ESTADO DO MARANHÃO
PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DE SÃO LUÍS
JUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Processo n.º : 3129/2008
Autor
: Ministério Público do Estado do Maranhão
Réu
:
DECISÃO
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO ajuizou Ação Civil
Pública Condenatória de Obrigação de Fazer, com pedido de liminar, em defesa do Patrimônio
Cultural, em face de A.S.L.
O autor afirma que o réu é proprietário de um imóvel situado na Praça
Gonçalves Dias, nº314, Centro, o qual se encontra em total estado de abandono e arruinamento
causados pela sua omissão em conservá-lo. Trata-se de um imóvel tombado pelo Estado do Maranhão
através do Decreto Estadual nº10.089/86 e pela União através da sua inscrição no Livro do Tombo de
Belas Artes, desde 23/12/1955.
Foram feitos vários laudos periciais (fls.05/07, fls. 42/45 e fls.63/70) atestando
que o referido imóvel encontra-se em risco iminente de desabamento, tendo havido inclusive medida
interventiva cautelar realizada pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional),
como forma de preservar algumas peças de valor histórico.
Também foi instaurado Inquérito Civil nº81/2007 (fls.14/85) pelo Ministério
Público do Estado do Maranhão atestando a péssima situação do imóvel, tendo havido inclusive
notificação do réu para prestar esclarecimentos sobre o atual estado do imóvel. Porém, o proprietário
não prestou informações, devido à sua ausência do nosso território nacional.
Relatado, passo à fundamentação.
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A proteção ao patrimônio histórico tem cunho constitucional, porquanto a
Constituição Federal de 1988 dando tratamento inovador, trata a questão de forma minuciosa
adotando a concepção de valor cultural de bens enquanto produto de cultura coletiva e tutelando a
preservação do patrimônio cultural brasileiro, bem como impõe a repressão a danos e ameaças ao
referido bem:
"Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de
natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em
conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos
diferentes grupos formadores da sociedade brasileira nos quais se
incluem:
(...)
V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico,
artístico, arqueológico,
paleontológico, ecológico e científico.
§ 1º O poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá
e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários,
registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas
de acautelamento e preservação.
(...)
§ 4º Os danos e ameaças ao patrimônio cultural serão punidos,
na forma da lei."
A Magna Carta impõe não só ao poder público, mas também à comunidade o
dever de zelar pelo patrimônio histórico e paisagístico, sendo o tombamento um dos instrumentos a
garantir tal tutela.
A lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, disciplina a Ação Civil Pública de
Responsabilidade Por Danos Causados ao Meio Ambiente, ao Consumidor, a Bens de Direitos do
Valor Artístico, Estético, Histórico, Turístico e Paisagístico:
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“Artigo 1° - Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação
popular, as ações de responsabilidade por danos causados:
I - Ao meio ambiente;
II - Ao consumidor;
III - A bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico
e paisagístico;
(...)
Artigo 3° - A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro
ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.
Artigo 4° - Poderá ser ajuizada ação cautelar para fins desta Lei,
objetivando, inclusive, evitar o dano ao meio ambiente, ao consumidor,
aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico”.
Quando a ação civil pública é voltada para a obtenção de providência
jurisdicional em que se determina uma obrigação de fazer ao réu, a tutela pretendida tem caráter
preventivo, em que se busca uma decisão mandamental com o fim de prevenir novos danos, ou a
continuação dos anteriores. Nesses casos, a pretensão do autor é obter determinação judicial que
conduza coercitivamente o réu a fazer ou deixar de fazer alguma obrigação.
No presente caso, o MP ingressou com pedido de caráter mandamental
preventivo para que o proprietário do bem tombado proceda às necessárias restaurações no bem,
para que o mesmo não perca suas características arquitetônicas originais, evitando assim um grave
prejuízo ao patrimônio cultural pátrio.
É dever do proprietário de um bem tombado proceder à sua correta conservação
para mantê-lo dentro de suas características culturais. Caso o proprietário não disponha de recursos
para proceder às devidas restaurações, deverá comunicar tal fato ao órgão que decretou o
tombamento. No caso em questão, trata-se de um empresário estrangeiro que nada comunicou sobre
sua situação financeira, muito menos se manifestou por qualquer meio de comunicação sobre a real
situação do imóvel, e nada esclareceu sobre o motivo pelo qual se omite há bastante tempo em
preservar o referido bem.
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Como visto acima, prevê a lei da ACP a utilização de medida cautelar para evitar
danos aos bens protegidos pela referida lei. Para tanto, exige-se 02 pressupostos essenciais: “fumus
boni iuris” e o “periculum in mora”. Procedendo à análise dos fatos e fundamentos jurídicos desta ação,
podemos vislumbrar a presença destes requisitos. A plausibilidade do direito material encontra-se
consubstanciado na vasta documentação juntada aos autos pelo MP, notadamente o Inquérito Civil
nº81/2007 (fls.14/85), e fundamentado na tutela constitucional dada à matéria, e ainda na lei 7347/85,
que disciplina a ACP. O perigo da demora está no risco iminente de perecimento do bem histórico
tombado, pois caso não haja uma intervenção reparadora imediata, provavelmente ao final da
demanda a pretensão do MP não terá mais valia.
Isto posto, concedo a medida liminar, determinando ao réu Amaro da Silva
Leitão que proceda à imediata adoção de medidas de escoramento, limpeza do terreno e estabilização
do imóvel a fim de evitar seu súbito desmoronamento, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de
multa diária de 1.000,00 (mil reais).
Cientifique-se às partes desta decisão.
Cite-se o réu para, querendo, oferecer contestação no prazo de 15 (quinze) dias.
São Luís, 14 de fevereiro de 2008.
Itaércio Paulino da Silva
Juiz de Direito Auxiliar
Respondendo pela 2ª Vara da Fazenda Pública
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Liminar - Gonçalves Dias