CIÊNCIA
POLÍTICA
PARA
O CURSO DE ADMINISTRAÇÃO
Ailton Guimarães
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Mestre em Economia de Empresas pela UCB - Universidade Católica de Brasília; Especialista
em Finanças pela UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina e Especialista em
Controladoria pela Faculdade Tibiriçá/SP.
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SUMÁRIO
1. PARTE I - CAPÍTULO 1, página 2.
Significado e objeto da Política.
Evolução Histórica do Pensamento Político.
Pensamento Político Contemporâneo.
2. PARTE I - CAPÍTULO 2, página 22.
Evolução Histórica do Pensamento Político.
Grécia. Roma. Maquiavel.
Maquiavel e a Administração.
Pensamento Político Contemporâneo.
3. PARTE I - CAPÍTULO 3, página 49.
Poder e sociedade. Conceito de poder.
Tipos e fontes de poder.
Maquiavel e o poder político.
Legitimidade e legalidade do poder político.
Teoria das elites. As elites e o poder.
4. PARTE I - CAPITULO 4, página 62.
Concepção e evolução de Estado.
O Estado Moderno.
Teorias sobre a origem do Estado.
Burocracia. Burocracia e poder.
A estrutura burocrática das empresas capitalistas.
5. PARTE II - CAPITULO 5, página 72.
Política, poder e Administração.
Liderança e poder.
Dependência, a chave do poder. Táticas de poder
O poder em ação, o comportamento político.
6. PARTE II - CAPITULO 6, página 80.
Teorias contratualistas.
Economia Política.
Poder político e o poder econômico.
Intervenção do Estado na economia.
7. PARTE II - CAPITULO 7, página 100.
Teoria dos jogos. História. Conceitos. Importância.
Teoria da escolha Racional.
O poder do eleitor.
Teoria das votações.
Teorema do eleitor mediano.
O jogo do apadrinhamento.
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CAPITULO I
O que veremos neste capítulo:
 Significado e objeto da Política.
 Evolução Histórica do Pensamento Político.
 Pensamento Político Contemporâneo.
“O homem é um animal político”
Aristóteles
1. Introdução
O estudo da ciência política permite-nos conhecer o exercício e
organização do poder em uma sociedade. Além disso, através desta ciência
social, podemos ver como acontece a distribuição e transferência de poder em
processos de tomada de decisão.
Estes processos de distribuição e transferência de poder
envolvem, normalmente, interesses contraditórios, e a ciência política é o veiculo
apropriado para entendermos estes processos.
A ciência política faz parte das ciências humanas, pois analisa o
Estado, a soberania, a hegemonia, os regimes políticos, os governos, as linhas
históricas destas partes da política nos países desde a antiguidade até hoje e a
influência que têm sobre a sociedade incluindo as Relações internacionais. É
frequentemente um exemplo aplicado na Teoria dos jogos e sob este prisma
podemos avaliar os ganhos - como o lucro privado de pessoas ou das empresas
ou da sociedade (o desenvolvimento econômico) - e as perdas - como o
empobrecimento de pessoas ou da sociedade (Corrupção política) - como
resultados de uma luta ou de um jogo em que existem regras não explícitas que
a pesquisa deve explicitar.
A ciência política tem relação com diversos campos do
conhecimento, como os sistemas políticos, ideologia, teoria dos jogos, economia
política, geopolítica, análise de políticas públicas, relações internacionais,
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análise de relações exteriores, estudos de administração pública e governo,
processo legislativo e outros.
2. Definição
O termo ciência política foi cunhado em 1880 por Herbert Baxter
Adams, professor de História da Universidade Johns Hopkins. Significa o estudo
da política.
Mas o que é política?
Segundo Dias (2011), a definição do termo política foi dada
pelos gregos. Este povo vivia em cidades ou estados conhecidos como polis. Do
termo polis vem os adjetivos "politiké" (política em geral) e "politikós" (dos
cidadãos, pertencente aos cidadãos).
Ainda segundo Dias, o termo política é usado também para
representar uma atividade ou conjunto de atividades que tem como referência a
polis ou, em outras palavras, o Estado.
Max Weber, citado por Dias (2011), diz que o conceito da
palavra política é bastante amplo e abrangente. O termo pode ser usado para
indicar a política de desconto de um banco, política de greve de um sindicato,
política da diretoria de uma associação e, até, da política de uma esposa para
controlar o marido. Para Weber, política é o conjunto de esforços feitos com
vistas a participar ou influenciar a divisão do poder.
Política também significa a arte ou ciência da organização,
direção e administração de nações ou Estados. Nesse sentido temos a política
interna - aplicação desta ciência aos negócios internos da nação - e política
externa - referente aos negócios externos.
2.1 Outros significados
No sentido mais simples, política representa a arte de guiar ou
influenciar o modo de governo pela organização de um partido político, pela
influência da opinião pública, pela aliciação de eleitores.
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Para Hobbes, política consiste nos meios adequados à obtenção
de qualquer vantagem.
Já Rousseau, ensina que política é o conjunto dos meios que
permitem alcançar os efeitos desejados.
Enquanto que para Maquiavel, política é a arte de conquistar,
manter e exercer o poder, o governo.
Política pode ser ainda a orientação ou a atitude de um governo
em relação a certos assuntos e problemas de interesse público: política
financeira, política educacional, política social, política do café com leite.
Dos diversos significados podemos inferir que política pode ser
entendida como tudo aquilo que acontece nas relações sociais e que envolve
poder. Sendo assim, os conceitos mais apropriados para o nosso curso são:
1) Política é a arte ou ciência da organização, direção e
administração de nações e Estados;
2) Política é o conjunto de esforços feitos com vistas a participar
ou influenciar a divisão do poder.
Dessa forma, podemos relacionar a política e suas aplicações
nos negócios privados (empresas) e reescrever:
Política significa a arte ou ciência da organização, direção e
administração de nações ou Estados e empresas.
2.2 Objeto da ciência política
Em 1948 a UNESCO – Organização para a Educação, a
Ciência, e a Cultura das Nações Unidas – promoveu um encontro entre
cientistas políticos com o objetivo de estabelecer o objeto da disciplina Ciência
Política. Duas posições se destacaram:
1) a que defendia que a ciência política tem como o objeto do
estudo o poder; e.
2) a que defendia que o objeto de estudo da ciência política é o
Estado.
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Não havendo consenso, a UNESCO elaborou um rol de objetos
de estudos. Estes objetivos foram divididos em quatro grandes áreas. Vejamos:
Área I – Teoria política
a) Teoria política
b) História das idéias políticas
Área II – Instituições políticas
a) A constituição
b) O governo central
c) O governo regional e local
d) A administração pública
e) As funções econômicas e sociais do governo
Área III – Partidos Grupos e Opinião Pública
a) Os partidos políticos
b) Os grupos e associações
c) A participação do cidadão no governo e na administração
d) A opinião pública
Área IV – As relações internacionais
a) A política internacional
b) Os organismos internacionais
c) O direito internacional
Esta sugestão da UNESCO não esgota os objetos de estudo da
ciência política, pois muitos autores apontam outros focos de observação.
3. Sistema político
Um sistema político é definido por Robert Dahl, citado por Dias
(2011), como qualquer padrão permanente de relações humanas que implique
de maneira significativa, em poder, governo ou autoridade.
Este sistema tem as seguintes características:
a) Controle desigual dos recursos políticos
Recurso político é meio pelo qual uma pessoa consegue influenciar o
comportamento de outras pessoas. Em geral os recursos políticos -
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representados por dinheiro, informação, alimento, empregos, amizade, posição
social, direito de elaborar leis ou votos - são distribuídos de maneira desigual.
b) Busca de influência política
A busca da influência política acontece quando um membro do sistema procura
adquirir controle sobre as diretrizes, regras e decisões determinadas pelo
governo.
c) Distribuição desigual da influência política
A distribuição desigual da influência política, em geral, está relacionada com o
controle desigual ou o uso eficiente dos recursos políticos.
d) Objetivos conflituosos
Conflito e consenso são aspectos presentes e importantes de qualquer sistema
político, pois os membros do sistema nem sempre tem os mesmo pensamentos.
e) Aquisição de legitimidade
A legitimidade é o meio pelo qual os líderes de um sistema político procuram
transformar sua influência em autoridade. A legitimidade pode ser conseguida
por meio da força, mas também por meio da convicção.
f) Desenvolvimento de uma ideologia
Ideologia é um conjunto de doutrinas (princípios). Nos sistemas políticos,
normalmente os líderes procuram desenvolver ou adotar uma ideologia para
legitimar sua liderança.
g) Impacto de outros sistemas políticos
O comportamento de um sistema político é, em geral, influenciado pela
existência de outros sistemas políticos.
h) Influência da mudança
O comportamento de um sistema político é, em geral, influenciado pela
existência de outros sistemas políticos.
4. As origens do pensamento político
È consenso entre os estudiosos da ciência política que a Grécia
é o berço do pensamento político. A política tinha uma importância muito grande
para os gregos e é lá que surgem os primeiros mestres desta ciência.
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4.1 Os sofistas
Os primeiros mestres ou especialmente o primeiro grupo de
pensadores políticos foram os sofistas.
Sofística era originalmente o termo dado às técnicas ensinadas
por um grupo altamente respeitado de professores retóricos na Grécia antiga.
Protágoras, Górgias e Prodico foram os principais expoentes deste grupo de
pensadores que defendia a ideia de que o homem é a medida de todas as
coisas e que cada individuo podia definir, de acordo com suas crenças, o que
era direito.
Esta ideia expressa o sentido de que o ser humano não deve
adequar-se aos padrões estabelecidos sem contestação, mas sim moldar-se
segundo a sua liberdade.
Os sofistas são considerados os primeiros advogados do
mundo, pois cobravam de seus clientes (discípulos) para efetuar suas defesas,
dada sua alta capacidade de argumentação.
4.2 Platão
Platão é considerado um dos primeiros filósofos políticos. As
idéias de Platão sugerem que as pessoas devem se sujeitar a um governo
composto dos melhores indivíduos.
Platão considerava que a política como a arte de tornar os
homens mais justos e virtuosos.
Sua obra mais importante é “A república” (Escreveu também “O
político e As leis”.) onde defende que a autoridade governamental tem que estar
associada à cultura e ao conhecimento mais amplo, e que o filosofo deve ser o
homem de Estado.
4.3 Aristóteles
Aristóteles foi discípulo de Platão. Entretanto, difere bastante do
mestre no que diz respeito ao método e os pontos de vista sobre o sistema
político.
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Aristóteles defendeu a ideia de que a ciência política tem como
principal objetivo a busca do bem estar comum. Neste sentido, o Estado é o
meio adequado para satisfazer as necessidades intelectuais e morais dos
homens. Somente através do Estado o homem poderia alcançar seus fins
essenciais. Para ele o homem era um animal político (zoon politikón). Fora da
vida social o homem seria considerado uma besta.
Para Aristóteles cada individuo teria sua função no Estado
segundo suas aptidões. Assim, os homens aptos para governar seriam aqueles
dotados de altas condições espirituais. Os que tinham somente vigor físico e
pouca cultura não poderiam governar. Desta forma a escravidão seria útil e
benéfica para todos.
Segundo Aristóteles há uma diferença clara entre Estado e
governo. O Estado é representado pelo total dos cidadãos, enquanto o governo
é o exercício daqueles que, ocupando os postos públicos e detendo o poder,
ordenam e regulam a vida dos outros.
5. Maquiavel
Além dos clássicos gregos muitos autores contribuíram para o
desenvolvimento da ciência política. No entanto, cabe destacar os ensinamentos
Nicolau Maquiavel.
A partir de sua obra “O Príncipe” a política passa a ser
entendida como um conjunto de técnicas, táticas e estratégias em função do
poder.
6. Karl Marx
Marx também dá uma importante contribuição à teoria política
com sua visão materialista da história. Para Marx, os fatores econômicos
determinam as mudanças na vida das pessoas.
7. Os contratualistas
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Hobbes, Locke e Rousseau também são importantes fontes de
estudo de política, principalmente no que se refere a constituição do Estado.
8. A igreja e a concepção do Estado
Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino são os pensadores
cristãos que mais se destacaram no estudo do poder político, em especial no
estudo do poder político.
Bibliografia
Dias, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Editora Atlas, 1ª ed. 2011.
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Textos para discussão
Política e Gestão Empresarial
Gutemberg B. de Macêdo - 29.10.2010 - http://www.oprincipiodasabedoria.com/?p=312
“Se você deseja uma descrição de nossa era, eis aqui uma: a civilização dos
meios sem os fins; opulenta em meios para além de qualquer outra época, e
quase para além das necessidades humanas, mas esbanjando-os e utilizandoos mal porque não possui nenhum ideal soberano; um vasto corpo com uma
alma esquálida.” R. W. Livingston, 1880-1960 - Escritor inglês
O conhecimento e a prática da ciência política nos dias atuais é imprescindível e
insubstituível. Nenhum profissional deveria se abster, sob qualquer justificativa,
de exercer os seus deveres de cidadãos em todos os instantes de sua vida. E,
mais importante ainda, nenhum profissional, por mais preparado que seja,
deveria assumir uma posição de liderança se não a conhecesse e a dominasse
em profundidade.
A ausência desse conhecimento e de sua prática no dia-a-dia de suas atividades
é a responsável pelo avanço dos maus políticos e das políticas governamentais
comprovadamente equivocadas.
Eis alguns dos motivos:
1 - O homem é um ser eminentemente político. Portanto, o profissional que não
se ocupa do estudo e da prática da ciência política, já tomou a decisão política
de que gostaria de ter-se poupado: serve a classe política dominante e contribui
para a proliferação e avanço de pseudos líderes – governantes despreparados,
populistas e corruptos.
2 - A intervenção dos governantes em todos os campos das atividades
humanas. Nesse caso, quando tremendos poderes se concentram nas mãos de
alguns poucos políticos e nenhum profissional é capaz de compreender as
conseqüências desastrosas dessa tendência, a sociedade está prestes à
mergulhar num sistema ditatorial sem que ao menos percebam. [...]
3 - A maioria absoluta dos brasileiros jamais leu ou estudou a constituição de
seu país. São cidadãos cegos e fáceis de serem manipulados. Eles não sabem
quais são os seus verdadeiros deveres e direitos constitucionais. E, por não
saberem quais são eles, se tornam cidadãos de terceira categoria e sujeitos a
serem influenciados e governados por políticos corruptos, despreparados,
mentirosos e populistas.
4 - O Brasil está enterrando rápida e sorrateiramente todos os seus valores, se é
que eles existiram algum dia ao longo de sua história republicana. A avaliação
internacional do povo brasileiro, na questão de ser capaz de perceber a
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corrupção, e de se insurgir contra ela, chega a ser constrangedora e vergonhosa
para homens e mulheres com princípios éticos e morais. [...]
5 - É um erro muito comum entre os cidadãos de acreditar que aqueles que
fazem mais barulho ao se lamentar a favor do público sejam os mais
preocupados com o seu bem-estar. Na verdade, a maioria deles se vale da
causa alheia para defender, proteger e manter os seus interesses pessoais e
mesquinhos. R. Hooker, teólogo anglicano, 1554-1600, “Of the Laws of
Ecclesiastical Polity”, I, 1, escreveu: “Quem tenta convencer uma multidão de
que ela não está sendo tão bem governada como deveria, nunca deixará de ter
ouvintes atentos e favoráveis.”
6 - Aqui, vale lembrar as sábias palavras do político alemão e o grande líder da
resistência alemã ao nazismo, Konrad Adenauer, 1876-1967, “É muito
importante que a tarefa da oposição seja exercida por um grande partido, fixado
em bases democráticas”… Considero que uma boa oposição num parlamento
seja uma necessidade absoluta; sem uma oposição realmente boa, cria-se
acescência e esterilidade. Infelizmente, no Brasil não há oposição e, mais triste
ainda, o Congresso Nacional se tornou um grande balcão de negócios e Brasília,
um grande shopping center de barganhas políticas fétidas.
À luz dessas considerações, qual o caminho proposto às empresas e aos seus
profissionais?
Primeiro – Colocar os holofotes sobre os reais problemas do país que são bem
diferentes dos comumente propalados pelos governantes na televisão. Estamos
muito mal colocados no ranking de desenvolvimento humano e qualidade de
vida e assistimos passivamente a deterioração, obsolescência e
desindustrialização do país, enquanto outros países estão se desenvolvendo
rapidamente.
Segundo – Promover a valorização da educação e do conhecimento em todos
os níveis sociais como únicas fontes de emancipação da mente. Quem leu a
entrevista dada pelo reitor da Universidade de São Paulo à revista Veja, 27 de
outubro de 2010, deve ter ficado assombrado como algumas de suas
afirmações: “Nossas universidades ainda são medievais perto das novas
exigências;” “O ensino superior no Brasil está hoje em nível semelhante ao dos
Estados Unidos um século atrás,” entre tantas outras.
Terceiro – Empresários e executivos deveriam promover em suas empresas
cursos sobre a ciência política, a fim de afastar de seu meio a ignorância, a
influencia de líderes sindicais corruptos, autoritários, truculentos e sem nenhum
compromisso com a democracia.
Quarto – Empresários e executivos não deveriam ficar passivos diante dos
discursos demagógicos de líderes políticos e sindicais que pregam um
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socialismo barato e de fachada. E, além disso, atribuem todos os males da
sociedade moderna ao capitalismo. É bom frisar, não existe desenvolvimento,
progresso, inovação e sustentabilidade sem riqueza. [...]
Quinto – Promover a competição entre todos os setores da economia é vital
para o desenvolvimento do país. A sociedade não pode continuar pagando
impostos para pagar salários e benefícios a uma classe de profissionais que
pouco contribui para o aprimoramento das instituições públicas e dos serviços
que prestam. Estão aparelhando o estado e inchando a máquina do governo e
ela se apresenta cada vez mais ineficiente. Mas poucos falam contra esse
desmando. Continuamos como nos dias do jurista Rui Barbosa a procurar os
cargos para os homens e não os homens para os cargos.
O melhor exemplo que encontrei na história foi dado pelo general Robert Wood
Johnson, ex-Chief Executive Officer da Johnson & Johnson, que diante dos
problemas que assolavam os Estados Unidos em seus dias, implementou em
sua organização, na década de quarenta, um programa de consciência e
preparo político para todos os seus colaboradores. A sua premissa era:
“No man in business can be successful unless he has some knowledge of
practical politics.” (Nenhum homem poder ser bem sucedido no mundo dos
negócios a menos que tenha algum conhecimento prático de política)
13
O homem e a máquina
Cristiane Mano - São Paulo – Revista Exame – Edição 1.005 – 30.11.2011. pág.
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Mesmo para os padrões brasileiros, poucas vezes na história os políticos
causaram tanta repulsa — mais do que justificada, diga-se — quanto agora. A
sequência de escândalos de corrupção já derrubou cinco ministros da presidente
Dilma Rousseff, o sexto está cada vez mais enrolado em suas próprias mentiras
e, agora, a bolsa de apostas se sofisticou — especula-se não somente quais os
próximos da lista mas também a ordem com que seguirão para o cadafalso.
Brasília nunca mereceu tanto a alcunha de ilha da fantasia, um lugar onde
uma minoria parece conspirar diariamente para sugar o dinheiro de quem
trabalha. Tudo, lá, opera a favor do “malfeito”, para usar uma expressão cara à
presidente. Temos quase 40 ministérios. Quase 1 milhão de pessoas trabalham
para o governo federal, das quais 20 000 são apadrinhadas nos chamados
“cargos de confiança”.
O orçamento do governo federal é de invejáveis 2 trilhões de reais, o que
faz do mandatário brasileiro uma das pessoas que mais movimentam recursos
em todo o mundo. Essa montanha de dinheiro circulando num ambiente de
pouca transparência, em meio a um sistema político sedento por recursos, só
podia dar no que deu.
O Brasil é o 69º país mais corrupto da atualidade, segundo um ranking
elaborado pela ONG Transparência Internacional. Temos uma das maiores
cargas tributárias do mundo — sem que isso se materialize em serviços públicos
de padrão digno. No relatório mais recente do Banco Mundial, divulgado em
julho, o Brasil aparece na posição 136 entre 142 nações analisadas no quesito
de qualidade de gastos do governo.
O orçamento trilionário do governo é incapaz de financiar uma
infraestrutura compatível com o tamanho de nossa economia. A máquina pública
brasileira suga muito e devolve pouco, dando um exemplo de improdutividade e
ineficiência que extrapola os limites das repartições, impõe travas ao
crescimento e não serve o cidadão.
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Mais de 15 anos atrás, o Brasil conseguiu vencer a instabilidade
econômica, com as consequências que todos nós conhecemos. Agora, parece
ser consenso que um novo salto do país só será possível se conseguirmos
vencer o enorme desafio da melhoria da gestão pública. “O Brasil que
estabilizou a moeda e voltou a crescer se vê obrigado, agora, a se tornar mais
eficiente”, diz o cientista político Murillo de Aragão.
Hoje, o rosto que melhor personifica essa busca é o do empresário Jorge
Gerdau Johannpeter. Durante 56 anos de trabalho na iniciativa privada, Gerdau
ajudou a construir o 12º maior grupo empresarial brasileiro, um conjunto de
empresas ligadas à área siderúrgica espalhadas hoje por 14 países, com 45 000
funcionários e um faturamento global de 37 bilhões de reais.
Sua trajetória e sua estatura como homem de negócios o colocaram na
categoria de ministeriável. Recusou todos os convites. No último deles, porém, a
conversa tomou um rumo diferente. O diálogo se deu em novembro do ano
passado, num encontro a portas fechadas com Dilma, no escritório do governo
de transição no Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília.
Durante a reunião, Gerdau rabiscou o esboço do modelo que poderia
levá-lo à equipe da presidente. De acordo com o modelo, Gerdau seria parte de
uma espécie de conselho consultivo para projetos de melhoria da gestão
pública. “Anotei algumas ideias e ela pediu para ficar com o papel”, diz.
Ali surgiu o embrião do que se tornou, em maio deste ano, a Câmara de
Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade. Presidida por Gerdau, a
câmara é formada por representantes do governo e do setor privado. De um
lado, estão quatro ministros — Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, Guido Mantega,
da Fazenda, Miriam Belchior, do Planejamento, e Fernando Pimentel, do
Desenvolvimento.
De outro, o ex-presidente da Petrobras Henri Philippe Reischtul, o
presidente da Suzano Papel e Celulose, Antonio Maciel Neto, e o empresário
Abilio Diniz, presidente do conselho de administração do Grupo Pão de Açúcar.
Nenhum deles recebe remuneração pelo trabalho.
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Há pouca coisa que une a rotina do Gerdau empresário à do Gerdau que
circula por Brasília. À frente dos negócios, suas decisões significavam execução.
No governo é diferente. À frente da câmara, Gerdau não tem autoridade para
mudar o que bem entender.
Não pode demitir quem se recusar a seguir os planos ou premiar os
melhores desempenhos nem tem mandato para decidir livremente o escopo de
atuação do grupo. O foco do trabalho da câmara foi definido por Dilma ainda em
2010 e se concentrou nos ministérios da Saúde e dos Transportes, na Infraero e
nos Correios.
Até agora, o grupo realizou sete reuniões oficiais no Palácio do Planalto
— mas Jorge Gerdau já participou de quase uma centena de encontros com
ministros e secretários de governo para discutir a importância e a necessidade
de mudanças. Algumas medidas práticas, que contaram com o apoio de
consultorias como McKinsey, Accenture e o INDG, do especialista em gestão
Vicente Falconi, já começam a sair do papel.
Uma das metas mais ambiciosas está nos Correios — entre aumento de
receita e corte de custos, os ganhos previstos são de 1,5 bilhão de reais por
ano. Os resultados, segundo os planos da câmara, começarão a aparecer em 18
meses. Outro projeto busca formas de reduzir a burocracia para licitação e
execução de obras em rodovias e ferrovias.
“É um modelo inédito de coope­ração que nos permite perseguir metas
objetivas”, diz a ministra Gleisi Hoffmann, uma das principais interlocutoras de
Gerdau no governo. “A presidente Dilma tem acompanhado de perto os
resultados.”
Hoje, a câmara vale mais pelo simbolismo do que pelos resultados. Numa
visão otimista, ela seria, antes de mais nada, o reconhecimento de que
mudanças precisam ser feitas, o primeiro passo para a ação. Não é pouca coisa,
mas também não é garantia de nada.
“No Brasil, o governo federal é o reino da rigidez”, diz o economista Raul
Velloso, especialista em contas públicas. “Executar mudanças expressivas
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nesse contexto é um trabalho heroico.” É evidente que Gerdau sabe disso. A
máquina que ele quer ajudar a trabalhar tem, sim, funcionários comprometidos.
Mas também está impregnada de gente que, por interesses pes-soais ou
políticos, prefere que as coisas continuem exatamente como estão. E elas vão
resistir. Gerdau sabe, ainda, que o sucesso de seu grupo depende da entrega
de resultados nos próximos meses e anos — e do impacto que eles provocarão
na opinião pública e, consequentemente, no meio político.
“A burocracia é lenta. Exige paciência, insistência”, diz Gerdau. “Mas os
resultados são tão grandes e tão fantásticos que vale a pena insistir. Esse
movimento pode mudar o Brasil."
Notas aos políticos
Prestes a completar 75 anos de idade, Gerdau baseia sua confiança nas
experiências que vem colecionando nos últimos anos com governos estaduais e
municipais. Seu trabalho pela melhoria da gestão pública começou em mea-dos
dos anos 2000 e se intensificou a partir de janeiro de 2007, quando transferiu a
presidência executiva do grupo Gerdau a seu filho, André.
Foi quando passou a buscar recursos e apoio de outros empresários para
sustentar projetos de aumento de eficiência da máquina. O ceticismo, tanto de
homens de negócios quanto de políticos, era enorme. “Muita gente não
acreditava que pudesse dar certo”, diz Beto Sicupira, sócio da AB Inbev, o
primeiro empresário a acompanhar Gerdau nas conversas com governadores.
Os dois se conheceram por meio de um amigo em comum, o consultor
Vicente Falconi, com quem ambos trabalhavam havia mais de duas décadas. As
primeiras visitas a políticos interessados num choque de gestão, como Aécio
Neves, então governador de Minas Gerais, e Eduardo Campos, de Pernambuco,
sempre eram feitas pelo trio.
Para escolher aqueles que mereciam uma segunda visita, Gerdau,
Falconi e Sicupira criaram um sistema de notas que iam de zero a 100, de
acordo com o interesse do político e as chances de sucesso. “Não voltávamos a
conversar com quem recebia nota abaixo de 70”, diz Falconi.
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Um dos governadores visitados ganhou nota zero após uma experiência
que beirava o patético. “Fomos recebidos pela televisão local”, diz Falconi. “O
governador pensou que o Gerdau tinha ido até lá para anunciar investimentos e
não entendeu nada daquele discurso todo sobre gestão eficiente.”
Hoje, Jorge Gerdau e seu grupo têm a seu favor os números. Mais
precisamente 14 bilhões de reais em ganhos com aumento de receita e corte de
despesas em programas de choque de gestão realizados em 11 governos
estaduais e oito municípios. Trata-se de um retorno de quase 200 vezes o valor
investido nos projetos de consultoria — boa parte dele financiada por mais de
200 empresários.
“Em vez de insistir no embate puro e simples entre empresa e Estado,
Gerdau construiu uma parceria em busca de soluções práticas numa proporção
inédita”, diz Elcior Santana, responsável pela área de gestão pública do Banco
Interamericano de Desenvolvimento, que estuda levar o modelo para outros
países da América Latina.
A aproximação com diversas esferas do poder, ao contrário do que pode
parecer, é quase sempre um trabalho duro e sem glamour. Gerdau já chegou a
visitar até quatro governadores num intervalo de dois dias. Recentemente,
chegou às 8 da noite e saiu a 1 hora da manhã de um jantar em Londrina, no
interior do Paraná, para arrecadar verbas para projetos de melhoria de
efi-ciência na prefeitura.
Um leiloeiro de gado foi chamado para animar os cerca de 400
convidados que fecharam uma cota de 2,6 milhões de reais, suficiente para
cobrir todos os custos com o início do projeto. (Estima-se que, nos últimos cinco
anos, o carioca Jorge Gerdau tenha colocado mais de 15 milhões de reais de
seu próprio dinheiro em projetos de Porto Alegre, sua cidade por adoção.)
Mesmo depois de assumir a dianteira da câmara de políticas de gestão do
governo federal, ele faz questão de marcar o primeiro encontro pessoalmente
com novos interessados em montar programas de choque de gestão. Em
dezembro, tem previsto em sua agenda um encontro com o prefeito de Criciúma,
em Santa Catarina.
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“Em geral, a aproximação entre empresários e o setor público acontece
muito mais para prestígio mútuo do que para a obtenção de resultados práticos”,
diz Sicupira. “Com o Gerdau é diferente.”
Boas ideias na gaveta
Encarar o trabalho na administração federal é encarar o risco de
frustração. Há anos, Gerdau tenta reproduzir em Brasília pelo menos parte do
sucesso obtido em algumas cidades e estados do país.
Em 2007, estudos para a reestruturação do sistema de Previdência Social
apontaram ganhos de até 50 bilhões de reais em quatro anos — num projeto
que incluía um amplo esforço para acabar com as fraudes na área. A proposta
esbarrou em alas mais resistentes do governo e nunca foi levada adiante.
Um ano depois, outro projeto propôs a redução de 2 bilhões de reais de
custos em diversos ministérios, numa ação coordenada pela pasta do
Planejamento. A meta também nunca foi atingida. “Temos uma tradição de
ministérios encastelados, que funcionam sob a lógica de um jogo de poder
extremamente complexo”, diz Aragão.
Tradução: para não perder apoio no Congresso, os presidentes
costumam simplesmente deixar na gaveta os projetos que confrontem a base
aliada, instalada em ministérios loteados. Dilma fugirá dessa armadilha?
Uma conjunção de fatores, acredita Gerdau, pode tornar o momento atual
mais favorável a mudanças. Um deles, que facilitou o avanço da conversa com a
presidente no final do ano passado, é a proximidade entre os dois. Ambos se
conheceram nos anos 80, quando Dilma ocupou a Secretaria Municipal da
Fazenda de Porto Alegre, no governo de Alceu Collares.
Mas foi entre 2003 e 2010, período em que ela presidiu o conselho de
administração da Petrobras (do qual Gerdau faz parte desde 2001), que os dois
encontraram afinidades. “Tivemos uma relação muito próxima. As reuniões eram
mensais e duravam até 7 horas. Percebemos que tínhamos opiniões
convergentes sobre temas de gestão”, diz Gerdau.
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O relacionamento evoluiu para um contato frequente — hoje, eles se
falam pelo menos uma vez por semana, pessoalmente ou por telefone. “Ela quer
saber o tempo todo como está o andamento dos projetos, quais são as
dificuldades e está sempre pronta para resolver”, afirma Gerdau.
Um dos exemplos mais recentes diz respeito à burocracia na contratação
de consultorias envolvidas nos projetos — que quase sempre esbarram em
lentos e ineficientes processos de licitação.
Segundo Gerdau, ao perceber o problema, Dilma decidiu fechar os
contratos de maneira centralizada na Presidência, num processo que exigiu um
trâmite já aprovado na Procuradoria-Geral da União. “Há uma evolução cultural
em torno do tema da gestão pública”, diz o empresário. “Noto que as portas
estão abertas para avançar.”
Para os políticos, as portas se abrem na medida em que os votos se
multiplicam. E esse talvez seja o maior dos trunfos de Gerdau e seus
companheiros. O choque de gestão promovido em Minas Gerais fez com que
Aécio Neves fosse eleito por duas vezes governador do estado e ainda fizesse
seu sucessor, Antonio Anastasia.
Em Pernambuco, outro estado a perseguir metas de eficiência, Eduardo
Campos reelegeu-se com mais de 80% dos votos válidos. É o que Jorge Gerdau
chama de “contrato inteligente”. “Com resultados assim, alguns começam a ver
esses projetos como oportunidade, não como ameaça”, diz o conselheiro
Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano.
Confiança mútua é fundamental para a lógica de interação desenvolvida
por Gerdau. Nos projetos estaduais e municipais, tornou-se praxe o
acompanhamento dos resultados das mudanças — conduzido sempre por um
grupo de empresários envolvidos em suas metas desde o início.
É o que acontece há cerca de cinco anos em Pernambuco. As reuniões
no estado ocorrem três vezes por ano e reúnem seis empresários, entre os
quais o próprio Gerdau.
“Prestamos contas dos resultados e aprendemos a acompanhar de perto
o que acontece aqui dentro”, diz o governador Eduardo Campos, que conseguiu
20
dobrar a capacidade de investimento apenas com uma gestão mais eficiente. Na
câmara, a função dos conselheiros é reproduzir a mesma cultura de
acompanhamento.
Os projetos pioneiros escolhidos por Dilma visam obter resultados
rápidos, de modo a encorajar novas iniciativas. Além disso, também vão aliviar
situações emergenciais. Um deles, conduzido com a ajuda da consultoria
Accenture, busca reduzir o tempo de embarque e desembarque de passageiros
no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo.
As medidas ainda estão sendo estudadas, mas deverão incluir alterações
óbvias, como direcionar passageiros barrados pelo detector de metais para uma
fila separada, em vez de fazê-los atrasar a passagem dos demais. Os primeiros
resultados são esperados para dezembro.
Juntamente com a consultoria McKinsey, a câmara vem trabalhando na
criação de uma nova metodologia de acompanhamento de projetos do governo.
A ideia é impor uma padronização das informações prestadas e uma
regularidade de prestação de contas em cerca de dez projetos prioritários, como
a execução de obras para a Copa do Mundo de 2014.
O modelo é a delivery unit, criada pelo ex-premiê britânico Tony Blair no
início dos anos 2000. Até 2002, entre 20% e 25% dos pacientes ingleses
passavam mais de 4 horas nos prontos-socorros em hospitais e centros de
saúde — um percentual considerado alto demais.
Os projetos de definição de prioridades fizeram esse patamar baixar para
apenas 4% em 2005. Os ganhos chegaram a 44 milhões de libras por ano. Nas
mãos do novo primeiro-ministro, David Cameron, a unidade foi fechada no ano
passado, o que evidencia outro desafio da gestão pública — a continuidade.
O verdadeiro teste
Quais as chances de Gerdau e seu time liderarem uma mudança cultural
em Brasília? O lamentável histórico brasileiro no terreno da gestão pública
sugere cautela. Gerdau estima que um trabalho abrangente realizado em todos
21
os ministérios possa trazer ganhos de até 80 bilhões de reais nos próximos
anos, mas ele próprio admite que, por ora, seu escopo de trabalho é tímido.
Para alguns analistas, a Câmara poderá ter bons resultados em projetos
isolados, mas o teste definitivo só viria depois de enfrentar áreas mais
pantanosas. É o caso do Ministério dos Transportes, em que as metas são
diminuir em até 70% o tempo de execução das obras do governo federal e cortar
o desperdício de recursos em 30% num prazo de 24 meses.
Além da burocracia, a mudança nessa área deverá esbarrar em outros
males arraigados. Boa parte da cúpula do ministério foi demitida em julho após
denúncias de superfaturamento e recebimento de propina. Quem se dispuser a
enfrentar os bandos que dominam feudos inteiros do governo terá de desmontar
práticas consolidadas no país desde a redemocratização.
Conseguirá Dilma trilhar um caminho diferente de seus antecessores na
luta por apoio da classe política? O Brasil está pronto para virar uma página e
dar um salto na administração do dinheiro público? Gerdau diz acreditar que sim
— e a imensa maioria dos brasileiros espera que ele esteja certo. “Sabemos que
vai demorar”, diz Gerdau. “Mas para persistir é preciso manter o idealismo.”
Com reportagem de Alexa Salomão e Luiza Dalmazo.
22
CAPITULO II
O que veremos neste capítulo:
 Evolução Histórica do Pensamento Político.
 Grécia e Roma.
 Maquiavel e a Administração.
 Maquiavel em resumo.
 Pensamento Político Contemporâneo.
“Não há nada mais difícil do que planejar, mais duvidoso do que obter sucesso,
nem mais perigoso de administrar que a criação de uma nova ordem das
coisas... Uma vez que os inimigos tenham a ocasião de atacar o inovador, eles o
farão com a paixão de um guerrilheiro, enquanto os outros o defenderão tão
preguiçosamente, que o inovador e seus parceiros se tornarão vulneráveis”.
Maquiavael
1. Introdução
No capítulo 1 iniciamos nosso curso
de Ciência política, conhecendo primeiramente a
origem e o significado da palavra política. Embora
no contexto atual, quando ouvimos esta palavra
geralmente fazemos uma associação negativa, ela
significa
a
arte
da
organização,
direção
e
administração de nações, Estados e também das
empresas. Desta forma, a sua ligação com o poder
é indiscutivel.
A ciência política por sua vez é o estudo da política e,
consequentemente sobre o poder.
Segundo Bonavides (2010), ciência política, em sentido amplo, é
o estudo dos acontecimentos, das instituições e das ideias políticas tanto no
passado, quanto no presente e possibilidades futuras.
A evolução desta ciência que tem fortes vinculos com a filosofia,
direito constitucional, história, psicologia, sociologia e, principalmente com a
23
economia, vem da Grécia Antiga, uma sociedade baseada na escravidão mas
também um modelo de democracia. Platão, em sua obra “A República”, já fazia
referências à especialização do trabalho e da produção.
A ciência política atravessou diversas fases, passando de uma
posição mais filosófica a outra mais materialista e naturalista. Esta última,
fundamentada pelo positivismo, movimento com raízes historicas na Revolução
Industrial.
Mas foi na Grécia que surgiram os primeiros pensadores
políticos, com destaque para Platão e Aristotóles.
Além destes, não podemos esquecer o italiano Maquiavel, que
ao rejeitar a tradição idealista de Platão e Aristoteles mostra outro sentido para a
política e o poder.
Vejamos a seguir um pouco mais sobre estes pensadores e a
evolução do pensamento político.
2. A política na Grécia antiga.
A vida política na Grécia antiga tinha como uma de suas
principais características a realização das assembléias onde todos os membros
da polis podiam participar. Entretanto, somente aqueles que estivessem
habilitados a disputar o cargo de rei poderiam opinar. Estar habilitado significava
possuir alguns recursos políticos tais como terras e o apoio de outros membros
importantes da polis.
Fato interessante era que, apesar de permitir a expressão das
opiniões, a assembléia não decidia nada. Era um lugar de discussão, não de
deliberação. Essa cabia unicamente ao rei decidir.
Apesar disso, este procedimento mostra que os antigos gregos
consideravam a participação dos cidadãos como fator fundamental de
sustentação do poder político, e não no uso, ou ameaça do uso, da força estatal
em si.
Na verdade, a visão política dos gregos acerca da cidadania e
da responsabilidade do indivíduo para com o Estado se apoiava, principalmente,
24
mas não exclusivamente, na noção da integração voluntária do cidadão ao
processo de tomada de decisões políticas e na sua respectiva execução
responsável por parte daqueles cidadãos encarregados da administração
política da cidade-estado (a polis).
O poder de coerção do Estado, ainda que reconhecido e aceito
como algo necessário, ocupava um lugar de menor importância na escala de
valores políticos da civilização grega.
2.1 O pensamento platônico
As idéias de Platão não se limitavam ao campo da política.
Como filosofo ele escreveu sobre o amor, conhecimento, política e sobre o
homem e alma.
No que se refere ao conhecimento, Platão defendia a ideia de
que o filosófico, contido na alma, representava o verdadeiro conhecimento,
embora admitisse a existência do conhecimento técnico.
Platão certa vez escreveu:
“Os males não cessarão para os humanos antes que a raça dos
puros e autênticos filósofos chegue ao poder, ou antes, que os chefes das
cidades, por uma divina graça, ponham-se a filosofar verdadeiramente.” (Platão,
Carta Sétima, 326b).
Sobre o poder político, o homem e sua alma, Platão acreditava
que as virtudes humanas, em número de três, estavam baseadas na alma.
Acreditava também que o homem era dividido em duas partes:
I) O corpo – a matéria – que mudava ao longo da vida; e
II) A alma – a parte imaterial e divina – que não sofria alteração
durante a vida.
Para Platão a alma é divida em 3 partes:
I – Racional (Que se baseia no raciocínio): cabeça; esta tem
que controlar as outras duas partes. Sua virtude é a sabedoria ou prudência.
II – Irascível (Que se irrita facilmente): tórax; parte da
impetuosidade, dos sentimentos. Sua virtude é a coragem.
25
III – Concupiscente (desejo forte): baixo ventre; apetite, desejo
carnal (sexual), ligado à libido. Sua virtude é a moderação ou temperança.
A interação entre virtude, corpo e alma determinava a posição
que o cidadão ocuparia na hierarquia da pólis, como evidenciado a seguir.
A alma e as virtudes segundo Platão
Virtude
Tipo de alma
Orientação
Parte do corpo Posição na polis
Sabedoria
Ouro
Razão
Cabeça
Governante
Coragem
Prata
Vontade
Tórax
Soldado
Moderação
Bronze
Desejo
Baixo ventre
Trabalhador
Platão acreditava que a alma depois da morte reencarnava em
outro corpo, mas a alma que se ocupava com a filosofia e com o Bem, esta era
privilegiada com a morte do corpo. A ela era concedida o privilégio de passar o
resto de seus tempos em companhia dos deuses.
Por meio da relação de sua alma com a Alma do Mundo, o
homem tem acesso ao mundo das Idéias e aspira ao conhecimento e às idéias
do Bem e da Justiça. A partir da contemplação do mundo das Idéias, o
Demiurgo (divindade responsável pela criação do universo), tal como Platão
descreveu, organizou o mundo sensível. Não se trata de uma criação ex nihilo,
isto é, do nada, como no caso do Deus judaico-cristão, pois o Demiurgo não
criou a matéria nem é a fonte da racionalidade das Idéias por ele contempladas.
A ação do homem se restringe ao mundo material; no mundo
das Idéias o homem não pode transformar nada. Pois, se é perfeito, não pode
ser mais perfeito.
2.2 Aristóteles
Aristóteles, discipulo de Platão, preocupou-se mais em analisar
as diferentes formas de estado (monarquia, aristocracia, governo constitucional,
26
tirania, oligarquia, democracia). Esta posição
contrastava com a do seu mestre que defendia,
como vimos, a ideia de uma classe dominante de
"reis filósofos".
Analisadas
sob
a
ótica
do
pensamento econômico, as posições defendidas
pelos dois mostram que, enquanto Platão tinha
desenhado um modelo de sociedade com base na
Platão imaginava a
sociaedade ideal como
sendo aquele em que a
proriedade fosse comum a
todos.
De forma diferente,
Aristóterles acreditava na
sociedade baseada na
propriedade privada.
propriedade comum de recursos, Aristóteles via este modelo como um anátema
(maldição). Para ele um modelo baseado na propriedade privada seria mais
apropriado, mas o dinheiro serviria somente como um meio de troca, nada mais
do que isto. Aristóteles escreveu certa vez:
"É claramente melhor que a propriedade seja privada, mas o uso dela em
comum deve ser incentivada pelo legislador".
Ele desaprovava a usura e o lucro através do monopólio.
3. O pensamento político em Roma
Os romanos assimilaram muitos aspectos da cultura dos povos
vencidos, principalmente dos gregos.
Dotados de notável senso prático, souberam reelaborar essas
influências, nas quais introduziram inovações que levaram à formação de uma
cultura original. Com isso, acabaram por legar às gerações futuras várias
contribuições nas mais diversas áreas.
No que se refere ao pensamento político, Cícero foi o nome de
maior destaque. Como escritor, foi ele quem apresentou aos Romanos as
escolas da filosofia grega. Além de escritor talentoso foi um ardoroso defensor
da república como forma de governo, colocando-se inclusive contra o império.
4. Maquiavel
É reconhecido como fundador do pensamento e da ciência
política moderna, pelo fato de haver escrito sobre o Estado e o governo como
realmente são e não como deveriam ser.
27
Os pensadores que o precederam eram idealistas, orientados
por crenças religiosas medievais. Maquiavel inverteu estas lógicas. Para ele,
não havia meios que os fins não justificassem nem códigos morais que não
pudessem ser transgredidos, nem princípios religiosos que reprimissem o
governante. Surge então o termo razão de Estado, que tem o seguinte
significado:
O governante deve se valer de qualquer meio, independente de
tal estratégia ser moralmente aceita ou não para garantir a integridade do
Estado. De outra forma, caso o Estado não seja capaz de impor suas ordens de
modo irresistível, é impossível garantir a ordem pública e qualquer progresso
moral, econômico ou civil. Vem daí as famosas palavras de Maquiavel: “os fins
justificam os meios”.
Maquiavel entrou para a política aos 29 anos de idade no cargo
de Secretário da Segunda Chancelaria. Nesse cargo, ele observou o
comportamento de grandes nomes da época e os adicionou aos conceitos da
antiguidade clássica que estudou para fundamentar suas ideias.
O Príncipe, publicado em 1532, é sua obra mais conhecida.
Nela, defendeu a centralização do poder político, mas não propriamente o
absolutismo, já que acreditava na república como forma de governo.
Suas ideias foram desenvolvidas em uma época em que a Itália
estava dividida em diversos pequenos Estados, entre repúblicas, reinos,
ducados, além dos Estados da Igreja. Esta divisão levava a constantes disputas
de poder entre esses territórios, a ponto de os governantes contratarem os
serviços de mercenários com o intuito de obter conquistas territoriais. É neste
cenário, que Maquiavel defende a unificação como forma de acabar ou
minimizar os conflitos.
Entretanto, uma leitura apressada das suas obras pode levarnos a entendê-lo como um defensor da falta de ética na política, em que os fins
justificam os meios e não como uma estrategista. É o que nos revela alguns
estudos recentes sobre sua obra, que admitem a interpretação errônea do seu
28
pensamento ao vincular o adjetivo maquiavélico, criado a partir do seu nome,
aos conceitos de esperteza, astúcia e até maldade.
Em o Príncipe, ele apresenta os tipos de principados existentes
e expõe as características de cada um deles. A partir daí, defende a
necessidade do príncipe formar seus exércitos próprios e após tratar do governo
propriamente dito e dos motivos por trás da fraqueza dos Estados italianos,
conclui dizendo que um novo príncipe conquiste e liberte a Itália.
Suas considerações e recomendações aos governantes sobre a
melhor maneira de administrar o governo caracterizam a obra como uma teoria
do Estado moderno.
É importante repetir que a obra de Maquiavel não deve ser
analisada sem se considerar o contexto em que foi produzida.
O método utilizado por ele de romper com a tradição vigente
(medieval), e fundamentar-se no empirismo e na análise dos fatos recorrendo a
experiência passadas - especialmente da Roma antiga – é um marco na forma
de análise e estratégia.
Além disso, ele foi o primeiro a propor uma ética para a política
diferente da ética religiosa, ou seja, a finalidade da política seria a manutenção
do Estado.
Entre os conceitos mais importantes criados ou defendidos por
Maquiavel estão os de virtù e o de fortuna.
Estes conceitos são empregados várias vezes por Maquiavel em
suas obras.
Para ele, a virtù seria a capacidade de adaptação aos
acontecimentos políticos que levaria à permanência no poder.
A virtù seria como uma barragem que deteria os desígnios do
destino. Mas segundo o autor, em geral, os seres humanos tendem a manter a
mesma conduta quando esta frutifica e assim acabam perdendo o poder quando
a situação muda.
29
Já a fortuna2 representa as coisas inevitáveis que acontecem
aos seres humanos (sorte ou falta de sorte).
Para
Maquiavel,
o
governante
que
possuisse
a
virtú
consquistaria também a fortuna.
Outro ponto importante das ideias de Maquiavel é a referência a
natureza humana. Para ele, a natureza humana seria essencialmente má e os
seres humanos desejam sempre obter os máximos ganhos a partir do menor
esforço, apenas fazendo o bem quando forçados a isso.
A natureza humana também não se alteraria ao longo da história
fazendo com que seus contemporâneos agissem da mesma maneira que os
antigos romanos e que a história dessa e de outras civilizações servissem de
exemplo. Assim, o governante não deveria esperar o melhor dos homens ou que
estes fizessem o que se espera deles.
4.1 Maquiavel e a Administração
Os autores Luiz Roberto Antonik e Aderbal Nicolas Muller em
sua obra “O Príncipe revisitado: Maquiavel e o mundo empresarial”, mostram
que os ensinamentos de Maquiavel estão bem atuais e no mundo dos negócios ao contrário do que ensinam certos teóricos da administração - a prática e o
conhecimento nos ensinam que um pouco de maldade, estresse e desafio são
indispensáveis para o bom resultado, e isso apenas se obtêm com pessoas
certas.
Embora O Príncipe tenha sido escrito para descrever as
maneiras de se conduzir os negócios públicos internos e externos e,
fundamentalmente,
como
conquistar
e
manter
um
principado,
seus
ensinamentos são facilmente aplicáveis também aos negócios privados.
2
A idéia de fortuna em Maquiavel vem da deusa romana da sorte e representa as coisas inevitáveis que
acontecem aos seres humanos. Não se pode saber a quem ela vai fazer bens ou males e ela pode tanto levar
alguém ao poder como tirá-lo de lá, embora não se manifeste apenas na política.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Nicolau_Maquiavel
30
Como observador do comportamento humano, Maquiavel foi um
renovador de costumes, um agente de mudanças, um estrategista. Suas
observações de Maquiavel podem ser comparadas a postura de gestores, sejam
eles chamados de líderes, gerentes, coordenadores ou governantes.
4.2 Maquiavel em resumo
4.2.1 Pensamentos sobre a Sociedade
- Processo de ascensão do capitalismo: mercantilismo.
- Desenvolvimento do Estado Nacional: soberanos locais são
absorvidos pelo fortalecimento das monarquias e pela crescente centralização
das instituições políticas (cortes de justiça, burocracias e exércitos) .
- Estado absoluto: preserva a ordem de privilégios aristocráticos
(mantendo sob controle as populações rurais), incorpora a burguesia e
subordina o proletariado incipiente.
4.2.2 Pensamentos sobre a natureza humana
- Racionalidade instrumental: busca o êxito, sem se importar
com valores éticos.
- Cálculo de custo/benefício: teme o castigo.
- Homem possui capacidades: força, astúcia e coragem.
- Homem é vil, mas é capaz de atos de virtude.
- Mas não se trata da virtude cristã.
- O homem não muda.
4.2.3 Pensamentos sobre a Política
- Política: é mostrada como esfera autônoma da vida social.
- Não é pensada a partir da ética, nem da religião e nem da
filosofia: rompe com os antigos e com os cristãos. passa a ser campo de estudo
independente.
- A vida política tem regras e dinâmica independentes de
considerações privadas, morais, filosóficas ou religiosas.
31
- Política é a esfera do poder por excelência.
- Política é a atividade constitutiva da existência coletiva: tem
prioridade sobre todas as demais esferas.
- Política é a forma de conciliar a natureza humana com a
marcha inevitável da história: envolve fortuna e virtu.
- Fortuna: contingência própria das coisas políticas: não é
manifestação de Deus ou Providência Divina.
- Virtu: qualidades como a força de caráter, a coragem militar, a
habilidade no cálculo, a astúcia, a inflexibilidade no trato dos adversários. Pode
desafiar e mudar a fortuna: papel do homem na história
4.2.4 Pensamentos sobre o Estado
- O Estado: está além do bem e do mal: o Estado é.
- Estado: regulariza as relações entre os homens, utilizando o
que eles têm de bom e evitando o que eles têm de mal.
- Tanto na política interna quanto nas relações externas, o
Estado é o fim: e os fins justificam os meios. Daí a idéia de “razão de Estado”:
existem motivos mais elevados que se sobrepõem a quaisquer outras
considerações, inclusive à própria lei.
- A tirania é uma resposta prática a um problema prático.
5. Pensamento político contemporâneo
Diversos autores contribuiram para formatar o pensamento
político contemporâneo.
John Locke com sua teoria do contrato social em que defendeu
a ideia de que as pessoas contratavam com a sociedade (Estado) e que
portanto, seus direitos de propriedade deveriam ser defendidos, foi um deles.
Outro autor muito importante foi Karl Marx.
A teoria marxista é uma crítica radical das sociedades
capitalistas, notadamente as ideis de Adam Smith.
32
O marxismo constitui-se como a concepção materialista da
história, significando dizer que os fatos econômicos e que determinam a história.
Karl Marx compreende o trabalho como atividade fundamental
da humanidade. E o trabalho, sendo a centralidade da atividade humana, se
desenvolve socialmente, sendo o homem um ser social. Sendo os homens seres
sociais, a história, isto é, suas relações de produção e suas relações sociais
fundam todo processo de formação da humanidade. Esta compreensão e
concepção do homem são radicalmente revolucionárias em todos os sentidos,
pois é a partir dela que Marx irá identificar a alienação do trabalho como a
alienação fundante das demais.
Bibliografia
Dias, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Editora Atlas, 1ª ed. 2011.
Bonavides, Paulo. Ciência política. São Paulo: Editora Malheiros, 17ª. ed. 2010.
Weffort, Francisco C. Os clássicos da política. São Paulo. Editora Ática. 2006.
http://search.babylon.com/?q=fortuna+e+virt%C3%BA+wikipedia&s=web&as=0&babsrc=home
http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_do_pensamento_econ%C3%B3mico
33
TEXTOS PARA DISCUSSÃO
Fortuna e Virtù na Trajetória de Lula
Por Lúcio Flávio Vasconcelos as 20:33 h
http://www.wscom.com.br/blog/lucioflavio/post/post/Fortuna+e+Virt%C3%B9+na+Trajet
%C3%B3ria+de+Lula-761
As reflexões sobre a política não foram as mesmas depois dos escritos de Nicolau
Maquiavel (1469-1527). Nascido em Florença, cidade italiana que vivia a plena
efervescência do Humanismo renascentista, Maquiavel foi um homem dedicado ao
exercício da administração pública, com o objetivo maior de fortalecimento do papel do
Estado na condução da sociedade.
Durante toda sua vida, o pensador florentino, acertadamente considerado o fundador da
Ciência Política, foi um homem prático, que analisava a política com racionalidade. Nos
seus escritos, desnudou as intenções políticas dos homens em sua crueza, com toda
sua grandiosidade e mesquinhez.
Em 1512, a república que servia com tanto zelo foi derrubada e os Médici retornaram ao
poder. O dedicado servidor público Maquiavel foi preso e torturado, acusado de traição
pela família Médici.
Sem o cargo público que tanto prezava, Maquiavel recolheu-se a uma pequena fazenda
de sua propriedade, em San Casciano, e dedicou-se com afinco ao seu segundo maior
prazer: escrever.
Nos catorze anos seguintes, Maquiavel vai produzir uma significativa obra, que engloba
escrito históricos e obras literárias. Mas é com o livro seminal O Príncipe que ele
encontrará a imortalidade.
Na sua obra O Príncipe, Maquiavel tem a preocupação de aconselhar os governantes
não só em obter o poder mas, principalmente, em como mantê-lo. Para tanto, lança
mão de dois conceitos principais: Fortuna e Virtù.
34
Para Maquiavel, a Fortuna seria o conjunto dos acontecimentos, os fatos que ocorriam
no contexto social em que o governante vivia. Já a Virtù representa a série de
qualidades pessoais do príncipe que possibilita o discernimento necessário para
conquistar e manter o poder.
Após essa rápida análise dos conceitos maquiavelianos, vamos nos debruçar nos
últimos acontecimentos que assolam a nossa república.
Desde o final dos anos 70 que se processa no Brasil uma mudança significativa na
política nacional. Há o surgimento de um novo sindicalismo, que teve como base o ABC
paulista. Também houve um profundo envolvimento da Igreja Católica nas questões
sociais, culminando na articulação do Movimento dos Sem Terra (MST). A expansão do
ensino universitário possibilitou a difusão de um conhecimento científico uniforme em
todo o país.
Surgiram no Brasil milhares de núcleos urbanos que passaram a abrigar setores de
classe média sedentos por mudanças sociais e políticas. Foi dentro desse processo de
alteração do cenário nacional que se deu a Fortuna de Lula.
Aproveitando as profundas modificações ocorridas nos últimos 25 anos, Lula soube,
como nenhum outro líder político brasileiro do século XX, capitalizar as transformações
e ser o seu principal representante.
Eis a sua Virtù! O líder operário de baixa escolaridade fundou um partido que se
distanciou
da
prática
política
do
Partido
Comunista,
sensibilizou
setores
intelectualizados da classe média com seu socialismo moderado, mobilizou segmentos
dos trabalhadores com o seu sindicalismo de resultados e galvanizou setores
desorganizados da sociedade com sua retórica salvacionista.
Na sua trajetória política, Lula percebeu como poucos a oportunidade de chegar ao
poder sem provocar a ira dos setores mais conservadores. Ao ganhar as eleições em
2002, apresentou-se como um moderado que iria minimizar o sofrimento dos excluídos
sem causar rupturas.
Durante o seu mandato, o modelo econômico tão criticado por setores radicais do PT
permaneceu no mesmo itinerário traçado pelo antecessor Fernando Henrique Cardoso.
35
A onda de crescimento econômico que atingiu a América Latina, deu margem para que
políticas públicas favoráveis aos setores populares fossem implantadas. Salário mínimo
de R$ 350,00 é o maior em poder aquisitivo desde 1979.
Mesmo após meses de bombardeio de seu governo, com a conseqüente perda de
principais auxiliares na construção da sua trajetória, Lula demonstra uma força política
inigualável.
Os partidos de oposição, principalmente PSDB e PFL, não têm demonstrado Virtù
suficiente para desbancar o prestígio que permeia o candidato Lula. Talvez isso se dê
porque ainda está muito vivo na memória da maioria da população os oito anos do
governo FHC.
O desafio para Lula é enorme. Nem Nicolau Maquiavel arriscaria prever se o Governo
Lula propiciará, até outubro próximo, a Fortuna tão necessária para que o candidato
Lula continue exercendo a sua Virtù.
Lúcio Flávio Vasconcelos é Graduado em História pela UFPB, tem Mestrado e Doutorado em
História pela Universidade de São Paulo (USP). É professor do Departamento de História da
UFPB e também Professor Orientador do Programa de Pós-Graduação em Sociologia (PPGS),
do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da UFPB. Publicou os livros História Política do
Sendero Luminoso (1998), Guardiões da Ordem (2001) e América Latina: Entre a Civilização e
Barbárie (2005), todos lançados pela UFPB. Atualmente é debatedor no programa Conexão
Master.
36
Fortuna e virtù
Cláudia Vassallo - Revista Exame | 18/11/2010
Maquiavel e as lições do príncipe: só sorte não basta
Em seu magistral o príncipe, o pensador Florentino Nicolau Maquiavel defende que o
líder precisa de dois atributos para triunfar: fortuna e virtù - sorte (algo fora do controle
dos mortais) e competência. Fortuna é algo que aparentemente não faltará à presidente
eleita, Dilma Rousseff, que a partir de 1o de janeiro assume a liderança do país.
O Brasil vive hoje um momento que, se não é perfeito como alguns gostam de
propagar, traz enormes oportunidades de construção do futuro. O momento histórico
nos favorece de diversas maneiras. Mas talvez nada nos abra uma janela tão grande
para o crescimento e o desenvolvimento quanto a transformação demográfica pela qual
passaremos nos próximos 20 anos - um processo que começa agora e que envolverá o
amadurecimento em massa e o ápice da capacidade produtiva da maioria da população
brasileira. O chamado "bônus demográfico" chegará a seu pico em 2022, quando se
estima que haverá quatro cidadãos inativos - crianças e velhos, sobretudo para cada
dez economicamente ativos. Viveremos, então, um período de carga máxima de nossa
capacidade de produção e de consumo.
As conseqüências e as oportunidades geradas por essa transformação para o país e
para quem faz negócios são brutais. E é sobre elas que se debruça a reportagem de
capa desta edição, assinada pelo repórter Nicholas Vital. Um estudo assinado pelos
professores Cássio Turra e Bemardo Queiroz, da Universidade Federal de Minas
Gerais, mostra que apenas o fenômeno demográfico gera um potencial de crescimento
do PIB brasileiro de 2,5% anuais até 2030. Trata-se de um cenário, esperamos
improvável. Pressupõe que, num espaço de duas décadas, nada seja feito para
modernizar o país e tomar sua economia mais dinâmica e mais pujante. O que os
professores Queiroz e Turra estão dizendo é que, ainda que tudo dê absolutamente
errado, seguiremos em frente. Por pura sorte. Agora é torcer para que a presidente
Dilma e seus sucessores emprestem altas doses de sua própria virtù à enorme e
efêmera fortuna derramada sobre o Brasil dos próximos 20 anos.
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Vinte anos para o Brasil ficar rico
Nicholas Vital, da EXAME - 17/11/2010 16:16
Está em curso um fenômeno novo para o país: o amadurecimento em
massa da população. Mas é preciso correr, pois a janela de oportunidades tem
data para fechar
Ronaldos e Giseles à parte, a maioria dos mortais segue um roteiro de
vida semelhante. Primeiro experimentamos as delícias da infância e da
adolescência. Depois, chega a hora de começar a trabalhar, um momento
marcado por muito esforço e pouco dinheiro. Com o tempo, as oportunidades
vão surgindo e o desafio é conseguir garantir um descanso tranquilo no período
final. E assim passamos de geração em geração. Também os países seguem
uma trajetória semelhante, com graus diferentes de sucesso. Numa fase inicial,
nações jovens têm uma fatia grande da população abaixo da idade de trabalho.
Com o tempo, as crianças crescem e começam a trabalhar. É um período ideal
para aproveitar o impulso e crescer. Depois vem a fase do envelhecimento, em
que o ímpeto econômico se esvaece. Se tudo der certo nesse caminho, haverá,
então, riqueza suficiente para financiar o sossego dos idosos.
O Brasil já foi uma nação jovem. E seremos, no futuro, um país velho. A
boa notícia é que estamos — agora — no auge do período produtivo. Encontrase em curso um fenômeno demográfico e social novo para o país: o
amadurecimento em massa da população. O crescimento populacional
vertiginoso ficou para trás. Após crescer geometricamente por dois séculos, o
número de brasileiros aumenta cada vez menos e não deve ultrapassar a marca
de 220 milhões. Ao mesmo tempo, com expectativa de vida de 73 anos, o país
tem hoje dois terços da população entre 15 e 64 anos — a faixa etária
considerada economicamente mais produtiva. A proporção dos que estão em
idade de produzir vai continuar a crescer até 2022, quando atingirá um pico de
71%. A previsão é que nessa data o número de brasileiros em idade ativa passe
dos atuais 130 milhões para 147 milhões. As chances de negócios abertas por
essa transformação silenciosa são enormes. “Se em dez anos não abrirmos 100
milhões de novas contas, é porque algo deu errado”, diz Luiz Carlos Trabuco
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Cappi, presidente do Bradesco. Segundo estimativa da Federação Brasileira de
Bancos, o número de agências bancárias no país deve crescer 50% na próxima
década, o que significa a criação de cerca de 150 000 postos de trabalho. O
crescimento no setor bancário é apenas um exemplo do salto esperado em
inúmeros mercados na próxima década.
“Essa é uma chance única na história de qualquer país”, disse a EXAME
Ronald Lee, diretor do departamento de demografia e economia da Universidade
de
Berkeley
e
membro
da
Comissão
Americana
para
Estudos
do
Envelhecimento. A chance a que Lee se refere é batizada pelos especialistas de
bônus demográfico — a fase com o máximo possível de gente trabalhando. Uma
projeção realizada pelos professores Cássio Turra e Bernardo Queiroz, da
Universidade Federal de Minas Gerais, mostra que o Brasil tem um potencial de
crescimento de 2,5% ao ano gerado exclusivamente pelo bônus demográfico.
Outra conta, feita por Marcelo Neri, pesquisador do Centro de Políticas Sociais
da Fundação Getulio Vargas, sugere um aumento de até 2,7% ao ano na renda
média dos brasileiros em função do bônus e do aumento da escolaridade,
iniciado nos anos 90. No cenário elaborado por Turra e Queiroz, o Brasil, se
crescer apenas à média anual de 2,5% propiciada pelo bônus demográfico,
chegará a 2030 com um produto interno bruto de 3,3 trilhões de dólares, 50%
maior que o atual. Mas o país tem crescido mais que isso — e os economistas
avaliam que será possível manter um ritmo de 4,5%. Isso elevaria, no mesmo
prazo, o PIB para 4,8 trilhões de dólares, o suficiente para alcançar um padrão
de renda equivalente ao que Portugal tem atualmente. Numa hipótese mais
otimista, de o bônus ser aproveitado para impulsionar reformas mais profundas,
em duas décadas o Brasil atingiria o nível de renda per capita atual da Espanha
e teria um PIB de 7 trilhões de dólares. “Os brasileiros estão diante de uma
oportunidade de ouro, mas ela é temporária. Após duas décadas, o
envelhecimento da população inverterá a curva e fará a proporção de inativos
subir. Por isso, para tirar o máximo proveito até lá, o Brasil deve investir
fortemente nas novas gerações, em especial provendo boa educação básica”,
diz Lee. O recado é claro: temos mais 20 anos para fazer a lição de casa,
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modernizando a economia e melhorando a qualidade da educação, e, assim,
nos tornar uma nação rica. Caso contrário, estaremos no pior dos mundos.
Corremos o risco de envelhecer sem ter conseguido integrar o clube dos
desenvolvidos — e aí será muito mais difícil chegar lá.
O bônus tem como origem uma guinada no comportamento das famílias
brasileiras. Desde meados dos anos 60, tem havido uma queda progressiva no
tamanho das famílias. A média de filhos por mulher, que era de seis há meio
século, caiu até chegar a menos de dois hoje. A presidente eleita Dilma Rousseff
— de quem se espera um conjunto de políticas para aproveitar ao máximo o
bônus demográfico — é um exemplo da nova mulher brasileira. Teve apenas
uma filha, a qual, por sua vez, recentemente lhe deu o primeiro neto. A idade
média da população, antes inferior a 20 anos, atualmente está próxima de 29 —
e vai continuar a crescer. A pirâmide demográfica mudou de forma e agora é
uma figura cada vez mais arredondada. No ponto atual, a maioria dos que eram
jovens nas décadas anteriores ainda não chegou à terceira idade e constitui uma
inédita geração de brasileiros mais maduros e que estão no auge de sua carreira
profissional. O resultado é que a proporção entre pessoas que não trabalham e
as que são ocupadas caiu de mais de sete inativos (seja criança, seja idoso)
para cada grupo de dez trabalhadores, há 20 anos, para menos de cinco para
dez. No auge do bônus, em 2022, essa proporção será de quatro para dez.
Quando há menos gente que precisa ser sustentada, a abundância de
população em idade ativa dinamiza a economia e gera recursos adicionais que
podem ser revertidos em poupança e investimento. Isso reforça o crescimento
econômico e gera oportunidades em inúmeros mercados.
A mudança do perfil demográfico da população brasileira deve fazer com
que alguns setores da economia experimentem um ritmo de crescimento
acelerado na próxima década, o que pode colocar o Brasil entre os líderes
globais em vários segmentos. Os cosméticos são um bom exemplo. Hoje, o
Brasil é o terceiro maior mercado de produtos de perfumaria e beleza do mundo,
atrás de Estados Unidos e Japão. Caso a estimativa de crescimento do setor se
confirme — 9,6% ao ano, de acordo com uma estimativa feita pela consultoria
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Euromonitor a pedido de EXAME —, o mercado brasileiro de cosméticos deverá
chegar a 108 bilhões de dólares em 2020, quase o dobro do observado
atualmente nos Estados Unidos. “Nossos consumidores, em sua maioria, são
maduros”, diz José Vicente Marino, vice-presidente de negócios da Natura, a
maior empresa de cosméticos do país. “Boa parte de nosso crescimento nos
últimos anos já pode ser atribuída ao bônus.” O envelhecimento da população
também deve impulsionar o segmento de serviços médicos, que inclui gastos
com consultas, exames e hospitais. Hoje, os brasileiros gastam pouco mais de
56 bilhões de dólares, montante que deve alcançar 112 bilhões em 2020, mais
do que o gasto atual da Alemanha, em torno de 90 bilhões de dólares. O gasto
com educação, segundo as projeções da Euromonitor, também deve dobrar na
próxima década, de 91 bilhões de dólares para 182 bilhões.
Para as empresas, um dado central é o perfil do brasileiro médio daqui a
uma década, quando o bônus demográfico estiver empurrando o país com força
máxima. Muito provavelmente, será próximo ao de Ana Rita Mazza Menani. Aos
33 anos de idade, casada, com dois filhos, formada em comunicação social, ela
e o marido, Rogério, têm uma pequena gráfica em Monte Alto, no interior
paulista. Juntos eles dispõem de uma renda em torno de 8 000 reais por mês.
Moram numa casa confortável e, na garagem, têm dois carros e duas motos.
Dentro de casa, não faltam eletrodomésticos, móveis e computador. Os filhos,
de 7 e 13 anos, estudam em escola particular, fazem aulas de inglês, artes,
música e esportes. “Investimos cerca de 25% da renda familiar na educação
deles”, diz Ana Rita. “Se tivéssemos mais filhos, seria difícil manter o padrão. As
pessoas da minha geração não têm condições de ter mais que um ou dois
filhos.” Embora muito tenha se falado sobre o crescimento na base da pirâmide,
o exemplo de Ana Rita ilustra que a ascensão econômica em curso no país
legará uma estrutura social com preponderância das classes média e alta.
Nessa nova sociedade, algumas tendências comportamentais começam a ser
detectadas. A importância crescente dada à educação dos filhos é uma delas. O
desenvolvimento esperado para as próximas décadas está atrelado a fortes
investimentos em educação e formação de mão de obra qualificada — uma das
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consequências diretas do bônus. “Saímos da baixíssima escolaridade para um
nível menos ruim, e isso já está jogando a favor do desenvolvimento há um
tempo”, afirma Neri, da FGV. “Nosso retrato provavelmente seria bem pior se
não fosse isso. O que precisamos fazer é avançar com mais ambição no setor
de educação, para não desperdiçar o bônus.”
Essa necessidade faz com que as escolas constituam um mercado que
evidentemente está entre os que mais proliferam atualmente no Brasil. De
acordo com a Euromonitor, esse setor deve crescer quase 10% ao ano no Brasil
até 2020, quando alcançará 400 bilhões de reais. A expansão tem atraído
investidores estrangeiros principalmente para atuar no ensino superior. O grupo
americano DeVry chegou ao país há três anos. Instalou-se na Região Nordeste
e já conta com 14 000 alunos em suas quatro unidades. “Enxergamos uma
grande oportunidade no mercado brasileiro de educação”, diz Carlos Filgueiras,
presidente do braço local do DeVry. “O potencial de crescimento é muito grande.
Hoje, apenas 30% dos jovens brasileiros entre 18 e 22 anos estão na faculdade.
Na Grécia, o índice é de mais de 90%.” De acordo com ele, o efeito do bônus já
é perceptível, mas poderá ser mais intenso porque as classes C e D estão
começando a ter acesso às universidades. “Isso deve impulsionar o setor nos
próximos anos”, diz.
Potencial a ser descoberto
Curiosamente, muitas empresas ainda não atentaram para o potencial de
mercado aberto pela mudança na demografia brasileira. Recentemente, ao
promover por seis meses um estudo com seus 100 executivos de nível mais alto
para identificar tendências e planejar os próximos dez anos, o grupo de
engenharia Promon descobriu o bônus. “O tema da demografia causou frisson
nas nossas reuniões”, diz Luiz Fernando Rudge, presidente da Promon. “As
pessoas não percebem seu efeito no dia a dia, mas vimos que, ao longo das
décadas, o impacto é dramático.” A Promon identifica áreas de negócios que
serão particularmente atraentes num cenário de amadurecimento da população,
como as de saúde e bem-estar. “Podemos investir na construção e na operação
de hospitais e condomínios para pessoas mais idosas”, afirma Rudge. Além
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disso, com a perspectiva de um crescimento econômico mais consistente,
diversos setores de infraestrutura em que a Promon atua, de energia a
telecomunicações
e
tecnologia
da
informação,
também
deverão
ser
positivamente afetados.
De acordo com um estudo da consultoria Ernst & Young, a mudança do
perfil demográfico da população brasileira deve dar ainda mais fôlego ao setor
de construção civil. Estima-se que, todos os anos, cerca de 1,7 milhão de novas
famílias sejam formadas no país. Até 2030, serão pelo menos 35 milhões de
novas famílias, principalmente da emergente classe C, que precisarão de um
lugar para morar. Trata-se de outra tendência que começa a ser detectada: o
surgimento de famílias pequenas e em franca ascensão social. As construtoras
já perceberam o fenômeno e vêm adequando seus produtos aos novos
consumidores.
“As
famílias
estão
ficando
cada
vez
menores.
Consequentemente, os apartamentos também devem ficar mais compactos”, diz
Antonio Carlos Ferreira, diretor de incorporações da Gafisa, uma das maiores
construtoras do país. Em 2007, as famílias tinham, em média, 3,1 pessoas. Em
2030, prevê-se que haverá apenas 2,4 pessoas por residência. O operador
logístico mineiro Lando Tavares, de 34 anos, comprou seu primeiro apartamento
há aproximadamente um mês. Casado há quatro anos e pai de uma menina de
2 anos, ele aproveitou um aumento salarial e a oferta abundante de crédito para
financiar em 25 anos um imóvel avaliado em 100 000 reais. Os Tavares
representam a nova família brasileira — pequena e mais preocupada com a
qualidade de vida.
Uma população mais velha traz também mudanças em termos de objetos
de desejo. Um segmento crescente é o formado por homens e mulheres
maduros e com dinheiro para gastar. O envelhecimento costuma tornar os
consumidores mais exigentes. Para as montadoras de automóveis, isso deve
produzir uma alteração na demanda. A participação de veículos maiores e mais
equipados deverá crescer consideravelmente nos próximos anos, com alta nas
vendas de sedãs médios e modelos de luxo. “Eles devem tomar parte do
mercado dos populares”, afirma Stephan Keese, sócio da consultoria
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especializada Roland Berger. “As pessoas mais velhas geralmente têm mais
dinheiro e compram produtos melhores.” Atualmente, os veículos compactos
respondem por 69% do mercado brasileiro, ante 15% dos sedãs médios. Em
2020, a participação dos populares deve cair para 63%, enquanto a dos médios
subirá para 20%. O mercado de carros de luxo também deve dobrar, para mais
de 50 000 unidades por ano. “Nos Estados Unidos e na Europa, os carros
básicos são mais completos porque são desenvolvidos para uma população
mais velha e exigente”, diz Keese. Essa é justamente a aposta que a marca
japonesa Nissan fez recentemente para se expandir no Brasil. Instalada no país
no final dos anos 90, a Nissan lançou em 2007 o modelo Sentra, aquele que
“não tem cara de tiozão”. O sedã, que custa a partir de 55 000 reais, obviamente
não tem como público-alvo os jovens. A intenção foi chamar a atenção dos
homens maduros, os potenciais consumidores. “Quando chegamos ao Brasil, já
sabíamos da tendência de envelhecimento da população. Tínhamos certeza de
que o segmento cresceria”, afirma Murilo Moreno, diretor de marketing da
Nissan. “O tíquete médio vem subindo. Os carros de luxo estarão cada vez mais
presentes nas ruas.”
O exemplo vem da Ásia
A legião de consumidores maduros deve impulsionar o crescimento de
mercados antes pouco expressivos. Uma preocupação é envelhecer bem e de
forma saudável. Essa nova realidade faz com que a indústria de lácteos, por
exemplo, precise de um novo plano de negócios para os próximos anos. Com
um mercado infantil cada vez menor, não faz mais sentido investir milhões de
reais em produtos com poucas possibilidades de crescimento. O foco agora são
os leites funcionais, ricos em cálcio e outras vitaminas e consumidos por adultos.
“Esses produtos devem crescer 300% nos próximos cinco anos”, afirma
Fernando Falco, presidente da Leitbom, controladora da marca Parmalat no
Brasil. Segundo ele, nos próximos dois anos a Parmalat deve lançar pelo menos
sete novos lácteos funcionais e só dois produtos voltados para o público infantil.
O crescimento do número de adultos em busca de uma vida mais saudável
beneficia uma gama de empresas que vai muito além das fabricantes de
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alimentos. O Brasil já é o segundo mercado do mundo para as academias de
ginástica, só atrás dos Estados Unidos.
Todos os países hoje considerados desenvolvidos se beneficiaram de
mudanças no perfil populacional para atingir estágios mais elevados de renda e
qualidade de vida. Na Europa, no Japão e nos Estados Unidos, a transição
demográfica foi mais lenta, tendo se iniciado com a revolução industrial. Lá, as
vantagens começaram no século 19, com um aumento da população gerado
pelas conquistas científicas e pelo desenvolvimento da infraestrutura urbana de
saneamento. Foi uma evolução que se estendeu ao início do século 20, com a
redução da mortalidade infantil e a expansão do acesso a serviços médicos e
educação. O impulso inicial, de ampliação das populações, depois foi contido
com a queda da natalidade. Na Ásia, excetuando o Japão, os avanços na
qualidade de vida da população chegaram após a Segunda Grande Guerra.
Mas, com as tecnologias e os conhecimentos já disponíveis, a adoção de
melhorias foi intensa, o que gerou uma transição rápida. Em países como Coreia
do Sul, Singapura, Hong Kong e Taiwan, a mudança demográfica iniciada nos
anos 60 gerou uma ampliação da força produtiva que serviu de base para a
decolagem das economias. Os governos desses países souberam perceber que
uma população com mais expectativa de vida também precisaria ser mais
educada e que o ambiente de negócios precisaria ser nutrido. A transformação
que se viu em três décadas fez os quatro países merecerem o apelido de Tigres
Asiáticos. Um estudo realizado pelos pesquisadores David Bloom e Jeffrey
Williamson, da Universidade Harvard, concluiu que o bônus demográfico gerou
um terço do crescimento dos quatro tigres entre 1965 e 1990. “A mudança no
perfil da população foi determinante para o milagre econômico asiático”, afirma
Bloom. “Até então, esses países cresciam lentamente devido ao peso excessivo
de uma população muito jovem.” O estudo mostra que, durante a transição, a
massa local de trabalhadores cresceu a um ritmo de 2,4% ao ano, enquanto o
crescimento total da população era de 1,6%.
A Coreia do Sul lançou as bases de seu sucesso antes mesmo de chegar
ao bônus. Devastado pela guerra dos anos 50, o país passou a investir em
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educação e fez uma série de reformas para que sua economia deslanchasse.
Mais tarde, em meados dos anos 80, quando chegou ao período de transição
demográfica, já estava devidamente preparado. Em três décadas, os sulcoreanos multiplicaram por 8 sua renda per capita, para perto de 20 000 dólares,
o dobro da brasileira, e entraram para o clube dos países ricos. Atualmente,
quem melhor está aproveitando a transição demográfica é a China. Graças às
políticas draconianas de controle de natalidade introduzidas pelo governo na
década de 70, o país tem colhido os frutos de uma estrutura etária que, por ora,
é favorável — há, desde os anos 90, cada vez menos crianças e cada vez mais
adultos aptos a produzir. Todos os anos, milhões de chineses entram para o
mercado de trabalho e engrossam o já enorme contingente de mão de obra
local. Dar emprego a tanta gente é um desafio, mas o país tem conseguido dar
conta. Com custo baixo para produzir quase tudo, a enorme população chinesa
é o motor que move a segunda maior economia do mundo. Estima-se que o
bônus tenha sido responsável por até 30% do crescimento do PIB da China na
última década. Além disso, o fenômeno ajudou a tirar da pobreza cerca de 400
milhões de pessoas nos últimos 30 anos. Assim como o Brasil, a China ainda
tem cerca de 20 anos de bônus demográfico pela frente. Mas há uma nítida
diferença em como a oportunidade é encarada lá e aqui. “No Brasil, ainda não
caiu a ficha de que estamos diante de uma janela temporária”, diz Rogério Rizzi
de Oliveira, sócio da empresa de consultoria Monitor Group. “Os chineses
correm para manter o crescimento acima de 10% porque sabem que isso só
poderá ser feito num prazo curto. Nós, aqui, também precisamos apertar o
passo.”
Os desafios para que o Brasil aproveite ao máximo sua janela de
oportunidades, porém, ainda são muitos. Não temos uma economia com a
modernidade e a eficiência necessárias para gerar crescimento econômico de
alta qualidade. “O próximo governo precisará trabalhar muito para que
possamos dar um salto. Do contrário, corremos o risco de desperdiçar parte do
bônus”, afirma Rubens Ricúpero, ex-ministro da Fazenda e diretor da Faculdade
de Economia da Fundação Armando Alvares Penteado, em São Paulo. Temos
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as próximas duas décadas para alcançar um padrão de país rico — depois, a
janela de oportunidades irá gradualmente se fechar. Se a transição não for
devidamente aproveitada, a sociedade brasileira estará de frente para um novo
e dramático quadro por volta de 2040: o de uma nação de idosos que não
melhoraram suficientemente seu padrão de vida e, pior, sem recursos para
sustentar a velhice. O alerta sobre esse cenário sombrio é dado hoje pelos
países europeus, onde os sistemas de seguridade e manutenção do bem-estar
social estão em crise. Isso está ocorrendo mesmo em lugares que alcançaram
altos níveis de renda per capita, como França, Reino Unido e Itália, e, de forma
pior, nos que não enriqueceram tanto, como Grécia, Portugal e Polônia. Uma
questão difícil de ser enfrentada é a da saúde. “O custo para tratar um idoso é
muito maior que o de um jovem”, afirma o economista Paulo Tafner, pesquisador
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. “Até 2040, o gasto brasileiro com
saúde vai se multiplicar por 3.” Caso o país não se prepare adequadamente, o já
deficiente sistema público de saúde entrará em colapso. O mesmo impacto se
dá nas contas da deficitária Previdência Social. “É preciso reconhecer que o país
não está preparado para ter 30 milhões ou 40 milhões de idosos, como deve
acontecer nas próximas décadas”, diz Carlos Eduardo Gabas, ministro da
Previdência. Para Ronald Lee, de Berkeley, o Brasil terá de reavaliar seu
sistema de aposentadoria, que ele considera provavelmente o mais generoso do
mundo em relação ao nível de renda per capita. “Não há dúvida de que há
muitos idosos pobres que precisam das pensões, mas eu suspeito que haja
muita gente recebendo mais do que precisa”, afirma Lee. “O modelo atual não
será sustentável no futuro.” O custo da Previdência em relação ao PIB já é duas
vezes maior que nos Estados Unidos, e a idade média do brasileiro ainda é
inferior à dos americanos. São questões que deveriam estar na ordem do dia.
Não estão. Fazendo um paralelo com o que o pensador florentino Nicolau
Maquiavel dizia do Príncipe, é preciso ter virtù e fortuna — competência e sorte
— para triunfar. Tudo indica que a sorte agora está do lado do Brasil. Falta
mostrar virtù para aproveitar ao máximo a janela de oportunidades. São 20 anos
— e o relógio está correndo.
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Maquiavel e o lucro mais magro dos bancos
Milton Gamez – Isto é Dinheiro - Edição 773 - 27.7.2012
Nicolau Maquiavel, cinco séculos depois de ter moldado o pensamento e
a ciência política moderna, está mais atual do que nunca.
Nicolau Maquiavel, cinco séculos depois de ter moldado o pensamento e
a ciência política moderna, está mais atual do que nunca. Não apenas devido
aos seus ensinamentos sempre úteis aos Príncipes de plantão, mas também ao
que tem a dizer aos banqueiros e investidores nestes momentos de crise
internacional. Imagine se, por um capricho da história, o pensador florentino
fosse vivo e virasse consultor dos maiores bancos privados. Na semana
passada, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander divulgaram lucros menores que
o esperado no primeiro semestre (leia mais aqui). O que o filósofo diria aos
bancos diante da queda da atividade econômica e do crescimento da
inadimplência nos últimos meses? Que façam muitas provisões contra os
calotes – e de uma só vez.
Banqueiros, como os demais empresários, buscam o maior lucro para o
capital investido, correndo o menor risco possível. Os acionistas das instituições
financeiras, como os investidores das outras empresas, também exigem lucros e
dividendos polpudos. Em qualquer lugar do mundo, os bancos vivem da
confiança do público em sua solidez, pois todos operam alavancados
(emprestam bem mais do que o patrimônio contábil) e nenhum abarrota caixasfortes gigantes com dinheiro suficiente para devolver aos clientes de uma só
vez, se necessário. Quando a economia vai bem, lucros elevados mostram que
o dinheiro dos acionistas e dos investidores está sendo bem utilizado nos
financiamentos à produção e na prestação de serviços. Naturalmente, quando
os bancos têm retornos financeiros muito superiores aos das empresas dos
outros setores, industriais e comerciantes costumam reclamar bastante.
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Mas e quando a economia vai mal? Bancos com lucros minguados são
alvo de desconfiança, perdem clientes e são criticados por emprestar menos e
exigir mais garantias. Nessas horas, os banqueiros mais conservadores
reforçam a liquidez e aumentam suas provisões contra perdas, mesmo que isso
leve a lucros menores. É bom que seja assim, diria Maquiavel. É preciso fazer
todo o mal de uma só vez a fim de que, provado em menos tempo, pareça
menos amargo. E quando voltarem a fazer o bem, que o façam aos poucos,
para que seja melhor saboreado. Só não podem ficar parados e perder o bonde
do crescimento no segundo semestre. Se as carteiras de crédito voltarem a
crescer de forma responsável, com os juros mais baixos e de acordo com a
capacidade de pagamento das empresas e das famílias, todos ganharão mais
no longo prazo. Embarcar em farras de crédito, como se viu nos Estados Unidos
e na Europa até 2008, não é uma boa estratégia.
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CAPITULO III
O que veremos neste capítulo:
 Poder e sociedade.
 Conceito de poder.
 Tipos de poder e fontes de poder.
 Maquiavel e o Poder político.
 Legitimidade e legalidade do poder político.
 As elites e o poder.
1. Introdução
Nas notas de aulas anteriores conhecemos o significado de
política (a arte da organização, direção e administração de nações, Estados
e também das empresas), os seus o objetos de estudo – sugeridos pela
UNESCO - e a evolução Histórica do pensamento político.
Aprendemos como Maquiavel e Marx, entre outros pensadores,
construíram caminhos alternativos para o entendimento deste conceito tão
importante em nossas vidas.
Max Weber, citado por Dias (2011), afirma que quem faz
política, não importa o motivo, aspira ao poder. Então, vamos conhecer um
pouco sobre este que é um dos mais importantes processos sociais das
sociedades humanas, segundo Dias (2011).
2. O que é poder?
Das diversas definições para a palavra poder, uma tem o apoio
da maior parte dos especialistas no estudo das ciências sociais: poder é a
capacidade de interferir no comportamento das pessoas.
A existência do poder implica uma relação social que pode
ocorrer entre duas ou mais pessoas, ou duas ou mais organizações. Segundo
Fleiner Gerster, citado por Dias (2011), o poder é derivado, de um lado, da força
e a superioridade de uma parte e, do outro lado, da dependência ou fraqueza da
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outra parte. Neste sentido, o individuo encontra-se sob o poder de outro quando
a sua conduta não é decidida por ele mesmo, mas depende de um a decisão
tomada pelo outro.
Já Friedrich, citado por Dias (2011), ensina que o poder é, de
certa forma, a capacidade de obrigar alguém a fazer ou não alguma coisa.
Entretanto, argumenta que a origem do poder relacional é consensual e
cooperativa, sendo muito importante para um líder a aquisição deste poder
originado no consenso.
È difícil não acharmos uma relação de poder em nossas vidas.
Ela ocorre, em diferentes intensidades, em praticamente todas as relações
sociais. Além de variar em intensidade, também existem diversos tipos de
poderes. No entanto, apesar desta diversidade, podemos estabelecer uma
hierarquia entre os poderes, tendo o poder político o lugar de maior destaque.
Esta prevalência do poder político sobre os outros poderes é
primordial para estabelecer a necessária convivência social. Baseado nisto,
aceitamos ou legitimamos até o uso do poder com o fim da dominação de um
grupo sobre outro.
Um ponto interessante diz respeito ao exercício do poder, pois
apesar dele ser feito por pessoas, não deve ser confundido com elas. É o que
chamamos despersonalização do poder.
Como processo social, o exercício do poder está fortemente
ligado a cultura dos grupos sociais. Significa dizer que se um grupo privilegia o
uso da força física, o poder naquela comunidade terá como principal
componente a força física. Se os indivíduos valorizarem a divindade, então os
sacerdotes terão maiores possibilidades de exercer o poder.
Aristóteles em livro Política aponta três tipos de poder: o poder
paterno (entre pais e filhos); despótico (entre o senhor e seus escravos) e o
político (entre governante e governado).
Norberto Bobbio, citado por Dias (2011) também aponta três
tipos de poder: o econômico, o ideológico e o político.
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Segundo aquele autor, o poder econômico é aquele que para
ser exercido depende da posse de bens.
O poder ideológico é baseado nas ideias. Ele é exercido quando
alguém consegue alterar o comportamento de outra pessoa, utilizando somente
ideias.
O poder político é fundamentado na posse de instrumentos com
os quais se exerce a força física ou a coação.
Para Max Weber, poder significa toda probabilidade de impor a
própria vontade em uma relação social, ainda que exista resistência.
Para Dias (2011), o poder é legitimo quando aqueles que não o
tem, aceitam e o obedecem.
3. De onde vem o poder?
Existem diversas fontes de poder, sendo a força e a autoridade
as principais no que se refere a conquista e legitimidade do poder. Em geral,
elas não aparecem isoladas, coexistindo em diferentes graus para formar o
poder do agente que o exerce.
A força, como fonte de poder, surge quando um agente usa ou
ameaça de coerção física outro agente. Essa coerção física pode é expressa
pelo usa de armas ou até mesmo pelo porte físico.
È característica dos Estados o uso da força para promover a
coerção física. Para tanto os Estados possuem os meios necessários como
polícia e forças armadas (aeronáutica, exercito e marinha)
Outra fonte de poder, a autoridade, pode ser definida como um
direito de decidir sobre o comportamento de outrem.
Max Weber estudou e identificou três tipos de autoridade: a
burocrática, também denominada racional; a tradicional e a carismática.
A primeira, a autoridade burocrática ou racional, é baseada no
cargo ou posição formalmente constituída. Neste caso, a lei ou as regras
escritas determinam como será o exercício da autoridade. Exemplos: juiz,
delegado, funcionário público.
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A autoridade tradicional é aquela constituída segundo a crença,
as normas e tradições sagradas. As pessoas obedecem devido à tradição.
Exemplos: rei, príncipe, padre, marido, pai, etc...
A autoridade carismática é baseada nas qualidades pessoais
excepcionais do individuo, o líder. As pessoas respeitam a autoridade do líder
pelo carisma e isto é importante para a estabilidade da organização ou
sociedade. Exemplos: Cristo, Napoleão, Ghandi, Martin Luther King, Peron, Fidel
Castro, etc.
3.1 Outras fontes de poder
No tocante ao exercício do poder, John Kenneth Galbreith
avalia que um líder que deseja motivar as pessoas precisa conhecer os pontos
básicos que podem maximizar seu poder. Esses pontos básicos ele classificou
como fontes de poder e no seu entender elas são três:
I - a personalidade, que é o conjunto de características pessoais
de uma pessoa (inteligência, conduta moral, etc.);
II - a propriedade ou riqueza, que é o conjunto de bens que uma
pessoa possui, e
III - a organização ou as organizações (escola, associação,
igreja, etc.) da qual participa.
4. O poder político
Todo grupo que possui um padrão permanente de relações
humanas que envolva de maneira significativa, poder, governo ou autoridade,
necessita de um poder que o estruture e o mantenha coeso. È o poder político.
Este poder tem algumas peculiaridades, como a possibilidade
recorrer a força para que sejam alcançados os fins pretendidos.
O poder político é diferentemente exercido pelo líder e pelo
governante. O primeiro usa capacidade de convencimento para modificar o
comportamento de seus seguidores, enquanto o segundo exerce o poder político
53
de maneira mais formal, em decorrência das leis e normas que legitimam sua
autoridade.
Importante registrar que os indivíduos se submetem ao poder
político, obedecendo-o, por acreditarem na legitimidade.
5. Maquiavel e o poder político
Em sua obra O príncipe, Maquiavel procurou compreender a política
sob a ótica da conquista ou da manutenção do poder.
Baseado no seu entendimento dos fatos e em sua crença de que a
natureza dos homens é constante e inalterável ele desenvolveu uma teoria que
possibilita a análise objetiva da realidade política.
Em O príncipe, Maquiavel aponta os caminhos para governar e manter o
poder sem cair nas armadilhas das quais o gênero humano é capaz. Maquiavel
pretendia com sua obra ensinar quais eram os mecanismos de governo, como
se poderia consolidar e fortalecer o Estado e que erros deveriam ser evitados.
Para Maquiavel, a religião e a moral poderiam ser utilizadas para
consolidar o poder, mas não para o seu funcionamento. A força, segundo ele, é
o único meio de incrementar e manter o poder.
Maquiavel argumentava que sempre existiria uma razão de Estado para
justificar o emprego da violência e da crueldade, sendo mais importante, para a
manutenção do poder, ser temido que amado.
6. Legitimidade e legalidade do poder político
A legitimidade vem da crença de que quem exerce o poder político tem
autoridade para tal. È a ideia de obrigação política de obediência pela qual as
pessoas aceitam e justificam um poder político.
Não devemos confundir legitimidade com legalidade, pois enquanto a
primeira relaciona o poder com determinado conjunto de valores. A segunda
vincula o poder com as leis.
54
7. As elites e o poder
Denominamos elite uma categoria de pessoas que se destacam em um
setor ou atividade social.
No campo político a elite representa quem exerce o poder.
Em um sistema político a elite governante é quem detém o poder
político, existem outras elites que lhe dão sustentação e apoio tais como igrejas,
sindicatos, associações, e outros grupos.
8. Teoria das elites
Gaetano Mosca foi quem primeiro formulou a teoria das elites. Para ele
há duas classes de pessoas: governantes e governados.
A classe governante (a elite) cumpre todas as funções políticas através
do monopólio do poder, enquanto a dos governados, mais numerosa, é regida
pela elite de modo legal ou violento.
Vilfredo Pareto, contemporâneo de Mosca, também formulou sua teoria
das elites. Para ele, em toda sociedade há uma classe superior (a elite) que
possui os poderes político e econômico.
Em sua teoria da circulação das elites ou teorema de Pareto, ele
descreve o processo dinâmico de formação e substituição das elites em um
movimento permanente que eleva os indivíduos até os postos superiores,
deslocando outros para os inferiores.
Outro autor, Wright Mills, desenvolveu sua teoria das elites, partindo da
ideia de que o homem comum é aquele cujos poderes são limitados pelo mundo
cotidiano e sendo assim é movido por forças que não estão no seu controle. Por
outro lado, a elite é composta por homens que se encontram em posições tais
que lhe permitem ocupar posições estratégicas dentro da sociedade,
concentrando poder, riqueza e prestigio.
Bibliografia
Dias, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Editora Atlas, 1ª ed. 2011.
55
7 Tipos de Poder no Ambiente de Trabalho
http://liderando-lideres.com.br/lideranca/7-tipos-de-poder-no-ambiente-detrabalho/
Há uma frase de Margaret Thatcher, que diz: “O
poder é como ser uma dama: Se você tem que dizer às
pessoas que você é, você não é”.
Pessoalmente, acho que o estudo do poder
fascinante. A definição no dicionário de poder é “uma
pessoa ou coisa que possua ou exerça autoridade ou
influência”. Então, em essência, quando usamos o poder, estamos utilizando a
nossa autoridade para conseguir alguma coisa.
Todo mundo tem poder. Todos. E, eu não acredito que o poder é uma
coisa ruim. A questão é que tipo de poder uma pessoa tem e como alguém usa
esse poder.
Aqui estão alguns dos tipos mais comuns de poder encontrados no
ambiente de trabalho:
O poder coercitivo está associado com pessoas que estão em uma
posição para punir outros. As pessoas temem as consequências de não fazer o
que foi pedido deles;
Poder de conexão é baseado em quem você conhece. Esta pessoa
conhece, e tem peso na opinião de outras pessoas poderosas dentro da
organização;
Poder da expertise vem da experiência de uma pessoa (duh!). Isto é
normalmente uma pessoa com uma habilidade aclamada ou valorizada;
Uma pessoa que tem acesso a informações valiosas ou importantes
possui o poder da informação;
O poder legítimo vem da posição que uma pessoa detém. Isto está
relacionado com o título de uma pessoa e responsabilidades de trabalho. Você
também poderá ouvir isso se referir como poder posicional.
As pessoas que são bem-queridas e respeitadas podem ter o poder da
referência;
56
Poder da recompensa está baseado na capacidade de uma pessoa dar
recompensas. Estas recompensas podem vir na forma de missões de trabalho,
horários, salários ou benefícios.
Agora, pare de ser modesto e pensar sobre si mesmo … Eu não tenho
nenhum poder. Como você pode ver, existem muitas maneiras diferentes que o
poder pode se manifestar. E por essa razão, é importante perceber que o poder
existe em todos nós. É possível também que você tem diferentes tipos de poder
com diferentes grupos ou situações.
Agora, os dois maiores erros que vejo as pessoas fazerem do uso do
poder, são:
1) Tentando usar o poder que elas não têm, e
2) Usando o tipo errado de poder para alcançar resultados.
Para ajudar a identificar sua “zona de poder”, tome um momento e
pense sobre como você tenta influenciar a ação dos outros. Você pode usar as
descrições acima, como uma pseudo autoavaliação. Avalie-se numa escala de
1-5 em cada um dos diferentes tipos de poder. Com 1 sendo nenhuma de suas
características e 5 sendo bastante característico.
Este pode ser um exercício (desculpe o trocadilho) poderoso. Se você é
honesto consigo mesmo, eu espero que você encontre um resultado útil. Não só
pela maneira como você tende a usar o poder, mas na maneira como os outros
usam o poder com você.
57
O Poder nas Empresas e Demais Organizações - o perigo representado por
pessoas que tentam resistir às mudanças. Elias Alves - 28/04/2012
https://sites.google.com/site/espreendedor/o-poder-nas-empresas-e-demais-organizacoes---operigo-representado-por-npessoas-que-tentam-resistir-as-mudancas
Um bom líder sempre pensa, planeja e age de maneira que seus funcionários
e clientes sintam que necessitam da empresa e dele. Isto lhe garantirá a fidelidade
dos funcionários e dos clientes.
Existem vários tipos de poderes. O político, o do pensamento (positivo ou
negativo), o do chefe de uma tribo, o do líder religioso, o de mercado, etc. Mas o
poder que será o tema de uma série de artigos a partir deste é o que deve ser
exercido por líderes de organizações sociais - empresas, escolas, associações,
igrejas, etc. Todo poder é limitado. Para que uma pessoa ou um grupo exerça
poderes, é preciso, no mínimo, existir pessoas sobre as quais os poderes devem
ser exercidos. As pessoas que detêm poderes precisam também da existência de
um conjunto de estruturas, estratégias e informações confiáveis para conseguir
seus objetivos. Portanto, não existe poder ilimitado nem independente. O poder é a
capacidade de uma pessoa ou um grupo exercer influências sobre outras pessoas
ou grupos, mas isto só é possível depois que o detentor do poder conseguir
identificar as motivações das pessoas a serem influenciadas. Para isto ele precisa
primeiro identificar as fontes de seu poder.
As fontes de poder segundo Galbreith
Para descobrir o que pode motivar outras pessoas, o líder de uma
organização precisa primeiramente identificar quesitos básicos dos quais seu poder
deve provir. Esses quesitos são chamados "fontes de poder". John Kenneth
Galbreith - Ph.D. em Economia Agrícola com mestrado e doutorado pela
Universidade da Califórnia - identificou três dessas fontes como fundamentais: a
personalidade, que é o conjunto de características pessoais de uma pessoa
(inteligência, conduta moral, etc.); a propriedade ou riqueza, que é o conjunto de
bens que uma pessoa possui, e a organização ou as organizações (escola,
associação, igreja, etc.) da qual participa.
Galbreith diz que a personalidade é o estágio mais antigo do exercício do
poder. É o que mais atrai profissionais como jornalistas, radialistas, profissionais de
58
marketing, mas também advogados e outros que veem nela a possibilidade de
participarem em programas de televisão como entrevistados e de se destacarem
publicamente através de jornais e outros meios, não necessariamente porque
querem "aparecer", mas porque precisam disso profissionalmente. A propriedade e
a organização não os conduzem a essa possibilidade.
Segundo Galbreith, a propriedade ou a riqueza de uma pessoa ou de um
grupo transforma outras pessoas e outros grupos em seus submissos. Entre estes,
estão os funcionários em relação aos seus chefes. Mas esses mesmos funcionários
se tornam detentores do poder quando diante deles, em casa, se tornam submissos
os empregados domésticos, e os demais membros de organizações (associações
de moradores de bairros, clubes, etc.) das quais são presidentes. Neste caso, a
pessoa ou grupo que detém poderes por interesses específicos pode até "comprar"
certos tipos de políticos, de advogados e outras pessoas susceptíveis a subornos e
até chantagens.
Galbreith destaca a organização como a fonte de poder mais importante
porque, segundo ele, são necessárias para que a pessoa garanta seu poder. Isto
quer dizer que o declínio do poder proveniente da personalidade e da propriedade
pode estar relacionado ao crescimento dos grupos organizados. Por serem
instituições formadas por pessoas que se organizam para defender temas
específicos, especialmente os de utilidade pública e social, essas instituições
conquistam facilmente patamares sociais mais elevados e conquistam um
reconhecimento público capaz de transformá-las
nos chamados "movimentos
sociais".
Principais características pessoais associadas às mudanças de poder
Entre os elementos pessoais que determinam a capacidade de exercício do
poder, costumam-se destacar a personalidade, o 'status' social e as características
formal e de competência. Quanto à personalidade, destacam-se o dinamismo, a
capacidade de aproveitar oportunidades, a habilidade em negociações e no interrelacionamento pessoal e a motivação para o trabalho.
O "status" social se refere à rede de relações que o funcionário é capaz de
criar. Na verdade nunca é demais lembrar que isto é extremamente importante para
qualquer pessoa obter sucesso na vida.
59
O que se chama de "autoridade formal" é a posição hierárquica como fonte
de poder. Neste caso, não se trata do poder exercido pelos líderes, mas do exercido
pelos chefes. Lembre-se, "liderança" e "chefia" não são a mesma coisa.
A autoridade da competência mede a profundidade do conhecimento que o
funcionário tem em relação à empresa para a qual ele trabalha. Como já foi
esclarecido em outros artigos neste blog, todo funcionário que queira ser bem
sucedido precisa conhecer o máximo possível sobre as potencialidades e as
fraquezas da empresa em todos os aspectos; o que a legislação determina quanto à
atuação da empresa no mercado e às suas funções sociais, etc. Neste caso,
considera-se como líder a pessoa a quem os demais funcionários do departamento
costumam, com maior frequência, perguntar o que podem ou não podem fazer ou
como devem agir em determinadas situações. O líder é aquele que frequentemente
dá a palavra final, a palavra que define uma decisão.
Interesses em jogo
Em se tratando de poder, o que se verifica claramente no âmbito da política
também ocorre nas empresas. Como o poder se move de um departamento para
outro e de uma pessoa para outra segundo as exigências das forças de mercado e
as características pessoais, obviamente entram em jogo os interesses pessoais.
Durante um período pré-eleitoral, os partidos políticos se unem em coalizões
para fortalecer as possibilidades de eleição de seus representantes. No entanto, o
que mais caracteriza as negociações políticas é o conjunto de interesses comuns
dos partidos e pessoais de seus integrantes. Numa empresa, as coalizões para
obtenção de poder ocorrem também por interesses pessoais e comuns, e surge
outra coalizão a partir do momento em que alguém demonstra outro interesse
diferente. O que se verifica ao final de tudo isto é que cada coalizão sempre se
configura de forma bem diferente de todas as outras.
Jay Galbraith destaca três elementos do poder como os principais
Renomado economista norte americano, Jay Galbraith é considerado o
precursor dos estudos sobre estruturas organizacionais. Atualmente desenvolve
pesquisas para o Centro de Organizações Eficazes da Universidade do Sul da
Califórnia. Ele garante a existência de três instrumentos básicos em qualquer
organização: o condigno, o compensatório e o condicionado.
Imposição sobre preferências pessoais dos funcionários
60
Segundo Galbraith, o poder condigno se destaca pela capacidade de impor
ao indivíduo ou a um grupo uma alternativa desagradável e penosa o suficiente para
fazê-lo desistir de suas preferências pessoais, usando-se até mesmo punições
físicas para tal finalidade (desconforto, dores e até torturas). É um instrumento
relacionado à personalidade como fonte de poder.
A conquista em vez da obtenção
Quando o assunto é o poder numa empresa ou organização, "conquistar"
não é o mesmo que "obter". "Conquistar" é conseguir o poder através da opressão
ou de interesses escusos; "obter" é alcançar ou conseguir o poder através do
merecimento. O poder compensatório se dá pela conquista através de submissão
em troca de favorecimentos como aumentos salariais, promoções e outras
recompensas nem sempre legais. Tanto neste caso como no poder condigno, o
funcionário está consciente de sua submissão. O poder compensatório é um
instrumento cuja fonte de poder é a propriedade.
Mudança de convicções através da persuasão
O poder condicionado é exercido pela mudança de uma convicção. Estão
inseridos nele a persuasão, a educação e o compromisso social com o que quer
que nos pareça certo. É altamente subjetivo e se manifesta através da família, da
escola, dos meios de comunicação, etc. um dos fatos mais interessantes em
relação ao poder condicionado é que nem sempre os que o exercem ou os que a
ele se submetem percebem sua presença.
Isto acontece porque o condicionamento pode ser implícito ou explícito. É
implícito quando determinado pela própria cultura à qual pertencemos e explícito ao
ser efetuado, por exemplo, pela mídia - principalmente através de publicidade.
Os "rituais" e o medo de perder o poder
A burocracia costuma definir procedimentos que se transformam em rotinas
e, mais do que isto, se tornam "rituais". Entre estas, estão certas circunstâncias e
pompas que costumam ser adotadas em recepções a visitantes como autoridades
políticas, celebridades de outros países, etc. Há muitos casos em que a burocracia
costuma definir procedimentos que acabam se tornando "rituais". São conhecidos
fatos em que esses "rituais" são simplesmente desnecessários - como os que
ocorrem em certos bancos, nos quais eles são adotados até mesmo como rotina na
abertura do atendimento diário por um caixa.
61
Além das rotinas ritualísticas, destaca-se o fato de que há pessoas que
ocupam cargos elevados na hierarquia da empresa que simplesmente têm medo de
mudanças. Não porque apenas não querem mudar algo que já está estabelecido e
achem que uma modificação trará problemas à empresa, mas porque já estão
acostumados a uma rotina que lhes garante um poder que não corem correr o risco
de perder. Em muitas dessas situações, os chefes chegam a impor obstáculos
contra quaisquer sinais de inovações e criatividade demonstrados por seus próprios
funcionários, e muitos destes até são demitidos sob a alegação de necessidade de
cortes nos gastos da empresa, inaptidão para as funções, etc.
Despersonalização
As burocracias determinam regras para os cargos, não para os ocupantes
dos cargos. Isto faz com que os funcionários sejam conhecidos por seus próprios
colegas pelos cargos que ocupam - diretor disto, gerente daquilo, etc. - e não por
seus nomes. Existem situações, felizmente raras, em que os funcionários são
conhecidos apenas pelos números das matrículas.
Dizem que há quem goste dessa impessoalidade. Acredito que haja pessoas
acostumadas a ela, mas "acostumar-se a algo" não é o mesmo que "gostar de
algo". Creio que as únicas pessoas que poderiam de fato gostar disto seriam
aquelas que se beneficiam através de favoritismos e corrupção. O público e os
funcionários honestos - que felizmente existem - não querem tratamento impessoal.
Querem e têm o direito de serem tratados como pessoas, não querem um
tratamento padronizado. Se você perguntar sobre isto a um líder de um
departamento de marketing, e se teste for sincero, será isto que ele lhe dirá como
resposta.
62
CAPITULO IV
O que veremos neste capítulo:
 Concepção e evolução de Estado.
 O Estado Moderno.
 Teorias sobre a origem do Estado.
 Burocracia.
 Burocracia e poder.
 A estrutura burocrática das empresas capitalistas.
1. Introdução
Um sistema político, entendido como qualquer padrão
permanente de relações humanas que implique de maneira significativa,
em poder, governo ou autoridade precisa de um poder que o coordene,
necessita de um poder que o estruture e o mantenha coeso. Esse poder é o
poder político que na hierarquia dos poderes ocupa o lugar mais alto.
Política, sistema político, poder, autoridade, sociedade e Estado
são conceitos fortemente entrelaçados e sendo assim, não há como deixar em
segundo plano o estudo de nenhum deles.
O objetivo deste capítulo é mostrar o significado da palavra
Estado, sua concepção e evolução. Também veremos a composição da
estrutura necessária para o funcionamento do Estado, a burocracia.
Em seguida, estudaremos a burocracia nas empresas, pois ela
não é uma exclusividade do Estado.
2. O conceito de Estado
Segundo Dias (2011), a palavra Estado surgiu para representar
a situação ou condição de poder na sociedade política.
No dicionário Houaiss a palavra Estado teve origem no século
XIII e designa o conjunto das instituições (governo, forças armadas,
funcionalismo público etc.) que controlam e administram uma nação.
63
O jurista italiano Norberto Bobbio, acrescenta que a primeira vez
que a palavra foi utilizada, com o seu sentido contemporâneo, foi no livro O
Príncipe, de Nicolau Maquiavel.
O Estado, fenômeno histórico presente desde a Antiguidade em
diversas regiões do planeta, constitui um conjunto de instituições por meio das
quais o poder da sociedade se organiza. Essa organização independe de
parentesco, não tem personalidade, é vinculada somente à corporação política
que forma o povo organizado e serve para justificar o poder político.
Neste sentido, podemos entender que o Estado é o aparato
necessário para que se possa exercer o poder.
Em resumo, no dizer de Dias (2011):
“O Estado constitui uma sociedade politicamente organizada em
um lugar e tempo determinado, onde vigora determinada ordem de convivência,
com um poder soberano, único e exclusivo. [...].”
3. A concepção do Estado
O conceito de Estado tal como o utilizado atualmente, e que é
utilizado por organizações internacionais para identificar seus membros (como
ONU e a OEA), tem sua origem no século XVI, com a formação do Estado
moderno, em sua forma absolutista.
Ao longo da história, o Estado moderno foi se adaptando a
diferentes situações, evoluindo desde as formas absolutistas às democráticas.
Hoje, como forma de sociedade, se apresenta como uma corporação de caráter
territorial
fundamentada
pela
solidariedade
do
povo,
com
autonomia,
independência e soberania.
Segundo Duverger, citado por Dias (2011), o Estado é uma
comunidade humana em que os governantes são mais bem organizados, sendo
este fato decorrente de três pontos:
1) o Estado possui a organização política mais complexa, tanto
no que se refere à repartição de tarefas como à hierarquia dos órgãos;
64
2) no Estado encontramos um sistema de sanções organizadas
que permitem aos governantes reprimir a desobediência e estabelecer a
organização da sociedade;
3) o Estado dispõe de maior material para fazer executar suas
decisões (exercito, policia, forças armadas, etc..) do que qualquer outra
comunidade.
4. A evolução da concepção de Estado
Na Grécia antiga encontramos as primeiras referências daquilo
que podemos considerar como Estado.
Em uma etapa primitiva existiram cidades importantes que eram
dominadas por famílias. Tempos depois, surgiram comunidades com relações
mais complexas no que diz respeito às formas de organizações. Eram as polis,
cidades estados cuja ideia de governo e soberania não estava vinculada ao
território que ocupavam.
A
preocupação
maior
dos
gregos
era
centrada
no
comportamento político, econômico, religioso e cultural dos indivíduos, pois
esses fundamentavam as leis e costumes, através da pratica da política.
Na cultura romana, o Estado era a civitas ou a comunidade dos
cidadãos. Tinha em sua constituição a assembleia, o senado e o povo.
As formas de organização política romana foram a monarquia, a
república e o império. Para Cícero, a civitas não era qualquer aglomeração
humana, mas somente a que se baseia no consentimento da lei e na utilidade
comum.
5. O Estado moderno
Para conseguir o poder absoluto de seus territórios e a centralização do
poder os principes empreenderam várias lutas contra o império e a igreja. Este
conjunto de lutas foi a condição básica para o surgimento do Estado moderno.
Vencidos o império e a Igreja, os princípes conseguiram concentrar o
poder em suas mão, sendo que os principais fatores que possibilitaram esta
concentração de poder foram:
65
I) a criação de um exército, cujos membros dependiam de pagamento;
II) formação de uma estrutura composta de funcionários permanentes
com competências bem definidas, economicamente dependente e organizada
em hierarquia. A burocracia.
III) a criação de um sistema de tributos em contraposição ao sistema de
contribuição voluntária da nobreza.
IV) Implantação de uma única ordem jurídica em todo território.
Além destes fatores citados como importantes para o surgimento do
Estado moderno não devemos esquecer:
- a adoção do direito romano que trouxe o conceito da propriedade
privada;
- a reforma protestante que propiciou a ruptura com o poder da igreja,
reforçando desta forma o poder do Estado; e
- o desenvolvimento do capitalismo fruto da ascensão da burguesia.
A primeira forma de Estado moderno que surge é o Estado absolutista,
definido como o monopólio da força sobre três planos:
a) jurídico – somente o Estado poderia produzir normas jurídicas;
b) político – caberia unicamente ao príncipe legislar e administrar; e
c) sociológico – o príncipe possui um novo instrumento operacional, uma
máquina que atua de maneira racional e eficiente.
6. As teorias contratualistas sobre a origem do Estado
Contratualismo é a ideia de que o Estado é o produto da decisão
racional dos homens destinada a resolver os conflitos gerados pelo seu instinto
antissocial ou para solucionar os problemas advindos da convivência.
Os principais autores desta ideia são: Thomas Hobbes, John Locke e
Jean-Jaques Rousseau.
Suas teorias têm os seguintes pontos em comum:
i) Partem da premissa que antes do Estado regido por leis, existiu o
Estado em que os indivíduos tinham direitos naturais;
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ii) Através do contrato social, os indivíduos decidem viver em uma
sociedade regida por leis, tendo o Estado como instrumento de solução de
conflitos;
iii) há diferentes tipos de Estado: o absolutista (Hobbes), liberal (Locke)
e democrático (Rousseau).
6.1. O contrato segundo Hobbes (1588-1679)
Thomas Hobbes defendeu a ideia de que o ser humano é antissocial e
sua conduta é motivada pelo egoísmo. Para ele, os pactos sociais poderiam ser
mantidos desde que existisse um governo forte, pois o temor ao castigo
induziriam os indivíduos a conviver em sociedade.
De acordo com Hobbes, o homem é um ser agressivo e invejoso por
natureza devido ao seu desejo de tirar vantagem num contexto inicial de
igualdade. Em decorrência disso surgem os conflitos que somente podem ser
resolvidos com a intervenção do Estado. Assim, o Estado é mais do que uma
decorrência natural da vida em sociedade, é um instrumento necessário para
garantir a estabilidade da convivência entre os homens.
Hobbes dizia que a natureza humana era composta de duas tendências:
A razão e a paixão.
A paixão levava os homens a desejarem e a conseguirem os bens e
privilégios dos outros, provocando o conflito. Já a razão, lhes mostrava que os
bens conseguidos assim não podiam ser desfrutados e dessa forma era melhor
pactuar.
O pacto consistia na renúncia dos direitos em favor do soberano para
que este estabelecesse a justiça e a moral. Desta forma, o soberano se torna o
único poder legislativo e o Estado, a única fonte de direito.
6.2. O contrato segundo John Locke (1632-1704)
Principal teórico do liberalismo, Locke contribuiu de maneira decisiva
para o entendimento dos conceitos de liberdade e propriedade.
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John Locke acreditava que as pessoas são livres e iguais, embora muito
egoístas, buscando o crescimento pessoal sem se importar com a situação dos
outros.
Como as pessoas são livres e iguais, os poderes do Estado deveriam
ser suficientes para garantir o cumprimento das regras de forma a assegurar que
as pessoas conseguissem desfrutar seus direitos e as suas liberdades.
O Estado deveria providenciar as regras (legislação), difundir o
conhecimento (educação), garantir o cumprimento das regras (segurança) e
punir o não cumprimento (justiça).
6.3. O contrato segundo Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)
Diferentemente de Hobbes e Locke, Rousseau defende que as pessoas
são livres, iguais e boas, e as sociedades é que as corrompem. Entretanto,
existem inúmeras necessidades que precisam ser satisfeitas e neste sentido, o
Estado, constituído segundo a vontade de todos, é o instrumento essencial da
vontade geral expressa por meio de lei.
7. O Estado segundo Karl Marx
A contribuição de Marx para a Ciência Política é de suma importância.
Sua visão materialista, fundamentada no pressuposto de que as relações de
produção determinam o modo pelo qual a sociedade se organiza, revoluciona o
pensamento político.
Para os marxistas, o Estado representa a organização de classe do
poder político, que defende e garante a dominação de uma classe (a burguesia)
sobre a outra (o proletariado). Esta estrutura dominante utiliza-se da religião e
do sentimento nacionalista para perpetuar a relação desigual existente na
sociedade capitalista.
Para Marx, como o Estado pertencia todos, os meios de produção
deveriam pertencer ao Estado e não aos particulares (propriedade privada).
68
8. Estado, burocracia e poder
Max Weber foi o estudioso que cuidou de
se aprofundar sobre a organização burocrática e
teorizar o estudo da burocracia.
Ele
instituição
analisa
o
burocrática,
Estado
sendo
como
sua
uma
criação
necessária para assegurar à classe dominante,
uma dominação política.
Para garantir a sua dominação, o Estado
dispõe de instituições para transmitir a sua ideologia, de instituições de
repressão para garantir que as leis que são criadas, sejam cumpridas, e de
instituições econômicas para poder intervir na economia.
Para se entender melhor a forma de dominação no Estado, é preciso
analisar a teoria da dominação de Weber. Segundo ele, existem três tipos de
dominação: tradicional, carismática e legal.
A dominação tradicional se caracteriza por uma legitimação que se
baseia na crença na justiça e qualidade do dominador.
O governante tem
liberdade para emitir ordens, ficando restrito apenas aos costumes e hábitos da
sua sociedade.
A
dominação
carismática
consiste
na
crença
em
qualidades
excepcionais de um indivíduo para governar outros. Quando atinge uma
complexidade maior, ele é assessorado pelos seus discípulos mais próximos.
Trata-se de uma dominação instável e inconstante.
Já a dominação legal se baseia num aparato de regras que legitimam o
seu poder. Os assessores administrativos são chamados burocratas e também
tem seu poder regulamentado legalmente, não podendo vendê-lo ou transferi-lo.
Esses três tipos de dominação, porém, nunca acontecem de forma pura, tendo
sempre características misturadas, mas prevalecendo um desses tipos.
O Estado moderno sofre a burocratização em toda parte. Mas o fato de
que a organização burocrática seja tecnicamente o meio de poder mais
altamente desenvolvido nas mãos do homem que o controla, não determina o
69
peso que a burocracia, como tal, é capaz de exercer em uma estrutura social
particular. Em condições normais, a posição de poder de uma burocracia
plenamente desenvolvida é sempre predominante e toda burocracia busca
manter, ou mesmo aumentar, a superioridade dos que são profissionalmente
informados, mantendo secretos seus conhecimentos e intenções.
A partir do Estado moderno, que fez valer a burocracia, as outras
instituições cada vez mais vão adquirindo aspectos burocráticos.
Exército, igreja e universidades já tem sua organização burocrática, mas
é na grande empresa moderna onde ela é mais perfeitamente aplicada.
Max Weber afirma que o moderno sistema de produção burocrático,
eminentemente racional e capitalista, se originou da ética protestante: o trabalho
árduo e o ascetismo proporcionando a poupança e reaplicação das rendas
excedentes, em vez de seu dispêndio para o consumo.
9. A Teoria da burocracia e o pensamento administrativo
A Teoria da Burocracia desenvolveu-se dentro da Administração ao
redor dos anos 40, em função, principalmente, dos seguintes aspectos:
- A fragilidade e parcialidade da Teoria Clássica (Taylor e Fayol) e da
Teoria das Relações Humanas (Diversos – grande depressão);
- A necessidade um modelo de organização racional aplicável não
somente à fábrica, mas a todas as formas de organização, principalmente às
empresas;
- O tamanho e complexidade crescentes das empresas.
O conceito central da Teoria da Burocracia é a autoridade legal, racional
ou burocrática. Os subordinados aceitam as ordens dos superiores como
justificadas, porque concordam com um conjunto de preceitos ou normas que
consideram legítimos e dos quais deriva o comando.
A obediência não é devida a alguma pessoa em si, mas a um conjunto
de regulamentos legais previamente estabelecidos.
O aparato administrativo que corresponde à dominação legal é a
burocracia. A posição dos funcionários (burocratas) é definida por regras
70
impessoais e escritas, que delineiam de forma racional a hierarquia os direitos e
deveres inerentes a cada posição, os métodos de recrutamento e seleção, etc.
A burocracia é a organização típica da sociedade moderna democrática
e das grandes empresas. Através do “contrato” ou instrumento representativo da
relação de autoridade dentro da empresa capitalista, as relações de hierarquia
nela passam a constituir esquemas de autoridade legal.
Weber notou a proliferação de organizações de grande porte que
adotaram o tipo burocrático de organização, concentrando os meios de
administração no topo da hierarquia e utilizando regras racionais e impessoais,
visando à máxima eficiência.
Fatores principais para o desenvolvimento da moderna burocracia:
- O desenvolvimento de uma economia monetária;
- O crescimento das tarefas administrativas do Estado Moderno;
- A superioridade técnica do tipo burocrático de administração.
Características da Burocracia
- Caráter legal das normas e regulamento.
- Caráter formal das comunicações.
- Caráter racional e divisão do trabalho.
- Impessoalidade nas relações.
- Hierarquia da autoridade.
- Rotinas e procedimentos padronizados.
- Competência técnica e meritocracia.
- Especialização da administração.
- Profissionalização dos participantes.
Vantagens da Burocracia
Para Weber, comparar os mecanismos burocráticos com outras
organizações é como comparar a produção da máquina com modos não
mecânicos de produção.
71
Assim, as vantagens da burocracia são:
- Racionalidade em relação ao alcance dos objetivos da organização;
- Precisão na definição do cargo e na operação;
- Rapidez nas decisões;
- Unicidade de interpretação;
- Uniformidade de rotinas e procedimentos;
- Continuidade da organização através da substituição do pessoal
afastado;
- Redução do atrito entre as pessoas;
- Subordinação dos mais novos aos mais antigos
- Confiabilidade.
Nessas condições, o trabalho é profissionalizado, o nepotismo é evitado
e as condições de trabalho favorecem a moralidade econômica e dificultam a
corrupção.
A equidade das normas burocráticas assegura a cooperação entre
grande número de pessoas, que cumprem as regras organizacionais, porque os
fins alcançados pela estrutura total são altamente valorizados.
Bibliografia
Dias, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Editora Atlas, 1ª ed. 2011.
72
CAPITULO V
O que veremos neste capítulo:
 Retrospectiva.
 Política, poder e Administração.
 Liderança e poder.
 Dependência, a chave do poder
 Táticas de poder
 O poder em ação, o comportamento político.
1. Retrospectiva
Política, sistema político, poder e autoridade são conceitos
fortemente entrelaçados e tem importância equivalentes.
Relacionar esses conceitos com o mundo empresarial não é
difícil visto que em uma empresa temos relações de poder, autoridade e, por que
não dizer, de polítca.
Nas notas de aulas anteriores estudamos todos esses
conceitos, começando pela política e seus primeiros pensadores na Grécia.
Da
política
passamos
para
o
sistema
político
padrão
permanente de relações humanas onde coexistem poder, governo e autoridade.
È difícil não acharmos uma relação de poder em nossas vidas.
Ela ocorre, em diferentes intensidades, em praticamente todas as relações
sociais. Além de variar em intensidade, também existem diversos tipos de
poderes. No entanto, apesar desta diversidade, podemos estabelecer uma
hierarquia entre os poderes, tendo o poder político o lugar de maior destaque.
É um fenômeno intrigante, complexo e oculto. Está presente nos
setores públicos e privados com fins lucrativos ou não, em situações de trabalho
voluntário e trabalho remunerado. Cada tipo de organização difere em termos de
objetivo, quadro de pessoal e outras variáveis, mas os problemas de poder
organizacional são muitas vezes da própria sobrevivência individual e estão
presentes em cada uma delas.
73
Para Robbins (2002), poder é um processo natural em qualquer
grupo ou organização. Ele tem origem na força ou na autoridade.
A força, como fonte de poder, surge quando um agente usa ou
ameaça de coerção física outro agente. È uma característica dos Estados.
A outra fonte de poder, a autoridade, pode ser definida como um
direito de decidir sobre o comportamento de outrem. Max Weber identificou três
tipos de autoridade: a burocrática; a tradicional e a carismática.
O estudo da política, do poder e da autoridade inicialmente
acontece naquela instituição que conhecemos como Estado. Entretanto,
podemos encontrar estes conceitos também nas organizações privadas.
Quando utilizado de maneira equilibrada o poder pode trazer
benefícios para a empresa, devendo o gestor decidir a forma mais adequada de
exercê-lo, sem ser autoritário e inflexível, mas com firmeza, pois como escreveu
Maquiavel, “O homem que tenta ser bom o tempo todo está fadado à ruína entre
os inúmeros outros que não são bons”.
2. Política, poder e a Administração
Política é, como sabemos, a arte da organização, direção e
administração. Com o objetivo de mostrar como a política e o poder se
desenvolvem nas empresas, definimos a seguir o que é administração.
A administração, também chamada gerenciamento ou gestão de
empresas, é uma ciência humana fundamentada em um conjunto de normas e
funções elaboradas para disciplinar elementos do processo produtivo. Ela
estuda os empreendimentos humanos com o objetivo de alcançar um resultado
eficaz de forma sustentável. Neste contexto, o administrador necessita de
autoridade para executar suas principais funções que são: Planejar, organizar,
liderar e controlar.
As instituições administradas são entidades sociais de pessoas
e recursos que interagem em ambientes físicos ou não. Essas interações são
conhecidas como relações de trabalho. Nelas, o poder e o conflito, estam
sempre presentes.
74
Assim, o campo das relações de
trabalho
surge
como
espaço
propicio
de
manifestações de poder, produzindo as diversas
relações de força existentes entre os grupos de
interesse nas próprias organizações.
Esses interesses são em geral
econômicos, mas os fatores políticos, que podem
ser visto na aceitação das regras de maneira
consensual quando, eliminando-se o caráter de imposição e garantindo a
eficácia do sistema produtivo, como nos ensinam as teorias contratualistas sobre
a formação do Estado moderno, são muito importantes.
Neste cenário, Morgan (1996) diz que as organizações podem
ser vistas como sistemas de atividade política, e esta política organizacional
nasce
quando
as
pessoas
pensam
diferentemente
e
querem
agir
diferentemente. Essa diversidade cria tensão que precisa ser resolvida por
meios políticos ou, dito de outra forma, por quem detém o poder político.
3. Liderança e poder são sinônimos?
Os líderes utilizam o poder como meio de
atingir objetivos, seja do grupo ou até mesmo pessoal.
Portanto, liderança e poder estão muito próximos, mas não
sinônimos. Diferem basicamente de três formas:
a) Quanto à vinculação de objetivos;
b) Quanto ao foco da influência;
c) Quanto a Importância da origem e
conquista
No primeiro caso, o líder precisa, para ser bem sucedido, fazer
seus liderados compartilharem dos seus objetivos, enquanto o exercício do
poder requer apenas dependência.
Quanto ao foco da influência, a liderança é explicada
basicamente pela relação líder - liderado. Já o exercício do poder, para ser
75
entendido corretamente, precisa considerar todos os efeitos, diretos e indiretos,
verticais e horizontais.
Quanto à importância da origem e conquista, a preocupação
sobre a liderança tem foco no estilo do líder. Com relação ao poder, a
preocupação é com as táticas de conquistas e da submissão.
4. Dependência, a chave do poder
Quanto maior a dependência, maior o poder.
Isto nos leva a seguinte constatação: A dependência aumenta
quando o recurso detido por um agente é importante, escasso ou não
substituível.
Um recurso será considerado importante se alguém desejar
fortemente aquilo que é possuído por um agente.
A escassez, objeto principal de estudo da economia, é um fator
determinante para estabelecer o nível de dependência. Quanto menos escasso
for um recurso, menos poder ele dará ao seu proprietário.
No que se refere à substituição, a conclusão é: quanto menos
substitutos viáveis tiver um recurso, maior o poder que seu controle
proporcionará.
Conclusão: as fontes de poder variam de empresa para
empresa. Em uma empresa, os recursos tecnológicos significam fonte de poder;
em outra, são os departamentos de marketing os poderosos.
5. Táticas de poder
O bom exercício do poder é importante, mas como
fazê-lo com eficiência?
A maneira como os agentes influenciam os outros,
as táticas de poder, são os caminhos para o sucesso, ou
não, do exercício do poder.
76
Segundo Robbins (2002), as táticas ou estratégias mais importantes
para consquitar e exercer são sete. Vejamos cada uma delas e seu respectivo
significado.
1) Razão - argumentação racional e lógica de ideias.
2) Amabilidade - promoção de um clima amigável por meio de uma
postura humilde.
3) Coalização - Obtenção de apoio do grupo para suas ideias.
4) Negociação - oferecimento de benefícios ou favores para resolver um
conflito.
5) Afirmação - abordagem forte e direta para exigência do cumprimento
de obediência.
6) Autoridades superiores - faculdade de conseguir apoio dos superiores
para suas ideias.
7) Sanções - utilização de recompensas, punições, promessas e
ameaças para motivar.
Os administrados utilizam essas táticas ou estratégias de poder em dois
planos:
I - com relação aos subordinados
II - com relação aos seus superiores
Em ambos os casos, a razão, segundo Robbins (2002), é o meio mais
efetivo para exercer o poder.
O uso da estratégia adequada depende, em geral, do objetivo a ser
atingido, da expectativa quanto ao resultado pretendido e da cultura
organizacional.
6. O poder em ação, o comportamento político
Robbins (2002), argumenta que o poder nas organizações é posto em
prática quando os agentes se agrupam para exercer influência, seja para
conseguir aumentos de salários, promoções ou melhorias das condições de
trabalho. Neste caso, estão colocando em prática seus poderes, isto é, estão
fazendo política.
77
Essa maneira de agir é vista por Robbins (2002) como comportamento
político.
De maneira mais formal ele define comportamento político como
atividades que não são requeridas como parte do papel formal na empresa, mas
influenciam, ou tentam influenciar, a distribuição de vantagens e desvantagens
dentro do grupo. O comportamento político, em geral, está fora dos requisitos
específicos do trabalho das pessoas.
Robbins divide este comportamento em dois tipos:
I) O comportamento político legítimo – Aquele relacionado às atividades
do dia. Exemplos: reclamar com o chefe, formar coalizões, desenvolvimento de
contatos fora da empresa.
II) O comportamento político ilegítimo – Aquele que viola as “regras do
jogo”. Quem o pratica é chamado de individuo que “joga sujo”. Exemplo:
sabotagem, denúncia de colegas e uso de roupas inadequadas.
6.1. A realidade política
A política é um fato nas empresas e quem ignorá-lo corre serio risco de
ser mal sucedido em sua vida profissional
Uma questão importante é: È possível que em uma organização não
exista política?
Robbins (2002), responde que sim, é possível, mas improvável. Não
existirá política se todos na empresa tiverem os mesmos interesses, se
compartilharem as mesmas metas, se os recursos organizacionais forem
ilimitados e se os resultados dos desempenhos forem totalmente claros e
objetivos.
Este não parece ser o mundo real, tendo em conta que as organizações
são formadas por pessoas com diferentes interesses. È essa diversidade é,
normalmente, a grande fonte de conflitos.
Esses conflitos podem se materializar pelos seguintes motivos:
a) competição pelo uso dos recursos da empresa
b) busca de apoio para aprovar interesses
78
6.2. Fatores que contribuem para a existência do comportamento político
Pesquisas recentes apontaram alguns fatores que contribuem para o
desenvolvimento do comportamento político nas empresas. Aqui estão alguns
deles:
Fatores individuais:
– capacidade de automonitoramento
- necessidade de poder
- investimento na organização
- conformidade
- expectativa de sucesso
Fatores organizacionais
- Alocação de recursos
- oportunidades de promoção
- sistema de avaliação de desempenho pouco claro
- pressão por alto desempenho
- abordagem de soma zero
Bibliografia
Robbins, Stephen P. Comportamento Organizacional. Tradução técnica: Reynaldo Marcondes.
São Paulo: Prentice Hall, 9ª ed. 2002.
79
EXERCÍCIO DE FIXAÇÃO
O informe oficial quase fez parecer que foi voluntário. Jon S. Corzine,
líder do Goldman Sachs, decidiu declinar do cargo de presidente. Na verdade,
Corzine foi expulso por um golpe orquestrado pelo comitê executivo da empresa,
formado por cinco poderosos executivos. A maneira como Corzine perdeu o
emprego é um bom exemplo do papel do poder e da política dentro das
organizações.
Corzine foi nomeado presidente do Goldman em 1994. A empresa, na
época, lutava contra prejuízos no setor de tesouraria e a perda súbita de vários
parceiros importantes. Corzine tomou o controle, estabilizou a empresa e ajudou
a levantar o moral e a lucratividade. Mas diversos incidentes ocorridos em 1998,
solaparam seu poder.
Primeiro, os sócios resolveram abrir o capital da empresa. Isto resultaria
em um enorme ganho para todos eles. mas os investidores fogem das empresas
que se dedicam as operações de tesouraria, por causa da imprevisibilidade
desse setor. Os bancos de investimentos, tem ganhos mais estaveis que provem
de comissões sobre administração de fundos e subscrições. Como o Goldman
tinha ambas as funções, o comitê todo-poderoso dos cinco executivos decidiu
apresentar a empresa aos investidores como um banco de investimentos. O
problema era que Corzine tinha suas raízes voltadas para as operações de
tesouraria. Líder natural, com um estilo dissimulado e desorganizado, ele era
visto pela comunidade financeira como ligado a área de comercialização de
títulos. Em comparação, o braço direito dele, Henry Paulson, que por sinal era
membro do comitê executivo, vinha do lado do banco de investimentos.
Reservado, educado e extremamente organizado, Paulson se ajustava
perfeitamente à imagem que a empresa pretendia passar para a comunidade
financeira.
Em segundo lugar, em agosto e setembro de 1998, o Goldman teve um
prejuízo de U$$ 500 milhões no setor de tesouraria. O fato aconteceu alguns
meses antes da empresa fazer sua oferta pública. Istou reforçou os problemas
com o negócio de comercialização de títulos e prejudicou a imagem de Corzine.
Terceiro, um dos principais apoiadores de Corzine, o vice-presidente Roy
Zuckerberg, deixou o comitê executivo no final de novembro.
Por fim, Corzine e Paulson nunca foram muito próximos. Seus históricos
e estilos eram muito diferentes, gerando um relacionamento muitas vezes
conflitante. Com Corzine perdendo seu apoio e a percepção de que Paulson
seria um líder mais adequado para o processo de abertura de capital da
empresa, parecia ter chegado o momento de Paulson dar seu golpe. E foi o que
ele fez.
Em 11 de janeiro de 1999, a empresa divulgou um comunicado oficial
dizendo que Corzine estava deixando seu posto e o comitê executivo, dissolvido,
fora substituido por um comitê gestor de 15 executivos liderado por Paulson.
Adaptado do livro Comportamento organizacional, 9a. edição, 2002, páginas 340 e 341. Editora
Prentice Hall.
80
CAPITULO VI
O que veremos neste capítulo:
 Introdução. Teorias contratualistas.
 Economia Política.
 Poder político e o poder econômico.
 Intervenção do Estado na economia.
1. Introdução
Depois de conhecermos um pouco mais sobre o poder,
estudando como ele se desenvolve nas empresas voltemos nosso foco para a
política, em especial a Economia Política ou, dito de outra forma, o estudo da
influência política na economia.
Para entendermos melhor este tema vamos recordar um pouco
das teorias contratualistas.
Contratualismo é a ideia de que o Estado é o produto da decisão
racional dos homens destinada a resolver os conflitos gerados pelo seu instinto
antissocial ou para solucionar os problemas advindos da convivência.
Os principais autores desta ideia são: Thomas Hobbes, John
Locke e Jean-Jaques Rousseau.
Suas teorias têm os seguintes pontos em comum:
i) Através do contrato social, os indivíduos decidem viver em
uma sociedade regida por leis, tendo o Estado como instrumento de solução de
conflitos;
ii) há diferentes tipos de Estado: o absolutista (Hobbes), liberal
(Locke) e democrático (Rousseau).
Thomas Hobbes defendeu a ideia de que o ser humano é
antissocial e sua conduta é motivada pelo egoísmo. Para ele, os pactos sociais
poderiam ser mantidos desde que existisse um governo forte, pois o temor ao
castigo induziriam os indivíduos a conviver em sociedade.
John Locke acreditava que as pessoas são livres e iguais e
sendo assim, os poderes do Estado deveriam ser suficientes para garantir o
81
cumprimento das regras de forma a assegurar que as pessoas conseguissem
desfrutar seus direitos e as suas liberdades. Desta forma, o Estado deveria
providenciar:
a) as regras (legislação);
b) difundir o conhecimento (educação);
c) garantir o cumprimento das regras (segurança); e
d) punir o não cumprimento (justiça).
Rousseau defendeu a ideia de que as pessoas são livres, iguais
e boas, e as sociedades é que as corrompem. Entretanto, existem inúmeras
necessidades que precisam ser satisfeitas e neste sentido, o Estado, constituído
segundo a vontade de todos, seria o instrumento essencial da vontade geral
expressa por meio de lei.
Além das teorias contratualistas, outros autores contribuíram
para tentar explicar a necessidade da existência do Estado. Um dos mais
importantes foi Karl Marx. Ele acreditava que o Estado representava a
organização de classe do poder político, que defende e garante a dominação de
uma classe (a burguesia) sobre a outra (o proletariado). Para Marx, como o
Estado pertencia a todos então, os meios de produção deveriam pertencer ao
Estado e não aos particulares (propriedade privada).
2. Economia Política
Economia política foi um termo criado por Antonie de
Montchrétien em 1615, e utilizado para o estudo das relações de produção,
especialmente entre as três classes principais da sociedade: capitalistas,
proletários e latifundiários.
Adam Smith, um dos adeptos da economia política, propôs a
teoria do valor-trabalho, segundo a qual o trabalho é a fonte real do valor.
No final do século XIX, o termo economia política foi
paulatinamente trocado pelo economia, usado por aqueles que buscavam
abandonar a visão classista da sociedade, repensando-a pelo enfoque
82
matemático, axiomático e valorizador dos estudos econômicos atuais e que
concebiam o valor originado na utilidade que o bem gerava no indivíduo.
Atualmente o termo economia política é utilizado comumente
para referir-se a estudos interdisciplinares que se apoiam na economia,
sociologia, direito e ciências políticas para entender como as instituições e os
contornos políticos influenciam a conduta dos mercados.
Dentro da ciência política, o termo se refere principalmente às
teorias liberais e marxistas, que estudam as relações entre a economia e o
poder político.
3. As relações entre o poder político e o poder econômico
Muito antes de analisarmos as instituições políticas – governos e
partidos políticos –, que na democracia são os instrumentos de exercício do
poder, é preciso reconhecer que esses governos e partidos são sustentados por
recursos, valores e uma cultura própria da sociedade. Desse conjunto de fatores
nascem os poderes que nos governam. Nas sociedades modernas existem
como já vimos várias formas de poder, sendo o mais visível e atuante, sem
dúvida, o poder político, exercido pelo Estado.
Cada
cidadão
transfere,
como
nos
ensina
as
teorias
contratualistas, para esta instituição, o Estado, uma parte da sua soberania
individual, conferindo-lhe mandato para atuar em seu nome na defesa dos
interesses comuns da sociedade.
Este poder representativo de toda a sociedade dá ao Estado
autoridade para exercer sobre o conjunto das pessoas o poder político, nas mais
variadas formas: legislativa, administrativa, judicial e coerciva.
Outro poder relevante e presente na sociedade é o poder
econômico. Apesar de a sua presença não ser notória, pois se apresenta como
um conjunto disperso e normalmente não organizado institucionalmente, o poder
econômico constitui na verdade um poder final, muito importante e decisivo das
sociedades modernas. Este poder tem influência sobre todos os outros poderes,
83
exercendo uma ação dinamizadora sobre o conjunto da sociedade, incluindo
sobre os poderes político, mediático e os grupos de pressão.
Trata-se de um poder fundamentado na propriedade privada e
por isso dizemos que estamos no chamado domínio dos direitos absolutos, pois
é inerente ao ser humano, não sendo permissível que sobre o mesmo se
sobreponha outro qualquer direito de propriedade.
A lei atribui o mais amplo conteúdo ao direito de propriedade
privada: o direito de possuir, usufruir e decidir sobre o seu destino.
A questão de saber qual a relação entre o poder político e o
poder econômico está intimamente ligada à natureza do regime e da política
econômica.
Buscando extremos na ilustração, diríamos que, num regime de
economia baseada na propriedade coletiva dos meios de produção e da direção
centralizada da economia, o poder econômico pertence ao povo, que o exerce
através da classe política, das cooperativas, dos sindicatos, dos órgãos de
gestão das empresas, onde participam diretamente, e de uma série de outros
meios e mecanismos populares de gestão da economia, próprios dos sistemas
de economia centralmente dirigida. Aqui o poder econômico privado não teria
espaço para se afirmar.
Diversamente, em um regime cuja economia é baseada na
propriedade privada e nas leis do mercado, o poder econômico pertence a quem
tem a propriedade desses bens.
Os principais atores do poder econômico são, pois, os que
detêm a propriedade dos principais e mais importantes bens da economia.
Nas economias de mercado, o alcance e a dimensão deste
poder são determinados pelo papel econômico do Estado, cuja maior ou menor
intervenção na economia depende do regime econômico respectivo. Este pode
ser mais ou menos liberal, consoante a tendência ideológica de quem exerce o
poder político em cada momento histórico.
Modernamente, e independentemente da coloração ideológica
de quem exerce o poder político, os Estados não prescindem de uma
84
intervenção reguladora da economia, tendente a suprir as lacunas do poder
econômico privado e evitar as crises que o liberalismo econômico nefasto
potencia. Exemplo de liberalismo nefasto e das suas consequências (trágicas)
foi a recente crise financeira e económica mundial.
Pelas razões acima apontadas, faz todo o sentido que, nas
economias emergentes, sobretudo as que têm históricos de colonização, o
poder econômico privado com influência decisiva sobre o conjunto da sociedade
seja nacional, pois ele constitui o poder real - podendo determinar o curso do
poder político - e é uma forma de contribuir para a afirmação da soberania
nacional e para a independência econômica efetiva.
Pelas mesmas razões, no jogo entre o poder político e o poder
econômico, o Estado tem a responsabilidade de garantir o equilíbrio entre
ambos, dando efetividade aos princípios da liberdade de iniciativa econômica
privada e da orientação e regulação públicas da economia.
4. Intervenção do Estado na economia
Até 1930 o pensamento econômico predominante era aquele
denominado liberal. O pensamento liberal ou liberalismo, que teve como
principais expoentes John Locke e Adam Smith, pregava a ideia de que a
economia deveria funcionar sem que o Estado tivesse participação direta no
processo de produção, como também no consumo, visto que as liberdades
individuais deveriam ser respeitadas para que tudo se acomodasse de forma
comum e simples.
Neste cenário, o sistema econômico era dominado pelas leis de
mercado, quer dizer, as forças competitivas da economia se encarregavam ou
deveriam se encarregar de fazer os ajustamentos necessários a qualquer
desequilíbrio, que por ventura acontecesse.
Até então, não havia nenhuma preocupação, quanto à economia
como um todo, devido ser mais importante, entender como funcionavam os
preços dos produtos e dos fatores de produção no processo de crescimento, das
relações exteriores, e do bem-estar interno da população. Isto aconteceu
85
pautado numa suposição mais forte e delicada que seria toda a base do sistema
econômico vigente - a concorrência perfeita.
Na verdade, os mercados estavam funcionando numa estrutura
de grande imperfeição, tendo em conta as acumulações de capital que se
processavam, e as concentrações que estimulavam os conglomerados, na
formação de oligopólios e monopólios exploradores, invalidando a filosofia da
competição perfeita.
A crise de 1929 motivou o surgimento de novas ideias em
especial as de John Maynard KEYNES (1936). Os estudos de Keynes indicaram
que a saída para a crise vivida pelos Estados Unidos passava pelo aumento da
participação do Estado na Economia, e foi com isto que surgiu a intervenção do
Estado na economia.
A intervenção do Estado na economia vem justamente com o
aparecimento da macroeconomia, isto é, um estudo econômico que versa sobre
a economia como um todo e não localizado, como na teoria dos preços, da
famosa competição perfeita. Nestas mesmas condições, o Estado passou de
mero coordenador das atividades nacionais gerais, a uma situação de capitalista
de Estado, investindo, poupando, decidindo como deve ser a economia, enfim,
intervindo na estrutura econômica, de tal maneira que os ajustes econômicos
eram coordenados pela intervenção do Estado, através de medidas próprias.
E a crise de 1929 teve fim. Alguns países progrediram e se
fomentou neste processo de acumulação e concentração, a divisão de países
terceiro-mundistas, periféricos, ou, subdesenvolvidos; mas, isto decorrente de
uma economia dominadora, imperialista, onde predominam e fortificam-se os
poderosos na economia.
Para que o Estado agisse com eficiência na estrutura de
mercado, KEYNES observou que o sistema econômico não se autorreajusta por
si só, ao considerar que, nem sempre a produção global encontra sua procura
efetiva e isto faz com que, alguém trace melhor o caminho que a economia deve
percorrer.
86
A
partir
de
então
os
países,
desenvolvidos
ou
em
desenvolvimento, adotaram medidas que visavam maior ou menor intervenção
do Estado na economia de forma a cumprir com eficiência as funções do Estado.
E é neste contexto que a economia está totalmente vinculada
aos princípios do Estado como instituição, quer se trate de capitalismo, ou, de
socialismo, o Estado já tem bem definido, em seus caminhos a seguir em sua
estratégia de planejamento.
As funções do Estado seriam de procurar conseguir o máximo
bem-estar econômico e social possíveis, para toda a sociedade. Para tanto, ele
dispõe de vários instrumentos como a política fiscal e a política monetária, além
da importante contribuição que pode prestar ao desenvolvimento econômico
mediante a investigação científica e a divulgação dos seus resultados.
5. Exemplos da Intervenção do Estado na economia brasileira
O grau de intervenção do Estado na economia está diretamente
relacionado ao posicionamento ideológico da elite governante. Para os adeptos
do pensamento liberal, o Estado deve intervir o menos possível. Contrariamente,
os defensores do socialismo advogam maior intervenção do Estado na
Economia.
No Brasil, a atuação econômica estatal aparece de forma mais
efetiva na década de 40, quando tem início o processo de substituição das
importações. Dada à fragilidade da iniciativa privada, o Estado exercia o papel
de condutor da economia. Nessa década foram criadas as primeiras grandes
empresas estatais, a Companhia Siderúrgica Nacional, a Fábrica Nacional de
Motores, a Companhia Vale do Rio Doce e a Companhia Hidrelétrica do São
Francisco.
Na década seguinte, estabeleceu-se uma importante discussão
ideológica acerca do papel do Estado, sobretudo devido ao contexto da guerra
fria onde o mundo ficou dividido entre o pensamento capitalista – sob a liderança
dos EUA - e as ideias socialistas capitaneadas pela antiga URSS.
87
Neste contexto conturbado surgiram somente duas empresas
estatais merecedoras de destaque: o Banco Nacional do Desenvolvimento
Econômico – BNDE (depois BNDES) e a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobrás) –
que foi criada simbolicamente, após uma ampla mobilização popular.
Mas foi a partir da década de 60, após o movimento militar de
1964, e ao longo de toda a década de 70, quando foram criadas mais de 300
empresas estatais, que o Estado brasileiro cresceu de maneira mais forte. Em
setembro de 1981, recenseamento oficial indicou a existência, apenas no plano
federal, de 530 pessoas jurídicas públicas, de teor econômico.
Na década de 90 com o governo Collor e depois com a
implantação do plano Real, o pensamento liberal (neoliberal) ganha força e a
tese do Estado mínimo fundamentam as privatizações e a diminuição do Estado
empresário.
Este viés neoliberal perdeu um pouco de força a partir de 2003
quando o governo eleito no final de 2002 mesmo dando continuidade a algumas
medidas conceitualmente liberais investiu na área social com a instituição ou
ampliação de programas de assistência.
Em entrevista concedida a Associação dos Docentes da
Universidade de São Paulo em janeiro de 2011, o professor André Singer, do
Departamento de Ciências Políticas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da USP (FFLCH), avaliou que o governo Dilma Rousseff tende, ao
menos de início, a não afastar-se das linhas mestras do projeto político liderado
por Lula, que envolve “transformação dentro da ordem, sem ruptura”. Ou seja, a
seu ver, a continuidade, no sentido de ausência de radicalismo, deve prevalecer.
Isso porque, dentro da ampla coalizão que elegeu Dilma, as forças políticas
ligadas ao capital rejeitam medidas mais contundentes, tais como imposto sobre
grandes fortunas ou redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais.
Singer não descarta tais mudanças, mas acredita que dependeriam de uma
alteração na atual correlação de forças.
O professor da FFLCH chama atenção para a complexidade da
situação: no interior da composição vencedora, o antagonismo entre de um lado
88
os trabalhadores organizados, e de outro lado “o que restou do capital industrial
nacional”, pode ser superado quando se trata de combater a atual política
cambial, com a finalidade de preservar empregos e barrar a desindustrialização.
“Mexer na política cambial significa um confronto com o setor dominante do
capital, que é o capital financeiro. Para enfrentar este bloco é preciso reunir
muita força e, portanto, vai haver necessidade de unir esses setores, porque o
poder do capital financeiro é muito grande”.
Na sua opinião, a vitória de Dilma confirma suas teses sobre o
lulismo, fenômeno que expressa um realinhamento do eleitorado e o advento de
uma nova e duradoura agenda política para o Brasil: “Existe uma nova maioria,
articulada em torno da idéia de combate à pobreza sem ruptura da ordem”. A
nova maioria pode incluir interesses muito amplos: desde os setores mais
pobres até setores do próprio capital financeiro, “à medida que você mantém,
por exemplo, uma taxa de juros relativamente alta”. Contudo, o núcleo dessa
vasta composição social, precisa ele, “é formado pelos interessados no processo
de distribuição de renda por meio de maior intervenção estatal, que tem um
sentido antineoliberal”.
O governo Lula, diz, mudou a agenda, que deixou de ser a
diminuição do Estado e ampliação do mercado, para ser uma agenda de
combate à pobreza: “O que me leva a achar que não está correto o diagnóstico
de que o governo Lula aprofunda o neoliberalismo”. Singer pensa que a
oposição não tem como fugir da nova pauta fixada pelo realinhamento, o que
explica as promessas feitas pelo candidato José Serra no segundo turno, tais
como aumento do salário-mínimo e ampliação do Bolsa Família.
A entrevista foi concedida a Pedro Estevam da Rocha Pomar e
Kamila el Hage.
Bibliografia
Queiroz, Francisco. As relações entre o poder político e o poder econômico.
http://expansao.sapo.ao/home/opiniao/francisco_queiroz/as_relacoes_entre_o_poder_politico_e_o_poder_e
conomico. 2010-06-04 11:30:00
Entrevista André Singer: Governo Dilma tende à continuidade e ao equilíbrio, sem ruptura.
http://www.adusp.org.br/files/revistas/49/r49a01.pdf
89
Texto para discussão
Poder Político e Poder Econômico
Paul Singer | 29-11-2011|
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“Os países que preservaram instituições estatais conseguiram resistir às
pressões neoliberais e priorizar desenvolvimento, geração de emprego e
combate à pobreza. No Brasil, o Poder Político não está submetido ao Poder
Econômico.”
'Banco público impede submissão da política ao poder econômico'
A decisão do [então] primeiro ministro da Grécia de submeter o próximo pacote
de “ajuda” da Europa ao seu país a uma consulta popular desencadeou uma
queda espetacular das cotações nas bolsas de valores no mundo inteiro,
colocando em foco a profunda contradição entre o Poder Político e o Poder
Econômico nos países capitalistas democráticos, que hoje são a grande maioria
das nações. Uma decisão que deveria ser normal em qualquer democracia – a
de consultar o povo, do qual o governo, isto é, o Poder Político, é o
representante – acaba de provocar pânico entre os donos do capital financeiro,
que hoje detém a hegemonia do poder.
A mesma contradição é a fonte da motivação essencial do movimento hoje
mundial dos Indignados, que desde 15 de outubro promove a ocupação das
praças centrais dos distritos financeiros de 951 cidades em 82 países. O que os
Indignados demandam, acima de tudo, é que a democracia formal, vigente
nestes países, se torne real, ou seja, que o Poder Político eleito pelo povo de
fato o represente, em vez de executar políticas que beneficiam exclusivamente a
classe que exerce o Poder. O que evidencia a contradição de interesses entre a
maioria do povo – os 99% que os ocupantes de Wall Street almejam representar
– e o 1% que constitui a elite do Poder.
A contradição entre Poder Político e Poder Econômico se explica pela origem de
um e outro Poder. Em democracias, o Poder Político é exercido pelos eleitos
pela maioria dos cidadãos, que é necessariamente constituída por trabalhadores
não proprietários de meios de produção social, boa parte dos quais ganha a vida
como assalariados de empresas capitalistas; ao passo que, no capitalismo, o
Poder é exercido pelos capitalistas, mas não por todos por igual.
Os empresários da economia real, isto é, cujas empresas produzem bens e
serviços que atendem necessidades humanas, dependem de crédito tanto para
financiar vendas a prazo quanto para investir em matérias primas, maquinário,
instalações etc., na medida em que a demanda por sua produção se expande; o
crédito é concedido por bancos, fundos de investimento e outros intermediários
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financeiros. A renda não gasta pelas famílias, empresas e governos é
depositada nestes intermediários, que a redistribuem na forma de empréstimos
aos governos, empresas e famílias cujos gastos superam sua renda.
Os bancos, fundos etc., que são empresas capitalistas, visam maximizar seus
próprios lucros, emprestando a juros maiores do que pagam aos depositantes e
aplicando parte dos depósitos que lhes são confiados em títulos de propriedade
de firmas (ações) ou de débito emitidos por governos e empresas. Commodities,
ações de novas empresas e cotas de fundos de investimento são
transacionados em leilões diários nas bolsas de valores e suas cotações flutuam
ao sabor das oscilações de oferta e demanda pelos mesmos.
A maior parte dos participantes nestes leilões são especuladores, que procuram
adivinhar em que ativos irão se concentrar as preferências da maioria para
adquiri-los antes que se valorizem e quais ativos serão vendidos, para vendê-los
antes que se desvalorizem. Obviamente, uma parte dos especuladores faz
antecipações erradas e, por isso, perde dinheiro para os seus felizes
competidores, cujas apostas anteciparam o futuro corretamente.
Trata-se de um jogo de apostas, mas que afeta o andamento da economia real.
Se o otimismo prevalecer nas bolsas de valores, os especuladores comprarão
ações e títulos de crédito, cujas cotações subirão, o que permitirá aos
empresários obter mais facilmente dinheiro para expandir suas atividades; o
crescimento da produção da economia real confirmará as expectativas otimistas
dos detentores do dinheiro depositado neles pelos poupadores, levando-os a
reiterar as compras de títulos e assim por diante. O resultado será a formação
de uma típica bolha de valorização de ativos, cujo efeito será acelerar a
expansão das atividades econômicas, até que elas esbarrem em pontos de
estrangulamento, que impedirão a continuação do crescimento.
Os pontos de estrangulamento são constituídos por recursos indispensáveis à
produção e à distribuição, que exigem tempo para serem multiplicados, como,
por exemplo, a produção e distribuição de energia elétrica, os meios de
comunicação e de transporte, a mão de obra com escolaridade acima da
fundamental etc.. Os pontos de estrangulamento elevam o custo de produção e
distribuição de bens e serviços, suscitando círculos viciosos de elevação de
preços e salários, que resultam em inflação cada vez maior, contra a qual o
Poder Político é forçado a agir, reduzindo a disponibilidade de crédito e o gasto
público.
O mero anúncio destas medidas de “austeridade” basta para que as
expectativas dos especuladores financeiros se invertam, passando de otimistas
a pessimistas, pois eles sabem que elas reduzirão a demanda por títulos nas
bolsas, fazendo com que suas cotações desabem.
inflação e renda
Em suma, o Poder Político é induzido a conter a inflação atendendo ao interesse
dos capitais financeiros, que temem a desvalorização da moeda, ocasionada
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pela subida dos preços. A inflação exige a ampliação da oferta de moeda, que é
a “mercadoria” que os intermediários financeiros transacionam. Sua
desvalorização prejudica diretamente bancos e fundos, cujos capitais são
constituídos, em sua maior parte, por tesouros em forma da moeda corrente do
país.
Na verdade, a inflação prejudica também todos que dependem de rendas fixas,
entre os quais estão também os trabalhadores informais, que estão excluídos de
normas contratuais ou legais que reajustam rendas ou depósitos
automaticamente por índices periódicos de inflação. Esta circunstância permite
aos porta-vozes dos interesses financeiros proclamarem que é necessário
paralisar o crescimento econômico tão logo pressões inflacionárias se fazem
sentir, porque a inflação é o mais cruel dos impostos, pois pune os mais pobres.
Na realidade, pune os mais pobres e os mais ricos, sendo óbvio que os últimos
podem suportar perdas muito melhor que os primeiros.
A experiência histórica do final do século passado mostra que realmente inflação
elevada e persistente pode prejudicar seriamente o funcionamento dos
mercados e, quando atinge o limite da hiperinflação, tornar impossível o
prosseguimento do desenvolvimento econômico; uma vez atingido este estágio,
a estabilização dos preços exige o encolhimento da demanda efetiva total por
bens e serviços, com efeitos negativos para a economia real, prejudicada pela
dificuldade de vender com lucro suas mercadorias.
Como governo algum se arrisca a lançar a economia em hiperinflação, as fases
de crescimento rápido são abortadas pelo Poder Político mediante políticas de
estabilização que se caracterizam pela elevação das taxas reais de juros,
proporcionando grandes lucros aos capitais financeiros.
Isso comprova mais uma vez que, no capitalismo contemporâneo, o Poder
Político não pode deixar de praticar políticas, que em nome do interesse geral,
de fato priorizam o capital financeiro, reforçando a hegemonia deste sobre o
Poder Econômico. Convém observar que, se a intermediação financeira fosse
atribuição exclusiva de bancos públicos, a estabilização dos preços em vez de
concentrar a renda, como acontece hoje, reforçaria a participação do Poder
Político na renda nacional, possibilitando-lhe ampliar políticas redistributivas e
deste modo tornar a distribuição da renda mais justa.
Aqui reside o caráter contraditório do relacionamento entre Poder Político e
Poder Econômico. Os governos desejam em geral que haja prosperidade;
embora esta possa beneficiar todas as classes, o excedente econômico assim
gerado sempre é apropriado pelos capitalistas. Os trabalhadores só se
beneficiam pelo aumento do emprego, que viabiliza em alguma medida as
campanhas sindicais por melhoras salariais. Só que estas somente são obtidas
após muita luta contra a resistência patronal, ao passo que a apropriação do
excedente pelos donos e administradores dos capitais é imediata: sendo as
mercadorias produzidas pelos trabalhadores propriedade dos capitalistas, o
lucro a mais decorrente do maior volume de vendas é deles. O que os
trabalhadores podem receber a mais será pelas horas extras eventualmente
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trabalhadas, o que explica a forte concentração da renda que ocorre sempre
quando o crescimento econômico perdura.
Para se contrapor à concentração da renda, governos comprometidos com os
interesses e aspirações das classes trabalhadoras podem tributar os ganhos
extraordinários dos capitalistas e aplicar a receita pública adicional em políticas
redistributivas. Políticas como estas, no entanto, provocam a desconfiança dos
operadores financeiros, que reduzirão suas aplicações na economia nacional,
lançando-a em crise. Sabedores disso, governos de esquerda evitam ferir a
confiança do capital financeiro, o que explica sua frequente conversão ao
neoliberalismo.
No capitalismo contemporâneo, o Poder Econômico, ao contrário do Poder
Político, deixou de ser nacional para se tornar global, sendo dominado por um
limitado número de gigantescas transnacionais financeiras. Estes capitais
tomam em geral a forma de bancos demasiado grandes para que os governos
possam correr o risco de deixá-los quebrar. Eles estão interligados por
interesses financeiros, o que lhes permite atropelar o Poder Político de países
que não se submetem aos seus desejos.
O Poder Econômico privado conseguiu monopolizar a distribuição do dinheiro
internacionalmente aceito, a moeda “forte”, representada principalmente pelo
dólar, graças à influência que exerce sobre instituições multilaterais como o
Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial (Bird) e a Organização
Mundial do Comércio (OMC), o que lhe permite impor sua vontade ao Poder
Político de nações que não têm o status de superpotências, como está claro no
caso da Grécia e de mais uma série de outros países que simplesmente
perderam a confiança do Poder Econômico global, de que sejam capazes de
honrar suas dívidas externas. Para reconquistar esta confiança, estão sendo
obrigados a aplicar políticas econômicas de austeridade que lançam suas
economias nacionais em longas e profundas crises.
Bancos públicos
A voga do neoliberalismo que assolou o mundo nos últimos 32 anos fez com que
muitos países vendessem seus bancos públicos a capitais privados, o que
tornou seus governos inteiramente dependentes dos intermediários financeiros
privados. Estes governos, para reter a confiança das finanças capitalistas, foram
obrigados a equilibrar seus orçamentos, procurando reduzir seus déficits e
conter o crescimento da dívida pública. Além disso, tiveram de priorizar o
combate à inflação, reduzindo a despesa pública e o ritmo do crescimento
econômico.
O efeito destas políticas foi reduzir a demanda por mão de obra das empresas,
ampliando o desemprego, enfraquecendo os sindicatos e suas lutas por
melhores salários e condições de trabalho. A contenção da despesa pública
debilitou as políticas redistributivas e os sistemas públicos de saúde, educação e
previdência, que estão sendo em parte privatizados.
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Os países que preservaram seus bancos públicos e os ampliaram de acordo
com as necessidades puderam resistir às pressões neoliberais e continuar
priorizando o desenvolvimento e o combate à pobreza, ampliando e
aperfeiçoando suas políticas sociais e mantendo a expansão do emprego, de
modo a evitar o desemprego em massa, sobretudo o de longa duração.
Atualmente, os países que optaram por esta alternativa se encontram em sua
maior parte na Ásia e na América Latina e constituem as economias emergentes
que mais crescem no mundo e menos são afetadas pelas crises produzidas pela
especulação financeira desregulamentada. Nestes países, entre os quais se
encontra felizmente o nosso, o Poder Político não está submetido ao Poder
Econômico.
Na América do Norte e na Europa o peso do legado neoliberal subordina o
Poder Político à ideologia e aos interesses do Poder Econômico. Daí resulta o
marasmo econômico, a persistência do desemprego em massa e da pobreza,
com o aumento inegável da desigualdade socioeconômica. Nos países do
Primeiro Mundo, os sacrifícios impostos à classe trabalhadora e, em especial, à
juventude estão suscitando o surgimento de uma nova esquerda, que
diferentemente da velha esquerda não pauta a conquista do poder como ponto
de partida para a reversão de uma situação insuportável.
A rebelião dos Indignados tem por alvo a restauração da autenticidade
democrática por meio da indispensável subordinação dos interesses da minoria
privilegiada à vontade da maioria. Para tanto, ela terá de revelar os liames
políticos e econômicos que amarram os representantes eleitos ao Poder
Econômico, que retira sua força de uma globalização dominada pelo capital
financeiro e que impede que o Poder Político, limitado ao âmbito nacional, possa
cumprir suas plataformas eleitorais.
Obviamente, para restaurar a autenticidade democrática e a supremacia do
Poder Político, será necessário desenvolver, ao lado do capitalismo, uma
economia em que o capital seja propriedade coletiva dos trabalhadores que o
utilizam, como sempre foi em toda longa história da humanidade que precedeu a
Revolução Industrial.
Esta “outra economia” já está sendo desenvolvida em numerosos países e terá
como resultado a diversificação do Poder Econômico, tornando-o em boa parte
afinado com as necessidades e desejos dos que hoje são explorados e
alienados.
*Paul Singer é secretário nacional de Economia Solidária do ministério do
Trabalho.
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Paraguai, paraíso do Estado mínimo.
César Felício - Valor Econômico - 21/06/2012
Com uma população de 6,3 milhões de habitantes e um PIB cem vezes menor
que o brasileiro, o Paraguai está habituado a viver suas tragédias de forma
subterrânea, longe das atenções mundiais. Dificilmente o desastre ocorrido na
sexta-feira, em Curuguaty, próximo da fronteira com o Brasil, fugirá dessa regra.
O episódio em que morreram 18 pessoas, sendo 11 militantes sem terra e sete
policiais, merecia um destino diferente do esquecimento. Serviria como
advertência do que pode ocorrer quando se entrecruzam concentração de renda
e um Estado débil.
Na manhã de sexta-feira, o grupo especial de operações da polícia paraguaia,
uma espécie de Bope local, foi deslocado para a fazenda de um ex-senador do
Partido Colorado, Blás Riquelme. A propriedade está ocupada há alguns anos
por cerca de 500 famílias. Foram recebidos à bala e devolveram o fogo. Entre os
mortos, estava o comandante do grupo policial. O confronto gerou uma crise
institucional: caiu o ministro do Interior e o chefe da polícia, a oposição tenta
articular um pedido de impeachment contra o presidente Fernando Lugo e os
ruralistas irão promover um "tratoraço" na segunda-feira.
Liderança histórica na área de direitos humanos do país, o advogado Martín
Almada lembra que a tragédia de Curuguaty faz parte da herança que o país
recebeu da ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989). O ditador, que morreu
exilado no Brasil em 2006, estruturou seu poder distribuindo terras fiscais do
Estado de maneira discricionária, gerando um caos fundiário. A prática
continuou, em menor escala, nos governos seguintes, até 2003.
Explosões no país vizinho devem preocupar Brasil
Fez parte desta indústria de transações escusas a titularidade de 7,851 milhões
de hectares, ou 64% do total adjudicado em 50 anos. Dentro deste universo,
foram beneficiados milhares de brasileiros que tornaram-se produtores de soja
no Paraguai em circunstâncias pouco transparentes.
"É neste contexto que a propriedade de Riquelme se situa", afirma Almada. O
que aconteceu no Paraguai foi uma reforma agrária às avessas: em 1991, 1,5%
dos proprietários controlavam 81,3% da superfície. Com o advento da soja, a
concentração não diminuiu. Segundo dados da coordenadoria nacional de
direitos humanos do Paraguai, em 2008 2% das propriedades somavam 78%
das terras.
A soja e o gado empurraram o Paraguai adiante, e o país chegou a registrar
taxas chinesas de crescimento, como os 15,4% de expansão do PIB em 2010.
Os dólares entraram no país, mas não nos cofres públicos: o Paraguai é o
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paraíso do Estado mínimo. Segundo dados do Banco Central local, a carga
tributária atual é de 13% sobre o PIB, a mais baixa da América do Sul. O
imposto de renda da pessoa jurídica só foi criado em 2004. O de pessoa física, a
depender do Congresso, só começará a ser cobrado a partir do próximo ano.
No Paraguai, o Estado provedor não existe. As pessoas estão habituadas a
cada um cuidar de si. De acordo com um levantamento da Cepal divulgado no
ano passado, 69% dos lares paraguaios não contam atualmente com nenhum
mecanismo de proteção social, nem mesmo de previdência contributiva. É o
mais alto percentual entre os 13 países pesquisados, em uma pesquisa que não
inclui o Brasil. Um terço da população está abaixo da linha de pobreza.
Foi neste contexto que o então bispo católico Fernando Lugo iniciou a irresistível
arrancada que o levaria à Presidência em 2008. Sem estrutura partidária,
ganhou ao catalisar as esperanças de desenvolvimento social e reforma agrária,
tema de não pouca importância em um país com 40% da população no campo.
Em seus quatro anos de governo, o resultado da gestão de Lugo parece
apagado. O presidente tornou-se foco de atenções por suas vicissitudes
pessoais, como filhos do tempo de celibato reconhecidos tardiamente e a
batalha contra um linfoma. Seu maior sucesso administrativo foi conseguir do
Brasil a renegociação da venda da energia elétrica de Itaipu. O aumento de
200% na energia gerada pelo Paraguai por si só representou um acréscimo de
1% no PIB local. Do ponto de vista político, disciplinou o Exército, ao reformular
a cúpula da instituição.
Sem maioria no Congresso, Lugo viu o seu projeto paraguaio de Bolsa Família,
o "Tekoporá", ser podado pelo Legislativo. O programa pagava 83 mil benefícios
em 2011, muito aquém do que se previa. A estratégia de tocar um programa de
reforma agrária com a compra de terras não funcionou. Os conflitos rurais, que
caíram entre 2008 e 2010, voltaram a crescer no ano passado. Sem ter o que
oferecer aos movimentos organizados, Lugo não os atende e não os reprime.
A anemia do Estado no Paraguai faz com que o poder público vá perdendo o
seu poder mediador em meio a conflitos. É uma tendência que tende a se
agravar, segundo Almada. "Lugo parece temer o mesmo destino que Manuel
Zelaya teve em Honduras, que caiu em 2009 em um golpe patrocinado pelas
forças políticas", comentou.
Para os próximos anos, na opinião de Almada, episódios de violência devem se
repetir. "A pobreza no Paraguai é explosiva", comentou. O esgarçamento
institucional em um país com uma fronteira terrestre notoriamente de baixo
controle policial com o Brasil não deve ser uma questão menor para Brasília.
Um incipiente movimento insurgente, o Exército do Povo Paraguaio, tenta se
estruturar desde o governo anterior a Lugo. Sua cúpula está presa, mas o
governo não conseguiu romper a cadeia de comando da organização. De acordo
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com o que o próprio adido da Polícia Federal no Paraguai afirmou no ano
passado, as principais organizações criminosas brasileiras estão presentes no
país vizinho.
Não há qualquer evidência de que a ponta mais radicalizada da insurgência
paraguaia se conectou com o submundo brasileiro, mas cabe em relação a esta
hipótese funesta lembrar a frase do escritor francês Victor Hugo: "Nada é mais
poderoso quando a uma ideia chega seu tempo".
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Teoria conspiratória na zona do euro
Folha de São Paulo - 25 de junho de 2012 - Ensaio - Floyd Norris.
Imagine que há duas décadas uma Alemanha recém-unificada resolvesse
dominar a Europa, como a Alemanha previamente unificada havia tentado sem
sucesso meio século antes. Dessa vez, ela usaria dinheiro em vez de armas.
Não há evidência para essa teoria de conspiração. Mas, se houvesse, as coisas
poderiam ter acontecido mais ou menos como aconteceram.
O que se segue é uma breve história do euro. As frases em itálico foram
inventadas para amparar a teoria conspiratória. Mas os fatos estão inalterados.
Em meados de 1992, a experiência europeia com o câmbio semifixo estava sob
pressão principalmente por causa da decisão do Bundesbank (o banco central
alemão) de elevar os juros acentuadamente. Os termos generosos da unificação
alemã haviam sobrevalorizado fortemente o marco alemão-oriental, causando
inflação.
Esses juros altos trouxeram uma enxurrada de dinheiro para a Alemanha. Como
outras moedas europeias estavam atreladas ao marco, elas também subiram,
afetando a capacidade dos países de competir nos mercados mundiais. Para
manter esse atrelamento, esses países precisaram elevar seus juros quando
suas economias já estavam fracas, piorando suas situações domésticas.
Especuladores concluíram que o atrelamento cambial não poderia durar.
Enormes vendas de liras italianas e libras esterlinas forçaram os governos a
queimarem divisas para sustentar suas moedas.
Em setembro, Grã-Bretanha e Itália abandonaram o atrelamento cambial. Suas
moedas se depreciaram rapidamente. Outros foram atrás. Os britânicos
culparam os alemães por seus juros altos. "Acusações tendenciosas de
responsabilidade não vêm ao caso", respondeu o então chanceler alemão,
Helmut Kohl.
Para muitos europeus, a lição a tirar disso foi que as moedas comuns
precisavam ser rígidas, para evitar qualquer ataque especulativo a uma moeda
fraca.
A Europa já havia decidido no Tratado de Maastricht, assinado naquele ano, a
buscar um caminho para a união monetária. As regras não previam qualquer
mecanismo real de implantação, mas não havia forma de um país deixar a zona
do euro.
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É concebível que a Alemanha tenha aprendido três coisas com a experiência de
1992. Primeiro, que sem um câmbio fixo suas empresas exportadoras
enfrentariam o risco de desvalorizações competitivas periódicas no resto da
Europa. Segundo, que a união monetária poderia ajudar as exportações se o
valor do euro fosse mantido baixo por causa de economias menos competitivas.
Finalmente, se a Alemanha adotasse uma política de juros baixos, os bancos
poderiam abrir a torneira do crédito e criar um boom europeu financiado por
dívidas. Isso causaria desequilíbrios. No fim das contas, países profundamente
endividados enfrentariam uma crise, a qual só poderia ser solucionada se eles
aquiescessem às políticas alemãs e cedessem uma grande parte da soberania
nacional.
Em julho de 1992, o Bundesbank elevou sua taxa básica de juros em 75 pontos,
para 8,75%. Ao longo dos anos, ele cortaria rapidamente os juros. Quando o
euro foi lançado, a taxa estava em 2,5%.
Com o tempo, as exportações alemãs dispararam, enquanto seus vizinhos
europeus usavam dinheiro emprestado para comprar produtos alemães. Os
bancos alemães ajudaram a financiar bolhas imobiliárias na periferia.
O momento crítico da crise pode ter sido quando os bancos irlandeses
quebraram, no começo de 2009. Se o governo irlandês tivesse dito que iria
garantir os depósitos, mas que empréstimos feitos aos bancos poderiam deixar
de ser pagos, os bancos alemães estariam em apuros e provavelmente
precisariam ser resgatados pelo governo da Alemanha.
Em vez disso, o governo irlandês garantiu as obrigações bancárias -algo que ele
não conseguiu bancar. A Irlanda é que precisou ser resgatada. A receita alemã
para a Irlanda, como logo mais seria para outros países, foi a austeridade. Nos
últimos anos, houve repetidas crises, com a Alemanha parecendo ser rígida até
ceder na última hora e evitar um desastre, sem fazer nada que permitisse que as
economias problemáticas crescessem.
O fim do jogo talvez esteja próximo. Países com problemas podem permanecer
na zona do euro, enfrentando vários anos de recessão. Ou podem abandonar o
euro, talvez atraindo uma catástrofe, mas tendo mais liberdade para desvalorizar
suas moedas. Ou eles podem entregar sua soberania e aceitar a liderança
alemã sobre uma Europa unificada. Aí a Alemanha irá resgatá-los.
Se a Europa não aceitar a oferta, e o euro se desintegrar, é difícil saber como
será. Mas um novo marco alemão sem dúvida seria muito mais forte do que o
euro é agora, tornando a vida bem mais difícil para os exportadores alemães.
Isso leva alguns europeus a pensarem que a Alemanha está blefando e que ela
irá continuar pagando a conta mesmo se não conseguir o que deseja.
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O euro deveria selar a integração e a prosperidade europeias, assegurando que
nunca mais o continente iria iniciar uma guerra mundial. Em vez disso, ele gerou
ódio, recessão e ressentimento. Os gregos e outros veem nisso uma
conspiração alemã. Os alemães veem uma conspiração para obrigá-los a pagar
pelos pecados alheios.
Se isso escapar ao controle, a economia mundial pode ser a perdedora,
independentemente de alguma conspiração ter realmente existido.
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CAPITULO VII
O que veremos neste capítulo
- História da Teoria dos jogos. Conceitos. Importância.
- Teoria da escolha Racional.
- O poder do eleitor.
- Teoria das votações.
- Teorema do eleitor mediano.
- O jogo do apadrinhamento.
1. Introdução
A Teoria dos Jogos surgiu como um campo da Matemática aplicada e
desde 1944, quando o matemático húngaro John Von Neumann e o economista
alemão Oskar Morgenstern lançaram o livro Teoria dos Jogos e Comportamento
Econômico (The Theory of Games and Economic Behavior), é usada como
ferramenta em estudos de estratégia.
Segundo Ferguson (1988), a Teoria dos Jogos tem como objetivo geral
avaliar o comportamento racional em situações nas quais os resultados
dependem da interação das ações dos agentes envolvidos.
A aplicação da teoria dos jogos à ciência política levou ao
desenvolvimento de modelos teóricos que permitem avaliar o comportamento
dos agentes (jogadores) - eleitores, estados, grupos de interesses e políticos envolvidos em diversas situações.
2. Breve História da Teoria dos Jogos
A primeira referência objetiva conhecida da teoria dos jogos ocorreu em
uma carta escrita por James Waldegrave em 1713. Nesta carta, Waldegrave
propõem uma solução de estratégia mista de minimax para o jogo le Her3.
3
Descrição do jogo: 13 cartas de um mesmo naipe são embaralhadas. No início do jogo, o jogador 1 recebe uma carta X (que apenas
ele vê), o jogador 2 recebe uma carta Y (que apenas ele vê) e uma carta Z é colocada sobre a mesa (que ninguém vê). O jogador 1 joga
101
Mas foi Antoine Augustin Cournot, matemático francês que viveu entre
1801 e 1877, com a publicação de Antoine Augustin Cournot Researches into
the Mathematical Principles of the Theory of Wealth - Pesquisas sobre os
Princípios Matemáticos da Teoria da Riqueza - em 1838 que estabeleceu os
princípios teóricos da teoria dos jogos. Neste estudo mostra um modelo onde
duas empresas que competem entre si comercializando um mesmo produto,
decidem quais as quantidades que maximizam seus lucros – O Dupolio de
Cournot.
Em 1913 o matemático alemão Ernest Friedrich Ferdinand Zermelo
(1871-1953) dá a sua contribuição ao fortalecimento da Teoria dos jogos. Ele
demonstrou que o jogo de xadrez sempre tem uma solução, significando que
para qualquer jogada de um participante, seu oponente tem uma estratégia
vencedora. Esta demonstração foi importante para o estudo da técnica da
indução inversa.
Quatorze anos depois, em 1927, Félix Edouard Justin Emile Borel
(1871-1956), outro matemático francês, usa pela primeira vez o conceito
moderno de estratégia. Ele definiu este método, ao qual chamou de método de
jogo, como um codigo que determina para cada circunstância possível
exatamente o que o agente deve fazer. Borel escreveu certa vez:
“Os problemas de probabilidade e análise que se propõem com relação
à arte da guerra, ou especulações econômicas e financeiras, não são isentos de
analogia com os problemas que dizem respeito a jogos, embora possuam um
maior grau de complexidade”.
O termo "jogos" utilizado por ele refere-se não a simples jogos que
dependem de sorte, mas especificamente a jogos estratégicos.
Posteriormente, em 1944, surge formalmente a Teoria dos Jogos com a
publicação do livro Teoria dos Jogos e Comportamento Econômico (The
primeiro: ele deve decidir se mantém a sua carta X ou a troca com a carta Y do jogador 2 (no segundo caso, o jogador 2 não pode se
recusar a fazer a troca). Depois é a vez do jogador 2: ele deve decidir se mantém a sua carta ou a troca com a carta Z. Ganha quem
tiver a carta de maior valor (J > Q)!
102
Theory of Games and Economic Behavior) do matemático húngaro John Von
Neumann e do economista alemão Oskar Morgenstern.
Nesta obra os autores desenvolveram a análise dos jogos de soma
zero, definiram a representação dos jogos em forma extensiva além de
discutirem a cooperação e a formação de coalização entre os agentes
(jogadores).
Apesar de ser considerada um marco no estudo da teoria dos jogos, a
obra mostrou-se bastante restritiva ao concentrar o foco na análise dos jogos de
soma zero, algo pouco aplicado na maioria das situações de interação entre
indivíduos ou entre organizações.
A partir de 1950, o matemático John F. Nash Jr, o economista John C.
Harsanyi e o matemático e economista Reinhard Selten, avançaram no estudo
da Teoria dos Jogos ao apresentarem ferramentas teóricas que possibilitaram a
análise de uma maior variedade de modelos de interação.
A contribuição de Nash foi de suma importância para a análise de uma
classe muito maior de jogos. Ele mostrou o equilíbrio para jogos que não fossem
de soma zero. Este conceito ficou conhecido como equilíbrio de Nash, situação
em que a jogada de um agente será sempre a melhor resposta a estratégia de
outro agente.
Em 1965 Selten publicou um artigo cujo conteúdo principal é o modelo
equilíbrio perfeito em subjogos. A partir deste conceito, Selten, diz que uma
estratégia para ser ótima ter que levar em consideração todos os possíveis
desdobramentos do processo de interação estratégica.
A contribuição de Selten foi significativa, principalmente para a análise
daqueles jogos que envolvem ameaças e compromissos, pois permitiu avaliar
quais compromissos ou ameaças poderiam ser cumpridas.
Não devemos esquecer de Robert J. Aumann, matemático cujos
estudos possibilitaram
entender que
as relações entre
indivíduos ou
organizações tem uma boa chance de durar por tempo indeterminado. Esta ideia
103
está vinculada as premissas de cooperação, tempo de realização dos ganhos
e respeito a um contrato.
Como exemplos de situações que podem ser estudadas a partir da
contribuição de Aumann podemos citar a formação de cartéis. Nesta estrutura
de mercado as empresas abrem mão de parte da sua oferta para que o preço de
mercado se eleve, mas existirá sempre a tentação de que uma ou todas
empresas aumentem suas ofertas e, consequentemente, seus lucros decretando
o fim do cartel.
Finalmente citamos o trabalho de Thomas C. Schelling, The Strategy of
Conflit. Neste livro Schelling, aplicando os preceitos da Teoria dos Jogos, mostra
que uma forma convincente para anular uma ameaça é tornar a resposta a
mesma imprevisível. Se o agente ameaçador não pode prever a reação a sua
agressão, então seus riscos de perda aumentam de modo que ele irá preferir
cessar a ameaça.
Outra contribuição importante de Schelling foi a ideia do ponto focal.
Este conceito mostra que mesmo em um ambiente em que há dificuldade de
comunicação a coordenação entre os indivíduos pode levar a um bom resultado
para todos.
3. Conceitos
Como sabemos a Teoria dos Jogos é o estudo que descreve as relações
de conflito e de cooperação entre agentes inteligentes e racionais. Estas
relações são análogas a um jogo ao qual definimos como uma representação
formal que possibilita a avaliação das interações entre aqueles agentes.
Um jogo possui os seguintes elementos:
1) Agentes: Também chamado de jogadores podem ser quaisquer
Indivíduos que tenha capacidade de decidir (pessoa física,
empresas, governo, sindicato, partido políticos, etc..);
2) Estratégia: plano completo de ação, o que fazer em cada possível
situação. Estratégia implica escolha e equilíbrio das opções
apresentadas;
104
3) Interação: ação de cada agente afeta de alguma forma os demais
envolvidos na situação;
4) Racionalidade: Suposição de
maximização de sua utilidade;
que
os
agentes
buscam
a
5) Pagamentos (payoffs) definidos para cada jogador.
4. A Teoria da Escolha Racional
A teoria dos jogos tem como principal objetivo explicar como os agentes
(jogadores), interagindo entre si, fazem suas escolhas.
Assumindo que os agentes são racionais – procuram sempre maximizar
suas recompensas - podemos estudar as escolhas, utilizando o método que
considera as preferências de cada um. A Teoria da Escolha Racional.
Para efeito do nosso estudo consideraremos válida a seguinte
suposição:
Num problema de escolha pessoal ou política existem um indivíduo e um
conjunto de alternativas. O individuo fará sua escolha de acordo uma relação de
preferência, representada como a seguir.
I) Preferência fraca representada pelo símbolo:
Exemplo:
, onde lemos A é tão boa quanto B ou A é fracamente
preferível a B ou ainda, A é preferível a B.
III) Preferência estrita representada pelo símbolo: 
Exemplo: A  B , onde lemos A é estritamente (sempre) preferível a B.
III) Indiferença representada pelo símbolo:
~
Exemplo: A ~ B , onde lemos A e B são equivalentes.
5. Teoria dos jogos e Ciência política
A Teoria dos Jogos auxilia o entendimento teórico - ou seja por meio de
abstrações - do processo de decisão de agentes que interagem entre si. Desta
forma, contribui para ampliar a capacidade de agir estrategicamente, permitindo
conhecer, previamente, o melhor resultado para os jogadores (agentes) diante
das estratégias disponíveis.
105
Pesquisas na ciência política também têm usado a teoria dos jogos. O
jogo do apadrinhamento é um exemplo de aplicação da Teoria dos Jogos na
política. Podemos ver outras aplicações na formação de alianças entre partidos
e no resultado de uma votação.
6. O poder do eleitor
Distâncias, pesos ou volumes são exemplos básicos de medições que
podemos fazer com facilidade. Para tal usa-se um termo de comparação, metro,
quilograma ou litro, conforme os casos.
Existem porém, outras coisas que mesmo não sendo tão fáceis de
medir, medimos diariamente com o auxílio de aparelhos mais complicados.
Neste segundo caso, temos as temperaturas ou a intensidade de um terremoto.
Um ponto em comum desses dois tipos de medições é fato de serem
medidas absolutas, ou seja, uma vez fixada uma escala, um objeto ou
acontecimento pode tomar um valor qualquer dentro da escala.
Mas quando se trata de medir o poder, a situação é mais complicada,
pois não devemos utilizar uma medida absoluta dado que o poder de alguém só
pode, quanto muito, ser comparado com o de outra pessoa ou grupo.
Em se tratando de um eleitor, uma boa maneira de avaliar seu poder, a
capacidade de influenciar o resultado de uma eleição, é considerar que seu voto
tem peso (poder) relativo, isto quer dizer que:
"O índice de poder de um eleitor é a razão entre o seu poder e a soma
dos poderes de todos os outros eleitores".
7. Teoria das votações
A votação é talvez mais conhecida pelo seu uso em eleições, onde
candidatos políticos são selecionados, em geral para a administração pública. O
estudo das votações ou de sistemas de votação, a teoria da votações, surgiu no
106
século XVIII para tentar explicar qual o melhor sistema de votação a ser aplicado
em uma disputa.
Um sistema de votação ou sistema eleitoral é o meio de escolha entre
um número de opções, baseado na entrada de um número de votos ele consiste
em conjunto de regras de como os votantes podem expressar seus desejos, e
como esses desejos são agregados para se obter um resultado final.
A maioria dos sistemas de votação é baseada na regra da maioria, ou
no princípio de que o vencedor de uma disputa é aquele que consegue mais da
metade dos votos.
Diferentes sistemas de votação podem ter diferentes resultados,
particularmente nos casos onde não há uma clara preferência da maioria. Então,
a escolha do(s) sistema(s) eleitoral(is) é um componente importante de um
governo democrático.
È praticamente impossível um sistema de votação contemplar ou
satisfazer todos os critérios desejáveis. Isto foi provado pelo economista
Kenneth Arrow em seu trabalho teorema da impossibilidade de Arrow. Nele,
Arrow mostrou que várias características desejáveis de sistemas de votação
são mutuamente contraditórias. Por esta razão, ao se avaliar um sistema de
votação, é necessário decidir quais as características são mais importantes para
determinada eleição.
O conseso é que ele é composto basicamente dos seguintes elementos:
I - a forma de cédula;
II - o conjunto de votos permitidos; e
III - o método de mensuração ou apuração do resultado.
Esse resultado pode conter um único vencedor, ou pode envolver
múltiplos vencedores como em uma eleição para um corpo legislativo. O sistema
de votação pode também especificar como o poder de voto está distribuído entre
os votantes, e como os votantes estão divididos em distritos eleitorais cujos
votos são contados independentemente.
107
Sistema de votação, voto e democracia são elementos interligados. O
voto é utilizado como característica básica da democracia desde o século VI
a.C., quando esta foi introduzida em Atenas e desde então, a maioria das
eleições foram conduzidas usando voto majoritário ou alguma variante.
O voto ou a teoria do voto se tornou objeto de estudo acadêmico na
época da Revolução Francesa quando, em 1770, Jean-Charles de Borda propôs
a contagem de Borda como um método para eleger membros da Academia
Francesa de Ciências.
Esse sistema foi criticado pelo Marquês de Condorcet, que propôs um
método de comparação par-a-par que ele tinha desenvolvido. Ele também
escreveu sobre o paradoxo de Condorcet, que chamou de intransitividade das
preferências da maioria.
Por estas contibuições, Condorcet e Borda são usualmente creditados
como os precussores nos estudos sobre sistemas de votações.
8. Teorema do eleitor mediano
Um teorema importante no estudo da Ciência Política é o Teorema do
Eleitor Mediano. Ele procura explicar o comportamento dos candidatos de uma
eleição em função das preferências dos eleitores.
Vejamos de maneira prática a demonstração desse teorema.
Suponha que em uma eleição os eleitores estão uniformemente
distribuidos em relação a questão em torno da qual se dará a eleição. A posição
preferida pelo eleitor no que se refere à questão em debate nas eleições é
chamada ponto ideal.
A posição ideológica dos candidatos envolvidos no pleito está
representada no gráfico a seguir onde um índice determina apenas o
distanciamento destas posições.
Figura 1
Esquerda = 0
Centro = 0,5
Direita = 1
108
De acordo com a figura, um eleitor que tem uma posição ideologica
representada pelo indice 0,5 está exatamente na posição intermediaria entre as
posiçoes ideologicas de esquerda e de direita.
Supondo que os eleitores estão distribuidos uniformemente entre as
posições ideologicas seus votos não estão concentrados em nenhuma posição
ideologica. Sob essas premissas o comportamento dos eleitores poder ser
representado como a seguir.
Grá fico 1
núme ro de e le itore s
0
0,5
1
posiçã o ide ológica
Antes de prosseguirmos temos que definir um conceito importante. O de
leitor mediano.
O eleitor mediano é aquele que divide a distribuição dos eleitores em
torno de uma questão em duas partes iguais.
No nosso caso, o eleitor mediano é aquele cujo ponto ideal é
representado pelo indice 0,5 do Gráfico 1.
Vamos supor que os eleitores preferem o candidado que mais se
aproxima de suas posições. Desta forma, um eleitor representado pelo indice 0,5
irá preferir um candidato que estiver na posição 0,3 a um que estiver na posição
0,8.
Consideradas essas premissas como nossos candidatos devem
escolher suas plataformas politicas?
O Gráfico 1 nos auxilia a encontrar a quantidade de votos que cada
candidato pode obter. Por exemplo, se um candidato convencesse os eleitores
que estivessem entre as posições 0 e 0,25 conseguiria 25% do total de votos
(0,25 - 0). Já um candidato que consquistasse os votos dos eleitores
posicionados entre 0,3 e 0,7 conseguiria 40% do total de votos (0,7-0,3).
109
Suponhamos que a plataforma política do candidato Verde tenha se
situado na posição V mostrada no Gráfico 2. Neste caso, qual seria o melhor
posicionamento do candidato Amarelo?
Gráfico 2
número de eleitores
0
V
0,5
1
posição ideológica
O melhor posicionamento do candidato Amarelo seria ligeiramente a
direita de V, pois assim conquistará os votos que estiverem entre V e 1.
Se V estiver em 0,3, o candidato Amarelo tera 70% dos votos (1 - 0,3).
A lógica desse resultado é que mesmo que os eleitores mais próximos
de 1 considerarem a posição de Amarelo distante de suas posições ideológicas,
a posição desse candidato ainda se encontra mais próxima que a do candidato
Verde.
Dito de outra forma, o candidato que se situar mais próximo do ponto
ideal do eleitor mediano terá maior chance de ganhar a eleição.
Isto explica porque em algumas eleições majoritárias, os candidatos
apresentam plataformas políticas muito parecidas.
De maneira mais técnica, o Teorema do eleitor mediano diz que:
Se as preferências de todos os eleitores apresentam um ponto ideal,
então o ponto preferido do eleitor mediano é opção que vence a maioria das
comparações (vencedor de Condorcet).
9. O jogo do apadrinhamento
Um outro jogo político importante estudado pela Teoria dos Jogos na
analise politica é jogo do apdrinhamento.
110
Considere, a seguinte situação:
Dois candidatos, um da situação e outro da oposição, estão decidindo se
se comprometem ou não em oferecer empregos a seus cabos eleitorais.
Os candidatos sabem que oferecer empregos a seus cabos eleitorais faz
com que eles trabalhem mais e aumentem suas chances de vencer a eleição.
Mas sabem também, que os eleitores não aprovam esse tipo de procedimento.
Uma vez feita a promessa ela será cumprida, pois se o candidato não
honrar o compromisso terá dificuldade na próxima eleição.
O candidado da oposição precisa mais deste procedimento, tendo em
vista que o candidato da situação conta com as obras realizadas no seu
governo.
Esse jogo, com as escolhas e seus respectivos percentuais de
recompensas, pode ser representado da seguinte forma:
Figura 2
Candidato da situação
Promete
Candidato da oposição
Não promete
Promete
50, 50
(1)
60, 40
(2)
Não promete
20, 80
(3)
40, 60
(4)
A Figura mostra que:
1) Se o candidato da oposição prometer empregos a seus cabos
eleitorais (Promete) e o candidato da situação também o fizer, cada um terá 50%
dos votos dos eleitores.
2) Se o candidato da oposição prometer empregos e o candidato da
situação não prrometer, o primeiro conseguirá 60% dos votos e o outro 40%.
3) Se o candidato da oposição não prometer empregos a seus cabos
eleitorais (Promete) e o candidato da situação prometer, o primeiro terá 20% dos
votos e o outro, 80% dos votos dos eleitores.
111
4) Se o candidato da oposição não prometer empregos e o candidato da
situação não prometer também, o primeiro conseguirá 40% dos votos e o outro
60%.
De acordo com a representação da Figura 2, qual a melhor estratégia
(escolha) para os candidatos (jogadores)?
Para o candidato da situação a opção Promete é melhor quando o
candidato da oposição escolhe Promete, pois ele consegue 50% (1) dos votos
contra apenas 20% se não prometer (3) e também quando o candidato da
situação escolhe Não promete e ele consegue 60% dos votos (2) contra 40% se
não prometer (4).
Para o candidato da oposição a opção Promete é melhor quando o
candidato da situação escolhe Promete, pois ele consegue 50% (1) dos votos
contra 40% se não prometer (2) e também quando o candidato da oposição
escolhe Não promete e ele consegue 80% dos votos (3) contra 60% se não
prometer (4).
Então, prometer empregos (Promete) é a melhor opção para qualquer
jogador.
Bibliografia
Fiani, Ronaldo. Teoria dos Jogos com aplicações em Economia, Administração e
Ciências Sociais. Rio de janeiro: Editora Elsevier, 2ª ed. 2006.
112
A Teoria dos Jogos na política: a concessão, a cenoura e o porrete
Por Diogo Schelp - sábado, 31 de outubro de 2009 | 5:19 – Revista Veja
Robert Aumann recebeu, em 2005, o Prêmio Nobel de Economia por seus estudos na
área da Teoria dos Jogos. Suas teses ajudam a compreender os princípios que regem
os conflitos e como se consegue convencer adversários a cooperar entre si. As teorias
do judeu ortodoxo de 79 anos têm aplicação prática na economia, na diplomacia, em
política e até em religião. Aumann começou a se interessar pelo assunto na década de
50, depois de conhecer John Nash - vencedor do Prêmio Nobel de Economia de 1994 e de receber a missão de desenvolver estratégias de defesa para os Estados Unidos
em plena Guerra Fria. Aumann nasceu na Alemanha e sua família emigrou para os
Estados Unidos em 1938, para fugir do nazismo. Um de seus filhos morreu na primeira
guerra do Líbano, em 1982. Aumann, que vem ao Brasil no próximo dia 9 para uma
série de palestras, concedeu a seguinte entrevista a VEJA, de sua sala na Universidade
Hebraica de Jerusalém.
O fato de sua vida ter sido marcada por dramas de guerras determinou seu
interesse pelo tema?
Sim, você está certo. A II Guerra Mundial e o constante estado de conflito em Israel,
que se estende desde 1922, certamente me influenciaram. A convivência constante
com guerras despertou em mim grande interesse pelo mecanismo das lutas armadas.
Eu me considero um homem de paz. Mas a forma como os outros homens de paz
querem acabar com as guerras não é eficiente. Eu quero paz, mas de um jeito diferente.
O estudo da economia e da Teoria dos Jogos me ensinou que as coisas nem sempre
são o que parecem. O funcionamento dessas ciências é mais complexo e tem relação
com a maneira com que as ações de um indivíduo afetam outras pessoas. Essa
interação depende de uma rede intrincada de participantes ou, como costumo chamar,
jogadores. Por isso, não basta querer a paz para consegui-la. É preciso entender como
esse desejo afeta outras pessoas. Dizer “eu quero paz” pode não trazer paz, mas
guerra. Para minimizar as surpresas é preciso calcular com muito cuidado como uma
ação leva a outras.
O que é a Teoria dos Jogos?
É uma ciência que examina situações em que dois ou mais indivíduos ou entidades
lutam por diferentes objetivos, nem sempre opostos. Cada jogador tem consciência de
que os outros também agem de forma a atingir as próprias metas. Um exemplo óbvio
são os jogos recreativos ou esportivos, como o xadrez, o pôquer e o futebol, em que
todos os participantes possuem metas próprias. No xadrez, cada peça movida por um
jogador desencadeia uma série de reações no adversário. A compra de uma casa
também pode ser analisada por meio da Teoria dos Jogos, mas sugere um cenário
completamente diferente, pois o comprador tem objetivos comuns aos do vendedor.
Ambos estão interessados em que o negócio se concretize. Alguns aspectos da
negociação, porém, são opostos, porque o comprador quer um preço mais baixo e o
vendedor um preço mais alto. Nessa disputa, o comprador analisa os movimentos do
vendedor, e vice-versa. Cada um pensa sob o ponto de vista do outro para elaborar
uma maneira de atuar. O mesmo vale para a política ou para a guerra. Minha pesquisa
consiste em analisar as estratégias de situações interativas como essas.
(…)
De que maneira a Teoria dos Jogos pode ajudar a evitar ou solucionar guerras?
113
É preciso identificar os elementos comuns a diferentes situações de conflito. Em
diversos conflitos atuais, há uma tentativa de resolver o problema tomando medidas
para agradar à outra parte. Há quem pense que atender às demandas do adversário
pode trazer a paz. Basta usar raciocínio lógico e analisar a história para ver que isso
não é verdade. O senso comum diz que a II Guerra Mundial foi causada por Adolf Hitler.
Há alguma verdade nisso, porque foi ele quem ordenou a invasão da Polônia em
setembro de 1939. Mas o papel desempenhado pelo primeiro-ministro inglês Neville
Chamberlain é frequentemente negligenciado. É impressionante ler os jornais daquele
tempo e perceber quanto a retórica de Chamberlain era similar ao que ouvimos hoje em
dia na diplomacia: “Nós temos de conseguir a paz, temos de entender o outro lado,
temos de fazer concessões…”.
Como a política de pacificação de Chamberlain?
Ele estava tão obcecado em garantir a paz que passou a atender a todas as demandas
de Hitler. Ao fim das negociações de Munique, em 1938, ele perguntou a Hitler se todas
as exigências da Alemanha haviam sido atendidas. Hitler disse que sim. Chamberlain,
então, voltou a Londres, exibiu pomposamente o acordo assinado com Hitler e proferiu
a frase que entraria para a história dos piores erros de avaliação: “A paz em nosso
tempo está assegurada”. Dias depois as tropas alemãs ocuparam os Sudetos. Meses
depois tomaram a então Checoslováquia. Um ano depois Hitler invadiu a Polônia. Só
então a Inglaterra declarou guerra à Alemanha. Hitler ficou furioso. Ele tinha razões
para isso. Chamberlain levou-o a acreditar que a Inglaterra aceitaria qualquer coisa que
ele fizesse, sem limites. As concessões de Chamberlain foram um incentivo para Hitler,
e elas levaram o mundo à II Grande Guerra.
Se fazer concessões não ajuda, que tipo de incentivo pode acabar com um
conflito?
É preciso dizer na mesa de negociação: “Não vamos aceitar essas demandas e, se
vocês insistirem nelas, vamos revidar com violência”. Há dois tipos de incentivo: a
cenoura e o porrete. Theodore Roosevelt dizia para falar com suavidade, mas ter
sempre à mão um porrete. Se Chamberlain tivesse dito a Hitler em 1938 em Munique
que não aceitaria certas demandas, Hitler teria de recuar, porque não estava ainda
preparado para a guerra. Na crise dos mísseis de Cuba, em 1962, o presidente
americano John Kennedy deixou claro aos russos que, se os mísseis não fossem
retirados da ilha, os Estados Unidos agiriam. Com isso, Kennedy conseguiu a paz. (…)
Essa é a maneira correta de tratar o Irã em relação aos seus planos de construir
um arsenal nuclear?
No caso do Irã, não fico muito preocupado. Mesmo que o governo iraniano consiga
construir a bomba atômica, duvido que ele a utilize. Obviamente, isso daria ao Irã um
bom poder de barganha, o que não é nada agradável. Não acredito que faria uso dessa
arma, no entanto, porque Estados Unidos e Israel têm capacidade para responder a um
ataque com um poder muito superior. É um pouco a lógica da Guerra Fria. O problema
com o Irã não é o regime dos aiatolás querer utilizar a bomba, mas essa tecnologia cair
nas mãos de grupos terroristas como a Al Qaeda, que não tem endereço. O que
mantinha o equilíbrio durante a Guerra Fria é que um lado podia destruir o outro. A Al
Qaeda não é um inimigo convencional com um país, uma capital e um povo. Ela pode
atacar e não sofre retaliações.
114
Modelando comportamento : A teoria dos jogos na prática
3/9/2011 - http://www.economist.com/node/21527025?frsc=dg|a
Software que modela comportamento humano pode fazer previsões, derrotar rivais e
transformar negociações
Para um homem que alega falta de expertise na área, Bruce Bueno de Mesquita, um
acadêmico na Universidade de Nova York, fez algumas previsões políticas
impressionantemente precisas.
Em maio de 2010 ele previu que o presidente do Egito, Hosni Mubarak, cairia de poder
dentro de um ano. Nove meses depois Mubarak fugiram para o Cairo em meio a
protestos de rua em massa. Em fevereiro de 2008 o Sr. Bueno de Mesquita previu que
o presidente do Paquistão, Pervez Musharraf, seria deixar o cargo até o final do verão.
Ele tinha ido embora antes de Setembro.
Cinco anos antes da morte do aiatolá iraniano Khomeini, em 1989, o Sr. Bueno de
Mesquita havia indicado corretamente seu sucessor, e, desde então, tem feito centenas
de previsões como consultor tanto para governos estrangeiros e do Departamento de
Estado Americano, do Pentágono e as agências de inteligência.
Qual é o segredo do seu sucesso? "Eu não tenho idéias, o jogo faz", diz ele.
O "Jogo" do Sr. Bueno de Mesquita é um modelo de computador desenvolvido por ele e
que usa um ramo da matemática chamado teoria dos jogos, que é freqüentemente
usada por economistas para descrever como eventos vão se desenrolar e como
pessoas e organizações agem no que eles consideram ser o seu melhor interesse.
Valores numéricos são usados para represntar objetivos, motivações e influência de
"players (jogadores)"- negociadores, líderes empresariais, partidos políticos e
organizações de todos os matizes, e, em alguns casos, seus funcionários e torcedores.
O modelo de computador, em seguida, considera as opções em aberto para os diversos
agentes, determina a seu provável curso de ação, avalia sua capacidade de influenciar
os outros e, portanto, prevê o curso dos acontecimentos.
A influência de Mubarak, por exemplo, esgotou-se quando os cortes na ajuda
americana ameaçou sua capacidade de manter capangas no exército e forças de
segurança felizes. Então percebeu que os funcionários insatisfeitos estariam menos
dispostos a usar a violência para acabar com os protestos de rua.
Mesquita & Roundell, empresa do Sr. Bueno de Mesquita, é apenas um dos vários
equipamentos de consultoria que executam simulações de computador, para escritórios
115
de advocacia, empresas e governos. A maioria dos conselhos para tomada de decisão
é sobre política, no sentido mais amplo da palavra, a melhor forma de antecipar um
julgamento, influenciar um júri, ganhar o apoio dos acionistas ou atrair eleitores
indecisos para uma coalizão política e fazer concessões legislativas.
Mas a alimentação de software com bons dados sobre todos os atores envolvidos é
especialmente complicada em assuntos políticos. Reinier van Oosten, uma empresa
holandesa que usa os modelos de negociações políticas e em comércio de instituições
da União Europeia, observa que as previsões não se concretizam quando as pessoas
inesperadamente cedem à emoções "não-racionais", como o ódio, em vez de perseguir
o que é, aparentemente, seus melhores interesses. Classificando as motivações das
pessoas é muito mais fácil, principalmente quando o dinheiro é o objeto principal.
Assim, a modelagm do comportamento usando a teoria dos jogos está se mostrando
particularmente útil quando aplicada à economia.
Siga o dinheiro
A Modelagem de leilões provou ser especialmente bem sucedida, diz Robert Aumann,
um acadêmico da Universidade Hebraica de Jerusalém, que recebeu o prêmio Nobel de
Economia em 2005 por seu trabalho em teoria dos jogos. Lances, sendo quantificados,
facilitam a análise e previsão de como a resposta correta pode ser muito lucrativa.
Empresas de consultoria estão contribuindo para ajudar clientes a tornar os leilões mais
rentáveis ou torná-los menos onerosos. Em um leilão online em 2006, do espectro de
radiofrequências licenças pela Federal Communications Commission dos Estados
Unidos, Paul Milgrom, consultor e professor da Universidade Stanford, utilizou seu
software de teoria dos jogos para ajudar um consórcio de licitantes. O resultado foi um
triunfo.
Quando o leilão começou, o software Dr Milgrom rastreaou as propostas dos
concorrentes para estimar seus orçamentos para as 1132 licenças em oferta.
Decisivamente, o software estimou os valores secretos dos licitantes em licenças
específicas e determinou que certas licenças grandes estavam sendo supervalorizados.
E dirrcionou clientes do Dr Milgrom para obter um conjunto de licenças menos caras.
Dois de seus clientes, a Time Warner e a Comcast, pagaram cerca de um terço menos
do que seus concorrentes, economizando quase US $ 1,2 bilhão.
Avanços na teoria dos jogos tem acontecido rapidamente nos últimos anos e tornou
evidente que não fazer uma análise adequada pode ser caro, diz Sergiu Hart, um
colega do Dr. Aumann da Universidade Hebraica. Por exemplo, há alguns anos o
governo de Israel adicionou uma torção nova para um leilão de refinaria de petróleo.
Para incentivar lances maiores, o governo ofereceu um prêmio de US$ 12 milhões ao
segundo lance mais alto. Foi um erro caro. Sem o incentivo, o lance mais alto teria sido
cerca de US $ 12 milhões superior, uma análise mostrou que os participantes fizeram
ofertas baixas porque o perdedor iria ficar rico. Combine essa quantia com o pagamento
de prémios, e as perdas do governo somaram cerca de US$ 24 milhões. A conclusão,
então, é "não é possivel saber qual é a solução" sem a ajuda de um software de
modelagem, diz Brad Miller, modelador sênior da Charles River Associates, uma
consultoria em Boston. A empresa projeta software de teoria dos jogos para modelar
leilões industriais e a plotagem de fusões e aquisições corporativas.
"O uso de modelagem faz com que os clientes empresariais fiquem mais inclinados a
adotar estratégias de longo prazo." Software não é sempre necessário. Um estudante
da Universidade Hebraica, por exemplo, demonstrou a perda de US $ 24 milhões do
governo israelense usando papel e caneta. Ele levou cerca de dois dias, no entanto, de
acordo com um professor lá. Software, naturalmente, é muito mais rápido. Mas acoleta
e tratamento dos dados necessários requer e treinamento. Reinier van Oosten, a
116
consultoria holandesa, geralmente cobra €20,000-70,000 ($28,000-100,000) para
resolver um problema utilizando o seu software, chamado DCSim, porque ele deve
primeiro realizar longas entrevistas com especialistas. Seus clientes incluem órgãos
governamentais na Holanda e no estrangeiro, e grandes empresas, incluindo IBM, um
gigante de computador, e ABN AMRO, um banco holandês.
PA Consulting, uma empresa britânica, desenha modelos sob medida para ajudar seus
clientes a resolver problemas específicos em áreas tão diversas como fármacos,
energia de combustíveis fósseis e a produção de programas de televisão. Agências do
governo britânico contrataram a PA Consulting para construir modelos para testar
esquemas regulatórios e das regras de zoneamento. Para dar um exemplo simples: se
dois astutos vendedores de sorvetes compartilham uma longa praia, eles montaram
seus estandes no meio da praia, explica Stephen Black, um modelador na sede da
empresa em Londres. Infelizmente para os clientes potenciais nos extremos da praia,
cada vendedor impede o outro de deslocalizar-no outro ponto que seria mais perto de
mais pessoas. Ao introduzir um terceiro vendedor, no entanto, o equilíbrio é quebrado
com uma sequencia de realocações e mudanças de preços. O uso de modelagem faz
com que os clientes empresariais fiquem mais inclinados a adotar estratégias de longo
prazo, o Dr. diz Black.
Mas o software da teoria dos jogos também pode trabalhar bem fora da esfera da
economia. Em 2007, militares dos Estados Unidos forneceram ao Sr. Bueno de
Mesquita, informações para capacitá-lo a modelar o impacto político de mover um portaaviões próximo à Coréia do Norte (ele não revela os resultados). O software de teoria
dos jogos pode até mesmo ajudar a localizar o esconderijo de um terrorista. Para
executar simulações, Guillermo Owen da Naval Postgraduate School em Monterey,
Califórnia, utiliza dados de inteligência da Força Aérea dos EUA para estimar em uma
escala de 100 pontos a importância que um homem atribui a seus gostos (pesca, por
exemplo) e as prioridades (restantes ocultos ou, em maior risco de descoberta,
recrutamento de homens-bomba). Tais fatores determinam onde e como os terroristas
decidem viver. attaches desempenhou um papel importante para encontrar o
esconderijo de Osama bin Laden em Abbottabad, Paquistão, diz Owen.
Para onde vamos?
Juntamente com a corrida armamentista, a modelagem de software está cada vez mais
elaborada, há também os esforços para desenvolver um software que pode ajudar na
negociação e mediação. Duas décadas atrás Clara Ponsatí, um acadêmico espanhol,
veio com uma idéia inteligente enquanto meditava sobre o processo de paz israelensepalestino. Como os negociadores em todos os lugares sabem, a primeira equipe a
revelar tudo o que ele está disposto a sacrificar (ou pagar) perde considerável poder de
negociação. Mas se nenhum dos lados revela as concessões que está disposto a fazer,
as negociações podem entrar em colapso. Em um artigo publicado em 1992, o Dr.
Ponsatí descreveu como o software poderia ser projetado para quebrar este impasse.
A idéia do Dr Ponsatí era que se um mediador humano não era confiável, acessível e
disponível, para conduzir as negociações, um computador poderia fazer o trabalho em
seu lugar. Para a negociação as partes dariam as informações confidenciais sobre suas
posições para o software após cada rodada de negociações. Uma vez que as posições
de ambos os lados já não eram mutuamente exclusivas, o software poderia decidir a
diferença e propor um acordo. Dr Ponsatí, agora chefe do Instituto de Análises
Econômicas da Universidade Autônoma de Barcelona, diz que tais "máquinas de
mediação" poderia lubrificar as negociações destravando informações que poderiam ser
retidas por um adversário ou mediador humano.
117
Barry O'Neill, um teórico do jogo na Universidade da Califórnia, Los Angeles, descreve
como um software criado recentement pode facilitar acordos de divórcio. Ao marido e
mulher são dados um número de pontos que eles secretamente alocam para os bens
domésticos que desejam. A esposa poderá informar ao software que a sua avaliação do
carro da família é, digamos, 15 pontos. Se o marido coloca o valor do carro em 10
pontos, não pode depois alegar que ele merece mais o carro do que ela.
Prevendo um fim ao conflito
Os participantes precisam ter certeza de que a tecnologia da mediação é totalmente
neutra. Para grandes negócios, empresas de auditoria acompanham de perto o
desenvolvimento e utilização de software de modo a assegurar que nenhum agente
obtém secretamente informação sobre as posições da outra parte na negociação, diz
Benny Moldovanu, um teórico do jogo na Universidade de Bonn. Ele aconselha as
empresas usarem o software para desenhar negociação para os regimes de
privatização e mercados de venda por atacado de electricidade. Essa abordagem vai se
espalhar para outros mercados de serviços públicos, como água, acredita ele.
Pode este software de mediação de acordos de divórcio e preços ser utilizado para
resolução de disputas políticas e militares?
Teoricos da teoria dos jogos, que consideram todas essas questões serem variações do
mesmo tipo de problema, desenvolveram um modelo conceitual intrigante de guerra.
O "princípio da convergência", como é conhecido, afirma que conflito armado é, em
essência, um exercício de coleta de informações. Beligerantes lutam para determinar a
força militar e a vontade política de seus adversários, quando todos os lados têm
avaliações "convergentes" precisas e idênticas, um acordo de rendição ou a paz pode
ser forjada. Cada beligerante tem uma motivação forte para acertar o inimigo difícil e
mostrar que valoriza muito grande uma vitória. Tal modelo poderia ser usado para
refletir negativamente sobre a natureza humana. Mas alguns teóricos dos jogos
acreditam que o modelo poderia ser aproveitada para ser um substituto mais viável para
fazer negociações diplomáticas de conflito armado.
118
EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO
1) O paradoxo de Condorcet4. Considere um parlamento imaginário com 3
partidos em que os deputados possuem todos o mesmo ordenamento de
preferências do seu respectivo partido. Considere ainda, que os partidos
possuem o mesmo número de deputados. Chamaremos os partidos de
Conservador, Moderado e Radical. Existem 3 propostas orçamentárias a serem
votadas.
a) Aumentar o número de propostas sociais (proposta G); b) Manter o número
de propostas sociais (proposta M) e c) Reduzir o número de propostas sociais
(proposta D);
As preferências dos partidos estão representadas a seguir.
Partido
Ordem das preferências
Conservador
DGM
Moderado
M  DG
Radical
GM D
O processo de escolha será feito da seguinte forma:
a) Na primeira votação será escolhida uma proposta entre as opções G e M;
b) Na segunda votação será escolhida uma proposta entre as opções M e D.
c) Na terceira votação será escolhida uma proposta entre as opções G e D.
1.1 Mostre quais seriam os resultados das votações e a ordem de preferência
do parlamento.
1.2 Dada à ordem de preferência do item 1.1, podemos dizer que o parlamento é
racional?
2) Considere uma eleição entre três candidatos, A, B, e C, que disputam um
cargo politico na cidade Alfabetagama. Se um eleitor prefere o candidato A ao B
e o B ao C, representamos sua preferência como A  B  C . A tabela a seguir
mostra os tipos e quantidade dos eleitores, assim como suas respectivas
preferências.
4
Marie Jean Nicolas Caritat, Marques de Condorcet (1743-1794), filósofo, matemático foi um dos
precursores dos cientistas políticos modernos. Defendia a educação pública gratuita e igual para todos,
igualdade de direitos para homens e mulheres, assim como indivíduos de todas as raças. Como matemático,
deixou contribuições importantes em cálculo integral. Preso pela revolução francesa em 1794, foi
encontrado morto em sua cela em 28/03/1794.
119
Tipo
de
eleitor
I
II
III
Número
de
votos Preferência
95
A B  C
95
B  AC
C  A  B
110
Com base nestes dados, responda (demonstre seu raciocinio):
a) Se os candidatos se enfrentassem em dois turnos na seguinte ordem: A
versus B e, em seguida, o vencedor deste embate com C, qual seria o candidato
eleito?
b) E se a eleição fosse em um único turno, quem seria o candidato com maior
rejeição e qual seria o eleito?
3) Plinio, o jovem, advogado romano do século 1 d.C, presidia o Senado
Romano quando lhe foi apresentado o seguinte caso:
Um Senador, Afranius Dexter, foi encontrado morto. A morte poderia ter sido
suicidio ou assassinato pelas mãos de um de seus serviçais. O Senado foi
convocado para decidir o destino desses serviçais. Os Senadores tinham tres
opções - Absolvição (A), banimento (B) ou execução (E). A tabela a seguir
mostra os tipos de decisão e o percentual de Senadores simpatizante de cada
veredito.
Percentual
de
Decisão
Senadores Preferência
Absolvição (A)
45
ABE
Banimento (B)
35
B A E
E  B  A
Execução (E)
20
Havia duas possibilidades de condução da votação. Votar as propostas duas a
duas ou em uma única vez. Plinio que era a favor da absolvição deveria optar
por qual delas? Porque? Como Plinio poderia perder o caso, mesmo se o
Senado escolhesse a sua opção favorita? (demonstre).
4) O Conselho Monetário Nacional (CMN) é o órgão normativo do Sistema
Financeiro Nacional. O CMN é composto somente por 3 membros: o Ministro da
Fazenda (MF), que é o presidente do Conselho, o Ministro de Orçamento e
Gestão (MOG), e o Presidente do Banco Central do Brasil (PBC). Sendo o órgão
deliberativo máximo do Sistema Financeiro Nacional, compete ao CMN adaptar
o volume dos meios de pagamentos às reais necessidades da economia
nacional e seu processo de desenvolvimento. Para isto o CMN pode autorizar a
emissão de papel-moeda. Suponha que este mês o CMN irá se reunir para
120
decidir sobre o volume adequado de papel-moeda para a atual fase da
economia brasileira. Existem somente três políticas em pauta: Elevar (E), Manter
(M) ou Reduzir (R) o volume de papel-moeda. Os membros do CMN têm as
seguintes preferências:
a) MF : E  M , M  R, não R  E
b) MOG : M  R, R  E, não E  M
c) PBC : R  E, E  M , não M  R
4.1 Dadas as preferências acima, podemos garantir que os membros do CMN
são racionais?
4.2 Suponha que a preferência do Conselho Monetário Nacional (CMN) é
definida por maioria de votos entre os 3 membros. Inicialmente vota-se somente
entre as políticas E e M. Qual a preferida pelo CMN?
4.3 Agora vota-se somente entre as políticas E e R. Qual a preferida pelo CMN?
4.4 Por fim, vota-se somente entre as políticas M e R. Qual a preferida pelo
CMN?
4.5 De acordo com os resultados de 2.3; 2.4 e 2.5, podemos dizer que o CMN é
ra5ional? Por que?
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CIÊNCIA POLÍTICA PARA O CURSO DE ADMINISTRAÇÃO