Os tractores agrícolas representam um dos principais investimentos dos agricultores. A sua correcta
utilização, a adequação às alfaias e a capacidade do operador para aproveitar ao máximo as
possibilidades que oferecem estes modernos equipamentos, reflecte-se em mais valias, nomeadamente
em termos da capacidade de trabalho e do consumo de combustível.
O estabelecimento de um modelo de dimensionamento tractor-alfaia, baseado na medição do esforço
de tracção solicitado em condições reais de trabalho (figura 1), permite aos fabricantes uma indicação
fiável da potência recomendada a cada modelo de grade que produzem, f acultando desta fôrma, ao
agricultor a informação de que precisa para a sua tomada de decisão, no que respeita à selecção do
conjunto tractor-alfaia adequado à sua exploração. O dimensionamento deste par tractor-alfaia tem
i mplicações importantes na produtividade e na eficiência do trabalho.
Os trabalhos
publicados por Zoz
(1972), marcaram o
início das propostas
sistemáticas de previsão do dimensionamento tractor-alfaia.
Este autor estabeleceu
um diagrama designado "Tractor Drawbar
Performance
Predictor Chart", assente em
conhecimentos teóricos e em
resultados de ensaios de campo,
com o qual permitia estimar a
potência disponível na barra e as
necessidades de lastro para
tractores de duas rodas motoras.
Os modelos de previsão da
dimensão do par tractor-alfaia para
mobilização do solo foram
normalmente pensados para a
charrua. Smith (1976), Witney e
Oskoui (1982), Witney (1988) e
Jahns e Steinkampf (1988) são
alguns dos trabalhos apresentados
nesta perspectiva.
Todavia, a mesma
metodologia pode ser
aplicada a outros tipos
de alfaias ou mesmo
em termos gerais
(figura 2).
A questão do
dimensionamento do
conjunto tractor-alfaia
pressupõe a considera- ção
de um conjunto de
v a r i á v e i s
(apresentadas nos
rectângulos
escurecidos da figura 2)
que permitam a transposição da
largura da alfaia para a potência do
tractor, ou vice-versa. Neste
trabalho são utilizados como valores
de referência os valores médios das
variáveis medidas em ensaios de
campo realizados com tractores e
grades de discos "offset" no
Alentejo (Serrano, 2002), para além
das indicações publicadas pelos
Standards da ASAE.
A figura 3 ilustra uma
representação esquemática do
modelo geral de dimensionamento
do conjunto tractor-alfaia em
mobilização do solo.
Nos estudos de dimensionamento, as condições que se impõem
à partida são a área das parcelas a
mobilizar e os dias disponíveis, em
média, para realizar determinada
operação cultural, conduzindo a um
valor médio de capacidade de
trabalho que permite a execução
das tarefas no período adequado,
sem correr riscos de natureza
agronómica, garantindo a instalação
das culturas na altura mais
favorável (ASAE Standards, 2000:
ASAE EP496.2DEC99).
O cálculo do tempo disponível
para realizar qualquer operação
cultural pode ser estimado de
acordo com a equação 1, a qual
traduz o produto do número de dias
úteis com precipitação inferior ao
valor crítico, pelo número de horas
disponíveis por dia (hd). O número
de dias em que a quantidade de
precipitação impede a realização da
operação cultural pode ser estimado a partir de cálculos de
probabilidades, baseados nos
registos de pluviosidade diária
verificados numa determinada
região, numa série de anos
consecutivos. Atendendo a que
na instalação das culturas de
Primavera no Alentejo não existe
normalmente limitação de tempo
disponível, são normalmente
considerados como períodos
críticos os meses de Outubro e de
Novembro.
multiplicar pelo número de
passagens da alfaia previstas),
utilizando o valor contabilizado de
horas disponíveis nesse período.
A equação 2 relaciona a
capacidade de trabalho realizada
pelo conjunto tractor-alfaia com as
variáveis que a determinam. Nesta
expressão, o rendimento de campo
depende fundamentalmente de
aspectos relacionados com (ASAE
Standards, 2000: ASAE D497.4
MAR99):
-o operador (a sua perícia nas
manobras de cabeceiras, nas
sobreposições e nas regulações da
alfaia);
- as características da parcela
(a sua dimensão, forma, tipo de cultura, teor de humidade, condição do
solo);
- e o tipo de operação cultural.
A mesma norma dos Standards
da ASAE sugere para este
parâmetro e para grades de discos
pesadas, valores no intervalo de 70
a 90%, com um valor típico de 85%.
Ct = v x l x n x 0,1
(Eq. 2)
Onde: Ct- capacidade de
trabalho (ha/h); vr- velocidade real
de avanço (km/h); I- largura de
trabalho (m); (nc- rendimento de
campo (decimal); 0,1- factor de
conversão de unidades.
A velocidade de trabalho
trabalho passará a ser a variável
dependente. Esta variável traduz a
dimensão da alfaia, a qual é imposta
pela necessidade de garantir uma
determinada capacidade de
trabalho.
Esta primeira fase tem como
resultado a indicação de um
intervalo de larguras de trabalho de
grades de discos que garantem a
realização da operação cultural em
causa, no período de tempo
disponível imposto pelas condições
do solo habituais na região. Esta
informação é, todavia, de valor
meramente indicativo, uma vez
que em cada ano as condições
meteorológicas condicionam as
decisões dos agricultores
relativamente ao momento
oportuno para intervir, podendo
pontualmente ser necessário a
contratação de prestadores de
serviços como forma de viabilizar
a instalação das culturas.
situa-se normalmente num estreito
depende do tipo de operação
intervalo de 6 a 8km/h. A indicação
cultural, do estado em que se
deste intervalo de velocidades
encontra o solo e da capacidade do
resulta das observações registadas
operador para aproveitar as
em ensaios de campo realizados nas
possibilidades que oferecem os
condições habituais de trabalho no
actuais tractores agrícolas, ao nível
Alentejo (Serrano, 2002). São
da regulação dos bancos dos
condutores e da pressão de também definidas normas de
orientação pela ASAE para este
enchimento dos pneus, não
(ASAE Standards, 2000:
parâmetro
esquecendo o potencial inerente
ASAE D497AMAR99), as quais
às modernas suspensões. Não
indicam para grades de discos
existindo limitações impostas
pesadas
um intervalo
de
pelas características da parcela,
velocidades
de
5,5
a
10km/h,
com
nomeadamente em termos de
um valor típico de 7km/h.
obstáculos naturais, a velocidade
Na equação 2 a largura de
típica para trabalhos de gradagem
O dimensionamento do tractor,
ou seja, a estimativa da potência recomendada requer o
conhecimento das exigências de
tracção da alfaia, a qual, associada
à velocidade de operação, permite
prever a potência solicitada na barra
Onde: Pb - potência na barra
solicitada pela alfaia (kW); T tracção na barra (kN); v velocidade real de avanço (km/h);
3,6- factor de conversão de
unidades.
Os resultados obtidos em
ensaios de campo realizados com
grades de discos "offset" em
condições de sequeiro no Alentejo
(Serrano, 2002), para solos de
textura média (figura 5),
conduziram ao
estabelecimento de um
modelo de previsão da
tracção na barra a partir
da massa da grade de
discos (equação 4).
Onde: T - tracção na
barra (N); m- massa da
grade (kg).
Esta previsão, com um
erro de ±20 %, integra
um domínio amplo e
significativo de valores de
massa, representativos
dos modelos de grades
utilizados na região. A
aplicação desta indicação
para solos de textura forte
(argilosos) ou para solos
de
textura
fraca
(arenosos), carece de
validação.
A utilização do modelo
de previsão da tracção
na barra a partir do
conhecimento da massa
da grade, exige um elo de
ligação entre largura de
trabalho (resultado do
dimensionamento da grade
de discos) e massa da
grade (parâmetro de entrada no
modelo de previsão da tracção na
barra). A relação entre a massa e a
largura de corte da grade (equação
5) foi estabelecida a partir dos
resultados obtidos nos ensaios
de campo realizados com
equipamentos dos agricultores
(Serrano, 2002). A recta de
regressão apresentada, com um
coeficiente de determinação
superior a 0,90, representa cerca de
20 modelos de grades de discos
"offset" rebocadas, com massas
compreendidas entre 1000 e 4000
kg, com 60 a 100 kg/disco e com
discos de 61 e 66 cm
(respectivamente, 24 e 26
polegadas) de diâmetro.
Onde: m- massa da grade (kg);
l- largura de corte da grade de
discos (m).
Deve referir-se que os valores
de massa utilizados correspondem
a valores efectivos, resultado de
pesagens das referidas alfaias, os
quais por vezes não têm
correspondência com os valores
i ndicados nas tabelas dos
fabricantes. A largura de corte
corresponde à largura da secção de
solo mobilizado em cada passagem
da grade.
de tracção (n) pode fazer-se a partir
da equação 7 (Serrano, 2002).
A estimativa do rendimento total
Onde: n - rendimento total de
tracção (decimal); n - rendimento
mecânico da Transmissão
Os parâmetros Cha e T foram
calculados com base nas variáveis
medidas nos ensaios de campo
realizados (Serrano, 2002) com
tractores e grades de discos "offset"
rebocadas (consumo horário,
velocidade real de avanço, largura
de trabalho e tracção na barra).
Para a massa específica do
gasóleo (p ) foi considerada um
valor médio de 854g/L,
correspondente à indicação de Billot
(1999) a partir de ensaios realizados
no Cemagref a 15°C de
temperatura.
Para o consumo específico (C )
foram admitidos valores em função
dos regimes de funcionamento do
motor, típicos de utilização em
operações de mobilização do solo:
- num regime de cerca de 80%
do regime nominal, utilizado em
operações que não exigem a
potência máxima do tractor e em
que, com a obtenção de um
consumo específico mínimo (de
270g/kWh) e relativamente estável,
se procura optimizar o consumo de
combustível sem comprometer a
capacidade de trabalho;
- no regime nominal, utilizado em
operações exigentes em potência
ou quando se pretenda optimizar a
capacidade de trabalho, com menor
eficiência em termos de consumo
de combustível (cerca de 300g/
kWh).
A indicação destes valores de
consumo específico é resultado de
ensaios à tomada de força
realizados com vários modelos de
tractores Massey-Ferguson da série
3000, de 59 a 81 kW de potência
máxima no motor (Serrano, 2002).
O quadro 1 apresenta o
rendimento total de tracção obtido
pela aplicação da equação 7 aos
resultados dos ensaios realizados
(Serrano, 2002).
Destes
resultados
pode
concluir-se que, em termos médios,
nas condições típicas de utilização
de grades de discos "offset" na
mobilização de solos de textura
média para instalação de culturas
Quadro 1 - Rendimento total de tracção, para dois regimes do motor, em cada
condição do solo, calculado no conjunto dos ensaios realizados com diversos
modelos de tractores e de grades de disco, em solo de textura média para
instalação de culturas de sequeiro no Alentejo (Serrano, 2002)
de sequeiro no Alentejo, o
rendimento total de tracção foi de
cerca de 70% em solo não
mobilizado ou em solo gradado e de
cerca de 60% em solo lavrado ou
lavrado e gradado. Para efeitos de
cálculo da potência motora
solicitada e uma vez que o tractor é
utilizado nas duas condições de solo
(não mobilizado e mobilizado) deve
utilizar-se o valor mais baixo de
rendimento total de tracção, neste
caso de 60%. Como indicação de
enquadramento destes valores, a
ASAE estima que o rendimento total
de tracção máximo em tractores
de quatro rodas motoras seja de
70% em solo firme (não mobilizado) e de 67,5% em solo mobilizado
(ASAE Standards, 2000: ASAE
D 497.4MAR99).
A indicação da potência motora
recomendada (Ne , em kW)
pressupõe a consideracção do grau
de utilização da potência máxima
(y), normalmente entre 80 e 85%,
funcionando esta margem de 15 a
20% como reserva para fazer face
á solicitações suplementares que
possam surgir no decorrer do
trabalho a realizar, imprevistos
resultantes da heterogeneidade do
solo e zonas inclinadas em que é
preciso vencer a gravidade.
O diagrama representado na
figura 4 pode ainda ser utilizado no
sentido inverso, para prever a
dimensão da grade de discos
adequada a determinado tractor.
4. Considerações finais
A figura 6 ilustra o resultado
da aplicação do modelo de
dimensionamento tractor-grade de
discos apresentado para condições
normais de instalação de culturas
de sequeiro no Alentejo, em solos
de textura média. Nestas condições
é sugerida uma relação potência do
tractor/largura da grade de discos
de 37,5 a 50 CV /m de largura.
A título meramente
exemplificativo, no quadro 2
enumeram-se vinte casos concretos
encontrados durante as visitas a
explorações agrícolas no Alentejo,
realizadas no âmbito dos ensaios de
campo do projecto Pamaf 8.140. É
possível confirmar nestes exemplos,
salvo raras excepções, o intervalo
atrás sugerido para a relação
potência do tractor/largura da grade
de discos, tendo-se verificado um
valor médio de 44 CV/m de largura.
Os pares largura da gradepotência do tractor recomendados na
figura 6 baseiam-se nos pressupostos
enunciados neste artigo. Também
esta informação tem um valor
indicativo, sendo necessário em
cada situação uma análise
criteriosa dos meios disponíveis e
das condições de trabalho. Na
pr ática
poderemos
encontrar
tractores de
menor
potência a
traccionar as
mesmas
alfaias, por
exemplo, um
t ractor
MasseyFerguson
3095, de 100
CV, com uma
grade de
discos
"offset"
Prémetal
PLHR 26-26,
de 3,10mde
l argura de
trabalho, com
um grau de
utilização
d a potência
disponível
mais elevado
ou, o que é
muito comum,
a reduzidas
velocidades
de trabalho.
D e s t a
f o r m a
p o d e
comprometerse não só o
e f e i t o
desejado no
solo, mas
também a
produtividade
e eficiência
do trabalho.
rendimento
global de
utilização do
combustível
fornecido ao
motor.
Apesar
d e s t a s
observações,
na realidade é
mais habitual
encontrar
tractores
sobredimensionados para as
alfaias do que
o inverso, o
que também
se traduz em
prejuízo para o
agricultor uma
vez que não
rentabiliza o
m a i o r
investimento
realizado na
potência do
tractor, com
i mpacto
negativo na
produtividade
e na eficiência
do trabalho. É
m u i t o
frequente o
dimensionamento do
tractor ser
feito em função da charrua, vindo as
restantes
alfaias
subdimensionadas. O
exemplo do
quadro 2 que
reúne o tractor
New Holland G240, de 240 CV, e a
grade de discos "offset" Torpedo
40-26, com 4,30m de largura de
Fig. 6 - Aplicação do modelo de dimensionamento do conjunto tractor-grade de discos
a condições normais de instalação de culturas de sequeiro no Alentejo,
em solos de textura média
É preferível
rentabilizar
a potência
instalada no tractor através da
velocidade de trabalho do que
fazê-lo à custa do esforço de
tracção, uma vez que este tem
implicações directas no rendimento
total de tracção e, por isso, no
Fig. 7 - A largura de trabalho da alfaia no estabelecimento da dimensão do tractor
trabalho,
(à esquerda) e na avaliação de indicadores de dimensionamento (à direita)
poderia
à
partida indiciar
uma dessas
situações.
Todavia, o
agricultor em
causa consegue aumentar
o grau de
utilização da
potência do tractor deslocando
o conjunto a
velocidades de
trabalho da ordem
dos 10 km/h, uma
vez que as parcelas de terreno como um fusível indicador. Todas
têm dimensões consideráveis,
estas informações, velocidade,
praticamente sem relevo e sem patinagem, capacidade de trabalho
obstáculos naturais.
e consumo de combustível, estão
Em qualquer dos casos, os disponíveis ao operador nos
indicadores capacidade de sistemas de informação que
trabalho e consumo por hectare equipam muitos dos modernos
desempenharão um papel tractores agrícolas. É preciso
importante no apoio à tomada de sensibilizar os agricultores e
decisão do agricultor, não só formar os operadores para que
como referências na escolha do par ambos possam utilizar os referilargura da alfaia - potência do dos sistemas como ferramentas
tractor, mas também na gestão i mprescindíveis à tomada de
correcta do conjunto em trabalho, decisão.
permitindo ao operador aproveitar
as possibilidades que os modernos
equipamentos oferecem por forma
a optimizarem estes dois parâmetros
(figura 7).
Devem evitar-se situações de
incorrecto dimensionamento,
as quais resultarão em reduzidas capacidades de trabalho e
consumos de combustível por
hectare agravados. O limite, no caso
de alfaias pequenas para o tractor,
será imposto pela velocidade de
trabalho, a qual deve garantir
a segurança e o conforto do
operador e a qualidade do trabalho.
No caso de alfaias grandes, em que
o limite é imposto pela capacidade
de tracção do tractor, a patinagem das rodas motoras funciona
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