 0,104 O valor teórico da tensão critica de flambagem tomando-se o diâmetro médio igual a 62,50 mm e a espessura igual a 0,104 mm, através da expressão 1, tem-se σcr = 14,82 N/mm 2.1 - Preparo dos corpos-de-prova Inicialmente, fez-se necessário o lixamento de uma pequena área da superfície da lata de alumínio com uma inclinação de 45º em relação ao eixo longitudinal da lata, em dois sentidos diferentes, para que fosse conferida uma maior aderência entre a superfície da lata e a cola do extensômetro elétrico utilizado. Posteriormente foi feita a limpeza do local com acetona comum para a retirada do material particulado resultante do processo de lixamento. Após a limpeza da superfície, procedeu-se com a colagem dos extensômetros ao corpo-de-prova. Foi necessário que as latas estivessem completamente cheias e fechadas para que os extensômetros fossem colados, pois qualquer pressão que fosse aplicado à superfície da lata no instante da colagem poderia ocasionar uma deformação, mesmo que pequena, ao corpo-de-prova e isso acarretaria em uma leitura equivocada da carga crítica do material, pois como já foi dito anteriormente, as chapas metálicas esbeltas sofrem muito com as imperfeições geométricas iniciais. Em seguida foi feita a soldagem dos fios do sistema de aquisição de dados nos terminais dos extensômetros. 6 Figura 5 – Extensômetros colados nas latas de alumínio juntamente com os seus respectivos fios soldados nos terminais de aquisição de dados. 2.2 - Execução do Ensaio de Compressão Simples O ensaio de compressão simples consiste na aplicação de uma carga centrada no corpo de prova, que tende a provocar um encurtamento do mesmo, com o intuito de obter a sua resistência última. Nos materiais metálicos essa resistência última consiste na determinação da carga crítica de flambagem do material. A estrutura de reação foi composta por um pórtico metálico e pela laje de reação do Núcleo de Ensino e Pesquisa da Alvenaria Estrutural (NEPAE), do Departamento de Engenharia Civil. Para a execução do ensaio de compressão simples utilizou-se um atuador hidráulico, disponível no NEPAE, sendo acoplada uma célula de carga de 10 tf para a medição da intensidade das forças. Sobre as latas foi colocado um molde de PVC para que as cargas aplicadas pudessem se deslocar de maneira uniforme para a lata. 7 Com o corpo-de-prova devidamente ajustado e centralizado nos apoios do atuador hidráulico e com os cabos devidamente ligados ao sistema de aquisição de dados, iniciou-se um carregamento constante sobre a lata de alumínio, de tal maneira a garantir que a lata não viesse a sofrer com um carregamento muito rápido. a b c d Figura 6 – (a) e (b) Visualização dos corpos-de-prova nos apoios do macaco hidráulico, antes do carregamento; (c) e (d) corpos-de-prova durante o carregamento, atingindo a carga crítica de flambagem, com a visualização do fenômeno de flambagem local. 2.3 - Modelo Numérico Neste tópico são apresentadas as etapas de desenvolvimento dos modelos numéricos analisados com a utilização do software comercial ANSYS (versão 12.0.1), com observações quanto às peculiaridades e considerações adotadas na realização das análises e nas hipóteses simplificadoras. Utilizaram-se modelos 8 tridimensionais com o objetivo de se obter resultados que possam ser comparados com aqueles obtidos na fase experimental realizada. A montagem dos modelos numéricos foi realizada de acordo com as seguintes fases: Montagem da geometria do modelo no Software AutoCad 2010; Escolha do tipo de elemento finito a ser utilizado; Definição das características do material envolvido; Preparação da malha de elementos finitos na geometria; Definição das condições de contorno do modelo; e Aplicação do carregamento. Dentre todas essas fases, ressalta-se a importância da montagem da geometria, na obtenção de um modelo tão próximo quanto possível da realidade para a execução da malha de elementos finitos e, conseqüentemente para análise dos resultados. Utilizou-se o software AutoCad para a confecção do modelo unifilar do corpo-de-prova (figura 7) devido a facilidade para a elaboração do desenho e a precisão alcançada com o mesmo em relação ao software ANSYS. Figura 7 – Modelo unifilar em 2D da lata de alumínio no AutoCad (dimensões em mm). Em seguida o modelo 2D foi exportado para o software ANSYS para que pudesse ser feito o modelo tridimensional (figura 8) da lata de alumínio e 9 posteriormente a confecção das malhas, as restrições dos deslocamentos e a aplicação das cargas para a análise numérica. Figura 8 – Modelo tridimensional da lata de alumínio no ANSYS. 2.4 - Elemento Finito Utilizado O tipo de elemento finito adotado na preparação do modelo numérico foi determinado por tentativa e erro, até encontrar um modelo de elemento que melhor se adaptasse a determinadas características geométricas do modelo, que conseguisse representar de forma mais fiel o comportamento do material e que conseguisse otimizar o esforço computacional nas análises numéricas. Assim sendo, o modelo do elemento escolhido foi o SHELL 281 (figura 9). Este modelo é caracterizado por possuir 8 nós, e cada nó possui seis graus de liberdade (translações em X,Y,Z e rotações sobre X,Y e Z), este elemento é apropriado para fazer análise em estruturas de cascas com paredes finas. Figura 9 – Elemento de área SHELL 281 Fonte: ANSYS Help System Release 12.0.1 10 Na análise numérica foi utilizado as constantes do material alumínio para que os resultados fossem coerentes com o experimento prático e com os valores teóricos de acordo com a equação 1, e estão listados à seguir. Tabela 2 – Coeficiente de Poison (µ) e Módulo de Elasticidade (E) Constantes Valores Coeficiente de Poison do alumínio (µ) Módulo de Elasticidade do Alumínio (E) 0,33 70000 MPa Após definido o tipo de elemento e as constantes a ser utilizada, confeccionou-se a malha no modelo, conforme a figura 10. Figura 10 – Modelo tridimensional da lata de alumínio com a malha de elementos finitos. As condições de contorno quanto ao deslocamento foram adotadas em três regiões: Regiões 1 e 2 foram restringidos os deslocamentos nas direções dos eixos X e Y. Região 3 foi restringido os deslocamento das direções dos eixos X,Y e Z 11 O carregamento foi aplicado na borda superior do modelo com um valor unitário de 1 (um) para baixo. Esse carregamento unitário foi adotado, pois, o método de análise adotado foi o de Autovalor. A análise da flambagem por Autovalor prevê uma força teórica de flambagem de uma estrutura ideal elástica. Ele calcula os autovalores estruturais para a carga do sistema dado e as restrições. Isto é conhecido como Análise de Flambagem Clássica de Euller. 3 – Resultados e Discussões No presente momento, o modelamento numérico se encontra num estágio mais avançado do que os ensaios de compressão, inclusive, o primeiro já apresenta resultados preliminares. Porém ambos ainda não foram totalmente concluídos. Portanto, não foi possível fazer a análise comparativa definitiva do método teórico com a análise computacional e prática. Contudo, uma análise prévia dos resultados do modelo numérico nos mostra certa discrepância com o valor teórico. Pois a equação 1 é válida para o caso de cilindros de paredes muito finas (R/t > 250) conforme a figura 4, e ao utilizar latas de alumínio, de modo a simplificar a análise experimental, esta apresenta curvas que modificam o comportamento em relação ao tubo circular do modelo teórico e esse comportamento ainda precisa ser melhor analisado. Tabela 3 – Valores preliminares das cargas críticas de flambagem Corpo-de-prova Valor Teórico Valor Numérico Lata Média 14,82 N/mm. 4,2 N/mm Lata Grande 14,82 N/mm. 4,34 N/mm 12 Figura 11 – Esquema de flambagem das latas médias e grandes, respectivamente. 13 4 - Bibliografia [1] - Bushnell, D. (David), Computerized buckling analysis of shells. 1938 – Kluwer Academic Publishers, 423 p. [2] - Fonseca, E. M. M.; Oliveira, C. A. M.; Melo, F. Q. – Fenômenos de instabilidade em elementos tubulares submetidos à compressão. 2005 - Revista de Mecânica Experimental. ISSN 1646-7078. 11 p. [3] - Hunt, G. W.; Lord, G. J.; Peletier, M. A. – Cylindrical shell buckling: A characterization of localization and periodicity. 2003 - Disponível em: < http://www.win.tue.nl/~mpeletie/Research/Papers/HuntLordPeletier03.pdf > Acesso em: 05 Ago. 2011. [4] – Reis, A; Camotim, Dinar – Estabilidade Estrutural. – McGraw-Hill de Portugal, Ltda. – 2000, 470. [5] - Ricardo, Octávio G. S. – Um modelo simplificado para o estudo de flambagem em cilindros e cones de paredes muito finas. 1963 – 76 p. Tese de Doutorado. Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. [6] - Teng, J. G. – Buckling of thin shells: Recent advances and trends. 1996 - Disponível em: < http://pdffinder.net/Buckling-of-thin-shells:-Recent-advancesand-trends.html# > Acesso em: 19 Set. 2011. [7] - Timoshenko, Stephen,1878-1972. – Teoria da Elasticidade - Teoria da elasticidade /S. P. Timoshenko, J. N. Goodier ; traduzido por Sérgio Fernandes Villaça, Humberto Lima Soriano, Hierônimo Santos Souza.- Rio de Janeiro: Guanabara Dois, 1980, 545 p. 14