CENTRO HISTÓRICO EMBRAER
Entrevista: Mario Sergio Dias Ferraz
São José dos Campos – SP
Outubro de 2011
Apresentação e Formação Acadêmica
Bom, eu nasci em Garça (SP) e eu vim de lá com três, quatros anos de
idade para São José dos Campos (SP) e nós viemos morar aqui no Banhado,
na Vila Esperança, bem na curva do S e ficamos um tempo ali, meu pai veio
sem grana de lá e começamos a vender banana, assim... a catar papelão...
dali nós mudamos para a Major Antônio Domingues e dali eu não lembro
muita coisa de lá, mas sempre a mesma coisa que a gente fazia, depois
mudamos para o Esplanada, Avenida São João, quinhentos e setenta, e ali
nós ficamos bastante tempo, ali a gente cortava a grama, fazia valeta para
a prefeitura, catava papelão, sempre fui de catar papelão para o meu pai,
desde pequeno e depois ali nós fomos... eu estava estudando...
Uma coisa que marcou para mim foi quando eu comecei a fazer o primeiro
ano e aí eu prestava muita atenção no professor e quando eu fui virar do
lado, um rapazinho, outro... todo mundo escrevendo já e eu não sabia nada
“Nossa, como que pode começou a aula agora e o cara já sabe escrever
tudo...”, depois de muito tempo que passou é que eu fui saber que ele fez,
eles fizeram prézinho, aquelas coisas todas que na época era muito difícil,
não tinha, só para quem tinha dinheiro. Então, outra coisa que me marcou
também é que quando eu fui ler lá na frente tinha a diretora, dois
professores, a classe inteira lia, você levantava e pegava a página número
tal, você levanta, põe na página tal e lê, aí eu gaguejei, tirei quarenta e
cinco e noventa em matemática e as outras partes que tinha... geografia...
sei lá o que tinha mais, não lembro direito, português tinha tirado nota boa
em português, tipo assim para passar... sete..., só na leitura eu tirei
quarenta e cinco e eu repeti de ano. Então, isso aí me marcou muito, uma
coisa que hoje em dia a gente passa assim direto sem estudar nada e
passa, então na época era mais difíceis as coisas, né?
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Depois disso nós fomos para a Vila Maria, mas para ir para lá também meu
pai não tinha dinheiro, comprou uma casa velha, caindo os pedaços
baratinha, ele pagou só no material, na casa não, no terreno e fomos
desmanchar a casa toda para levar para lá, mas antes disso a Rua Vinte e
Três de Maio era uma descida enorme, então tinha que cavar o terreno,
cavar na mão, então a gente cavava na mão tudo aquilo lá e nós fizemos
treze metros por quatro de altura, dez... fomos e aí meu pai, depois que
estava pronto para fazer a casa meu pai não quis ficar mais na frente da
casa, morar na... ficava muito com vergonha de ficar na frente da casa, de
morar na rua e aí ele quis ficar no fundo e a gente teve que cavar mais
treze metros para ele ficar no fundo, escondido lá, mas é coisa que
acontece.
Nós ralamos muito nisso aí, eu meus irmãos, todos e na época a gente
morava no Esplanada lá na São João, o David começou a trabalhar na Neiva
(Sociedade Construtora Aeronáutica Neiva), meu irmão mais velho, depois
logo em seguida foi o Celso o outro irmão meu e quando o Celso veio para o
CTA (Centro Técnico Aeroespacial) fez muitos desenhos lá e tinha o PAR lá
na época e o pessoal gostou do trabalho do meu irmão lá e aí contratou o
Celso para a Embraer. Depois que ele contratou o Celso, quando eu tinha
quinze anos, o Celso me trouxe para a Embraer também e aí eu comecei na
realidade, eu comecei aqui a fazer letra de forma para poder escrever e
fazer desenho, uma época tinha que fazer letra de forma, uma letra bem
feita, uma letra bem legível para poder fazer o desenho e então eu comecei
a escrever na caligrafia que eu tinha... minha caligrafia era muito ruim. Aí
eu fiquei lá, fiz isso aí e comecei a fazer desenho, desenhar uma coisa aqui,
fazer uma revisão ali e aí eu comecei a fazer mecanismo secundário de tab,
tab do profundor, tab do leme, tab do aileron - o Bandeirante (EMB 110
Bandeirante) né? - teve o agrícola também... eu mexi no rop do avião
agrícola e o Bandeirante é um avião que teve bastante versões então, ele
durou bastante no projeto porque ele tinha muitas versões, tinha o
Cargueiro, o K1, tinha o P1, o P2, tinha o aero fotogramétrico que nós
fizemos um serviço grande nele.
Então, eu fui... comecei lá de baixo mesmo fui aprendendo o que é um
rebite, o que é um... e tudo o que eu aprendi aqui na Embraer foi com as
pessoas da Embraer e eu agradeço muito as pessoas que trabalharam
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comigo, que deram um apoio para mim, toda a vez que a gente vai
perguntar ou está com uma dúvida o pessoal foi com a maior boa vontade
de explicar, isso aí eu acho a Embraer nota dez. Eu acho excepcional isso aí
e as pessoas hoje na Embraer precisam usar é isso, em minha opinião as
pessoas precisam usar, conversar com as pessoas e com os outros sempre
um vai passar alguma coisa a mais para a gente por mais que a gente
saiba, por mais de tudo o que a gente tenha eu acho que sempre tem
alguém, alguma coisa a mais para acrescentar, então eu acho que isso aí,
uma coisa assim que eu acho que é ouro, é mais que ouro é diamante...
Então esse ponto eu dou valor, o ponto que eu mais dou valor são as
pessoas que é a qualidade das pessoas, um é diferente do outro, ninguém é
igual ao outro e essa diferença que existe entre uma pessoa e outra é o que
faz a diferença no produto final.
Então, isso para mim é primordial e a pessoa que me ajudou muito foi o
Celso, no começo - porque ele me colocou aqui dentro -, depois o
Mittelstadt que ele já morreu tudo, mas ele que me ensinou a projetar,
depois o Davi – outro irmão meu, foi chefe depois do Mittelstadt. Depois
vieram outros chefes, eu tive bastante chefe o Luiz Carlos Affonso, trabalhei
com o Ranieri (Fernando Ranieri), trabalhei com Tsutomu (Tsutomu
Sassaki), trabalhei com Masao (Masao Hashizume), nossa o Masao (Masao
Hashizume)... foi o melhor chefe que eu já tive.
Trajetória na Embraer
Aí em 78 quando eu entrei na Embraer eu virei projetista que lá eu era
desenhista/projetista na Neiva (Sociedade Construtora Aeronáutica Neiva) e
virei projetista aqui na Embraer. Na Embraer comecei a mexer com
mecanismo secundário que é mecanismo de tab de profundor, leme, aileron
que tinham aquelas rodinhas que antes era mecânico, que tinha rodinha
aqui e mexia no tab para compensar o avião, um pouquinho só, uma coisa
assim. Então eu fazia esse trabalho de revisão do avião. Depois disso eu caí
para comandos de voo primário que é o manche do avião que mexe e faz a
acrobacia do avião, faz o direcionamento do avião no ar, então são
comandos de voo primário, secundário - por isso que o nome diz que é
secundário -, antes vem o primário que é um pouco mais importante, ele
tem autonomia, o piloto tem autonomia sobre ele. E depois disso aí,
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começou a cair serviço de porta, porta de carga do Bandeirante (EMB 110
Bandeirante) eu fiz, aquela estrutura de rasgar o avião e por uma porta
embaixo, um trabalho de estrutura.
Depois disso me convidaram... e eu trabalhei um pouco no interior do
Bandeirante, tinha que fazer aquelas coisas assim de dentro do avião,
cadeira de piloto, a gente fazia tudo que não tinha... hoje você compra tudo
e põe lá, então ele fazia... Eu e o Cambito mexemos muito com essa parte
de interior um ano e pouco, daí o Balata (Aguinaldo Raimundo Balata) me
convidou para ir para interior e eu disse “Ah, eu não quero por paninhos no
avião... não faz meu ritmo isso aí por paninho, tecidinho mexer nisso aí...”
hoje é legal até, mas na época eu era meio machão e não queria mexer
com isso. Depois disso daí comecei a fazer o Brasilia (EMB 120 Brasilia), no
Brasilia comando de voo, fiz comando de voo no Brasilia, depois do Brasilia,
no Tucano (EMB 312 Tucano) fiz comando de voo depois eu caí para o AMX,
no AMX eu fiz a parte do flap - o ar em fuga do flap - na Itália, a concepção
para trazer aqui para o Brasil. Aí nós trouxemos para cá e daí eu não caí
mais nesse programa aí eu tive que sair, passou para o pessoal lá, o
pessoal deu continuidade no trabalho meu e eu fui fazer o Brasilia, fiz o
Brasilia e tal, trabalhei no Brasilia e depois do Brasilia eu fui fazer... - tem o
Xingu (EMB 121 Xingu) ali para o meio, mas no Xingu trabalhei pouco, só
comando de instalação de PA - piloto automático - essas coisas muito... -, aí
nós começamos com CBA (CBA 123 Vector), no CBA eu fiz coisa, eu fiz
coisa que não acaba... nossa...
Embraer e Futuro
Eu acho assim... que as pessoas devem ser... em primeiro lugar para fazer
um bom trabalho, ter um bom emprego ou uma boa profissão - vamos dizer
uma boa profissão - primeiro tem que gostar do que faz e ser feliz com
aquilo que faz e vibrar com aquilo que faz porque é feliz porque vibra. Uma
pessoa que se dá bem é uma pessoa que gosta e que ama o que faz e que
ama o próximo tem que amar o próximo, gostar do próximo porque o
próximo que vai te ajudar, isso daí está na Bíblia. Então, isso você sendo
feliz você já vai fazer a coisa mais bem feita, a coisa vai sair mais perfeita,
vai sair mais com alegria, vai sair mais tranquilo, sem atrito por que a
inovação vem da onde? O pessoal quer que inove, inove, inove e de onde
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que vem a inovação? Vem da parte interna nossa, vem das pessoas... se as
pessoas estão bem por dentro, se elas estão felizes, se elas estão
contentes, se elas gostam do que fazem ela vai lá e quer fazer uma coisa
melhor, que ela gosta muito daquilo, é isso... Se não tiver gosto o cara fala
“Vou fazer isso daí...” não adianta... não vai sair coisa boa, para sair coisa
boa tem que gostar e não adianta. E... as pessoas que estão em volta que
eu acho que talvez seja até mais da metade do trabalho porque o trabalho
que a gente faz não é o 100% nunca, a gente faz uma parte, as outras
partes a gente vai correr atrás, a gente vai atrás das pessoas e a gente tem
que tratar bem as pessoas se não, não vai passar as coisas para a gente.
Então, basicamente eu penso que a alegria de estar aqui fazendo aquele
serviço, gostando daquele serviço é uma coisa fundamental, eu acho que
essa parte aí é a parte que é o diferencial para o resto do mundo, essa é a
diferença, o mundo melhor que o resto do mundo, é assim... eu acho.
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