DOCÊNCIA EM EDUCAÇÃO FÍSICA, SABERES E FUNÇÕES
Ana Zeli Nascimento
José Augusto Victoria Palma
Resumo
O presente estudo, de cunho bibliográfico, teve por objetivo identificar
quais são os saberes e funções do docente em Educação Física. Para tanto se
faz necessário compreender como se dá o processo de profissionalização da
docência, quais são seus saberes e de que forma são adquiridos e também qual
percurso histórico da Educação Física. Buscamos em nosso estudo caracterizar
a docência como ação profissional, ao mesmo tempo em que procuramos
relacionar com o ensino da Educação Física. Identificamos que para o exercício
da docência, de qualquer que seja a disciplina/matéria escolar, são necessários
saberes pedagógicos e científicos. Além do que, outros saberes, extraídos da
experiência, são construídos no cotidiano da sala de aula.
Palavras-chave: Formação de professores, Saberes Docentes, Educação
Física
Introdução
Sabe-se da necessidade de continuar a mudar os padrões
pedagógicos que norteiam os professores de Educação Física. Entretanto, é
preciso também entender o percurso da área desde a sua gênese para que
possamos chegar à conclusão de qual Educação Física que queremos, e de fato
quais, são os saberes e as funções profissionais do docente desta disciplina.
Docência – processo de profissionalização (Princípios da formação inicial
e contínua)
As profissões têm surgido do desenvolvimento das ocupações, quando
estas procuram um maior reconhecimento científico, reconhecimento da
especificidade e da conquista de status social. (PALMA et al, 2007). Sobre isto,
Nascimento e Farias (2012), dizem que:
“A ocupação apresenta como característica a dedicação
exclusiva, o recebimento do salário, a preocupação com a
qualidade do serviço prestado à sociedade e a
dependência ao método da tentativa e erro. A profissão é
caracterizada como uma ocupação de elite que deve ter
maior recompensa (salário) e status social, tendo a
pesquisa como norteadora de seu campo de atuação.” (p.
63)
Assim, entende-se a profissionalização como o processo de
qualificação, no qual uma ocupação é organizada, obtendo o direito a
exclusividade de execução de um tipo particular de trabalho. Aqui o exercício
profissional é caracterizado por uma dimensão subjetiva que será percebida na
postura profissional, ou seja, nas ações do indivíduo. Tardif (2000), por sua vez,
considera
como
principais
características
profissionais:
conhecimentos
especializados e formalizados; esses conhecimentos devem adquiridos meio de
uma longa formação de alto nível, a maioria das vezes de natureza universitária
– pois através de um curso universitário é que o indivíduo terá um diploma, o
qual lhe possibilitará um título profissional; os conhecimentos profissionais são
pragmáticos; o profissional deve fazer uso de conhecimentos esotéricos; avaliar
o trabalho de seus pares; ter autonomia e discernimento; os conhecimentos
profissionais são evolutivos e progressivos e necessitam de uma formação
contínua ou continuada; e os erros pode ser responsabilidade do profissional.
Com relação a docência, sabe-se que o seu processo de
profissionalização iniciou-se tardiamente, especificamente no final do século XX,
desde então o professor vem buscando construir sua identidade profissional.
Nas últimas décadas, a profissionalização docente tem como objetivo conseguir
desenvolver e implantar características dentro da formação do ensino e na
formação dos professores. Há uma tentativa de renovar os fundamentos
epistemológicos do ofício de professor. A docência passa a entrar num processo
reflexivo a respeito das práticas profissionais, considerando o docente como
formador e pesquisador, há de considerar o professor como produtor de
conhecimento. Lembrando que o seu papel é ensinar, e isto consiste numa ação
intencional em um contexto sociocultural, e que pressupõe um conjunto de
operações complexas que transformam o projeto pedagógico curricular da
escola em prática real. (PALMA et al, 2007)
A profissionalização docente no Brasil, segundo Nascimento e Farias
(2012), pode ser caracterizada por três fases. A primeira tem início na década
de 1960, com institucionalização da primeira Lei de Diretrizes e Bases (LDB).
Em meados de 1960, a segunda fase consolidou uma nova organização do
ensino brasileiro e do seu corpo docente, aqui já uma preocupação com a
qualificação do professor, bem como suas condições de trabalho. A terceira fase,
na década de 1980, foi aquela na qual tornaram forma ás expectativas de
profissionalização. (p. 66)
O que foi possível perceber é que a profissão docente se desenvolveu
em meio a uma crise geral do profissionalismo e das profissões, e esta crise, que
teve seu início na década de 1980, está associada á crise da perícia profissional,
impacto da formação profissional; crise do poder profissional; e crise da ética
profissional. (TARDIF, 2000) Esta crise acaba por atingir os professores, o qual
estes apresentam uma desmotivação pessoal, insatisfação profissional,
ausência e também o abandono da carreira. Mais tarde, na década de 1990,
temos a Era da profissionalização, a qual surgiu várias discussões e debates
relacionado as instituições formadoras, entre elas faculdades e universidades. E
para resolver tais dilemas, Nóvoa (1999) diz que é necessário incentivar uma
maior identificação pessoal dos professores, aumentar o tempo de presença nas
escolas, além da importância da formação inicial e continuada – o que irá auxiliar
na carreira docente.
Vale ressaltar, que boa parte da discussão sobre a formação de
professores se faz da perspectiva de a educação se realiza por meio da
escolarização, o que implica considerar em que consiste a atividade principal do
professor do professor e quais conhecimentos teóricos e técnicos são
necessários à realização dessa atividade. Aqui a educação tem como objetivo
principal o ensino de conteúdos científicos de cada área de conhecimento. E é
no domínio desses conhecimentos e no modo de torná-los acessíveis aos
educandos que está o núcleo da atividade do professor, a promoção da
aprendizagem. (SFORNI, 2012)
Saberes e Funções da Docência
É no final do século XX que o papel do professor é resgatado e são
desenvolvidos estudos que utilizam uma abordagem metodológica que da voz
ao professor. E que o considera em sua própria formação, é assim que os
saberes vão se constituindo a partir de uma reflexão na e sobre a prática,
saberes estes que irão caracterizar a profissão docente e serão desenvolvidos
durante todo o processo de formação, e também nas atividades cotidianas deste
futuro docente, e também passam a integrar a identidade do professor. Para a
construção desta identidade profissional é necessário caminhar junto com as
características da socialização com a realidade, com o processo de formação,
ou seja, a identidade é um verdadeiro processo de negociação. Sobre isto Tardif
(2000) vem nos falar sobre uma epistemologia da prática profissional, a qual
procurará estudar o conjunto de saberes utilizados pelos profissionais em seu
espaço de trabalho cotidiano para desempenhar suas tarefas.
“A finalidade de uma epistemologia da prática profissional
é revelar esses saberes, compreender como são
integrados concretamente nas tarefas dos profissionais e
como os incorporam, produzem, utilizam, aplicam e
transformam em função dos limites e dos recursos
inerentes ás suas atividades de trabalho. Ela também visa
a compreender a natureza desses saberes, assim como o
papel que desempenham tanto no processo de trabalho
docente quanto em relação à identidade profissional dos
professores.” (TARDIF, 2000 p. 11)
Partindo desta finalidade é os saberes dos professores são
caracterizados como temporais, por seres adquiridos com o tempo, sendo assim,
boa parte do que os professores ensinam ou como ensinam provém da sua
própria história. Os saberes podem ser também são plurais e heterogêneos, pois
provêm de diversas fontes; e os saberes profissionais dos professores podem
ser personalizados ou situados, pois se tratam de saberes apropriados,
incorporados, subjetivados, saberes que é difícil dissociar das pessoas, da sua
experiência ou situação de trabalho;
Há várias pesquisas no Brasil, no que dizem respeito aos saberes da
docência, tais pesquisas vêm tendo muita influencia da literatura internacional,
que passam a considerar o professor como um profissional que adquire e
desenvolve conhecimentos a partir da prática e no confronto com as condições
da profissão. Por este motivo o saber docente é heterogêneo, possui varias
tipologias, sendo eles mobilizados na pratica pelo professor em sua pratica
pedagógica. (NUNES, 2001). Sobre isso Tardif et al (1991) diz que,
“...quanto mais um saber é desenvolvido, formalizado,
sistematizado, como acontece com as ciências e os
saberes contemporâneos, mais se revela longo e
complexo o processo de aprendizagem que exige, por sua
vez, uma formalização e uma sistematização adequada.”
(p. 219)
Ou seja, procura-se entender a prática pedagógica a partir de toda
complexidade que a envolve, tanto no que diz respeito á própria atividade de
ensinar, quanto no fato de os agentes são pessoas, com histórias, memórias,
trajetórias, expectativas, experiências e singularidades.
Dentre os autores que inspiram pesquisadores brasileiros, temos o
norte-americano, Lee Shulman, que fez um estudo importante sobre os
conhecimentos que os docentes possuem em sua matéria de ensino. Tendo em
vista três tipos de conhecimento: conhecimento da matéria; conhecimento
pedagógico; e o conhecimento do currículo. E ainda temos sete categorias que
formam o conhecimento de base do ensino, sendo eles: conhecimento do
currículo; conhecimento pedagógico do conteúdo; conhecimento do aluno e de
suas características; conhecimento do contexto educacional; e conhecimento
das finalidades educativas. Tais conhecimentos, segundo Shulman (1987), são
originados de quatro fontes, as disciplinas, os programas escolares, as ciências
da educação e a prática docente. Observa-se que Shulman não tem
preocupação em compreender como a matéria torna-se acessível ao aluno e
também quais saberes o docente mobiliza para ensinar o aluno uma determina
disciplina.
Tardif (2002) considera, como colocado anteriormente, que o “saber
docente é um saber plural formado de diversos saberes provenientes das
instituições de formação, da formação profissional, dos currículos e da prática
cotidiana” (p. 54), saberes estes constituídos em um âmbito sociocultural que
pode ir se modificando com tempo. E junto de outros autores Tardif, Lessard e
Lahaye (1991) por sua vez, propuseram uma tipologia diferente da apresentada
por Shulman, ou melhor, eles ampliaram sua categorização. Segundo estes
autores são quatro os saberes que implicam na atividade docente sendo eles os:
•
Saberes da formação profissional (inicial ou continuada): também
se constituem estes saberes da formação profissional conhecimentos
pedagógicos relacionados às técnicas e métodos de ensino (saber-fazer),ou
seja, são ideologias pedagógicas encontradas na formação dos professores;
•
Saberes disciplinares: são reconhecidos e identificados como
pertencentes aos diferentes campos do conhecimento, também são
produzidos e acumulados pela sociedade ao longo da história da
humanidade;
•
Saberes curriculares: apresentam-se sob forma de programas
escolares (objetivos e metodologias) que os professores devem aprender e
aplicar;
•
Saberes da experiência: são os saberes que resultam do próprio
exercício da atividade profissional dos professores, estes saberes são
produzidos pelos docentes por meio da vivência de situações específicas
relacionadas ao espaço da escola e as relações com alunos e colegas de
profissão.
Tardif (2002) se preocupa em evidenciar que o processo de
constituição do profissional professor não se restringe ao presente. Isso significa
aceitar que as fontes de aquisição dos saberes dos professores se referem
igualmente às experiências do presente e as do passado e que conhecimentos
adquiridos no contexto da sua vida pessoal e familiar, assim como em toda a sua
trajetória escolar, são decisivos também na constituição de sua identidade
profissional, justificando, portanto, a característica temporal dos saberes dos
professores. Estes saberes são transformados e passam a integrar a identidade
do professor, constituindo-se em elemento fundamental nas práticas e
discussões pedagógicas, sendo assim caracterizados como um saber original
(NUNES, 2001).
Gauthier (2006), também, partindo do princípio de Tardif, que o saber
é algo plural, é contra a ideia de senso comum que muitos docentes têm em
relação aos saberes, o qual para ensinar basta conhecer o conteúdo, ter talento,
bom senso, seguir a intuição, ter experiência e cultura. Partindo destas
premissas a docência seria um ofício sem saberes. Ao contrário disto e
complementando
ou
apresentando
semelhança
dqueles
saberes
já
apresentados por Tardif (2002), Gauthier apresenta uma classificação de
saberes docentes, os quais são:
•
Saberes Disciplinares: são aqueles saberes produzidos pelos
pesquisadores e cientistas envolvidos com atividades de pesquisa nas
diferentes áreas de conhecimento. Sendo que para ensinar é necessário
entender profundamente o conteúdo;
•
Saberes Curriculares: são aqueles referentes aos conhecimentos
a respeito dos programas escolares;
•
Saberes das Ciências da Educação: seria aqueles saberes
produzidos sobre a escola, estaria eles relacionados a própria profissão
docente, o qual o professor deve conhecer a instituição em que está atuando;
•
Saberes
da
Tradição
Pedagógica:
estes
referem-se
as
representações que os docentes têm a respeito da escola, seja do aluno, do
professor ou da instituição;
•
Saberes Experienciais: referem-se aos conhecimentos construídos
pelos professores, sendo estes resultados de uma construção individual;
•
Saberes da Ação Pedagógica: estes, por fim, seriam os saberes
experienciais dos professores a partir do momento em que se tornam
públicos e são validados por meio de pesquisas realizadas tendo como
cenário empírico a sala de aula.
O objetivo principal dos estudos desenvolvidos por Gauthier et al é
argumentar no sentido de que a profissionalização da docência está
estreitamente relacionada à legitimação e institucionalização dos saberes
profissionais dos professores que, a partir desse processo, passariam a controlar
a utilização e a reprodução desses saberes pelas instituições destinadas à
formação de novos docentes. (CARDOSO et al, 2012 – p. 10)
O que se pode notar é que a prática profissional de um docente é
resultado da relação existente entre os seus diferentes saberes, adquiridos não
somente na sua preparação profissional, cursada em instituições destinadas à
formação de professores. Os saberes dos professores são, da mesma forma,
resultantes dos conhecimentos e ensinamentos aprendidos na sua vida familiar
e social, no decorrer de sua trajetória escolar como aluno, no seu próprio lugar
de trabalho, por meio das relações estabelecidas com alunos e colegas de
profissão.
Educação Física e seu Contexto Histórico
Ao buscarmos entender a Educação física na escola na atualidade,
se faz necessário conhecer um pouco da sua história e a que interesse ela busca
atender. Se relacionarmos a Educação Física como sendo apenas movimento
ou locomoção, podemos dizer que ela tem seu início desde os primórdios. A
história da Educação Física confunde-se com a Ginástica, no entanto, esta última
está presente desde a Antiguidade Clássica até os dias atuais. Foi na Idade
Moderna que ouvimos pela primeira vez a terminologia Educação Física, a qual
surgiu graças a um corte epistemológico com a Ginástica. (PEREIRA, 2007)
O paradigma predominante de ação dos professores que atuavam
com a Educação Física, em sua maioria, era o paradigma simplista dualista
cartesiano, que surgiu graças ao então filósofo e matemático René Descartes
(1596 – 1650). No qual tem-se como característica principal a separação
ontológica do homem em corpo e alma. A res extensa (corpo) e a res cogitans
(alma), que são consideradas, no cartesianismo, dimensões distintas de modo
que a mente é considerada como o principal elemento humano, e o corpo é
morada da alma.
Descartes via o corpo como objeto/matéria, em que sua natureza
podia ser explicada por meio das leis da mecânica e em função da organização
e do movimento de suas partes (BORELLI; PEREIRA; MORTARI – 2013), sendo
o corpo uma máquina perfeita governada por essas leis a serviço da razão.
Podemos dizer que o paradigma simplista dualista cartesiano é pensamento
clássico da humanidade, os princípios desse paradigma acabam por rejeitar as
contradições, não permite olhar o todo, mas vê esse todo de forma fragmentada,
acaba por decompor o todo em elementos simples.
Já no Brasil, a Educação Física tem início em 1851, mas não estava
inserida na escola em todos os estados, apenas no Rio de Janeiro,
especificamente em escolas militares. A Educação Física, fora entendida como
uma maneira de forjar o homem forte, saudável, indispensável a implementação
do processo de desenvolvimento do país. Nesse momento a influência é
totalmente do militarismo e de médicos higienistas - isso ocorreu em decorrência
do alto índice de mortalidade infantil, e as condições de saúde da população em
geral. (CASTELLANI, 1988)
Outra questão que vale ressaltar foi a participação da mulher nas
práticas da Educação Física. As alunas eram proibidas, pelos seus pais, de
participarem das práticas, por considerarem as práticas corporais inferiores as
intelectuais. Essa situação alterou-se gradativamente o que viria mudar com um
parecer de Rui Barbosa que data em torno de 1882, entretanto com várias
restrições. Tal liberação se fazia necessária, para que mulher frágil se tornasse
forte e sadia para gerar filhos saudáveis. O qual colocava o físico a favor do
intelectual, assim como Descartes já apontava em suas teorias. Rui Barbosa,
dizia a esse respeito:
“A Educação Física da mulher deve ser, portanto, integral,
higiênica e plástica, e, abrangendo com os trabalhos
manuais os jogos infantis, a ginástica educativa e os
esportes, cingir-se, exclusivamente aos jogos e esportes
menos violentos e de todo compatíveis com a delicadeza
da mãe.” (CASTELLANI, 1988 – pg. 45)
Somente mais tarde graças a algumas reformas educacionais
realizadas em vários estados brasileiros - dentre eles estão Bahia, Ceará, Minas
Gerais, Pernambuco - entre 1920 e 1928, foi que esses estados contemplaram
a Educação Física como componente curricular do ensino primário e secundário
(CASTELLANI, 1988). Mas em 1922, o Ministério de Guerra do Brasil, cria o
Centro Militar de Educação Física, com o objetivo de dirigir, coordenar e difundir,
este método militarista e algumas aplicações desportivas, porém este centro só
passou a existir, alguns anos mais tarde quando do funcionamento do curso
provisório de Educação Física – somado a outros fatos, como a presença de
militares na formação dos primeiros professores civis de Educação Física.
Com a Constituição do Estado Novo, em 1937, com o golpe de Getúlio
Vargas, a Educação Física tinha por finalidade promover a disciplina moral e o
adestramento físico dos estudantes, isto pensando na economia do país e na
defesa da nação. Mais tarde em 1942, com a Reforma de Capanema, ela passou
a ser obrigatória nos estabelecimentos de ensino, o motivo da obrigatoriedade é
que se tenha uma mão de obra adestrada, forte e obediente.
Em 1945, com o fim do Estado Novo, para se tornar professor de
Educação Física, diferente das outras licenciaturas, era necessário apenas, ao
interessado, um curso técnico, de nível secundário, com duração de dois anos
(CASTELLANI, 1988). Nessa época, a questão pedagógica, na formação inicial
e durante a atuação não era levada em consideração. Afinal era apenas a
educação do físico tão só que era valorizado.
Já na década de 1960, a Educação Física tinha um caráter mais
tecnicista, um tanto competitivo. Neste período ocorre o Golpe Militar de 1964,
no qual havia censura a artes, música e literatura. Assim poder-se-ia dizer que o
único objetivo que a Educação Física poderia ter, era formar atletas, para se
apresentarem nos grandes eventos e trazerem resultados para o país. Era um
período de desenvolvimento para o país, tanto na área de comunicação como
na urbanização, e também as indústrias, o objetivo da Educação Física aqui era
também que os alunos fossem obedientes às regras. (CASTELLANI, 1988)
A década de 1970 foi marcante para os brasileiros e principalmente
para a Educação Física. Foi, exatamente, em 1970 que o hino da seleção
brasileira de futebol – “Noventa milhões em ação, pra frente Brasil, salve a
Seleção” – composta por Miguel Gustavo e Raul de Souza, teve como objetivo
inicial apoiar a Seleção. Entretanto, por trás de toda essa alienação havia vários
crimes políticos. Mas tarde, ainda nos anos 1970, criou-se o movimento “Esporte
Para Todos” (EPT), tal movimento surgiu com o intuito, dos governantes da
época, de convencer à sociedade a brasileira de que o desenvolvimento
econômico, do início da década, correspondia ao desenvolvimento social da
sociedade brasileira, sendo demonstrado através das atividades físicas de lazer
realizadas pela população.
Nas décadas de 1980, do século passado houve, dos professores e
pesquisadores da área, um movimento renovador da Educação Física, a qual
passou a ter várias discussões envolvendo o campo crítico e progressista da
pedagogia. Nessa época, e ainda hoje podemos observar que, a Educação
Física tinha dificuldade em romper como paradigma da aptidão física – a qual o
conhecimento advém das ciências naturais. Para tal rompimento, via-se a
necessidade de que o corpo docente se qualificasse através de programas de
pós-graduação, no qual viria a ser incorporada as questões pedagógicas, e as
ciências humanas, como a sociologia e a filosofia da educação.
Várias propostas pedagógicas foram originadas, dentre as quais
temos:
•
Abordagem desenvolvimentista - a qual tem como objetivo inicial, oferecer
à criança a oportunidade de experiência de movimento, garantindo seu
desenvolvimento motor. Através de um processo de aprendizagem de
natureza biológica, utilizando movimentos padronizados e com fases
determinadas. Tem como defensor Go Tani;
•
Abordagem construtivista-interacionista – que trata do desenvolvimento
cognitivo por meio dos jogos e brincadeiras infantis. Esta abordagem faz
crítica a escola, pois, segundo seu defensor, a escola desconsidera a
cultura infantil. Não há padronização de movimentos, porque estes são
organizados e construídos pelo próprio sujeito. Seu principal defensor é
João Batista Freire;
•
Abordagem crítico superadora – esta é oposta a perspectiva tradicional
de Educação Física e traz uma reflexão com sentido e significado, e
intencionalidade, discutindo principalmente os temas da cultura corporal,
Seus principais representantes são Carmen Lúcia Soares, Lino Castellani
Filho, Valter Bratch, dentre outros.
•
Abordagem crítico emancipatória – também faz crítica a Educação Física
tradicional, ela constitui um sentido/significado no movimentar e
intencionalidade, buscando superar o tradicional. Eleonor Kunz, o
principal defensor desta abordagem, diz que deve haver equilíbrio entra a
identidade pessoal e a social, ele também faz crítica ao termo “cultura
corporal”, pois segundo ele, tal termo pressupõe que há outras formas de
cultura como a intelectual, retomando dicotomia mente/corpo – a qual
busca romper. O melhor seria dizer “cultura do movimento” (DAOLIO,
2004). Através do se movimentar há uma forma de comunicação com o
mundo.
O objetivo das propostas pedagógicas é dar subsídios ao professor
no momento da sua ação em sala de aula e por meio dela introduzir o estudante
no universo da cultura de movimento de forma crítica, sendo esta a tarefa da
escola. A Educação Física tem vários desafios como, por exemplo, se legitimar
no campo pedagógico. Fazer uma leitura adequada da política do corpo,
entendendo o percurso histórico do mesmo, e por fim, temos o desafio
epistemológico, a qual a pedagogia crítica terá a pretensão de superar o
tradicional, fazendo uma leitura crítica da realidade. (BRATCH, 1999)
Segundo Benites e Neto (2006), “no presente momento o que se tem,
como grande referência, no âmbito escolar, são os Parâmetros Curriculares
Nacionais, apresentando como objetivos: Participar de atividades corporais,
estabelecendo relações equilibradas e construtivas com os outros, respeitando
características físicas e o desempenho de si próprio e dos demais; Conhecer,
valorizar, respeitar e desfrutar da pluralidade de manifestação de cultura corporal
do Brasil e do mundo, percebendo-as como recurso valioso para a integração
entre pessoas e entre diferentes grupos sociais e étnicos; Adotar hábitos
saudáveis de higiene, alimentação e atividades corporais, relacionando-os com
os efeitos sobre a própria saúde e de melhoria da saúde coletiva; solucionar
problemas de ordem corporal em diferentes contextos, dando possibilidades a
todos e também condições para que todos conheçam os seus corpos para
explorarem suas dimensões; Reivindicar melhores condições de trabalho e
Promover um ensino crítico e contextualizado, etc.”
Vale dizer que o objeto da Educação Física é o movimentar-se
humano como fenômeno histórico cultural, e isso só se firmará quando as
ciências naturais e humanas, juntas, formarem um referencial para a Educação
Física.
Conclusão
Podemos dizer, por fim, que as propostas pedagógicas tem por
objetivo dar subsídios aos professores no momento de sua ação em sala de aula
e por meio dela introduzir o estudante no universo da cultura de movimento de
forma crítica, sendo esta a tarefa a escola. Sendo os professores profissionais,
os saberes vão se constituindo desde a sua formação, a partir de uma reflexão
na e sobre a prática, saberes estes que irão caracterizar a profissão docente e
serão desenvolvidos durante todo o processo de formação, e também nas
atividades cotidianas deste futuro docente, e também passam a integrar a
identidade do professor.
Referências Bibliográficas
BORELLI, C. V. J.; PEREIRA, A. M.; MORTARI, K. S. M. Manuel Sérgio:
Precursor da Ciência da Motricidade Humana. Texto aceito para o IX SIEFLAS
Seminário Internacional de Educação Física, Lazer, Saúde – Braga.
BRACHT, Valter. A constituição das teorias pedagógicas da Educação Física.
Cadernos Cedes, ano XIX, nº 48, Agosto/99
DAOLIO, Jocimar. Educação Física e o conceito de cultura. Campinas, SP:
Autores Associados, 2004.
FILHO, Lino Castellani. Educação Física no Brasil: A História que não se conta.
Campinas, SP; Papirus; 1988.
NASCIMENTO, J. V.; FARIAS, G. O. Construção da identidade profissional em
educação física: da formação a intervenção.. Florianópolis: Ed. da UDESC, 2012
NÓVOA, Antônio. Profissão Professor. Porto, Portugal, Porto Editora, 1999.
NUNES, C. M. F.; Saberes Docentes e Formação de Professores: Um breve
Panorama da Pesquisa Brasileira. Educação & Sociedade, ano XXII, nº 74,
Abril/2001.
PALMA, Ângela P. T. V. at al.. Educação Física e a organização
curricular – educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Londrina :
EDUEL, 2010. Sobre a docência. In LIBÂNEO, J.C. e ALVES, N. (orgs) Temas
de Pedagogia: diálogos entre didática e currículo. São Paulo : Cortez, 2012.
SFORNI, M. S. de Faria. Formação de professores e os conhecimentos
teóricos
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ. :
Vozes, 2002.
Universidade Estadual de Londrina
Ana Zeli Nascimento ([email protected])
Orientador: José Augusto Victória Palma ([email protected])
Linha: Formação de professores em Educação Física
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