Mª Antònia Pujol; Núria Lorenzo; Verónica Violant (Coordinadoras) (2012)
Innovación y creatividad: Adversidad y Escuelas creativas. Barcelona: GIAD-UB
ADVERSIDADE E CRIATIVIDADE:
uma articulação oportuna?
João Henrique Suanno*
[email protected]
RESUMO
As crises pessoais, sociais, econômicas, políticas e outras, todas humanas, podem ser
percebidas como uma grandiosa oportunidade para alavancar novas possibilidades de
superação da realidade atual. As adversidades, se percebidas como oportunidades de
crescimento, podem também ser percebidas como o iniciar de um novo ciclo, carregado
de enormes forças de renovação, criação e inovação. É importante o significado que
cada pessoa atribui às experiências que se lhe acontece. Para cada pessoa há uma
representação interna diferente daquilo que é vivido, onde algumas pessoas apenas
enxergam a dificuldade em si e outras que visualizam grande oportunidade para
crescimento e aprendizagem. Para discussão destes pontos utiliza-se das contribuições
teóricas de Torre (2011), (PIAGET, 1979), Porter (2008), Deslande (2003), Ferreira
(1986), Forés & Grané (2012), Ellis (1929), Moraes (2008), Merleau-Ponty (1994),
Saint-Exupéry (1974) e mais. O investimento na construção de estratégias de
enfrentamento às adversidades deve ser alvo do planejamento familiar e escolar, assim
como também em todos os âmbitos da sociedade, a fim de oportunizar aprendizagens no
sentido de facilitar o desenvolvimento da criatividade nas pessoas e um novo olhar
sobre as ameaças e percebê-las como oportunidades de crescimento e desenvolvimento.
A adversidade é um auxiliar no desenvolvimento da consciência pessoal, social e
universal do indivíduo e oportunidade de treinamento e desenvolvimento da mente e de
impressões do mundo.
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Mª Antònia Pujol; Núria Lorenzo; Verónica Violant (Coordinadoras) (2012)
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A adversidade rumo ao crescimento pessoal e criativo
O mundo atual vive grandes incertezas, onde as transformações acontecem em
alta velocidade e nada é garantido. Há que se fazer uma tomada de consciência da
incerteza e caos do mundo, onde os passos da evolução seguem sua trilha natural e essa
pode ser uma oportunidade de aprendizado.
As crises pessoais, sociais, econômicas, políticas e outras, todas humanas,
podem ser percebidas como uma grandiosa oportunidade para alavancar novas
possibilidades de superação da realidade atual, na melhoria que parte do pessoal, em
primeiro lugar, para o social.
As adversidades, se percebidas como oportunidades de crescimento, podem
também ser percebidas como o iniciar de um novo ciclo, carregado de enormes forças
de renovação, criação e inovação. Em momentos de crise, em situações de grandes
conflitos, o que é elaborado, quase sempre, são produtos inovadores.
Criatividade e capacidade crítica aliadas no dia a dia são grandes diferenciais
para o surgimento de ações inovadoras, o que alteram a auto-imagem e o pensamento
estratégico na busca de saídas de soluções problemas.
O conceito de adversidade criadora proposto por Torre (2011) articula
criatividade e adversidade, por compreender que é possível enfrentar as adversidades
(pessoais, sociais, econômicas, globais...) com criação de novas possibilidades, e define
que:
o potencial humano para transformar e transformar-se ante à
adversidade ou estados de carências com resultados que
beneficiam a todos. Vai acompanhada de uma maior consciência
da situação, energia emocional e atitude superadora. Falamos de
um potencial criativo que tem sua origem nos erros, problemas,
enfermidades,
perturbações,
conflitos,
separações, desgraças, catástrofes... e
crises,
fracassos,
leva importantes
mudanças com benefícios comunitários ou social. Situações que
aguçam a consciência e fazem de desencadeadores de
alternativas
geradoras de ações
construtivas para outros. (p. 251-252)
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criativas ou mudanças
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A presença da adversidade na vida das pessoas tem um papel fundamental na
transformação destas em pessoas mais preparadas para as mais diversas situações que se
lhes surgem. Na vida há momentos de conflitos que necessitam de tomadas de decisões
para dar continuidade aos afazeres da própria vida.
O equilíbrio é fugaz e, ao se deparar com situações de grandes adversidades hão
novos enfrentamento e, com isto, novas aprendizagens e transformações decorrentes
que, de acordo com o olhar que este tem para com suas experiências do mundo, mudam
para melhor esse mesmo indivíduo.
Retraimento ou ação criativa e inovadora
As pessoas têm, na sua grande maioria, dificuldade em se adaptarem e
flexibilizar suas estruturas cognitivas (PIAGET, 1979). O processo de desequilibração
produzido pela adversidade necessita que o indivíduo reaja e enfrente da forma como
lhe for possível, e com criatividade, a dor e o sofrimento. Essa atitude de reação positiva
perante a dor possibilita a aprendizagem de novos conteúdos e reorganizações de
antigos modos de proceder, e pode classificar a adversidade, mesmo sob sofrimento,
como acontecimento que teve sua contribuição em um determinado momento da vida.
Pode ser vista como instrumento desenvolvedor da criatividade, visto que em épocas de
grandes crises, momentos de grandes crescimentos e inovações posteriores a elas,
geralmente, surgem. Estas reorganizações cognitivas, possivelmente, resultarão em
desenvolvimento e aprimoramento de habilidades e atitudes agregadas de valores,
acrescidas de criatividade e inovação.
As pessoas, inevitavelmente, enfrentam situações de sofrimento de maneiras
diferentes, com temporalidades também diferentes, em ocasiões diversas umas das
outras e momentos recheados de demasiadas incertezas. O diferencial entre todas estas
pessoas está na forma como encaram estas situações e como as transformam em
aprendizagens para outras tantas que ainda, inevitavelmente, acontecerão ao largo da
vida de todos. O que importa são as atitudes construtivas de enfrentamento da dor, para
que a mesma seja um motivador de aprendizagens e que possa ser um desencadeador do
pensamento criativo, daí o conceito de adversidade criadora, como aquilo que se
aprende a criar para lidar com a dor, a partir da dor.
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Ação de transformação interior
Não é o fato de perceber a vida como Pollyanna, personagem de célebre obra
universal homônima de Eleanor H. Porter (2008), que nos traz a história de uma
menina-moça que percebe somente as boas coisas do mundo, onde se esquiva das
agruras da vida, mas de encarar a própria vida com os pés no chão e entender que as
adversidades são fatos que aconteceram no passado de todos, acontece no presente e
serão presentes no futuro de todos. Nem tudo o que acontece com o indivíduo, depende
da decisão deste.
As atitudes que cada pessoa assumirá nos momentos em que acontecerão estas
ranhuras na vida, podem ser transformadas em oportunidades de crescimento ou
permanecem-se inertes, sem reações, sem tomadas de atitudes que possam ajudar as
pessoas a saírem do lugar indesejado em que estão, para outro de melhores energias. É
justamente diante das consequências das atribulações que os indivíduos devem procurar
repensar suas posturas, pois delas virão a submersão na fuga da realidade vivida, a
emersão, como de uma phênix, que renasce das cinzas, de onde não há mais esperança
de vida ou a permanência na inércia latente de possibilidades que, um dia, poderão ou
não se transformarem em ações de enfrentamento.
Os comportamentos de evitação impossibilitam o preparo para outros eventos
que surgirão, quem sabe, ainda mais contundentes. Ao mesmo tempo, a postura de
enfrentamento deve ser cautelosa e consciente a ponto de perceber os pontos fortes e
fracos que existem em si mesmo e na situação apresentada. O aprendizado se inicia a
partir de iniciado esse estudo, onde se busca compreender a adversidade para se elaborar
as ações para sua superação.
Esse comportamento de evitação impossibilita o enxergar de saídas para alcance
de um promissor futuro. O indivíduo deve assumir a responsabilidade sobre suas ações,
apoiados em conceitos, comportamentos e formas de agir elaborados ao longo de suas
experiências de superações, o que todos os indivíduos, inevitavelmente, possuem.
A responsabilidade deve ter sua origem na dedicação, perseverança e
determinação na aprendizagem e desenvolvimento da criatividade, com sabedoria e
paciência, com o entendimento de que reformas do pensamento não acontecem
imediatamente de um dia para o outro, nem de uma situação para outra de forma pronta,
mas necessita elaboração, discernimento na seleção do que pode e deve ser aproveitado.
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O indivíduo proativo se acerca do controle do seu desenvolvimento neste sentido e,
possui maior capacidade de reversão da situação presente, com superação e prontidão
para outras situações, nunca desejadas, mas inevitáveis.
Poderíamos pensar, segundo Deslande (2003) em três tipos de comportamentos
que as pessoas normalmente têm quando em enfrentamento com a adversidade, onde em
um grupo se encontram aqueles que possuem comportamento de evitação e não de
enfrentamento, e encarrega outrem da solução dos problemas que se lhes aparecem,
quando os têm, pois não consegue pensar na busca de soluções, só no problema e não
possuem resistência física, nem emocional para esse embate e sentem-se enfraquecidos
e desgostosos da vida. Outro grupo parte daqueles que chegam a enfrentar as situações
de adversidade que lhes aparecem, porém sem grande resistência no embate e procuram
dividir com o outro a responsabilidade da busca de soluções para os problemas que não
se cansam de surgir. Também possuem o receio de se deslocarem do lugar onde estão
com receio de que algo de imprevisto aconteça, por isso tendem a não terem um
comportamento inovador e criativo.
No último grupo estão localizadas aquelas pessoas que possuem grande
capacidade de enfrentamento às adversidades, e não aceitam se deixarem vencer pelas
mesmas. Estão constantemente alertas, constroem soluções e, nestas, aprendizagens e
reorganizações cognitivas, com os olhares atentos ao futuro e nas estratégias a serem
utilizadas para o atingimento de seus objetivos.
Estas pessoas possuem uma possibilidade de se tornarem cada vez mais
criativas, pois exercitam constantemente suas capacidades criadoras quando em
momentos de enfrentamento e também fora deles. São pessoas argutas, com
flexibilidade e entendem que a solução está no seu envolvimento e na sua capacidade de
reorganizações de suas estruturas cognitivas no planejamento nestas estratégias de
solução. Não se receia da tentativa, nem lança ao outro a responsabilidade de resolver e
enfrentar a adversidade.
Administrando a adeversidade: a resiliência
A resiliência, segundo Ferreira (1986) é um termo que tem sua origem no latim
resilium e que significa a capacidade que as pessoas, ou uma sociedade, possui de se
adaptar ou de evoluírem positivamente frente a uma situação adversa, com flexibilidade
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na adaptação às mudanças e com grande capacidade de auto-reerguimento. Para Forés
& Grané (2012),
é uma metáfora geradora que se baseia na esperança futura
possível humana e a busca da felicidade ante os sofrimentos,
trauma e dor sofridas. É um conceito que tem um grande poder
de inspiração. (p.23)
Considerada como uma capacidade do indivíduo, Deslande (2003) a percebe
como comportamento praticado em determinadas situações, de acordo com as condições
circunstanciais, no sentido de administrar a adversidade, sem se sucumbir a ela,
relativizando indivíduo e contexto, na tentativa de superação de acontecimentos com
grande garda estressora, ressignificando o problema. Esse tipo de ação se encontra,
justamente, no comportamento de renovação e transformação constantes e contínuas,
com saltos de aprendizagem, com uma pessoa proativa na construção de realidades
melhores.
Ao se deparar com situações provocadoras, que exijam atenção em situações
emergenciais, que imputem muita pressão há que se enfrentá-las com criatividade e
também com mais inovação. Muitas experiências já vividas, muitas vezes, já não são
suficientes para a resolução de situações novas. Em parte contribuem, mas estratégias
novas e remodeladas fazem-se necessárias em vários momentos da vida.
Uma grande preocupação é a forma de como as pessoas enfrentam e resistem ao
processo de mudança e crescimento interiores em frente à demanda de enfrentamentos
externos, internos e pessoais. Lançar-se à atividade requer atitude baseada na coragem e
liberdade de expressão com autonomia. Para se enfrentar a realidade externa, deve-se
primeiro trabalhar e enfrentar a realidade interna, com seus medos, receios, temores e
fraquezas. Mudanças externas são melhores aceitas do que as mudanças internas, e as
pessoas precisam primeiro aprender a aceitar, e também a desejar, as mudanças internas.
O conceito de resiliência ganha, nos dias de hoje, uma grande importância
justamente pelo fato de demonstrar que os indivíduos conseguem reconstruir-se e
aprender mais perante a adversidade, e saem destas situações mais preparados para
novas situações e, ainda, com saúde mental.
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Heródoto, filósofo grego (485a.C. – 430/20a.C.), traz a observação de que “a
adversidade tem o efeito de atrair a força e as qualidades de um homem que as teria
adormecido na sua ausência” e, desta forma, a reação do indivíduo é determinante para
o que pode acontecer com sua vida e perceber novas estratégias e caminhos que pode
percorrer. A reação do indivíduo pode contribuir para o sucesso e superação, e o torna
cada vez mais preparado para lidar com o que surge diante de si, ou para o fracasso e
obscuridão do pensamento e a percepção para reconhecimento das oportunidades de
crescimento da sabedoria, nestes casos, diminui.
A adversidade como fato, a resiliência como escolha
Às pessoas deveriam ser oportunizados momentos de se trabalhar as suas
capacidades de enfrentamento como alavanca para superação e engrandecimento de
forças internas de continuação e jamais de desistência.
Segundo Ellis (1929), “a dor e a morte são parte da vida. Rejeitá-las é rejeitar a
própria vida”. A pensar: Seja bem vinda a adversidade!, ou mesmo: Sejam bem vindos à
adversidade! A receptiva não é o fato de desejar que a adversidade se faça presente, um
dia, na vida das pessoas, mas ao não se ter o controle dos acontecimentos, ao se deparar
com ela, se colocar em uma posição de coragem para o enfrentamento. Com ela
aprende-se a lidar e a superá-las e, consequentemente, a ser quem somos.
O fato de perceber as várias faces da adversidade, não representa inércia no
comportamento em busca de sua solução, mas, ao contrário, é enfrentá-la com o
entendimento que é uma ocorrência da vida e, com forças interiores de a encarar de
frente, a aceitar como ponto de partida para a busca de melhorias e a confrontar com a
possibilidade de uma realidade melhor, pensar outras e mais maneiras de como se
desvencilhar dela.
Percebe-se, ao longo do tempo, que várias pessoas conhecidas mundialmente, e
que enfrentaram grandes momentos de adversidades, tais como Abraham Lincoln
(1809-1865, político estadunidense, 16° presidente dos Estados Unidos), Enrico Caruso
(1873-1921, tenor italiano), Winston Churchill (1874-1965, estadista britânico), Jonah
Lomu (jogador de rugby, nascido em 1975), Lionel Andrés Messi, (futebolista, nascido
em 1987) e outras tantas personalidades, as transformaram em vantagens e
oportunidades para o atingimento de metas. Quando se há momentos de grandes
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transtornos a serem enfrentados, as soluções, às vezes, são encontradas nos lugares mais
improváveis, mas somente pessoas com grande capacidade de enfrentamento
conseguem utilizarem-se deste recurso, aliada à capacidade de criação que possui.
Moraes (2008) entende que há que se colaborar com as pessoas para que percebam
a riqueza de cada momento da vida, para exercitarem o sentido
de oportunidade, de cada ocasião. Para que possam perceber a
importância de cada momento de sua vida, de casa momento de
dor ou de alegria, como oportunidades importantes para sua
evolução. Para texto, eles precisam perceber que a felicidade
depende, antes de tudo, de seu grau de consciência e de
compreensão, de seu poder transformador, de seu espírito em
evolução. (p. 260)
Recursos utilizados que surpreendem àqueles que, quando relatados, poderiam
se utilizar desta ou daquela técnica ou estratégia para resolução de algum tipo de
problema pessoal. Nestes casos se destacam a capacidade criativa e inovadora. São
estratégias que fogem às já concebidas, muitas vezes buscadas em áreas
multidisciplinares, que transcendem definições prontas e acabadas, e as reescreve de
outras formas.
Ao se relacionar aprendizagens pessoais com o social, há que se lembrar que os
exemplos de superação às adversidades saem de seus autores para ganhar o mundo em
outras paragens, de outros modos. Segundo Merleau-Ponty (1994), ao se apropriar de
um exemplo que a tenha tocado pelo seu teor e capacidade de transformações, uma
pessoa, a toma com o sua, faz a leitura desta realidade com sua lupa, lhe injeta a sua
maneira de ser e lhe confere novas características acopladas às da própria experiência,
de forma que lhe dê um sentido próprio, vinculado com a sua própria vida. Por isso,
exemplos de superações notórias nas religiões, na política, nas ciências, na natureza, no
esporte e mais, são absorvidas pela população mundial como exemplos e inspiração
para as vidas de todas as pessoas, sejam de que continente e línguas forem.
Viver o dia a dia da vida é uma constante prova de superação e um constante
teste de verificação de forças existentes dentro da cada pessoa, para superar a si mesmo
e as situações que provocam conflitos e angustiam a todos, de maneiras diferentes.
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Mesmo sendo de origem diversa da adversidade, não se leva em consideração o fato de
gostar ou não, ou mesmo de querer ou não, pois estas situações fazem parte da vida e
suas superações estão entre os maiores obstáculos que todos enfrentamos, quer sejam
pequenos ou grandes, existem os desafios e dificuldades a serem confrontados com lutas
pessoais, e podem ser um auxílio na busca de estruturas internas para dar o suporte aos
momentos adversos. Isto não é uma apologia ao sofrimento, nem à dor, ou mesmo à
necessidade da existência da adversidade.
Ressignificando a adversidade
É importante o significado que cada pessoa atribui às experiências que se lhe
acontece. Para cada pessoa há uma representação interna diferente daquilo que é vivido,
onde algumas pessoas apenas enxergam a dificuldade em si e outras que visualizam
grande oportunidade para crescimento e aprendizagem. Estas últimas se superam a cada
evento e sobrevivem aos mesmos engrandecidos, amadurecidos e melhores preparados.
Assim, em meio ao temporal não adianta reclamar! Neste momento faz-se
necessário buscar um espaço na dor para se realizar uma reflexão cuidadosa, a ação com
disciplina, ousar nos métodos em busca das soluções aliados a uma grande vontade de
reestabelecer o equilíbrio, nem que seja por pequenos momentos cronológicos, mas de
grandes realizações pessoais internas e também sociais. A ação deve ser consciente, sem
nunca desmerecer o problema e atento para perceber que cada momento como esse é
uma grande oportunidade de realizações.
Cada situação é única e merece um olhar também único para se trabalhar com
ela.
Há quem diga que a adversidade é “madrinha das oportunidades”, pois através
dela voltamos nosso olhar para um mundo diferente, desafiador, de forma inteligente,
otimista, mas sem nunca se afastar da realidade, a qual deve ser o elemento norteador do
pensamento, sem nunca deixar de se afastar dela. O fracasso pode representar
desistência de novas tentativas, mas pode também representar superação, resiliência.
É interessante quando se vê uma pessoa a qual obteve sucesso em uma
determinada tarefa e outras dizem que foi um lance de sorte, ou mesmo que esta se
encontrava na hora certa em determinado lugar onde aconteceria algo com alguém e
este alguém foi a pessoa em questão. Estas outras não percebem o quanto trabalho
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existe por detrás de um evento tido como de sorte. Não estão atentas ao enorme número
de fracassos e de situações adversas enfrentadas por este que, num determinado
momento, obteve sucesso em uma empreitada. Histórias de sucessos estão intimamente
ligadas às histórias de tentativas e fracassos, em igual ou superior número de
ocorrências. Por isso cada tentativa de não sucesso é um caminho em busca do acerto
que está logo à espera de ocorrer.
Sofrer não é, nem nunca foi agradável, se tivermos como referência uma pessoa
que não está acometida de nenhuma psicose ou mania que a faça gostar e se sentir
dependente de dor e sofrimento, mas não se pode negar a realidade que se impõe em
alguns momentos da vida e não se pode deixar-se sucumbir às mesmas. Assim como
disse Saint-Exupéry (1974), “Se alguma coisa se te opõe e te fere, deixa crescer. É que
estás a ganhar raízes e a mudar. Abençoado ferimento que te faz parir de ti próprio.” O
crescimento nasce do homem para o próprio homem. Ninguém aprende, nem cresce, por
ninguém. Resta-nos, então, aceitar sua existência das adversidades, enfrentá-las,
reestruturar-se e seguir em frente.
Não se trata também de desvalorizar o peso e a importância da adversidade na
vida das pessoas e adotar uma postura diminuta diante de uma situação exasperadora.
Não é possível compreender tudo com nível de entendimento claro da razão e admitir
que há fraquezas e falhas decorrentes não bastam para o alívio contido na solução destes
problemas.
Querer convencer a adversidade na tentativa de dissuadi-la como se esta fosse
sair da sua estrada de vida, não é possível e se aproxima da indulgência, ou seja, da
facilidade em perdoar os erros dos outros, com prática de constantes atenuações, ou
mesmo jamais com a preocupação em se ocupar destes. Esse tipo de postura fatalmente
diminui o valor da conquista e as aprendizagens de transformação de si mesmo.
É importante lembrar que a ação tomada diante dos desafios que as crises nos
impõem, determinam sucesso. Essa ação reverterá a realidade presente, com vias a
transformá-la em possibilidades de superação e de encontro de rumos que,
anteriormente, os olhares não viam. Juntamente com estas ações, agregar valores pode
ser o grande diferencial para que a superação possa ser uma verdadeira inversão da
situação que ora se apresenta, e o planejamento, nesse momento, é uma grandiosa
ferramenta para propiciar esse salto.
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Da adversidade à criatividade
O investimento na construção de estratégias de enfrentamento às adversidades
deve ser alvo do planejamento familiar e escolar, assim como também em todos os
âmbitos da sociedade, a fim de oportunizar aprendizagens no sentido de facilitar o
desenvolvimento da criatividade nas pessoas e um novo olhar sobre as ameaças e
percebê-las como oportunidades de crescimento e desenvolvimento. Situações adversas
devem ser oferecidas como exercício de resoluções a fim de que as pessoas possam
elaborar mais ideias, com sensibilidade e capacidade criativa de responder a estas
demandas.
Os problemas colaboram com a construção de uma pessoa mais criativa, mais
vinculada com a realidade, com possibilidades de grandes realizações por saber que
para ser bem sucedida faz-se necessário o pensamento com liberdade, com cautela, com
coragem, com ousadia e responsabilidade, e que esses atributos são conquistados como
troféus de outros tantos embates já ocorridos.
O indivíduo que confia em si mesmo e é conhecedor das suas habilidades,
conhecimentos, capacidades e talentos planeja com mais confiança suas estratégias para
enfrentamento das adversidades e das mais diversas situações desafiadoras, e obtém
como resultado uma melhora considerável, a nível pessoal, na forma e na estratégia do
que faz, isto devido à grande oportunidade de crescimento e desenvolvimento que essas
situações
trazem
e
contribuem
para
o
auto-conhecimento
e
consequente
desenvolvimento da auto-confiança.
A relação estabelecida pela atividade na qual se investe tempo e energia é
essencial motivar a caminhada ao encontro de uma pessoa (si próprio) com autoconfiança aumentada, além da ética, da capacidade crítica e planificadora. O amor e o
prazer na realização destas atividades são exemplos disso, pois demonstram que existe
no interior do indivíduo o caminho a ser seguido, porém ainda a ser descoberto e,
quando a resposta do indivíduo for construtiva e positiva, a limpidez do caminho se
aclara, sua força de agiganta, a coragem de enfrentamento cresce, a perseverança se
eleva em prosperidade, a determinação se reforça a cada enfrentamento e o otimismo
pessoal representa a confiança na resolução e crescimento das experiências para
acontecimentos futuros. Esse preparo e transformação pessoal facilita todo o processo
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de enfrentamento presente e futuros. Como nos alerta com muita propriedade Moraes
(2008),
precisamos aprender a educar para a escuta do sentimento e
abertura do coração. Ensinar nossos alunos a serem mais felizes,
apesar de suas dificuldades, muitas vezes, imensas. Educar no
caminho do amor, da inteireza, da fraternidade e da sabedoria.
Educar no encanto do ver, do ouvir, do aprender a refletir para
poder agir conscientemente, descobrindo o que existe em cada
olhar que abarca o seu entorno. (p. 259)
É importante lembrar que ao se falar a palavra educar não se pode restringir à
educação escolar, até mesmo porque educação não acontece somente dentro das paredes
da escola. É preciso ampliar o sentido desta palavra para a ação de educar que acontece
no seio familiar, social e comunitário, onde as pessoas iniciem um processo de relação
interpessoal baseado no caminho do amor e refletir com consciência para com o
entorno.
Desta maneira, o indivíduo que se prepara, com o auxílio do meio, para esta
escuta do sentimento e abertura do coração, desenvolve uma capacidade de resiliência
como expressão de renovação dentro da adversidade. A física nos traz uma definição de
resiliência a qual podemos nos acercar da mesma para usar também em relação às
pessoas, que se refere à propriedade de determinados materiais em acumular energia em
si, quando confrontados e submetidos a uma pressão muito grande. Esse acúmulo de
energia volta ao seu estado de equilíbrio que a matéria tinha logo em seguida à pressão
sofrida, sem que este sofra deformações.
Adversidade, Resiliência e Criatividade: uma relação pouco desejada, mas muito
profícua.
Em relação às pessoas, essas deformações são sentidas em seu amor-próprio, nas
suas relações de confiança com o mundo, com as pessoas e consigo mesmo e, como
consequência destas, na força que acredita ter para a luta a ser travada nos momentos e
ambientes hostis. Ainda assim, algumas pessoas quando sofrem excessiva pressão,
carregam-se de uma energia que não sabia que tinham e descobrem dentro de si em
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espaços nunca dantes percorridos, com superação e construção de forças de
enfrentamento às adversidades.
Pode-se dizer que as consequências acontecerão de maneira inevitável, e mesmo
neste caso, que nos referimos às pessoas nunca podemos ser certos em descrever
comportamentos como certezas, somente como possibilidades, que podem ocorrer, no
mínimo duas: a de acumular experiência negativa e viver a lembrança das experiências
com dor e sofrimento, e uma outra maneira de viver o que nunca deixará de ser uma
experiência desagradável, mas de forma a retirar desta novas aprendizagens de
superação, novas capacidades de lidar com a dor e o sofrimento das lembranças, com
mais experiência e competência para encarar de frente esta e novas adversidades que
não deixam nem deixarão de surgir.
A resiliência, desta forma, em consideração à etimologia da palavra, resilium,
proveniente do latim, traz o sentido latente de saltar para um novo momento onde se
encontra uma pessoa renovada, impulsionada e mais preparada para novos
enfrentamentos adversos, e reencontros cada vez miores com suas possibilidades de
superação de uma mesma pessoa, a cada dia, diferente em possibilidades de ações.
Podemos entender também resiliência como a capacidade que o indivíduo tem
de transformar-se na sua necessidade de obtenção de um ou mais objetivos de vida. A
resiliência fortalece a capacidade de prevenção, projeção e antecipação de cenários,
utiliza-se de sua proatividade e, em consequência, experimentar um aumento da sua
reputação com outrem, de sua autoimagem e de sua auto-confiança.
O que não pode acontecer é confundir resiliência com conformismo, ou com a
capacidade de suportar uma situação com grande pressão passivamente. Um indivíduo
resiliente, o é, quando há o crescimento, mudanças e inovações na antecipação de
situações, coerente, estrategicamente, consigo mesmo, com os outros e com o meio, de
maneira proativa e com visão voltada para o futuro, com transformação de si mesmo e,
ao mesmo tempo, considerado como motivo de inspiração para as transformações de
outrem.
A adversidade é um auxiliar no desenvolvimento da consciência pessoal, social e
universal do indivíduo e oportunidade de treinamento e desenvolvimento da mente e de
impressões do mundo.
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O ser humano é situado historicamente, também o é em imaginação e percebe-se
na busca da construção de uma consciência pessoal coerente, preocupada com o ser
humano inserido na sociedade, que contribui para a construção de uma consciência
social coletiva, engajada na construção de instrumentos para o enfrentamento de
momentos e situações adversas. Desta forma o ser humano e a sociedade proporcionam
o questionamento dialético de sua existência relacionada com seu próprio mundo e com
o mundo social, na formação do que podemos chamar de homem social transformador,
criativo, em constante autopoiese, sem nunca se desvincular do seu compromisso com a
preservação do ambiente do ser social vivente de forma criativa.
As pessoas devem pensar em estratégias criativas para atender às necessidades
em momentos de crises pessoais e considerar estas como oportunidades de revisão de
suas estratégias de ação e foco na solução de problemas.
Considerações Finais
O ser humano tem que buscar coerência com sua consciência, vinculada com
responsabilidade à época e ao meio ao qual está inserida, com transcendência incessante
como ser único, mas em relação constante com os outros, participante colaborador na
transcendência destes. Na interrelação há a representação do mundo interno de cada
uma das pessoas envolvidas e, ao mesmo tempo em que as pessoas se interagem com
seus mundos internos e representações, interagem também com esta, as aprendizagens
sociais e históricas da sociedade às quais viveu, visitou ou estudou.
A capacidade de lidar com a adversidade é elemento essencial para que o
indivíduo possa enfrentar, elaborar, reagir e sobreviver a estes momentos. Isso é o que
também podemos, de modo pessoal, chamar de resiliência. O indivíduo com esse talento
possui uma capacidade de enfrentamento à todas as situações que se lhe apresentam, e
sabe que auxílio outro que não o seu próprio não é certeza de companhia, nem de
socorro. Sua confiança nas suas reações, e a consciência no talento que possui para esse
tipo de enfrentamento o auxilia a reverter as adversidades, com bom senso, na
recondução de sua trajetória para o alcance dos objetivos traçados para tal,
desenvolvendo a criatividade, pois quando tudo se parece perdido, o uso da imaginação
e da criatividade são os melhores aliados do conhecimento.
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Mª Antònia Pujol; Núria Lorenzo; Verónica Violant (Coordinadoras) (2012)
Innovación y creatividad: Adversidad y Escuelas creativas. Barcelona: GIAD-UB
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Mª Antònia Pujol; Núria Lorenzo; Verónica Violant (Coordinadoras) (2012)
Innovación y creatividad: Adversidad y Escuelas creativas. Barcelona: GIAD-UB
*Psicólogo, Psicopedagogo, Mestre em Ciências da Educação Superior pela
Universidad de La Habana-Cuba revalidado pela Universidade Católica de Goiás –
UCG. Professor da Universidade Estadual de Goiás – UEG. Doutorando em Educação –
UCB/DF. Pesquisador do grupo ECOTRANSD/CNPq.
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ADVERSIDADE E CRIATIVIDADE: uma articulação oportuna?