Aderência e Dissonâncias às Estratégias de Relacionamento do Projeto Wines of Brasil
Autoria: Jefferson Marlon Monticelli, Júlia Cardoso de Azevedo, Sílvio Luís de Vasconcellos,
Ivan Lapuente Garrido
Resumo
O presente estudo visa analisar as estratégias de relacionamento ─ competição, cooperação e
coopetição ─ adotadas pelas empresas para manter um posicionamento competitivo no
cenário de negócios. Considerando o aumento da competição internacional do mercado de
vinhos no Brasil, as vinícolas brasileiras foram impelidas a questionar suas estratégias e
buscar o mercado externo como alternativa para reforçar sua competitividade. Para fomentar o
desenvolvimento desse setor, o Projeto Setorial Integrado Wines of Brasil surgido de uma
iniciativa do Instituto Brasileiro do Vinho (IBRAVIN) e da Agência de Promoção à
Exportação e Investimentos (APEX) é de grande relevância para o processo.
1 Introdução
Tem se verificado mudanças na forma de gerir os negócios em um cenário competitivo
globalizado. A busca por vantagens competitivas sustentáveis tem incentivado as
organizações a explorarem novas alternativas de agrupamentos empresariais. Dentro de um
ambiente caracterizado por volatilidade, pela exigência de organizações inovadoras e
dinâmicas, cerceado por estruturas institucionais que possam limitar a sustentabilidade da
empresa, novos arranjos interorganizacionais são preponderantes à perpetuidade no ambiente.
No entanto, a competição não é mais a única estratégia de relacionamento que
prevalece no ambiente de negócios. Estratégias de cooperação e coopetição complementam o
paradigma competitivo, gerando novas formas de governança intra-organizacional, assim
como ampliando as alternativas de agrupamento empresarial entre as firmas (Bengtsson &
Kock, 1999, 2000; Brandenburger & Nalebuff, 1995; Padula & Dagnino, 2007). No
relacionamento de coopetição, os agentes têm uma mútua interação, agregando valor em
determinadas atividades e, simultaneamente, competindo pelos mesmo recursos em outras,
visando maximizar seus ganhos. (Brandenburger & Nalebuff, 1995).
Essas estratégias de cooperação competitiva têm sido difundidas tanto no mercado
doméstico quanto no internacional, visando não somente ampliar a competitividade das
firmas, assim como garantir sua sobrevivência (Lado et al., 1997). Torna-se mais perceptível
ainda ─ e fadado ao sucesso ─ a prevalência da coopetição em redes de negócios e Arranjos
Produtivos Locais (APL's) que possuem empresas com culturas colaborativas, habilidades
complementares, objetivos convergentes e riscos mensuráveis (Brouthers et al., 1995).
Considerando o exposto, este estudo tem como objetivo analisar as dimensões
competitiva, cooperativa e coopetitiva, contextualizando-as no projeto Wines of Brasil na
indústria vitivinícola do Rio Grande do Sul. Este artigo está dividido em cinco seções. Após a
introdução, apresenta-se o referencial teórico onde são descritos os conceitos que norteiam as
principais estratégias de relacionamento adotadas pelas firmas, abordando suas definições,
limitações e compreensão acerca dos temas. Sua contextualização é aplicada no estudo
empírico, identificando evidências que atestem o relacionamento de coopetição. Em
continuidade, trata-se da metodologia utilizada para amparar o estudo. Na seção seguinte,
analisam-se os resultados obtidos a partir da pesquisa empírica. Por fim, são elencadas as
considerações finais acerca do tema, conjecturando a visão coopetitiva na indústria
pesquisada, associando as restrições do estudo e sugestões para pesquisas futuras.
Referencial Teórico
A Perspectiva Competitiva
Competição trata da disputa de forças entre agentes, visando estabelecer supremacia
sobre o adversário. O objetivo é de garantir que os riscos posteriores sejam inferiores às
recompensas futuras (Hamel et al.,1989). Complementar a esse conceito, a perspectiva
competitiva resulta de ações e respostas competitivas entre firmas que atuam dentro de uma
mesma indústria (Hitt et al., 2002). Com isso, a firma atinge uma performance superior as
demais, gerando uma vantagem competitiva através de avanços tecnológicos, inovação em
produtos, práticas mercadológicas ou organizacionais (Porter, 1985) ou competências
distintivas difíceis de imitar (Barney, 1991; Wernerfelt 1984).
Conforme Bengtsson e Kock (1999), a competição proporciona movimentos de
imitação entre os concorrentes para lidar com situações de incerteza ambiental — fenômeno
2 denominado como isomorfismo mimético (DiMaggio & Powell, 1983). Dessa forma, as
organizações, por mais que busquem desenvolver competências distintivas, existe a
homogeneização dos comportamentos dos competidores pela legitimidade de suas estratégias.
Na relação entre os competidores não existem objetivos compartilhados, pois eles são
decididos independentemente. Todavia, o objetivo comum é uma premissa na competição,
visto que os concorrentes disputam metas semelhantes utilizando de seus recursos
disponíveis. Essa convergência ou sobreposição ocorre quando (a) as firmas utilizam das
mesmas estratégias, (b) disputam o mesmo mercado ou (c) competem na mesma linha de
produtos ou portfólio de negócios. Ademais, a competição tende a intensificar-se mediante a
evolução do ciclo de vida da indústria até o nível de maturidade, quando há um maior número
de concorrentes (Luo, 2005). Portanto, essa relação envolve conflito, desarmonia, a busca
incessante por um desequilíbrio entre os agentes, mesmo que isso resulte em um jogo de soma
zero (Bengtsson & Kock, 2000).
A principal premissa do paradigma competitivo é a disputa dos agentes pelos mesmos
recursos, que nem todos podem obter simultaneamente. Isso motiva um comportamento que
visa ganhos individuais e acarreta contra-movimentos em resposta a este comportamento
(Jarillo, 1993; Padula & Dagnino, 2007). Bengtsson & Kock (1999) complementam essa
abordagem focada na disputa por recursos, a concorrência por mercados de produtos e
serviços similares, podendo gerar uma interdependência horizontal e vertical entre as firmas.
Horizontalmente, a firma competirá para obter e se apropriar de uma vantagem
competitiva (Porter, 1985) ou de competências distintivas que ofereçam produtos ou serviços
superiores aos seus concorrentes (Barney, 1991; Wernerfelt 1984). A competitividade se
intensifica para lidar com desafios impostos pela concorrência ou quando é identificada uma
oportunidade de melhorar a sua posição no mercado. Ainda, no que diz respeito aos
relacionamentos horizontais, essas interações são mais informais, gerando redes de
complementaridade interorganizacional (Bengtsson & Kock, 1999).
Verticalmente, a posição, o poder e a dependência que a empresa exerce dentro da
rede a qual pertence, irão impactar na obtenção de vantagens competitivas à firma. Essa
relação interorganizacional é influenciada pela interação com os demais atores, envolvendo
trocas econômicas. (Bengtsson & Kock, 1999; Brandenburger & Nalebuff, 1995)
Sob a ótica cognitiva dos gestores, menciona-se que fatores como prestígio e o orgulho
dos executivos à frente das empresas também induzem a competição e a superação dos
desafios impostos pelo mercado (Bengtsson & Kock, 2000). Esse comportamento é reforçado
pela segregação e ocultação de informações entre os colaboradores, comprometendo-os
isoladamente em superar os concorrentes.
A abordagem da dinâmica competitiva possui restrições como a falta de
reconhecimento de que as decisões de uma firma afetam as demais e, por conseguinte, a
indústria envolvida; descreve a competição de maneira muito passiva; desconsidera
imperfeições da relação competitiva que possa a conduzir, por exemplo, a uma situação de
monopólio (Osarenkhoe, 2010).
Considerando a sustentação exposta, entende-se que o termo competição envolve,
intrinsecamente, conflito e rivalidade entre os agentes para obter um desempenho superior.
A Perspectiva Cooperativa
As estratégias cooperativas visam alavancar ganhos recíprocos dos agentes mediante
sua interação, focando na complementaridade, confiança e na harmonia dos atores. A
cooperação é uma das alternativas para manter a competitividade em um cenário de intensa
3 concorrência, respondendo rapidamente as necessidades dos consumidores e as demandas por
produtividade e inovação. É definida como uma relação em que os agentes compartilham
capacidades e recursos ou incrementam estes, visando atingir benefícios mútuos, mediante sua
interdependência interorganizacional (Bengtsson & Kock, 1999; Luo, 2005).
A cooperação baseia-se em evitar a disputa direta com concorrentes, delimitando o
conflito com base em um acordo cooperativo que possibilite manter a sustentabilidade da
vantagem competitiva adquirida ou que favoreça a geração de valor (Mintzberg et. al., 2006).
As organizações agem motivadas pela intensificação da concorrência baseada em tecnologia,
pelo dinamismo do ambiente, pela demanda por recursos complementares e heterogêneos,
para adquirir aprendizado, compartilhar conhecimento e desenvolvimento tecnológico, para
acessar novos mercados, ampliar ganhos de escala e criar barreiras de entrada, além de
propiciar o foco na sua atividade-fim (Khanna et al., 1998).
Contudo, para Porter (1985), a cooperação entre firmas somente é vantajosa quando
utilizada de forma seletiva e temporariamente. As ações cooperativas devem ser adotadas
apenas em áreas básicas de pesquisa de produtos e processos, deixando de lado qualquer área
que possa providenciar uma vantagem competitiva para a organização. Apesar das firmas
poderem elevar seu nível de competitividade através do compartilhamento de riscos e
benefícios, da priorização de um relacionamento harmônico entre as partes e da satisfação de
necessidades que não seriam atendidas de maneira isolada, não pode haver uma transferência
de sabedoria estratégica entre os agentes.
Esse tipo de relacionamento ainda fortalece as firmas em negociar coletivamente com
instituições, principalmente governamentais, ampliando seu poder e impondo novas barreiras
de entrada contra later movers (Luo, 2005). Também, do ponto de vista econômico, a
cooperação enfatiza a eficiência e a redução dos custos de transação, corrigindo imperfeições
do mercado e tornando as organizações mais flexíveis para lidar com a volatilidade do
ambiente (Williamsom, 1985). Ademais, a partir do conceito da Resourced Based View — ou
RBV (Barney, 1991; Wernerfelt, 1984), identifica-se como a melhor forma de utilização dos
recursos através da cooperação, desde que não compartilhe seus recursos valiosos.
A maior parte dos relacionamentos interorganizacionais inicia através de acordos
informais baseados em relações de baixo risco, retorno e confiança. Baseados na repetição dos
comportamentos dos agentes, há um aumento da confiança entre os envolvidos e, por
conseguinte, dos investimentos e das expectativas. Ademais, as motivações que nortearam a
colaboração dos agentes no passado podem ser diferentes das razões que os mantenha sob
interação no momento presente, evidenciando o dinamismo da relação e, mais
especificamente, das expectativas, do aprendizado e do comprometimento dos envolvidos
(Ring & Van de Ven, 1994).
O paradigma cooperativo baseia-se na interdependência entre as firmas, gerando um
jogo de soma positiva em que o desempenho de um participante está diretamente relacionado
ao desempenho do outro, enfatizando o desenvolvimento de ações conjuntas para a obtenção
de benefícios mútuos (Jarillo, 1993; Padula & Dagnino, 2007).
Os relacionamentos cooperativos podem se caracterizar por acordos formais ou
informais, ou seja, rigorosos e rígidos ou tênues e flexíveis (Bengtsson & Kock, 1999).
Quanto mais forte o contrato for, mais formal será a relação, sendo utilizado, principalmente,
para formação de agrupamentos empresariais que poderão ser representados por uma entidade
com gestão independente e identidade própria (Kanter, 1994;). Todavia, os temas
especificados, em contratos formais ou acordos informais, constituem importantes dimensões
negligenciadas e futuros pontos de conflito (Grandori & Cacciatori, 2006).
4 Ademais, ressalta-se a relevância da confiança e do comprometimento para o alcance
dos objetivos comuns e o fortalecimento da cooperação existente. Ainda destacam-se outros
fatores essenciais ao sucesso do relacionamento colaborativo: excelência de cada participante;
relevância do relacionamento; interdependência entre os agentes; investimento recíproco;
informação simétrica; troca de experiências e aprendizagem coletiva; histórico e identidade
semelhantes; utilização de mecanismos de coordenação, padronização e controle; integração
entre a rede e institucionalização da cooperação (Kanter, 1994; Park & Ungson, 2001).
Por outro lado, a falta de confiança entre os participantes, um ambiente desfavorável e
o desalinhamento entre as firmas com objetivos distintos ou ações oportunistas são
limitadores da estratégia colaborativa, assim como benefícios inferiores aos almejados
(Bengtsson & Kock, 2000; Jarillo, 1988). Associa-se a estes, a ausência do reconhecimento
das forças competitivas dentro de uma relação cooperativa (Padula & Dagnino, 2007) ou o
entendimento delas apenas como influências negativas (Bengtsson et al., 2010). Assim como
a competição, a cooperação apresenta uma visão incompleta, pois a firma fica sujeita ao
gradual declínio de sua inovação competitiva e ao aumento de dependência de outras firmas,
diminuindo sua competitividade em mercados com acirrada concorrência (Luo, 2005).
Mediante a descrição transcorrida, compreende-se que cooperação refere-se à
estratégia de relacionamento que visa reciprocidade entre os agentes devido aos ganhos serem
maiores do que os riscos. Seu objetivo é desenvolver estratégias colaborativas para geração de
valor que, mediante acordos tácitos ou formais, será compartilhado entre as partes.
A Perspectiva Coopetitiva
Coopetição baseia-se na interdependência entre empresas, buscando a convergência de
interesses e objetivos, através de relacionamentos díspares. Seu alicerce está em criar valor
através da colaboração entre organizações concorrentes, visando alinhar interesses diferentes
em prol de um objetivo comum. Baseia-se em criar oportunidades para gerar vantagens
competitivas, remover obstáculos externos e neutralizar ameaças (Chin, Chan & Lam 2008).
Ainda, especifica-se que, para caracterizar o processo de coopetição, a cooperação e a
competição devem ocorrer simultaneamente, porém os participantes colaboram em áreas
distintas das que competem (Luo, 2005).
Essa visão é complementada através da criação de valor pelas partes que dividem
conhecimentos e recursos, utilizando-se da cooperação, mas que, paralelamente, competem
para atingir os melhores resultados. Essa relação envolve trocas econômicas e nãoeconômicas, sendo que, no elo cooperativo o poder é balizado pela cadeia de valor; no elo
competitivo pela força e posição dos atores na rede. (Bengtsson & Kock, 1999, 2000;
Bengtsson et al., 2010). Nesse ponto, quanto maior o número de interações, maior será a
possibilidade de promover a melhoria no desempenho em produtos, serviços, relacionamento
com o consumidor, assim como ganhos de produtividade, eficiência e de qualidade, que não
seriam possíveis obter se desenvolvidos isoladamente (Ganguli, 2007; Luo et al., 2006).
Posto isto, compreende-se que a coopetição tem a mesma origem na colaboração, visto
que surgem de interesses comuns que substituem a maximização do ganho individual. São
investidos recursos para ampliar o volume total a ser compartilhado, porém ele não será,
necessariamente, dividido de forma igualitária entre as partes (Padula & Dagnino, 2007). Por
mais que exista um alinhamento de interesses, em algum momento, existirá um ponto de atrito
que originará uma disputa pela divisão dos resultados. Os ganhos da relação serão
proporcionais não somente ao que foi investido e percebido pelos participantes, mas também
5 obtidos pelo aprendizado e pelo poder individual exercido na estratégia de relacionamento
(Abdallah & Wadhwa, 2009).
Ainda, o relacionamento coopetitivo pode sofrer influência de variáveis exógenas ─
direcionadas pelo contexto ambiental ─ e de variáveis endógenas ─ providas pela estrutura de
conhecimento entre os agentes. Mudanças no ambiente podem conduzir a alterações nas
estruturas de incentivo e induzir a situações de conflito e desconfiança, enfraquecendo o
interesse na relação de cooperação. Já a estrutura de conhecimento envolve a seleção,
interação organizacional (conexão de recursos e atividades para alcance de objetivos
compartilhados) e interação estratégica (esforços para direcionamentos estratégicos através
atividades colaborativas) (Padula & Dagnino, 2007).
A relação coopetitiva ocorre em função da maximização dos resultados obtidos pelo
direcionamento de esforços em um mesmo sentido, transcritos por acordos formais ou tácitos.
Cooperação implica, basicamente, em harmonia; já a competição em conflito. Nas atividades
distantes do mercado-alvo, as empresas cooperam; nas atividades próximas ao mercado
almejado, as empresas competem (Bengtsson & Kock, 1999, 2000).
Os relacionamentos coopetitivos, assim como os colaborativos, são baseados na
confiança, reciprocidade e no altruísmo (Kanter, 1994). Através da confiança e da ausência de
rivalidade obtém-se a redução dos custos de transação, dos períodos de desenvolvimento de
produtos e de inovação e dos mecanismos contratuais para neutralizar os riscos oportunistas.
Não obstante, adquire-se um leque de opões estratégicas que permitem assumir posturas
flexíveis e ágeis mediante o dinamismo do mercado (Lado et al., 1997).
No entanto, apesar da coopetição ser baseada em interesses convergentes, seu modelo
possui críticas, principalmente no que se refere aos riscos acarretados pelo oportunismo e pelo
dinamismo do ambiente (Gulati et al., 2000; Hamel, 1991). Além disso, a relação falha
quando os agentes deixam de reconhecer a assimetria de benefícios, têm a percepção de
injustiça ou oportunismo de outro agente, mediante a evolução do relacionamento, reduzindo
as motivações dos participantes (Khanna et al., 1998).
Sendo assim, cria-se uma relação díade congruente e positivamente interdependente
entre os participantes. Ademais, a coopetição não é um construto dicotômico, situado em um
contínuo entre competição e cooperação. Seu conceito é multidimensional, complexo e
dinâmico, assumindo diferentes valores dentro de um eixo ortogonal (Padula & Dagnino,
2007).
Ao entender-se o exposto, compreende-se que coopetição implica no
compartilhamento de objetivos que induzem aos agentes cooperarem e competirem entre si
simultaneamente, visando reduzir riscos, perdas e diminuir incertezas, ampliando seu leque de
opções estratégicas e alavancando seus ganhos, obtendo desempenho superior à estratégias de
relacionamento baseadas somente em competição ou cooperação.
Interações de Competição e Cooperação
Chin, Chan e Lam (2008) desenvolveram um modelo que diagnostica os
relacionamentos de acordo com o nível de interação entre seus agentes (Figura 1). O modelo
apresenta quatro tipologias que podem ser obtidas de acordo com a interação e intensidade da
competição e cooperação entre as firmas. Os autores sugerem que o comportamento dos
agentes visa angariar recursos e capacidades para desenvolver e implementar estratégias que
gerem valor e retorno econômico à organização acima da média do mercado. Ainda, Luo
(2005) salienta que as similaridades dos mercados contribuem para comportamentos
competitivos e que a assimetria de recursos favorecem ao estabelecimento de cooperação
6 entrem os agentes. Justifica-se a competição pela disputa dos mesmos recursos; e a
colaboração dos agentes para a sua complementaridade, visando internalizar conhecimento
adquirido do coopetidor relacionado.
Alta
Competitivo (i)
Adaptativo (iv)
Isolado (ii)
Parceiro (iii)
Orientação
Competitiva
Baixa
Baixa
Alta
Orientação Colaborativa
Figura 1: Grau de intensidade de relacionamento de competição e cooperação
Fonte: Adaptado de Chin, Chan e Lam (2008)
No primeiro quadrante ocorre a prevalência de relacionamentos competitivos,
baseados principalmente em oligopólios, caracterizados por alto nível de concorrência,
desregulamentação da indústria e sofisticada demanda dos clientes. Ainda, há uma maior
incidência de similaridade de produtos, recursos e mercados, evidenciando uma menor
intenção de cooperação. Para tanto, as firmas utilizam de: (a) estratégias de inteligência
empresarial para coletar informações do mercado e antecipar movimentos dos concorrentes;
(b) foco em um nicho geográfico, de produto e/ou tecnologia; (c) táticas de atração,
manipulação e dominação para defender-se de concorrentes (Hitt et al., 2007; Luo, 2005).
A segunda situação é constituída dos agentes que não interagem de maneira
significativa com outros rivais, mantendo baixos níveis de competição e cooperação
simultaneamente. Tratam-se de firmas com um limitado escopo de produtos ou mercados, que
sustentam uma posição competitiva utilizando de barreiras regulatórias, tecnológicas,
financeiras contra novos entrantes. Firmas neste quadrante consideram utilizar de: (a)
especialização em produtos ou mercados para enfatizar o conhecimento adquirido; (b)
economias de escala, melhorando o fluxo de caixa e ampliando as barreiras de entrada; (c)
integração vertical, expandindo a cadeia de atuação da firma e potencializando sua atuação
(Hitt et al., 2007; Luo, 2005).
O terceiro quadrante apresenta a situação de alta cooperação e baixa competição,
aproveitando de sinergias criadas entre os agentes. Ademais, são condições necessárias para
que ocorra esse relacionamento a alta complementaridade de recursos e capacidades e o baixo
compartilhamento de características semelhantes de um mesmo mercado. Firmas neste
quadrante utilizam de: (a) extensão de sinergias através da complementaridade de recursos,
compatibilidade de objetivos e cultura cooperativa; (b) divisão de valores mediante tentativa
de acomodação das respectivas culturas, filosofias e valores organizacionais; (c)
aperfeiçoamento de interação entre as firmas através da familiaridade, socialização e
compartilhamento de conhecimento (Luo, 2005).
Por fim, no último quadrante consta a relação adaptativa em que há interação entre
cooperação e competição para que os participantes alcancem seus objetivos e melhorem seu
desempenho através da redução de custos, riscos, exploração das competências e ganho de
7 eficiência. Ademais, raramente os rivais concorrem em todos negócios, produtos ou
mercados, oportunizando chances de cooperar. Firmas que estabelecem um relacionamento
adaptativo utilizam de: (a) análise de limites que consideram as áreas a cooperar e a competir;
(b) loose coupling que facilita a colaboração atribuindo flexibilidade e estabilidade aos
relacionamentos; (c) equilíbrio estratégico entre cooperação e competição (Luo, 2005).
Metodologia
O estudo foi desenvolvido por meio de uma pesquisa explanatória, a qual busca
explicar um fenômeno contemporâneo. Ao ser classificado como explanatório, ele busca
identificar “como” e “por que” acontece nas dimensões relatadas entre a organização e o
ambiente no qual está inserida. (Yin, 2005). A aplicação da pesquisa explanatória foi a mais
adequada nesse estudo, pois teve como objetivo explicar a relação entre estratégias de
relacionamento junto ao projeto Wines of Brasil.
Esta foi uma pesquisa de caráter descritivo, pois objetivou identificar as relações
causais (Schwab, 1999), relacionando o referencial teórico com as evidências empíricas
coletadas e dados secundários obtidos em sítios e publicações do setor.
Para compor a unidade de análise, foram escolhidas vinícolas e entidades mediante
critério de conveniência, uma vez que foram selecionadas empresas integrantes do projeto
Wines of Brasil na Serra Gaúcha, totalizando doze entrevistados (Figura 2).
Entrevistado
Empresa
Cargo
Data
1
IBRAVIN
Diretor Técnico
18/01/2012
2
Wines of Brasil
Gerente de Exportação
18/01/2012
3
Vinícola Aurora
Supervisor de Exportação
18/01/2012
4
Vinícola Salton
Coordenador de Exportação
26/01/2012
5
Vinícola Miolo
Gerente de Relações Internacionais
07/02/2012
6
Vinícola Basso
Gerente de Exportação
07/02/2012
7
EMBRAPA
Pesquisador em Socioeconomia
11/01/2013
8
Vinícola Miolo
Gerente de Relações Internacionais
17/01/2013
9
Vinícola Don Giovanni
Gerente Comercial
17/01/2013
10
Vinícola Dal Pizzol
Gerente Comercial
21/01/2013
11
SDPI
Diretora de Promoção de Negócios e
Coordenador de Inteligência Comercial
21/01/2013
12
APEX
Gestor de Relacionamento com Empresas
Brasileiras
25/01/2013
Figura 2: Informações gerais das entrevistas
Fonte: autores
8 Em relação à técnica utilizada, adotou-se o estudo de caso para realizar um exame
abrangente do fenômeno (Yin, 2005). Para compor o estudo, realizou-se um protocolo do
caso, elucidando o objetivo da pesquisa, o embasamento teórico para ancorá-la, assim como o
plano de coleta de dados e procedimentos operacionais de campo (Dubé & Paré, 2003).
A triangulação dos dados permite realizar análises mais cuidadosas, uma vez que há
diferentes fontes de informação e auxilia a validar a pesquisa (Dubé & Paré, 2003). Com base
na literatura descrita no capítulo anterior, foram determinadas categorias de análise para a
elaboração do roteiro de entrevista, sendo estas validadas por dois especialistas no tema antes
da pesquisa de campo.
Para a análise dos dados, foram utilizados os resumos elaborados pelos autores, as
gravações das entrevistas, além dos materiais disponíveis nos sítios eletrônicos e publicações
dos participantes do estudo. De acordo com Bardin (1979), a análise qualitativa é aplicada no
intuito de elaborarem-se deduções específicas sobre acontecimentos, na busca de inferências
mais dirigidas, baseadas em índices que a amparem.
Análise dos Resultados
A indústria vitivinícola tem relevância econômica para o estado do Rio Grande do Sul.
Em relação ao cultivo e produção do vinho no Rio Grande do Sul, de uma maneira geral, sua
evolução é dividida da seguinte forma: (1) de 1875 a 1915 direcionada ao consumo familiar;
(2) a partir de 1915 ocorre a distribuição dos produtos em nível nacional; (3) nas décadas de
60 e 70 ocorrem os primeiros processos de internacionalização com a penetração de empresas
estrangeiras no mercado brasileiro, como Chandon, Maison Forestier, Martini; (4) a partir da
década de 90 existem maiores investimentos em tecnologia, profissionalização da
administração e marketing possibilitando a internacionalização das vinícolas gaúchas (Farias,
2008;). O representante da APEX reforça essa segmentação no seu discurso ao dividir, de
maneira resumida, a história da indústria vitivinícola em: (1) século XIX com a chegada dos
italianos trazendo o cultivo da uva e a produção do vinho; (2) século XX com a
profissionalização do setor; (3) século XXI com a indicação de procedência das regiões
visando promover a diferenciação do produto.
O setor tem enfrentado forte concorrência no mercado interno, principalmente dos
países tradicionais em produção e comercialização internacional de vinhos. Para lidar com
essa ameaça, torna-se preponderante a internacionalização das vinícolas brasileiras, visando
manter sua sustentabilidade no mercado doméstico (Fensterseifer, 2007). A representante do
Wines of Brasil atesta que, atualmente, ou a vinícola brasileira se internacionaliza ou ela
perderá competitividade, inclusive no mercado doméstico, pois o mercado internacional gera
um aprendizado imensurável, fato este que é de amplo reconhecimento por parte dos
representantes das vinícolas conforme os depoimentos coletados.
Com a programação de eventos esportivos internacionais como os Jogos Olímpicos e a
Copa do Mundo de Futebol, além de todo desenvolvimento econômico dos últimos anos, o
país tem chamado atenção dos principais expoentes mundiais. O projeto Wines of Brasil
favoreceu-se deste cenário e realizou diversas ações de promoção comercial no exterior nos
últimos anos (Merguizzo, 2012). De acordo com os entrevistados, as dificuldades enfrentadas
pelo vinho brasileiro no mercado internacional não estão relacionadas à qualidade, mas sim ao
chamado custo Brasil, envolvendo elevados tributos, infraestrutura precária, ausência ou
existência de tratados bilaterais, excesso de intermediadores na comercialização do produto,
barreiras fito-sanitárias e atuação limitada ou precária de instituições governamentais.
9 O Projeto Setorial Integrado [PSI] Wines of Brasil tem sua origem declarada no ano de
2002, porém ainda sob a caracterização de um consórcio de exportação organizado pela
Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul [FIERGS]. Naquele momento era
formado por seis vinícolas (Aurora, Bacardi Martini do Brasil, Casa Valduga, Lovara, Miolo
e Salton) que se agruparam, por intermédio da FIERGS, visando iniciar o processo de
internacionalização por meio de um planejamento, com estudos de mercado e
desenvolvimento de experiências iniciais no mercado externo, principalmente através de
cursos, reuniões, feiras e eventos internacionais.
A partir de 2004, com o apoio da Agência Brasileira de Promoção à Exportação e
Investimentos [APEX], o consórcio de exportação tornou-se um projeto setorial integrado
através de um acordo com o Instituto Brasileiro do Vinho (IBRAVIN), tendo como objetivo
inicial promover o vinho brasileiro no exterior. De acordo com o representante da APEX, essa
mudança ocorreu para dar visibilidade nacional ao projeto e evitar concorrência pela mesma
fonte de recursos para uma mesma indústria dispersa em diversos consórcios regionais ou
locais de exportação pelo país. Park e Ungson (2001) endossam essa visão ao declarar que a
apropriação de recursos é afetada pela interdependência entre os parceiros, tornando-se uma
potencial fonte de conflitos e, por conseguinte, de dissolvição dos relacionamentos.
Em relação à APEX, ela realiza periodicamente pesquisas de mercado para identificar
países atrativos para divulgação e comercialização do vinho brasileiro. Com base nesses
resultados, a equipe do Wines of Brasil e os gestores das vinícolas selecionaram os seguintes
mercados-alvo: Estados Unidos, Alemanha, Suíça, Reino Unido, Austrália, Japão, República
Tcheca, Canadá, Hong Kong, China e Polônia. No entanto, cabe a cada vinícola determinar os
países que tem interesse em desenvolver negócios. Ainda, todas as vinícolas entrevistadas
afirmaram que, em função do apoio financeiro do projeto Wines of Brasil (aluguel e
montagem da estrutura nas feiras comerciais) apenas para os mercados previamente
selecionados, muitas vinícolas preferem atuar onde existe esse benefício.
A estratégia adotada condiz com a visão de Bengtsson e Kock (2000) na qual a
coopetição pode se estabelecer em graus e locais diferentes, sendo que, no geral, as vinícolas
procuram competir nas ações mais próximas dos clientes (área comercial) e cooperam nos
processos mais distantes deles (produção). Nesse ponto, o discurso da representante da
vinícola Aurora resume a mudança de comportamento advinda com o projeto que visa
promover o vinho no mercado internacional: "lá fora a gente se ajuda; aqui dentro a gente se
mata." Ainda, segundo ela, é extremamente importante a troca de informações,
principalmente nas viagens para o exterior: "nessas ocasiões, não predomina o sigilo de
informações; porém no mercado interno a postura é totalmente diferente."
O apoio institucional do Wines of Brasil para as vinícolas participantes inclui subsídio
financeiro para a exposição da empresa em eventos internacionais, estudos sobre os
mercados-alvo, treinamentos relacionados ao mercado internacional externo e acesso aos
convênios com prestadores de serviço para envio de amostras, desembaraço aduaneiro,
passagens aéreas, entre outras atividades relacionadas ao mercado externo (Wines of Brasil,
2012). A entrevistada da Miolo reforça que o projeto permite divulgar a imagem do Brasil
como produtor de vinhos, derrubando um paradigma, além de "surpreender pela inovação, por
criar algo novo, exótico". No entanto, os representantes da Miolo e da APEX mencionam que
uma das falhas mais recorrentes é a tentativa de reproduzir o modelo de comercialização no
mercado doméstico para o mercado internacional. Por outro lado, o entrevistado da APEX
destaca os ganhos a serem obtidos mediante a reprodução do modelo utilizado no mercado
internacional junto ao mercado doméstico. De acordo com a entrevistada da Dal Pizzol, as
exportações aprimoram as práticas da vinícola, capacitando e qualificando a empresa.
10 Contudo, o benefício direto tem sido a melhoria da imagem da marca do vinho,
principalmente no mercado nacional.
Para as vinícolas menores, mencionadas como "vinícolas boutiques" pelo entrevistado
da APEX, o posicionamento adotado deve ser baseado na diferenciação. A entrevistada da
Dal Pizzol ratifica essa estratégia, associando a produção de vinhos exóticos à história e
tradição da família empreendedora, além de buscar obter o potencial de cada tipo de uva, mas
preservando sua identidade original. O representante da APEX corrobora ao mencionar que
deve prevalecer a busca pela identidade do vinho nacional, com suas características
específicas, diferenciando-se dos vinhos europeus, no processo chamado de branding.
Em 2012, o Wines of Brasil contava com 40 vinícolas e tinha como metas um maior
reconhecimento do vinho brasileiro no mercado internacional, aumento do volume de
exportações e do número de exportadores, segundo a gerente geral do projeto. As demais
entidades atuam como capacitadores — ou como o representante do IBRAVIN chama de
parceiros operacionais — entidades de desenvolvimento empresarial como o Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas [SEBRAE], a Secretaria do
Desenvolvimento e Promoção do Investimento Estado do Rio Grande do Sul [SDPI-RS], do
setor vinícola (União Brasileira de Vitivinicultura - UVIBRA e Associação Brasileira de
Enologia - ABE), além da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária [EMBRAPA] e
universidades da região Sul do Brasil.
Para que as relações de coopetição sejam fortalecidas, devem ter motivações,
estratégicas e benefícios que sejam facilmente identificáveis para as contrapartes, além de
mecanismos de solução de conflitos e de definição de responsabilidades (Zineldin, 2004). Não
obstante, a manutenção da relação só ocorrerá mediante ganhos superiores ao agente que não
aderir a qualquer interação coopetitiva e, desde que seja fornecida uma divisão justa dos
resultados (Jarillo, 1988). O representante da vinícola Salton endossa essa premissa ao
mencionar que o projeto permite que pequenas vinícolas alcancem mercados externos que
seriam inatingíveis, principalmente através do Programa Primeira Exportação [PPE] além de
propiciar às maiores vinícolas uma expansão da venda de seus produtos. A entrevistada da
vinícola Miolo diz que o maior apoio prestado entre as firmas do setor ocorre na troca entre as
informações comerciais ─ principalmente sobre feiras ─ e sobre questões burocráticas ─
legislação, exigências de rótulo, etc.Contudo, para o entrevistado da vinícola Don Giovanni,
não basta apenas as vinícolas estarem integradas ao projeto, pois torna-se fundamental que
estejam preparadas para internacionalizar-se.
Essa postura reforça a visão da coopetição em que os agentes (vinícolas maiores e
vinícolas menores) cooperam e competem simultaneamente, porém em áreas distintas
(marketing, comércio exterior e comercialização observa-se cooperação; produção verifica-se
competição), visando gerar benefícios aos envolvidos (criar e disseminar uma identidade do
vinho nacional) através do compartilhamento de recursos e conhecimento para uma posterior
divisão de resultados superior ao ganho isolado (reconhecimento do vinho brasileiro no
mercado externo e retomada de fatia no mercado doméstico).
No entanto, segundo a entrevistada da Dal Pizzol, a cooperação poderia ser maior
mediante a aquisição de insumos como rolhas e garrafas em grande escala, além do pleito em
conjunto pela redução e uniformidade de tributos. Ela salienta que até mesmo para a retirada
do pedido de salvaguarda ─ que vislumbra ampliar o consumo do vinho nacional e reduzir os
tributos incidentes, entre outras benfeitorias ─ não houve uma unanimidade no setor, visto
que existiam acordos específicos entre vinícolas e importadores.
Contudo, para a gerente geral da Wines of Brasil a maior dificuldade do projeto é o
desconhecimento dos consumidores estrangeiros do vinho brasileiro, diferentemente da
11 cachaça, por exemplo, um produto tipicamente nacional e reconhecido no âmbito
internacional. Entretanto, a superação desse desafio, segundo resposta unânime dos
entrevistados, vem gerando benefícios perceptíveis não somente para o mercado externo, mas
também para o mercado doméstico, pois o consumidor brasileiro é de certa forma,
preconceituoso com os vinhos nacionais, caracterizando os vinhos importados como de
melhor qualidade do que os produzidos no Brasil.
Considerando todos os relatos, observa-se que o projeto proporcionou o alcance a todas
vinícolas participantes, independente do porte. Daquelas que iniciaram sua atuação em 2002,
algumas já desfrutam de um estágio mais avançado de internacionalização, como formação de
parcerias internacionais. Porém, mesmo para os casos de início tardio, o Wines of Brasil
possibilitou atingir mercados até então inimagináveis, participando de feiras e eventos
internacionais que têm custos elevados e exigem um alto grau de preparação técnica, o que
não seria viável para as empresas de forma independente. Nesse quesito, a troca de
informações e a integração entre os participantes são propulsores do processo, criando uma
visão única de uma relação sinérgica para o mercado externo. De acordo com a entrevistada
da vinícola Basso, o projeto Wines of Brasil auxilia as vinícolas também pela organização das
rodadas de negócios direcionadas aos objetivos de cada empresa e eventos de marketing,
como degustação de vinhos com a imprensa anterior as feiras.
Apesar do Wines of Brasil ter proporcionado a congregação das vinícolas e entidades
em busca de um objetivo comum – promover o vinho brasileiro no exterior – não se percebe a
adesão uniforme e total das vinícolas que pertencem ao projeto. Todos relatos são unânimes
em caracterizar a alta competitividade da indústria e a dificuldade de estabelecer esforços
conjuntos, motivada principalmente pela gestão familiar e por aspectos culturais da região.
Ainda, segundo o representante da EMBRAPA, o projeto está inserido em uma sociedade que
não está integralmente habilitada, em termos de recursos humanos, financeiros e logísticos. A
resistência, mesmo com todos os incentivos e benefícios mencionados, deve-se a uma
interpretação de um projeto elitista, que privilegia somente as vinícolas maiores, ampliando o
distanciamento com as vinícolas com menor escala de produção.
Independente da percepção sobre o Wines of Brasil, tanto as vinícolas maiores quanto as
vinícolas menores, assim como as instituições, possuem uma compreensão que, se não é
comum, pelo menos é tangente: é primordial vender a marca do vinho do Brasil no exterior
antes de vender o vinho de qualquer vinícola. A representante da vinícola Dal Pizzol reforça a
ideia de coopetição dentro da indústria: "o mercado não sobrevive somente das grandes
vinícolas, pois as pequenas empresas agregam novidades, qualidade, vinhos de nicho." Ela
ainda acrescenta: "primeiro precisa vender a marca do vinho brasileiro no exterior,
derrubando o preconceito, mas não consegue-se fazer isso de forma isolada."
Posto isto, denota-se que a coopetição oferece recursos para firmas com fortes
limitações e representa um veículo para entrada em mercados que, de outra maneira, a firma
não estaria apta a acessar. Contudo, segundo Zineldin (2004), firmas menores podem ter
pouco para contribuir para um relacionamento coopetitivo devido sua incipiência
organizacional em termos de aprendizado e conhecimento. Ademais, firmas de menor porte
têm maior risco de dependência dos benefícios gerados pelo relacionamento, tornando-se
refém dessa estratégia, com o agravante da maior facilidade de apropriação dos recursos e do
aprendizado pelas firmas com maior capacidade instalada (Osarenkhoe, 2010).
12 Considerações Finais
Na busca de visualizar os relacionamentos de coopetição na indústria vinícola da Serra
Gaúcha, o presente estudo procurou apresentar brevemente o setor vitivinícola do Rio Grande
do Sul através da obtenção de discursos de entidades e vinícolas de diferentes porte e estágios
de internacionalização. Constata-se que existem poucas fontes disponíveis acerca do tema,
concentrando-se nos materiais desenvolvidos pelo IBRAVIN, como os relatórios da
instituição e o Anuário dos Vinhos do Brasil.
O estudo permitiu constatar, ao longo da revisão da literatura e das entrevistas,
evidências de relacionamentos de coopetição entre as firmas, mesmo em uma indústria
caracterizada por intensa competitividade, tanto no mercado doméstico quanto no cenário
internacional. Aplicando o modelo de Chin, Chan e Lam (2008) na indústria vitivinícola,
identificam-se os seguintes participantes: (i) competitivo: vinícolas maiores que são
internacionalizadas, mas que não utilizam de estratégias colaborativas. Apesar de não
cooperarem, mantêm elevado nível de competitividade, como duas únicas vinícolas
exportadoras não integrantes do Wines of Brasil; (ii) isolado: vinícolas menores, que não
participam do Wines of Brasil, possuindo comportamento passivo com demais vinícolas, tanto
em nível de competição quanto em nível de cooperação; (iii) parceiro: vinícolas menores,
integradas ao Wines of Brasil, que buscam ganhos de sinergia e aprendizado, focando em
nichos de atuação para evitar a competição com vinícolas maiores; (iv) adaptativo: vinícolas
com maior nível de desenvolvimento, internacionalizadas e participantes do Wines of Brasil,
que almejam uma melhora de seu desempenho através da coopetição.
Quanto aos entrevistados, observa-se que as vinícolas já obtiveram benefícios com a
participação no projeto, tendo em vista que muitas empresas só tiveram acesso às feiras
internacionais e rodadas de negócio pela articulação do IBRAVIN junto aos órgãos
financiadores e representantes do governo federal no exterior. Ainda, o projeto Wines of
Brasil tem aproveitado a imagem positiva do Brasil no exterior e o interesse pelo país em
função dos eventos esportivos para desenvolver uma série de ações promocionais do vinho
brasileiro, aproximando especialistas e jornalistas estrangeiros das vinícolas nacionais.
Apesar da iniciativa partir de entidades institucionais, as interações coopetitivas entre
os participantes tem criado a chamada vantagem coopetitiva (Padula & Dagnino; 2007). Isso
difere da orientação focada na vantagem competitiva que visa ganhos individuais e
comportamento egoísta por parte dos agentes (Porter, 1985). As empresas cooperam para criar
valor, mas competem para dividir os resultados, criando um novo contexto em que os agentes
têm que cooperar e competir para sobreviver. No caso do setor vinícola, essa situação aplicase somente ao mercado externo, já que no mercado interno ainda prevalece a competição.
Sendo assim, a cooperação não exclui a existência de pressões competitivas (Padula &
Dagnino; 2007).
A colaboração competitiva reduz custos, riscos e incertezas associadas com inovação
ou desenvolvimento de novos produtos durante o processo de internacionalização. Na maioria
das vezes, é muito oneroso para uma firma desenvolver e penetrar em um mercado sozinha
(Luo et. al., 2006). Para as firmas do setor, a tecnologia não é um fator restritivo, porém a
colaboração permite acessar mercados e ampliar o conhecimento no âmbito comercial.
Ademais, a coopetição permite enfrentar ameaças e dificuldades institucionais, principalmente
as originadas das diferenças entre os ambientes doméstico e estrangeiro (Luo, 2005).
Contudo, a rivalidade entre os participantes da rede aumenta o risco de oportunismo,
sendo necessário criar regras adicionais de governança, acarretando custos de transação.
Verschoore (2004) salienta a dificuldade em lidar com uma rede heterogênea que desenvolve
13 diferentes expectativas, objetivos e estilos de administração. Entre as vinícolas, observa-se a
competitividade acirrada no setor, que não faz distingue a diferença entre as firmas.
Apesar do caso apresentado ter sido discutido à luz da teoria, este estudo apresenta
limitações a serem consideradas e indicações de pesquisas futuras: (a) entrevistou-se um
número limitado de vinícolas e entidades do projeto Wines of Brasil da Serra Gaúcha, que
possuem constante atuação nos projetos desenvolvidos pelo grupo, mas seria interessante
complementar o estudo nas demais regiões para confirmar o resultado positivo encontrado;
(b) o ambiente coopetitivo envolve dinamismo e, por conseguinte, mudanças nas relações
entre os agentes que, assim como o mercado, não permanecem estáticos; (c) torna-se relevante
verificar a aplicabilidade de outros modelos de estratégias de relacionamento entre os
participantes da indústria vitivinícola.
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Aderência e Dissonâncias às Estratégias de