CONFIANÇA E DEMOCRACIA
promisso" . Como em todo o compromisso (e na promessa) existe uma margem
de risco , assentando a experiência da segurança num equilíbrio subtil entre
risco e confiança. É por isso que o modelo do Estado-providência, entendido
como sistema de gestão de riscos , confere segurança, na medida em que pro­
tege as pessoas contra riscos (doença, invalidez , perda de emprego , velhice);
sendo que , hoje, o abandono desse modelo (como é o caso nos E .U .A .) é acom­
panhado do aumento dum sentimento de insegurança.
A confiança nos outros e nas instituições , e a credibilidade destes são , com
efeito , a chave para o desenvolvimento de um sentimento de segurança. Cremos
nas instituições públicas das sociedades democráticas como sendo aquelas que
se norteiam pelo bem comum , mas para sentirmos segurança é necessário que
surjam como honestas , credíveis e fiáveis , realizando na prática o interesse
geral e a defesa do bem comum. Coloquemos , pois , a questão da confiança nas
instituições, não sem antes analisarmos aquilo que pode ser entendido como a
relação paradigmática da confiança, i .e . a confiança entre duas pessoas .
RELAÇÃO DE CONFIANÇA ENTRE DUAS PESSOAS
A experiência de confiança básica é a relação de confiança entre duas pes­
soas . Para que tal relação de confiança se verifique , é necessário que se mante­
nham expectativas favoráveis em relação às intenções , interesses ou acções do
outro e que exista uma presunção da credibilidade e da honestidade da outra
pessoa. É credível quem possui competências e/ou conhecimentos reconheci­
dos , e quem é responsável . Assim sendo , exerce-se como que uma delegação
no outro , ou dependência em relação à sua competência e boa vontade , exis­
tindo da parte deste uma obrigação moral em honrar a confiança que lhe é
depositada2 1 . A confiança liga-se ao princípio da reciprocidade fundado na soli­
citude , que significa poder contar com . . . Confia-se no outro e deve-se demonstrar
que se é de confiança . Existe uma dinâmica de se dar ao outro , de se pôr à dis­
posição , de dependência voluntária, de vulnerabilidade .
Há, deste modo , uma relação de confiança que é uma relação de delegação ,
baseada na reciprocidade22 ; é preciso colocar o direito daquele que delega,
existindo uma obrigação moral do outro em respeitar esta delegação . Karpik23
fala desta relação de delegação: alguém dá o poder a outro de fazer alguma
coisa em seu nome . A representação do representado é voluntária; colocamo­
-nos voluntariamente numa posição de dependência. O poder do representante
é discricionário - não há um controlo imediato . Mas existe contudo uma relação
de reciprocidade que é moral24 . Existe a obrigação moral do outro em respeitar
a confiança que lhe foi atribuída (nisto reside a dimensão ética da confiança) .
A confiança é , assim, uma hipótese sobre uma conduta futura, como enun­
ciava Simmel , requerendo algum conhecimento ou saber sobre as pessoas
sobre quem recai (aspecto cognitivo) , ou implicando um juízo de lealdade , de
honestidade ou de fiabilidade (aspecto moral) . Procura-se no outro indicadores
65
Download

RELAÇÃO DE CONFIANÇA ENTRE DUAS PESSOAS