Sebastião A. Borges et al.
Consumo de água em frangos de corte
suplementados com bicarbonato de
sódio ou cloreto de potássio na ração
Sebastião Aparecido Borges (Doutor)
Curso de Medicina Veterinária - Universidade Tuiuti do Paraná
Daniely Salvador (Mestre)
Nutricionista da NUTRIS Nutrição, Tecnologia e Sistemas Ltda
Ana Vitória Fischer da Silva (Doutora)
Universidade Federal do Paraná
Fabiano Lopes Bueno
Nutricionista da NUTRIS Nutrição, Tecnologia e Sistemas Ltda
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 31, FACIAG 02, p. 89-96, Curitiba, jun. 2002
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Consumo de água em frangos de corte suplementados...
Resumo
Dois experimentos utilizando 2.400 pintos de corte machos foram realizados com o objetivo de avaliar o consumo de água. Rações à base de milho e farelo de soja foram fornecidas à vontade. As aves foram suplementadas
com NaHCO3 (0,5, 1,0 e 1,5 %) ou KCl (0,5 e 1,0%) na ração a partir de 21 ou 35 dias, até 49 dias de idade. O
delineamento experimental foi em blocos ao acaso em esquema fatorial 2x3+1 ou 2x2+1 (idades x níveis +
controle) com 5 repetições. O consumo de água, a relação água/ração e a umidade da cama foram superiores
para aves suplementadas a partir de 21 dias e naquelas com maiores níveis de sais na dieta. O consumo de água
aumentou e a relação água/peso corporal diminuiu com a idade das aves. O “turnover” de água diminuiu com
a idade das aves porém, aumentou com a suplementação de NaHCO3 e KCl.
Palavras-chaves: bicarbonato de sódio, cloreto de potássio, consumo de água, relação água/peso, umidade de
cama.
Abstract
Water intake was evaluated in 2,400 male broilers supplemented with NaHCO3 (0.5, 1.0 and 1.5%) and KCl (0.5
and 1.0%) in ration from 21 and 35 days of age until 49 days old. The corn-soybean diets and water were
supplied “ad libitum”. A randomized block design were used, in a 2x3+1 or 2x2+1 factorial scheme (age x levels
+ control) with 5 replicates. Water intake, water/ration relationship and litter moisture increased in broilers at 21
days old and for higth levels of salts in diet. Water intake increased with age although it decreased per unit of body
weight. Water turnover in broilers reduced with age, but increased with NaHCO3 or KCl supplementation.
Key words: litter moisture, potassium chloride, sodium bicarbonate, water intake, water/weight ratio.
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 31, FACIAG 02, p. 89-96, Curitiba, jun. 2002
Sebastião A. Borges et al.
Introdução
A água é um componente essencial aos tecidos
biológicos. O metabolismo e o balanço de água normalmente são negligenciados em especificações
nutricionais de aves. Apenas em situações de privação
sua importância é considerada, sendo que perdas excessivas, podem causar desidratação, queda no desempenho e morte. Assim, a ingestão é peça fundamental
na manutenção do balanço hídrico das aves em temperaturas elevadas, sendo que a ave tem capacidade
de igualar, por meio da ingestão, o volume de água
perdido durante o estresse calórico (Ait-Boulahsen et
al., 1995).
O bicarbonato de sódio (NaHCO3) e o cloreto
de potássio (KCl) têm sido utilizados na tentativa de
minimizar as perdas causadas por estresse calórico
(Borges, 1997). A adição destes sais à água de bebida
altera o equilíbrio osmótico das aves (Teeter, 1989),
aumentando o consumo de água (Belay & Teeter,
1993). O consumo de água está relacionado com o
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 31, FACIAG 02, p. 89-96, Curitiba, jun. 2002
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Consumo de água em frangos de corte suplementados...
consumo de alimento, idade e peso da ave, temperatura e pH da água (Macari, 1996). Fundamentado no
exposto acima foram conduzidos experimentos com
objetivo de avaliar o turnover de água em frangos de
corte durante o verão frente a suplementação com
bicarbonato de sódio e cloreto de potássio na ração.
Material e Métodos
Foram utilizados 2400 pintos machos da linhagem “Ross”, recebendo rações semelhantes até 21
dias de idade, quando se iniciaram os experimentos.
As aves foram distribuídas em boxes (1,5m x 3,2m)
com 40 aves por unidade experimental. Rações, a
base de milho e farelo de soja, com 20 % de proteína bruta, 3.200 kcal/kg EM e 0,30 % de NaCl, foram fornecidas à vontade e formuladas visando
atender as exigências nutricionais da linhagem e ao
National Research Council (NRC, 1994) para os demais nutrientes. As temperaturas médias máxima
(33,14°C) e mínima (21,61°C) e a umidade relativa
média máxima (98%) e mínima (50%) no interior do
aviário, foram obtidas das colheitas diárias, utilizando-se Ter mômetro de Bulbo Seco e
Termohigrógrafo. As aves foram suplementadas com
NaHCO3 (0,5, 1,0 e 1,5 %) ou KCl (0,5 e 1,0%) na
ração a partir de 21 ou 35 dias, até 49 dias de idade.
O delineamento foi em blocos casualisados em esquema fatorial: 2 x 3 + 1 ou 2 x 2 + 1 (idade x níveis
+ controle) para o NaHCO3 e KCl, respectivamente, com cinco repetições.
Os bebedouros foram equipados com sistema independente de abastecimento de água e os dados de
temperatura e pH da água foram colhidos três vezes
por semana, em duas leituras diárias, correspondendo
respectivamente, ao horário de menor (6:00 a 7:00) e
maior (13:00 a 14:00) temperatura ambiente. No 49º
dia foram colhidos 3ml de sangue da veia braquial
em duas aves por parcela, dessorado em centrífuga
e analisado em espectrofotometria de chama para
determinar os níveis séricos de sódio (Na) e potássio
(K). Para determinação da umidade da cama foram
coletadas três amostras eqüidistantes, de aproximadamente 500g com posterior homogeneização, compondo uma única amostra de 250g por parcela. A
determinação da matéria seca foi obtida pelo método da secagem em estufa com ventilação forçada a
55±5ºC por 72 horas e a avaliação por diferença de
peso em balança digital com precisão de um grama.
Além desses parâmetros, foram avaliados o consumo de água, relação água/ração e relação água/peso
corporal. Os resultados foram submetidos a análise
estatística segundo Banzatto & Kronka (1995) e as
médias comparadas pelo teste de Tukey (5 %).
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 31, FACIAG 02, p. 89-96, Curitiba, jun. 2002
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Sebastião A. Borges et al.
Resultados e Discussão
O consumo de água e relação água/ração (Tabelas 1 e 2) foram influenciados tanto pelo nível, quanto
pela idade de início da suplementação de NaHCO3 e
KCl na ração. Quanto maior a inclusão de NaHCO3
e KCl e mais precoce a suplementação, maior o consumo de água e a relação água/ração. A dimensão do
aumento no consumo de água promovido por estes
sais foi semelhante. Assim, o consumo de água está na
dependência direta da idade da ave (Tabelas 3 e 4) e
quantidade de sais adicionados na ração (Tabela 1 e
2), corroborando relatos de Macari (1996) e Borges et
al. (1998). Isto pode vir a ser um efeito desejável nas
criações, em locais de clima quente e/ou durante o
verão, visto que a ingestão de água é um meio auxiliar
na dissipação de calor pelas aves.
Aves com acesso à suplementação de NaHCO3 e
KCl consumiram maior quantidade de água, provavelmente para satisfazer a sede criada pelo aumento
na ingestão de Na e K, uma vez que a resistência
osmótica do sangue é um fator regulador da sede.
Belay & Teeter (1993) relataram que durante o estresse
calórico, o frango de corte consome mais água porém, aumenta a sua excreção renal, resultando em
maior volume urinário, sem alterar a relação urina formada/água ingerida.
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 31, FACIAG 02, p. 89-96, Curitiba, jun. 2002
TABELA 01 CONSUMO DE ÁGUA (AG), RELAÇÃO ÁGUA/RAÇÃO (AG/RA), UMIDADE
DA CAMA (UM), NÍVEIS SÉRICOS DE NA E K, TEMPERATURA (T) E PH EM FRANGOS DE
CORTE SUPLEMENTADOS COM NAHCO3.
Ag
(L/dia)
0,35
0,37
Controle
Fatorial
Idades
21 dias
0,38a
35 dias
0,36b
Níveis de NaHCO3 (%)
0,5
0,35b
1,0
0,37a
1,5
0,39a
CV (%)
5,24
Ag/Ra
(L/kg)
2,62
2,73
UM
(%)
35,60
39,99
Na
(mmol/L)
136
132
K
(mmol/L)
4,2
4,3
T
(ºC)
27,21
27,33
PH
7,47
7,62
2,81a
2,65b
41,54
38,45
134a
130b
4,5
4,2
27,41
27,81
7,77
7,79
2,60c
2,73b
2,87a
4,21
33,11b
42,02a
44,85a
14,10
136a
134a
128b
2,84
4,5
4,0
4,5
10,07
27,42
27,34
27,99
7,69
7,51
7,60
CV - Coeficiente de variação.
a,b
Médias seguidas de letras diferentes na coluna diferem entre si pelo teste de Tukey
(P<0,05)
O National Research Council (NRC, 1994) estabeleceu o consumo de água de 1.000, 1.250, 1.500 e
1.700 ml/ave/semana, da quarta à sétima semana,
TABELA 02 CONSUMO DE ÁGUA (AG), RELAÇÃO ÁGUA/RAÇÃO (AG/RA), UMIDADE DA
CAMA (UM), NÍVEIS SÉRICOS DE NA E K, TEMPERATURA (T) E PH EM FRANGOS DE
Ag
(L/dia)
0,33b
0,36a
Controle
Fatorial
Idades
21 dias
0,37a
35 dias
0,36b
Níveis de KCl (%)
0,5
0,36b
1,0
0,37a
CV (%)
4,43
Ag/Ra
(L/kg)
2,46b
2,64a
UM
(%)
33,55b
38,68a
Na
(mmol/L)
130,00b
135,95a
K
(mmol/L)
3,80
4,09
T
(ºC)
27,03
27,09
7,47
7,55
2,69
2,59
39,58
37,79
132,25b
139,65a
3,96
4,22
27,10
27,08
7,52
7,60
2,59
2,69
4,2
35,99b
41,38a
11,35
135,85
136,05
1,49
3,93
4,25
10,2
27,09
27,10
7,58
7,54
CV - Coeficiente de variação.
pH
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Consumo de água em frangos de corte suplementados...
TABELA 03 RELAÇÃO ÁGUA/PESO CORPORAL E CONSUMO SEMANAL DE ÁGUA EM FRANGOS DE CORTE SUPLEMENTADOS COM NAHCO3 A PARTIR DE 21 OU 35 DIAS DE IDADE*.
Período (semana)
Controle
21 dias
0,5%
1,0%
1,5%
35 dias
0,5%
1,0%
1,5%
Relação água/peso corporal (L/kg)
4
5
6
7
1,43
1,34
1,26
1,20
1,51
1,40
1,30
1,22
1,53
1,41
1,32
1,24
1,72
1,60
1,39
1,32
1,36
1,25
1,26
1,16
1,39
1,34
1,36
1,30
1,35
1,24
1,35
1,32
Consumo semanal de água (L)
4
5
6
7
1,69
2,25
2,74
3,23
1,75
2,33
2,83
3,28
1,79
2,37
2,90
3,36
2,05
2,74
3,11
3,63
1,56
2,05
2,69
3,07
1,64
2,29
3,03
3,58
1,58
2,08
2,93
3,54
* Dados observados.
respectivamente, para temperatura ambiente variando
de 20 a 25ºC. Estes valores são inferiores aos apresentados nas Tabelas 3 e 4, obtidos com temperatura
ambiente de 21,61 a 33,14ºC no interior do aviário,
mostrando que o consumo de água é dependente da
temperatura ambiente e dos ingredientes presentes na
ração.
O consumo de água aumentou com a idade das
aves porém, quanto maior ou mais pesada a ave, menor a troca de água no organismo, traduzido pela
TABELA 04 RELAÇÃO ÁGUA/PESO CORPORAL E CONSUMO SEMANAL DE ÁGUA EM FRANGOS DE CORTE SUPLEMENTADOS COM KCL A PARTIR DE 21 OU 35 DIAS DE IDADE*.
Período (semana)
Controle
21 dias
0,5%
1,0%
35 dias
0,5%
1,0%
Relação água/peso corporal (L/kg)
4
5
6
7
1,40
1,26
1,17
1,15
1,47
1,38
1,29
1,20
1,63
1,46
1,36
1,19
1,40
1,32
1,29
1,19
1,43
1,29
1,34
1,23
* Dados observados.
Consumo semanal de água (L)
4
5
6
7
1,61
2,08
2,50
3,04
1,73
2,33
2,84
3,29
1,92
2,47
3,00
3,30
1,63
2,19
2,79
3,16
1,68
2,19
2,97
3,37
redução na relação consumo de água/peso corporal
(Tabela 3 e 4). Aumentando a suplementação de
NaHCO3 e KCl, houve um aumento no turnover de
água no organismo da ave, podendo ser benéfico nos
casos de estresse calórico pois, de acordo com Branton
et al. (1986), a ingestão de água aumenta a sobrevivência das aves estressadas pelo calor. Porém, a temperatura da água não deve exceder os limites de tolerância
da ave. Há efeitos positivos do fornecimento de água
à baixas temperaturas para frangos de corte em estresse
calórico (Teeter, 1989), sendo constatado que a temperatura da água é um importante fator regulador da
temperatura corporal da ave, devendo ser fornecida
entre 20 e 24 ºC (Macari, 1996). No presente estudo, a
temperatura média (27,30 ºC) e o pH (7,64) da água
nos bebedouros, provavelmente, não interferiram nos
parâmetros avaliados.
Níveis mais elevados de suplementação de
NaHCO 3 (1,0 e 1,5%) e KCl (1,0%) foram
determinantes no aumento da umidade da cama, estando estritamente relacionados com o aumento na
ingestão de água, corroborando com Borges et al.
(1998) quando suplementaram níveis crescentes de
NaCl na ração. Os valores de umidade da cama encontrados para aves suplementadas a partir de 21 dias
e naquelas que receberam 1,0 e 1,5% de NaHCO3 e
1,0% de KCl, extrapolaram as recomendações feitas
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 31, FACIAG 02, p. 89-96, Curitiba, jun. 2002
Sebastião A. Borges et al.
para criações comerciais. Estes resultados são conseqüência direta da maior ingestão de água, pois,
nor malmente, 60 a 70% da água ingerida é
excretada (Macari, 1996).
Posto que temperaturas elevadas podem causar perda de água corporal, levando o animal à
desidratação, queda no desempenho e até mesmo
à morte, o aumento no turnover de água promovido pelo NaHCO 3 e KCl pode ser de grande relevância na manutenção do equilíbrio hídrico do
animal, sua produtividade e sobrevivência.
Os níveis séricos de K, ao contrário do Na,
não foram afetados pela inclusão de NaHCO 3 e
KCl na ração. Ait-Boulahsen et al. (1995) observaram aumento na concentração plasmática de K
quando suplementaram 0,6 e 0,9% de KCl na água
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 31, FACIAG 02, p. 89-96, Curitiba, jun. 2002
de bebida das aves. Isto sugere que a presença desses sais na ração pode interferir no equilíbrio
eletrolítico da ave, conseqüentemente no equilíbrio
ácido-básico.
Conclusões
A ingestão de água está na dependência direta da
idade da ave e da quantidade de NaHCO3 e KCl na
ração. O maior consumo de água provoca elevação
na relação água/ração. A relação água/peso corporal diminui com a idade das aves, sendo que, quanto
maior ou mais pesada a ave, menor o turnover de
água no organismo. O NaHCO3 e o KCl melhoram
o turnover de água no organismo da ave. A umidade
da cama é reflexo da ingestão de água pela ave.
95
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Consumo de água em frangos de corte suplementados...
Referências bibliográficas
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BORGES S. A.; ARIKI, J.; JERÔNIMO Jr.; R.; MARTINS, C. L.; MORAES, V. M. B. (1998). “Níveis de cloreto
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NATIONAL RESEARCH COUNCIL. (1994). Nutrient requirements of poultry. Washington: National Academy
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SIMPÓSIO TÉCNICO PLANALQUÍMICA. Anais... São Paulo. pp.17-40.
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 31, FACIAG 02, p. 89-96, Curitiba, jun. 2002
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