DEMANDAS EM SAÚDE MENTAL NO NÍVEL DE ATENÇÃO
BÁSICA E NO CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
(CAPS): Características da articulação entre os dois serviços.
Área de conhecimento: Saúde.
Ana Maria Pereira Lopes (Professora Psicologia UNISUL Pedra Branca)
Girlane Mayara Peres (Acadêmica Psicologia UNISUL Pedra Branca)
PUIC - Individual.
Introdução
Ao longo da história, a loucura já foi considerada de diferentes maneiras. No Ocidente, ao
longo dos últimos três séculos, foi sinônimo de perigo, agressividade e possessão. Pessoas
com sofrimento psíquico intenso, juntamente com alijados eram colocadas em asilos e
hospitais com a finalidade de manter a ordem na sociedade. (AMARANTE, 2007). O modelo
que fundamentava esses hospitais, criticados por sua ineficácia e cronificação, teve várias
propostas de mudanças, mas foi a da Psiquiatria Democrática Italiana, organizada por
Basaglia, a vertente que mais influenciou mudanças nesse setor. (AMARANTE, 1996).
Denúncias de maus tratos e mortes em manicômios serviram de base para organizações de
movimentos sociais como o Movimento Nacional de Luta Antimanicomial (MNLA), cujo mote
foi a luta conta a hospitalização e pela reforma psiquiátrica. Grande conquista foi a
promulgação da Lei 10.216 em 2001 que instalou e redirecionou a o modelo de assistência
para a atenção psicossocial, sendo a internação hospitalar o último recurso de atenção.
(BRASIL, 2004).
A Reforma Psiquiátrica não significa apenas uma reestruturação ou reformulação de um novo
modelo de assistência à pessoa com transtorno mental, mas sim um processo e um novo
olhar em quatro dimensões que ocorrem simultaneamente e são inter-relacionadas são elas:
teórico conceitual, técnico assistencial, jurídico-político e sociocultural. (AMARANTE, 2007).
A partir da implementação da lei, outras formas de intervenção foram efetivados, os Centro
de Atenção Psicossocial (CAPS) e mais atualmente a Saúde Mental na Atenção Básica. (AB)
Estes fazem parte de uma rede de cuidados que envolvem as residências terapêuticas,
ambulatórios, centros de convivências, clubes de lazer, igrejas, os amigos, escola, trabalho
entre outros, possibilitando cuidado integral à pessoa com sofrimento psíquico.
A articulação entre o CAPS e AB possibilita a educação permanente, bem como o
acolhimento das necessidades específicas de cada pessoa. O contrário pode levar a ruptura
no acesso à saúde das pessoas que buscam ajuda, assim, não contribuindo para o processo
da Reforma Psiquiátrica e para o Direito à Saúde. (KUJAWA, 2003). Dessa forma, diante da
discussão apresentada pergunta-se, em face do caso da cidade de Florianópolis: Quais são
as características da articulação entre a AB e o CAPS ?
Objetivo Geral
Descrever as características da articulação entre Unidade Básica de Saúde (UBS) e Centro
de Atenção Psicossocial (CAPS).
Metodologia
Pesquisa qualitativa, exploratória e descritiva realizada nos anos de 2009 e 2010. Foram
entrevistados profissionais da cidade de Florianópolis, sendo 5 do CAPS (2 psicólogos, 1
psiquiatra, 1 assistente social e 1 enfermeiro), e 5 da AB através da equipe do NASF (1
psiquiatra, 1 psicólogo 1 assistente social) e ESF (1 enfermeiro e 1 médico).
Os dados foram coletados por meio de uma entrevista semi-estruturada (MINAYO, 2007),
em que perguntas abertas em relação a integração, encaminhamento, demanda, rede e
fluxo de saúde mental foram feitas.
Durante a entrevista, a entrevistadora manteve uma postura flexível em relação ao roteiro,
seguindo o fluxo da entrevista, dessa forma, não manteve a ordem das perguntas e fez,
quando necessário, perguntas adicionais.
Bibliografia
AMARANTE, Paulo. O homem e a serpente: outras histórias para a loucura e a psiquiatria.
Rio de Janeiro, FIOCRUZ, 1996.
AMARANTE, P. Saúde mental e atenção psicossocial. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007.
BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações
Programáticas Estratégicas. Saúde Mental no SUS: os centros de atenção psicossocial.
Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
KUJAWA, Henrique; BOTH, Valdevir; BRUTSCHER, Volmir. Direito à Saúde com controle
social. Passo Fundo: Fórum Sul de Saúde (PR SC RS), Centro de Assessoramento Popular
de Passo Fundo (CEAP), 2003.
CARACTERÍSTICAS DA
ARTICULAÇÃO CAPS –
ATENÇÃO BÁSICA
PSICOLOGIA
Resultados
DESCRIÇÃO
RELATIVAS Á
INTEGRAÇÃO
Identificou-se integração entre os funcionários do CAPS, bem como entre os da AB.
Além disso, foi também demonstrado integração entre ambos os serviços AB-CAPS /
CAPS-AB. Isso se dá a partir do planejamento das atividades entre os trabalhadores,
bem como no cotidiano dentro do centro de saúde além das reuniões de equipe que tem
como propósito planejar e discutir o serviço. A integração é demonstrada também a partir
da assistência já ocorrida no serviço anterior, em que a pessoa já vem ao serviço
encaminhada e pré atendida, dessa forma, viabilizando os procedimentos. Assim, esse
fluxo de atendimento evidencia uma rede, proporcionando maiores condições de
atendimento àquela pessoa em sofrimento psíquico. Por último, a integração ocorreu
devido à dificuldade ou facilidade de vínculo dos pacientes da AB com sofrimento
psíquico.
RELATIVAS AOS
Outra forma de articulação entre a AB e o CAPS é através dos encaminhamentos, que
ENCAMINHAMENTOS
ocorre, preferencialmente, via reunião de regional. Entretanto, outras formas de
encaminhamento e acompanhamento das pessoas encaminhadas podem ocorrer, como
via contato telefônico e via encaminhamento escrito. Esses encaminhamentos podem
sobrevir por vários motivos, como para a AB devido à alta, para a AB por déficit de
clareza, claro da AB e via Unidade Básica de Saúde. Ficou evidente que durante as
reuniões de regional ou via contato telefônico acontece o acompanhamento da
demanda encaminhada, em que os profissionais tomam conhecimento de como está o
vínculo da pessoa encaminhada, ou mesmo, se ela chegou ao serviço.
RELATIVAS À
A atenção em saúde mental deve ser realizada dentro de uma rede de cuidados, tanto
PRESENÇA DE REDE
em espaços sociais como nos próprios centros de saúde. Entretanto, parece ocorrer uma
falta dos espaços, da socialização e vinculação, ou seja, a rede existe, mas é
insuficiente.
RELATIVO AO
A articulação entre ambos os serviços também ocorre pelo reconhecimento da demanda.
RECONHECIMENTO DA Assim, foi apontado que o critério para a definição se é um caso CAPS ou da AB é
DEMANDA DESTINADA relativo ao grau de sofrimento psíquico. Em que o papel do CAPS é atender o
AO DIFERENTES
sofrimento psíquico intenso, ou seja, uma pessoa que está prejudicada em todas as
NÍVEIS DE ATENÇÃO
esferas da vida, a qual não está conseguindo solucionar as dificuldades que aparecem
em seu cotidiano. Já o Papel da AB: acompanhamento da ressocialização; com o
objetivo de que as pessoas se sintam acolhidas e retomem as suas atividades. Além
disso, foi demonstrado que o compartilhamento de papéis é condição para o
trabalho, já que ambos os serviços tem que criar estratégias para a vinculação das
pessoas com sofrimento psíquico. Assim, pode ocorrer de ela não permanecer na
Unidade adequada para a sua demanda, mas naquela onde o tratamento é aderido. O
reconhecimento da demanda perpassa pela noção integral de saúde mental, além da
ciência das condições psicossociais na comunidade.
RELATIVO AO MODO
DE ESTRUTURAÇÃO
NA REDE DE SAÚDE
MENTAL
INSTITUCIONAL
Percebeu-se o descumprimento da política de saúde mental do MS, entre outros
motivos, pela necessidade de ser ter uma política de saúde mental no município. Além
disso, destacou-se também a necessidade de territorialização do CAPS. Percebeu-se um
processo crescente de implementação da reforma psiquiátrica, entretanto, ainda foi
apontado ser necessária a construção de CAPS em territórios próximos à população, já
que a distância pode ser uma barreira para a pessoa fequentar o serviço. Outro aspecto
percebido como deficiente é a falta de profissionais tanto no nível do CAPS quanto da
AB. Dessa forma, para dar conta da demanda a estruturação da rede requer
estratégias constantes, em que os profissionais se adaptam as necessidades da
pessoa que procura ajuda.
RELATIVO AO FLUXO
DE TRABALHO
Foi realizado um fluxograma em que se possibilita identificar como ocorre o fluxo da
pessoa que procura o serviço de saúde mental em uma das regiões de Florianópolis.
Neste fluxograma, a AB é a porta de entrada do serviço de saúde, entretanto, muitas
vezes, a demanda espontânea chega para o CAPS, e lá é acolhida. Uma vez que seja
um caso em que há indicação para CAPS ele permanecerá lá a partir de um projeto
terapêutico, já no caso de ser uma demanda de atenção básica será encaminhado para
tal. Se a pessoa iniciar seu fluxo de entrada no sistema de saúde a partir da AB, lá ela
poderá continuar com o atendimento de atenção básica em saúde mental ou com o
serviço especializado na AB, mas se for um caso indicado para o CAPS, ocorrerá o
encaminhamento, entretanto isso dependerá do sofrimento e gravidade de cada pessoa.
Conclusões
Os serviços estudados estão em um processo de implementação e enraizamento da
reforma psiquiátrica no município. É necessária uma articulação entre os diversos setores
sociais, educacionais e de saúde, já que as quatro dimensões indicadas por Amarante
(2007) necessariamente caminham juntamente e estão interligadas, assim, uma interfere na
outra. A dimensão sócio-cultural pode ser identificada com grande necessidade de
implementação junto a rede disponível para o serviço estudado, pois esta ainda parece
distante por parte dos profissionais da AB e CAPS como possibilidade de encaminhamento
das pessoas atendidas. Ainda que a AB tenha preocupações em reconhecer as
necessidades sociais e de territorialização, não são realizados trabalhos de inclusão,
desmistificação social do transtorno mental e de incentivo a organização de uma rede de
atenção, o que possibilita indicar ainda vagarosidade da implementação institucional da
reforma psiquiátrica.
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