Comunicação de ocorrência de espécies exóticas invasoras
OCORRÊNCIA DO MEXILHÃO-DOURADO, Limnoperna fortunei, NO SISTEMA
DE TRATAMENTO DE ÁGUA DE PRESIDENTE EPITÁCIO (SP/BRASIL)
Décio Dias Cesco(1)
Engenheiro Civil pela Universidade Estadual de Maringá – UEM (PR). Especialização em
Engenharia Sanitária pela Universidade Estadual Paulista – UNESP (SP). Mestrando em
Engenharia Civil – Recursos Hídricos e Tecnologias Ambientais pela Faculdade de Engenharia
Campus de Ilha Solteira da Universidade Estadual Paulista – UNESP (SP). Gerente do Setor de
Presidente Epitácio da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – SABESP
(SP).
INTRODUÇÃO
O mexilhão-dourado, Limnoperna fortunei, é um molusco bivalve nativo da Ásia que foi
detectado na captação de água da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo SABESP em Presidente Epitácio na represa da UHE – Eng. Sérgio Mota de Porto Primavera no
rio Paraná (SP, Brasil) em abril de 2004. O molusco foi introduzido na América do Sul pela
Bacia do Prata, na altura de Buenos Aires, em 1991, por meio da água de lastro de navios
transoceânicos. Desde então, o invasor vem se espalhando pelos principais afluentes da Bacia
a uma velocidade de 240 Km/ano, chegando aos rios da bacia do Rio da Prata e do Paraná Paraguai. Esses bivalves apresentam maturação sexual rápida, alta capacidade reprodutiva e
elevada adaptação aos diferentes ambientes aquáticos (mixohalinos ou de água doce),
características próprias das espécies invasoras. O mexilhão-dourado é uma espécie epibissal,
um "macrofouler" que pode aderir a quase todo tipo de substrato natural ou artificial, incluindo
tubulações, válvulas, telas, engrenagens, gradeamentos, superfícies de concreto entre outros.
Este é um dos motivos de preocupação para as estações de tratamento de água, as quais se
tornam vulneráveis às infestações, especialmente nas captações de água bruta, tubulações e
estações de bombeamento de água bruta. No sistema de captação de água bruta da Sabesp de
Presidente Epitácio o mexilhão causou problemas operacionais necessitando limpeza nos crivos
das bombas, raspagem das paredes de concreto do poço da captação e necessitando até
desentupir equipamentos analisadores integrantes do processo de automação da Estação de
Tratamento de Água. Um programa de monitoramento está em andamento para detecção da
ocorrência do mexilhão-dourado, e para a efetividade do programa de controle do molusco que
atualmente é feita através da aplicação de cloro.
BREVE HISTÓRICO
Limnoperna fortunei (DUNKER, 1857), o mexilhão-dourado, é um molusco da ordem dos
bivalves, família Mytilidae, originário do sudeste asiático (China, Coréia e outros). Na América
do Sul, as primeiras coletas de L. fortunei foram feitas em 1991, no estuário do rio da Prata,
Argentina e sugere-se que sua introdução no continente tenha ocorrido por meio da água de
lastro de navios mercantes procedentes da Ásia, a qual foi descarregada nas operações
portuárias das embarcações, liberando assim os organismos no novo ambiente. Em 1996, o
mexilhão foi encontrado no Rio Paraná, Argentina, demonstrando assim uma capacidade
impressionante de dispersão da espécie numa velocidade aproximada de 240 km por ano. Uma
situação muito similar ocorre na América do Norte, nos Estados Unidos e no Canadá, desde
1988, com a espécie Dreissena polymorpha – o mexilhão-zebra, que possui morfologia
funcional semelhante à L. fortunei.
Os problemas causados pela espécie são genericamente chamados de “macrofouling” ou
“biofouling”, quer seja: redução do diâmetro e obstrução de tubulações, redução da vazão de
água, aumento do processo de corrosão de tubulações, gosto e odor na água, entre outros.
Esses problemas tornam muito clara a importância do estudo do combate ao mexilhãodourado para os serviços de abastecimento público de água potável. Outros setores da
sociedade, tais como o industrial, de geração de energia e de navegação também são afetados
pela presença do molusco em suas atividades, além de enorme impacto causado ao meio
ambiente.
(1) Endereço: Rua João Pessoa, 10-85 – Vila Maria - Presidente Epitácio – SP – Brasil – CEP
19470-000. Tel (18) 281 1414 – email: [email protected]
O mexilhão-dourado possui estágios larvais livres, ao fim dos quais os indivíduos aderem-se
precocemente a um substrato firme para o seu desenvolvimento, característica que é típica de
espécies invasoras e que parece conferir-lhes vantagem em relação à estratégia das espécies
nativas de moluscos ocorrentes no Lago Guaíba. Estudos sobre o ciclo de vida do mexilhãodourado indicam que o organismo possui uma longevidade de 36 meses, podendo atingir até
30mm de comprimento da concha ao final desse período (CATALDO & BOLTOSSKOY apud
COLARES, 2002).
Foram verificados no Rio da Prata (Argentina), que com 5 a 6 mm de comprimento de concha,
os mexilhões já podem apresentar maturidade sexual, conforme as condições sazonais. A
população de moluscos parece apresentar um processo de reprodução contínua, com picos de
atividade de maturação sexual relacionados com as mudanças de temperatura (DARRIGRAN
ET AL apud COLARES, 2002).
Diante da situação apresentada, este trabalho tem como objetivo notificar a ocorrência e
descrever a preocupação da SABESP com a presença de L. fortunei em suas instalações do
sistema de abastecimento de água do município de Presidente Epitácio. Focando na
preocupação com o setor de Saneamento, visto que o problema está intimamente relacionado
à Saúde da população abastecida e de outras unidades que também poderão ser afetadas por
esta espécie invasora. Preocupação também pelo fato que dentro das alternativas para
controle, a solução adotada com aplicação de cloro poderá trazer problemas à qualidade da
água se considerar que o rio Paraná com a criação do Lago pela UHE Eng. Sérgio Mota em
Porto Primavera, poderá por meio de processos de eutrofização acumular uma maior
quantidade de matéria orgânica, e estas em contato com o cloro promover a formação de
subprodutos em especial os THM´s (trihalometanos). Este produto sabidamente cancerígeno
quando em concentrações acima do limite de 100 μg/L na água de abastecimento público.
ALTERNATIVAS PARA CONTROLE
O sistema de captação no rio Paraná tem vazão nominal de 140 l/s, dotado de 02 poços de
sucção, com grades de proteção e sistema de recalque através de conjunto motobombas de
eixo vertical cuja manutenção era feita por meio da limpeza das grades e dos poços para
retirada de vegetações e sempre que havia perda da produção. Com a presença do molusco
esta limpeza passou a ser diária e, chegou a provocar o entupimento dos crivos das bombas.
Na busca de alternativas para o controle do mexilhão buscou-se informações das experiências
vividas pelo DMAE de Porto Alegre, da CESP na UHE Engº Sérgio Mota de Porto Primavera e
considerando que era efetuado a pré-cloração no sistema, optou-se pela aplicação de cloro na
captação, o que permitiu a manutenção da qualidade da água produzida atendendo a Portaria
518/04 do Ministério da Saúde que especifica os padrões de qualidade da água para consumo
humano.
A utilização de produtos químicos no controle dos mexilhões parece ser uma alternativa
vantajosa, pois oferece proteção para todo o sistema de tratamento, incluindo estruturas de
difícil acesso e inspeção. Deve haver, no entanto, um rigoroso controle quanto às
concentrações desses elementos no interior de ETAs e nas descargas de lodo para o meio
ambiente, uma vez que podem alcançar níveis em desacordo com as normas de saúde pública
e de proteção aos mananciais. Entre todos os produtos químicos testados por diversos
investigadores para o controle de D. polymorpha, o uso do cloro e seus derivados possui
aceitação quase universal. A aplicação contínua de cloro em concentração de 0,5mg/L foi
testada em sistemas de água bruta de Hong Kong (China), relatando-se eficiência na
prevenção de infestação do mexilhão-dourado. A alimentação e a respiração dos moluscos
parecem ser interrompidas em resposta ao produto químico lançado na água (COLARES,
2002).
Outras alternativas foram levantadas para controle do molusco cujas eficiências precisam ser
confirmadas, bem como podem ser adotadas soluções em conjunto diante de algumas
situações que poderão representar menores custos de implantação:
• Métodos de tratamentos mecânicos: como filtragem e separação;
• Métodos de tratamentos físicos: tais como esterilização por ozônio, luz ultra-violeta,
correntes elétricas, tratamento térmico, pinturas para alterar textura de paredes e tubulações;
• Métodos de tratamentos químicos: como adição de biocidas para matar os organismos;
• Métodos de tratamentos biológicos: como algumas espécies predadoras do mexilhão (isto
precisa ser melhor estudado, para definição das espécies inimigas naturais).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O diagnóstico realizado evidenciou o impacto da presença da espécie Limnoperna fortunei no
sistema de abastecimento de água da SABESP de Presidente Epitácio no Lago da UHE Eng.
Sérgio Mota no rio Paraná, o que resultou na implementação de medidas operacionais para
controle do organismo através da aplicação de cloro. A partir do acompanhamento desses
resultados, a SABESP está buscando novas alternativas para o gerenciamento do sistema
afetado pelo molusco, bem como para a possibilidade de outros sistemas que poderão ser
afetados considerando-se a velocidade de espalhamento e, onde a solução com a aplicação do
cloro pode ser impossibilitada pela estrutura que necessita. Conforme destacado por vários
autores, o controle desse organismo envolve diversas ações preventivas e corretivas, que
devem ser desencadeadas de forma integrada para garantir a operacionalidade dos sistemas
envolvidos, incluindo também a apropriação dos custos relacionados a essas atividades.
Esse fenômeno recente de invasão de uma espécie exótica nos ambientes aquáticos do rio
Paraná e, também em outros estados brasileiros, ressaltam a importância das ações de gestão
ambiental nos mananciais, com efetivo controle e fiscalização pelas diversas esferas do poder
público envolvido, a fim de permitir o uso múltiplo dos recursos hídricos e a preservação das
comunidades naturais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COLARES, EVANDRO RICARDO DA COSTA, Diagnóstico e Controle do Mexilhão-Dourado,
Limnoperna FORTUNEI, em Sistemas de Tratamento de Água em Porto Alegre, VI Simpósio
Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental, Vitória – ES, 2002.
MANSUR, M.C.D.; DOS SANTOS, C. P.; DARRIGRAN, G.;. HEYDRICH, I; CALLIL, C.T. &
CARDOSO, F.R. Primeiros dados quali-quantitativos do mexilhão-dourado, Limnoperna fortunei
(Dunker), no Delta do Jacuí, no Lago Guaíba e na Laguna dos Patos, Rio Grande do Sul, Brasil
e alguns aspectos de sua invasão no novo ambiente Rev. Bras. Zool. vol.20, Curitiba , 2003.
CESP – Companhia Energética de São Paulo, Plano de Ação Emergencial para Controle do
Mexilhão Dourado, São Paulo – 2003.
MINISTÉRIO DA SAÚDE, Norma de Qualidade da Água para Consumo Humano - Portaria nº
518 de 25 de março de 2004.
ANEXOS
Figura 1–Vista aérea da cidade de Presidente Epitácio, com detalhe da
captação da Sabesp . Foto: Cesp.
Figura 2 – Vista da captação de água no rio Paraná. Foto: Sabesp
Figura 3-Tijolos usados para detectar presença do mexilhão. Foto:Sabesp
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