PALAVRA DO PRESIDENTE
Heróis ou vilões?
(as lições do dia-a-dia)
U
m cidadão comum, desesperançado da vida, resolve
cometer suicídio. Procura o
prédio mais alto da cidade e
do ponto máximo salta para a morte.
Um cidadão nada comum vê o corpo
caindo em direção à morte certa e se
lança no espaço e consegue agarrar o
suicida. Ambos atravessam uma janela
envidraçada e conseguem sobreviver.
O herói nem suja a roupa. O outro reclama de dores e da insólita ação do
seu salvador. E procura um advogado.
E ingressa com uma ação de indenização contra o Sr. Incrível, pois afirma,
em síntese, que, além de não haver solicitado qualquer ajuda, o dito cujo interferiu no seu livre-arbítrio e lhe causou algumas lesões corporais.
Uma composição ferroviária
corre em alta velocidade em direção
ao abismo, pois a ponte foi destruída.
Atento e destemido, o candidato a herói utiliza todos os poderes e a sua força extraordinária para frear o trem. Os
passageiros são surpreendidos com a
parada súbita e vários sofrem escoriações e fraturas. E procuram um advogado. E ingressam com ações de reparação com base nos danos que sofreram.
“Se todos são
especiais, então
ninguém é especial...”
Essa conduta se repete em vários cantos do mundo. E os portadores
de “habilidades especiais” ficam peremptoriamente proibidos de usarem os seus
poderes...
Injustiça? Ingratidão? Absurdo?
Diante desses exemplos, fico
pensando nos japoneses reclamando
indenização do National Kid, pois na luta
contra os monstros a cidade é quase
sempre destruída. E nos X-Men, que
são perseguidos apenas porque têm
certas habilidades. E ouço e escuto as
oportunas palavras do filho do Mr.
Incrível: Se todos são especiais, então
ninguém é especial...
Pensando bem, o que acontece
nas telas, acontece na vida real.
Há muitos anos, o povo foi chamado a escolher entre Barrabás e Cristo. E Cristo, que era o mocinho, que tinha
poderes especiais e veio para salvar o
mundo, perdeu. Mais tarde, a explicação foi dada pelo Padre Antonio Vieira:
“Quis Deus salvar o gênero humano naquele
dia fatal em que deu a vida por ele; e de que
ministros se serviu sua Providência? Caso estupendo! Serviu-se de Judas, de Anás, de Caifás,
de Pilatos, de Herodes; e por meio da injustiça
e impiedade dos homens tão abomináveis, se
conseguiu a salvação de todos os predestinados.
Se esperai ser um deles, não vos queixeis. E se
me dizeis que foram injustos os ministros
convosco, também vo-lo concedo, posto que o
não creio. Mas que importa que neste conselho
fosse Judas, ou naquele Anases e Caifases, ou
noutro Herodes e Pilatos, se por meio da sua
injustiça tinha Deus predestinado a vossa salvação? Eles irão ao inferno pela injustiça que
“E os portadores de “habilidades
especiais” ficam peremptoriamente
proibidos de usarem os seus poderes...”,
Valter Xavier, presidente do Imag-DF
vos fizeram, e vós por ocasião da mesma injustiça ireis ao Céu.” (1)
E fica o registro final: “Aristóteles
disse que entre todas as coisas terríveis, a mais
terrível é a morte. Disse bem; mas não entendeu o que disse. Não é terrível a morte pela
vida que acaba, senão pela eternidade que começa. Não é terrível a porta por onde se sai; a
terrível é a porta por onde se entra. Se olhais
para cima, uma escada que chega até o Céu; se
olhais para baixo, um precipício que vai parar no Inferno. E isto incerto”.(2)
Valter Xavier
Presidente do IMAG-DF
1 - Sermão da Terceira Quarta-Feira
da Quaresma, Capítulo VI, Pregado
na Capela Real (1669) – cf. Antonio
Vieira, Sermões, Tomo I
(organização Alcir Pécora), Editora
Hedra, São Paulo, 2000, p. 115)
2 - Sermão da Quarta Feira de
Cinzas, Capítulo VII, Pregado em
Roma, na Igreja de Santo Antonio
dos Portugueses (1672), op. cit., p.
68.
O Magistrado
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Capa
3 Palavra do Presidente
Heróis ou Vilões?
(as lições do dia-a-dia)
32
Habemus Crucificação
Aspectos jurídicos do
Julgamento de Cristo
6 Radar
Um giro pelas notícias que
marcaram o último mês
8 Carta dos Editores
Procurando respostas...
9 Cartas
A serviço dos leitores
10 Eventos
Operadores do Direito do Brasil
e da Inglaterra fazem parcerias em
evento realizado em São Paulo
Direito do Consumidor
12
Comissão da Câmara aprova fim
de prazos nos Créditos de
celulares pré-pagos
14 Direito do Consumidor
Vagas de garagem
20 Tecnologia
A tecnologia pode ser uma
alternativa ao desperdício de
papel e assim, contribuir para
a preservação das florestas
22 Serviço
Precatório: saiba o que é e
como fazer para recebê-lo
24 Direto ao ponto
Entrevista
Giovanni Ettore Nanni discute o
enriquecimento sem causa
Liberdade de imprensa ameaçada
26 Iniciativas
4
O Magistrado
Divulgação
STJ e os portadores de
necessidades especiais
16
Í
28
A arte secreta
de Michelângelo
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Cidadania
41
Realizada em Brasília a I Conferência
Distrital de Políticas de Promoção
da Igualdade Racial
Dúvidas nunca mais
Idéias
E
42
Vínculo trabalhista: ele existe entre
franqueador, franqueado e
seus empregados?
Espaço Universitário
46
Conheça o que pensam os futuros
operadores do Direito
Polêmica
50
Abuso de poder: Decisão inédita do
TJDFT censura publicamente
promotores do Distrito Federal
Direito nas ruas
56
Ação de hackers: bancos devem
indenizar cliente
Português jurídico
58
Sem dramas na hora de escrever
Saúde
61
Rinite alérgica pode interferir no
desempenho escolar de crianças
Livros
65
As novidades do mundo da leitura
62 Saúde
Postura dos pais é vital no
combate à obesidade infantil
Cultura
66
Vivo Open Air: do entretenimento
à experimentação
Ponto de Vista
68
Os traseiros, os juros e a igreja
Segredo de Justiça
70
A veia poética dos magistrados
guardada a sete chaves
O Magistrado
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Delegados e IMAG-DF
Mauro Cezar Lima e Valter Xavier
assinaram convênio que prevê descontos
nas mensalidades do Imag-DF.
O Instituto dos Magistrados do
Distrito Federal (Imag-DF) e Sindicato dos Delegados de Polícia do Distrito Federal (Sindepo-DF) firmaram parceria no dia 5 de abril. “Pelo convênio
firmado serão oferecidos descontos
diferenciados nas mensalidades e demais encargos dos cursos, abertos ao
público, oferecidos pelo nosso Centro
de Estudos Superiores aos associados
e servidores do Sindepo-DF”, explica
Valter Xavier, presidente do Imag-DF.
“É bom ressaltar que os descontos também serão extensivos aos dependentes
legais e diretos de nossos associados e
servidores’, finalizou Mauro Cezar
Lima, presidente do Sindepo-DF.
Ganhador da Promoção
Valdson Gonçalves de Amorim recebeu do Diretor de redação de
“O magistrado em revista”, Marcos Linhares, o livro “Código da Vinci”.
O Procurador do Distrito Federal Valdson Gonçalves de Amorim,
de Brasília-DF, foi ao IMAG-DF receber seu prêmio: um exemplar do livro
“Código Da Vinci”. Valdson mandou
um correio eletrônico comentando um
dos textos da revista. No caso, escrito
por Renan Paes Félix, intitulado “Aspectos da Política Criminal Brasileira”
(fls. 48/49). Parabéns ao procurador.
6
O Magistrado
E se você também quiser um dos
cinco exemplares da primeira ficção jurídica nacional – o livro GUARDIÃO,
faça como Valdson e mande seu comentário a qualquer um dos textos desta
edição de maio para o correio eletrônico: [email protected]
Os cinco primeiros comentários embasados receberão a obra. Resultados na próxima edição.
Condenada por violentar
homem. Se a moda pega...
De acordo com informações da
agência Reuters, “Uma corte norueguesa
sentenciou uma mulher a nove meses de
prisão por violentar um homem, na primeira condenação do tipo no país
escandinavo, que se orgulha pelo seu
igualitarismo. O homem, de 31 anos,
dormia em um sofá durante uma festa
em janeiro do ano passado e disse no
tribunal da cidade de Bergen que acordou
com uma jovem de 23 anos fazendo sexo
oral com ele. Sob a lei norueguesa, quaisquer atos sexuais com alguém que esteja
“inconsciente ou que por outras razões
não pode se opor ao ato” são considerados violação. A corte sentenciou a mulher nesta quarta-feira a nove meses de
prisão e ordenou a ela que pague 6.355
dólares em recompensa.
IV Encontro dos Povos da
Chapada dos Veadeiros
Foi realizado nos dias 6, 7 e 8 de maio
na cidade de Alto Paraíso/GO, que fica a
230Km de Brasília, o IV Encontro dos Povos da Chapada dos Veadeiros, organizado
pela Fundação Pró-Natureza (Funatura), teve
como objetivo resgatar a cultura local, principalmente musical. O evento teve música,
culinária, teatro, artesanato, terapias, poesia,
palestras, oficinas e danças. Os principais
patrocinadores do encontro foram o
SEBRAE-GO, a Funatura e a Prefeitura de
Alto Paraíso. O jovem prefeito de Alto Paraíso, Uiter Gomes de Araújo, de 31 anos, disse que suas expectativas sobre o evento se
superaram. “Em um fim de semana comum
a cidade ficou completamente lotada, mais
de 2 mil pessoas passaram pela festa por
noite. O que mais me deixou feliz no Encontro foi o depoimento das pessoas que
não tinham mais oportunidades de mostrarem seu valor cultural, de povos esquecidos como os Kalungas”, declarou o prefeito. Uiter declarou ainda que em Julho será
realizado na Vila de São Jorge um Festival
de Cultura e também uma EcoMaratona
(Jonathan Pinato Luasses)
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O ministro Gilson Langaro Dipp, do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), encerrou
o VII Congresso Internacional de Direito
Ambiental, realizado em Foz do Iguaçu (PR)
com palestrando sobre “A visão do STJ em
matéria ambiental”. A vice-presidente do
Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, desembargadora federal Marga Inge
Barth Tessler, presidiu a mesa. Ao abrir os
trabalhos, Marga fez uma rápida introdução
sobre o tema. Ela falou sobre a criação das
unidades de conservação, especialmente protegidas pelo artigo 225 da Constituição Federal (CF), que são “instrumentos da tutela
ambiental”. Essa norma, explicou a
magistrada, é inspirada no princípio da salubridade ambiental como direito de todos e
no da natureza pública e compulsória da
proteção ambiental. Marga citou os dois tipos de categorias das unidades de conservação: as integrais (como os parques nacionais
e os refúgios ambientais) e as de uso sustentável (áreas de proteção ambiental – APA – e
florestas nacionais, por exemplo). Não fazem parte do Sistema Nacional de Unidades
de Conservação da Natureza (SNUC), salientou a desembargadora, as áreas de proteção permanente e as reservas legais, indígenas e biológicas, entre outras. A seguir, o
ministro Dipp iniciou sua conferência. Ele
destacou que a lei que criou o SNUC foi um
passo fundamental na legislação ambiental
brasileira. Segundo o conferencista, o artigo
225 da CF refletiu “toda a legislação
ambiental brasileira até então existente”. O
ministro do STJ ressaltou que o Brasil tem
“uma longa história predatória, que vem
desde o período colonial”. O ministro lembrou de atividades que disputam espaço com
a preservação do meio ambiente: a pecuária,
a extração de madeira, o garimpo e a plantação de soja. “Não se pode tolher o desenvolvimento”, afirmou o magistrado, “mas
também não se pode esquecer da proteção
ambiental”. O ministro saudou a recente criação de uma unidade de conservação no município de Sinimbu (RS). A iniciativa, segundo Dipp, foi possível a partir de uma parceria entre a Souza Cruz e a Universidade de
Santa Cruz do Sul, onde pela primeira vez,
numa universidade, proprietária de uma
unidade de conservação, poderão ser realizados estudos universitários, escolares e dirigidos à comunidade. Dipp também falou
de casos negativos como a tentativa de redução drástica da APA da Ilha do Bananal, em
Tocantins. Essa reserva de mais de um milhão de hectares, “é quase um escudo para a
proteção ambiental da região, pois está no
ponto em que se encontram o Cerrado e a
Floresta Amazônica”. Conforme o conferencista, pressionado pelo agronegócio, “o governo está diminuindo a área em 89%”. O
Ministério Público Federal no Estado, afirmou, entrou com uma ação contra o ato na
Justiça Federal. Segundo Dipp, muitas ques-
Ascom/TRF4
Dipp & o Direito Ambiental
A desembargadora federal Marga Inge
Barth Tessler, presidindo a mesa
do evento ao lado do ministro Gilson
Langaro Dipp, do STJ
tões ambientais não chegam ao STJ, “pois o
sistema processual brasileiro tem mecanismos que obstruem a chegada dessas ações
aos tribunais superiores”. A missão do tribunal superior, lembrou o ministro, é fazer
com que a lei seja corretamente aplicada e
uniformizar as decisões tomadas pela Justiça em todo o país. Assim, o STJ não pode
reapreciar fatos e provas, salientou Dipp, “e
o Direito Ambiental está exatamente baseado nesses aspectos”. (Ascom/TRF4)
CNI instala Conselho de Responsabilidade Social
Com a presença da presidente
do Museu de Arte Moderna de São
Paulo (MAM) e do Instituto Itaú Cultural, Milu Villela, e do representante
da Unesco no Brasil, Jorge Werthein, o
presidente da Confederação Nacional
da Indústria (CNI), Armando
Monteiro Neto, instalou em maio, em
Brasília, o Conselho Temático Permanente de Responsabilidade Social da entidade. Na oportunidade, deu posse ao
presidente do Conselho, Jorge Parente
Frota Júnior, e outros 16 conselheiros.
Um dos principais focos de atuação do
novo Conselho será sensibilizar o maior
número possível de industriais, para que
exerçam ações de responsabilidade social no País. Jorge Parente Frota Junior,
que também preside a Federação das
Indústrias do Estado do Ceará (FIEC),
mostra o exemplo do seu Estado nessa
área de atuação. “No Ceará, desenvolvemos o Projeto de Formação Cidadã,
da qual participam 14 unidades de ensino superior do Estado, que implantaram disciplinas de Responsabilidade
Social em seus cursos, sendo que uma
delas até criou um curso de pós-graduação nesse ramo”, afirmou.
Festival de cursos
Continua o festival de criação de faculdades pelo país afora. De janeiro
a março deste ano foram reconhecidos e autorizados a funcionar 523
novos cursos superiores no país. A média é de quase 10 cursos por dia.
O Magistrado
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CARTA DOS EDITORES
Procurando respostas...
EXPEDIENTE
IMAG-DF
Instituto dos Magistrados
do Distrito Federal
Maio. Mês das mães e de receber um novo papa. De repensar valores familiares, sociais, políticos, religiosos.
Nós, como sempre, tentamos ficar antenados com o mundo
ao redor. Em nossa capa, o julgamento de Cristo, analisado sob o
ponto de vista jurídico. É fácil perceber como em todos os tempos e
lugares sempre houve e haverá armações para “derrubar” quem
incomoda os ditos poderosos.
Em nossa seção polêmica, um caso emblemático que aborda, segundo a decisão da justiça, um exemplo de abuso do Ministério Público. E fica uma pergunta que ouvimos certa vez num corredor: O Ministério Público protege a sociedade. Mas quem protege a sociedade do Ministério Público?
O caso também nos faz recordar de uma piada antiga: E
Jesus perguntou à multidão: - Quem não tiver errado que atire a
primeira pedra. Eis que o gajo mirou e acertou bem na testa de
Maria Madalena. Jesus, surpreso perguntou: - Você nunca errou?!
Ao que o gajo respondeu:
- Não dessa distância.
E como estamos discutindo mandos e desmandos, o Dr.
Giovanni Ettore Nanni nos concedeu uma preciosa entrevista sobre o enriquecimento ilícito.
Em nossa seção de saúde o problema abordado é a rinite alérgica. Quem diria? Ela afeta seriamente a vida escolar de nossas
crianças. Com o frio chegando, todo cuidado é pouco.
Eventos, iniciativas, cultura, direito do consumidor, enfim, a
revista foi feita pensando em você, que nos prestigia todo mês. Em
nossos encontros mensais, essa relação se fortifica. Que venha junho!
Até a próxima edição!
Marcos Linhares e Ednardo Viana
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O Magistrado
DIRETORIA
Presidente: Desembargador Valter Ferreira Xavier Filho (TJDF)
Vice-Presidente: Juiz de Direito Mário Motoyama (TJDF)
Diretor Cultural: Desembargador Pedro Aurélio Rosa de Farias (TJDF)
Tesoureiro: Juiz de Direito Irineu de Oliveira Filho (TJDF)
Secretário Geral: Desembargador José Wellington Medeiros de
Araújo (TJDF)
ASSESSORIA DA PRESIDÊNCIA
Juiz de Direito Agnaldo Siqueira Lima (TRF), Juiz de Direito
Antoninho Lopes (TJDF), Juiz de Direito Carlos Bismark Piske de
Azevedo Barbosa (TJDF), Juiz de Direito Clóvis Moura de Souza
(TJDF), Juiz de Direito Gilberto de Souza Sá (TJDF), Juiz de Direito Irineu de Oliveira Filho (TJDF), Desembargador José Wellington
de Medeiros Araújo (TJDF), Juiz de Direito Leandro Borges
Figueiredo (TJDF), Juiz de Direito Manoel Franklin Fonseca Carneiro (TJDF), Juíza de Direito Maria Leonor Leiko Aguena (TJDF),
Delegado Mauro Cezar Lima, Juiz de Direito Ronan Acácio Jacó
INSTITUTO DOS MAGISTRADOS DO DISTRITO FEDERAL - IMAG-DF
SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12 - CEP 70770-630 - Brasília - DF
TELEFONES: (61) 274-3110 ou 3037-3110
O Magistrado
O Matistrado em Revista é uma publicação do IMAG-DF. As opiniões emitidas em artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a posição da revista. É permitida a reprodução das matérias desde que
seja citada a fonte.
CONSELHO EDITORIAL
Toda a diretoria do IMAG-DF
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Desembargador Valter Ferreira Xavier Filho
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EDITOR EXECUTIVO
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COLUNISTAS
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REVISÃO
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REPORTAGEM
Jonathan Pinato Luasses
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COLABORADOR ESPECIAL
José Washington dos Santos
JORNALISTAS RESPONSÁVEIS
Marcos Linhares - Mtb 5017-DF
Ednardo Viana - DF 2924 JP
FOTOGRAFIA
Carlos Tiburcio / (61) 9969-7838
AGÊNCIAS NOTICIOSAS
Assessorias de Imprensa do STF, STJ, TJDF, Agência Brasil
(Abr), Agência Câmara, Agência Senado
PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO
Cláudia Capella e Paulo Pedersolli
ARTE E CAPA
Cláudia Capella
IMPRESSÃO
Gráfica Terra
TIRAGEM
30.000 exemplares
REDAÇÃO
SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12 - CEP 70770-630
Telefone: (61) 3037-3110
Brasília - DF
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alta Corte Jurídica do país é o eminente Ministro do STF Nelson Jobim”
RENAN PAES FELIX, João PessoaPB, por correio eletrônico
Nota da redação: Parabéns, Renan.
Mandaremos o livro do Dr. Lair Ribeiro, sobre câncer de mama, pelo correio.
ESPAÇO UNIVERSITÁRIO
Textos com maior repercussão
- Um tapa na Constituição
- Porte de armas por autoridades
- Neuza Maria, a primeira
desembargadora negra do país
- Empréstimos ao servidor sem
consultar SERASA e SPC
42%
21%
19%
11%
Edição XXIII
Edição de abril de 2005
GANHADOR DA PROMOÇÃO
“CÂNCER DE MAMA”
“Não sei se já mandaram algum e-mail,
mas o membro do Imag-DF que atualmente ocupa a presidência da mais
“Primeiramente, venho parabenizar a
todos os que fazem parte da redação, pela qualidade da revista, pois
consiste em intensa contribuição para
os que militam na seara jurídica e também em áreas diversas. Sou acadêmica de Direito da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) e curso atualmente o 9º (nono) período
nesta Instituição. Sabedora da oportunidade que vocês dão, reservando
um espaço para artigos de estudantes universitários, estou enviando um,
de minha autoria, para tentar publicação. Se esta for possível ou não,
gostaria de receber uma resposta”.
JANAÍNA DE LIMA VEIGA, Acadêmica de Direito, Unicap-Recife-PE
Nota da redação: Janaina, seu texto é muito bom e está nesta edição.
C A R TA S PA R A A R E D A Ç Ã O
As cartas para a redação de O Magistrado em Revista devem ser endereçadas para:
Editor-chefe, O Magistrado em Revista
SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12
CEP: 70770-630 - Brasília - DF
Fax: (61) 3037-3110
Correio eletrônico: [email protected]
As cartas devem ser encaminhadas com assinatura, identificação, endereço e telefone do
remetente. O Magistrado em Revista reserva o direito de selecioná-las e resumi-las para publicação. Mensagens pela internet sem identificação completa não serão levadas a sério. Só podem
ser incluídas na edição do mês as cartas que chegarem à redação até as 17 horas do dia 14 do mês
anterior.
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DO ESPIRÍTO SANTO
A referida revista é, sem qualquer dúvida, um excelente suporte para discussões dos mais modernos e atuais temas jurídicos, servindo de objeto
facilitador da compreensão dos mesmos. Solicito a continuidade do envio
dos exemplares para que eu continue
sendo agraciada com tão incomum
obra jurídica.
LUCIENE TREVIZANI GONÇALVES , Linhares-ES , Bacharel em
Direito
Nota da redação: Luciene, o
departamento responsável já foi avisado.
A SERVIÇO DOS LEITORES
Nossos telefones
Central de Atendimento ao Anunciante
Diariamente de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h.
Assinaturas
Estamos em processo de instalação de sistema de assinaturas.
Muito em breve, avisaremos o início do oferecimento de mais
esse serviço.
Central de atendimento às faculdades e projetos educacionais
Também estamos em processo de instalação desse sistema.
Muito em breve, avisaremos o início do oferecimento de mais
esse serviço.
Internet: www.imag-df.org.br
Distrito Federal (Brasília): (61) 274-3110
São Paulo e Rio de Janeiro: Em breve
Demais localidades: em análise e sob consulta
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Ao fornecer seus dados cadastrais para qualquer fim junto ao
IMAG-DF, seu nome será incluído em lista específica de clientes preferenciais para envio de material de divulgação e
promoções do Instituto ou de terceiros, parceiros da instituição. Caso não concorde, escreva para as centrais de atendimento ao anunciante e/ou assinaturas: SHCGNCR 716 Bloco
C Loja 12 - CEP 70770-630 - Brasília - DF.
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Redação e correspondência
Brasília (sede): SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12
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Paraná - Chefe: Ana Navarro / (41) 353-3166
[email protected]
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The “LEI” is on the table
Brasil e Grã Bretanha realizaram um seminário com uma visão
comparada de tópicos emergentes da advocacia internacional
Fotos:Divulgação
O Presidente em Exercício do Conselho
Federal da OAB, Aristóteles Atheniense,
esteve presente na abertura do
seminário
O Presidente em Exercício do
Conselho Federal da OAB, Aristóteles
Atheniense, esteve presente na abertura do seminário e agradeceu a colaboração da OAB de São Paulo, do
embaixador e do cônsul da GrãBretanha e ressaltou a importância da
troca de experiências no intercâmbio
de advogados do Brasil e da Inglaterra.
O embaixador da Grã Bretanha
no Brasil, Peter Collecott, também esteve presente e comentou sobre as idas
e vindas dos jovens advogados de
ambos os países. “As interações de leis
entre os países são muito importantes
para a relação política”, explicou o
embaixador. Além de ter ressaltado a
importância da idealização do seminário.
Quatro temas foram abordados em painéis pelos palestrantes. O
primeiro painel falava da Visão Comparativa dos Sistemas e Estruturas
Legais Inglesa e Brasileira (Common Law
e Direito Codificado), os palestrantes
foram o Desembargador do Tribunal
de Justiça de São Paulo, Ricardo
Lewandowski, o advogado britânico
Dominic Minett, além do sócio-titular da Advocacia Rodrigues do Amaral
em São Paulo e coordenador científico do seminário, Antônio Carlos
Rodrigues do Amaral.
No segundo painel, o tema era
Transações – Oportunidades na Inglaterra e no Brasil: Tópicos Atuais
que teve como palestrantes a membro integrante do Conselho de Relações Internacionais do Conselho Fe-
Por Jonathan Pinato Luasses
O Conselho Federal da Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB) e a
Law Society of England & Wales, realizaram no último dia 08 de abril, no
Centro Brasileiro Britânico em São
Paulo, um seminário sobre a comparação dos modelos jurídicos do Brasil
e da Grã-Bretanha.
As palestras realizadas no evento fazem parte do Acordo de Amizade assinado entre as entidades que realizaram o seminário em setembro do
ano passado a fim de estimular o intercâmbio de profissionais de Direito
dos dois países.
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O Magistrado
Os advogados Horácio Bernardes Neto e Alberto Zacharias Toron, além da sócia do
escritório de advocacia inglês Collyer Bristow, Silvia Fazio apresentaram o painel
“As Especializações Jurídicas no Brasil e na Inglaterra”
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Definição de
Common Law
O coordenador científico do seminário,
Antônio Carlos Rodrigues do Amaral.,
participou do ´painel que abordava a
Visão Comparativa dos Sistemas e
Estruturas Legais Inglesa e Brasileira
(Common Law e Direito Codificado)
deral da OAB, Isabel Franco, o advogado Mário Sérgio Garcia e do
especialista britânico em capital
markets e sócio da Clifford Chance,
Charles Johnson.
No terceiro painel as Especializações Jurídicas no Brasil e na Inglaterra foi o tema abordado. A mesa
contou com o advogado Alberto
Zacharias Toron, a sócia do escritório de advocacia inglês Collyer
Bristow, Silvia Fazio, além do também advogado, Horácio Bernardes
Neto. Detalhes de como investir no
Reino Unido, as diferenças do Código Civil Brasileiro e da Common Law,
foram alguns dos assuntos abordados no painel.
Fechando o seminário o tema
era Resolvendo Problemas - Solução de Controvérsias na Inglaterra e
no Brasil teve como palestrantes os
advogados Rubens Aprobatto e Gilberto Giusti que também é árbitro inscrito na Corte Brasileira de Mediação e Arbitragem Empresarial
(CBMAE), além de mais dois advogados britânicos especialistas em lití-
Termo utilizado para referir-se a nor mas e reg ras de
caráter jurídico não escritas, porém sancionadas pelo costume ou
pela jurisprudência. O nome vem
da concepção do direito medieval inglês que, ao ser ministrado
pelos tribunais do reino, refletia
os costumes comuns dos que
nele viviam. Este sistema legal
vigora na Inglaterra e em todos
os países originalmente colonizados pelos ingleses. Parte do princípio de que as questões devem
ser resolvidas tomando-se como
base sentenças judiciais anteriores, e não preceitos legais fixados antecipadamente. Este princípio é o que o distingue do sistema do direito continental europeu e dos demais países. A reunião de sentenças judiciais sobre
várias situações semelhantes permitem extrair regras gerais que
geram precedentes e que se convertem em orientações para o julgamento futuro dos juízes, em
casos análogos.
gios e arbitragem, o representante da
Clyde & Co em Londres, e do sócio
da DLA Piper Rudnick Gray Car y,
Jonathan Bruce. Os tipos e pesos dos
poderes judicários do Brasil e da Inglaterra, cortes e arbitragens e a importância das conciliações e mediações foram os principais assuntos
abordados.
A advogada Ângela Saade esteve presente no seminário e falou
que o evento trouxe considerações
bem esclarecedoras sobre a diferença entre o common law e o direito
codificado, bem como demonstrou
que a troca de experiências e interesses entre brasileiros e estrangeiros é
essencial para a atuação do profissional de direito, principalmente devido às atuais circuns tâncias da circulação de pessoas, bens e
ser viços no mundo. “Achei
o Seminário de grande importância,
pois os profissionais de certas
áreas devem manter-se atualizados e
estar atentos às tendências
do direito em âmbito internacional”,
declarou Ângela.
O presidente da OAB-SP,. Luis Flávio
Borges D´urso foi um dos apoiadores
do seminário
O Magistrado
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DIREITO DO CONSUMIDOR
A farra está prestes a acabar
Comissão da Câmara aprova fim de
prazos nos créditos de celulares pré-pagos
Fotos:Divulgação
Por Regina Vendeiro, advogada da área cível da
Advocacia Innocenti e Associados
A
Comissão de Defesa do
Consumidor (CDC) da
Câmara dos Deputados
aprovou nesta quartafeira, por unanimidade,
parecer sobre o Projeto de Lei nº
7.415/02, de autoria do deputado
Pompeo de Matos (PDT/RS), que proíbe as operadoras de telefonia móvel
de imporem limite de tempo para utilização de créditos ativados dos celulares pré-pagos.
Hoje, como regra geral, as operadoras determinam um período de
três meses para que o usuário consuma
em ligações valores na faixa dos R$ 50,
ou de um mês para valores inferiores.
As operadoras
determinam um
período de três
meses para que
o usuário consuma
em ligações valores
O projeto assegura aos consumidores o direito de utilização de seus créditos
ou reembolso das quantias pagas, independentemente do prazo de validade,
afirma a advogada Regina Vendeiro.
12
O Magistrado
na faixa dos R$ 50
DIREITO DO CONSUMIDOR
A medida se aprovada pode beneficiar cerca de 54 milhões de usuários de
aparelhos pré-pagos.
“O teor do projeto está em consonância com o Código de Defesa do
Consumidor e o voto dos deputados
corrobora decisões já proferidas pelo
Judiciário brasileiro, que vem assegurando aos consumidores o direito de utilização de seus créditos
ou reembolso das quantias pagas, independentemente do prazo de validade”, afir ma a
advogada Regina Vendeiro, da
área cível da Advocacia
Innocenti e Associados.
Ela lembra recente
decisão do desembargador João Egmont, da
O deputado Celso Russomano, relator do parecer, propôs o prazo mínimo
de um ano para a validade dos créditos.
1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça
do Distrito Federal, que determinou
que as operadoras de telefonia não
podem estabelecer prazo de validade
para a utilização dos créditos, sendo
fixada multa diária de R$ 50 mil em
caso de descumprimento.
“Tal iniciativa visa evitar o enriquecimento ilícito das operadoras que
se beneficiam dos valores pagos, sem
que tenham prestado os respectivos
serviços, em detrimento do consumidor que vê, abusivamente, subtraída a
opção de reembolso das quantias pagas pelos créditos, que nunca poderão
ser utilizados em virtude da expiração
do prazo”, destaca.
A especialista enfatiza outros
pontos positivos na votação realizada
na Comissão. O deputado Celso
Russomano, relator do parecer, propôs
o prazo mínimo de um ano para a validade dos créditos. Outro item beneficia também os usuários de celulares
pós-pagos. Nesse caso, as ligações
franqueadas todo mês pela assinatura
básica, que não sejam realizadas, devem
ser acumuladas para os próximos meses.
Regina observa que “o consumidor só deve pagar pelo serviço
efetivamente prestado. Assim, não é
razoável que perca o direito à utilização de pulsos ou minutos que não utilizou durante o mês. Caso o projeto
seja aprovado, as operadoras terão que
se adequar, visto que o descumprimento acarretará aplicação de várias
sanções previstas no art. 173 da Lei
9472/97”, alerta a advogada.
Ao projeto de lei 7.415/02, cujo
substitutivo segue agora para apreciação da Comissão de Tecnologia da
Câmara, foram anexados outros dois
projetos de lei a respeito do mesmo
assunto que já tramitavam na Câmara.
O de nº 4.441/04, da deputada Teté
Bezerra (PMDB-MT) e o 4.182/04,
apresentado pelo deputado Carlos
Nader (PL-RJ). Regina Vendeiro ressalta que “a aprovação do projeto reforçará os direitos do consumidor perante as empresas de telefonia”, conclui.
O Magistrado
13
DIREITO DO CONSUMIDOR
Vagas de garagens lideram
conflitos em condomínios
Especialista levanta problemas comuns e aponta possíveis soluções
sempre objeto de assembléias de
moradores, pautadas pelo bom senso.
Outra saída é estabelecer regras específicas na Convenção do Condomínio para
uso e proveito das vagas por todos os
moradores de forma igualitária.
2. Vagas indeterminadas
U
m dos problemas
mais discutidos hoje
em assembléias condominiais é a quest ã o d a s g a r a g e n s.
Do aluguel a terceiros, passando
pelo número de vagas disponíveis
e destinação dos espaços, até as
formas e prazos para realização de
rodízios – todos os pontos são
objeto de discussões acaloradas.
Juliana Mensitieri Baldocchi,
da área cível da Innocenti Advogados Associados destaca os problemas comuns e as possíveis soluções.
14
O Magistrado
1. Garagens adquiridas
juntamente com as unidades
e que não são entregues
exatamente com as
metragens prometidas.
A legislação de condomínio não
traz disposição legal que possa ser aplicada. Mas, com base na responsabilidade civil (Código Civil), pode-se recorrer à Justiça contra a construtora ou
incorporadora, obtendo-se assim um
abatimento do preço ou não sendo mais
possível, uma indenização pelo prejuízo. Nas relações com os condôminos,
a solução efetiva do problema deve ser
Quando se trata de vagas
indeterminadas, a forma de distribuição é mais justa quando se utiliza o rodízio por sorteio, porque ele garante a
igualdade de direito que deve existir
entre os moradores. Assim, a sugestão
é que seja feito um novo sorteio a cada
gestão do síndico, que não poderá ser
superior a dois anos. O rodízio deve
constar da Convenção ou do Regulamento Interno, incluindo-se aí o período de tempo da utilização da vaga. As
vagas indeterminadas serão sempre uti-
Outra questão
levantada é sobre
a responsabilidade por
danos causados aos
veículos como avarias,
furtos e roubos
Divulgação
lizadas na forma prevista na convenção, ou, na omissão desta, de acordo
com deliberação da assembléia de
condônimos. Definido na convenção o
critério a ser observado, somente a unanimidade dos condôminos poderá
alterá-lo, já que se cuida de mudança
da destinação da coisa comum com
prejuízo a direitos adquiridos.
3. Aluguel e venda de garagens
O Novo Código Civil trouxe, em
seu artigo 1.338, determinação expressa
acerca da preferência, em condições
iguais, entre os condôminos, deixando
estranhos ao condomínio como última
hipótese, até mesmo por questão de segurança. O aluguel e venda das garagens
devem ser regulados na Convenção, mas,
em caso de omissão, a aprovação e deliberação em assembléia dependerão de
quórum de 2/3 dos condôminos, tendo em vista as implicações de risco que
poderão ser ocasionadas pelo negócio.
4. Alienação de vagas de
garagens a terceiros, estranhos
ao condomínio
Não há previsão legal específica
para alienação de vagas de garagens a
terceiros estranhos ao condomínio, devendo essa questão ser dirimida pela
Convenção Condominial e Assembléias convocadas para tanto. Vagas
indeterminadas são consideradas partes acessórias às unidades condominiais,
podendo, segundo disposição do art.
1.339, § 2º, CC, ser alienadas a outros
condôminos. A alienação a terceiro só
pode ocorrer, se houver expressa previsão na convenção.
5. Mais apartamentos
do que garagens
Se a oferta era de uma garagem
por apartamento, a questão deverá ser
O aluguel e venda das garagens devem ser regulados na Convenção,
afirma Juliana Mensieteri Baldocchi
tratada fora do Condomínio, buscando-se as vias judiciais adequadas, acionando-se a incorporadora ou construtora responsável pela obra e comercialização das unidades.
Juliana lembra ainda que a utilização das garagens para outros fins, que
não seja a guarda de veículos, também é
ponto de atrito nos condomínios. “Essa
matéria também deve vir expressa na
Convenção e, em caso de estar definido
o uso específico para guarda de veículos terrestres, ou seja, carros e motos,
estará vedada a sua utilização para guardar objetos, bicicletas, colocar entulhos,
entre outros itens”, destaca.
Outra questão levantada pela especialista é sobre a responsabilidade
por danos causados aos veículos como
avarias, furtos e roubos. Nesses casos,
conforme orientação jurisprudencial, o
condomínio só é responsável por furtos e danos aos veículos estacionados
nas garagens se estas dispuserem de vigilantes específicos para este fim e/ou
manobristas. “Em qualquer dos casos,
vale acrescentar na Convenção quais são
as responsabilidades do condomínio,
ou ainda, incluir um item que deixe claro que o condomínio não se responsabiliza por roubos de veículos ou por
furtos de objetos deixados em seu interior e outro que decida pela contratação de um seguro para esses fins”,
propõe.
Juliana Baldocchi sugere também que, “para o caso de omissão na
Convenção Condominial ou Regulamento Interno, a orientação mais adequada é a deliberação em assembléia,
inclusive no tocante às sanções e ao
valor de multas para o caso de descumprimento das regras”, conclui.
O Magistrado
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E N T R E V I S T A
Giovanni
Ettore
Nanni
Discutindo o
enriquecimento
sem causa
Enriquecimento sem causa.
Tema inquietante num país onde
não é difícil achar alguém que se
encaixe no perfil. O dr. Giovanni
Ettore Nanni, que recentemente
lançou um livro sobre o assunto,
nos brinca com uma verdadeira aula
sobre o assunto.
Divulgação
Qual a origem do enriquecimento sem causa?
Caracterizam o enriquecimento sem causa: o enriquecimento, o empobrecimento, o
nexo de causalidade, a ausência de justa causa e a subsidiariedade da ação de
enriquecimento, afirma Giovanni Ettore Nanni
16
O Magistrado
Giovanni Ettore Nanni - O
tema tem origem no Direito Romano.
No entanto, há muita controvérsia se
este teria sofrido influência grega. Segundo um autor francês, o enriquecimento sem causa desenvolveu-se no
Direito Romano sob influência da filosofia grega, com base no velho
dogma que explica o mito de Nêmesis,
personificação da justiça na mitologia:
é necessário que o equilíbrio entre os
E N T R E V I S T A
homens
não
seja
mero
compromisso.De qualquer forma, não
obstante essa divergência, aponta-se,
com base em duas passagens do
Digesto, de Pompônio, quais sejam, jure
naturae aequum est neminem cum
alterius detrimento et injuria fieri
locupletiorem (D. 50. 17. 206) e nam
hoc natura aequum est neminem cum
alterius detrimento fieri locupletiorem
(D. 12. 6. 14), que no Direito Romano
antigo esboçou-se um princípio do
enriquecimento sem causa, aplicado a
casos particulares. Ainda Direito Romano, a concepção das condictiones sine
causa, da actio de in rem verso e da
actio negotiorum gestorum contraria
foram as grandes propulsoras do instituto.
Como é tratado o instituto do
enriquecimento sem causa pelo direito brasileiro?
Giovanni Ettore Nanni - O
enriquecimento sem causa é inserido
entre os atos unilaterais no Código Civil de 2002, nos arts. 884 a 886. Em
minha opinião, a despeito de inúmeras
teses existentes, estas não consolidam
nem esgotam a aplicabilidade do instituto. Sustento que o enriquecimento sem
causa possui um caráter dúplice, como
fonte obrigacional, quando dá ensejo à
interposição da ação de enriquecimento, e como princípio corretivo, para
purgar os desequilíbrios e as
desproporcionalidades, de forma ilimitada, desde que não contrarie a lei, nas
situações em que não se apresente como
fonte obrigacional. Entendo a previsão
do art. 884 do Código Civil como
uma cláusula geral da vedação do enriquecimento sem causa, pois, pelo fato
de a ação de enriquecimento impossibilitar uma fórmula única para sua utilização, a melhor estrutura é baseada em
um sistema móvel de cláusula geral e
aberta, que concilia as diferentes situa-
ções que ensejam o exercício da ação,
não engessando o quadro de hipóteses. E também porque sendo o enriquecimento sem causa um princípio
informador de todo o direito brasileiro, ele espraia os seus efeitos a qualquer
relação obrigacional. Por ser uma cláusula geral, atua mesmo que a hipótese
sob apreciação não permita o exercício da ação de enriquecimento, consubstanciando-se em ferramenta muito útil
para corrigir situações de desproporção patrimonial que evidencie a violação ao espírito emanado do preceito.
Em sua obra, o Sr. afirma
que, apesar de ser considerado na
doutrina, na jurisprudência e entre
os operadores do direito em geral
como sinônimo, o enriquecimento
sem causa e o enriquecimento ilícito são figuras distintas, jungidas a
situações jurídicas específicas e diferenciadas. Como podem ser distinguidos estes dois institutos?
Giovanni Ettore Nanni - O
enriquecimento sem causa é um remédio geral obrigacional previsto no Código Civil de 2002, que possui uma natureza dúplice como fonte obrigacional
e como princípio, cuja aplicabilidade
pode ocorrer no âmbito do direito privado e do direito público. Além disso,
o enriquecimento sem causa prescinde
“O enriquecimento
sem causa é
inserido entre
os atos unilaterais
no Código Civil
de 2002, nos
arts. 884 a 886”
do ilícito para sua configuração, pois o
ilícito é pressuposto para a responsabilidade civil e não para o enriquecimento sem causa. O enriquecimento ilícito
é um desígnio típico do direito administrativo, estando ligado aos atos de
improbidade administrativa, tipificado
em lei especial, Lei n. 8.429, de 2 de
junho de 1992. Logo, são assuntos autônomos, submetidos a diferenciadas
leis, com requisitos tipificadores diversos.
Quais os pressupostos para
caracterização do enriquecimento
sem causa?
Giovanni Ettore Nanni - Em
geral, são indicados cinco pressupostos para a caracterização do enriquecimento sem causa: o enriquecimento, o
empobrecimento, o nexo de causalidade, a ausência de justa causa e a subsidiariedade da ação de enriquecimento.
Em resumo, o primeiro requisito (o
enriquecimento) significa a ocorrência
de uma vantagem indevidamente
auferida pelo enriquecido. Esse enriquecimento pode apresentar o mais amplo aspecto, em qualquer circunstância
objetiva de aumento patrimonial, diminuição do passivo ou vantagem não
patrimonial. O segundo requisito (o
empobrecimento) pode consistir numa
diminuição efetiva do patrimônio ou
no fato de ter impedido o seu aumento. No entanto, uma vez que em variadas vicissitudes, inclusive de vantagem
não patrimonial, o empobrecimento
pode não ser configurável de forma
concreta no patrimônio do empobrecido, tal requisito pode ser dispensado.
O terceiro requisito (o nexo de causalidade) impõe a necessidade que exista
um liame causal entre aquele que, sem
justa causa, se enriquecer à custa de
outrem e o fato que ocasionou esse
enriquecimento. A ausência de justa
causa é o quarto requisito do tema, li-
O Magistrado
17
E N T R E V I S T A
gado à falta de fundamento no enriquecimento proporcionado ao enriquecido, por decorrência de um negócio inexistente, ilegal, nulo, anulável
etc., não sendo possível estabelecer a
priori, dada a conotação de cláusula
geral, quais as hipóteses em que se configura, o qual inclusive pode ocorrer
de forma superveniente, nos termos
do art. 885 do Código Civil de 2002.
A subsidiariedade da ação de enriquecimento é o último requisito para a
configuração do enriquecimento sem
causa, a qual decorre do art. 886 do
novo Código Civil. A despeito das
variadas maneiras de interpretação do
dispositivo, não deve preponderar a
forma abstrata, em que a mera exis-
tência de uma outra ação no plano teórico impediria o exercício da ação de
enriquecimento, mas sim a forma concreta. O correto enfoque da
subsidiariedade não é a concorrência
com outra ação - o que pode ocorrer
dependendo do preenchimento dos
requisitos específicos -, mas é o impedimento de obter-se a violação ou
fraude da lei. Nessa linha de raciocínio, não pode a ação de enriquecimento, por exemplo, suplantar uma situação fulminada pela prescrição ou pela
decadência, visto que violaria a lei.
Ocorre o instituto do enriquecimento sem causa no âmbito do
direito administrativo?
Giovanni Ettore Nanni - No
âmbito do direito administrativo o preceito que veda o enriquecimento sem causa também encontra acolhida, especialmente nos contratos firmados pela Administração Pública, em caso de anulação, quando as prestações eventualmente
desempenhadas em favor do Poder Público não encontrarem contraprestação.
A mesma situação deflui da revogação
ou invalidação do procedimento de licitação, em que verbas despendidas poderão eventualmente ser reavidas, conforme disposição da Lei n. 8.666/93. A justificativa de tais dispositivos é a atuação
marcante da norma que impede o
locupletamento injustificado.
Fonte: Saraijur
Enriquecimento Sem Causa - Col. Prof.
Agostinho Alvim, de Giovanni Ettore Nanni,
Editora Saraiva, R$ 84,00, 437 páginas. Esta obra
trata com a devida abrangência do
enriquecimento sem causa, suprindo carência da
literatura jurídica. Para dissecar o tema, o
Capítulo I faz uma ampla retrospectiva dos
antecedentes históricos do enriquecimento sem
causa. O Capítulo II destina-se à análise do
enriquecimento sem causa no direito estrangeiro.
O Capítulo III e os seguintes estudam o tema no
direito brasileiro, comparando o CC/1916 com o
CC/2002 e discorrendo sobre as teorias do
enriquecimento sem causa e outros aspectos
teóricos. Nas palavras do autor, a previsão
expressa desse instituto no CC/2002 “simboliza
um avanço na salvaguarda da retidão e equilíbrio
nas relações jurídicas, em atendimento aos
parâmetros da socialidade que timbram o novo
Código”. A obra propicia, portanto, a ideal
compreensão da concepção inovadora adotada
pelo CC/2002
18
O Magistrado
T E C N O L O G I A
Do papiro ao
software ecológico
Quem diria? A tecnologia pode ser uma alternativa ao desperdício
de papel e assim, contribuir para a preservação das florestas
Por Rubens Manino é sócio fundador da BCS Informática, especializada em
soluções para escritórios de advocacia. E-mail: [email protected]
O mais antigo papiro que
se tem notícia data de 2200 a.C.
De lá para cá, o ser humano consagrou o papel e lhe deu as mais
diversas utilizações. Entretanto,
seu uso exacerbado e crescente,
aliado a outras utilizações da madeira, também fez crescer os
desmatamentos. Para se ter uma
idéia, a taxa anual de desmatamento da Amazônia Legal
para o período de agosto/2001
a agosto/2002 - chegou a 25.500
km2 , o que equivale a 5,1 milhões de campos de futebol, um
aumento de 40% em relação ao
ano anterior.
É válido, portanto, buscar alternativas viáveis para reduzir seu uso. É o setor corpo-
rativo que mais utiliza papel e, infelizmente, há desperdício. Imprimem-se
documentos, arquivos, rascunhos, emails e tantos mais, para ler, fazer anotações e, depois, jogar no lixo. E, dependendo do ramo de atividade, o uso
e o descarte de papel é ainda maior. É
o caso da área jurídica. As advocacias e
fóruns estão abarrotados de processos,
despachos, petições de todos os tipos,
em papel. E os rascunhos que foram
para o lixo antes disso são incontáveis.
Mas, já se nota a substituição do
papel, senão definitiva, pelo menos de
forma significativa. E, quem diria? É a
tecnologia que vem fornecendo paulatinamente recursos para isto, e assim,
contribuído para diminuir o uso desmedido e, por conseguinte, o desmatamento das florestas. A ajuda vem dos,
por assim dizer, softwares ecológicos
que compartilham informações, digitalmente, e fazem circular documentos
e conhecimentos para os profissionais
envolvidos darem seu parecer, eliminando sucessivas cópias em papel durante o processo.
Existem também programas
que gerenciam o fluxo e padronizam
os processos de trabalho e reduzem em
mais de 30% o volume de papel. Escritórios de advocacia que automatizaram também os processos administrativos conseguiram atingir uma redução
ainda maior, chegando a 35%. Por sua
vez, as publicações no Diário Oficial
que, antigamente, seguiam para os advogados em papel, hoje chegam por
e-mail; a certificação digital, além de
toda comodidade e avanço que representa, é também um aliado ecológico,
uma vez que elimina o uso desnecessário. O e-mail também reduziu consideravelmente o uso do fax e os
“Existem também programas que
gerenciam o fluxo e padronizam os
processos de trabalho e reduzem em
mais de 30% o volume de papel.”
20
O Magistrado
scanners de mão eliminaram a necessidade de cópias em papel de andamentos e peças processuais nos fóruns.
Parece pouco, mas se trata de um
grande alento para a natureza. Gradativamente, mais e mais corporações
aderem aos meios eletrônicos e às soluções que, além de imprimir eficiência
aos processos de trabalho, reduzem o
gasto excessivo do papel. Sabemos que
é impossível abolir o seu uso, mas é
viável implantar processos que garantam o uso consciente. Em última instância, trata-se de uma nova conformação em que as maiores mudanças ainda estão por vir.
É bem verdade que nos últimos
anos, com o crescimento do número
de madeiras de reflorestamento e com
a reciclagem do papel e do papelão,
houve redução nos desmatamentos
predatórios para retirada da celulose.
Entretanto, ainda é pouco. Segundo o
fundo Mundial para a Natureza (WWF),
o Brasil tem a maior taxa de desmatamento do mundo. A mata Atlântica,
por sua vez, é uma das áreas mais atingidas pelo desmatamento no País. Já a
Mata de Araucária, encontrada na região Sul e parte do estado de São Paulo e cuja espécie dominante é a Araucária Angustifólia, ou Pinheiro do
Paraná, tem uma variada utilização na
indústria de móveis, construção civil, e
fábricas de papel e celulose. Por ser a
principal fonte produtora de madeira
do País, essa mata quase foi completamente ! extinta. (Fonte: Almanaque
Abril -1999 e 2000)
E, apesar da conscientização das
pessoas sobre os danos causados pelo
desperdício de papel, não é nem de longe suficiente. O desmatamento é tão
grave que coloca em risco a biodiversidade e fontes vitais como o ar e o solo
além de desequilibrar o ecossistema. É
por isto que a tecnologia coloca-se como
uma alternativa. Não única, mas importante na preservação das florestas.
Divulgação
T E C N O L O G I A
“As advocacias e fóruns estão abarrotados de processos, despachos,
petições de todos os tipos, em papel”, Rubens Manino
De fato, a preocupação com a
natureza parece ser recorrente em nossos dias. Há um sentimento generalizado e uma unanimidade sobre as conseqüências que a destruição dos recursos naturais acarreta para a vida no planeta. A necessidade de preservação dos
recursos naturais é evidente. Todos sabem (embora nem sempre pratiquem)
que o desmazelo e o prolongado pouco caso com a natureza levaram muitos animais à extinção; que a água po-
tável é um recurso esgotável; que a
poluição dos rios e do ar e a contaminação do solo e dos oceanos com produtos tóxicos trazem danos irreparáveis
para a saúde.
Neste contexto, cabe a cada
um, principalmente as corporações,
fazer sua parte. O desperdício de papel colabora para a destruição das
florestas, o que pode varrer do planeta muitas espécies da flora e da
fauna.
O Magistrado
21
S
E
R
V
I
Ç
O
Precatório: saiba o que é e
como fazer para recebê-lo
Tribunal de Justiça do Distrito Federal lança serviço de tira-dúvidas,
que funciona, inclusive, pela internet
Se você já ouviu falar de
precatório, mas não entende bem do
que se trata, não precisa se preocupar:
o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) está com o
serviço para atender ajudá-lo a ficar
por dentro do assunto. A primeira informação que você deve saber é que o
precatório é uma ordem judicial para
pagamento de débitos dos órgãos públicos federais, estaduais, municipais ou
distritais. Tais débitos recaem sobre esses órgãos públicos por terem sido
condenados a indenizar o cidadão. Em
segundo lugar, é preciso esclarecer que
o precatório só pode ser iniciado quando a ação judicial não comporta mais
qualquer tipo de recurso. Além disso, o
pagamento desse tipo de dívida depende de depósito pela esfera de governo
condenada a indenizar o cidadão –
União, Estados, Municípios ou Distrito Federal. Cada um desses níveis de
governos deve fazer constar de seus
orçamentos anuais a previsão de pagamento de seus precatórios. Atualmente, cerca de dois mil precatórios no
Distrito Federal aguardam quitação por
parte do governo local. Diversos desses processos envolvem mais de um
credor e, infelizmente, muitos dos atuais beneficiários estão aguardando pagamento há anos, alguns até mesmo há
décadas. Algumas dessas pessoas estão
22
O Magistrado
S
acometidas de doenças cardiovasculares, câncer, entre outras graves doenças, e morrem sem receber o dinheiro que o Estado lhes deve.
COMO É FORMADO UM
PRECATÓRIO?
Depois que a Justiça der ganho
de causa definitivo ao cidadão, condenando o ente federativo a indenizá-lo,
o Juiz expede um documento, nos
moldes de ofício, endereçado ao Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, no caso de
Brasília, a quem cabe, por força constitucional, adotar as providências necessárias para que o pagamento se concretize. Após o recebimento do pedido, o Presidente do TJDFT autoriza o
início do processo de precatório, que é
formado a partir de documentos enviados pela Vara, e que passa a ter andamento no Serviço de Precatórios da
Secretaria Judiciária.
DE ONDE VEM O
DINHEIRO PARA
PAGAMENTO DOS
PRECATÓRIOS?
O dinheiro vem sempre das entidades devedoras. Nesse caso, todos
os valores para pagamento dos
precatórios são depositados em uma
conta única. O TJDFT está concluindo
um estudo para alterar o sistema atual
desses depósitos para garantir que esses recursos tenham rendimento. Essas
novas regras constarão de uma Portaria do Presidente do TJDFT que será
publicada em breve. A idéia é criar contas individuais para esses depósitos, que
deverão ser vinculadas aos Cartórios
das Varas. Mas é bom lembrar que o
pagamento dos precatórios depende de
previsão orçamentária. Por exemplo, se
o DF tem R$ 1 milhão em precatórios
a desembolsar no ano de 2006, o mon-
tante deve constar do Orçamento aprovado no exercício de 2005 pela Câmara Legislativa.
O PAGAMENTO DO
PRECATÓRIO TEM DE
OBSERVAR UMA ORDEM?
Sim. Nenhum precatório pode
ser pago em desacordo com a ordem
cronológica de registro (autuação) dos
processos. Isso significa que a quitação
de cada precatório tem, obrigatoriamente, que seguir a ordem numérica
das autuações. A determinação está
expressa na Constituição Federal, em
seu artigo 100. Apesar dessa exigência,
a própria Constituição autorizou, no
ano de 2002, o pagamento dos
precatórios de pequeno valor, ou seja,
aqueles de até 40 salários mínimos (R$
10,4 mil), no prazo de até 60 dias
(Emenda Constitucional nº 37). Antes
dessa Emenda, o Governo do Distrito Federal e os demais entes federados
não tinham prazo fixado para pagar
essas pequenas quantias. Hoje, há duas
listas de precatórios, sendo que aqueles
precatórios de pequeno valor não entram mais na mesma lista dos inúmeros precatórios de grande valor pendentes de pagamento.
NÚMEROS TJDF
O Tribunal vem cumprindo, rigorosamente, a ordem cronológica de
autuação, inclusive no que se refere aos
créditos de até 40 salários mínimos. Os
créditos de natureza alimentícia, aos quais
é dado um tratamento diferenciado pela
Constituição, também seguem entre si
uma ordem cronológica. Quantas pessoas foram contempladas com o pagamento de precatórios em 2004? Entre
abril e dezembro do ano passado, cerca
de 80 credores antigos foram beneficiados com o pagamento dos precatórios.
Alguns dos que receberam tinham
E
R
V
I
Ç
O
precatórios com processos iniciados há
30 anos. A demora ocorreu pelo fato
de os devedores não terem efetuado o
depósito anteriormente.
AINDA EXISTEM
PRECATÓRIOS PENDENTES
DE PAGAMENTO?
Sim. De um universo de 2 mil
processos, um percentual de 90% ainda se encontra pendente de pagamento. Esses precatórios correspondem ao
período de 1996 a 2004. Em obediência à Constituição Federal, o TJDFT,
por meio do Serviço de Precatórios da
Secretaria Judiciária (Serpre), não pode
autorizar o pagamento de novos
precatórios sem que antes os mais antigos sejam pagos. Dos devedores, apenas o INSS tem depositado em dia os
valores por ele devidos.
COMO O TRIBUNAL
DISCIPLINA O PAGAMENTO
DOS PRECATÓRIOS?
Em geral, isso é feito por meio
de portarias que regulamentam o trâmite e a quitação dos precatórios. Contudo, uma Comissão formada por
Desembargador e servidores da Casa
está elaborando normas regimentais
necessárias a melhor satisfação desses
créditos.
EM CASO DE DÚVIDAS
SOBRE PRECATÓRIOS, A
QUEM PROCURAR EM
BRASÍLIA?
Em caso de dúvidas, em Brasília,
as pessoas devem procurar o Serviço
de Precatórios da Secretaria Judiciária/
TJDFT. O Serpre funciona no Palácio
da Justiça, sala 242. Atende pelo telefone 343-6669. Nos outros estados procurar os respectivos tribunais.
Fonte: Ascom/TJDF
O Magistrado
23
D I R E T O
A O
P O N T O
Assédio judicial
Jornalistas querem separar o joio
do trigo para evitar excesso de
processos contra a categoria
Réu em múltiplos processos por
crimes contra a honra, o comentarista
esportivo Jorge Kajuru foi condenado,
em março, por difamação, a 18 meses
de detenção, em regime aberto, na Casa
do Albergado de Goiânia. O processo
foi aberto pela filial da Rede Globo em
Goiás, onde a emissora é tocada pela
Organização Jayme Câmara. Kajuru,
cujo nome é Jorge Reis da Costa, responde por, pelo menos, mais 108 processos por dano moral.
Por ser definitiva, na área criminal, a decisão é incomum. Por ter sido
movida por empresa jornalística, é
emblemática. A condenação acontece
em um contexto pouco favorável para
a imprensa em geral e especialmente
ruim para os jornalistas. Levantamento
feito por este site, há pouco mais de 1
ano, mostra que para um universo de
2.783 jornalistas de 5 grupos
jornalísticos havia 3.342 ações judiciais
por dano moral.
O estudo mostra que a imprensa foi engolfada pelo alto grau de
litigiosidade que atinge todos os seto-
24
O Magistrado
res do país. Esse fenômeno se constata pelo
entupimento do sistema judicial. Mas mostra também as
outras vertentes, típicas do setor.
Uma é o assédio judicial movido por
políticos, empresários, juízes e outros
segmentos que pedem a ajuda do Judiciário para que suas mazelas fiquem
em segredo. É neste capítulo que se
encontra o maior volume de processos.
Não são poucos também os casos de erros, que mostram a precariedade da formação de jornalistas e que,
mesmo depois de apontados, são arrogantemente encarados: não são corrigidos nem se pede desculpas ao ofendido injustamente. O quarto lote é o
do abuso puro e simples. Fala-se da
honra alheia como quem amaldiçoa o
clima. Neste endereço residem os mais
de cem processos contra Kajuru, que
até hoje nunca teve a suspeita da
venalidade levantada contra ele.
O vetor mais pernicioso vem
agora: é o segmento de empresas e pro-
fissionais que usam o jornalismo
para fazer negócios: suprimem ou dão notícias em troca de dinheiro, publicidade ou
favores. É esse setor que contamina a imagem de toda a imprensa, contribuindo para o seu descrédito e para a multiplicação de processos e condenações. Em geral, usamse acusações de supostos crimes imputadas a uma empresa ou empresário
para enfraquecê-lo numa disputa de negócios. O patrono da notícia falsificada
ou turbinada costuma ser a parte
favorecida. E há também a velha extorsão.
PROJETO DOWN
Um caso acabado de extorsão é
descrito em detalhes nos autos de processo (000.02.226954-1), julgado pela
2ª Vara Cível Central de São Paulo.
Enquanto um empresário e sua empresa
eram alvejados por sucessivas notas
consideradas mentirosas e ofensivas de
um colunista, as vítimas foram procu-
D I R E T O
radas por uma ONG do próprio jornalista para comparecer com uma “doação” de 30 mil reais. Como a doação
não foi feita, os ataques recrudesceram.
A ONG em questão é uma entidade assistencial chamada Projeto
Down, alegadamente voltada para o
apoio a crianças acometidas da
síndrome de Down. A entidade tem o
mesmo endereço da empresa jornalística
e o site do colunista direciona os leitores
para o endereço da ONG.
Gilberto Luiz di Pierro, que atende pelo pseudônimo de “Giba Um”,
e sua empresa, a Manager Comunicação, flagrados, foram condenados pelo
juiz José Tadeu Picolo Zanoni a pagar 1.000 salários mínimos como reparação.
Em sua sentença, o juiz anota que
o pedido de dinheiro “foi claramente
confessado”. A coincidência de o endereço do recibo da ONG ser o mesmo da Manager, afirma Picolo Zanoni
“derruba toda a argumentação dos requeridos em prol do trabalho social que
eles acreditam desenvolver”.
O colunista Giba Um, em primeira instância, já foi condenado e recorre contra outras decisões que lhe
impuseram as penas de três meses de
detenção, uma reparação de 20 salários mínimos e outra de 500 salários. Outros processos estão em curso, como
o da filha do presidente Lula, Lurian, e
do prefeito Blumenau. Ambos pedem
reparação de 1.000 salários mínimos.
Todos os casos envolvem crime contra a honra. (Um leitor catarinense corrige a
informação a respeito do prefeito de Blumenau,
que moveu a ação no cargo, mas já não o ocupa).
revalorização profissional. O vice-presidente da Federação, Fred Ghedini, que
também dirige o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, concorda que para
recuperar o respeito da sociedade e do
Judiciário a corporação deve reagir
contra quem usa o jornalismo para atos
de banditismo.
“Por isso vamos retomar a luta
pela criação do Conselho Federal dos
Jornalistas”, afirma Ghedini. O Conselho teria instrumentos disciplinares
mais efetivos que as comissões de ética
da Fenaj e dos sindicatos. Segundo o
dirigente, “uma ação mais firme no
âmbito profissional traria um ganho de
qualidade nessas questões”, que hoje são
arbitradas de forma descompensada
pela magistratura.
CHOQUE DE
CORPORAÇÕES
A O
P O N T O
bou — o que é bom para o país. Mas
ao abrir-se a panela de pressão, o conteúdo espirrou longe. E o equilíbrio
nesse relacionamento ainda não se estabeleceu.
O CFJ foi repelido no ano passado pelas empresas jornalísticas por ser
visto como um possível órgão de cerceamento da liberdade de imprensa.
Suas características de autarquia, que
passaria a cobrar contribuições compulsórias da categoria, dona da licenciatura para o exercício da profissão, provocaram a repulsa também, da maior
parte dos profissionais do ramo. A sua
rejeição, contudo, não resolve o drama
da falta de um órgão disciplinar. Sem
um tribunal de ética, empresas e jornalistas ficam à mercê dos 15 mil juízes
brasileiros, um colegiado majoritariamente resistente ao jornalismo que se
pratica no país.
Os juízes, é preciso que se diga,
entendem tanto dos mecanismos da
imprensa, quanto os jornalistas entendem do sistema judicial. Durante décadas, os dois setores mantiveramse em respeitosa distância. Ultimamente, mais precisamente a partir da segunda metade da década de 90, a
cumplicidade aca-
REAÇÃO DE CLASSE
A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) reuniu-se recentemente
para discutir suas diretrizes para 2005.
Na pauta, uma campanha de
25
O Magistrado
I N I C I A T I V A S
STJ lança
projeto pioneiro
em Tribunais
Jorge Campos/ACS/STJ
Medidas de inclusão social e digital para portadores de
necessidades especiais serão implantadas com objetivo
de melhorar o acesso dessas pessoas à Corte
26
O Magistrado
“
O homem é a medida de todas as coisas”, acreditava o pensador grego
Protágoras. E foi com o painel e a frase
emoldurando o Salão Nobre que o Superior Tribunal de Justiça lançou o Projeto Inclusão - “Acessibilidade e Inclusão de Pessoas com
Deficiência”, com a presença de ministros e do ministrochefe da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Nilmário
Miranda. Um acordo de cooperação técnica foi assinado
entre o STJ e a Secretaria.
O acordo pretende desenvolver mecanismos e criar
condições que permitam aos portadores de necessidades
especiais, não só no STJ, pioneiro na adequação física do
Tribunal, mas em todo o Brasil, um melhor acesso aos órgãos públicos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), são aproximadamente 26 milhões em
todo o País, sendo 270 mil no Distrito Federal. O Projeto
Inclusão, lançado hoje, pretende desenvolver a sensibilidade
física, digital e social dos portadores de deficiência física.
Após cumprimentar as autoridades, os servidores e
os portadores de deficiência presentes ao lançamento do
projeto, o ministro Barros Monteiro, diretor da Revista do
Tribunal, revelou que já estão em andamento providências
para tornar disponíveis textos dos acórdãos em braille. Ele
lembrou as medidas já adotadas pelo Tribunal para reduzir
os obstáculos, como a adequação física, a reserva de um
por cento das vagas para estagiários aos portadores de deficiência e a prioridade nos julgamentos de processos. Afirmou, ainda, que o número de estagiários vai aumentar de
nove para 32.
O ministro-chefe da Secretaria Especial de Direitos
Humanos, Nilmário Miranda, elogiou a iniciativa do Tribunal, que, mesmo antes do Decreto 5.296/04 assinado pelo
presidente da República, já tomava medidas a fim de garantir e proteger o direito dos portadores de deficiência. “O
decreto significou uma verdadeira Lei Áurea para essas pessoas. Mas não haverá direito integral se não for garantida a
acessibilidade, que é o ponto de partida para todos os outros”, afirmou. Ele enalteceu todas as medidas já tomadas
pelo STJ. “Todos os tribunais se espelharão neste exemplo
para fazer as mudanças e cumprir os compromissos com os
direitos de uma parcela enorme da população brasileira”,
acrescentou.
Para aqueles que tinham dificuldades até para garantir
o direito de ir e vir, previstos na Constituição, por causa da
altura do botão do elevador ou falta de alguém para “guiar”
pelos caminhos, o decreto, que prevê a adequação física de
todos os órgãos em até 48 meses, é um presente. “As medidas vão diminuir nossa dependência de outras pessoas”, co-
I N I C I A T I V A S
memora o servidor Luís Lopes Batista. Formado em Direito e servidor do STJ desde 1990, Luís é deficiente visual.
Lembrada por todos como uma espécie de “guardiã
e protetora” dos direitos dos deficientes, não só no STJ,
como em todo o Brasil, a ministra Nancy Andrighi comemorou o lançamento do projeto. “Essas pessoas já têm
muitos sofrimentos. Vamos trabalhar cada vez mais para,
pelo menos, diminuir os obstáculos.”
O presidente da Associação Brasileira de Desportos
com Cadeiras de Rodas, Paulo Becker, também festejou.
“Todos nós somos diferentes um dos outros. Mas, acima de
tudo, somos todos seres humanos. Queremos respeito”, disse.
Em seguida, o presidente do Instituto Cultural - Superando Limites, Construindo Cidadania, Sueid Miranda,
entregou uma placa de agradecimento ao ministro Barros
Monteiro. O cadeirante Cícero Sales afirmou que a instituição fez toda a diferença em sua vida e elogiou o projeto
lançado pelo STJ. Cearense, foi vítima de erro médico e está
na cadeira desde 1998. Mas leva uma vida normal: é casado,
tem dois filhos, faz cursos profissionalizantes e joga tênis no
Instituto. A entidade dirige, ainda, uma fábrica de cadeiras
de rodas e um restaurante comunitário, onde trabalham pessoas portadoras de deficiência.
O lançamento do projeto foi encerrado com a apresentação da banda de música Zactar, da Associação dos Pais
e Amigos dos Excepcionais (Apae), que cantou, entre outras, as músicas “Espanhola” e “Noites com Sol”, causando
emoção entre os presentes.
Fonte: Ascom/STJ
“O acordo pretende
desenvolver mecanismos
e criar condições que
permitam aos portadores
de necessidades especiais
um melhor acesso aos
órgãos públicos”
O Magistrado
27
I
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É
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A
S
A arte secreta de
Michelangelo
Uma Lição de Anatomia na Capela Sistina
Por Gilson Barreto, médico, coordenador do Serviço de
Cirurgia do Hospital Municipal de Paulínia, no Estado de
São Paulo, e Marcelo Ganzarolli. de Oliveira, Mestre em
Química e Doutor em Ciências pela Unicamp, onde é
professor livre-docente do Instituto de Química
“...não há nenhum animal cuja anatomia
ele não dissecasse, e ele trabalhou em tantas
anatomias humanas, que aqueles que haviam
passado suas vidas nisso e feito disso sua profissão
dificilmente saberiam tanto quanto ele.”
A. Condivi (1527-1574), A vida de Michelangelo
O trecho acima, de Condivi, revela uma faceta de
Michelangelo Buonarroti (1475-1564) que normalmente é
negligenciada pelos historiadores e estudiosos de sua obra.
As biografias de Michelangelo o descrevem como um dos
maiores escultores de todos os tempos, cuja fama incomparável adquirida durante a Renascença, se deve também à sua
pintura, arquitetura, desenhos e obra poética. Na verdade, a
influência de Michelangelo sobre a história da arte foi tão
extraordinária, que a própria palavra Renascença (do italiano
rinascita) foi cunhada (por seu biógrafo Vasari, para descrever o salto das artes sob as influências de Michelangelo e
Rafael. Mas Michelangelo foi muito mais do que um artista
da Renascença; seus estudos minuciosos sobre a forma hu-
28
O Magistrado
mana, o tornam também um dos maiores anatomistas deste
período. É esta faceta que revelamos em nosso livro “A Arte
Secreta de Michelangelo – Uma lição de Anatomia na Capela Sistina” (ARX, 2003, 229 p.), através da descoberta de um
segredo que permaneceu oculto por quase 500 anos.
A célebre Capela Sistina, onde são realizados os
conclaves para escolha dos novos papas, é hoje visitada por
hordas de turistas que passam pelo Vaticano todos os anos.
Além dos impressionantes museus do Vaticano, a Capela deixa sua marca indelével nos visitantes que, observam maravilhados o afresco riquíssimo e complexo que Michelangelo
pintou, cobrindo todo o teto, entre 1508 e 1512. A iconografia
das cenas, com mais de 300 figuras humanas, coloca em destaque a anatomia dos nus; um reflexo da filosofia humanista
da renascença e de sua busca pelos ideais clássicos de beleza.
Em abril de 2003, nós começamos a descobrir que o
teto da Sistina estampa uma lição camuflada de anatomia
humana que vai muito alem da anatomia de superfície que
até então se conhecia. Esta descoberta foi motivada em parte por um artigo científico publicado em 1990 pelo médico
americano Frank Lynn Meshberger no “Jornal of the American
Medical Association” onde ele apresentou uma interpretação
para a cena da Criação de Adão de Michelangelo, baseada
em neuroanatomia. Meshberger argumenta de forma convincente que esta cena (a mais famosa da capela), possui uma
característica que ainda não havia sido reconhecida. Ele compara a cena onde o criador se encontra dentro de um manto
I
cercado de querubins, com várias figuras anatômicas que
mostram esquemas do corte sagital do crânio humano, contendo o cérebro, para mostrar uma impressionante semelhança entre a figura pictórica e as figuras anatômicas.
Meshberger identifica várias estruturas incluindo a artéria vertebral, o cordão espinal, a hipófise, o nervo óptico e o
quiasma óptico e conclui que a intenção de Michelangelo
pode ter sido a de representar Deus fornecendo a Adão o
intelecto. Gilson tomou conhecimento deste artigo na década de 90 e a analogia entre a pintura desta cena e o corte
sagital do cérebro me pareceu fazer sentido, a ponto de eu
ter preparado um slide desta comparação para usar em minhas aulas de cirurgia de cabeça e pescoço no hospital onde
D
É
I
A
S
trabalho –”Em abril de 2003, quando procurava este slide,
tive um “insight”: se na cena da criação de Adão, Michelangelo
fez uma representação de um corte sagital do crânio, não
teria ele também representado outras estruturas anatômicas
em outras cenas”? Ao abrir seu livro da Capela Sistina na
página da cena do profeta Jeremias, Gilson viu nas vestes
sobre os joelhos do profeta uma estrutura anatômica que ele
vê com muita freqüência em suas cirurgias: ali estava o ouvido interno dissecado, com a membrana do tímpano e o
ossículo do martelo! Esta descoberta precipitou outras três
ou quatro identificações de outras estruturas anatômicas em
outras cenas do teto nesta mesma noite atormentada. Na
manhã seguinte, nós dois, Gilson e Marcelo, iniciamos o que
classificamos como “um mergulho em um abismo de quase
500 anos de história, onde um grande enigma havia sido
selado por um dos maiores artistas que a humanidade já
conheceu”. Sentindo como se tivéssemos aberto uma espécie de cápsula do tempo, começamos a ler a aula de anatomia camuflada que Michelangelo havia deixado no teto da
Sistina. No trabalho que se seguiu, descobrimos que não só
todas as cenas do teto possuem estruturas anatômicas ocultas, mas que todas elas são acompanhadas de um impressionante código que Michelangelo usou para indicar onde as
peças estão. Após muitos meses de trabalho, a idéia inicial de
divulgar a descoberta na forma de artigos científicos, teve
que ser abandonada frente à dimensão das correlações encontradas, que superavam em muito o espaço que qualquer
jornal ou revista científica poderiam nos conceder. Foi então
com o apoio do amigo Heródoto Barbeiro que conseguimos apresentar a descoberta à Editora ARX, que os incentivou a organizar todo o material na forma de um livro. A
investigação para a montagem do livro exigiu que fizéssemos um mergulho também na história do Renascimento
onde descobrimos o Michelangelo anatomista. Esta história,
que raramente se encontra nos livros de arte, compõe uma
parte importante do livro A Arte secreta de Michelangelo.
Nele o leitor descobrirá que o profundo interesse que
Michelangelo teve por anatomia ao longo de sua vida foi
um reflexo da cultura de seu tempo; que em sua determina-
O Magistrado
29
I
D
É
I
A
S
quisa, descobrimos que o ambiente no qual a personalidade
de Michelangelo se formou, o expôs à dissecação, permitiu
que ele a praticasse e o colocou em contato com pessoas
familiarizadas com o estudo da anatomia e com os textos
médicos. A pesquisa revelou também que o profundo interesse pela anatomia de Michelangelo se estendeu por toda a
sua longa vida a ponto de ele ter planejado publicar um tratado de anatomia para artistas e colaborar em um texto de
anatomia para estudantes de medicina. Projetos que infelizmente ele não conseguiu concretizar.
No livro colocamos uma apresentação muito diferente
do teto da Sistina. Em trinta e três cenas do teto, com suas
centenas de figuras contorcidas e espiraladas, os Ignuds, Profetas, Sibilas, Escravos de Bronze e Querubins, participam de um
código orquestrado que visa conduzir o apreciador da arte a
uma estrutura anatômica camuflada. Como são poucos os leitores que podem reconhecer estas estruturas, elas estão todas
comparadas com fotos ou desenhos anatômicos. Por fim, o
leitor verá que o gênio também ocultou estruturas anatômicas
em duas de suas mais famosas esculturas. O Moises e a Pietá.
Michelangelo pode não ter editado em papel seu tratado de anatomia. Mas ele, conscientemente, o deixou registrado de uma forma muito mais perene. Quinhentos anos e
muitos Papas se passaram, para se descobrir que ele o deixou no teto da Sistina.
ção em compreender os movimentos do corpo humano, os
artistas dos séculos XV e XVI passaram a estudar a sua estrutura interna. Michelangelo começou a participar das seções de dissecações públicas já em sua adolescência, conduzido por Elia Del Medigo, um médico-filósofo, membro
do círculo de Lorenzo de Médici, que incluía muitos outros
pensadores como Giovan Francesco Rustici (1474-1554), que
se dedicava ao estudo da “necromancia” e Marsílio Ficino
(1433-1499), um dos humanistas de maior destaque desta
época, filho de um cirurgião e que tinha também estudado
medicina. Aos dezoito anos, Michelangelo já dominava a arte
da dissecação e fazia suas próprias dissecações e demonstrações.
Ele não foi, é claro, o único anatomista obsessivamente minucioso desta época. Outros contemporâneos seus,
grandes figuras como Leonardo da Vinci (1452-1519),
Berengario da Capri (1470-1550), Niccolo Massa (14891569), Andréas Vesalius (1514-1564) e Realdo Colombo
(1516-1559) romperam com a subserviência aos medievalistas
e re-exploraram o corpo humano. Leonardo produziu cerca de 750 desenhos anatômicos, sendo considerado o fundador da anatomia fisiológica e iconográfica. Em nossa pes-
30
O Magistrado
NOTA DA REDAÇÃO:
O primeiro leitor de
“O Magistrado em
Revista” que
mandar um
correio eletrônico
com um
comentário sobre
qualquer um dos
textos
publicados
nesta edição,
ganhará um
exemplar do
livro “ A Arte
Secreta de Michelangelo”
C
A
P
A
Habemus Crucificação
Aspectos jurídicos do julgamento de Cristo
Por Rubens Tavares, advogado militante há mais de 25 anos,
além de ter ocupado os cargos de procurador de justiça,
promotor e defensor público. Na área eclesiástica é formado em
Teologia, onde atua como professor de Hermenêutica Sagrada
(rubenstavares.uol.com.br)
Antes de tudo quero que os leitores me perdoem por uma introdução um pouco longa que darei, todavia é necessário que se entendam as circunstâncias que cercaram o julgamento
de Cristo, tendo em vista a precariedade de fontes.
Em razão disto, sem esquecer os
Evangelhos, é bom trazer à tona a cultura judaica para que possamos com
32
O Magistrado
maior segurança, traçar o perfil jurídico do Julgamento de Cristo. Outrossim, no que for necessário, procuraremos como fonte, o direito judaico e o
romano.
Israel foi a primeira nação
monoteísta 1, cuja origem remonta a
Abraão, cerca de 2.000 a.C. Figura
de destaque, também, foi Moisés, o
libertador, que teria recebido dire-
tamente de Deus as leis que regeria
a nação, motivo pelo qual Israel não
desassociava a administração política da religião. Na verdade, nas diversas fases de sua história, embora
governado por sacerdotes, profetas,
juizes e reis, tratava-se de uma
Teocracia. Tudo era em nome de
Jeová, o Deus único. O Templo 2 era
o local onde se venerava a Jeová, e
se praticavam os cerimoniais religiosos, tinha dois compartimentos, o
primeiro o Lugar Santo, e o segundo o Lugar Santo dos Santos, onde
estava a Arca da Aliança, e, segundo
acreditavam os judeus, havia ali presença literal de Jeová.
C
Nesse lugar, Santo dos Santos,
só quem tinha acesso, e assim mesmo
uma vez por ano, era o Sumo Sacerdote, figura máxima da religião judaica, para sacrificar pelo povo um novilho3, quando então Jeová se manifestava para perdoar o pecado de todos.
Após Abraão e Moisés, a figura de maior destaque em Israel fora
o rei Davi, que unificou o Estado,
construiu a capital Jerusalém e alargou grandemente as fronteiras do
reino, pois era um grande homem de
guerra. Nunca mais em Israel surgiu
uma figura tão carismática quanto ao
rei Davi. Após seu reinado e de seu
A
P
A
“No que tange à ordem de prisão, com certeza foi emitida pelo
Sinédrio na pessoa do Sumo Sacerdote, pois tinha autoridade sobre
os de cidadania judia”, Rubens Tavares
O Magistrado
33
C
filho Salomão, Israel sucessivamente,
séculos após séculos, passou a ser
presa de conquistas de várias nações.
Nesse período, todos os profetas
apontavam o nascimento de um messias que resgataria Israel e voltaria a
ter o mesmo resplendor dos tempos
do inigualável rei Davi. Todos aguardavam ansiosos.
Por volta do ano 64 a.C,
Pompeu 4, em seu empreendimento
conquistador, subjugou várias nações,
dentre as quais a Judéia, impondo o
domínio do Império Romano, o qual,
apesar da riqueza de sua mitologia que
mesclara-se à grega, respeitava as culturas e religiões dos conquistados, desde que não conflitasse com os interesses do Império.
Nesse clima – os judeus dominados pelos romanos, – nasceu Jesus
Cristo: pessoa carismática, excelente
oratória e sabia falar diretamente aos
corações. Conquistar a simpatia do
povo. Era comum reunir 3, 4, 5 mil
pessoas para ouvi-lo. Segundo ainda
consta nos Evangelhos, fez dezenas de
milagres. Ressuscitou mortos, curou
aleijados, restituiu vistas a cegos. Tinha
contra si, porém, ter nascido na pobre
e discriminada região da Galiléia, ao
norte da Judéia.
Por dois motivos, Jesus Cristo
conquistou a antipatia e temor de
grande parte da classe dominante judia: sacerdotes, escribas, fariseus,
saduceus e os componentes do
Sinédrio5. Primeiro, por ciúme6, já que
o povo passara a segui-lo. Segundo,
porque temiam que Jesus provocasse
alguma rebelião, atraindo a ira romana, no que poderiam ser esmagados7,
pois o povo poderia aceitá-lo como
o messias prometido que restituiria à
Judéia a glória que tivera com o rei
Davi.
Por isso, reuniu-se o Sinédrio, sob
a presidência do Sumo Sacerdote Caifás
e chegou-se a conclusão que a solução
era matar Jesus8.
“O iter na formação
da culpa de Jesus
foi ilegal, mesmo
considerando
as leis da época”
A
P
A
A situação alarmou-se mais ainda, quando, dias depois, num domingo, seis dias antes da Páscoa, Jesus Cristo
foi aclamado pelo povo como novo
rei ao entrar em Jerusalém, que estendia casacos, xales e ramos de árvores9,
à sua passagem.
Não tinha saída, a única solução
era matá-lo.
Mas como prendê-lo sem culpa,
e mais ainda, se o povo o admirava.
Poderia acontecer uma revolta popular.
A solução era prendê-lo em lugar ermo, à noite, longe do povo e
formalizar a culpa. Seria um fato consumado.
Judas Iscariotes, que era ganancioso por dinheiro10, sabendo que os
principais sacerdotes procuravam uma
oportunidade para prender Cristo sem
causar tumulto, foi procurá-los. Prometeu indicá-lo em um lugar ermo, à noite, que não houvesse o povo. Trinta
moedas foi o preço.
Antes de prosseguirmos é bom
esclarecer que a então Judéia, que era
considerada pelo Império Romano um
legado da Síria11, também dominada,
dividia-se em reino do norte e do sul.
Por ocasião do Ministério de Cristo,
Roma, que tinha como imperador
Tibério, indicara para governar o norte
O Magistrado
35
C
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A
“Creio que embora o Sinédrio tivesse o poder de condenar o cidadão judeu à pena
capital, não poderia executá-lo. Necessitava da chancela romana”, Rubens Tavares
Herodes Antipas, região pobre e discriminada pelos do sul. Ao sul havia a
capital Jerusalém onde situava-se o
Templo e o Sinédrio e a sede do governo religioso da Judéia. Tinha como
governador Pôncio Pilatos. Jesus Cristo era do Norte, Galiéia, apenas nascera no sul quando sua mãe fora recensear-se em Belém.
O sumo sacerdote de Israel era
Caifás que sucedera seu sogro Anás.
Ambos pertenciam ao Conselho Superior (Sinédrio), presidido por aquele.
Pois bem, como prometido,
Judas Iscariotes deixara as autoridades
36
O Magistrado
judaicas de plantão, pois a qualquer
momento os levariam a prender a Cristo.
Quinta-feira à noite, cumprindo cerimonial judaico, Jesus estava em
Jerusalém participando da Páscoa
com os discípulos. Após, nos últimos
minutos de quinta-feira ou nos primeiros minutos da madrugada de sextafeira, retirou-se para orar e meditar.
Judas sabia que Jesus iria para fora dos
muros de Jerusalém a um local denominado Jardim Getsêmani. Local
ermo. Além do mais, era madrugada.
Assim, correu e foi avisar às autorida-
des religiosas da Judéia. Em seguida,
como é de conhecimento de todos,
Jesus foi preso após receber um beijo
do traidor Judas Iscariotes, pois, por
ser noite, precisava que alguém o identificasse. Foi identificado com um beijo.
Temos agora as primeiras questões jurídicas:
A prisão à noite era legal?
Havia uma ordem de prisão?
Quem deu a ordem de prisão?
Jesus foi preso pela guarda romana ou judia?
O decreto de prisão da cruz foi
judeu ou romano?.
Vamos às respostas.
À época, em que pese o senso
de direito que tinha a cultura romana,
não se alcançara, evidentemente o patamar que temos hoje. Portanto, a prisão à noite não era ilegal quer para os
judeus12.
No que tange à ordem de prisão, com certeza foi emitida pelo
Sinédrio na pessoa do Sumo Sacerdote, pois tinha autoridade sobre os de
cidadania judia. Em Atos dos Apóstolos encontramos Saulo de Tarso, depois chamado Paulo, com ordem de
prisão emitida pelo Sumo Sacerdote13
contra os primeiros cristãos judeus para
levá-los presos a Jerusalém.
Temos, portanto que a ordem
de prisão foi expedida pelo Sumo Sacerdote. Ocorre que o Evangelho de
João cita que houve participação romana14.
Se houve participação da guarda romana, é porque havia alguma acusação por parte dos Sacerdotes, junto
a Pôncio Pilatos, o governador, de que
Jesus teria cometido algum ato que
afrontasse Roma.
Haim Cohn15 levanta várias hipóteses, dentre as quais de que a prisão de Jesus fora ordenada por
Pilatos, pressionado pelas autoridades judaicas, tanto é que ao amanhe-
C
cer do dia estava esperando para
julgá-lo.
Na verdade, como já fundamentado acima, entendo que a ordem de
prisão foi expedida pelo Sinédrio que
tinha jurisdição sobre os judeus. Todavia por ter a presença de soldados romanos, é certo que teria o Sumo Sacerdote Caifás pedido o concurso romano, demonstrando que Jesus oferecia perigo a Roma, pois pregava ao
povo subversão contra o Império:
“Enviou-me a pregar liberdade aos
cativos”16.
Assim, em que pese a guarda
romana ter colaborado, a ordem de
prisão foi expedida pelo Sumo Sacerdote Caifás. Tanto é certo que o preso
foi levado à sua casa, onde o aguardavam as demais autoridades judias, sendo primeiramente interrogado por
Anás, ex-Sumo Sacerdote, que em seguida o encaminhou ao seu genro, o
Sumo Sacerdote Caifás.
Os membros do Sinédrio (sacerdotes, escribas e anciãos17 e 18) estavam reunidos na casa de Caifás, onde
de maneira informal fizeram toda a
instrução do processo, interrogando,
humilhando e torturando Jesus Cristo.
Ao amanhecer do dia, antes da
cidade acordar, sexta-feira, Jesus foi
A
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A
Embora alguns digam tenha sido o Egito, cerca de 14 Séculos a.C., no reinado do Faraó
Amenofis IV, que quis instituir um deus único, entendo, ao contrário de muitos, que este
Faraó, execrado pelos seus sucessores por tal atitude, tenha se inspirado na doutrina dos
descendentes de Abraão. Ver História de Israel de J. Bright, páginas 139/140, Ed. Paulinas;
e Introdução do Antigo Testamento de Willian S. LaSor e outrospágina57, Ed, Vida
Nova.
2
Lugar sagrado de adoração dos judeus, onde se praticavam cerimoniais religiosos, contendo em seu interior vários utensílios, cada um com seu significado. Êxodo 25.8-40.
3
Levítico 16.
4
O Judaísmo Tardio. André Paul. Ed. Paulinas.
5
O Sinédrio era o Supremo Tribunal dos antigos judeus.Consistia de 71 membros, tendo
como presidente o Sumo Sacerdote. Cf. Orlando S. Boyer, Pequena Enciclopédia Bíblica.
Instituto Bíblico das Assembléias de Deus.
6
Evangelho de João12.19
7
Evangelho de João 11.48
8
Evangelho de João 11.47-53.
9
Nasceu daí a tradição do Domingos de Ramos. João 12. 42 e Mateus21.8.
10
Evangelho de João 12.4-6.
11
André Paul, obra citada.
12
A Vida de Cristo. Severino Pedro da Silva. Ed. CPAD.
13
Atos 9.1-2.
14
Evangelho de João 18.3 e 12.
15
Autor do livro O Julgamento de Jesus,o Nazareno, Ed. Imago.
16
Lucas 4.18-19.
17
Mateus 26.57 e Marcos 14.53.
18
Anciãos, ou seja, os demais membros do Sinédrio.
19
Severino Pedro da Silva, em sua citada obra A Vida de Cristo, a partir da página 96,
confronta as diversas fases e o modo como foi efetuado o Julgamento de Cristo com o
direito hebraico e conclui ter havido ilegalidades.
20
Lucas 23.2.
21
Orlando S. Boyer, obra citada.
1
O Magistrado
37
C
A
P
A
levado ao Sinédrio, apenas para validar
os atos praticados na casa do Sumo
Sacerdote. Em poucos minutos, o Conselho do Sinédrio concluiu pela culpa
de Jesus Cristo. Crime: Blasfêmia por
ter-se auto-proclamado filho de Jeová.
Pena: Morte.
O iter na formação da culpa de
Jesus foi ilegal, mesmo considerando
as leis da época19.
Destaque-se também, que, segundo os evangelhos, a crucificação de
Jesus Cristo se deu às nove horas da
manhã de sexta-feira. Portanto, o julgamento do Conselho do Sinédrio
deve ter terminado no máximo às seis
horas da manhã, haja vista que levaramno a Pilatos, onde obedeceu todo o ritual do pretório romano.
Em que pese a formação da
culpa ter se dado no Sinédrio, o foi
apenas por formalidade, pois que os
próprios que o prenderam, julgaramno, e além do mais, o julgamento se
deu à noite na casa do Sumo Sacerdote.
Todos os detalhes foram planejados pelas autoridades judias para que
tivesse um único resultado: condenação.
Ao amanhecer do dia, o povo
que admirava e seguia a Cristo ao vêlo preso, portanto derrotado, com as
mãos amarradas, sendo motivo de
zombaria por parte dos que o escoltavam rumo ao Palácio de Pôncio Pilatos,
não teve nenhum ânimo para defendêlo. Alguns por temor, outros pelo descrédito que foram assaltados. Jesus,
naquelas condições, não dava segurança a ninguém, não traduzia nenhuma
simpatia.
Mas se Sinédrio já havia sentenciado Jesus à pena capital, por que o
levavam ao Palácio de Pôncio Pilatos?
Creio que embora o Sinédrio
tivesse o poder de condenar o cidadão judeu à pena capital, não poderia executá-lo. Necessitava da chan-
38
O Magistrado
cela romana. É defeso ou impróprio
citar aqui o acontecido com Estevão
que foi apedrejado quando levado ao
Sinédrio também sob a acusação de
blasfemo. Neste caso, a lapidação ou
apedrejamento de Estevão se deu por
linchamento do povo com vistas
complacente dos membros do
Sinédrio.
Por esta razão, Cristo após receber a condenação do Sinédrio foi
levado ao Governador Pôncio Pilatos.
Todavia, Pilatos não faria nenhum referendo a morte de Cristo, apenas por
blasfêmia. Isto nada importava a
Roma.
Por este motivo, os interessados
na morte de Cristo levaram-no a Pilatos,
sob a acusação de que estaria sublevando o povo contra Roma proibindo dar
o tributo a César, e dizendo que Ele
Cristo, é o rei20.
Pilatos ao receber Cristo e conhecedor da inveja que as autoridades judaicas tinham dEle, procurou
fugir do litígio, enviando-o a
Herodes, alegando ser da jurisdição
deste. Herodes, não conseguindo inter rog ar a Cristo, devolveu-o a
Pilatos.
Restava agora Pilatos enfrentar
a pressão das autoridades judaicas interessadas na morte de Jesus. Pilatos o
interrogou. Não se convenceu de nada.
Prometeu açoitá-lo. Depois propôs a
liberdade de um preso: Jesus ou
Barrabás. Contudo, os promotores da
morte de Cristo continuavam
irredutíveis.
Finalmente, Pilatos, de maneira literal lavou as mãos, não no sentido de deixar a situação desenrolar
para ver no que dava. Mas no sentido de que lavaria as mãos quanto ao
resultado. Não se convencera de que
Jesus estava sublevando o povo, porém lavrou a condenação por pressão, aceitando formalmente a acusação.
O Governador romano lavrou a
condenação à morte, e morte de cruz
porque Jesus rejeitava o domínio romano e se auto proclamava rei dos judeus,
segundo a acusação. Tanto é que, zombando dos judeus, de modo irônico
transcreveu a acusação acima na cruz.
Outrossim, a pena à cruz não
constava no direito hebreu. A condenação à pena capital na cruz, era uma
prática romana21.
Conclui-se, portanto, sem a menor sombra de dúvida, que no aspecto
estritamente jurídico, a condenação de
Jesus Cristo à morte, e morte na cruz,
foi da lavra romana. Pilatos poderia
evitar, porém preferiu lavar as mãos e
curvar-se ante a pressão dos membros
do Sinédrio Judeu.
Bibliografia:
1. Bíblia de Jerusalém. Ed.
Paulus.
2. O Julgamento de Jesus, o
Nazareno. Haim Cohn. Ed.
Imago.
3. O Romance da Crucificação. Rubens Tavares autor deste artigo. Ed. Vida Plena.
4. O Judaísmo Tardio. André
Paul. Ed. Paulinas.
5. Introdução ao Antigo Testamento. Willian S. Lar e outros.
Ed. Vida Nova.
6. Pequena Enciclopédia Bíblia. Orlando S. Boyer. Instituto
Bíblico das Assembléias de Deus.
7. História de Israel. J.
Bright. Ed. Paulinas.
8. A Vida de Cristo. Severino
Pedro da Silva. Ed. CPAD.
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Igualdade racial em debate
Realizada em Brasília a
I Conferência Distrital de
Políticas de Promoção
da Igualdade Racial
Por Jonathan Pinato Luasses
Foi realizada em Brasília, nos últimos dias 02 e 03 de maio no Centro Cultural Rubem Valentim, a I Conferência
Distrital de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. O objetivo foi de debater diante
da sociedade a igualdade étnica racial. A conferência teve uma ampla discussão de temas
que visam uma estabilidade de políticas públicas para os diversos segmentos e etnias
como os índios, brancos, negros, ciganos
entre outros. Mais de 130 pessoas estiveram
presentes na conferência.
“Há uma atenção maior para os negros e índios que representam 50% da população do Brasil” afirmou o coordenador
geral da Conferência Distrital e Sub Secretário de Direitos Humanos e Cidadania, Antônio Barbosa. “Essas etnias foram as mais
dizimadas e esquecidas de nossa história.
Havia uma grande expectativa para a Conferência do Distrito Federal, já que até então na
existia qualquer articulação política com esses grupos étnicos”, complementou o coordenador do evento.
Os grupos presentes tiveram não só
a chance de discutir e aprofundar os assuntos ligados a igualdade racial, mas de esco-
lher os delegados de cada etnia que representarão o Distrito Federal na Conferência Nacional que ocorrerá do dia 30 de junho até 02
de julho também em Brasília. Documentos
foram extraídos após as discussões e reflexões dos grupos.
Uma das pessoas presentes na Conferência foi a presidente do Conselho de Defesa dos Direitos dos Negros do Distrito
Federal (CDDN-DF), Teresa Ferreira da Silva, explicou que a função principal do conselho é representar dentro do governo do Distrito Federal o negro e também os ciganos,
índios, judeus e israelitas, já que esses quatro últimos grupos não têm nenhum conselho representativo com força política.
“Além de darmos assessoria jurídica
para as pessoas que sofrem algum tipo de
preconceito ou racismo, damos também
atendimento psicológico para essas vítimas
e até para seus familiares devido a fragilidade
dessas pessoas devido com a descriminação.
Nem todo mundo tem estrutura psicológica para suportar o racismo”, explicou Teresa.
Já o professor de Filosofia da Fundação Escolar do Distrito Federal e também
aluno universitário do curso de História,
Gilson Marcos, explicou que trabalha muito
em defesa da igualdade racial dentro das salas de aula. “A educação é o principal meio
para retrabalhar o preconceito que existe den-
tro das pessoas, mesmo que inconsciente”,
declarou o professor.
A aluna do curso de Relações Internacionais da UNIEURO, Luciana Abreu, revelou que o evento foi um “divisor de água
em sua percepção do racismo”. Luciana, antes do evento, acreditava que havia muito
exagero no trato à questão. “Após a Conferência, consegui vislumbrar que o racismo
realmente existe e temos que nos engajar
nessa luta contra esse grave problema social”, finalizou a estudante.
“Eu já conheço a maioria das pessoas
presentes na Conferência desde a minha
época de militante”. Ministra da SEPPIR,
Matilde Ribeiro.
O Magistrado
41
DÚVIDAS NUNCA MAIS
Vínculo trabalhista: ele existe entre
franqueador, franqueado e seus empregados?
Melitha Novoa Prado, consultora jurídica especializada em
relacionamento de redes, esclarece a questão
O artigo 2º da lei de franquia
(lei nº 8.955/94) dispõe que franquia
empresarial é o sistema pelo qual um
franqueador cede ao franqueado o
direito de uso de marca ou patente,
associado ao direito de distribuição
exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente,
também ao direito de uso de
tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema
operacional desenvolvidos ou detidos
pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no
42
O Magistrado
entanto, fique caracterizado vínculo
empregatício.
Apesar do conceito trazido pela
própria lei de franquia deixar explícito
que não há vínculo empregatício entre
as partes, a proximidade da parceira
entre franqueador e franqueado e a estreiteza dos laços entre estes, com subordinação a manuais de operação e a
diretrizes pré-traçadas, muitas vezes era
entendida na Justiça do Trabalho como
relação de emprego.
“Os processos podem acontecer de duas maneiras: o potencial fran-
queado passa por treinamento e não é
aprovado pelo franqueador, então pede
à Justiça remuneração pelo período de
treinamento. Como alguns treinamentos são longos, como no caso do
McDonald´s, que leva um ano para se
realizar, alguns investidores se sentem
no direito de pedir isso à Justiça. Outro caso é do franqueado que tem o
contrato rompido e quer ser remunerado como funcionário. Dois casos
completamente absurdos”, diz Melitha
Novoa Prado, advogada especializada
em relacionamento de redes.
DÚVIDAS NUNCA MAIS
Divulgação
Em eventuais casos desta natureza levados aos Tribunais do Trabalho, caberá aos julgadores uma investigação aprofundada do sistema de franquia em operação para detectar se houve alguma situação de fraude ou ilícito
que possa possibilitar a eventual transferência de responsabilidade ao
franqueador, dentro de princípios que
direcionam o direito do trabalho no
que tange à agremiação de empresas
com objetivo comum.
Assim, características inerentes
ao Contrato de Franquia só podem ser
derrubadas quando firmadas em fraude, com o intuito único e exclusivo de
burlar as leis trabalhistas e previdenciárias. “Isso pode ocorrer ou não, não
podendo ser tomado como regra. Seria até um absurdo admitir que todos
os contratos de franquia são firmados
com esse fim”, diz Melitha.
FUNCIONÁRIOS DO
FRANQUEADO NÃO SÃO
EMPREGADOS DO
FRANQUEADOR
Uma vez que há autonomia e independência entre as partes, não fica
configurado o vínculo empregatício entre franqueador e franqueado. Portanto,
os funcionários do franqueado não são
empregados do franqueador. Alguns
julgadores, ao arrepio da evolução do
Franchising, que salta aos olhos, entendem
que franqueador e seus franqueados formam um grupo econômico, daí a responsabilidade do franqueador face às
verbas trabalhistas e previdenciárias dos
funcionários de seu franqueado.
Outros julgadores entendem,
acertadamente, que quando há um contrato de franquia firmado e quando o
franqueador apenas cumpre seu papel
de supervisionar e treinar a rede para
manter os padrões, não há responsabilidade do franqueador nos encargos
trabalhistas da franqueada.
Um caso absurdo é o do franqueado que tem o contrato rompido e quer ser
remunerado como funcionário, explica Melitha Novoa Prado, advogada
especializada em relacionamento de redes.
Muitos julgados têm entendido, corretamente, que não fica
configurada a responsabilidade solidária do franqueador pelo
cumprimento das obrigações da franqueada:
• Primeiro, porque a solidariedade somente decorre de lei ou de contrato
entre as partes, hipóteses não verificadas nos contratos de franquia;
• Segundo, pelo fato de que nos contratos de franquia há duas empresas
autônomas e independentes;
• Terceiro, porque na própria Lei 8.955/94, que dispõe sobre o contrato
de franquia, ao estabelecer na parte final do seu artigo 2º a inexistência
de vínculo empregatício entre franqueador e franqueado, torna-se
inequívoco o seu espírito de traçar uma fronteira marcante entre as duas
empresas, com uma linha divisória acentuada entre as obrigações
assumidas pela franqueada contra terceiros e as obrigações contraídas
pela franqueadora que são totalmente diversas.
O Magistrado
43
ESPAÇO UNIVERSITÁRIO
Transação Penal
Da política criminal do art. 76, § 2º, II, da Lei 9.099/95.
Por Janaína de Lima Veiga – 9º período
– Direito/UNICAP – bolsista PIBIC/
UNICAP/2005 – Recife
Previsto pela Lei Maior (art. 98,
inciso I) e regulado pela lei 9.099/95,
que também dispõe sobre os juizados
cíveis, o Juizado Especial Estadual Criminal constitui passo de inegável importância ao tão aclamado movimento de acesso à justiça e para a
Criminologia Moderna. Buscam-se a
reparação dos danos sofridos pela vítima (considerado objetivo principal);
a desburocratização da “Justiça”; a
despenalização; a atenção aos crimes
considerados de menor potencial ofensivo etc, calcando-se nos princípios da
oralidade, simplicidade, informalidade,
economia processual, celeridade e respectivos corolários. Os institutos da
conciliação, através de um acordo ou
de uma composição civil feita entre as
próprias partes, resolvendo sua controvérsia; através da intervenção do Ministério Público, na aplicação de penas
não privativas de liberdade, a chamada
transação penal, e o da suspensão condicional do processo, conduzem à
concretização dos fins dos juizados especiais criminais.
O art. 76, § 2º, II, da Lei
9.099/95. A questão suscitada, aqui, é
se, a transação penal, benefício concedido nos Juizados Especiais Criminais,
direito subjetivo previsto na respectiva
lei, evitando o surgimento de um processo, a imputação de culpa ao supos-
46
O Magistrado
to réu, ensejando a aplicação de penas
alternativas à privativa de liberdade, tais
como restritivas de direitos ou pena de
multa, ao ter como uma de suas causas
impeditivas sua possível aplicação a
cada cinco anos, chega a ter seus objetivos, obstruídos. Instituto, este, lembra L. Flávio Gomes, que faz parte do
modelo consensual de Justiça Criminal
instituído pela Lei 9.099/95, sendo uma
das vias ressocializadoras da
Criminologia Moderna. São apontadas como fontes de inspiração, o plea
bargaining, o guilty plea, ambos do Direito anglo-saxão, o patteggiamento, do Direito italiano.
O suposto autor do fato, acompanhado do seu advogado/defensor,
o qual se manifestará sobre a aceitação
ou não, pode aceitar o beneficio/direito da transação penal se, dentre outros
requisitos dispostos no artigo 76, parágrafos e incisos, da Lei dos Juizados,
nos últimos cinco anos, não o utilizou,
constituindo, pois, uma das causas
impeditivas para a sua utilização. O suposto autor do fato pode evitar o iní-
“(...) o artigo da
transação penal,
ao limitar o período
de cinco anos, aplica
outra pena e deveria
ser estudado”
cio de um processo, como aceita a
maioria doutrinária, como uma tática
de defesa, não discutindo a questão, se
aceitar a proposta, sem ser imputada,
teoricamente, culpa. Em aceitando, renunciará a garantias constitucionais,
como o contraditório, a ampla defesa,
o recurso etc.
Somos da opinião de que o artigo da transação penal, ao limitar o período de cinco anos, aplica outra pena
e deveria ser estudado. Se o objetivo é
evitar a sensação impunidade, cabe ao
Ministério Público avaliar se, realmente, de acordo com o artigo 76, o autor
do fato faz jus e se faz, propor uma
pena alternativa que, da melhor forma,
corresponda ao fato imputado. Diz –
se serem as penas alternativas uma medida, mas logo se vê a “pena” de 05
(cinco) anos sem direito ao beneficio.
Não é obrigatória a sua aceitação, o que
poderá ensejar a denúncia pelo Ministério Público e o início do processo,
partindo-se para a audiência de instrução e julgamento, tendo o juiz que decidir o caso. Audiência esta, em que o
suposto autor do fato poderá provar
sua inocência.
Em comentários ao art. 76, § 2º,
II, da supracitada lei, o saudoso Julio
Fabbrini Mirabete defende:
“Evita-se que a mesma pessoa
seja beneficiada duas vezes nesse lapso
temporal para não incentivar a sensação de impunidade”.
Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio
Scarance Fernandes, Luiz Flávio Go-
ESPAÇO UNIVERSITÁRIO
mes, comentando o referido artigo: “A
lei quer beneficiar o autor de fatos
enquadráveis nas infrações penais de
menor potencial ofensivo, mas não incentivar sua impunidade. Por isso, o
“agente” (rectius, o autor do fato: v.
observação supra, no comentário n. 11)
que já tiver se beneficiado da aplicação
consensual de pena não privativa de liberdade, nos termos da Lei 9.099/95,
não poderá gozar de novo benefício,
pelo prazo de cinco anos”. Ainda se
posicionando a respeito: “O único feito penal da transação é impedir novo
benefício pelo prazo de cinco anos, o
que também é razoável”. Continuam:
“A estipulação do referido prazo encontra paralelo na prescrição da reincidência previsto no inc. I do art. 64, CP”.
Se um dos efeitos da sentença
homologatória da transação penal é a
não reincidência, o paralelo feito com
o seu prazo, na causa impeditiva em
estudo, não deixa de fazer as suas vezes, impedindo benesses.
Argumentam os juristas Joel
Dias Figueira Jr. e Maurício Antônio
Ribeiro Lopes: “Objetiva-se, a exemplo da suspensão condicional da pena,
da suspensão condicional do processo
e de outros institutos genéricos que estabelecem algumas garantias pessoais
específicas no curso do processo ou
logo após a aplicação da pena, estimular o sentimento de responsabilidade
pessoal do agente. Prova disso pode
ser extraída da proibição de repetição
do benefício dentro do período de cinco anos (art. 76, § 2º, II)”.
O Anteprojeto de Lei para a conciliação, julgamento e execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, que deu origem, sucessivamente, ao
Projeto de Lei nº 1.480/89 e à Lei
9.099/95, não dispunha sobre o fundamento do prazo, causa impeditiva, da
transação penal. Ao tratar dos efeitos da
imediata aplicação da pena alternativa,
trazia: “(...) c.2) A sanção tem natureza
“(...) o Juizado Especial Estadual Criminal constitui passo de inegável
importância ao tão aclamado movimento de acesso à justiça e para
a Criminologia Moderna”, Janaina de Lima Veiga
penal, mas sem reflexo na reincidência,
sendo registrada para o fim único de
impedir novamente o mesmo benefício, pelo prazo de cinco anos, e não devendo constar de certidões (...)”.
Como se falar em impunidade
se o suposto autor do fato já cumprirá
pena alternativa? De todo jeito, se o
mesmo fizer jus à transação penal e se
aceita, deverá cumprir uma pena que
ficará a cargo de proposta do Ministério Público, o qual avaliará a intensidade da medida cabível àquela situação.
Em virtude de política legislativa tem-
se essa causa impeditiva com fundamento na prevenção à impunidade.
Duas considerações devem ser
feitas ao ser trabalhado tal tema. Vejamos. Opina o jurista Alexandre
Wunderlich com o qual concordamos:
“§ 2.º O processo de seletividade exercido pela vítima e o seu “poder denunciante”: a facilidade do registro do
termo circunstanciado e a obrigatoriedade do encaminhamento aos Juizados.
É fato notório que com o advento dos
Juizados basta uma diligência na delegacia de polícia para que o autor do
O Magistrado
47
ESPAÇO UNIVERSITÁRIO
fato seja chamado ao Poder Judiciário.
Isso, a meu ver, ocasionou uma
hipervalorização do termo circunstanciado e da palavra da vítima. A vítima é
ciente de que com a sua narrativa colocará o autor do fato à frente do juiz.
Muitas vezes este instrumento é utilizado de forma abusiva e com intuito vingativo. Em alguns casos, o autor é obrigado a constituir defensor e comparecer ao judiciário, mas na verdade houve
um registro de ocorrência que narra um
fato inexistente ou que não retrata a verdade. Isto porque não há qualquer investigação sobre aquilo que foi narrado.
Além disso, o autor da suposta infração
acaba por aceitar qualquer benefício que
lhe seja formulado em audiência a fim
de evitar um eventual processo”. Um
dos argumentos que poderia ser levado
em conta, quando se faz uma análise crítica da causa impeditiva do art. 76, § 2º,
II, da supracitada lei, é esse maior poder atribuído à suposta vítima. Simples
intrigas entre vizinhos, discussões banais,
etc, fatos, muitas vezes, atípicos,
inexistentes levados a delegacia, devido
a intenções meramente vingativas, acabam por fazer com que o suposto autor do fato aceite a transação penal, evitando os custos e as delongas de um
processo, além de outros prejuízos que
possam vir a ter no meio social por estar respondendo a um processo. Aceitando a pena restritiva, ficará 05 (cinco)
anos privado do benefício, vindo a se
sujeitar ao processo, caso seja vítima de
uma atitude meramente de índole vingativa. Ainda, é opinião de Alexandre
Wunderlich: “ O autor do conflito consente com a imposição de pena justamente para se livrar do eventual risco
de responder a um processo criminal.
Soma-se ao risco do processo o fato de
o autor ter que se submeter ao chamamento de testemunhas para demonstrar
sua inocência, de ser constrangido a participar de audiências na condição de réu,
de que outras pessoas de sua família
48
O Magistrado
percebam que está sendo processado
criminalmente, de ter que comunicar seu
endereço em caso de alteração e, ainda,
de ter que custear os honorários de advogado (já que a defensoria pública, em
muitos Estados, ainda está longe do ideal). Assim, o autor do fato aceita uma
pena restritiva de direitos que para ele,
em que pese a ausência de demonstração de sua culpa no conflito ou sua inocência, é menos gravoso que o custo do
processo.” Por essas razões explicitadas
na opinião do referido jurista, pode-se
considerar o espaço de tempo de 05
(cinco) anos, para impedir transações
penais consecutivas, muito longo e, até
mesmo, carecedor de fundamento. Não
se pensou na possibilidade do uso inadequado dos procedimentos e processo do Juizado, ao se estabelecer esse prazo. O suposto autor do fato, atendendo
a todos os outros requisitos da transação penal, mas em virtude de ter aceitado
há menos de cinco anos, vindo a ser vítima de um termo circunstanciado de
ocorrência e da palavra do suposto ofendido, ficará tolhido do benefício e terá
que arcar, se não houver interesse de
acordo por parte da suposta vítima, com
o processo e seus procedimentos. É certo que o suposto autor do fato, acompanhado do seu defensor, não é obrigado a aceitar a proposta e pode provar
sua inocência em um processo, mas se
um dos principais objetivos dos Juizados
Especiais é evitar as delongas do processo e despenalizar, seria de encontro a tais
escopos, esse impedimento.
O ideal seria apreciar apenas os
incisos I e III, § 2º, do art. 76, da Lei
estudada, os quais tratam, respectivamente, da condenação, “pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por
sentença definitiva” e da não indicação
pelos antecedentes, conduta social e personalidade do agente, “bem como os
motivos e as circunstancias”, da necessidade e da suficiência de tal medida. Somos da opinião de que tal espaço de
tempo deveria ser suprimido, mantendo-se as outras causas impeditivas, visto
já ser dada muita importância à palavra
da suposta vítima e ao termo circunstanciado de ocorrência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES, Luiz Flavio; GOMES FILHO, Antonio
Magalhães; GRINOVER, Ada Pellegrini. Juizados Especiais Criminais. Comentários
à Lei 9.099, de 26.09.1995. 3. ed. São Paulo: RT, 1.999. p. 148.
FIGUEIRA JR., Joel Dias, LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. Comentários à Lei dos
Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Lei 9.099, de 26.09.1995. 3. ed. São Paulo: RT,
2.000. p. 604.
GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Juizados Especiais Criminais. Doutrina e
Jurisprudência atualizadas. 2. ed. Editora Saraiva, 2.002.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais. Comentários
Jurisprudência Legislação. 4. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2.000. pp. 136, 149, 150.
JESUS, Damásio de. Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada. 7. ed. Editora
Saraiva, 2.002.
MOLINA, Antonio Garcia-Pablos De; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia: Introdução
a seus fundamentos teóricos: introdução às bases criminológicas da Lei 9.099/95. 2.
ed. São Paulo: RT, 1.997.
SILVA, Luiz Cláudio. Juizado Especial Criminal. Pratica e Teoria do Processo. Rio
de Janeiro: Forense, 1.997.
WUNDERLICH, Alexandre. A vítima no processo penal: impressões sobre o fracasso
da Lei 9.099/95. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Editora Revista dos Tribunais, nº
47, março – abril, 2.004, pp. 253, 259 e 260.
P
O
L
Ê
M
I
C
A
Abuso de poder
Decisão inédita do TJDFT censura publicamente promotores do Distrito Federal
50
O Magistrado
ção preliminar a respeito da petição de
Túlio Arantes, com vistas a apurar se o
subprocurador tinha atuado indevidamente.
Em seguida, requisitou na Delegacia Especial de Ordem Tributária, a
instauração de inquérito policial contra
Túlio Arantes, pelo crime de patrocínio
infiel. O presidente da Associação dos
Procuradores do DF, Marcos Vinícius
Witczak, garante que o promotor Mustafá
não poderia ter adotado tal procedimento,
por ser matéria fora de seu campo de
atuação e que invadia a competência privativa de outra promotoria.
Por fim, o promotor Zacharias
Mustafá acionou a Promotoria do
Patrimônio Público e Social, com o objetivo de apurar suposto ato de
improbidade decorrente mesma petição.
Divulgação
Recentemente, por unanimidade,
o Conselho Especial do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) anulou procedimento administrativo instaurado pelo Ministério
Público do DF contra o Subprocurador do Distrito Federal, Túlio Márcio
e Cruz Arantes.
Isso devido a um caso ocorrido
em agosto de 2003. O subprocurador
Túlio Arantes, atuando como advogado (os procuradores do Distrito Federal podem também advogar, desde que
não atuem contra o DF - art. 30, I, do
Estatuto) e não como procurador, em
petição única, requereu ao juiz da 8a
Vara Criminal que extinguisse a
punibilidade de um réu num processo
criminal tributário, alegando que o mesmo já tinha quitado a dívida com a fazenda pública.
No caso, Túlio Arantes limitouse a juntar o comprovante do pagamento do tributo, parte em espécie e outra
em precatórios, em face do que pedia
o fim do processo movido contra o
devedor em questão.
Pelo fato, o promotor do DF,
Zacharias Mustafá Neto, afirmou que o
subprocurador não poderia ter atuado
no processo, já que o Distrito Federal
era “vítima no feito”. Requereu, então
ao juiz responsável pelo caso que informasse à OAB/DF e à ControladoriaGeral do DF do ocorrido.
Porém, antes mesmo do juiz decidir algo a respeito do pedido, Mustafá
procurou outros meios para levar adiante o caso. Primeiramente, instaurou,
em sua própria promotoria, um procedimento administrativo de investiga-
“A instauração dessa investigação, com a fundamentação apresentada, nos parece frágil e
desmerecedora de um Ministério Público sério”, desembargador Nívio Gonçalves
P
Todos esses atos no primeiro
dia de setembro de 2003 e antes do
juiz da 8a Vara Criminal decidisse sobre a questão. Quando decidiu sobre
o caso, o magistrado César Laboissiére
Loyola, deu ganho de causa ao
subprocurador Túlio Arantes, alegando que não havia sido “deduzida qualquer pretensão contra a Fazenda Pública”, uma vez que ele se “limitara meramente a requerer a extinção de
punibilidade”.
Por causa das ações de Mustafá,
Túlio Arantes teve que ingressar com
um habeas corpus para trancar o inquérito policial indevidamente instaurado, no qual o TJDFT reconheceu que
o fato não configurava crime. Teve,
também, que impetrar um mandado
de segurança, perante o Conselho Especial do TJDFT, para trancar o inquérito administrativo instaurado a pedido de Mustafá Neto na Procuradoria
de Defesa do Patrimônio Público e
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Social. Além de Mustafá, outros quatro promotores se envolveram no
caso. São eles, Libânio Alves
Rodrigues, Eduardo Gazzinelli Veloso,
Fábio Barros Matos e Ivaldo Lemos
Júnior.
Com isso, vale ressaltar um fato
curioso: como a Corte evoluiu em pouco mais de oito meses.Já que no ano
passado, até mesmo desembargador
podia ser investigado pelo Ministério
Público do Distrito Federal.
O caso no Conselho Especial do TJDFT
Os desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal entenderam, no início de maio deste ano,
que não há justa causa para abertura do
processo.
Foram juntadas ao processo,
duas consultas a respeito do tema. Em
parecer, o Conselho Superior da Procuradoria Geral do DF afirmou não
haver prática de “nenhum ato que importe violação a dever funcional”. No
mesmo sentido, a Ordem dos Advogados do Brasil, seccional DF, se
posicionou no sentido da inexistência
de impedimento para Procurador do
Distrito Federal atuar como advogado.
Segundo a OAB/DF, a vedação
restringe-se ao exercício da profissão
contra a Fazenda Pública que o remunere. Os desembargadores entenderam
que a investigação interna era desprovida de sentido, já que os mesmos fatos do mandado de segurança já haviam sido apurados em inquérito policial, instaurado por iniciativa de promotores, e pouco antes trancado por força de habeas corpus concedido à unanimidade pela 1ª Turma Criminal do
TJDF, por ausência de justa causa.
Ao dar provimento a esse mandado de segurança, o TJDF considerou ilegal e abusiva a instauração de um
procedimento de investigação preliminar no MP contra o advogado Túlio
Arantes, efetuado por cinco promotores (Zacharias Mustafa Neto, Libânio
Alves Rodrigues, Eduardo Gazzinelli
Veloso, Fábio Barros Matos e Ivaldo
Lemos Júnior), com a chancela do exprocurador geral de Justiça José Eduardo Sabo Paes, atos que foram endossados, ainda, pelo atual Vice-Procurador-Geral José Firmo Reis.
Houve manifestações contundentes dos desembargadores quanto ao
abuso praticado pelo Ministério Público. “A instauração dessa investigação,
com a fundamentação apresentada, nos
parece frágil e desmerecedora de um
Ministério Público sério. É bastante grave, pois sem dúvida já é suficiente para
macular a imagem da autoridade
impetrada. Sem causa, sem nenhum
motivo justo e grave, não é possível
uma investigação como a noticiada nos
autos. Isso marca a vida profissional do
investigado, traz-lhe sofrimento, compartilhado por toda sua família. O procurador-geral do Ministério Público
atual me parece uma pessoa honesta, e
por isso mesmo, acredito firmemente
que porá um fim em tudo isso que está
acontecendo em nome da dignidade e
em nome da justiça. Concedo a segurança sabendo que, na tarde de hoje,
pratiquei um ato de justiça”, declarou,
em seu voto, o desembargador Nívio
Gonçalves.
No julgamento, os desembargadores formularam ainda outras duras críticas ao MP, em especial ao exprocurador-geral Eduardo Sabo, repreendendo-o por ter chancelado o ato
ilegal de seus subordinados, e ao atual
Vice-Procurador-Geral do PDFT, José
Firmo Reis, por ter promovido uma
troca de pareceres no processo. O parecer original havia sido favorável ao
advogado, o que ensejou a elaboração
de um novo parecer, do atual vice-procurador-geral, em sentido totalmente
contrário. “Como parece que o primeiro não agradou, a cúpula do MP decidiu trocá-lo”, foi o comentário cáustico a respeito feito pelo desembargador
Lécio Resende em seu voto. Criticou,
ainda, duramente, esse tipo de investigação interna, ao afirmar, que o mau
uso dos poderes do MP “chegou a um
tamanho descontrole que o órgão poderá vir a instaurar procedimentos
inominados, não previstos em lei, com
caráter meramente persecutório”.
Por seu turno, a OAB/DF saudou a decisão como histórica. Segundo a presidente Estefânia Viveiros, o
entendimento do Tribunal nesse caso
significa “a vitória da justiça e do bom
O Magistrado
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senso, porque ela põe um freio nos
excessos que o MPDF vem ultimamente cometendo e assegura maiores garantias aos advogados do Distrito Federal”. Estefânia lembrou ainda que o
promotor de Justiça Zacharias Mustafá
Neto, de quem partiu a seqüência de
atos abusivos, está denunciado criminalmente perante o Tribunal Regional
Federal da 1ª Região por abuso de autoridade.
Trata-se de uma decisão inédita
e que está tendo intensa repercussão nos
meios jurídicos porque, pela primeira
vez e por unanimidade, o Judiciário
local não só censurou explicitamente o
Ministério Público por abuso de poder, por se utilizar desse polêmico procedimento investigativo preliminar,
como questionou a legalidade do MP
para promover investigações por conta própria.
Essa decisão torna incômoda a
posição do Ministério Público na discussão que vem se desenvolvendo, nos
meios jurídicos, no sentido de se saber
se os promotores podem ou não, legalmente, proceder a investigações criminais por conta própria, questão que
está tendo sua constitucionalidade questionada no Supremo Tribunal Federal
(STF).
Fonte: Infojur
OAB quer investigação contra os promotores
O incidente que envolveu cinco
promotores de Justiça, a cúpula do
Ministério Público do Distrito Federal
e o advogado e procurador Túlio
Arantes pode ganhar novos desdobramentos. Membros do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil querem que a entidade encaminhe
ao procurador-geral da República,
Cláudio Fontelles, um pedido de investigação interna contra os promotores,
para apurar eventual prevaricação e
abuso de autoridade.
Os advogados afirmam que, na
condição exclusiva de advogado, Túlio
atuou uma única vez numa ação penal
em que o Distrito Federal não era parte, quando comunicou ao juiz que o réu
na causa havia pago o tributo que era
acusado de sonegar. Assim, ele requereu a extinção da punibilidade.
A petição rendeu dois inquéritos, instaurados pelos promotores, um
penal e outro de natureza administrativa, pela prática de ato de improbidade.
O inquérito penal foi trancado no ano
passado, por decisão unânime da 1ª
Turma Criminal do Tribunal de Justiça, com parecer favorável do atual procurador-geral de Justiça do DF, Rogério Schietti. O procedimento administrativo foi declarado abusivo pela corte especial do Tribunal.
52
O Magistrado
Túlio solicitou pronunciamento
do Conselho Superior da Procuradoria-Geral do DF e da seccional da OAB
acerca do caso. Os dois órgãos se
posicionaram a favor de Túlio Arantes.
Ainda assim, foi processado administrativamente por cinco promotores:
Zacharias Mustafa Neto, Libânio Alves
Rodrigues, Eduardo Guazzinelli, Fábio
Barros Matos e Ivaldo Lemos Júnior.
Os atos dos promotores foram ratificados pelo ex-procurador geral do MP
do Distrito Federal, José Eduardo Sabo
Paes.
O conselheiro federal da OAB,
Rossini Corrêa, afirmou que os fatos
“são bem mais graves do que à primeira vista poderia parecer, pois representam a comprovação de que o MP,
em certos casos, pode empregar meios ilegais para agir”. Por conta disso,
acrescentou, pretende propor ao Conselho Federal da OAB que esse episó-
No ano passado, até
mesmo desembargador
podia ser investigado pelo
Ministério Público do
Distrito Federal.
dio seja levado ao conhecimento da
Procuradoria-Geral da República.
“Esse caso envolve abusos tão
injustificáveis e uma violação de prerrogativa tão acintosa e grosseira que as
autoridades que a perpetraram é que
deveriam, agora, ser investigadas no
âmbito do Ministério Público Federal,
por ato de improbidade”, afirmou. Ele
lembrou que o abuso de autoridade
reconhecido pelos desembargadores já
havia sido apontado pelo próprio Ministério Público Federal, quando denunciou um dos promotores envolvidos
(Zacharias Mustafá Neto), que já está
respondendo a processo penal perante
o Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
Na mesma linha, o conselheiro
federal Marcelo Galvão considerou inaceitável a conduta dos referidos promotores. “É de se louvar a decisão corajosa e inédita da corte local. Os
desembargadores, sensíveis ao caso, colocaram um basta a uma situação ilegal
e altamente constrangedora a um advogado respeitado e conhecido nesta cidade, que nada fez a não ser exercer legalmente sua profissão. Essa decisão,
ademais, traz mais garantias ao exercício da advocacia. Está de parabéns o
Tribunal”, afirmou o conselheiro.
Fonte: Consultor Jurídico
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Repercussão
Entrevista com Marcos Vinícius Witczak – presidente da
Associação dos Procuradores do Distrito Federal
A Associação dos Procuradores do Distrito Federal comemorou
a decisão recente do Tribunal de
Justiça do DF sobre o caso do
subprocurador Túlio Arantes. O presidente da entidade, Marcos
Vinícius Witczak, acredita que a
partir de agora o MP agirá com
mais responsabilidade diante de
casos parecidos.
Para ele, a desavença entre alguns promotores e procuradores
começou em 2001, quando Mustafá
Neto promoveu uma ação de
improbidade contra alguns procuradores do DF, dentre os quais,
Luciano Arantes, irmão de Túlio
Arantes, à época procurador-geral
adjunto do Distrito Federal. Mais à
frente, os procuradores do DF seriam inocentados no caso. Ficou, no
entanto, o mal-estar da história.
Em uma entrevista exclusiva,
Witczac dá seu posicionamento sobre tudo que ocorreu de 2001 até a
recente decisão do TJDF para o
caso do subprocurador Túlio
Arantes.
O Magistrado - O senhor
acha que esse caso ilustra o problema que existiria, eventualmente,
entre procuradores do Distrito Federal e promotores?
Marcos Witczak - Eu não quero crer que exista uma posição
institucional do Ministério Público contra a procuradoria do DF. O que me
parece que ocorre é que há promoto-
“O que me parece que ocorre é que há promotores de justiça que atuam,
por vezes, sem respeitar o trabalho dos procuradores”, Marcos Witczak.
O Magistrado
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res de justiça que atuam, por vezes, sem
respeitar o trabalho dos procuradores.
Um trabalho que é feito, principalmente, na área da consultoria jurídica, e que
merece o devido respeito, porque afinal de contas nós somos procuradores
de DF e atuamos com independência
técnica. Nós somos técnicos e nós emitimos manifestações jurídicas em processos administrativos.
O Magistrado - O senhor
considera que investigações como
essas que foram abertas contra o
subprocurador Túlio Arantes são
abusivas por parte do Ministério
Público do DF?
Marcos Witczak - Eu digo
que são abusivas porque temos agora a chancela do Poder Judiciário. No
caso do Túlio, havia uma insistência
do Ministério Público em desprezar
a manifestação da OAB e do Conselho Superior da Procuradoria de que
ele não havia infringido o Estatuto
dos Advogados e nem seus deveres
funcionais como Procurador. Espero que agora o MP respeite a decisão
do Tribunal de Justiça. Mas o caso
do Túlio infelizmente não é isolado.
Existem outros casos onde também
houve abusos cometidos contra procuradores. E o que é interessante nesses outros casos é que em todos eles
houve um entendimento do Ministério Público de que procuradores ao
emitirem pareceres estariam cometendo equívocos nas suas conclusões jurídicas. Que estariam opinando de
forma incorreta. Jamais o Ministério
público nos acusou de termos recebido alguma vantagem ilícita para favorecer algum interesse particular.
Nunca fomos acusados disso. Mas,
já fomos acusados de emitir pareceres que o Ministério público entendeu incorretos juridicamente, e isso é
inadmissível.
54
O Magistrado
O Magistrado - O senhor
atribui esse fato do subprocurador
Túlio Arantes a outros episódios?
Marcos Witczak - O primeiro
episódio que ocorreu e que procuradores foram acusados da prática de atos
de improbidade pela simples emissão
de pareceres foi no notório caso
Martins. Na ocasião, procuradores foram acusados por terem elaborado ou
aprovado pareceres favoráveis à alteração de uma cláusula num termo de
regime especial de pagamento de tributos. Essa opinião jurídica, para o
Ministério Público, estaria equivocada
e causaria prejuízos ao DF. Ora, o parecer é uma peça técnica e que tem fundamentos jurídicos. Se aqueles fundamentos jurídicos não estão corretos não
é o Ministério Público que pode julgar
esse aspecto, até porque o parecer não
vincula a Administração. O parecer é
uma peça de consultoria, como o próprio nome já diz, então, isso é para nós
muito claro: é nossa independência técnica. O procurador quando emite um
parecer se vale dos elementos fáticos
que estão nos processos e da convicção jurídica que ele tem sobre determinado assunto. Como o Poder Judiciário excluiu os procuradores da ação
de improbidade do caso Martins, caso
de grande repercussão, eu creio, então,
que esse fato acirrou os ânimos dos promotores e começaram a surgir outros
casos e chegamos a ter procuradores
denunciados criminalmente pela emissão de pareceres em um caso de dispensa de licitação, mas a ação penal foi
trancada pelo Tribunal de Justiça por
manifesta falta de justa causa. Isso pelo
mesmo motivo de sempre, porque um
procurador de estado, no caso do DF,
não pode ser responsabilizado por ter
emitido uma opinião jurídica sobre determinado assunto. Claro que se há má
fé, se há uma conduta viciada aí é outra
questão. Jamais eu defenderia uma imu-
nidade absoluta para o procurador.
Não é isso. É que o procurador deve
responder se há prova verdadeira da
prática de um ato ilícito, de uma conduta criminosa, que seria emitir um
parecer com vistas a obter uma vantagem indevida ou um parecer que não
reflita a verdade do processo.
O Magistrado - O senhor
acha que faltam critérios de alguns
integrantes do Ministério Pública na
hora de denunciar?
Marcos Witczak - Eu creio
que em alguns casos sim, porque promotores por vezes não têm a percepção de que o procurador não executa
políticas públicas, o procurador não
administra o DF. O ato administrativo não é do procurador. O procurador é um consultor jurídico e se o
Ministério Público julga que atos praticados pelos administradores do DF
são incorretos e ilegais, então, deve
buscar o Judiciário para obter a correção destes atos, mas jamais responsabilizar o advogado público por uma
opinião técnico-jurídica que emitiu
num processo.
O Magistrado - O que esse
tipo de processo de investigação
tem causado na vida desses procuradores?
Marcos Witczak - É profundamente constrangedor ter o nome
no jornal acusado da prática de
improbidade, porque, infelizmente,
muitas vezes, a pessoa leiga lê o jornal e já toma os fatos como verdadeiros. Então, um procurador que
tem o nome exposto no jornal como
alguém que tenha participado da prática de um ato irregular ou ilegal é
muito agredido moralmente. Aquilo
é profundamente constrangedor e
desagradável, faz com que a pessoa
P
padeça de um sofrimento devastador.
Imagine, um profissional que sempre
zelou por sua reputação, tem uma
história como procurador, tem uma
biografia como profissional exemplar, como é o caso do Túlio Arantes,
que tem um nome conhecido na comunidade jurídica, entre seus amigos,
e de repente as pessoas passam a têlo como alguém que praticou um ato
criminoso e essa pessoa é questionada a respeito disto. Isso causa um dissabor que é irreparável.
O Magistrado - O senhor
acha que essa última decisão do
TJDF marca uma nova era?
Marcos Witczak - A nossa vontade é que o Tribunal tenha mostrado
ao Ministério Público que é necessário
um maior cuidado na análise destas denúncias, destes fatos e que o Ministério
Público passe a ver a Procuradoria com
outros olhos, porque nós somos advogados do DF, dos interesses do Distrito
Federal. Nós temos a coragem de dizer
O
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no processo se o interesse do administrador do momento contraria o interesse público. Nós temos essa coragem
porque nos é garantida por Lei a independência técnica e parece que é isso que
o Ministério Público não quer enxergar.
Não quer ver no Procurador um advogado público que tem o dever constitucional de fazer o controle prévio da legalidade. Espero que isso demonstre que
o Judiciário está atento, que o Judiciário
não deixará prevalecer injustiças contra
os advogados públicos.
Leia alguns trechos importantes, de forma intercalada, isto é, não contínua, dos votos de
cada desembargador, que demonstram o reconhecimento do abuso de autoridade do
Ministério Público no caso de Túlio Arantes.
Fotos: Divulgação
DES. EDSON ALFREDO MARTINS SMANIOTTO
(SOBRE A FALTA DE JUSTA CAUSA E SOBRE
ADVERTÊNCIA EXPRESSA AO MP):
“Não vejo justa causa
para permitir essa investigação,
ainda que preparatória, ainda
que preliminar”
A iniciativa do Ministério Público fere direito líquido
e certo do Impetrante”
E ainda faria uma ponderação: é hora de o MP deixar de tomar outras providências (no caso referindo-se à eventual continuidade do
PIP)”
DES. LÉCIO RESENDE DA SILVA (SOBRE A
QUESTÃO BIZARRA DOS DOIS PARECERES
DO MP NOS AUTOS)
“A presença de pareceres contraditórios evidencia apenas uma coisa: a de que a unidade e a indivisibilidade do MP
não passa do plano meramente formal”.
“Mantenho ambos os
pareceres nos autos porque a
existência deles apenas demons-
tra a ilegalidade e o abuso de poder com que houve as
autoridades impetradas”
“É importante lembrar que em todos esses anos
de magistratura, jamais vi presentes nos mesmos autos
02 pareceres, 01 a favor e outro contra”.
Sobre a ilegalidade e abusividade do PIP (procedimento de investigação preliminar):
“Este tema se torna ainda mais grave quando se
observa que o Procedimento de Investigação Preliminar instaurado - e que eu espero que não tenha prosseguimento - trata da mesma questão que já havia sido
examinada no âmbito do habeas corpus julgado pela 1ª
Turma Criminal deste Tribunal, ordem concedida à unanimidade. E aqui o que se tem é violação da coisa julgada.
E isto é intolerável, isto é inadmissível.”
DESEMBARGADOR EDUARDO ALBERTO DE
MORAES OLIVEIRA (SOBRE OS DOIS PARECERES NOS AUTOS)
“A presença de parecer ‘retificatório’ so se
justificaria se houvesse fato
novo, processual, capaz de
ensejar e existência de parecer modificativo, porque, do contrário, penso
eu, é situação que compromete a seriedade da Instituição”.
O Magistrado
55
D I R E I T O N A S R U A S
Ação de hackers
Bancos devem indenizar clientes
Por Daniella Augusto Montagnolli
Thomaz, advogada da Trevisioli
Advogados Associados
Com o advento do Código de
Defesa do Consumidor, em setembro
de 1990, os consumidores finalmente
ficaram assegurados diante dos fornecedores de serviços ou produtos que
contratam ou adquirem. Tal segurança
faz-se pertinente num momento em
que, entre outras relações, ganha importância aquela existente entre os consumidores (correntistas) e os bancos (fornecedores de serviços e produtos). Os
fatos mostram que esta sempre foi uma
relação desigual, refletindo desvantagem ao consumidor.
Até agosto de 2004, ainda se discutia a aplicabilidade do código às instituições financeiras. Porém, em 9 de
setembro passado, com a Súmula 297
do Superior Tribunal de Justiça, qualquer dúvida caiu por terra. As instituições financeiras sempre se portaram
como gigantes quando confrontadas
com os seus correntistas. Estes, em quase todos os serviços contratados, nunca puderam negociar condições, cláusulas, prazos etc. nos “contratos de
adesão”.
Ora, se os bancos nunca mudaram a postura adotada, mostrando-se mais maleáveis, nada mais justo que respondam pelos atos praticados. E assim vem acontecendo.
Buscando acompanhar as tendências
mundiais no que se refere às transações eletrônicas, os bancos dis-
56
O Magistrado
ponibilizaram aos consumidores serviços “virtuais” para facilitar o dia-a-dia destes na execução
de transferências, pagamentos e demais operações on-line. Todavia, ao
oferecer esses serviços, não fornecem
a segurança que o consumidor precisa. É nessa dualidade que reside a atual polêmica jurídica.
O Código de Defesa do Consumidor determina que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de
culpa, pela reparação dos danos causados aos
consumidores por defeitos relativos à prestação
de serviços... Assim, se o banco fornece a
opção para seus clientes movimentarem
suas contas via internet, deve garantir a
total segurança do sistema.
D I R E I T O N A S R U A S
Divulgação
Inúmeras são as conseqüências e
os prejuízos que a ação dos hackers
pode causar. Além de verem suas contas “varridas”, os correntistas podem
assistir, impotentes, ao uso do seu “limite” no cartão ou cheque especial, sem
ter autorizado tais operações. Como
decorrência, podem ser compelidos ao
pagamento de juros e encargos referentes à utilização indevida e podem ter
seus nomes lançados no rol de devedores da Serasa ou SPC.
É preciso agir. Hoje, os
consumidores não estão mais dispostos a amargar prejuízos e buscam assessoria jurídica para serem ressarcidos pelos danos.
O dano material, em geral, é indenizado na proporção da sua extensão e acrescido de juros e correção, ou
seja, há restituição do valor retirado
pelos hackers, e, quando for o caso, da
soma dos encargos pela utilização
indevida do limite e/ou cheque especial. Já o dano moral é mensurado caso
a caso e pode variar de acordo com a
extensão do dano sofrido pelo
correntista, conforme o entendimento
dos juízes, que podem divergir. Mas,
quase sempre, os tribunais vêm fixando a indenização num patamar entre
10 a 20 vezes o valor pelo qual o consumidor foi inscrito nos órgãos de proteção ao crédito.
“(...) se os bancos
nunca mudaram
a postura adotada,
(...) nada mais justo
que respondam
pelos atos
praticados”
“ (...) há restituição do valor retirado pelos hackers, e, quando for o caso,
da soma dos encargos pela utilização indevida do limite e/ou cheque
especial”, Daniella Augusto Montagnolli Thomaz
Importante ainda é frisar que, nessas situações, nos termos do que ensina o
Código de Defesa do Consumidor, o
ônus da prova cabe sempre aos bancos, cabendo ao consumidor demonstrar
o fato ocorrido e sua conseqüência (prejuízo). Porém, os bancos devem compro-
var que procederam com a segurança que
lhes cabia. E é justamente neste ponto que,
infelizmente, as instituições financeiras estão deixando a desejar, fazendo-nos concluir que a tecnologia empregada na
internet, pelos hackers, está muito mais
avançada do que a delas próprias.
O Magistrado
57
PORTUGUÊS
JURÍDICO
A redação como
parte da advocacia
– Final
Por Marcelo Paiva, professor do Imag-DF
EM QUE PESE A –
EM QUE PESE(M)
Em que pese a (com o som fechado
= pêse) tem o sentido de “ainda que contrarie
a opinião de”, “ainda que”. O verbo fica
sempre no singular.
Falhou neste ponto, em que pese à sua forma
atraentíssima, a teoria planeada (Euclides da
Cunha).
Em que pese aos argumentos apresentados
contra o acusado, ele será absolvido.
Em que pese(m) (com o som aberto
= pése) tem o sentido de “ainda que se leve
em consideração”, “embora”. O verbo
concordará com o termo seguinte, que será
sujeito da construção.
Em que pesem as opiniões do ministro,
ninguém aceitou a explicação.
INOBSTANTE
O vocabulário ortográfico não registra
a palavra “inobstante”. Por vários anos, tentei
persuadir meus alunos a não empregarem o
termo. Desisti. A expressão é plenamente
consagrada no meio jurídico. Peço agora aos
dicionários que passem a incorporá-la. Ela é
empregada no sentido de “não obstante” ou
“nada obstante”.
ISSO POSTO –
ISTO POSTO
Como deve ser do conhecimento de
todos, o pronome “isso” retoma idéia já
apresentada (termo anafórico), enquanto o
pronome “isto” antecipa idéia a ser apresentada
ou retoma apenas a última idéia apresentada.
Sendo assim, a expressão adequada para o
emprego seria “isso posto”, pois se está
retomando idéia já mencionada. Não se deve,
entretanto, empregar com a ordem trocada
dos elementos – “posto isso” -, pois o
particípio não deve iniciar a expressão.
PONTUAÇÃO COM
ELEMENTOS NORMATIVOS
HÁ QUE + INFINITIVO
Expressão típica de textos jurídicos,
a expressão “há que + verbo no infinitivo”
tem o sentido de “é necessário”, “deve-se
fazer”.
Há que examinar com detalhes os argumentos
apresentados.
58
O Magistrado
Ao citar referências de elementos
articulados, geralmente surgem algumas
dúvidas se há necessidade ou não do uso de
vírgulas. Vamos esclarecer:
a) seqüência em ordem direta
crescente, ligada pela preposição “de”, não
recebe vírgula.
PORTUGUÊS
JURÍDICO
“O vocabulário ortográfico não registra a palavra “inobstante”. Por vários anos,
tentei persuadir meus alunos a não empregarem o termo. Desisti”, professor
Marcelo Paiva.
O processo está baseado nos incisos I e II do
artigo 226 do Código Penal.
O advogado recorreu com base na al. d do
inc. III do art. 593 do Código de Processo Penal.
A autorização está fundamentada
corretamente com base na al. b do inc. II do art. 10
da Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993.
Observe que, no último exemplo,
a vírgula aparece somente por causa da
data.
b) seqüência em ordem indireta,
mesmo com a preposição “d”, é separada
por vírgula.
Tal situação é regulada no art. 302, inc. III,
do Código de Processo Penal.
O art. 5.º, inc. XXXVI, da Constituição
de 1988 repete a regra do art.º 153, § 3.º, da
Constituição de 1967.
QUE ESTA SUBSCREVE
OU QUE A ESTA
SUBSCREVE?
O verbo subscrever pode ser transitivo
direto no sentido de “aprovar”. Sendo assim,
a preposição se torna inadequada.
O desembargador que esta subscreve.
SE POR AL
Al é abreviação de aliud, que significa
“coisa diversa”. A expressão se por al,
empregada por alguns juristas, tem o sentido
de “se por outros motivos”.
O Magistrado
59
Suplemento de
Saúde
Saiba mais sobre a rinite alérgica
O papel dos pais em relação à
obesidade infantil
S
A
Ú
D
E
Rinite alérgica pode interferir no
desempenho escolar de crianças
Inflamação na mucosa nasal que afeta 25% das crianças em idade escolar
pode trazer conseqüências físicas, intelectuais e emocionais
Nariz entupido, gripes de repetição ou sinusite. É muito comum a
rinite alérgica ser assim “diagnosticada”
e, pior, tratada desnecessariamente com
antibióticos. É aí que mora o perigo.
Essa doença, se não tratada em tempo
e adequadamente, pode trazer conseqüências desagradáveis. Uma delas é o
baixo rendimento escolar. “A rinite traz
diversos incômodos, além de seus próprios sintomas. Isso leva a criança a ficar irritadiça e fatigada, interferindo no
seu dia-a-dia, principalmente na escola”, explica a Dra. Maria Candida Rizzo,
doutora em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e
preceptora de Residência Médica do
Hospital Menino Jesus/PMSP.
A rinite alérgica é uma inflamação na mucosa nasal que desencadeia
uma série de sintomas nasais, como
nariz entupido, coriza e coceira no nariz. Atinge cerca de 25% das crianças
em idade escolar e é causada pela exposição aos chamados alérgenos, como
ácaros, mofo e pêlos de animais. Substâncias irritantes, como gases poluentes
e perfumes, contribuem para agravar
o quadro. Os alérgenos ligam-se a
anticorpos presentes no organismo dos
indivíduos predispostos, levando à liberação de ‘substâncias’ das células capazes de produzir espirros, coceira no
nariz e na garganta, coriza e obstrução
nasal.
“O resultado final se traduz em um nítido comprometimento emocional”, afirma a
Dra. Renata Cocco, médica alergologista do Hospital Albert Einstein.
O Magistrado
61
S
A
Ú
D
E
Junto com a rinite alérgica infantil, é muito comum ocorrerem doenças associadas, as chamadas
comorbidades, cujos sintomas podem
levar a dificuldades de concentração e
perda cognitiva, afetando o rendimento escolar. Conforme esclarece Dra.
Candida, nas crianças, a doença não se
limita à irritação no nariz, mas caracteriza-se por ser uma inflamação
sistêmica. “Quando a mucosa nasal está
inflamada, pode ocorrer a alteração das
condições normais de outros órgãos
com os quais o nariz se comunica, como
o pulmão, a faringe, os seios da face,
os olhos e ouvidos. Se não tratada, a
rinite pode levar localmente a um
acúmulo de secreção com maior probabilidade de proliferação bacteriana”.
Nesses casos, a criança apresenta além
dos incômodos da própria rinite – prurido nasal, coriza, obstrução e espirros
– sintomas de asma, otite, sinusite,
faringite e conjuntivite. “Além disso,
essas comorbidades mascaram o diagnóstico da própria rinite, levando, não
raro, a tratamentos errôneos”, completa
Dra. Cândida.
Outra característica da rinite não
tratada ou mal conduzida é a respira-
62
O Magistrado
ção oral, por causa da obstrução do
nariz. Isso leva à fragmentação do sono
e, ao longo do dia, cansaço, irritabilidade e dificuldades de concentração.
“Crianças tratadas inadequadamente
respiram inadequadamente. Conseqüentemente, apresentam prejuízo na oxigenação cerebral e distúrbios de sono. A
criança tem a sensação de não ter descansado adequadamente e isso se reflete na falta de concentração nas atividades escolares. O resultado final se traduz em um nítido comprometimento
emocional”, afirma a Dra. Renata
Cocco, médica alergologista do Hospital Albert Einstein. Além disso, segundo a Dra. Ana Paula Castro, médica
assistente da Unidade de Alergia e
Imunologia do Departamento de Pediatria do Hospital das Clínicas –
FMUSP, “o aprendizado também pode
ficar prejudicado pelo comprometimento da função auditiva, relacionado ao
acúmulo de secreção na tuba auditiva,
como complicação de rinite alérgica”.
Respirar pela boca também causa
má oclusão dentária, alterações na posição da mandíbula e da língua – o que
pode levar a problemas de fala –
vulnerabilidade às cáries e halitose.
“Todo o conjunto de alterações leva, a
longo prazo, a distúrbios de postura não
apenas em nível físico mas também intelectual e emocional”, alerta Dra.
Candida. A obstrução nasal prejudica,
ainda, o olfato, havendo perda de apetite e, em última instância, perda de peso
Substâncias
irritantes, como
gases poluentes
e perfumes,
contribuem para
agravar o quadro
e altura. Além disso, ao respirar pela boca,
a criança anula a função nasal de filtrar,
umidificar e aquecer o ar, o que a expõe
às outras comorbidades.
Dra. Maria Candida ressalta a
importância de se ter em mente o conceito de rinite alérgica como doença
sistêmica, sendo recomendado o tratamento multidisciplinar com outros especialistas além do alergista/pneumologista ou do pediatra, como
fonoaudiólogos, dentistas, ortodontistas e otorrinos. “A principal forma de
prevenir as comorbidades é o seu reconhecimento adequado. É muito importante que o médico possa identificar a rinite alérgica como causa de complicação”, explica Dra. Ana Paula.
A Dra. Renata alerta que “o tratamento deve ser sempre individualizado, cada paciente deve ser abordado
de forma específica quanto à identificação dos desencadeantes e medicação
apropriada. Consensos internacionais
apontam os corticóides nasais como
uma importante opção terapêutica para
as rinites que requerem tratamento
farmacológico”. O Plurair, solução
aquosa com fluticasona comercializado
pela Libbs Farmacêutica, não agride a
mucosa nasal por não conter
conservantes. Além disso, seu frasco
possui um sistema de aplicação a vácuo que previne a entrada de microorganismos e impede a contaminação do
produto. O medicamento também não
apresenta efeitos adversos sistêmicos,
quando utilizado corretamente e sob
supervisão médica.
Porém, para um bom resultado
do tratamento, é fundamental o afastamento dos desencadeantes e irritantes,
para qualquer tipo de rinite. Dra. Renata Cocco recomenda, ainda, a limpeza nasal com solução aquosa de
cloreto de sódio (soro fisiológico)
como primeiro passo para a manutenção das vias nasais permeáveis e para a
remoção dos alérgenos e irritantes.
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Exemplo
Postura dos pais é vital no combate à obesidade infantil
Por Nataniel Viuniski, pediatra e nutrólogo, é supervisor da clínica Espaço
Leve - Núcleo de Prevenção e Tratamento da Obesidade Infanto-Juvenil, de
São Paulo. Autor do livro “Obesidade Infantil - Um Guia Prático”. Viuniski
também é coordenador do departamento de obesidade infantil da Abeso
(Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade)
A obesidade infantil atinge no
Brasil entre 7% e 15 % das crianças,
dependendo da região e da classe social. Nos Estados Unidos, o número
dobrou na última década e cerca de
30% das crianças apresentam algum
grau de sobrepeso. Diante das inúmeras doenças decorrentes do excesso de
peso, a Academia Americana do Coração (American Heart Association) declarou que prevenir a obesidade infantil
é uma das formas mais eficientes de
diminuir os problemas cardiovasculares entre adultos.
O estilo de vida atual faz com
que os pais, oprimidos pelos compromissos do dia-a-dia, mudem os
hábitos alimentares da família. Substituem pratos balanceados e comidas
“As brincadeiras
de rua foram
substituídas por
até cinco horas
diárias na frente
de algum
tipo de tela”
Dr. Nataniel Viuniski explica que os pais substituem pratos balanceados e comidas
caseiras por pizzas, massas prontas, biscoitos e refrigerantes.
O Magistrado
63
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E
caseiras por pizzas, massas prontas,
biscoitos e refrigerantes. Recente pesquisa do IBGE revela que, em geral,
os brasileiros consomem muitos alimentos com alto teor de açúcar, frutas
e hortaliças em quantidade insuficiente. Portanto, as crianças aprendem a
comer cada vez mais gordura e menos fibras, aderindo ao que se
convencionou chamar de geração
coca-cola ou geração fast food. A mudança comportamental já é velha conhecida, mas só agora, com o “surto” da obesidade, percebe-se o impacto que ela pode causar na saúde.
A baixa incidência de aleitamento materno e o sedentarismo também
são grandes aliados para a epidemia
de obesidade infantil. As brincadeiras
de rua foram substituídas por até cinco horas diárias na frente de algum
tipo de tela (TV, videogame, compu64
O Magistrado
tador). Reservando oito horas do
dia para o sono e quatro para a escola, sobra pouco tempo para gastar a
energia da garotada. O problema cresce ainda mais rápido nas camadas mais
humildes da população, em que a oferta de bolachas e refrigerantes, por
exemplo, é mais freqüente. Em
contrapartida, é menor o acesso à educação nutricional ou a informações
sobre estilo de vida saudável.
Como a obesidade infantil é
um desafio mundial, alguns países já
começam a preparar contra-ofensivas. No Canadá, por exemplo, o programa de atendimento pré-natal
informa a gestante sobre alimentação
saudável, para ela e para o seu bebê.
A vedete do programa é
o aleitamento materno, único alimento
recomendado até os seis meses de
vida, uma medida eficiente para evi-
tar o excesso de leite em pó nas
refeições e proteger o nenê contra a
obesidade no futuro.
Entre os adultos brasileiros, o
índice de obesidade atinge 40%, ou
38,8 milhões de pessoas. Se queremos
reverter essa tendência para a próxima geração, precisamos prestar atenção no que nossas crianças estão ingerindo hoje. É preciso conscientizar
crianças e adolescentes sobre a importância de uma alimentação completa, variada e colorida - portanto,
rica em nutrientes. Não há alimentos
proibidos, e sim pratos que devem
ser consumidos com moderação. E
vale lembrar aos pais e mães: não
adianta ensinar as crianças a comer
corretamente se não respeitarem as
próprias ordens. A melhor maneira
de educar e colocar limites é com o
próprio exemplo!
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NÃO FICÇÃO
AO SABOR DE CLÁSSICOS MEMORÁVEIS
Coleção Clássicos IPRI. O IPRI (O Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, da Fundação Alexandre de Gusmão,
instituição de direito público, vinculada ao Ministério das Relações Exteriores –www.funag.gov.br), e a Editora Universidade
de Brasília estabeleceram parceria para viabilizar a edição sistemática, sob a forma de coleção, de obras básicas para o
estudo das relações internacionais. Algumas obras publicadas:
Paz e Guerra entre as Nações, de
Raymond Aron, Tradução de Sérgio Bath, Prefácio de Antonio
Paim, R$ 69,00, 934 págs. O autor
acredita que a paz é o objetivo de todas as sociedades. Mas, iniciou o seu
estudo pela guerra, porque, “a conduta estratégico-diplomática refere-se
à eventualidade do conflito armado”.
Rousseau e as Relações Internacionais, de Jean-Jacques Rousseau,
Tradução de Sérgio Bath, Prefácio
de Gelson Fonseca, R$48,00, 320
págs. Alguns textos jamais haviam sido
publicados em língua portuguesa.
Como é o caso de seus comentários
sobre o projeto de paz perpétua de
Abbé de Saint-Pierre, enquanto outras reflexões importantes
muitas vezes se perdem em meio a considerações mais gerais.
A política do poder , de
Martin Wight, Tradução
de Carlos Sérgio Duarte,
Prefácio de Henrique
Altemani, R$39,00, 330
págs. O autor foi um dos
mais importantes teóricos
da Escola Inglesa. Para ele,
guerras são deflagradas por
desejo de conquista territorial, por impulso doutrinário ou por medo. Quando
se combinam as duas últimas causas, tem-se o pior
tipo de conflito.
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ASCOM/Vivo
Vivo Open Air: do
entretenimento à
experimentação
Evento vai ocupar o Pontão do
Lago Sul até 29 de maio
A mega-tela suíça vai exibir clássicos, cult movies, infantis e blockbusters, além de pré-estréias nacionais e internacionais
P
rimeiro, São Paulo. Depois, Rio de :Janeiro. Nessas cidades o público chegou a
100.000 pessoas. Agora, a VIVO, maior
operadora de telefonia móvel do hemisfério sul, lançará em 12 de maio, a primeira edição do VIVO Open Air em Brasília. O evento, que possibilita ao público assistir a grandes produções cinematográficas num mega-telão de 282 metros
quadrados, localizado a céu aberto, acontece no Pontão do Lago Sul até o dia 29 de maio. Tendo a sinestesia
como palavra de ordem, o VIVO Open Air mistura
cinema, música, cenografia, gastronomia e jogos. Mais
do que divertir, a proposta é levar o público a uma
experiência multisensorial. Por isso, as imag ens
projetadas no mega-telão suíço – equivalente a um pré-
66
O Magistrado
dio de seis andares e com um sistema hidráulico capaz
de levantá-la em três minutos – serão o ponto de partida para um festival que vai extrapolar os limites do
entretenimento. “Patrocinar o VIVO Open Air é reafirmar nosso apoio à cultura e à inovação, que são conceitos intimamente conectados aos valores da VIVO.
E é por conta disso que em 2005 o cinema será um
dos segmentos estratégicos para o nosso
posicionamento de marca”, afirma o Vice-Presidente
Executivo de Marketing e Inovação da VIVO, Luís
Avelar.
“Além ser expandido para Brasília, o evento foi
totalmente redesenhado, com a criação de curadorias
específicas para o evento, para o cinema e para o palco
musical. O objetivo é oferecer às famílias de nossos
C
clientes e ao público em geral uma experiência ainda
mais completa, com inúmeras novidades e uma
fortíssima experiência com a marca”, explica o Diretor de Marketing Promocional e Eventos da VIVO,
Felipe Barahona. Como nas outras edições do evento,
que aconteceram em São Paulo e no Rio de Janeiro em
2004, em 2005 os filmes estarão no centro das atenções – a curadoria está pela primeira vez a cargo do
Grupo Estação. A diferença é que, agora, o cinema
funcionará como elo entre todas as outras atrações. Da
sala de games on line às inovadoras propostas vídeocenográficas de Marcello Dantas. Das atrações musicais nacionais e internacionais selecionadas pela produtora Predileta às imagens eletrônicas dos VJs dos grupos Bijari, Embolex e Apavoramento. A idéia, segundo os curadores Carlos Nader e Rafael Dragaud, é fazer o público transitar entre diferentes formas de arte,
num verdadeiro cruzamento de sensações e sentidos
que têm como motivo central o cinema. Pura sinestesia.
“O sucesso do Vivo Open Air como evento de
cinema nos deu a oportunidade de ampliar as áreas de
interesse e ousar em segmentos como a música. As pessoas vão trocar um simples programa por uma experiência única”, afirma Dragaud. “Patrocinar novamente
o Vivo Open Air, que pode ser considerado um ícone
no cenário cultural brasileiro, só vem reforçar nosso
posicionamento de investir em música para nós”, diz
Loredana Mariotto, diretora de marketing da Motorola.
Tradição na Europa, onde acontece em países como
Suíça, Alemanha e França, o evento foi trazido para o
Brasil pela produtora D+3 em 2002. O cinema ao ar
livre terá capacidade para 1.500 pessoas. “Nossa expectativa é reunir um público de 35.000 pessoas em
Brasilia”, diz a produtora Joana Braga, da D+3. Desde a bilheteria, o público será impactado por uma cenografia composta por uma série de tubos e imagens
projetadas em fumaça, árvores e na própria arquitetura do local. “Os tubos serão o elemento de transitoriedade, o caminho obrigatório para se chegar a qualquer outro lugar dentro do evento”, conta o cenógrafo Marcello Dantas. A mega-tela suíça vai exibir clássicos, cult movies, infantis e blockbusters, além de pré-estréias nacionais e internacionais. Dentre os filmes confirmados na programação de Brasília estão a sessão
dupla de “Kill Bill: Volumes 1 e 2”, de Quentin
Tarantino; os inéditos “Riding Giants – Adrenalina
Pura”, do americano Stacy Peralta, e “Team America –
D e t o n a n d o o M u n d o ” , d e Tr e y Pa r ke r ; o c u l t
“Polyester”, de John Waters; o infantil “Os Incríveis”,
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de Brad Bird; e o mega-sucesso “Senhor dos Anéis –
A Sociedade do Anel”, de Peter Jackson.
Já na tenda dedicada à música, o lema é apostar
na novidade e na afinidade com o conceito de sinestesia
e com o mundo do audiovisual. Por isso, passará por
lá o que há de mais hype na cena nacional: jovens apostas, nomes conhecidos e seus novos projetos e atrações internacionais de vanguarda. Muitos deles com o
propósito de apresentar um show único criado exclusivamente para o evento. Entre as atrações estão nomes como o da banda Los Sebozos Postizos (projeto
paralelo dos integrantes do Nação Zumbi) com o show
“Uma noite do Ben”, só com músicas de Jorge Benjor
dos anos 60 e 70; o grupo carioca Lafayette e os
Tremendões, que revisitam clássicos da Jovem Guarda; o DJ Dolores e seu novo trabalho, “Aparelhagem”;
e os locais Nego Moçambique, Sapatos Bicolores e Bois
de Gerião. A tenda também contará com uma programação para a família, sempre nas tardes de sábado:
uma edição especial da peça “Eu e Meu Guarda-chuva”, do titã Branco Mello, está confirmada para 14 de
maio. Completando a programação, o Vivo Open Air
2005 terá ainda uma sala de jogos on line, além de bares e restaurantes.
SERVIÇO
Informações:
(61) 364-2418
Ingressos:
de domingo a terça-feira: R$ 26 e R$ 13 (meia
entrada para estudantes e maiores de 65 anos).
De quarta-feira a sábado: R$ 30 e R$15 (meia
entrada para estudantes e maiores de 60 anos).
Serviço médico:
Uma ambulância UTI com médico e um posto
médico com enfermeiros
Site:
www.vivo.com.br/vivoopenair.
O Magistrado
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P O N T O
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V I S T A
Os traseiros,
os juros e a Igreja
Por Luiz Gustavo Leão Ribeiro,
Registrador Imobiliário
A eleição previsível e ensaiada do
novo Papa, e um discurso improvisado do Presidente da República renderam farta repercussão na imprensa. Os
noticiários das últimas semanas estiveram recheados de matérias a respeito
da Igreja Católica, dos traseiros preguiçosos dos brasileiros e das taxas de juros. Fé, juros e nádegas. Pelo menos nos
últimos 2.000 mil anos estes temas estiveram intimamente ligados.
Estes três temas de grande interesse público têm um elo de ligação: o
pecado. A Fé ao centro, controlando
tudo – leia-se o Papa, a Igreja. Em sua
órbita, as ações pontifícias contra os
traseiros e os juros, instrumentalizadas,
principalmente, pela Congregação pela
Doutrina da Fé, que atendia pelo nome
de Tribunal do Santo Ofício da
Inquisição.
As nádegas sempre foram atacadas pela Igreja em duas frentes. Sob
o ponto de vista, digamos, mais pragmático, a Igreja sempre condenou, e
com fervor – literalmente -, a prática
“As nádegas sempre
foram atacadas pela
Igreja em duas frentes.”
68
O Magistrado
da sodomia. Símbolo da bela mulher
brasileira, os traseiros podem também
servir de símbolo da perseguição histérica e histórica da Igreja contra as
mulheres. Recentemente, o tema das
nádegas mais uma vez bate à porta da
Igreja. De maneira mais sórdida, e cheirando tão mal quanto a fumaça das
“fogueiras de purificação”, as nádegas
voltam a incomodar a Igreja, sob a
forma lamentável e intolerável da
pedofilia.
Por outro lado, os juros também
sempre foram condenados pelas bulas
pontifícias. A justificativa, neste caso, é
menos teológica e mais mercadológica.
A Igreja, que sempre controlou as terras, grande fonte de riqueza, tinha como
grande rival os judeus, que controlavam
as finanças. A proibição da cobrança
de juros e a possibilidade ardente da
ação do Santo Ofício dificultava a atuação dos grandes rivais e matinha-os,
de certa forma, sempre à mercê dos
atos expiatórios.
Isto, no entanto, nunca impediu
que a Igreja fosse uma grande cliente
dos financistas judeus. Nunca se impor-
P O N T O
tou de pagar os juros dos empréstimos
necessários para financiar principalmente as inúmeras campanhas bélicas do
Pontífice.
Como ponto de interseção, o
pecado, e sua conseqüência, o medo e
a culpa, as molas mestras da teologia
católica. No centro do pecado, o maior de todos, o primitivo, que nos acompanha antes mesmo do primeiro sopro de respiração: o pecado original.
Todos nascemos pecadores, herdeiros e sucessores do pecado cometido pelos habitantes do paraíso. Não se
deixe enganar pelo sorriso angelical de
um recém nascido: é um pecador! A
doutrina do pecado original, além de
muito original, é bastante intrigante.
Suscita-nos, pelo menos, duas grandes
questões teológicas.
Todos viemos ao mundo já pecadores e, para salvação da alma que
se gera condenada, necessitamos da
Igreja, a porta de salvação que nos apresentará o paraíso. É ela quem nos batiza, livrando-nos do pecado original, e
nos acolhendo no caminho que Ele
desenhou para os justos. Se é assim, para
onde foram os milhões de habitantes
da terra, que, originalmente pecadores,
morreram antes de Pedro erguer a pedra fundamental? Foram condenados,
sem sequer a chance de salvação?
Outra questão diz respeito à vinda do Salvador e de sua paixão para
redimir os pecados da humanidade. Se
Jesus se sacrificou por nós, pela salvação de nossa alma, pela redenção dos
pecados, porque continuamos, após sua
morte e ressurreição, a nascermos originalmente pecadores?
A morte de Jesus seria como
uma grande anistia aos pecados da humanidade, que àquela altura praticamente a levavam à total insolvência perante
Deus. Mas, se mesmo assim continuamos, após a anistia, a portarmos o pecado original quando nascemos, é de
se concluir que a Igreja anistiou apenas
os juros e a multa, mas não abriu mão
de nos cobrar o principal. Talvez um
ato falho, deixando entrever suas origens judaicas.
Aplicando estas questões teológicas à política, somos obrigados a reconhecer que a política de juros sustentada pelo Governo Federal é um pecado contra o povo brasileiro. Aliás, é um
pecado original, uma vez que contraria
os fundamentos originais do partido
que o sustenta.
Não bastassem os juros, aplicase ainda uma política fiscal de brutal
violência e incoerência econômica.
Como lembrou o jornalista Jorge
Kajuru, Tiradentes foi enforcado pela
Coroa por ter liderado uma rebelião
que, entre outras coisas, protestava con-
D E
V I S T A
tra a cobrança de impostos da ordem
de 20% (conhecido como “os quintos
dos infernos”). Se vivesse hoje, com a
carga tributária ultrapassando 40% do
PIB, Tiradentes se enforcaria...
Os questionamentos práticos contra os dogmas e a teologia da Igreja são
apenas questões mundanas que não abalam a fé. Por outro lado, as críticas às
políticas monetária e fiscal do Governo
são sérias questões que abalam a fé nas
grandes mudanças sociais prometidas e
esperadas e imprescindíveis e inadiáveis.
Pelo menos, a Igreja nos oferece o caminho da salvação, com o batismo. Necessitamos, urgentemente, encontrar a pia
batismal onde afogaremos os pecados do
Governo Federal, antes da condenação
final do povo brasileiro.
“A Igreja, que sempre controlou as terras, grande fonte de riqueza, tinha como
grande rival os judeus, que controlavam as finanças”, Luis Gustavo Leão Ribeiro
O Magistrado
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SEGREDO DE JUSTIÇA
Minha Mãe
Beijo-te a mão, que sobre mim se espalma
Para me abençoar e proteger,
Teu puro amor o coração me acalma;
Provo a doçura do teu bem-querer.
Porque a mão te beijei, a minha palma
Olho, analiso, linha a linha, a ver
Se em mim descubro um traço de tua alma,
Se existe em mim a graça do teu ser.
E o M, gravado sobre a mão aberta,
Pela sua clareza, me desperta
Um grato enlevo, que jamais senti:
Quer dizer - Mãe! este M tão perfeito,
E, com certeza, em minha mão foi feito
Para, quando eu for bom, pensar em ti.
A primeira pessoa que mandar um correio
eletrônico ([email protected]) e
conseguir acertar o nome do famoso poeta
brasileiro que escreveu o soneto acima, ganhará
um exemplar do livro “Guardião”, a primeira
ficcção jurídica nacional.
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O Magistrado
Download

POL Ê MICA - IMAG-DF