XLV CONGRESSO DA SOBER
"Conhecimentos para Agricultura do Futuro"
METODOLOGIA DAS ESCALAS GEOGRÁFICAS DE PODER E GESTÃO
APLICADA AOS ESTUDOS DE DESENVOLVIMENTO EM QUATRO
TERRITÓRIOS RURAIS
ALDOMAR ARNALDO RÜCKERT (1) ; ANELISE GRACIELE RAMBO (2) .
1.PROGRAMA
DE
PÓS-GRADUAÇÃO
EM
GEOGRAFIA
E
EM
DESENVOLVIMENTO RURAL - UFRGS, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL;
2.PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO RURAL PGDR/UFRGS, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL.
[email protected]
APRESENTAÇÃO ORAL
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL E RURALIDADE
METODOLOGIA DAS ESCALAS GEOGRÁFICAS DE PODER E
GESTÃO APLICADA AOS ESTUDOS DE DESENVOLVIMENTO EM
QUATRO TERRITÓRIOS RURAIS1
Grupo de Pesquisa: Desenvolvimento Territorial e Ruralidade
Resumo
O presente artigo resulta de um projeto de pesquisa realizado por um grupo
multidisciplinar, composto por pesquisadores das áreas de Geografia, Agronomia,
Economia, e Sociologia para atender a uma demanda da Secretaria de Desenvolvimento
Territorial (SDT) do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Dentre outros
objetivos, a pesquisa visou representar as diferentes escalas de atuação dos atores nos
territórios como ferramentas para o planejamento das dinâmicas territoriais. Nesse sentido,
apresenta-se aqui as escalas de atuação dos atores em quatro projetos desenvolvidos nos
territórios rurais e analisados ao longo da referida pesquisa. Tratar-se-á portanto, da
Cooperativa Regional de Agricultura Camponesa (CORAC), Seberi, Médio Alto
Uruguai/RS; do Sistema de Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar (SISCLAF),
Francisco Beltrão, Sudoeste do Paraná/PR; do Centro de Formação da Agricultura Familiar
São José Operário (CENTAF), Silvânia, Estrada de Ferro/GO e Associação Frutivale,
1
Este artigo é resultado do projeto de pesquisa “Avaliação do Desenvolvimento Territorial em Quatro
Territórios Rurais – Brasil”, realizado sob demanda da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), do
Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), financiado pelo Instituto Interamericano de Cooperação
para a Agricultura (IICA). Registra-se ainda agradecimentos aos professores doutores Sérgio Schneider,
Eduardo Filippi, PauloWaquil, aos pós-graduandos Suzimari Specht, Marcelo Conterato, Guilherme
Radomsky e a economista Eliane Sanguiné da Silva que também fizeram parte da equipe.
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Londrina, 22 a 25 de julho de 2007,
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Datas, Vale do Jequitinhonha/MG. Entende-se que a metodologia das escalas geográficas
de poder e gestão, aplicada aos estudos de desenvolvimento territorial, permite uma
compreensão mais clara de como os territórios são geridos e quem são estes atores que
interagem no processo de desenvolvimento. A partir disso, é possível observar-se as
potencialidades e debilidades do território. Estas podem ser incrementadas ou reduzidas
respectivamente, de modo a favorecer os processos de desenvolvimento territorial. A
metodologia pode, portanto, servir como uma ferramenta para o planejamento das ações e
dinâmicas territoriais.
Palavras-chaves: desenvolvimento territorial local/regional – escalas geográficas de poder
e gestão - densidade institucional
Abstract
The present article results of a research project developed by a multidiscipline group,
composed of Geography, Agronomy, Economy, and Sociology researchers aimed to do
deal with a demand of the Secretaria do Desenvolvimento Territorial (SDT) of Ministério
do Desenvolvimento Agrário (MDA). Amongst other objectives, the research aimed to
represent the different scales of action of actors in the territories as tools for planning of
territorial dynamic. In this direction, we present here the scales of action of actors in four
projects developed in the rural territories and analyzed in this research. We will be treat, of
the Cooperativa Regional de Agricultura Camponesa (CORAC), Seberi, Médio Alto
Uruguai/RS; Sistema de Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar (SISCLAF),
Francisco Beltrão, Sudoeste do Paraná/PR; Centro de Formação da Agricultura Familiar
São José Operário (CENTAF), Silvânia, Estrada de Ferro/GO e Associação Frutivale,
Datas, Vale do Jequitinhonha/MG. We understand that the methodology of power and
management geographic scales, applied to studies of territorial development, allows a
clearer understanding of how the territories are managed and who are these actors who
interact in the development process. This allows to observe the potentialities and weakness
of the territory. These can be developed or be reduced respectively, in order to favor the
territorial development processes. It may therefore serve as a tool for planning of
territorial actions and dynamic.
Key Words: local/regional territorial development power and management geographic
scales - collective territorial innovation - institutional thickness
1 A CONTRIBUIÇÃO DA METODOLOGIA DAS ESCALAS PARA OS
PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
A metodologia das escalas geográficas de poder e gestão caracteriza um recurso
metodológico o qual permite observar como os atores locais/regionais – sociedade civil,
Estado e mercado – articulam-se entre si e com as demais escalas de poder e gestão, com
vistas à promoção do desenvolvimento de seu território. Considerar-se a existência de
diferentes escalas atuantes em determinado território, possibilita a compreensão da
densidade e da complexidade oriunda da multiplicidade de poderes neles existentes e
atuantes.
Racine; Raffestin; Ruffy (1983) tratam à escala como um filtro que preserva o que é
pertinente em relação ao objeto de estudo, permitindo sua compreensão. Castro (1995), por
sua vez, afirma que a escala geográfica pode ser considerada como um artifício analítico
que dá visibilidade ao real. Porém, vale ressaltar que uma escala não pode ser vista
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isoladamente de seu entorno, pois perde seu poder explicativo. Ou seja, o recorte espacial a
ser analisado estará sempre relacionado com seu entorno, com as demais escalas.
O processo de desenvolvimento territorial local ou local/regional2, não pode ser
entendido simplesmente como uma resposta endógena aos problemas exógenos. Segundo
Acselrad (2002), a dinâmica do desenvolvimento territorial de escala local se dá pela
combinação de fatores em escalas variadas. Não há um poder econômico estruturalmente
local, privado ou público, mas dimensões locais de um poder que se constrói na hierarquia
dos tomadores de decisão.
Com base no acima mencionado, a densidade institucional assume grande
importância, pois reunindo diversos atores – públicos e privados, individuais e coletivos –
torna-se possível elencar as demandas bem como as potencialidades do território, e assim,
de forma coletiva, realizar ações com características de inovação territorial, promovendo
processos de desenvolvimento.
É importante mencionar que a metodologia das escalas ganha relevância em razão
da multidimensionalidade do poder resultante da descentralização político-administrativa
do Estado ocorrida no Brasil a partir dos anos oitenta. Nesse sentido, diferentes atores Estado, sociedade civil e mercado – de diferentes escalas, agem sobre o território, ora
estabelecendo relações conflituosas, ora de sinergia.
Entende-se que considerar estas relações e estes atores torna-se um requisito
essencial para a compreensão dos processos de desenvolvimento territorial, pois, quando se
retorna à análise das relações de poder, o território volta a ser importante, não apenas como
espaço próprio do Estado-Nação, mas sim dos diferentes atores sociais. O território é um
produto produzido pela prática social, e também um produto consumido, vivido e utilizado
(BECKER, 1983). Ou ainda, o território é produto dos atores sociais, do Estado ao
indivíduo, passando por todas as organizações, pequenas ou grandes (RAFESTTIN, 1993).
Com base no que foi mencionado, entende-se que, ao falar em desenvolvimento
territorial, está se tratando de ações, mecanismos, estratégias e políticas endógenas e
exógenas, desencadeadas por atores locais/regionais em interação com as demais escalas
de poder e gestão, reforçando e constituindo territórios por meio de novos usos políticos e
econômicos. Inclui o desenvolvimento das potencialidades locais/regional (ambientais,
humanas, econômicas), o que torna os atores mais ativos na intervenção e ação sobre seu
território, refletindo-se no desencadeamento de processos de desenvolvimento territorial.
Uma contribuição importante é a que traz Boisier (1995), quando define o
desenvolvimento territorial como uma expressão ampla que inclui o desenvolvimento de
comunidades, províncias ou regiões. O conceito refere-se a processos de mudança sócioeconômica, de caráter estrutural, delimitados geograficamente e inseridos num marco
configurado por sistemas econômicos de mercado, ampla abertura externa e
descentralização dos sistemas de decisão. Ou seja, a organização coletiva dos atores
locais/regionais, buscando ações, mecanismos, práticas e políticas que visam o
desenvolvimento de seu território. Nesse sentido o desenvolvimento territorial não se
restringe ao crescimento econômico, mas consiste na articulação dos atores em atender
também suas demandas e necessidades sociais, culturais e ambientais.
2
Para observar a interação entre atores, é possível acrescentar ao territorial a escala local/regional. A priori,
entende-se como desnecessário tal adjetivo, em função do territorial opor-se ao global, e estar subentendida
uma dimensão mais local. Porém à medida que se utiliza o recurso metodológico das escalas geográficas de
poder e gestão, adota-se “desenvolvimento territorial local/regional” para tornar perceptível a interação dos
atores ou dos poderes locais/regionais com as demais escalas de poder e gestão.
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Por sua vez, para que o desencadeamento de um processo de desenvolvimento
territorial seja possível, entende-se ser importante estimular a inovação territorial coletiva,
entendida aqui como a capacidade de gerar e incorporar conhecimentos para dar respostas
criativas aos problemas do presente, não só em termos de crescimento econômico, mas
numa perspectiva integrada (MÉNDEZ, 2002).
Ao lado da inovação territorial coletiva, assume importância a densidade
institucional. Segundo Fernandéz (2004), esta caracteriza uma sólida presença institucional
(firmas, associações empresariais, instituições financeiras, ONGs, agências de
desenvolvimento, escolas, centros de serviço, institutos tecnológicos e universidades, etc);
bem como o desenvolvimento de formas de cooperação que gerem uma consciência de
pertença a uma dinâmica territorial e ao padrão de coalizão representativo dos interesses
locais.
Dessa forma, entende-se que os processos de desenvolvimento territoriais têm
maiores probabilidades de êxito na medida em que os atores locais/regionais, representados
tanto pela sociedade civil, quanto pelo Estado e pelo mercado, buscam estabelecer
ações/projetos/programas, voltados à inovação territorial coletiva e à densidade
institucional. Ou seja, inovações construídas de forma coletiva, com base nas
potencialidades do território, em interação com as demais escalas de poder e gestão.
Pelo que foi mencionado, pode-se considerar que os processos de desenvolvimento
territorial local/regional, embora possam apresentar um protagonismo dos atores
locais/regionais quanto ao exercício de poder e gestão sobre seus territórios, não se
mantém isolados dos atores das demais escalas. As ações territoriais provavelmente não
teriam o mesmo êxito ou resultado se praticadas de forma isolada e individual.
Por sua vez, a definição das escalas geográficas de poder e gestão se dá com base
em dois critérios: divisões político-administrativas e escalas não institucionalizadas,
resultantes da ação ou da gestão dos atores locais/regionais sobre o território. O primeiro,
refere-se às divisões político-administrativas existentes, referentes ao âmbito municipal,
microrregional, estadual, nacional. O segundo, a escalas de gestão em âmbitos locais e/ou
regionais, as quais são definidas pela própria atuação dos atores locais/regionais sobre o
território, levando a novos usos políticos e econômicos que tenham reflexos/implicações
no desenvolvimento dos territórios rurais.
A identificação da presença das diversas escalas de poder e gestão nos territórios
rurais se deu mediante a aplicação de entrevistas com um roteiro semi-estruturado a
lideranças de projetos de desenvolvimento. Estes projetos representam à idéia-guia que
perpassa as ações no território, estando em geral, relacionada às potencialidades
locais/regionais de desenvolvimento.
Para tanto foram levantadas informações sobre as diversas fontes de recursos
presentes no território e como estes atores e recursos se fazem presentes em ações de
desenvolvimento territorial. Com base nessas informações, encontrou-se as seguintes
escalas presentes nos territórios rurais, sendo as duas primeiras institucionalizadas e outras
definidas pela ação dos atores locais/regionais:
1. Escala Nacional: correspondente aos atores que possuem atuação no âmbito
nacional;
2. Escala Estadual: referente aos atores do estado da federação de cada território
pesquisado;
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3. Escala Regional: referente aos atores de cada território rural pesquisado3;
4. Escala Local/Regional: referente aos atores com atuação na área de abrangência
dos arranjos institucionais que coordenaram os projetos pesquisados.
Além das escalas, os atores foram classificados ainda enquanto Estado, sociedade
civil e mercado. Ao tomar-se por base as concepções de Bobbio (1986), por sociedade civil
entende-se a esfera das relações sociais não reguladas pelo Estado e este, como o conjunto
dos aparatos que um sistema social organizado exerce o poder coativo. A sociedade civil
seria o lugar onde se desenvolvem os conflitos econômicos, ideológicos, religiosos, que as
instituições estatais têm o dever de resolver.
Observa-se que Bobbio não trata do mercado enquanto ator distinto da sociedade
civil. Segundo sua concepção, o que não se enquadra no âmbito do Estado, refere-se a
sociedade civil. Porém, nesta análise, opta-se por entender o mercado como um ator
distinto. Enquanto que a este cabem os atores cujos objetivos centram-se na obtenção do
lucro para seus proprietários/acionistas, à sociedade civil seria formada por aqueles
movimentos de cunho e objetivos coletivos e sociais. Afinal, os objetivos que movem cada
um dois atores, se não são opostos, no mínimo, seguem rumos distintos.
Sendo assim, os atores representantes do Estado referem-se a secretarias,
ministérios e órgãos do governo, universidades públicas, empresas estatais, autarquias,
financiamentos internacionais públicos (Banco Mundial, BID, FAO, UNICEF, etc). Os
atores representantes da sociedade civil são sindicatos, associações, cooperativas,
representações de classe, fóruns e consórcios de desenvolvimento, ONGs, escolas,
universidades comunitárias, confessionais, filantrópicas. Por sua vez, os atores
representantes do mercado referem-se a empresas locais, nacionais e multinacionais,
capital financeiro como bolsas de valores etc.
Por conseguinte, para mensurar a densidade institucional, da qual se tratou acima,
se tomou por base à interação de atores e escalas em torno dos arranjos institucionais e
projetos desenvolvidos nos territórios, como apresenta a tabela abaixo:
Níveis
4
3
2
1
Tabela 01. Níveis de Densidade Institucional
PODERES ATUANTES JUNTO AOS ARRANJOS/PROJETOS
Poder apenas das instituições/organizações civis/profissionais e/ou empresariais
Poder municipal e instituições/organizações civis/profissionais e/ou empresariais.
Poder estadual e instituições/organizações civis/profissionais e/ou empresariais.
Poder federal, estadual e local, instituições/organizações civis/profissionais e/ou empresariais
e/ou estrangeiras.
Fonte: Rückert (2001); Rambo (2006).
Sendo assim, quanto mais próximo ao nível 01, maior a densidade de atores
presentes nos arranjos ou projetos e maior tendem ser as transformações territoriais por
eles gerados.
Para que se possa melhor visualizar essa densidade institucional, será apresentado
um mapa institucional4 (BOISIER, 1997) referente a cada arranjo ou projeto estudado.
Este mapa ilustra quais são os atores presentes, além de ser possível apresentar quais os
3
Neste sentido, a Estrada de Ferro (GO) representa uma exceção. O território corresponde à escala
local/regional e não regional, sendo que esta última não pôde ser definida. Isso se deu em virtude da
generalização das informações sobre os atores (ex. sindicatos, associações, secretarias da região).
4
O mapa institucional, vem neste trabalho, representado através de uma figura/organograma, devido a
impossibilidade de o fazer na forma cartográfica. Os atores que o compõem a densidade estão localizados em
escalas distintas, partindo da local até a nacional.
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procedimentos utilizados pelas diferentes atores e quais os recursos - materiais, naturais,
financeiros, humanos, de conhecimento, etc. - com que conta cada caso analisado.
Com base nas considerações feitas acima, a seguir, serão apresentados os arranjos
e projetos analisados com base na metodologia das escalas geográficas de poder e gestão.
1.1 CORAC – Cooperativa Regional de Agricultura Camponesa, Seberi – Médio Alto
Uruguai/RS
No território rural Médio Alto Uruguai há uma certa unicidade de que as ações e
projetos de desenvolvimento devem apoiar os processos de organização e capacitação dos
agricultores para qualificação e (re) estruturação das agroindústrias familiares, associada à
abertura de canais de comercialização para os produtos da agricultura familiar.
Nesse sentido, o projeto que melhor territorializa a idéia-guia em torno do
desenvolvimento daquele território, compõe o PAA - Programa de Aquisição de
Alimentos, através dos projetos desenvolvidos naquele território: Compra Direta com
Doação Simultânea e Compra e Distribuição de Cestas de Alimentos. O PAA é proposto
pelo Governo Federal através do MDA/SAF. Por sua vez, na escala local/regional, a
CORAC, localizada no município de Seberi, tem coordenado estes projetos.
A execução das ações no território, de modo geral, está centralizada na CORAC.
Este arranjo está ligado a outro importante arranjo, qual seja, a Rede de Comercialização
Solidária, do qual, a CORAC é entidade responsável pela administração.
A Rede de Comercialização Solidária congrega 14 cooperativas integrantes do
Colegiado de Desenvolvimento Territorial (CODETER). Uma das principais funções da
Rede é a de agilizar a troca e a comercialização dos produtos da agricultura familiar, uma
demanda apontada pela idéia-guia.
A CORAC, em razão de administrar o PAA na escala local/regional, recorre à
Rede de Comercialização quando lhe falta algum produto que compõe a cesta de
alimentos. Desta maneira, está se constituindo uma rede de comercialização de produtos da
agricultura familiar.
O PAA, como já é possível constatar, foi uma das formas encontradas pelos atores
locais/regionais, em parceria com o Estado, de atender a uma demanda da agricultura
familiar daquele território – a abertura de novos canais de comercialização além do
conseqüente fortalecimento de agroindústrias. Vale ressaltar que apenas cinco municípios
da CORAC não são atendidos pelos projetos. Outros cinco estão em fase de incorporação.
Um deles, Frederico Westphalen, embora não pertença à CORAC nem ao Território do
Médio Alto Uruguai, também é beneficiado.
O PAA foi criado, em 2003, pelo Governo Federal, com o objetivo de incentivar a
agricultura familiar, compreendendo ações vinculadas à distribuição de produtos
agropecuários para pessoas em situação de insegurança alimentar e à formação de estoques
estratégicos. Na escala local/regional, os projetos do PAA foram implementados tendo em
vista os níveis de pobreza do território, além da dependência dos agricultores familiares em
relação às grandes empresas. O Programa, que teve vigência durante o ano de 2006,
garantiu aos agricultores uma renda mínima mensal, possibilitando a agregação de valor à
produção, além de significar, conforme os próprios agricultores, um novo horizonte em
relação à autonomia e auto-estima das famílias.
A realização dos projetos do PAA acabou gerando uma considerável rede de
interação entre atores na escala local/regional. Por outro lado, pode-se observar que há dois
grupos de beneficiados diretos pelos projetos. Os agricultores familiares, que produzem os
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produtos que irão compor a cesta, o que acaba lhes proporcionando, como mencionado
acima, uma renda mínima mensal, a diversificação da produção e das fontes de renda além
da agregação de valor a produção. O segundo grupo corresponde às famílias carentes, às
escolas e hospitais que recebem as cestas.
No caso dos projetos desenvolvidos dentro do âmbito do PAA pela CORAC, a
densidade institucional é de nível 01, porém com um diferencial, possui apenas atores da
sociedade civil e do Estado, da escala local/regional e nacional.
Esta característica acaba sendo uma particularidade do projeto, se comparado aos
demais analisados neste artigo. A priori, a menor diversidade de atores e escalas, parece
não interferir nos resultados esperados. Porém, a longo prazo pode representar um
obstáculo à permanência e continuidade deste canal de comercialização da agricultura
familiar, uma demanda essencial a ser atendida no território do Médio Alto Uruguai, como
aponta a idéia-guia.
Pelo mapa a seguir apresentado, observa-se o predomínio da sociedade civil,
representando 85% dos atores envolvidos, permanecendo o Estado com 15%. Por sua vez,
a escala local/regional representa 80% dos atores. Isso demonstra que esta escala possui
uma relativa capacidade de organização e mobilização em torno de suas demandas, o que
acaba contribuindo para que as políticas públicas de escalas exógenas gerem
transformações territoriais mais significativas no território. Porém essa capacidade de
mobilização local/regional poderia ser potencializada na medida em que integrar atores do
Estado e do mercado, de todas as escalas.
Figura 01. Mapa Institucional da CORAC - Seberi – Médio Alto Uruguai/RS
Fonte: Elaborado com base nas entrevistas, dez/2006.
Os atores apontados no mapa institucional desempenham diferentes funções nos
projetos do PAA. A CORAC é o ator central, pois coordena o projeto na escala
local/regional. Esta cooperativa realiza as articulações da escala local/regional com a
nacional (governo federal/CONAB).
Sendo assim a CORAC é responsável pela organização da produção e
recebimento dos produtos que irão compor as cestas. Em seguida, efetua a distribuição
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destas para as entidades parceiras, as quais as repassam para o público alvo final: as
famílias de baixa renda, escolas e hospitais.
Estas entidades parceiras, da sociedade civil, ao distribuírem as cestas, acabam
comprometendo estas famílias cadastradas no programa, a alguma contra-partida, sendo
esta referente a atividades de “animação social”, tais como: atividades culturais e
educacionais, incentivando a permanência de jovens e adolescentes nas escolas;
atendimento das crianças com necessidades especiais; trabalhos voluntários em hospitais;
organização de festas beneficentes; estudos de alternativas de alimentação e moradia para
as famílias em situação de fragilidade social; atividades de acompanhamento de jovens;
trabalhos em grupo voltados ao artesanato.
O MDA teve sua participação através da disponibilização dos recursos financeiros
para a compra dos produtos dos agricultores familiares. No ano de 2006, estavam alocados
pelo MDA/SAF, R$ 130 milhões (SAF, 2006) ao PAA. Deste valor, 1,95% destinaram-se
ao território do Médio Alto Uruguai, o que corresponde a R$ 2.539.410,71. Estes recursos
destinaram-se principalmente ao pagamento dos agricultores fornecedores de produtos,
recolhimento e distribuição dos produtos, pagamento dos funcionários da CORAC
envolvidos nestes serviços.
A respeito dos projetos descritos acima pode-se ressaltar algumas
particularidades. O mesmo tempo em que beneficia o espaço rural, através da compra de
produtos da agricultura familiar, este acaba beneficiando também o espaço urbano. Este
último sob duas formas: a primeira através do fornecimento das cestas às famílias carentes
e a escolas e hospitais e a segunda forma, através das atividades de animação social,
desenvolvidas pelos atores parceiros. Estes resultados são possíveis apenas na medida em
que há uma densidade institucional em torno deste programa federal.
Porém, entende-se ser pertinente ressaltar novamente a necessidade da construção
de novos canais de comercialização para os produtos da agricultura familiar. Isso se torna
necessário, principalmente em razão deste processo depender da renovação dos projetos
com o MDA/SAF. Uma vez não renovados, os agricultores acabam correndo o risco de
perder esta fonte de renda, o que significaria um retrocesso dentro do que estabelece a
idéia-guia.
Para tal, torna-se importante, aumentar a diversidade de atores envolvidos. Buscar
novos postos de comercialização que envolvam atores do mercado, reduzindo a
dependência de programas governamentais; buscar programas de aquisição de alimentos
semelhantes, ampliar a participação de agricultores, a variedade de produtos e os canais de
comercialização, além do público que recebe as cestas ou adquire os produtos da
agricultura familiar.
1.2 SISCLAF - Cooperativa Central de Leite da Agricultura Familiar com Interação
Solidária – Francisco Beltrão, Sudoeste do Paraná
O SISCLAF é o projeto do território que melhor territorializa a idéia-guia no
Sudoeste do Paraná. De acordo com o Plano Territorial de Desenvolvimento Rural
Sustentável (PTDRS), as idéias de sustentabilidade e protagonismo das populações do
campo perpassam as discussões e ações no território.
O SISCLAF é composto por vinte e três cooperativas singulares, as CLAFs
(Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar), e abrange vinte e três municípios do
Sudoeste. É formado por mais de 3.750 famílias, produzindo cerca de quatro milhões de
litros de leite ao mês. O Sistema foi criado no ano de 2003, porém sua história inicia antes,
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com a criação das CLAFs, já no ano de 1998, quando foram constituídas cooperativas nos
municípios de Renascença, Marmeleiro, Dois Vizinhos e Nova Prata do Iguaçu.
A atividade leiteira caracteriza uma potencialidade da agricultura familiar, pois
permite viabilizar economicamente unidades produtivas baseadas em pequenas extensões
de terra. Por outro lado, embora seja uma atividade conhecida e comum aos agricultores
familiares, esta necessita estruturar a sua cadeia produtiva, em razão de encontrar-se
vulnerável a políticas de preço e de comercialização estabelecidas pelas indústrias de
processamento. Diante da constatação desta realidade, entidades locais/regionais criaram
as quatro primeiras CLAFs no início dos anos 90.
Por sua vez, no ano de 2003, com base na estrutura do Sistema CRESOL, as
CLAFs criam o SISCLAF. Este é constituído com o fim de estabelecer um elo entre as
CLAFs, atuando no seu fortalecimento e expansão. Dessa forma, estabelecendo estratégias
de ação em quatro eixos: organização, produção, comercialização e transformação, o
SISCLAF tem desenvolvido um trabalho de fortalecimento da agricultura familiar através
da cadeia leite.
É importante ressaltar que o SISCLAF não atua de forma isolada, mas procura
interagir com demais atores para atender as demandas da agricultura familiar. O mapa
institucional, apresentado a seguir, traz os principais parceiros do SISCLAF, os quais
interagem constantemente. Essa interação tem levado a formação de uma territorialidade
em torno da atividade leiteira ou do Sistema, o que pode estar originando uma nova escala
de poder e gestão.
O mapa aponta uma densidade institucional de nível 01. Ou seja, em torno deste
arranjo, há a presença de atores da sociedade civil, do Estado e do mercado; da escala
local/regional até a nacional, tendo todos estes atores, acentuada importância na
implementação e no desenvolvimento das ações do SISCLAF. Nesse caso pode-se
observar que a sociedade civil organizar-se em torno de suas demandas, fortalecendo-se e
assim, leva-as ao Estado. Porém para isso, conta com o apoio dos demais atores, os quais
estabelecem relações recíprocas e sinérgicas, como pode ser visualizado abaixo:
Figura 02. Mapa Institucional do SISCLAF – Francisco Beltrão - Sudoeste do Paraná
Fonte: Elaborado com base nas entrevistas, dez/2006.
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A ASSESOAR teve importante papel na formação das primeiras cooperativas
singulares, sendo esta a entidade autora do projeto das CLAFs. Nesse sentido pode-se citar
os STRs, que tratam do fornecimento da Carta de Aptidão necessário ao agricultor para a
liberação do PRONAF. A CRESOL, enquanto banco cooperativo, fornece e repassa os
recursos do PRONAF ao agricultor. As prefeituras e secretarias municipais de agricultura
participam dos projetos, intermediando o repasse de recursos.
Atores como EMBRAPA, UNIOESTE, UTFPR e ARCAFAR têm sua
participação dada pela realização de pesquisas, elaboração de projetos, de acordo com as
demandas do SISCLAF, além da avaliação do trabalho dos técnicos do Sistema. Já a
UNICAFES, FETRAF, Fórum do SISCLAF atuam através da divulgação e disseminação
de tais experiências, incentivando práticas cooperativas. Recentemente está iniciando-se
parcerias com o SEBRAE e SENAI, objetivando-se a realização de cursos de formação e
capacitação.
Por fim, o Governo Federal, por meio do MDA/SDT, através do PRONAF, é
responsável pelo fornecimento de grande parte dos recursos financeiros utilizados nos
projetos do SISCLAF, sendo que a contrapartida local/regional ou mesmo estadual é
menos significativa.
Assim, ressalta-se que a participação dos atores tanto da sociedade civil, quanto
do Estado e do Mercado é essencial para o desencadeamento de processos de
desenvolvimento territorial rural sustentável. A participação destes atores em suas
respectivas escalas pode ser visualizado no
gráfico 01.
Pela figura, é possível observar Gráfico 01. Densidade Institucional do SISCLAF:
uma massiva participação da sociedade civil participação dos atores nas escalas de poder e gestão
em torno do SISCLAF. Isso pode
representar a organização da mesma em prol
de minimizar suas debilidades e atender as
suas demandas. O Estado, também apresenta
considerável
participação,
responsável
principalmente pela disponibilização de
recursos financeiros e pesquisas. Isso
demonstra que sua participação nos
processos
de
desenvolvimento
é
imprescindível. Os atores pertencentes ao
Fonte: Elaborado com base nas entrevistas
mercado, neste caso, os laticínios, possuem (*) O cálculo da porcentagem é feito com base no número de
atores e refere-se ao total em cada escala.
participação mais discreta, restringindo-se a
compra do leite.
Gráfico 02. Participação das Escalas
Por outro lado, pode-se evidenciar a
Geográficas de Poder e Gestão no
participação de cada uma das escalas no SISCLAF.
SISCLAF (%)
Destaca-se a participação da escala local/regional, com
46% dos atores, ao lado da escala nacional, com 38%,
seguido da estadual (13%) e regional (4%) como é
trazido pelo gráfico 02:
A acentuada participação local/regional
demonstra a capacidade de organização e mobilização
de seus atores, que buscam parcerias nas demais escalas
para atender estas demandas. Vale mencionar a discreta
participação da escala estadual, sendo que esta se dá
apenas pela sociedade civil. Esta constatação pode
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Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Fonte: Elaborado com base nas
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apontar para a necessidade de uma integração maior entre políticas públicas federais e
estaduais.
Por sua vez, o fato da participação da escala regional, correspondente ao território,
se mostrar discreta, pode ser decorrente da recente implantação da política, sendo que a
territorialidade e institucionalidade em torno dessa escala estão em formação.
A seguir, a partir da análise de um projeto específico do SISCLAF poderá se
evidenciar o papel e a pertinência de cada ator e conseqüentemente a importância da
densidade institucional no atendimento das demandas originadas na agricultura familiar.
Sendo assim, o Projeto de Agroindustrialização de Leite da Agricultura Familiar
no Sudoeste do Paraná, apresentado ao MDA/SDT em 2005, objetiva ampliar a área física
e a capacidade de armazenagem e de transformação do leite da indústria em Itapejara do
Oeste. No entanto, observou-se em campo que as obras estão paradas naquela unidade.
As CLAFs são o público alvo deste projeto. Porém além de ampliar a produção e
industrialização das CLAFs, os atores locais/regionais entendem ser necessário investir
também na capacitação dos agricultores familiares. Para essa ação, o SISCLAF conta com
atores parceiros como UTFPR, UNIOESTE, EMATER, SEBRAE.
A COOPAFI bem como a COOPERIGUAÇU serão parceiras na comercialização
dos produtos do SISCLAF. O Sistema também vem contando com o apoio de deputados
federais, através de emendas parlamentares, o que contribui – em alguma medida – para
descaracterizar a filosofia de gestão do território – a de que os projetos precisam passar
pelo Conselho Gestor.
Já os STRs dos municípios de abrangência do SISCLAF, bem como o Conselho
Municipal de Desenvolvimento Rural, são parceiros na mobilização e mesmo fiscalização
do projeto. Por sua vez, à CRESOL BASER, à Prefeitura Municipal de Itapejara do Oeste e
o MDA/SDT, fica a responsabilidade pela disponibilização dos recursos financeiros.
A ampliação da estrutura da indústria requer um investimento direto de R$
360.000,00. Deste valor, 97% será disponibilizado pelo MDA/SDT o que corresponde a R$
349.200,00. A contrapartida, da Prefeitura Municipal de Itapejara do Oeste, será de 3%, ou
seja, R$10.800,00. Estes valores evidenciam a importância da participação do Estado,
afinal, é este o ator, tanto na escala local/regional quanto nacional, o responsável pela
aplicação de recursos. Ou ainda, a sociedade civil dispõe de 29% dos recursos envolvidos,
superior aos 21% da Prefeitura Municipal. Por sua vez, somando os 50% de participação
do Governo Federal pelo MDA/SDT, aos 21% da Prefeitura, a participação do Estado
chega a 71%.
A intenção ao enfatizar estes valores, não é a de apresentar qual ator é mais
importante, mas sim, demonstrar que o projeto apenas se torna viável a partir da
participação de cada um destes atores, ou seja, a partir da formação de uma densidade
institucional em torno do mesmo. Da mesma forma como o SISCLAF, o projeto ora
analisado possui um nível de densidade 01, envolvendo atores da escala local/regional até a
nacional.
1.3 Associação FRUTIVALE, Datas – Alto Jequitinhonha/MG
No território rural do Alto Jequitinhonha, a idéia-guia passa pela geração de
trabalho e renda. Conforme mencionado pelos atores, as políticas de geração de trabalho e
renda estão relacionadas ao fomento da agricultura familiar. Assim a criação de canais de
comercialização foi considerada um objetivo fundamental.
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Dessa maneira, o projeto da Associação Frutivale foi elencado como aquele que
melhor está territorializando a idéia-guia. Este abrange treze municípios, mas sua estrutura
central está localizada no município de Datas, onde funcionará um entreposto de insumos,
a agroindústria de polpa e a produção das mudas. A Associação está incluída nas ações
territoriais do eixo da fruticultura, que junto ao de apicultura e derivados de cana formam
os principais eixos de ação para o desenvolvimento do território.
A Frutivale caracteriza uma associação de produtores que contou com recursos de
diferentes fontes (prefeituras, MDA, CONAB e os produtores de morango) para sua
estruturação: a produção de mudas envolve 114 agricultores familiares e a produção de
polpa, 224. Atualmente, a agroindústria e o entreposto de insumos estão em fase de
construção. Já as mudas, em mais de vinte variedades, estão sendo distribuídas entre os
associados.
O que justificou a criação da Frutivale bem como a produção de mudas e a
construção da agroindústria foi a reduzida expressão da agricultura familiar no Alto
Jequitinhonha. Além disso, outro fato que acabou incentivando a realização deste projeto
foi a possibilidade de aproveitamento das frutas já produzidas no território, inclusive “as de
fundo de quintal” através do PAA programa do MDA/SAF e CONAB.
Assim, os objetivos que o projeto pretende alcançar referem-se a desenvolvimento
da fruticultura, considerada uma fonte alternativa e viável de geração de emprego e renda.
Com base nisso, se propõe ainda a criação de redes de parcerias, organizando a produção e
a agroindústria.
Pode-se citar alguns pontos fortes deste projeto como clima, solo e água
favoráveis; atividade que demanda mão-de-obra; mercado em expansão; facilidade
transporte e insumos; parceria com instituições de pesquisa, que tendem a ser
potencialidades do território. Com base nas potencialidades e contornando debilidades, até
o momento já foi possível (1) implementar uma área com o plantio de mudas frutíferas, (2)
construir uma estufa e parte do prédio da agroindústria de polpa, (3) iniciar a construção do
entreposto de insumos, (4) entregar mudas aos agricultores familiares, bem como (5)
comercializar morangos com a CONAB, através do PAA.
O projeto de produção de mudas, de produção de polpa e a implementação da
agroindústria conta com um nível de densidade institucional 01, como é possível observar
no mapa institucional:
Figura 03. Mapa Institucional da Associação Frutivale – Alto Jequitinhonha
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Fonte: Elaborada com base nas entrevistas, dez/2006.
Estes atores desempenham diferentes funções dentro do projeto. A sociedade
civil, da escala local/regional, como os STRs, bem com a associação dos agricultores da
Frutivale, são responsáveis pela deliberação das ações desenvolvidas na Associação. Os
agricultores familiares produtores de morango, além de beneficiários, também fornecem os
morangos para a CONAB via PAA. O CMDRS de Datas é responsável pela
operacionalização das atividades no dia-a-dia da Associação. Já o CEDRS, tem prestado
consultoria, participado da tomada e deliberação de decisões.
Na escala regional, a AMAJE foi responsável pela elaboração do projeto na área
da engenharia civil. Ainda da sociedade civil, a PUC é parceira prestando serviços de
consultoria empresarial. Dos atores do Estado, as treze prefeituras, pertencentes à escala
local/regional, prestam diferentes formas de apoio a Associação, dentre eles, o financeiro.
A EMATER de Datas exerce a gerência geral do projeto e a EMATER Regional participa
através de atividades de mobilização dos associados.
A EMBRAPA e a EPAMIG tem prestado consultoria técnica e fornecido as
mudas. A UFVJM disponibiliza apoio em agronomia e extensão rural. Por sua vez, a
Comissão de Implantação das Ações Territoriais (CIAT) participa da tomada de decisões,
sendo que a Frutivale é o projeto do eixo da fruticultura, proposto pelo plano de
desenvolvimento do território. Nesse sentido, o IDENE presta apoio institucional ao CIAT.
Já o MDA é responsável pela liberação de recursos financeiros para a construção
das estruturas físicas e a CONAB entra com os recursos de comercialização através do
PAA. Por fim, dente os atores do Estado, as escolas estaduais são as beneficiárias do
projeto, pois recebem a polpa para o preparo de sucos na alimentação escolar, além de
ajudarem na divulgação do mesmo. Dos atores pertencentes ao mercado, a MAP Frutas é
um canal de comercialização em construção e um “potencial” parceiro para a ampliação
dos negócios.
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A atuação do Estado não se restringe a disponibilização de recursos financeiros.
Vários atores são parceiros na prestação de consultoria técnica, administrativa, participam
das tomadas de decisão, na mobilização, que se torna possível pela organização e
mobilização da sociedade civil na escala local/regional. Já a interação e as relações com os
atores do mercado, tornam-se essenciais para que seja possível a geração de emprego e
renda, um dos objetivos do projeto e da
Gráfico 03. Densidade Institucional da Frutivale:
idéia-guia.
participação dos atores nas escalas de poder e gestão (%)
Para melhor visualizar a
participação da sociedade civil, Estado e
mercado em suas respectivas escalas é
apresentado o gráfico 03. Este aponta
para um predomínio dos atores do
Estado nas escalas nacional e estadual,
respondendo por mais da metade dos
atores. (83% e 67%, respectivamente).
Por outro lado, na escala local/regional e
regional essa realidade se inverte,
havendo um predomínio da sociedade
Fonte: Elaborada com base nas entrevistas, dez/2006.
civil sobre os demais atores (75% e
100%, respectivamente). O mercado apresenta-se mais discreto, com a participação apenas
na escala estadual, representando nela, 17%.
Gráfico 04. Participação das Escalas Geo.
Vale destacar ainda que na escala local/regional
de Poder e Gestão na Frutivale (%)
constata-se a presença de um número total de atores
superior às demais escalas (36%), como consta no
gráfico 04. Isso parece demonstrar uma organização da
sociedade civil em torno de suas demandas, que, ao
interagir com as demais escalas, passam a implementar
projetos e ações que atendem às demandas territoriais.
Sendo assim, e pela diversidade de atores
presentes no projeto da Associação Frutivale, considerase que o mesmo vem atendendo seus objetivos,
colocando-se como uma ação viável que vai de encontro
à idéia-guia, ou seja, a implementação de políticas de
geração de trabalho e renda para a agricultura familiar,
através da criação de canais de comercialização.
1.4 CENTAF - Centro de Formação da Agricultura
Familiar São José Operário, Silvânia – Estrada de
Ferro/GO
Fonte: Elaborada com base nas
entrevistas, dez/2006.
No território rural Estrada de Ferro a idéia-guia que mobiliza os atores em relação
às ações territoriais refere-se ao fortalecimento da agricultura familiar, através da
capacitação e da qualificação profissional, gestão da propriedade, baseada em noções de
diversificação produtiva, geração de renda, qualidade fitossanitária e cuidados com o meio
ambiente.
Os atores ressaltam a necessidade de captação de recursos direcionados à
agricultura familiar, de modo a aumentar a inserção de tecnologia na produção, aliada à
educação no campo, para que a mão-de-obra familiar consiga utilizar tal tecnologia. Isto
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poderia servir como um estímulo à criação de mais agroindústrias, cooperativas de
produção e crédito de agricultores familiares e canais de comercialização dos produtos
agrícolas, pecuários e o artesanato.
Com base nesta idéia-guia, foi destacado o processo de constituição do CENTAF
no município de Silvânia. Este Centro é uma iniciativa da UBEC (União Brasiliense de
Educação e Cultura), uma associação civil, confessional de direito privado e de caráter
assistencial, educacional, filantrópico e sem fins econômicos, com sede no Ginásio
Anchieta em Silvânia, e do CIAT Estrada de Ferro.
A proposta inicial do projeto pedagógico do CENTAF foi apresentada pela UBEC
ao CIAT em dezembro de 2005, sendo que a mesma foi discutida pelo grupo de atores que
compõem o CIAT, e posteriormente aprovada. A partir de então, começaram a haver
ajustes na proposta e captação de recursos. Atualmente o projeto está pronto, sendo que o
seu funcionamento iniciará em julho de 2007, e abrangerá alunos de todos os municípios
do território da Estrada de Ferro.
A idéia do CENTAF, um centro de formação que objetiva a capacitação dos
agricultores familiares, através de cursos técnicos, foi sendo construída a partir da
necessidade sentida pelos atores locais/regionais em qualificar a mão-de-obra dos homens,
mulheres e jovens do campo de modo a diminuir o êxodo rural e criar novas formas de
capital social para que as políticas públicas tenham maior abrangência e efetividade.
No CENTAF o curso técnico inicial será o de agropecuária familiar. A duração
deste curso técnico será de 1 ano e 6 meses, tendo como base a pedagogia da alternância.
Outros cursos técnicos estão sendo projetados, como o de Agroindústria Familiar, para ser
direcionado principalmente para o APL Lácteo existente no território, seguidos de curso de
artesanato, desenvolvimento sustentável, e outros, conforme demandas que irão surgir no
território. Deverão ocorrer também cursos de curta duração para grupos de agricultores e
agricultoras do território, especialmente ligados aos interesses territoriais da Estrada de
Ferro como, por exemplo, correlatos à pecuária leiteira, à apicultura, ao orgânico, ao
associativismo, ao cooperativismo, entre outros.
É importante ressaltar ainda que, pretendendo reduzir sua dependência de recursos
externos que o viabilize, serão empreendidas no CENTAF, práticas de ecoturismo
associado à educação ambiental para grupos escolares, empresariais e familiares, além da
prática de turismo educativo para grupos que se interessem por processos de produção
alternativos (orgânicos, agroecológicos, homeopatia, artesanato, economia solidária, entre
outros).
Por outro lado, vale enfatizar que os atores envolvidos no CENTAF não estão
restritos aos doze atores que compõem a UBEC. Para que o Centro entre em
funcionamento e gere as transformações territoriais apontadas pela idéia-guia, constituiu-se
em torno do CENTAF um nível de densidade institucional 01, como aponta o mapa
institucional abaixo:
Figura 04. Mapa Institucional do CENTAF - Silvania – Estrada de Ferro/GO
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Fonte: Elaborado com base nas entrevistas, dez/2006.
Estes atores cumprem diferentes papéis na constituição do CENTAF. A sociedade
civil da escala local/regional, como os STRs, associações, central de associações, ONGs e
cooperativas de crédito enquanto integrantes do CIAT, são responsáveis pela fiscalização
do projeto. Além disso, ainda os STRs e as associações, junto das cooperativas de
produção, prestarão auxílios de diversas ordens, quando possível e/ou necessário, aos
futuros alunos.
Por sua vez, o Ginásio Anchieta irá disponibilizar a estrutura física e
redimensionar parte dos recursos de filantropia da UBEC bem como recursos humanos, a
qual irá ainda elaborar, executar e gerir o projeto pedagógico do CENTAF.
Os atores do Estado, como as Secretarias Municipais da Agricultura atuarão no
desenvolvimento de programas/projetos de apoio aos alunos egressos do CENTAF para
utilizá-los nos municípios. As Secretarias Municipais de Educação atuarão na
sensibilização e mobilização dos candidatos/estudantes. As Secretarias Municipais de
Assistência Social ficarão responsáveis pelo endosso dos candidatos a freqüentar o
CENTAF. Já as Prefeituras arcarão com os custos de transporte dos alunos, das
propriedades para o Centro e vice-versa.
Na escala estadual, os atores do Estado, como UEG e SECTEC atuarão em
parcerias futuras no desenvolvimento de projetos. A Agência Rural deverá acompanhar o
desenvolvimento dos alunos e de suas propriedade. As secretarias estaduais de Educação;
Agricultura Pecuária e Abastecimento e a Superintendência de Agricultura Familiar
disponibilizarão recursos humanos, além do estabelecimento de diversas parcerias/projetos.
A Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento atuará também, no fornecimento de
recursos tecnológicos.
Já na escala nacional, a UCB será parceira futura principalmente em projetos
ambientais, além de prestar assessoria pedagógica e técnica, mesmo papel do SENAR. O
MEC repassará recursos para a montagem dos laboratórios. A EMBRAPA participará com
várias sucursais, principalmente a EMBRAPA leite. O CTDRS/CIAT, através de
cooperação técnica-institucional irá fiscalizar a participação e estabelecer convênios com
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os municípios, para que a UBEC possa realizar convênios com o território. Por fim, os
recursos financeiros para a implementação do CENTAF serão disponibilizados pela
Secretaria Executiva do PRONAF, partindo do MDA/SDT a liberação de equipamentos
para o território de modo que este possa conceder os equipamentos para o CENTAF.
Vale destacar ainda que haverá a participação de atores do mercado, ou seja,
empresas de insumos agrícolas, que disponibilizarão os insumos para aulas práticas dos
cursos do CENTAF. Porém, o nome das empresas, não foi divulgado pelo Centro.
Observa-se que a os recursos financeiros provêm de diferentes fontes, das diversas
escalas, com destaque para o Estado, na escala nacional. Desta forma, fica evidenciado que
a participação de todos os atores é imprescindível para a concretização dos objetivos e
implementação do CENTAF. Ou seja, a densidade institucional de nível 01 está permitindo
a elaboração e breve concretização das demandas que foram apontadas na idéia-guia.
A participação da sociedade civil,
Gráfico 05. Densidade Institucional do CENTAF:
Estado e mercado em suas respectivas participação dos atores nas escalas de poder e gestão
escalas está expressa no gráfico 05. Este
demonstra um acentuado predomínio da
presença do Estado, nas três escalas
geográficas de poder e gestão, no que se
refere ao processo de constituição do
CENTAF. De um total de 29 atores, 66% são
representantes da esfera estatal e 34% da
esfera da sociedade civil. Vale ressaltar, que
os atores pertencentes ao mercado
(fornecimento de insumos), também estão se
fazendo presentes como parceiros neste Fonte: Elaborado com base nas entrevistas, dez/2006.
projeto.
Por sua vez, como aponta o gráfico 06, quanto Gráfico 06. Participação das Escalas Geo.
de Poder e Gestão no CENTAF (%)
à participação de cada escala, há um predomínio da
local/regional (43%), seguido da estadual (30%) e
nacional (27%). Além da expressiva participação dos
atores locais/regionais e nacionais, a estadual também
chama bastante atenção, sendo que nos demais projetos
analisados, a participação em número de atores é menos
significativa. Isso, no caso do CENTAF, pode
representar uma integração maior de políticas e ações
do estado da esfera estadual e federal, considerando que
os atores da escala estadual pertencem ao Estado. Tal
integração é considerada positiva em relação ao
desenvolvimento de territórios rurais.
Observa-se assim, que a diversidade de atores
Fonte: Elaborado com base nas
presentes, atende as demandas do projeto, sendo que
entrevistas, dez/2006.
apenas o conjunto enquanto tal, “parece” ter a
capacidade de levar o CENTAF à sua efetiva implementação.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA DA METODOLOGIA DAS ESCALAS
GEOGRÁFICAS DE PODER E GESTÃO E DOS QUATRO PROJETOS
ANALISADOS
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A partir da caracterização dos projetos dos quatros territórios rurais, CORAC
(Seberi, RS) SISCLAF (Francisco Beltrão, PR) CENTAF (Silvania, GO) e Associação
Frutivale (Datas, MG) pode-se fazer algumas considerações tomando-se por referência os
dados resultantes da metodologia das escalas. A seguir, muito brevemente, tentar-se-á
apresentar como esta metodologia pode servir enquanto ferramenta para o planejamento
das ações e dinâmicas territoriais.
Os quatro projetos analisados apresentaram níveis de densidade institucional 01,
com atores da sociedade civil, Estado e mercado, das escalas local, local/regional, regional,
estadual e nacional. Contudo, houve duas exceções.
No caso da CORAC (RS), há a presença de apenas duas escalas - local/regional e
nacional - com atores da sociedade civil e Estado. Considerou-se o projeto também de
nível 01 em razão de haver a presença da escala nacional. No entanto, ressalta-se que a
pequena diversidade de atores e escalas pode representar futuros obstáculos ao projeto,
como por exemplo, a sua continuidade após o fim do PAA.
A outra exceção refere-se ao CENTAF (GO) que apresentou apenas três escalas local/regional, estadual e nacional. Porém, isto decorreu do grande número de atores
presentes neste projeto, além do tempo reduzido para a realização da pesquisa de campo, o
que não permitiu um aprofundamento maior sobre os projetos. Isto reduz a riqueza de
detalhes e informações, porém não interfere, de modo geral, nos resultados finais da
análise.
No mais, a partir do mapa institucional e do gráfico que aponta o percentual de
participação dos atores, foi possível observar uma predominância da escala local/regional
enquanto número de atores envolvidos. A tabela abaixo apresenta comparativamente os
quatro projetos:
Tabela 02. Participação de cada escalas nos 4 projetos
Projetos
Escalas
Local/Regional
Regional
Estadual
Nacional
TOTAL
CORAC
(RS)
85%
***
***
15%
100%
SISCLAF (PR)
CENTAF (GO)
Ass.Frutivale
(MG)
45%
43%
35%
4%
***
9%
13%
30%
28%
38%
27%
28%
100%
100%
100%
(***) Escala não existente
Fonte: Elaborado com base nos mapas institucionais.
A significativa participação da escala local/regional pode ser reflexo da capacidade
de organização e mobilização dos atores locais/regionais em torno de suas demandas. Vale
ressaltar ainda que esta escala, somada à regional (quando existente) eleva sua participação
para próximo dos 50%.
Observada a escala regional (correspondente aos territórios rurais) de forma
individual, sua participação, quando existe, é discreta. Isso pode ser conseqüência do fato
da implementação da política dos territórios rurais ser relativamente recente. Por outro
lado, aponta para que as futuras ações nos territórios incentivem a construção de uma
identidade/territorialidade em torno desta delimitação, de modo que não se constitua mais
uma regionalização dentre as muitas já existentes.
A participação das escalas estadual e nacional permanece num patamar
semelhante no território Estrada de Ferro (30% e 27% respectivamente) e no Vale do
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Jequitinhonha (ambos 28%). Realidade oposta observada no território Médio Alto
Uruguai, onde não há presença da escala estadual, conseqüência de contatos e
representações políticas mais diretas com a escala nacional. No Sudoeste do Paraná, a
escala estadual representa 13% dos atores enquanto que a nacional 38%.
Quanto à escala estadual e nacional pode-se observar ainda que, exceto no caso
do Sudoeste do Paraná, o ator que mais se destaca é o Estado (ver tabela abaixo).
Considerando-se que, há uma mobilização local/regional significativa em torno das
demandas desta escala nos quatro casos, a participação do Estado pode representar uma
relação de sinergia entre escalas, ou ainda, entre sociedade civil local/regional e Estado
na escala estadual e nacional.
Considerando ainda que nos quatro projetos, na escala local/regional
predominam atores da sociedade civil e na estadual e nacional, atores do Estado, podese afirmar que este é um indício do que traz Bobbio, quando menciona que o papel do
Estado está relacionado ao atendimento das demandas levada a ele pela sociedade civil.
Considerando real esta premissa, o Estado, também de âmbito municipal, poderia, por
exemplo, voltar-se à construção de novos canais de comunicação com a sociedade civil,
de modo a melhor atender suas demandas.
Além disso, a discreta participação do Estado na escala estadual em dois
territórios aponta para uma necessidade de construção de canais de comunicação entre
estes dois níveis de poder – federal e estadual - de modo a somar forças e reduzir
esforços empreendidos em ações que por vezes, tem os mesmos objetivos, mas correm
paralelas, sem interagirem.
ESCALAS
Local/Regional
Regional
Estadual
Nacional
Total por escala
TOTAL
Tabela 03. Participação das escalas e atores nos 4 projetos
PROJETOS/ATORES (%)
CORAC
SISCLAF
CENTAF
Ass.Frutivale
(RS)
(PR)
(GO)
(MG)
SC
E
M
SC
E
M
SC
E
M
SC
E
M
85
24
13
8
30
13
26
9
*** *** ***
4
*** *** ***
9
*** *** ***
13
30
5
18
5
15
21
17
4
23
5
23
85
15
0
62
30
8
34
66
0
45
50
5
100%
100%
100%
100%
(***) Escala não existente
Fonte: Elaborado com base nos mapas institucionais.
Por sua vez, o mercado aparece de forma muito mais discreta. Está presente no
Sudoeste do Paraná, na escala local/regional (8%) e no Vale do Jequitinhonha, na escala
estadual (5%). Pode-se fazer duas considerações a este respeito.
A discreta participação de atores pertencentes ao mercado, pode apontar para a
realização de futuras ações de integração entre as experiências e o mercado já que a idéia
guia do território do Médio Alto Uruguai e Vale do Jequitinhonha, passa explicitamente
pela busca de novos canais de comercialização o que aparece implícito também nos outros
dois territórios.
Por outro lado, ressalta a importância de se distinguir o mercado dos demais
atores da sociedade civil, como apontado anteriormente. A restrita participação do
mercado, principalmente enquanto ator protagonista, sendo que sua presença nos projetos
se dá por meio de parcerias, certamente está relacionada ao seu objetivo: centrado mais na
obtenção de lucro e menos na perspectiva social, como no caso dos movimentos sociais.
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Porém entende-se ser importante uma maior integração com estes atores, pois esta acaba
sendo uma forma de viabilizar a idéia-guia mencionada.
Mais especificamente, quanto aos projetos, é possível afirmar que a densidade
institucional em torno dos mesmos tem permitido que estes atinjam os objetivos a que vem
se propondo. Os diferentes atores e escalas têm cumprido ou assumido diversos papéis,
tornando possível atender a demandas dos territórios rurais.
Foi observado ainda pelos pesquisadores, a predominância da presença de atores
voltados à agricultura familiar, com exceção do CENTAF, que integra diversas áreas. Esta
constatação parece, a priori, gerar ações setorializadas. Porém, as ações desenvolvidas nos
projetos apontam para uma visão de agricultura, não mais restrita à produção de alimentos,
mas sim, uma agricultura voltada à produção, processamento (leite/SISCLAF;
frutas/Frutivale) e comercialização (PAA – CORAC, Frutivale; SISCLAF em conjunto
negociando com as empresas processadoras).
Por sua vez, o projeto do CENTAF, que engloba uma considerável diversidade de
atores quanto à sua área de atuação (atores voltados à educação, assistência social, ciência
e tecnologia, assistência rural) expressa bem a visão da dinâmica territorial do
desenvolvimento rural. A partir de investimentos na educação, os atores locais/regionais
pretendem fortalecer a agricultura familiar através da capacitação, qualificação profissional
e gestão sustentável da pequena propriedade, procurando superar uma visão setorial. Os
projetos ligados ao PAA (CORAC, Frutivale), também podem ser aqui citados, uma vez
que, além de beneficiarem os agricultores familiares, beneficiam famílias carentes, escolas
e hospitais.
Enfim, as considerações feitas ao longo desta seção, não podem ser consideradas
finais, mas sim considerações preliminares ou mesmo iniciais. O tempo reduzido para a
realização do trabalho de campo não permitiu um aprofundamento maior de cada projeto.
As considerações ora trazidas são feitas no sentido de demonstrar a aplicabilidade da
metodologia de escalas aos processos de desenvolvimento territorial. O que se pode
observar, é que existem diversas escalas de poder e gestão atuando na transformação do
espaço, levando a novos usos políticos e econômicos, ou seja, gerando transformações
territoriais.
Ao observar as escalas e seus respectivos atores, ao lado do papel de cada um no
território, é possível perceber sua relevância para os processos de desenvolvimento, além
de poder-se elencar e buscar potenciais atores e ações necessários ao alcance dos objetivos
a que os projetos se propõem. Como exemplo, pode-se citar novamente o mercado, cuja
participação tende a gerar resultados positivos quando se pretende abrir novos canais de
comercialização para a agricultura familiar.
Enfim, a análise escalar constitui um método não dicotômico de apreensão da
realidade. O método leva em consideração elementos ou atores distintos mas imbricados,
que empregam novos usos políticos e econômicos do território. Cada ator possui sua
territorialidade, e o recurso das escalas recupera a importância dos atores relegados a
posições coadjuvantes nas análises centradas no marco estatal, atribuindo relevância a
várias dimensões que interconectadas, influenciam na dinâmica territorial.
REFERENCIAS
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Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
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"Conhecimentos para Agricultura do Futuro"
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Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
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metodologia das escalas geográficas de poder e gestão