O desaforamento e o reaforamento no novo
procedimento do júri
Elaborado em 06.2008.
Rodrigo Tourinho Dantas
Advogado em Salvador (BA). Bacharel em Direito pela Universidade Católica do Salvador
(UCSAL). Pós-graduando "lato sensu"em Direito Processual Civil pela Fundação Faculdade de
Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Sumário: 1. Noções preliminares; 2. Contextualização; 3. Desaforamento; 3.1.
Considerações gerais; 3.2. Hipóteses de desaforamento; 3.3. Processo do
desaforamento; 3.3.1. Cabimento e oportunidade; 3.3.2. Processamento; 3.3.3 O
assistente do Ministério Público e o pedido de desaforamento; 3.3.4. Destino; 3.3.5. O
desaforamento e o princípio do contraditório; 3.3.6. Efeito suspensivo para o pedido de
desaforamento; 3.3.7. Possibilidade de Desaforamento para segundo julgamento; 3.3.8.
Cabe recurso contra a decisão que acolheu o pedido de desaforamento?; 4.
Reaforamento; 4.1. O reaforamento e a anulação da decisão de pronúncia; 5.
Referências Bibliográficas.
1. Noções preliminares
A Lei nº. 11.689, sancionada em 9 de junho de 2008, publicada em 10 de junho do
mesmo ano e que entrará em vigor 60 dias após a sua publicação, provocou notáveis e
importantes mudanças no que concerne ao procedimento do Júri no Direito Brasileiro.
Por conta disso, faz-se importante, imprescindível mesmo, o estudo de cada uma dessas
alterações. No nosso caso, embora não seja o nosso propósito esgotar a abordagem do
tema, iremos fazer um estudo pormenorizado apenas acerca das modificações
relacionadas ao instituto do desaforamento.
2. Contextualização
A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de
1988, consagrou, em seu bojo, inúmeros direitos e garantias fundamentais, dentre as
quais a instituição do Júri como competente para julgar os crimes dolosos contra a vida
(art. 5º, XXXVIII da CF/88), bem como os crimes a ele conexos.
Com efeito, vige nesse procedimento o princípio segundo o qual o réu deve ser julgado
por seus pares. Vale dizer: o acusado deve ser julgado por aqueles que o conhecem e
que sabem de sua vida. Portanto, objetiva-se que, em lugar do juiz togado, preso a
regras jurídicas, seja o réu julgado por seus pares.
Nesse diapasão, são as lições sempre didáticas de Eduardo Spínola Filho, citando
Magarino Torres, in verbis:
Julgar um homem fora do seu meio é preferir a justiça empírica dos
técnicos, adstritos aos preceitos teóricos da lei uniforme, alheia dos da
realidade da vida de desigualdade natural dos homens; é fazer do júri um
simulacro de justiça, nada humana e ainda menos científica [01].
Passemos, agora, ao estudo minucioso sobre o desaforamento e as alterações/inovações
promovidas pela Lei nº. 11.689/08, e sobre o reaforamento (que mais uma vez, como se
verá, ficou carente de regulamentação legal). Tratam-se de temas de importância prática
imensurável (vejam-se inúmeros julgados acerca do tema em análise nos Tribunais de
Justiça e Tribunais Superiores – STJ e STF), mas que a doutrina, infelizmente, aborda
de maneira superficial.
3. Desaforamento
3.1. Considerações gerais
A determinação da competência jurisdicional no Brasil é, via de regra, estabelecida pelo
lugar da infração, o que vale dizer que será fixada pelo lugar em que se consumou a
infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de
execução. É essa a inteligência do art. 70 do CPP.
Por conta disso, a doutrina pátria preleciona que o réu deve ser julgado no distrito da
culpa, ou seja, onde cometeu a infração penal [02].
Não obstante, essa regra do art. 70 do CPP não é absoluta, haja vista que, em se tratando
dos crimes de competência do Tribunal do Júri, poderá haver uma derrogação para outra
comarca da mesma região, uma vez presente uma das hipóteses previstas nos novos arts.
427 e 428 do CPP, com redações dadas pela Lei nº. 11.689/08.
A esse deslocamento de competência chama-se de desaforamento. Segundo a melhor
doutrina de Fernando da Costa Tourinho Filho, "desaforar é deslocar o julgamento que
deve ser realizado no foro onde se consumou a infração, que é previsto em lei (art. 70
do CPP), para outro próximo". É, pois, retirar o processo do foro original, para que seja
julgado em outro, o que vale dizer que o réu será julgado fora do distrito de sua culpa.
Em breve síntese, segundo o professor Hélio Tornaghi, "desaforar é tirar o processo do
foro em que está. Naturalmente, para mandá-lo a outro foro" [03].
O desaforamento é uma exceção à regra da fixação da competência em razão do lugar
da infração (ratione loci). Nesse sentido, já decidiu a Egrégia Suprema Corte Brasileira
no julgamento do Habeas Corpus nº. 70799, cujo relator foi o Min. Paulo Brossard (o
art. 424 do CPP, ao qual faz alusão o Ministro, corresponde ao atual art. 427 do CPP):
HC 70799 / GO – GOIÁS. JÚRI - DESAFORAMENTO EXCEPCIONALIDADE. A teor do disposto no artigo 424 do Código de
Processo Penal, o desaforamento consubstancia exceção. JÚRI DESAFORAMENTO - COMARCA MAIS PRÓXIMA. O desaforamento
há de ocorrer considerada a comarca mais próxima ao distrito da culpa.
Destarte, tem-se que o desaforamento importa na modificação da competência
territorial, uma vez presentes os requisitos dos arts. 427 e 428 do CPP, ou ainda
questões de ordem material, a saber, p. ex. precariedade de instalações. Nesse sentido,
nunca é demais lembrar a preleção de Eugênio Pacelli, in verbis:
A decisão, como se vê, pertence ao tribunal de hierarquia jurisdicional
competente, tendo em vista que importa modificação de competência,
envolvendo comarcas e, por isso, juízos distintos, e ambos de primeira
instância [04].
Vale anotar, de outra banda, que o instituto do desaforamento não fere os preceitos
constitucionais – precisamente porque, ao contrário do que possa transparecer, o
referido instituto não colide com o princípio do juiz natural, tampouco com a vedação
de tribunal de exceção.
É que o desaforamento desloca o julgamento de um foro para outro em razão das
situações previstas na lei processual, mas a competência para julgar continua com o
Tribunal do Júri, que é constitucionalmente o juiz natural para apreciar os crimes
dolosos contra a vida.
Ademais, o desaforamento não enseja a formação de tribunal de exceção, uma vez que
"faz variar apenas o local do julgamento nas hipóteses do art. 424 do CPP" [05] (atual
art. 427, com redação dada pela Lei nº. 11.689/08), visando assegurar a imparcialidade
dos jurados. Em outras palavras: a excepcional modificação da competência ratione loci
é medida que se impõe à isenção e imparcialidade do Conselho de Sentença.
O Supremo Tribunal Federal, instado a se manifestar acerca do tema, assim se
posicionou (relembrando que o art. 424 do CPP a que se refere o voto corresponde ao
atual art. 427 do CPP):
HC 67851 / GO. ''HABEAS CORPUS''. JÚRI. JUIZ NATURAL.
TRIBUNAL DE EXCEÇÃO. DESAFORAMENTO. REAFORAMENTO.
1. Não é de ser conhecido o ''habeas corpus'', no ponto em que se impugna o
desaforamento deferido, porque pretensão idêntica já foi repelida por duas
vezes pelo supremo tribunal federal. 2. Juiz natural de processo por crimes
dolosos contra a vida e o tribunal do júri. Mas o local do julgamento pode
variar, conforme as normas processuais, ou seja, conforme ocorra alguma
das hipóteses de desaforamento previstas no art.424 do c.p. penal, que não
são incompatíveis com a constituição anterior nem com a atual (de 1988) e
também não ensejam a formação de um ''tribunal de exceção''. 3. Não se
justifica o restabelecimento da competência do foro de origem
(''reaforamento''), se permanecem as razões que ditaram o desaforamento.
''H.c.'' conhecido, em parte, e nessa parte, indeferido.
A figura processual do desaforamento aplica-se tão somente aos processos de
competência do Júri, conforme a exegese do art. 427 do CPP, sendo inadmissíveis para
processos de competência do juiz singular.
É mister salientar que o desaforamento só poderá ocorrer quando a decisão de pronúncia
não comportar mais recurso [06]. Destarte, só tem aplicação para o réu pronunciado e
deve ser argüida depois de transitada a decisão de pronúncia até antes do início do
julgamento no foro originário.
Esse entendimento, há muito adotado pela doutrina e jurisprudência brasileiras, passou a
ser positivado com a reforma processual penal. O § 4º do art. 427 do CPP passou a
prever que:
Art. 427 (…)
(…)
§ 4º Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando
efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo,
nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de
julgamento anulado.
3.2. Hipóteses de desaforamento
O desaforamento, antes da reforma, era tratado em apenas um artigo, que assim
dispunha:
Art. 424. Se o interesse da ordem pública o reclamar, ou houver dúvida
sobre a imparcialidade do júri ou sobre a segurança pessoal do réu, o
Tribunal de Apelação, a requerimento de qualquer das partes ou mediante
representação do juiz, e ouvido sempre o procurador-geral, poderá desaforar
o julgamento para comarca ou termo próximo, onde não subsistam aqueles
motivos, após informação do juiz, se a medida não tiver sido solicitada, de
ofício, por ele próprio.
Parágrafo único. O Tribunal de Apelação poderá ainda, a requerimento do
réu ou do Ministério Público, determinar o desaforamento, se o julgamento
não se realizar no período de um ano, contado do recebimento do libelo,
desde que para a demora não haja concorrido o réu ou a defesa.
Com a Lei nº. 11.689/08, o instituto do desaforamento foi contemplado com uma seção
própria, qual seja, a Seção V do Capítulo II do CPP. A nova norma penal assim prevê:
Art. 427. Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida
sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o
Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante
ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá
determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma
região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas.
§ 1º O pedido de desaforamento será distribuído imediatamente e terá
preferência de julgamento na Câmara ou Turma competente.
§ 2º Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar,
fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri.
§ 3º Será ouvido o juiz presidente, quando a medida não tiver sido por ele
solicitada.
§ 4º Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando
efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo,
nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de
julgamento anulado.
Art. 428. O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do
comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte
contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis)
meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia.
§ 1º Para a contagem do prazo referido neste artigo, não se computará o
tempo de adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa.
§ 2º Não havendo excesso de serviço ou existência de processos
aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de
apreciação pelo Tribunal do Júri, nas reuniões periódicas previstas para o
exercício, o acusado poderá requerer ao Tribunal que determine a imediata
realização do julgamento.
Assim como o anterior art. 424 do CPP, o atual art. 427 prescreve que o desaforamento
pode ser determinado pelos seguintes motivos, a saber: o interesse da ordem pública,
dúvida quanto à imparcialidade de júri ou ainda se houver incerteza quanto a segurança
do réu.
No tocante à primeira hipótese, caberá o desaforamento quando o interesse da ordem
pública assim o exigir. A doutrina pátria [07] é unânime em afirmar que é de
indispensável que haja um estado de paz e tranqüilidade, de modo a que se realize o
julgamento dentro das normalidades.
Outra situação em que cabe o pedido de desaforamento é quando houver dúvida acerca
da imparcialidade do Júri. Magalhães de Noronha, com notória propriedade, preleciona
que:
A imparcialidade do Júri é fundamental. Parcialidade e justiça são idéias
antitéticas. Não é raro que o crime apaixone a opinião pública, gerando
meio social – de onde são tirados os jurados -, antipatia, malquerença e
mesmo ódio contra o réu, não raro sendo que aqueles que vão servir no júri
manifestem sua opinião contra o acusado, embora sem conhecerem o delito
nos pormenores descritos pelo processo, disso surgindo situação
incompatível com a Justiça [08].
Como é sabido, a imprensa, quase que invariavelmente, corrobora para despertar na
população esse sentimento de antipatia, sobremaneira através de reportagens
sensacionalistas, resultando, muitas vezes, na deturpação dos fatos. É importante frisar
que, para requerer o desaforamento na hipótese de existir dúvida sobre a imparcialidade
do Júri, é preciso que haja indícios necessários para que se suscite essa suspeita. A
jurisprudência já se consolidou acerca dessa temática, afirmando que as dúvidas devem
ser sérias, sendo vedadas as suspeitas vagas. Não há como não citar o jurista Francisco
Monteiro Rocha que, com precisão e altivez de sua obra, revela-nos:
A dúvida sobre a imparcialidade do júri deve ser séria e baseada em
elementos suasórios convincentes, Não basta a presunção ou receio de que o
júri afrontará a lei, para prejudicar ou beneficiar o réu. Urge que o argüente
demonstre evidências de que o julgamento está comprometido mesmo pela
imparcialidade dos jurados [09].
Portanto, percebemos claramente que é preciso haver indícios sobre a parcialidade.
Destarte, não configura imparcialidade a simples reação favorável ou não da imprensa,
o poder econômico e político do réu, popularidade do acusado, dentre outros.
Fator que também configura o desaforamento é a incerteza quanto a segurança do
acusado. É a hipótese em que há um iminente perigo à integridade corporal ou à vida do
réu em face da revolta popular diante do fato delituoso. O que a lei quer evitar aqui é o
justiçamento do acusado pelo povo, como não raras vezes tem ocorrido (…). Evita-se,
com a medida, que se faça justiça com as próprias mãos [10]. O caso típico é quando
ocorre o desaforamento para evitar o linchamento do réu.
Em qualquer das hipóteses supramencionadas, como o desaforamento é medida
excepcional, é preciso que haja prova séria, idônea, a autorizar a medida [11].
O antigo parágrafo único do art. 424 do código de ritos penais prescrevia que poderia
haver o desaforamento se, decorrido um ano do recebimento do libelo, não tivesse sido
realizado o julgamento, desde que não tivesse concorrido o réu tampouco a defesa para
tal procrastinação. No que concerne a essa última hipótese, a Lei nº. 11.689/08
provocou significativas alterações.
A uma, porque o prazo não é mais de 1 ano, e sim de 6 meses. A duas, porque, agora, o
prazo de 6 meses não é contado da data do recebimento do libelo, e sim contado do
trânsito em julgado da decisão de pronúncia. A três, porque o desaforamento não mais
leva em conta a demora para o julgamento; o paradigma atual é o excesso de serviço.
Curial esclarecer que, se não houver excesso de serviço e o julgamento não se realizar
dentro de 6 meses do trânsito em julgado da decisão de pronúncia, não caberá
desaforamento. Todavia, pela redação do § 2º do art. 427 do CPP, ocorrendo essa
situação, assim como na hipótese de existência de processos aguardando julgamento em
quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri, nas
reuniões periódicas previstas para o exercício, o acusado poderá requerer ao Tribunal
que determine a imediata realização do julgamento.
Portanto, atualmente, poderá haver o desaforamento em razão do comprovado excesso
de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser
realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de
pronúncia.
Insta anotar que, para a contagem desse prazo, não se computará o tempo de
adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa.
Pergunta-se: as hipóteses elencadas no art. 427 e 428 do atual CPP único são "numerus
clausus", isto é, são taxativas?
Ainda na vigência do art. 424 do CPP a doutrina e a jurisprudência, aos quais sempre
fomos partidários, tinham entendimento de que se tratava de rol meramente
exemplificativo. Julgamos que esse posicionamento permanece mesmo depois da
reforma processual penal.
Por isso, motivos de força maior ou caso fortuito, ou como preferem uns, "questões de
ordem material" podem ensejar o desaforamento. Já se pronunciou o Tribunal de Justiça
de São Paulo acerca dessa problemática, quando na comarca, não exista prédio onde se
puder reunir o júri, ou ainda quando haja falta de instalações adequadas do Tribunal na
perspectiva de ser o julgamento de longa duração, dada a intensa repercussão do fato
[12]. Ocorrendo essas hipóteses não previstas em lei, admite-se, portanto, o
desaforamento.
3.3. Processo do desaforamento
3.3.1. Cabimento e oportunidade
Como cediço, o desaforamento tem cabimento apenas para os processos de competência
do Tribunal do Júri, não encontrando amparo legal para os processos de competência do
juiz singular. A Jurisprudência brasileira já se consolidou acerca deste tema, entendendo
que em nenhum outro rito é possível, somente encontrando respaldo para o
procedimento do Júri.
O pedido de desaforamento, como já explanado, é oportuno depois que transitar em
julgado a decisão interlocutória de pronúncia, o que vale dizer que poderá ser argüida
depois que não comportar mais recurso até antes do início do julgamento no foro
originário.
Por essas razões, não se pode falar em pedido de desaforamento durante a instrução
criminal, durante a pronúncia ou no recurso formulado contra a pronúncia. Nesse passo,
Magalhães Noronha, com clareza diamantina, preleciona:
O desaforamento é só do julgamento, carecendo de razão BORGES DA
ROSA quando diz que também se pode dar relativamente à instrução
criminal, pois o Código é de clareza meridiana ao dizer: ‘... poderá desaforar
o julgamento’. Trata-se também de medida somente aplicável ao julgamento
pelo júri" [13] . (grifou-se)
Visando espancar qualquer dúvida a respeito, a Lei nº. 11.689/08 positivou esse
entendimento no § 4º do art. 427 do CPP:
§ 4º Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando
efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo,
nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de
julgamento anulado.
É de bom alvitre ressaltar que não cabe o pedido de desaforamento na apelação da
decisão do Júri, haja vista que atentaria contra a soberania do Júri. Portanto, se a
acusação, a Defesa ou, ainda, o juiz não diligenciou o desaforamento na oportunidade
adequada, não tem sentido que venha a fazer quando do segundo julgamento ditado por
apelação [14], salvo, conforme veremos adiante, quanto a fato ocorrido durante ou após
a realização de julgamento anulado.
3.3.2. Processamento
O pedido de desaforamento deverá ser feito junto ao Tribunal de Instância Superior.
Qualquer das partes, o assistente de acusação (a respeito deste, trataremos em tópico
específico) bem como o juiz podem requerer a mudança do local do julgamento. Não
obstante, caso seja o juiz o solicitante do desaforamento, ele só poderá fazê-lo nas
hipóteses do "caput" do art. 427; as partes poderão requerê-la tanto nas hipóteses do
"caput" do art. 427, bem como a hipótese trazida no art. 428 do CPP.
O Ministério Público pode solicitar o desaforamento em qualquer das hipóteses já
mencionadas, uma vez que age como custos legis. Sendo o parquet o solicitante, mister
se faz a audiência do defensor como garantia ao princípio constitucional da ampla
defesa [15].
Muito antes da reforma processual, entendia-se que, uma vez requerido o
desaforamento, antes do Tribunal de Instância Superior decidir, havia necessidade do
juiz prestar informações sobre o pedido. A Lei nº. 11.689/08 positivou essa diretriz no
art. 427, § 3º.
Com amparo no princípio constitucional da celeridade processual consagrado na CF/88
pela Emenda Constitucional nº 45, bem como tendo em vista a economia processual,
nada impede - e é de bom alvitre - que o juiz, portanto, remeta o processo ao Tribunal já
devidamente informado.
Salutar ressaltar, todavia, que se for o juiz o solicitante, consoante o art. 427 do CPP,
não há necessidade de o mesmo prestar informações, "pois, nesse caso, evidentemente
estarão explicitadas as informações necessárias ao julgamento" [16].
Posteriormente, superada esta etapa da prestação de informações, os autos serão
remetidos ao procurador-geral de justiça para que o mesmo se manifeste. Por fim,
vencidos todos esses passos, os autos seguem para o Tribunal para que se processe o
julgamento do pedido. O pedido de desaforamento será distribuído imediatamente e terá
preferência de julgamento na Câmara ou Turma competente.
Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar, fundamentadamente,
a suspensão do julgamento pelo júri.
3.3.3 O assistente do Ministério Público e o pedido de desaforamento
Antes da Reforma processual ora analisada, questionava-se se o assistente do Ministério
Público poderia ou não o pedir o desaforamento.
Os doutrinadores brasileiros, à exceção do ultracitado Fernando da Costa Tourinho
Filho, sempre consideravam inaceitável a tese segundo a qual o assistente do parquet
poderia solicitar o desaforamento.
Nessa mesma linha, na jurisprudência havia certa resistência em aceitar a formulação do
pedido de desaforamento pelo assistente do M.P - embora alguns tribunais,
esparsamente, reconhecessem a legitimidade para tanto - ao fundamento de falta de
previsão legal, pois a lei processual, ao tratar dos assistentes, em seu art. 271, CPP, não
previa, de forma expressa, a autorização para tanto.
Embora corrente minoritária, mesmo antes da reforma processual, defendíamos, com
amparo na doutrina de Fernando da Costa Tourinho Filho, ser perfeitamente aceitável a
formulação do pedido de desaforamento por parte do assistente do Ministério Público,
pelos seguintes fundamentos:
O fato do art. 271 do CPP não fazer referência ao assunto não é argumento sério. Ele
também não diz quanto a poder o assistente interpor recurso extraordinário, carta
testemunhável, agravo de instrumento, e, não obstante, ele pode fazê-lo. Aliás, se a lei
admite a participação do assistente com a finalidade de velar pelo direito quanto à
satisfação do dano, é natural possa ele requerer o desaforamento, se houver motivos
sensatos que estejam a indicar que o conselho de sentença absolverá o réu [17].
A Lei nº. 11.689/08 sepultou de vez essa discussão, e, com absoluto acerto, seguiu a
doutrina de Tourinho Filho (e que também era por nós adotada). É o que proclama o art.
427 do CPP:
Art. 427. Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida
sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o
Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante
ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá
determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma
região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas.
3.3.4. Destino
Antes da reforma, o art. 424 do CPP prescrevia que, presente uma das hipóteses legais,
o Tribunal poderia desaforar o julgamento para comarca ou termo próxima onde não
subsistissem aqueles motivos.
A doutrina e a jurisprudência entendiam, todavia, que o Tribunal poderia mudar o
julgamento para comarca mais distante. Para tanto, a decisão exigia-se fundamentação.
Não se admitida, contudo, o desaforamento para outra unidade da federação.
A Lei nº. 11.689/08, seguindo essas orientações doutrinárias e jurisprudenciais, dando
nova redação ao art. 427 do CPP, passa a prever que o desaforamento será para outra
comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais
próximas.
3.3.5. O desaforamento e o princípio do contraditório
A Constituição Federal de 1988 inscreveu no rol dos direitos e garantias fundamentais
dois princípios dos mais importantes no Estado Democrático de Direito, a saber: o
princípio do contraditório e da ampla defesa. Encontram amparo legal no art. 5º, LV,
segundo o qual "os litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes".
O contraditório e a ampla defesa devem ser observados qualquer que seja o
procedimento. E, por conta disso, no procedimento do Júri, em relação ao
Desaforamento, tais princípios não poderiam ser postos de lado.
A respeito desse tema, através da Súmula nº. 712, o STF cristalizou o seguinte
entendimento: "é nula a decisão que determina o desaforamento de processo de
competência do Júri sem a audiência da defesa".
Como já exposto, sendo o Ministério Público o solicitante do desaforamento, mister se
faz a audiência do defensor como garantia ao princípio constitucional da ampla defesa.
Embora o art. 428 do CPP, com redação dada pela Lei nº. 11.689/08, apenas proclame
expressamente na hipótese do desaforamento em razão do comprovado excesso, se o
julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em
julgado da decisão de pronúncia, a necessidade de manifestação da parte contrária,
entendemos que, em qualquer hipótese, faz-se imprescindível a audiência das partes.
Se, porventura, o juiz não tiver propiciado às partes o contraditório, o Tribunal deve
mandar suprir essa falha. Nesse sentido, encontra eco os ensinamentos de James
Tudenchlak, citado por Francisco Monteiro Rocha:
Constatamos grave omissão da lei, ao não dispor acerca do pronunciamento
das partes, cujo interesse na decisão é evidente. De bom alvitre, portanto,
serem elas intimadas pelo tribunal, da representação judicial, com abertura
de prazo para se manifestarem a respeito [18].
Não obstante, forçoso registrar que o STF, a respeito da necessidade de manifestação
das partes quando o requerimento é feito pelo juiz, não tem entendimento pacificado.
O nosso Tribunal Constitucional assim já decidiu:
HC 77.580 -1/RS. DESAFORAMENTO. INTIMAÇÃO. O crivo do
Tribunal referente a pedido de desaforamento só poderá acontecer mediante
ciência prévia da defesa e acusação. Precedentes:Hábeas corpus nos
69.054 /MT, 64.207/MG e 71.059/PB, julgados no Plenário, na Primeira e
Segunda Turmas, relatados pelos Ministros Célio Borja, Néri da Silveira e
por mim, com arestos veiculados nos Diários de Justiça de 10 de abril de
1992, 10 de outubro de 1986 e 9 de agosto de 1994, respectivamente.
Em sentido oposto, a mesma Egrégia Suprema Corte já se manifestou pela
dispensabilidade da manifestação das partes quando o juiz requisitar ex officio o
desaforamento:
HC 71.345/GO. O desaforamento, por constituir derrogação da regra do
julgamento no distrito da culpa, é de aplicação restrita. Partindo do
magistrado o pedido, ele deve ser acolhido. A regra de que no
desaforamento deve-se ouvir a parte contrária à vista do contraditório não
prevalece quando o alvitre é do magistrado. A presunção é de
imparcialidade.
Para nós, essa última posição é completamente equivocada. A presunção de
imparcialidade que atribui o STF ao magistrado não é capaz de afastar uma garantia
constitucional.
Segundo Francisco Monteiro Rocha, com quem compartilhamos o pensamento:
(…) não há que se argumentar haver presunção de imparcialidade do juiz,
para afastar, por si só, o princípio do contraditório, em representação de
desaforamento por ele apresentada. A presunção de imparcialidade e
lealdade do julgador é sempre presente, qualquer que seja o processo em
julgamento, e nem por isso, se tem deixado de prestigiar o princípio do
contraditório [19].
Em breve síntese, tanto nas hipóteses de requerimento pelas partes e do Ministério
Público, pelo assistente de acusação, quanto na hipótese de representação pelo juiz,
mister se faz a intimação das partes para se manifestarem acerca do pedido de
desaforamento. Esse entendimento é perfeitamente compatível com a legislação
processual vigente, bem como com a Constituição Federal de 1988.
3.3.6. Efeito suspensivo para o pedido de desaforamento
A doutrina e a jurisprudência sempre duelaram acerca da aplicação do efeito suspensivo
em matéria de desaforamento. De um lado, uma corrente não atribuía efeito suspensivo
ao desaforamento, e a outra considerava de bom alvitre atribuir efeito suspensivo.
A corrente francamente majoritária entendia que não havia que se falar em efeito
suspensivo no desaforamento. Era esse o pensamento de Mirabete e Francisco Monteiro
Rocha.
Os partidários dessa corrente argumentavam que a lei era silente e, sendo assim, não
haveria razão para ter-se uma interpretação extensiva. Por conta disso, em inúmeros
julgados, ainda na vigência do antigo art. 424 do CPP, os Tribunais vinham decidindo
que "o art. 424 do CPP não atribui ao pedido de desaforamento efeito suspensivo, razão
por que não se pode pretender que se configure como constrangimento ilegal o
indeferimento do pedido de adiamento até a decisão do desaforamento" (RT 592/444).
Em sentido diametralmente oposto, Tourinho Filho entendia ser de bom senso que se
aguardasse o julgamento do pedido de desaforamento, atribuindo, pois, efeito
suspensivo. Eram esses os argumentos adotados pelo insigne doutrinador baiano:
E se houver o julgamento (parcial, como supôs a parte que pediu o desaforamento) e,
em seguida, o Tribunal deferir o pedido? Como Proceder em face de tamanha
perplexidade? Para evitar situações como essa, o julgamento deve suceder à apreciação
do pedido de desaforamento [20].
Sobre o tema, mesmo antes da reforma, adotávamos uma posição intermediária.
Entendíamos que, em regra, o desaforamento deveria ser dotado de efeito suspensivo.
Excepcionalmente, se ficasse provado que o pedido de desaforamento se tratava de uma
medida protelatória, aí sim, o juiz estaria autorizado a não atribuir o efeito suspensivo.
Ora, não há como fechar os olhos para a realidade. Não há como negarmos que muitas
vezes as partes utilizam-se do pedido de desaforamento como medida meramente
protelatória, com o intuito final de atrasar o julgamento do réu. Atribuir efeito
suspensivo, nessa hipótese, a nosso juízo, seria totalmente descabido.
A Lei nº. 11.689/08, colocando uma pá de cal nessa discussão, dando nova redação ao §
2º do art. 427, autoriza a concessão de efeito suspensivo, conforme se vê:
§ 2º Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar,
fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri.
Como se vê, a regra é que o pedido de desaforamento não seja dotado de efeito
suspensivo; excepcionalmente, sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá
determinar, fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri.
Entendemos, contudo, que o legislador equivocou-se, ao transformar em regra aquilo
que deveria ser tratado como exceção. Por ser o desaforamento medida excepcional, as
hipóteses autorizadoras deveriam ser analisadas sempre em favor do réu, já, para nós, o
desaforamento é uma garantia do réu de ter julgamento justo e pacífico.
Portanto, à exceção do desaforamento pela ocorrência do disposto no art. 428 do CPP,
caso no qual entendemos não ser possível a concessão de efeito suspensivo, todo pedido
de desaforamento deveria ser dotado de efeito suspensivo, salvo se comprovadamente
utilizado como medida manifestamente procrastinatória.
3.3.7. Possibilidade de Desaforamento para segundo julgamento
É plenamente possível o desaforamento para o segundo julgamento. Para tanto, é mister
que o primeiro tenha sido anulado e fatos novos e relevantes surjam, de modo que
autorize a mudança do julgamento para outro foro.
A respeito disso, o novel § 4º do art. 427 do CPP assim dispõe:
§ 4º Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando
efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo,
nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de
julgamento anulado.
3.3.8. Cabe recurso contra a decisão que acolheu o pedido de desaforamento?
Tal questionamento já está pacificado tanto na doutrina quanto na jurisprudência. É
cediço que não cabe recurso contra a decisão referente ao pedido de desaforamento.
Não obstante, o Supremo Tribunal Federal, em entendimento pacífico, vem
reiteradamente decidindo ser adequado o habeas corpus para rever a decisão quanto ao
pedido de desaforamento.
4. Reaforamento
O CPP, antes da reforma processual, não previa expressamente a figura do
Reaforamento. Esperávamos que a Lei nº. 11.689/08, neste particular, regulamentasse a
matéria. Todavia, lamentavelmente, manteve-se silente.
Porém, conquanto não encontre amparo legal, certo é que este instituto não é vedado. É
uma construção doutrinária e jurisprudencial, razão pela qual se entende que a figura do
Reaforamento encontra respaldo no Direito brasileiro, embora não seja entendimento
pacífico.
Preliminarmente, temos que entender que o reaforamento é uma espécie de segundo
desaforamento [21], ou seja, retira o julgamento do foro para o qual tinha sido designado
(face o desaforamento), retornando para o foro original, de modo que o réu é julgado
onde deveria sê-lo inicialmente.
A peculiaridade é que retorna o julgamento (lembre-se que o desaforamento é do
julgamento) para o foro onde havia sido desaforado.
A maior parte da doutrina [22] preleciona que, ocorrido o desaforamento, não pode
ocorrer o reaforamento, mesmo que no foro inicial tenham desaparecido as causas que o
determinaram, a saber as hipóteses do art. 427 e 428 do CPP, bem como as questões de
ordem material.
Nessa seara intelectual, ninguém menos que Eduardo Spínola nos proporciona a
seguinte lição, in verbis:
Definitivos são os efeitos do desaforamento, e, assim, se proscreve o
reaforamento, mesmo quando, antes do julgamento, tenham desaparecido as
causas que o determinaram [23].
A jurisprudência dominante também é no sentido de descabimento do reaforamento:
Não se justifica o restabelecimento da competência do foro de origem
(‘reaforamento’) se permanecem as razões que ditaram o desaforamento.
(RT 661/364)
Os opositores do reaforamento sustentam ainda que seria tarefa árdua provar que tenha
ocorrido o desaparecimento integral das causas que justificaram o desaforamento.
"Desaforado, ainda que tenham desaparecido as causas que o autorizaram, sempre resta
um ressaibo do que antes ocorrerá, desaconselhando, por isto, o retorno do julgamento à
comarca de origem" [24].
Não obstante, prossegue a doutrina e jurisprudência majoritária, caso no novo foro
também encontrem os motivos que foram determinantes do desaforamento poderia
haver um novo desaforamento (só não poderia voltar para o foro original, vez que se
trataria de reaforamento).
Assumindo posição isolada na doutrina, Tourinho Filho admite a possibilidade de
reaforamento, uma vez extinto os motivos que ocasionaram o deslocamento do foro
original, e no local para onde fora desaforado, as circunstâncias não permitirem um
julgamento sereno.
Se, por acaso, os motivos que originaram o pedido de reaforamento houverem
desaparecido e eles surgirem no novo foro, nada impede o reaforamento. Aliás, o
Egrégio STF, invocando nosso ponto de vista, houve por bem admitir o reaforamento.
O reaforamento, nesse caso, só pode ser argüido, obviamente, depois de ter se operado o
desaforamento e até antes do início do julgamento do réu. As hipóteses de reaforamento
seriam as mesmas para o desaforamento, salvo a hipótese do art. 428 do CPP, em que
nunca se admitirá o reaforamento, já que se trata de um critério cronológico. O tempo
estampa marcas indeléveis, não havendo como fazer voltar ao estado anterior.
Embora tenhamos um maior apreço pelas lições de Tourinho Filho, não nos parece
adequado admitir o reaforamento. Preferimos (e entendemos ser a mais correta) a
posição da maioria da doutrina, segundo a qual uma vez desaforado o julgamento não
haveria possibilidade de reaforamento, vez que seria difícil (até mesmo impossível)
provar que as razões que determinaram o desaforamento cessaram. Os efeitos são, pois,
definitivos.
Contudo, excepcionalmente, consideramos que, apenas quando as causas que
justificaram o desaforamento forem questões de ordem meramente materiais, seria
possível falar-se em reaforamento. A justificativa é simples.
Essas questões materiais, p. ex., precariedade de instalações, são hipóteses objetivas,
razão pela qual são de fácil constatação. E, uma vez supridas, desapareceriam por
inteiro a causa que determinou o desaforamento, ao contrário das hipóteses do art. 427
do CPP, que, por serem subjetivas, nunca se saberá ao certo se as causas que
justificaram o desaforamento tenham, de fato, desaparecido por inteiro.
4. O reaforamento e a anulação da decisão de pronúncia
Não é possível reaforamento quando a decisão interlocutória de pronúncia for
anulada, pois nada tem a ver com juízo de admissibilidade, e sim com a mudança
onde se processará o julgamento. Esse entendimento já foi consolidado por nossa
Corte Suprema, in verbis:
Sendo o desaforamento processo incidental, fora dos autos principais, diz respeito
apenas à transferência do foro de julgamento dos pronunciados em processo por
crime da competência do Júri, nada tendo a ver com a sentença de pronúncia, que é
juízo de admissibilidade da acusação intentada. (RT 586/415)
Sendo assim, uma vez anulada a decisão de pronúncia, não se opera o retorno do
julgamento para a comarca anterior.
5. Referências Bibliográficas
• FILHO, Eduardo Spínola. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado.Campinas-SP,
Broockseller, 2000, vol. IV.
• FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. São Paulo. Saraiva,
2005, 9ª ed.
• MIRABETE. Júlio Fabbrini, Processo Penal, São Paulo, Atlas, 2005, 17ª ed.
• NORONHA. E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal, São Paulo, Saraiva, 2002, 28ª ed.,
atualizada e revisada por Adalto José Q. T. de Camargo Aranha.
• OLIVEIRA. Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. Belo Horizonte, Del Rey, 2004, 3ª ed.
• ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Curso de Direito Processual Penal, Rio de
Janeiro, Forense, 1999.
Notas
01
FILHO, Eduardo Spínola. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado. Vol. IV Campinas:
Broockseller, 2000, p. 400, apud TORRES. A. Magarinos, Processo Penal do Júri, 1939, pp.
257-258.
02
Nesse sentido é o ensinamento de MIRABETE. Júlio Fabbrini, Processo Penal, São Paulo: Atlas,
2005, 17ª ed, p. 545: "Em regra, a competência é determinada pelo lugar em que se consumou a
infração (art. 70), de modo que o réu deve ser julgado no distrito de sua culpa, ou seja, onde
cometeu o delito e a ordem social foi violada"; e nesse sentido, também, é a preleção de
NORONHA. E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal, São Paulo: Saraiva, 2002, 28ª ed.,
p. 342, atualizada e revisada por Adalto José Q. T. de Camargo Aranha: "(…) é regra fundamental
que o réu seja julgado no distrito de sua culpa, isto é, no local onde cometeu o delito".
03
ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Curso de Direito Processual Penal., Rio de
Janeiro: Forense, 1999, p. 749, apud Hélio Tornaghi.
04
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. Belo Horizonte, Del Rey, 2004, 3ª ed., p.
699.
05
MIRABETE. Júlio Fabbrini, op. Cit p.545
06
FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. 9ª ed., São Paulo:
Saraiva, 2005, ed., p. 66.
07
Compartilham esse entendimento: FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo
Penal Comentado. 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 67; NORONHA. E. Magalhães. Curso de
Direito Processual Penal, 28ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 343; MIRABETE. Júlio Fabbrini,
Processo Penal, 17ª ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 545; ROCHA. Francisco De Assis do Rego
Monteiro. Curso de Direito Processual Penal., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 750.
08
NORONHA. E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal, São Paulo, Saraiva, 2002, 28ª
ed., p. 343.
09
ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Op. cit, p. 751.
10
Ibidem.
11
FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Op. Cit. P. 67.
12
É nesse diapasão o entendimento do TJ-SP: "É de deferir a representação do juiz que propugna o
desaforamento do julgamento baseado na falta de instalações adequadas do Tribunal do Júri e na
perspectiva de ser aquele de longa duração, dada a intensa repercussão do fato".
13
NORONHA. E. Magalhães. Op. Cit. P. 343.
14
Cf "FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. São Paulo.
Saraiva, 2005, 9ª ed., p. 68.
15
MIRABETE. Júlio Fabbrini, op. cit, p. 546.
16
FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. São Paulo.
Saraiva, 2005, 9ª ed., p. 68
17
FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Op. Cit. P. 70.
18
ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Op. cit, p. 756 apud JAMES TUDENCHLAK
19
Ibidem.
20
FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Op. Cit. P. 69.
21
Nesse sentido, propugna o doutrinador baiano Ticiano Alves e Silva, em sua monografia
"Possibilidade e admissibilidade do reaforamento no direito brasileiro: doutrina e jurisprudência":
"Pode-se afirmar, até, que o desaforamento é gênero do qual reaforamento é espécie".
22
Nesse diapasão: MIRABETE. Júlio Fabbrini, op. Cit., p. 549; NORONHA. E. Magalhães. Op.
Cit., p. 344, ROCHA, Francisco De Assis do Rego Monteiro. Op. Cit., p. 752.
23
FILHO, Eduardo Spínola. Op. Cit., p. 407
24
ROCHA, Francisco De Assis do Rego Monteiro. Op. Cit., p. 752
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O desaforamento e o reaforamento no novo procedimento do júri