Prefácio
Livro: Direito Desportivo
Autor: Guilherme Augusto Caputo Bastos
Honra-me, sobremodo, a escolha de meu nome pelo ilustre e ilustrado
Ministro do TST Guilherme Augusto Caputo Bastos para prefaciar o Direito
Desportivo, fruto da sua visão aguda e universal em torno de candentes
temas e instigantes questões jurídico-desportivas de notória atualidade. Com
certeza, está-se diante de um “trabalho de ajardinamento em meio a espessa
floresta”,erigido com inegável conhecimento experienciadodas causas
jusdesportivaspromanadas na era do sportbussiness e da indústria capitalista
do desporto. De fato, este livroconcretiza uma investigação científica e
aprofundada em derredor do universo jurídico-desportivo earrosta as
diferentes nuances que permeiam e convivem no jogo dinâmico e complexo
dajuridificaçãodo fenômeno desportivo.
Cumpre registrar que nesta sociedade tecnológica e “internetizada”, onde
vivemos
um
tempo
sem
tempo,
assiste-se
a
um“piriguetismo”
jusdesportivoquefazuso das redessociais, transfundindo parte dos 200
milhões
de
brasileiros,
antes
técnicos
de
futebol,
emcosméticosespecialistasemDireitoDesportivoqueabusam da folia verbal e
prodigalizamuma
raizdosproblemas.
rasa
E,
profundezajurídico-desportiva,
como
um
ponto
fora
semchegar
desta
curva
à
de
“achismos”jusdesportivosou de publicações que se cingem a fazer a
colagem/clonagem de opiniões sem ofertar novos e sopesados fundamentos,
exsurge esta relevante obra, produto da cosmovisão do mundusjurídicodesportivo e da vivência profissional do Autor nas múltiplas “tramas jurídicas
do desporto”.
Sem animus de dar dribles jusdesportivos ou de prestar razões, onde razões
não há, o Ministro Caputo Bastos oferta neste livro soluções razoáveis,
lógicas e sistemáticas, despidas de quaisquer contorcionismos resultantes de
paixões e emoções que, não raro, torcem e distorcem a análise de
destacadas temáticas jusdesportivas.
É cediço que as normas jusdesportivas assumiram um destacado
protagonismo na sociedade contemporânea, sobretudo em face da
especificidade da codificação desportiva e das peculiaridades de que se
revestem. Nessa linha, em capítulo destacado e com visível maestria, o
Ministro Caputo Bastos advoga a necessidade de uma lexspecialis para o
futebol. E o faz a partir da constatação deque “o futebol não cabe mais na
CLT”, ou seja, entende que suas normas, práticas e procedimentos são
insuficientese ressalta a inadequação do regime laboral comum para regular
e albergar aspectos específicos do contrato de trabalho desportivo
profissional.
Com perspicácia e argúcia,destina um capítulo para estabelecer
uma clara e nítida distinção entre os institutos do direito de arena e do direito
de imagem, objeto de tantas e equivocadas decisões judiciais merecem ser
derruídas.
Oseguro
obrigatório
desportivo
ganha
acurada
avaliação
jurídica,sendo dissecado em todos os seus desdobramentos fáticos e
jurídicos. Igualmente objeto de estudo é a concessão de Habeas Corpus ao
jogador Oscar (na época do E. C. Internacional) com os argumentos e
fundamentos jurídicos quelastreiam a inédita decisão do remédio heroico no
âmbito do Direito Desportivo. Norteado por um espírito realista, o Autor, com
tirocínio e ponderação, debruça-se também sobre o polêmico assunto da
responsabilidade objetiva na esfera do desporto profissional, trazendo
valiosos subsídiospara tolher os arroubos de algumas inconsequentes
decisões judiciais.
Não é demais sinalar que Autor já inscreveu seu nome na história
do Direito Desportivo brasileiro, o que pode ser aferido, exemplificativamente,
por dois fatos concretos e públicos:
a) foi o idealizador e artífice maior da Academia Nacional de Direito
Desportivo - ANDD, ente integrado por destacados cultores dotados
de notório saber jurídico-desportivo, com finalidade de estudar e
difundir o Direito Desportivo. Tem, outrossim,o propósito de estimular
o diálogo unificado entre a teoria e a práxis do desporto nas suas
dimensões jurídicas, seja pela via da promoção de palestras,
encontros, seminários e congressos, seja por meio de publicações e
incentivos à divulgação científica de temas afetos ao desporto;
b) é da sua lavra, como Relator, o acórdão revolucionário que pacificou
na Seção Especializada de Dissídios Individuais do TST o caráter
unilateral da cláusula penal, empós dez anos de insegurança jurídica
gerada por decisões contraditórias. E devo confessar: foi o voto do
Ministro Caputo Bastos que me inspirou a elaborar a proposta de
substituição da então ambígua cláusula penal na esfera desportiva
pelosnovéis institutos da cláusula indenizatória desportiva e da multa
compensatória desportiva hoje sedimentados na Lei n. 9.615/98. Isso
significa que o labor jurisprudencial desportivo do emimente Ministro já
produziu efeitos concretos na mutação dalexsportiva.
Reponte-se que o Autor, ao longo desta utilíssima publicação, conduz-nos a
inferir que as leis desportivas no Brasil, ou são insuficientemente aplicadas,
ou são distorcidamente exploradas pelos interesses dos “senhores do
momento”, sobretudo porque “alguns intérpretes tentam colocar, na lei, o que
na lei escrito não está, de acordo com suas preferências, ou dela suprimir
aquilo que não lhes agrada, transfigurando-se mais em legisladores do que
em hermeneutas”, como averbou Ferrara. Embora as leis, inclusive
desportivas, sejam repletas de vaguezas, texturas abertas, imperfeições e
ambigüidades, sabe o Autor que isso não confere ampla “liberdade de
interpretação” ou a autorização para uma livre atribuição de sentido, como se
existisse um grau zero de sentido.
Por sinal, como hermeneuta ou aplicador dalexsportiva,o Ministro Caputo
Bastos evita extrair do texto “idéias apenas existentes no próprio cérebro, ou
no sentir individual, desvairado por ojerizas e pendores, entusiasmos e
preconceitos”. Nesse contexto, ao exercitar a arte de interpretar a incidência
de normas sobre fatos na seara desportiva, o
fechadoem
“torre
do
darealidadedesportiva,outorgaa
marfim”,
este
Autor,que nunca ficou
nemalheioaouniversojurídico
trabalho
jurídico-desportivo
pragmaticidade e credibilidade induvidosas. Trata-se, então, de um contributo
ancilar na consolidação e valorização do Direito Desportivo como parte
destacada da constelação dos ramos jurídicos.
Alfim, o livro Direito Desportivo,ao cultivar novas sementes no terreno fértil do
Direito Desportivo, condensa marcos indispensáveis para todos aqueles que,
no dizer de Canotilho, “pretendam “jogar” seriamente o “jogo” do direito
desportivo”,num cenário em que o desporto está, ao arrepio do art. 217 da
Lex Magna, saindo “da área privada das associações, para situar-se no
território suspeito de dominação estatal”, como já lamentava Serrano Neves.
Por tudo isto, é esta obra indispensável para dirigentes, atletas, técnicos,
árbitros,
legisladores,
advogados,
julgadores,
empresários,estudantes,torcedores e jornalistas desportivos que desejem
"aprender a navegar em um oceano de incertezas, em meio a poucas ilhas
de certeza" existentes no arquipélago jusdesportivo.
Álvaro Melo Filho
Professor
Emérito
da
UFC.LivreDocênciaemDireitoDesportivo.Membro da FIFA, da
International Sport Law Association, da Academia
Nacional de DireitoDesportivo e do IBDD. Autor de 56
livros, dos quais 28 naárea do DireitoDesportivo, além
de
203
artigosemrevistasjurídicasnacionais
e
estrangeiras. Destaque como advogado na área de
Sport Law no Global Guide, anos de 2013 e 2014, do
Chambers&Partners (London).
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Prefácio do livro "Direito Desportivo" de Guilherme Augusto