EDUCAÇÃO SUPERIOR: mudanças e controvérsias.
Dalcy da Silva Cruz - Universidade Federal do Rio Grande do Norte
[email protected]
Jomária Mata de Lima Alloufa –Universidade Federal do Rio Grande do Norte
[email protected]
Carmen Suely Cavalcanti de Miranda - Universidade Potiguar
[email protected]
RESUMO
A educação em geral e o ensino superior em particular, vem tentando se adequar aos movimentos
de mudança verificados no Brasil nestas ultimas décadas. As propostas de reforma universitária no
Brasil levantam falsas oposições em vários níveis. A tese deixa de contemplar educação enquanto
sistema que deve funcionar conectado entre si e com a sociedade em geral. Como existe uma
fragmentação, as contradições aparecem entre educação básica e educação superior. Entre o ensino
médio e a educação profissional. Entre educação de jovens e adultos e projetos de alfabetização.
Essas oposições têm interferido no processo educacional, o qual deveria ser visto enquanto sistema
integrado, para uma melhor utilização de recursos humanos e financeiros, assim como resultados
mais satisfatórios que visem o desenvolvimento da sociedade nas dimensões econômica, social e
cultural.
Palavras- chaves: educação superior - reforma universitária - mudanças – controvérsias
RÉSUMÉ
L'éducation en général et l'enseignement supérieur en particulier, a essayé de s'adapter aux
mouvements des changements enregistrées au Brésil dans ces dernières décennies. Les
propositions de réforme de l'université au Brésil soulevent fausses oppositions à différents niveaux.
L'argument ne tient pas à considérer l'éducation comme un système qui doit travailler connectés
avec la société en général. Comme il ya une fragmentation, des contradictions apparaissent entre
l'enseignement de base et l'enseignement supérieur. Entre l`enseignement secondaire et
l'enseignement professionnel. Entre l`education des jeunes et des adultes et les projets
d'alphabétisation. Ces oppositions ont interféré dans le processus éducatif, qui doit être considéré
comme un système intégré pour une meilleure utilisation des ressources humaines et financières,
ainsi que des résultats plus satisfaisants pour le développement de la société dans les domaines
économique, sociale , et culturel.
Mots-clés: l'éducation - la réforme des universités - Changements - controverses
EDUCAÇÃO SUPERIOR: mudanças e controvérsias
1. Introdução
Num país com grandes desigualdades sociais como o Brasil e que apresenta um nível de
exclusão que deixa à margem grande parcela da população, é necessário pensar, refletir e debater
sobre o processo educacional. As Políticas Públicas ainda permitem que grande parcela da
população seja excluída do usufruto dos direitos mais elementares ao Ser humano, entre eles, a
educação. Apesar da retórica em que atende aos que ainda continuam à margem, parece no
entanto, que o encontro das necessidades e o que lhes é oferecido ainda não foi suficiente para
atender as demandas da sociedade. . Esse tema, hoje corrente na pauta dos debates atuais no
mundo, faz com que à medida que aumentam as desigualdades, mais se valoriza o saber e quando o
conhecimento faz a diferença temos que lembrar a Universidade, celeiro de inteligência e vanguarda em qualquer
parte do Mundo (Editorial - ADURN, 2006, p.07).
No Brasil, o Estado tem se omitido, ou melhor, dizendo , tem se descuidado da
Universidade para que o ensino seja de qualidade compatível com o desenvolvimento mundial
globalizado. daí a queda do nível do ensino e da produção acadêmica, que se soma à incapacidade da instituição de
absorver a grande demanda por cursos superiores (Editorial – ADURN - 2006, p. 07).
Para atender essa demanda, o governo brasileiro tenta corrigir sua ausência instituindo um
programa que se propõe dar oportunidade ao individuo de cursar uma Universidade. É o
PROUNI, uma proposta de Universidade para Todos, a qual vem despertando preocupações
fundamentadas em todos os segmentos envolvidos com a educação de qualidade e que seja, de fato, universalizada.
Aqui pretendemos expor alguns argumentos, muitos deles baseados em dados oficiais retirados de sítios do INEP e
da UNESCO na Internet, que podem ajudar no esclarecimento de questões que se colocam (ADUSP, 2004, p.1).
O texto que discute a questão do PROUNI, afirma que a Educação e a Educação Superior em
especial, é hoje considerada estratégica para a inserção autônoma de qualquer país no contexto internacional
(ADUSP, 2004, P.1).
Diz ainda que o ensino Superior mostra-se para o setor privado como potencial fonte de
lucro fácil, dada a pressão sobre os indivíduos no sentido de buscarem uma qualificação escolar
cada vez mais extensa (ADUSP, 2004, p.1).
O texto inicia contextualizando a situação do Brasil e seus índices de pobreza que, além de
outros indicadores, contribuem para aumentar o processo de exclusão social, o qual concorre
fortemente para ceifar grande parte da população dos seus direitos básicos. Esse quadro traz uma
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dificuldade enorme para analisar a ação do Estado através se suas políticas como, proposta de
inclusão de estudantes através do projeto PROUNI,(Projeto Universidade para todos).
Mais especificamente, quando essa ação diz respeito à Educação, área estratégica de qualquer
país, na verdade, a dificuldade se apresenta com maior força por se tratar de uma questão que está
na ordem do dia: a produção e divulgação do conhecimento, uma vez que é a Universidade,
considerada o celeiro de inteligência e vanguarda em qualquer parte do mundo de tradição secular.
O projeto parece ter a intenção de corrigir a grande defasagem existente entre uma grande
parcela que compõe as camadas mais pobres da população e o acesso à Universidade, apesar da
Educação em vários níveis no Brasil não ter sido ao longo da sua formação, uma prioridade para os
gestores da nação. Anísio Teixeira (1976), fala com propriedade sobre a esta falta de prioridade,
retomando o início do sistema educacional brasileiro afirma que:
A qualidade, o conteúdo e distribuição da educação, são determinados
pelas condições sociais e culturais e revelam formas e modos de atingir e
preservar objetivos e valores, nem sempre expressos, mas importantes e
queridos da organização social existente. Assim, ela constitui
instrumento de controle social, de manutenção do tipo e qualidade de
sociedade dominantemente aceitos (TEIXEIRA, 1976, p. 285).
Essa compreensão está contida na concepção althusseriana de que a educação se constituiu
em um aparelho de reprodução da cultura dominante. Partindo dessa relação orgânica
educação/sociedade, Teixeira vai buscar seu entendimento sobre a educação brasileira desde o
período colonial.
Os objetivos do empreendimento lusitano diz ele, vão determinar o tipo de organização
social e, conseqüentemente, o modo como a educação no Brasil Colônia foi concebida e
sistematizada: família patriarcal; uma burocracia fiscal ou militar cria um ambiente favorável a
Igreja a tomar a si a responsabilidade da catequese do habitante nativo, criando uma teocracia
espiritual para a sociedade civil. Nesse cenário, naturalmente que o processo educacional levaria a
uma cisão de classes e de interesses, de subordinação e de passividade.
Nessas circunstâncias, nenhuma instituição na vida brasileira existia
para desenvolver o senso de responsabilidade, mas apenas o do mando
descriminário por parte da autoridade e o da obediência, dependência e
passividade por parte do mandado, com o inevitável reverso de rebeldia
do oprimido e arbítrio do opressor (TEIXEIRA, 1976, p.285).
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Pressionado pela sociedade compreendendo intelectuais e movimentos sociais, o governo
procura solucionar o problema, abrindo vagas, tanto na Universidade Pública, quanto na
Universidade Privada, sobretudo, para aqueles indivíduos que tiveram toda sua vida escolar pautada
pelo ensino público. No entanto, a crítica que circula, sobretudo no âmbito da academia, é a de que
esta não é a solução mais acertada. Por quê? “o PROUNI e a política de cotas nas suas
formulações são bonitas e justas, mas na prática se mostram insatisfatórias e prejudiciais ao ensino
superior como um todo. Contribuem com a universidade empresa, mas desprezam a universidade
pública. (ADUSP, 2004,p. 1)
Essas questões foram discutidas por dois pensadores contemporâneos, cujo aporte teóricometodológico aponta para uma nova forma de universalidade partindo da idéia de localizar as
crises com as quais se defrontam as universidades contemporâneas, sugerindo uma reforma
democrática e emancipatória (SANTOS, 2005), bem como uma reforma da universidade, a partir
de uma reforma do pensamento (MORIN, 2000).
O primeiro aponta as 3 crises fundamentais: de hegemonia, de legitimidade, e institucional.
O segundo lembra o papel da universidade, sua missão, como memorizar, integrar e reatualizar o
saber produzido significando uma herança cultural de saberes, idéias e valores o que a torna regeneradora
porque ela assume a incumbência de reexaminá-la, atualizá-la e transmiti-la (MORIN, 2000b p.9). O
questionamento de ambos sobre o papel da universidade e as questões que se colocaram nesses
últimos 10 anos, como uma característica das transformações recentes no mundo com reflexos
fortemente acentuados no ensino em geral e no superior em particular. Este cenário justifica,
portanto, uma proposta de reforma democrática e emancipatória.
2.A proposta de reforma universitária
No seu texto de 1999 Santos lembra que a universidade vem sendo confrontada por
todos os lados. A sociedade cobra-lhe o desempenho de sua missão que não está sendo levada
a contento pelas políticas restritivas por parte do Estado no que se refere ao financiamento de
suas atividades. É um duplo desafio tanto para sociedade quanto para Estado, uma vez que
reformas fragmentadas não resolverão o problema, contribuindo para o despreparo:
Aliás, tal impreparação, mais que conjuntural, parece ser
estrutural, na medida em que a perenidade da instituição
universitária, sobretudo no mundo ocidental, está associada
à rigidez funcional e organizacional, à relativa
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impermeabilidade às pressões externas, enfim, à aversão à
mudanças (SANTOS, 1999,p. 187).
Nesse sentido, lembra SANTOS que a continuidade institucional que se arrasta por séculos,
sugere que seus objetivos sejam permanentes, o que leva a uma esclerose e engessamento, impedindo que
haja uma dialógica entre sociedade/instituição, ciência/tradição, ciência/arte criando uma ecologia
de saberes que venha arejar a universidade, pesquisadores, docentes e discentes. Reportando-se a
Karl Jaspers, Santos (1999) reafirma que bem dentro da tradição do idealismo alemão. Jaspers definiu a
missão eterna da universidade, nos seguintes termos:
É lugar onde por concessão do Estado e da Sociedade uma determinada
época pode cultivar a mais lúcida consciência de si própria. Os seus
membros congregam-se nela com o único objectivo de procurar,
incondicionalmente, a verdade e apenas por amor à verdade
(JASPERS, apud SANTOS, 1999, p. 188).
Essa perenidade nos objetivos da Universidade até inicio do século XX começou a ser
questionada uma vez que a verdade da ciência nos parâmetros da modernidade também sofria
questionamentos. O mundo enfrenta estarrecido a incerteza, a perspectiva do inacabamento dos
saberes, a incompletude do conhecimento.
No bojo das transformações mundiais e as conseqüentes crises dentro da universidade, a
cisão da educação levou a instituição universitária a procurar uma resposta às questões colocadas
pela sociedade. Procurou compatibilizar no seu interior a educação humanística e a formação
técnica ou profissional tentando compensar a perda de centralidade cultural provocada pela emergência da
cultura de massa com o esforço de centralidade na formação da força de trabalho especializada (SANTOS,
1999.p.196) esse é também aspecto central no pensamento de MORIM (2000b) quando da
discussão sobre reforma universitária, pois no seu entender a universidade gera saberes, idéias, valores que
posteriormente, farão parte dessa mesma herança. Por isso, a Universidade é conservadora, regeneradora e geradora
(MORIM, 2000b, p.9). Nesse processo ela assume uma dupla missão: gera conhecimento e
conserva este mesmo conhecimento. Missão transecular que vai do passado ao futuro via presente.
Missão também transnacional e dispõe de uma autonomia, a qual lhe possibilita efetuar essa missão
(MORIM, 2000b. p.9)
Na sua maneira de ver, a educação articulada com a cultura em geral, propõe a
compreensão da vida, do mundo e, sobretudo, da condição humana, como sonhos, desejos, com
vistas a uma educação aberta. Com a ênfase dada a educação musical e as artes em geral pode
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emergir uma cultura escolar. No Brasil, a música, não só na atualidade, mas desde o período
colonial foi amplamente utilizada como um recurso pedagógico pelos jesuítas na catequese dos
indígenas. A importância de lançar mão da arte como um recurso pedagógico é salutar uma vez que
a arte é um fator organizador da sociedade e, em assim sendo, possibilitará a religação dos saberes
cientifico e humanístico enriquecendo cada vez mais a educação e a cultura.
Em sua experiência pessoal, Morim relata que a música entrou em sua aprendizagem com
muita facilidade, pois apesar de informalidade do aprendizado, marcou profundamente sua
personalidade. Suas palavras são enfáticas ao lembrar que a música entrou em minha vida e nunca deixou
de mim falar daquilo que mais mim interessava e que as palavras são incapazes de dizem (MORIM,200,p.24).
Em relação a reforma universitária recentemente proposta pelo governo brasileiro, as
associações de docentes têm se manifestado desde de 2005. Uma síntese feita pela associação
docente do Rio Grande do Sul (ADUSP) leva em consideração alguns princípios básicos como: o
financiamento, a gratuidade e a autonomia das IFES, a relação do estado com as IES privadas e a
carreira docente. Os princípios sugeridos pela Associação são os seguintes: a) que a Educação
Superior Pública, seja integralmente sustentada por verbas orçamentárias estatais; b) que a
Educação Superior, seja gratuita aos estudantes, com base nos recursos orçamentários estatais
supracitados; c) que recursos públicos sejam alocados prioritariamente ás instituições públicas; d)
que as IFES disponham de Autonomia Integral; e) que uma nova Carreira Docente seja
estabelecida, com incorporação das gratificações (GAE, GED, CID) e recuperação e isonomia
salarial para docentes ativos e aposentados. f) que os recursos disponíveis permitam a realização de
concursos públicos para reposição e ampliação das vagas docentes.
A Educação, e a Educação Superior em especial, é hoje considerada
estratégica para a inserção autônoma de qualquer país no contexto
internacional. Por outro lado, o Ensino Superior mostra-se para o setor
privado como potencial fonte de lucro fácil, dada a pressão sobre os
indivíduos no sentido de buscarem uma qualificação escolar cada vez
mais extensa (ADUSP, 2004, p. 1).
Esta é a discussão que está ocupando os debates acerca da inclusão dos indivíduos ao
ensino superior por meio da cotas. Sabe-se que a educação ligada ao setor privado procura atender
a lei de mercado, uma vez que ela se tornou uma mercadoria que circula no mundo capitalista
como se não se constituísse um valor material. Dessa forma, o dito livre-mercado é evidentemente incapaz
de propor executar ações estratégicas de interesse para o país (p.1). Não é preciso negar que a Educação
Superior sofreu nestes últimos anos uma expansão que vem ocorrendo de forma “desordenada de
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vagas de cursos e de IES no setor privado; em especial, cresceram as vagas: quase quadruplicaram
nos últimos 7 anos, sendo que entre 2001 e 2003 quase 600mil, atingindo 1,72 milhão” (p.1).
SCHEIMHMAM (2005) argumenta sobre a reforma universitária apoiando-se na reforma
efetuada por Clark Kerr, presidente da universidade da Califórnia em 1958-1967, sua descrição da
referida reforma, pressionada pelos baby boorner” como sendo aumento de vagas e sua definição de
três tipos de instituição pública; no primeiro, os poucos, campi da Universidade da Califórnia, instituições de
pesquisa e ensino de pós-graduação em que também estudariam os alunos de graduação mais promissores. No
segundo nível (...) as universidades estaduais Califórnia com a missão principal de educar alunos de graduação. E,
finalmente, os colégios comunitários dedicados à educação vocacional, mas que também serviriam de trampolim para
alunos com menor preparo se transferirem, após dois anos de estudo para as universidades. Esse plano deixou de
fora as universidades privadas.(FOLHA, 2005, p. B2).
O articulista lembra que apesar das vantagens, o plano Keer é elitista, todavia o seu
objetivo era criar uma universidade pública que se tornasse referencias em termos de pesquisa e
pós-graduação e aponta os resultados: a produção concentrada de um conhecimento em
biotecnologia considerado o maior do mundo. Foi um motor essencial para o desenvolvimento do Vale do
Silício”.
Quanto ao sistema francês, o autor faz algumas restrições embora aponte como o mesmo
oferece aos alunos que são aprovados no exame final da educação secundária de ter acesso às
universidades públicas gratuitas suas restrições é sobre as diferenças salariais em relação á
Califórnia. o sistema francês é mais igualitário diz. Embora afirme sua ineficiência em inovações que
gerem e crescimento econômico, o que vem provocando fuga de cérebros para Estados Unidos e
Inglaterra. Ademais, nos últimos 15 anos foram laureados quatro professores da Universidade da
Califórnia.
O artigo tem como conclusão a afirmação de que proposta de reforma da educação superior em
vários países do mundo estão sendo influenciados pela experiência da Califórnia. Uma exceção lamentável parece ser
o anteprojeto apresentado ao congresso pelo ex-ministro Tarso Genro (FOLHA, 2005, p. B2).
A partir dessa configuração, o movimento docente através dos seus órgãos representativos
como ADURN, em nível local e ANDES, em nível nacional, afirmam: num país de índices de pobreza
elevados como é o caso do Brasil, onde o processo de exclusão social ceifa os direitos mais básicos de parcela da
população, analisar uma ação de política governamental que preza exatamente corrigir estas mazelas é difícil e correse o risco de cometer erros. Principalmente quando essa ação ocorre no campo da educação sistema tão
relegado, mesmo sendo área estratégica para qualquer país. (ADURN, 2006, p.7).
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O Brasil também se inclui nessa perspectiva, uma vez que na sociedade contemporânea,
o conhecimento se constitui no caminho prioritariamente concebido como fator de
desenvolvimento. Por isso, a universidade como lócus de produção do Saber
torna-se
imprescindível porque ela é considerada como o lócus da produção de Saber.
No Brasil a universidade pública não vem recebendo os investimentos que precisa para crescer com
qualidade (ADURN, 2006, p. 7) proporcionando um colapso entre a demanda por cursos superiores
que vem crescendo assustadoramente nessas ultimas décadas. Nesse sentido, o governo vem
tomando medidas equivocadas, criando a possibilidade de uma inclusão das camadas mais pobres
da população, fortalecendo a permanência e expansão das Universidades Privadas.
Esse fortalecimento diz respeito ao Projeto Universidade para todos (PROUNI) que
facilita o ingresso de jovens ao ensino superior na rede privada de ensino, perdoando os
empresários da educação do pagamento de impostos cobrados pelo Estado. É um projeto que vem
causando polêmicas e controvérsias nos debates sobre sua validade e eficácia. A posição de uma
das Associações Docentes e a seguinte: A Educação em geral e a Educação Superior em especial, é hoje
considerada estratégica para a inserção autônoma de qualquer país no contexto internacional (ADUSP, 2004,
p.1).
Do ponto de vista do desenvolvimento global, sem duvida nenhuma, esta é uma verdade
irrefutável. No entanto, o ensino superior tem sido para o setor privado uma fonte de lucro
incomparavelmente, mais substancial que outra atividade produtiva. Tanto que seu aumento esta
em ascendência continua como se pode depreendeu dos números apresentados. GERMANO
(2004), ao analisar a questão da Universidade Pública Brasileira nesses últimos trinta a quarenta
anos, mostra que seu desgaste tem sido crescente, sobretudo no período da ditadura militar,
embora reconheça que os governos militares fizeram elevados investimentos construindo “campi”
universitários pelo país a fora. Também houve um crescimento dos programas de pós-graduação.
“contudo, dada a ‘rebeldia’ da Universidade pública, a construção de uma agenda governamental
que não privilegiou as políticas sociais e a crise econômica dos anos 70, fizeram com que a
educação superior pública não fosse considerada prioridade”. Os cortes orçamentários foram
ocorrendo sucessivamente, quando a demanda por essa forma de ensino foi crescendo.
Com isso, o ensino privado cresceu em escala sem precedentes, tanto que já no final do
regime militar, a escola pública de ensino superior, respondia com 33,03% das vagas disponíveis,
enquanto a rede privada dispunha de 66,97% de vagas disponíveis. (GERMANO, 2004, p.6).
Segundo seu raciocínio, pode-se ler: “As universidades públicas brasileiras têm sofrido, nos últimos
trinta a quarenta um notório processo de desgaste, descrédito e despolitização por parte das
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políticas desenvolvidas, tanto pelos governos militares pós-1964, como pelos governos que
emergiram a partir da redemocratização (1985)” (GERMANO, 2004, P.6).
Durante a ditadura militar esse desgaste ocorreu, principalmente por causa da repressão
direcionada, sobretudo aos estudantes e professores, resultando freqüentemente, com inovações
dessas instituições pelas forças militares. Pela presença de interventores e, em alguns casos,
nomeação dos Reitores militares.
3. É possível uma nova Universidade?
A Universidade Brasileira, vem particularmente se transformando,sendo, portanto,
paulatinamente tema dos mais acalorados debates. Essa discussão constante diz respeito ao
processo de privatização e mercantilização do ensino com maior ênfase ao nível superior. Este é
um processo que vem, de forma sistemática, tomando corpo, à medida que o nível de ensino vem
caindo de forma acentuada. È um processo que necessita ser analisado a partir dos interesses do
capital. No dizer de Morim, a lógica do capital suscita forças contrárias a essa lógica. No passado,
ela possibilitou o surgimento de medidas que limitaram o poder Regulador dos Estados do BemEstar Social, criando dialogicidade entre o mundo do capital e o mundo civil. Essa ação reguladora
foi quebrada pela exploração do Mercado Mundial a partir dos anos de 1990 do século passado.
Neste sentido, pensar a universidade é pensar também, no que ele representa no mundo
globalizado. O pensamento de Santos (2005) aponta para o seguinte raciocínio:
Sob a égide da globalização neoliberal, organismos internacionais,
organizações não-governamentais e uma plêiade de fundações e institutos
privados têm vindo assumir algumas das funções da universidade
pública no desenvolvimento da educação pública, em especial no campo
da pesquisa educacional aplicada, Esta mudança na titularidade das
funções repercute-se no conteúdo do sem desempenho (SANTOS,
2005, p. 82).
No âmbito das contradições inerentes à lógica capitalista, existem proposições e ações em
práticas como as economias plurais. O desenvolvimento da economia cooperativa se articulando
com a economia de mercado. Contra essa lógica que parece carregar uma grande probabilidade de
triunfos, surgem cada vez mais forças que se levantam contra ela. O mesmo ocorre com o
processo educativo. Mas, é preciso reconhecer que são movimentos particularistas que ainda estão
muito voltados para seus próprios problemas, São dispersos, portanto, incapazes de dar uma
resposta mundial a um problema mundial.
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Mesmo se pensando em uma globalização que se pretende homogeneizadora, é preciso não
só agir localmente, mas entender que o global e o local são inseparáveis. Devem, portanto, serem
mais integrados. Como entende Morim, o local tem um papel importante na simulação de qualquer
coisa que vai além do local. No entanto, é necessário que a vida local exista.
No contexto da globalização, as universidades públicas têm sofrido com a falta de recursos
para custeio, de recursos humanos, tanto docentes como no quadro técnico-administrativo,
levando-as a um esgarçamento do seu tecido humano e estrutural, embora, ainda que apresentem
grandes avanços na produção acadêmica, refletindo no papel social e político que devem
desempenhar na sociedade. Mergulhadas nesse quadro sombrio, as universidades transformaram-se
num conjunto complexo e departamentalizado de visões, de posturas e de políticas que não se articulam em torno de
um objetivo comum (ADURN notícias, 2004, p. 4)
Há uma preocupação constante do corpo docente em produzir cada vez mais e com maior
velocidade, respondendo a um estímulo do Ministério de Educação (MEC) criando um clima de
competição e disputa interna por números de artigos publicados, congressos assistidos, no afã de
ter um volume mais alto de produtos, para possibilitar a ascensão de seus docentes, seus
departamentos e seus centros. É a universidade produtivista. Por outro lado, os departamentos são
o motor dessa ânsia por produção para terem sua cota de recursos garantida e ampliada,
atendendo, dessa maneira, a uma política do MEC cuja exigência corresponde a uma lógica da
produtividade, embora não corresponda à qualidade do ensino desejado pela sociedade. Há uma
permanente insatisfação ao mesmo tempo em que se trabalha com afinco para atender as políticas de
pesquisas impostas, de fora para dentro que criam um sentimento de frustração em relação, as expectativas
do meio acadêmico e, em conseqüência, da sociedade (ADURN notícias, 2004, p. 4). Nesse contexto a
Universidade necessita adaptar-se à modernidade científica e integrar, responder as necessidades fundamentais de
formação, porporcionar ensino para as novas profissões técnicas e outras, porém, sobretudo, porporcionar uma
educação metaprofissional, metatécnica (Morim, 1997. P.50) Mas, permanece o paradoxo: a Universidade
deve se adaptar a sociedade ou a sociedade deve se adaptar a universidade? Ela e Universidade não
é parte da sociedade? Sua abertura e interligação com o mundo extra-acadêmico parece ser a
missão precípua da relação Universidade X Sociedade, Saber científico X saber humanístico. A
Universidade ao longo da sua história foi enfrentar desafios, no século XX não foi diferente. A
pressão da sociedade nessa conjuntura foi de adaptar-se as pressões das demandas de uma
educação e pesquisa para atender às demandas econômicas, técnicas e administrativas, novas
técnicas, novos métodos e uma poderosa força: o mercado. Em toda história, porém há
resistências sobre adaptação sobre as condições existentes significou um marco não de vitalidade,
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mas de envelhecimento e de morte pela perda da invenção e da criatividade. No entanto, os
desafios continuam presentes, na fratura do conhecimento, na fragmentação do saber científico e
do saber humanístico sugerindo uma tomada de posição que urge refletir sobre a religação desses
saberes, a quebra dos limites entre saber científico e tradição. Estabelecer um fio de ligação em que
o indivíduo produz seja fora ou dentro da academia para que sirva de elemento organizador que
conceba a relação recíproca das partes. Essa formulação de considerar as partes e o todo, o todo
e as partes, vem de Pascal que concebeu este imperativo que merece ser observado. Todas as coisas
sendo causadas e causadoras ajudadas e ajudantes, mediatas e imediatas, mantidas por uma ligação material
invisível que subordina as mais distintas, me parece impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, tão pouco
conhecer o todo sem conhecer especificamente as partes (Morim, 1997.53)
A partir dessas formulações, Morim vai propor a reforma da Universidade via reforma do
pensamento que compreende o seguinte: 1.Reroblematização dos princípios do conhecimento e
problematização daquilo que apresentava ser a solução; 2.reforma do pensamento por um
pensamento complexo, capaz de ligar, contextualizar e globalizar; 3.transdisciplinaridade (Morin,
2000b,p.14 ).
Para o pensador francês a reforma do ensino significa encorajar os professores nesta
missão para que seja possível rejuntar a vida, o homem e o cosmos. Esse processo, certamente, vai
atingir do ensino fundamental a Universidade (Morim, 2000b). Sua preocupação em relação a
reforma do ensino, vem no sentido de provocar uma consciência em conservar e preservar o que
foi produzido em termos de saberes, tanto na Universidade quanto no Ensino fundamental e
médio. A questão colocada no final do século XX e a emergência de novas visões trazidas pelo sec.
XXI se torna cada vez mais urgente trabalhar na religação de saberes que a postura conservadora
fragmentou. Essa fragmentação das disciplinas é incapaz de captar o que está tecido em conjunto, isto é, o
complexo, segundo o sentido original do termo (Morim, 2000b. p.11).
A visão que a sociedade em geral, tem sobre educação, é limitada, pois a concepção
cartesiana do ensino e do mundo ainda está presente. A reforma do pensamento como sugere
Morim, diminui a viseira que impede um olhar mais aberto para o problema. A sugestão Moriniana
é a de que do ensino básico a universidade, o conhecimento é uma postura que certamente, levaria
a responder as questões fundamentais do ser humano, quais sejam: quem somos, de onde viemos
para onde vamos. Se partisse desde o ensino fundamental a resposta a essas curiosidades inerentes
ao ser humano, estariam contempladas as condições biológicas e culturais. Poderíamos então revelar o
aspecto físico e químico da organização biológica, inserir o ser humano no cosmos . por outro lado, descobrir-se-iam as
dimensões psicológicas, sociais e históricas da realidade humana ( Morim, 2000b.p.16 ).
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A preocupação com o ensino no sentido de desenvolver o ser humano na sociedade como
um todo, é para Morim, fundamenta. Procurar vê o todo e as partes, como preceito que vai
abranger o homem de maneira global sem rupturas. E preciso, neste contexto, pensar que o planeta
vive incertezas, pois assim, o desenvolvimento de uma consciência global, aneniza o sofrimento
causado pelas rupturas, pela tecnologia cega e pela miopioa do racionalismo que separa, que
disjunta, que isola (Morim, 2000b.p.41-47 )
No âmbito do pensamento de Boaventura de Souza Santos, a idéia mestra que norteia a
discussão sobre a reforma universitária enfatiza a explicação que diz respeito a universidade
pública. Apesar da gravidade das crises e a sua multiplicidade e algumas delas serem provenientes
de longas datas estão hoje reconfiguadas pela globalização neoliberal e o modo como afectam hoje a universidade,
reflete os desígnios desta ultima (Santos,2005.p.5) neste sentido as propostas feitas pelo autor para uma
reforma universitária seria nos seguintes termos: As reformas nacionais da universidade pública devem
refletir um projeto de país centrado em escolhas políticas que qualifiquem a inserção do país em contextos de produção
e distribuição de conhecimentos cada vez mais transnacionais e cada vez mais polarizados entre processos
contraditórios de transnacionalização, a globalização neoliberal e a globalização contrahegenõnica (Santos,
2005,p.55).
Uma reforma que contemple as demandas sociais, inclusive a democratização do saber e da
universidade, poderia eliminar a exclusão social que cada vez mais se agrava. Portanto, a Nova
Universidade poderia contemplar no seu projeto uma articulação local e global, nacional e
transnacional, democracia e universalidade, saber científico e saber humanístico, cooperação e
solidaireiedade. Enfim uma Universidade que possa enfrentar o Novo com o Novo. Que resista e lute
por uma definição do seu papel no local e no global, que articule ensino fundamental e médio com
ensino superior. Que articule ensino, pesquisa e extensão, de forma que um e outro estejam
interligados dialógicamente.Definindo seu papel a universidade poderá lutar pela sua legitimidade
enquanto instituição. Portanto, as reformas devem partir do pressuposto de que no século XXI só há
Universidade quando há formação graduada e pós-graduada, pesquisa e extensão ( Santos, 2005,p.64 ).
Uma Universidade que lute com afinco pela sua legitimidade deve preservar para si um
campo mínimo de manobra centrando-se em cinco áreas de ação que vai a legitimar: acesso: extensão;
pesquisa ação; ecologia dos saberes; universidade pública.
A primeira compreende a democratização ao invés de massificação. O estabelecimento de
parcerias com escolas públicas iria facilitar o acesso. A gratuidade da universidade pública será o
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elemento fundamental. Quanto a extensão, uma participação ativa em construção na sociedade
lutando contra a exclusão social, a degradação ambiental e defendendo a diversidade cultural.
A prestação de serviços neste campo é inesgotável. Seus destinatários são os mais variados:
grupos sociais, comunidades locais e regionais, movimentos sociais, setor público e privado,
promoção de atividades científicas e culturais, principalmente no campo das artes em geral.
No âmbito da pesquisa ação, vai além da extensão uma vês que abrande a pesquisa e a
formação. Esta é uma atividade que apresenta grande tradição na América Latrina.
Tal como acontece com as atividades de extensão, a nova
centralidade a conceder à pesquisa ação deve-se ao facto de a
trasnnacionalização da educação superior trazer no seu bojo
projeto de transformar a universidade em centro de pesquisa
acção ao serviço do capitalismo [....] esta só é possível
através da formulação de um modo contra-hegemônico
(Santos, 2005p.75)
No campo da ecologia dos saberes, proposta um tanto quanto revolucionária seria uma
extensão ao contrário, de fora para dentro, prática que no dizer de Morim, concretiza a religação
dos saberes, o que para santos consiste na formação de diálogos entre o saber científico ou humanístico que a
universidade produz, e saberes, leigos, populares, tradicionais, urbanos, camponeses, provindos de culturas ocidentais
(indígenas, de origem africana, orientais, etc) que circulam na sociedade ( Santos.2005). Enfim , um
diálogo permanente entre sociedade e universidade, eliminando a injustiça cognitiva e consolidando
uma prática que promova a convivência de saberes produzidos pela sociedade como um todo.
Esta seriam pois, práticas da nova universidade que poderiam torná-la menos elitista,
menos corporativista, menos engessada, podendo enfrentar as emergências sem pressa do curto
prazo, mas no alviçareiro anunciar de um longo prazo na construção de uma sociedade sem
injustiça social e sem injustiça cognitiva .
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Referências
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ADURN Notícias: Editorial: Um Prouni para a Universidade Publica. Natal: ADURN.
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especial da Adurn. Natal: Adurn. Dezembro de 2004. P 06-10.
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MORIN, Edgar. Complexidade e transdiscplinaridade: a reforma da universidade e do ensino
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v.120).
TEIXEIRA, Anísio. Educação no Brasil. São Paulo: Editora nacional, 1969. P. 285-315.
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EDUCAÇÃO SUPERIOR: mudanças e controvérsias. Dalcy