V FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES
I CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE
08 a 10 de setembro de 2011
UFS – Itabaiana/SE, Brasil
VIVÊNCIAS DO PROCESSO DE INCLUSÃO NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
SERGIPE
Catharine Prata Seixas 1
Verônica dos Reis Mariano Souza2
1-
INTRODUÇÃO
Desde o final do século XX, o processo de inclusão vem sendo alvo de muitas
discussões, embora as pesquisas sobre o assunto demonstrem avanços, persistem contradições
no ambiente escolar para aqueles ainda considerados marginais pela situação de deficiência.
No caso da surdo-mudez e da cegueira, apesar de quase dois séculos de implantação no Brasil
do Imperial Instituto dos Meninos Cegos, no Rio de Janeiro (1855) e do Instituto dos SurdosMudos, em 1857 (SOUZA, 2010) o processo educacional das minorias étnicas, sociais,
religiosas, econômicas e no caso do nosso estudo, das pessoas que se encontram em situação
de deficiência ainda não superou o problema básico de qualificação da educação de pessoas
que se encontram em situação de deficiência. Segundo dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE (2000), 16,5% da população sergipana possui algum tipo de
deficiência. Apesar do crescimento do número de matrículas dessas pessoas em todos os graus
e níveis de ensino, a maioria dos alunos que estão em situação de deficiência não consegue
ultrapassar as três primeiras séries do ensino fundamental. Ainda é insignificante o número de
alunos que ingressam no ensino superior, os poucos alunos que têm acesso aos cursos de
graduação pertencem à classe média e na grande maioria freqüentam as faculdades e
universidades privadas.
As questões relacionadas às pessoas que se encontram em situação de deficiência
envolvem inúmeros aspectos que se desenvolvem correlacionados a paradigmas e ideologias
que determinam ou determinaram a história. Sobre esse processo, FOUCAULT (1972) (1999)
(2001) e GOFMAN (1974) (1978) abrem, na década de 1970, uma importante reflexão a
respeito do extermínio, da exclusão e dos estigmas atribuídos às pessoas que a sociedade
ainda insiste em alijar.
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Aluna do curso de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Sergipe
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Professora Adjunta do Depto. De Educação da Universidade Federal de Sergipe
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Em 2010, através do Programa de Ações afirmativas da Universidade Federal de
Sergipe – UFS ingressaram cerca de trinta alunos com diversos tipos de deficiência. A
aprovação desses estudantes provocou mudanças nos conceitos muitas vezes cristalizados de
universidade, de aluno, de avaliação. O acesso de jovem com deficiência na UFS contribuirá
para a melhoria da qualidade e vida dessas pessoas.
Sabe-se que não nos falta legislação que garanta os direitos da pessoa em situação de
deficiência, dentre as diversas leis, destacamos a que estabelece cotas nos concursos e cota
proporcional ao número total de trabalhadores. As grandes empresas geralmente não
preenchem a cota estabelecida pela Lei porque não encontram pessoas qualificadas. As
pesquisas constatam que a baixa escolarização dessas pessoas leva ao subemprego e a
dificuldade para ingressar no mercado de trabalho. Por outro lado, não se pode pensar que o
melhor nível de escolarização da pessoa em situação de deficiência não lhe abrirá
oportunidades. O local de moradia, o sexo, a opção sexual, o estado civil e principalmente, a
própria deficiência influenciam na contratação. A barreira cultural ainda é grande. No
imaginário da população existe a crença de que as pessoas em situação de deficiência são
incapazes e improdutivas. Acreditamos que a educação superior de qualidade é um importante
instrumento na luta contra o preconceito.
Foucault (1987) nos lembra que saber é poder, e um dos meios de adquirir esse saber
é através da educação para todas as pessoas, independente da condição social, étnica,
religiosa, sensorial, motora ou qualquer outro condição.
Não é a atividade do sujeito de conhecimento que produziria um saber, útil ou
arredio ao poder, mas o saber-poder, os processos e as lutas que o atravessam e o constituem,
que determinam as formas e os campos possíveis de conhecimento. p.27
A Constituição de 1988 garante a educação para todos. No entanto a educação
sistemática, especialmente no ensino superior, é privilégio de uma parcela mínima da
população com deficiência.
De acordo com dados fornecidos pelo Departamento de Assuntos Acadêmicos –
DAA. Em 2009 a UFS possuía 22.486 alunos e apenas 10 alunos em situação de deficiência.
Este número perfazia um percentual de 0,002%. Dos poucos alunos que ultrapassavam a
barreira do vestibular a maioria abandonava seus estudos pela precária condição de
acessibilidade oferecida.
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O objetivo dessa pesquisa é analisar o processo de inclusão dos alunos que se
encontram em situação de deficiência, que ingressaram na Universidade Federal de Sergipe
em 2010 e no primeiro semestre de 2011. Diante disso, questiona-se:
Como se dá o processo de inclusão desses alunos? Quais as principais dificuldades
dos alunos e professores?
2-A PESQUISA
Trata-se de um estudo de caso de base etnográfica, que vivencia o processo de
inclusão dos alunos que se encontram em situação de deficiência, ingressos na UFS no ano de
2010 e no primeiro semestre de 2011.
Segundo Gil (2009), o estudo de caso possibilita o estudo em profundidade de um
grupo, uma organização ou fenômeno em suas diferentes dimensões, para o autor, esse tipo de
estudo nem sempre possibilita um estudo conclusivo que acaba impulsionando ao autor para
novas pesquisas.
São sujeitos dessa pesquisa 10 alunos em situação de deficiência sendo: três surdos,
três com dificuldade de locomoção, dois cegos, um aluno com dislexia, um aluno com
esclerose múltipla. O critério para escolha dos participantes foi possuir algum tipo de
deficiência no caso dos alunos, e dos professores ministrar aulas para esses alunos, além de
concordar em participar da pesquisa.
A coleta de dados deu-se através de observação participante; entrevistas semiestruturadas, consultas a documentos, participação de reuniões nas diversas instâncias da UFS
para discorrer e discutir sobre o tema.
A observação participante foi escolhida em virtude do contato direto da pesquisadora
com o tema e possibilitou o recolhimento de ações dos atores em seu contexto natural e uma
melhor descrição da situação das pessoas deficientes.
A análise dos dados constou de: identificação dos pontos relevantes encontrados nas
entrevistas, análise desses pontos à luz do referencial teórico; confronto dos pontos relevantes
com o cotidiano das pessoas em situação de deficiência na UFS; levantamento das pesquisas
realizadas na UFS a respeito do tema.
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3-AÇÕES AFIRMATIVAS E INCLUSIVAS NO ENSINO PÚBLICO SUPERIOR.
A temática de cotas divide opiniões e foi estabelecida na UFS depois de vários
debates. Através da Portaria 1110/207, foi criada uma comissão coordenada pelo Núcleo de
Estudos Afro-Brasileiros- NEAB, formada por representantes de cada Centro da universidade,
representante do sindicato dos professores, do sindicato dos servidores e Diretório Central dos
Estudantes – DCE. (SUBRINHO e MARCON, 2010).
O Programa de Ações Afirmativas da UFS estabelece que o sistema de vagas será
delimitado e abarcará as seguintes categorias e procedimentos:
Cota Social: reserva de 50% (cinqüenta por cento) das vagas totais de todos os cursos
de graduação para os candidatos que tenham cursado integralmente o ensino médio e pelo
menos quatro anos do ensino fundamental em instituições públicas estaduais e municipais de
ensino. Na inscrição os candidatos que por direito o desejarem deverão optar por esta reserva
e comprovar perante a CCV que realizaram tais estudos na escola pública
Cota étnico-racial: reserva de 70% (setenta por cento) das vagas reservadas para
alunos da Cota Social de todos os cursos de graduação para os candidatos que se autodeclararem pardos, negros ou indígenas.
Cota para aluno com necessidades especiais- cada curso da graduação destinará uma
vaga para pessoas portadoras de necessidades especiais.
Fonte: CCV – Comissão Central do Concurso Vestibular – PAAF
Os resultados do Concurso Vestibular depois da aplicação do sistema de cotas são
publicados por grupos. No Grupo A- compreende todos os candidatos, de qualquer que seja a
procedência escolar ou grupo étnico racial. Grupo B – Candidatos da escola pública de
qualquer grupo étnico racial. Grupo C – Candidatos da escola pública que se auto-declaram
pardos, negros ou indígenas. E no último grupo aparece a letra “N” e a palavra “Especiais”.
Durante as reuniões para a implantação do PAAF questionou-se o modo discriminatório como
os resultados são publicados, em outras palavras classificando-os por classe social e ou
deficiência.
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Em 2006 surgiu um movimento denominado “Por uma Universidade sem
Deficiência,” liderado por alunos do curso de Serviço Social, Letras e Pedagogia; esse grupo
discutia e solicitava melhoria das condições de acesso e permanência da pessoa com
deficiência na UFS. Em agosto de 2007 foi fundado o Núcleo de Pesquisa em Inclusão
Escolar da Pessoa com Deficiência – NUPIEPED e no currículo do curso do curso de
Pedagogia foram implantadas as disciplinas obrigatórias Fundamentos da Educação Inclusiva
e Língua Brasileira de Sinais que, imposição legal foi estendida aos demais cursos de
licenciatura e ao curso de fonoaudiologia.
O retorno de professores doutores na área de educação especial a implantação do
NUPIEPED, o ingresso de mestrandos nos programas de pós-graduação com pesquisas na
área de inclusão escolar e as dezenas de TCCs de alunos dos cursos de Pedagogia, Serviço
Social, Fonoaudiologia e Educação Física, a divulgação desses trabalhos em eventos dentro e
fora da universidade e projetos de extensão contribuíram para evidenciar na UFS os
problemas dos alunos em situação de deficiência.
A Resolução 80/2008 do Conselho de Ensino e Pesquisa – CONEP instituiu o
sistema de cotas de 50% das vagas para alunos oriundos da escola pública, alunos afrodescendentes, indígenas e uma vaga por curso para alunos em situação de deficiência, em seu
Artigo 1º afirma:
Cada curso de graduação ministrado pela UFS ofertará uma vaga para candidatos
portadores de necessidades educacionais especiais, comprovadas através de relatório médico.
Segundo dados divulgados pela Comissão Central do Concurso Vestibular – CCV
em 2010 foram inscritos 170 pessoas com deficiência. Foram aprovados 30 alunos. Sabe-se
que a inclusão da pessoa em situação de deficiência envolve valores, conceitos e preconceitos,
Souza (2000). Na UFS não foi diferente, durante as Oficinas Inclusivas ministradas pela PróReitoria de Graduação com o objetivo de preparar os professores para receber esses alunos,
embora amplamente divulgada na comunidade acadêmica, o número de professores
participantes foi insignificante. Muitos professores justificaram a não participação com a
afirmativa, “não vou participar de alguma coisa que sou contra;” ou “esse povo só vem
diminuir o nível de ensino da universidade que já é baixo porque muitos alunos chegam da
escola pública sem base. Não sabem escrever”. E durante a realização das oficinas foi comum
ouvir de colegas professores de diversas áreas a sentença: “um aluno cego, surdo não pode
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aprender conteúdo x”. Tais afirmações performativas e também preconceituosas definiam a
priori, o que a pessoa em situação de deficiência tem ou não condição de aprender. No
entanto, apenas o aluno e mais ninguém é capaz de dizer o quê e como ele poderá aprender.
As tecnologias assistivas são importantes aliados no processo de acesso aos conhecimentos e
possibilitam o acesso da pessoa em situação de deficiência o acesso a escolarização e a
melhor participação nas atividades sociais.
4-O ACESSO E PERMANÊNCIA DA PESSOA EM SITUAÇÃO DE DEFICIÊNCIA
NO ENSINO: O CASO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE.
A Universidade Federal de Sergipe possui 120 cursos de graduação; de acordo com a
Resolução 80/2088 do Conselho do Ensino da pesquisa, por ano ingressariam na UFS cerca
de 120 alunos. No entanto o número de aprovados no Concurso Vestibular 2010 foi de apenas
30 pessoas dos 170 inscritos que conseguiram aprovação. Segundo dados do INEP, na Região
Nordeste apenas 12% das pessoas em situação de deficiência conseguem chegar à
universidade. Tais índices questionam o acesso dessas pessoas ao ensino médio e também a
qualidade desse ensino.
O cotidiano dos alunos em situação de deficiência na UFS é dificultado pela falta de
acessibilidade arquitetônica, pedagógica e cultural da UFS. Com relação à acessibilidade
arquitetônica, Souza (2010, p.359) demonstra que as principais interferências no direito de ir e
vir das pessoas são as seguintes:







Pisos rebaixados que não leva a lugar algum;
Ausência de sinalizadores para pessoas cegas e ou com baixa visão;
Insuficiência ou inexistência de vagas especiais;
Rotas inacessíveis ou dificultadas;
Inexistência de guarda corpos;
Sanitários adaptados fora das normas da ABNT;
Rampas e aclives fora das normas da ABNT que impossibilita a independência dos
usuários de cadeiras de roda.
Os prédios mais recentes, construídos em 2009, 2010 e 2011 ainda apresentam a
inexistência de acessibilidade ou problemas de edificações incompatíveis com as normas da
ABNT que dificultam ou impossibilitam o acesso de pessoas usuárias de cadeira de roda,
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cegos ou pessoas com baixa visão.
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Cambiaghi (2007) adverte com relação aos espaços
acessíveis:
Todos os usuários podem ingressar, circular e utilizar todos os
ambientes e não apenas parte deles. Isso porque, como já
afirmamos, a essência do desenho universal está no propósito de
estabelecer acessibilidade integrada a todos, sejam ou não
pessoa com deficiência. p. 73.
No âmbito da acessibilidade cultural Souza (ibidem) afirma:





Despeito ao uso da vaga legal;
Carros estacionados impedindo rampas de acesso;
Motos e bicicletas estacionadas ou trafegando nas passarelas de pedestres;
Discriminação de alunos em situação de deficiência, (professores);
Lentidão na resolução dos problemas de acesso ao conhecimento.
Há ausência de uma cultura inclusiva que prime pelos direitos e bem estar de todos,
sendo também um dos problemas encontrados na UFS. Tal fato expõe as contradições e as
incoerências de uma instituição que em tese, deveria estar das demais instâncias da sociedade
em termos de ética e direitos humanos. A apresentação de relatórios de pesquisa e as
solicitações para a melhoria da acessibilidade das pessoas em situação de deficiência não
surtem o efeito desejado e esperado.
Com relação à acessibilidade de comunicação, Souza, (idem, p.360) foram
verificadas as seguintes dificuldades:







Ausência de sinalizadores de presença nas principais dependências da universidade;
Falta de sinalização em braile para indicar as salas de aula;
Insuficiência de réguas braile, lupas;
Insuficiência de bibliografia em braile;
Inexistência de livros em áudio;
Poucos recursos de tecnologia assistiva;
Despreparo dos professores e dos demais membros da comunidade para conviver com
naturalidade com os alunos em situação de deficiência.
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No cotidiano dos três alunos surdos profundos, falantes da Língua Brasileira de
Sinais, percebeu-se as seguintes dificuldades:
 No primeiro semestre de 2010 a UFS não contratou intérpretes;
 O atraso de um mês de aula no segundo semestre de aula; (situação idêntica aconteceu
no primeiro semestre de 2011);
 A extrema dificuldade dos alunos em ler e escrever texto em Língua Portuguesa; (não
consegue ler e responder uma avaliação escrita em Língua Portuguesa).
 A dificuldade dos intérpretes em traduzir fidedignamente os conteúdos de disciplinas
específicas;
 A troca intérpretes já que são contratados por empresas que prestam serviços a UFS;
 A ausência de vídeos em libras com a tradução dos principais textos das disciplinas.
Com relação aos surdos usuários da Língua Portuguesa, foi entrevistado um surdo
que apontou as seguintes dificuldades:
 Barulho nas salas de aula e na biblioteca; (usuário de aparelho);
 Professor que dá aula falando de costas para os alunos;
 Professor incompetente que não dá aula e reprova muito; (todos os alunos).
No depoimento do aluno surdo percebe-se a falta de preparo do professor para
trabalhar com a diversidade em sala de aula.
Torres Gonzáles (2002) chama atenção para a necessidade de todos os professores
receberem preparação adequada no desenvolvimento de estratégias para atenderem aos alunos
deficientes em situações no cotidiano da sala de aula. Acontece que em muitos casos e apesar
da legislação muitos professores ainda se negam a trabalhar com esse tipo de aluno.
Com relação à formação do professor, pesquisa de Santos (2011), a respeito do
processo de formação dos professores de Educação Física mostrou que 40% dos alunos que
ingressou no mercado de trabalho no primeiro semestre de 2011, se nega a dar aulas para
alunos em situação de deficiência. E 90% dos concludentes declararam estar despreparados
para atuar em turmas inclusivas. Diante de tais constatações percebe-se que além do problema
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de formação acadêmica existe o problema de aceitação por parte dos professores em trabalhar
com e para todos os alunos.
Outro depoimento de um aluno com baixa visão que demonstrou duas atitudes de
dois professores do seu curso a respeito à impossibilidade de ler os apontamentos do professor
no data show e no quadro. Um deles disse não acreditar na dificuldade e outro trouxe um CD
gravado em áudio com os principais textos ministrados na disciplina. Diante da atitude do
primeiro professor, o aluno passou a não comunicar aos professores a sua dificuldade.
Ainda com relação aos alunos com deficiência visual, uma aluna cega, aprovada no
Concurso Vestibular 2011, sem concorrer pelas cotas ou escola pública, abandonou o curso
porque não tinha condição de se locomover sozinha, principalmente para se deslocar de uma
sala para outra durante as aulas e por se sentir discriminada por um professor, abandonou o
curso na segunda semana de aula.
A Pro – Reitoria de Graduação através do Departamento
de Apoio Pedagógico disponibiliza um aluno ledor para os alunos cegos. Esses bolsistas
disponibilizam 20 horas semanais exercendo a atividade de ledor ou escaneando textos para
que sejam lidos por softwares específicos
Concordamos com Kenski (2003, p. 87) quando afirma:
Todos precisam se sentir como cidadãos do seu próprio país e cidadãos
do mundo. Características como a cooperação, a interatividade e o
respeito às diferenças são aspectos que precisam ser priorizadas em
todas as instâncias e em todos os setores educacionais. Nesse sentido,
os professores precisam ser capacitados para orientar seus alunos (e a si
mesmos) a aprender por meio de intercâmbios virtuais (e/ou
presenciais) com diferentes culturas, idiomas e realidade social.
Não é raro encontrar pessoas na comunidade universitária com um discurso calcado
nos valores da democracia e na prática não favorece a aprendizagem de todos os alunos, que
não estão abertas as mudanças. É inadmissível que um professor discrimine um aluno, seja
qual for o motivo. O conhecimento do homem está sempre ligado, mesmo de forma indecisa,
a éticas ou a políticas; mais profundamente, o pensamento moderno avança naquela direção
em que o outro homem deve torna-se o mesmo que ele. (FOUCAULT, 2002, p.453).
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Os alunos usuários de cadeiras de rodas não têm acesso aos pavimentos superiores da
UFS. Observamos o trajeto de um usuário de cadeira de rodas da Didática V para a Biblioteca
Central. Encontramos no caminho motos trafegando na passarela de pedestres, cadeiras das
lanchonetes tomando totalmente a passagem, rota inacessível, abaixamento de piso fora de
rota que obriga o usuário de cadeira de roda a trafegar pela pista de carros.
Verificamos que um dos motivos para um aluno usuário de cadeira de roda optar por
uma universidade particular foi à impossibilidade de participar das aulas de laboratório
porque os balcões fixos dos laboratórios são demasiadamente altos e não também não permite
a sua locomoção com a cadeira.
A Lei n. 1.679, de 2 de dezembro de 1999, revogada pelo Decreto 3.248/2003
assegura as condições básicas que permitam as condições de mobilidade e utilização das
tecnologias nas instituições de ensino superior. Apesar disso, os estudantes em situação de
deficiência, na sua maioria, não exigem os direitos garantidos pela legislação para a
concretização da inclusão de todos os alunos no ensino superior. Concordamos com a
afirmação de Ferreira (2007, p. 56)
Muitos são os aspectos que devem ser levados em conta na
concretização da inclusão no ensino superior. Embora as leis não
bastem para oportunizar ao universitário formar-se um profissional
competente e apto a desempenhar suas funções na sociedade, elas são
indispensáveis para nortear e respaldar as ações que devem ser
empreendidas.
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realidade do aluno em situação de deficiência ainda é mais difícil do que o
estudante que ouve, fala português, se locomove com autonomia. Essas dificuldades de acesso
aos conteúdos não são decorrentes de incapacidades do aluno em situação de deficiência, mas
em virtude da falta de acessibilidade da universidade. Os professores, em sua maioria, estão
despreparados para acolher e trabalhar bem com esse aluno. A incapacidade desse professor
leva a falta de acessibilidade cultural e pedagógica e a despreocupação da universidade de
garantir a acessibilidade prevista nas leis, compromete a qualidade do ensino Por outro lado,
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vale à pena enfatizar que o simples diploma de nível superior não garante o êxito profissional,
é imprescindível uma formação de qualidade que possibilite o bom desempenho profissional.
Talvez esse seja o maior desafio das ações afirmativas relacionadas às pessoas que se
encontram em situação de deficiência.
Ainda temos que evoluir muito no sentido de possibilitar o acesso ao conhecimento a
todos os alunos. Nesse período lento de mudanças dos conceitos de universidade, de
avaliação, de aluno. As pessoas em situação de deficiência habituadas, muitas vezes, a super
proteção da família e de algumas entidades que trabalham com esse público, não se adaptam
às difíceis condições de acesso e permanência e a terminalidade do curso. Muitos migram
para as faculdades e universidades particulares ou abandonam o curso. A lentidão por parte
dos setores da UFS na implementação de ações que facilitem o processo de inclusão
dificultam a permanência e a conclusão da graduação com qualidade.
A inclusão da pessoa em situação de deficiência é complexa e contraditória, se por
um lado a universidade “abre“ a porta para os grupos tratados historicamente como
minoritários por outro a “fecha” quando mantém as situações que contribuem para a exclusão
e a segregação.
REFERÊNCIAS
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