Caros Membros da Academia da Universidade da Madeira,
É com grande contentamento que a Universidade da Madeira celebra,
hoje, a chegada dos seus novos alunos mas, também, a partida de tantos
outros. Quer uns quer outros têm em si, como diz o poeta, “todos os sonhos do
mundo”. Se os primeiros, qual aves que voam pela manhã, chegam trazendo
consigo a agitação do grande sonho da descoberta, os segundos, qual aves do
crepúsculo, partem com a serenidade do caminho percorrido, com o
desassossego pela vontade da partilha e o desejo de voar alto, muito mais alto,
por rotas que, todavia, desconhecidas conjecturam existir.
A nós cabe-nos a missão de alimentar o sonho quer de uns quer de
outros acolhendo, calorosamente, no nosso seio os primeiros, e esperando o
regresso dos segundos. De ambos, cremos ser companheiros na descoberta
daquilo que todos, afinal, necessitamos, usando a expressão de Derrida, para
“aprendermos a viver”.
No seu reduto último é nisto que consiste a nobre e maior missão da
Universidade, a de, construindo-se e organizando-se em torno do aluno,
satisfazer-lhe não apenas as necessidades de conhecimento como, também,
fornecendo-lhe instrumentos e desenvolvendo nele as competências de que
necessita para “saber viver”. Esta ideia essencial é uma das que perfilho com
Ortega Y Gasset no que se refere à Missão da Universidade. A propósito refere
o pensador que: “O principio de economia não sugere apenas que a tarefa
seja a de economizar, poupar nas matérias ensinadas senão que implica
igualmente que na organização do ensino superior, na construção da
Universidade há que partir do estudante, não do saber nem do professor. A
Universidade deve ser a projecção institucional do estudante, cujas duas
dimensões essenciais são: uma, o que ele é: a escassez da sua faculdade
aquisitiva de saber; outra, o que ele necessita para saber viver.”
Esta forma de entender a Universidade não é nada mais nada menos do
que aquela que presidiu ao espírito do processo Bolonha mediante o qual se
operou a grande mudança no seio da Universidade Portuguesa – a de
centraçao efectiva do processo ensino/aprendizagem no aluno. Esta importante
sinalização simboliza que a Universidade mais do que um local de chegada e
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despedida deve ser entendida cada vez mais como um local de chegada e de
permanência dada a necessidade,
contemporaneamente, da formação ao
longo da vida.
O grande passo da centração no aluno foi já dado pela nossa
Universidade com a quase totalidade dos seus cursos adaptados a Bolonha.
Contudo, não basta sinalizar é necessário que este espírito de Bolonha – de
focalização nas aprendizagens mais do que na transmissão de conhecimentos
- se efective e ganhe concretude. Pensamos estar à altura da mudança e
esperamos que ela vá ganhando forma na vida do dia-a-dia da Universidade.
Seria, de facto, uma pena se a Universidade Portuguesa, e nomeadamente, a
nossa não ganhasse este desafio e volvidos uns anos viéssemos a concluir terse tratado de uma mera operação estética. Acreditamos que não! Contudo, não
basta acreditar é necessário que cada um de nós se torne co-responsável na
efectivação do que é esta nova Universidade perspectivada a partir do
processo de Bolonha. A concretização desta mudança paradigmática a todos,
quer professores quer alunos, traz a necessidade de sermos inabaláveis nas
nossas exigências pois que,
só deste encontro resulta a
satisfação pela
melhoria constantemente aspirada. Como já tive a oportunidade de referir e,
uma vez mais sublinho esta rotação do ensino/aprendizagem enfatizando a
centralidade do aluno no processo de construção do conhecimento impõe não
só à Universidade a obrigação de caminhar no sentido de garantir a excelência
e qualidade do ensino prestado como, também, estimula o aluno a,
legitimamente, tornar-se mais exigente quer com a Universidade e com os
diversos actores que a integram (Docentes, não Docentes e Administração)
quer consigo próprio.
Da nossa parte temos vindo a fazer um esforço significativo, nos últimos
anos, tanto na qualificação do corpo docente da UMa que se tem traduzido, por
exemplo, no aumento do número de docentes doutorados que este ano já
ultrapassa os 60% e para 2008 prevemos que ultrapasse os 70%, como nos
apoios à área de investigação e desenvolvimento expresso na criação de
importantes incentivos à investigação bem como no incremento/ aumento da
produção cientifica seja pelo desenvolvimento de projectos de investigação
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seja pelo número de publicações em revistas cientificas nacionais e
internacionais de referência.
Reitero a afirmação de que o caminho da Universidade deve ser o da
aposta na excelência e na qualidade e nestas uma dimensão se revela
fundamental, a da investigação científica em todas as áreas e valências
abarcadas pela Universidade da Madeira, sem excepção!
Se a Universidade deve, na sua missão primeira, como já o entendia
Ortega y Gasset, preparar para o “aprender a saber viver” essa preparação
será, a meu ver, tão ou mais conseguida quanto maior for o diálogo entre a
investigação científica e o ensino-aprendizagem.
Num mundo complexificado e global é crescente a necessidade de
fomentar nos alunos uma atitude investigativa que releve do próprio exercício
da investigação. Mais do que preparar os alunos para se constituírem como
receptáculos de cultura é exigido cada vez mais às Universidades que os
ajudem na aquisição de competências fornecendo-lhes instrumentos que lhes
permitam resolver os problemas e responder aos desafios, de modo criativo e
inovador, que a contemporaneidade a todos lança.
Ora, preparar os alunos para estas novas exigências e, de acordo com o
espírito de Bolonha, significa prepará-los para desenvolverem uma atitude
investigativa e para que isso ocorra é necessário que a investigação
interpenetre, efectivamente, as nossas práticas pedagógicas e que esses
fluxos e diálogos sejam uma realidade. Para que tal aconteça é necessário que
aspiremos a ter os melhores professores / investigadores. Aliás, essa é a tónica
ao desejar-se uma Universidade de qualidade e credibilizada pois que, entre
outros factores a qualidade de uma Universidade também se avalia pela
qualidade dos currículos dos seus professores/investigadores.
Estas reflexões são tão ou mais importantes num momento em que às
Universidades Públicas Portuguesas é colocado outro desafio que se prende
com a reflexão acerca da organização interna que cada uma pretende. A meu
ver a Universidade, em geral, e, em particular, a Universidade da Madeira deve
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pensar o seu futuro sem recear colocar, com toda a clareza, questões da
natureza daqueles que acima coloquei pois, só desse modo estará apta a estar
à altura dos desafios que se lhe colocam ao aspirar ser uma pequena/grande
Universidade de Investigação com reconhecimento global. Claro que a tarefa é
tudo menos fácil e exige desde logo que a qualidade seja, verdadeiramente,
uma aspiração de todos e de cada um. Para tal é necessário que mais do que
o receio da comparação intra e inter-pares a Universidade tenha maturidade
para distinguir e reconhecer o capital intelectual-cientifico que possui, em toda
a sua diversidade. Felizmente contamos na nossa Universidade com muitos
bons professores/ investigadores. Saibamos dar-lhes as condições para que
permaneçam no nosso seio. Ao contrário da tendência que, por vezes, subsiste
num Portugal subterrâneo, em teimar não criar estruturas capazes de atrair e
manter os melhores professores/investigadores, a Universidade da Madeira
deve ter a coragem de reconhecer os melhores, de ter a ousadia de aspirar a
possuir os melhores e de lhes dar condições para que o continuem a ser sem
que tal signifique, forçosamente, a exclusão dos que possam não estar entre
estes. Reconhecer que há quem possa não se enquadrar neste perfil não
significa afirmar que não seja igualmente válido à Instituição mas, tão somente
sublinhar a necessidade de reconhecer-se a diversidade no momento de
construir uma Universidade para figurar entre as melhores.
A este propósito, permitam-me que convosco partilhe o privilégio que
desde sempre tive em ter feito a minha formação, enquanto estudante, em
Instituições que me ensinaram a reconhecer a diversidade porque também
souberam acolher e criar condições de atractividade para que os melhores
professores /investigadores permanecessem no seu seio pois que, da sua
presença não beneficiaram apenas essas Instituições que os acolheram como,
também, a comunidade sob as quais o derrame de ter uma boa Universidade
se fez sentir. Neste âmbito, possuo memórias muito felizes que me foram
avivadas, muito recentemente, ao ter tido a noticia que um dos meus
Professores da Universidade de Minnesota, o Professor Leonid Hurwicz,
recebeu o prémio Nobel de Economia conjuntamente com mais dois colegas
(Eric S. Maskin, Institute for Advanced Study, Princeton, NJ, USA e Roger B.
Myerson, University of Chicago, IL, USA).
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Porque do seu testemunho e do da comunidade que o acolheu podemos
retirar uma importante aprendizagem no momento de nos repensarmos e
reforçamos como Universidade peço a vossa atenção para este laureado, o
mais velho da história dos prémio Nobel, que com 90 anos recebeu tão
merecida notícia.
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Aqui temos, pois, um Professor que por mais de 30 anos se esperava
viesse a receber este alto galardão e que na altura em que o recebe, na
humildade que sempre o caracterizou, diz que a única razão pela qual a
distinção lhe foi atribuída e a outros não se subsume ao facto de ter vivido mais
anos.
Este Professor que nunca esqueceu o modo como em 1939 os
Portugueses o trataram quando emigrou para a América via Portugal,
escapando deste modo ao triste destino da maioria dos judeus.
Ele esteve sempre entre os melhores, a sua Instituição sabia-o e soube
reconhece-lo e acolhe-lo. Da sua permanência ganhou não apenas a
Universidade como ganharam, também, todos os cidadãos desse Estado ao
poderem-se orgulhar da atribuição deste Nobel a um dos seus Professores,
como salienta no vídeo o Presidente da Universidade.
É, pois, nosso maior desejo que seja assim na Madeira com os membros
da Academia a terem muitos sucessos e que todos nós celebremos com eles o
nosso orgulho. Mas, para que isso seja uma realidade precisamos que, todos
vós, nos ajudem a sermos melhores através do conhecimento e da vossa
reflexão crítica sobre o vosso processo de ensino/aprendizagem.
Este apelo não se consubstancia à academia mas, é extensível ao meio
envolvente, o qual pode possuir a legitima aspiração e exigir à sua
Universidade que não só possua os melhores como deseje figurar entre as
melhores e mais reconhecidas Instituições.
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Ao longo destes últimos anos tem sido crescente o apoio à Universidade
por parte da sociedade madeirense e temos assistido, com agrado, a um salto
qualitativo na percepção não só do papel como da importância da mesma no
desenvolvimento da Região. E esse é um contributo a que a Universidade não
pode nem se deve furtar. Para que tal se concretize cada vez mais, é vital que
a Região continue a apoiar a sua Universidade e a sinta, cada vez mais, sua
com todos os direitos e deveres. Foi com base neste pensamento que fui
desde sempre um defensor que a comunidade envolvente deve participar da
vida da Universidade e nela ter representação pois que, sou da opinião de que
nem tudo pode ser dirigido por um centralismo cego que tem levado a que
injustificadamente, por exemplo, a Universidade da Madeira tenha assistido nos
últimos anos a um corte no seu financiamento. O baixo financiamento da
Universidade continua a ser uma das nossas grandes preocupações e tudo
faremos para continuar a aumentar a qualidade que já atingimos e que pode
ser constatada nos indicadores de qualidade utilizados na fórmula de
financiamento apesar de todas as reservas que mantemos quanto a esta.
Mas não basta à Universidade da Madeira ter o apoio da sociedade
envolvente. É necessário que, num exercício de maturidade, toda a
comunidade académica saiba igualmente amar a sua Universidade e agregarse em torno daquilo que é a primeira e essencial missão desta e que assim
sendo todos, independentemente dos encontros e desencontros de ideias, das
convergências e divergências de posições, aprendam a celebrar conjuntamente
os dias importantes para esta Instituição. É, esta postura de maturidade que a
sociedade espera da academia. Não basta publicamente sustentarmos
querermos o melhor para a nossa Universidade é necessário, também, com ela
sabermos celebrar, independentemente da legitimidade da possível divergência
de posições que cada um de nós possa ter quanto ao seu rumo e papel. Já o
afirmei anteriormente e, reafirmo-o, há que sabermos acolher e atrair os
melhores sabendo porém, que mais do que os protagonismos individuais urge
que a UMa seja a protagonista maior da sua própria história.
Para que assim seja todos somos necessários e o vosso contributo é
deveras importante para avançarmos. Por isso, desejo aos mais de trezentos
que partem os votos dos maiores sucessos e realizações pessoais. Sabemos
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que somos parte das vossas vidas pese embora a necessidades que tendes
em partir pois que, como diz Eugénio de Andrade:
“…a noite é enorme
e todo o meu corpo cresceu...
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas...
Aos quase três mil que ficam, aos mais de 680 novos alunos, sejam bem
vindos, espero que a nossa Universidade seja já parte importante das vossas
vidas e que consiga fazer que as palavras Sophia de Mello Breyner em vós
ressoem :
“Sinto que hoje novamente embarco
Para as grandes aventuras,
(…)
As minhas mãos estão cheias
De expectativa e de segredos
Como os negros arvoredos
Que baloiçam na noite murmurando.
Ao longe por mim oiço chamando
A voz das coisas que eu sei amar.
E de novo caminho para o mar.”
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A toda Academia da Universidade da Madeira, todos os alunos,
professores, investigadores e funcionários desejo um ano lectivo 2007/2008
cheio de sucessos académicos e pessoais.
A todos os nossos amigos o nosso Muito Obrigado!
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Abertura Solene das Aulas