Oftalmologia - Vol. 36: pp.133-140
Artigo Original
Avaliação da Mácula e Espessura
da Camada de Fibras Nervosas
Peripapilar em Crianças Prematuras
Ana Filipa Duarte 1I, Rita Rosa 1I, Arnaldo Santos 1I, Rute Lino 3III, Ana Bettencourt 2II, Cristina Brito 2II,
José Nepomuceno 2II, Alcina Toscano 2II, Pinto Ferreira 2II
1
Interno do Internato Complementar; 2Assistente Hospitalar Graduado ; 3Ortoptista 1ª Classe
I
Serviço de Oftalmologia do Centro Hospitalar de Lisboa Central
II
Maternidade Alfredo da Costa
III
Gabinete de Ortóptica – Centro Hospitalar de Lisboa Central
Resumo
Objectivo: Investigar alterações da mácula e da camada de fibras nervosas peripapilar numa
população de crianças prematuras com idades entre os 5 e 10 anos.
Métodos: Estudo prospectivo, controlado, envolvendo crianças prematuras seleccionadas na
consulta de Oftalmologia Pediátrica do Centro Hospitalar de Lisboa Central, entre Maio a Julho
de 2011. As mesmas foram distribuídas em 3 grupos: grupo sem retinopatia da prematuridade
(ROP) prévia – GP, 40 olhos; grupo com história de ROP com regressão espontânea – GR, 40
olhos; grupo com ROP submetida a tratamento – GT, 20 olhos. Foi igualmente constituído um
grupo controlo (GC), de crianças na mesma faixa etária e com nascimento após gravidez de
termo. Todas as crianças foram submetidas a tomografia óptica computorizada spectral domain
(Spectralis®) para determinação das espessuras macular central, perifoveal e camada de fibras
nervosas peripapilar.
Resultados: Nos grupos de crianças prematuras foram detectados, face à população controlo,
valores de espessura macular central significativamente superiores (GP, GR, GT, GC, 280,87 ±
18,65; 301,67 ± 24,19; 329,65 ± 29,35; 270,57 ± 10,74, respectivamente), o mesmo não acontecendo com as espessuras perifoveais interna e externa, onde não se evidenciaram diferenças.
A espessura média da camada de fibras nervosas peripapilar foi significativamente inferior nas
crianças prematuras (GP, GR, GT, GC 95,72 ± 16,17; 80,97 ± 12,68¸ 81,40 ± 24,63; 97,20 ±
8,01, respectivamente). Estas diferenças foram mais significativas na população com ROP (tratada e não tratada).
Conclusões: Crianças prematuras, sobretudo as que desenvolvem retinopatia da prematuridade,
podem apresentar alterações na anatomia foveal e espessura da camada de fibras nervosas.
Palavras-chave
Prematuridade, retinopatia da prematuridade, tomografia de coerência óptica, mácula, camada
de fibras nervosas.
Vol. 36 - Nº 2 - Abril-Junho 2012 |
133
Ana Filipa Duarte, Rita Rosa, Arnaldo Santos, Rute Lino, Ana Bettencourt, Cristina Brito, José Nepomuceno, Alcina Toscano, Pinto Ferreira
Abstract
Purpose: To investigate macular changes and retinal nerve fiber layer thickness in premature
children com ages between 5 and 10 years.
Methods: Prospective, controlled study involving premature children, recruited from Centro
Hospitalar de Lisboa Central, from May to July 2011. Three groups were formed: children with
no history of retinopathy of prematurity (ROP) - GP group, 40 eyes; group with previous ROP
with spontaneous regression - GR group, 40 eyes; group with previously treated ROP - GT
group, 20 eyes. Additionally 20 healthy and full-term children of the same age group were recruited and formed the control group. – Group C (GC). All the children were submmited to
spectral domain optical coherence tomography (Spectralis®) for determination of central and
perifoveal macular thickness and nerve fiber layer thickness.
Results: We found that premature children had significantly higher values of macula central
thickness (GP, GR, GT, GC, 280.87 ± 18.65 ; 301.67 ± 24.19 ; 329.65 ± 29.35 ; 270.57 ± 10.74,
respectively), and there were no differences concerning perifoveal internal and external thicknesses. Average thickness of retinal nerve fiber layer area was significantly lower in children
born before term (GP, GR, GT, GC 95.72 ± 16.17; 80.97 ± 12.68 ‘ 81.40 ± 24.63; 97.20 ± 8.01,
respectively). These differences were most significant in children with ROP (treated and not
treated), in which there was also a greater loss of foveal depression.
Conclusion: This study has shown that premature children, especially those with previous retinopathy of prematurity, may present changes in foveal anatomy and nerve fiber layer thickness.
Key-words
Prematurity, retinopathy of prematurity, optical coherence tomography, macula, nerve fiber
layer.
Introdução
A Retinopatia da Prematuridade (ROP) é uma patologia
vasoproliferativa que se pode desenvolver em recém-nascidos prematuros, na ausência de maturação retiniana completa. Afecta os vasos em desenvolvimento e apresenta um
largo espectro de gravidade e sequelas visuais, desde ligeira
com regressão espontânea, a mais agressiva com formação
de neovasos, descolamento da retina e, em última instância,
cegueira. Com a melhoria dos cuidados neonatais a possibilidade de sobrevivência de grandes prematuros tem aumentado e com isso, a incidência de ROP tornou-se cada vez
maior(1). Vários factores têm sido implicados no seu desenvolvimento: baixo peso à nascença, baixa idade gestacional
e oxigenioterapia suplementar, entre outros, sendo que mais
recentemente tem sido proposta uma importante influência
de factores genéticos(2).
O impacto da prematuridade no desenvolvimento ocular
e na visão pode, por si só, ser significativo, mesmo sem
o desenvolvimento de ROP, e a primeira sido associada a
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várias patologias desde miopia, estrabismo, ambliopia a
anomalias do disco óptico(3,4). No que respeita ao desenvolvimento macular, sabe-se actualmente que termina algumas
semanas após o nascimento(5) e estudos em animais têm
sugerido que a prematuridade pode alterar este processo(6).
Adicionalmente, dados recentes documentam a existência de uma disfunção macular subtil, em olhos com ROP,
traduzida em alterações do electroretinograma multifocal
(mfERG)(7), bem como um comprometimento da visão cromática e sensibilidade ao contraste a longo prazo(8). Apesar do crescente interesse crescente pelo estudo da mácula
e CFN em crianças prematuras(9-13), são ainda escassos os
estudos incidindo numa faixa etária mais avançada, e que
relacionem alterações da retina central e sobretudo da CFN
com existência de ROP prévia.
A Tomografia de Coerência Óptica (OCT) e mais recentemente a nova tecnologia Spectral-Domain (SD), de elevada resolução, permite obter dados relativos à área macular e
CFN de forma altamente reprodutível, sendo actualmente um
dos métodos mais utilizados na avaliação destas estruturas(14).
Avaliação da Mácula e Espessura da Camada de Fibras Nervosas Peripapilar em Crianças Prematuras
O objectivo deste estudo é o de investigar alterações
maculares e da espessura da camada de fibras nervosas
peripapilar, através de OCT, numa população de crianças
prematuras em idade escolar, de forma a melhorar a abordagem clínica nestas crianças.
Material e Métodos
Desenho do estudo
Estudo prospectivo controlado.
Amostra
O presente estudo incluiu crianças com nascimento pré-termo, entre os 5 e os 10 anos, seleccionadas na consulta
de Oftalmologia Pediátrica do Centro Hospitalar de Lisboa
Central no período de Maio a Julho de 2011. Foram excluídas crianças que apresentassem história de lesão cerebral,
cirurgia ocular prévia, sequelas de ROP (prega macular,
tracção vitreomacular, descolamento da retina envolvendo
a mácula) ou outra patologia significativa do pólo posterior, nistagmos, ambliopia e miopia com equivalente esférico ˃-3.0D. Os pais das crianças foram convidados por
via telefónica a participar no estudo, tendo sido obtido um
consentimento informado à data do exame. Seis crianças
foram excluídas por falta de colaboração, 5 prematuras e 1
do grupo controlo.
As crianças prematuras foram distribuídas em 3 grupos: Grupo P (GP) - sem história de retinopatia da prematuridade (ROP), 20 crianças entre 5 e 10 anos, (40 olhos);
grupo R (GR) - história de ROP com regressão espontânea, 20 crianças entre 5 e 10 anos (40 olhos); grupo T
(GT) – história de ROP submetida a tratamento – 15 crianças entre 5 e 6 anos (dos quais 20 olhos foram seleccionados, após análise dos critérios de exclusão). Foram ainda
recrutadas 20 crianças saudáveis, na mesma faixa etária,
com nascimento após gravidez de termo e sem patologia
ocular, que formaram o grupo controlo – grupo C (GC, 40
olhos).
Tabela 1 |
Todas as crianças foram submetidas a tomografia óptica
computorizada spectral domain (SD-OCT, Spectralis®), pelo
mesmo operador, numa sala com baixa iluminação e sem dilatação pupilar prévia. Para o estudo da mácula uma fonte de
fixação interna foi centrada na fóvea do doente, com monitorização da sua estabilidade pelo operador, e as imagens obtidas após realização de seis scans maculares radiais com igual
espaçamento angular, e 25 scans paralelos separados por
200 μm. As imagens foram analisadas através do software
incorporado no aparelho. A espessura da retina foi dada automaticamente como a distância entre um plano ao nível da
interface vitreoretiniana e outro ao nível do complexo membrana basal do epitélio pigmentar da retina – membrana de
Bruch. Foram obtidas os valores médios da espessura retiniana em cada uma das 9 áreas definidas pelo Early Treatment
Diabetic Retinopathy Study (ETDRS), dispostos em 3 anéis
concêntricos, com raios de 1.0, 2.22 e 3.45 mm, respectivamente. Analisou-se o valor central, perifoveal interno (soma
dos 4 valores do anel intermédio ) e perifoveal externo (soma
dos 4 valores do anel externo). Para o estudo da camada de
fibras nervosas peri-papilar foi analisada uma área de disco
óptico de 4 mm por 4 mm, com intervalos de 50 μm e obtidos
os valores de espessura da camada de fibras nervosas total
(CFN), determinados através do software do aparelho.
Análise estatística
Os resultados foram analisados estatisticamente utilizando o software SPSS versão 19.0 para o Windows (SPSS
Inc, Chicago, IL). Todos os dados são expressos como média ± desvio padrão. O teste Mann-Whitney U foi utilizado
para comparar os resultados entre os 4 grupos, para uma
significância estatística de 5%.
Resultados
As idades atuais das crianças incluídas nas amostras,
bem como as idades (semanas) e pesos gestacionais (gramas) são descritos na tabela 1. Todos os olhos do grupo
Resultados relativos à idade atual, idade gestacional e peso à nascença nos diferentes grupos de crianças prematuras.
Parâmetros
GP
GR
GT
Idade (anos)
7.29 ± 1.49
7.55 ± 1.28
5.74 ± 0.51
Idade gestacional (semanas)
31.70 ± 2.31
28.28 ± 1.49
25.50 ± 0.55
1536.23 ± 440.54
902.50 ± 306.87
740 ± 95.29
Peso à nascença (gramas)
Os valores são mostrados como média ± DP. GP = grupo de crianças prematuras sem ROP; GR = grupo de crianças prematuras com ROP com regressão espontânea; GT = grupo de crianças prematuras com
ROP tratada com laser.
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GR apresentaram história de ROP de estádio 1 ou 2 na fase
aguda, com posterior regressão espontânea documentada,
e os olhos do grupo GT foram submetidos a tratamento de
coagulação a laser para doença estádio 3 limiar.
No que respeita à espessura central da mácula observámos valores significativamente superiores nos grupos
de crianças prematuras (sem ROP, com ROP de regressão
espontânea e com ROP tratada) face às crianças controlo (tabelas 2 e 3), com excepção do grupo de prematuros
(GP), onde a espessura macular central foi superior ao grupo controlo mas não de forma significativa. As diferenças
foram igualmente significativas e com valores crescentes
ao compararmos os 3 grupos de crianças prematuras entre
Tabela 2 |
si (GP vs GR vs GT, tabela 4). Os valores de espessura
das áreas perifoveais foram similares entre os 4 grupos.
As figuras 1 a 4 (imagens da esquerda e centro) correspondem a 4 casos que exemplificam os resultados obtidos em
cada grupo. De salientar que nas imagens de scans maculares das crianças prematuras, e de forma mais evidente no
GR e GT, as depressões foveais apresentaram-se menos
evidentes, definindo-se uma camada contínua entre a lâmina limitante interna e a camada de fotoreceptores, correspondente às camadas internas da retina. De forma mais
precisa, no GP tal como no GC, 40/40 olhos (100%) apresentaram depressões foveais visíveis, sendo no GR 13/40
olhos (32,5%) e no GT 20/20 (100%) não.
Resultados relativos à espessura macular central e perifoveal nos diferentes grupos de crianças.
Parâmetros
GP
GR
GT
GC
Espessura mácula central (μm)
280.87 ± 18.65
301.67 ± 24.19
329.65 ± 29.35
270.57 ± 10.74
Espessura peri-foveal int. (μm)
337.87 ± 16.67
332.55 ± 12.11
345.20 ± 15.11
340.30 ± 11.85
Espessura peri-foveal ext. (μm)
298.24 ± 20.34
291.24 ± 15.02
311.43 ± 13.76
302.81 ± 11.16
Os valores são mostrados como média ± DP. GP = grupo de crianças prematuras sem ROP; GR = grupo de crianças prematuras com ROP com regressão espontânea; GT = grupo de crianças prematuras com
ROP tratada com laser; GC = grupo de crianças com nascimento após gravidez de termo.
Tabela 3 |
Resultados do teste de Mann-Whitney, utilizado na comparação de pares de grupos.
Parâmetros
GP vs GC
GR vs GC
GT vs GC
Espessura mácula central (μm)
0.06
˂0.001
˂0.001
Espessura peri-foveal int. (μm)
0.648
0.53
0.62
Espessura peri-foveal ext. (μm)
0.67
0.43
0.52
GP = grupo de crianças prematuras sem ROP; GR = grupo de crianças prematuras com ROP com regressão espontânea; GT = grupo de crianças prematuras com ROP tratada com laser; GC = grupo de crianças
com nascimento após gravidez de termo.
Tabela 4 |
Resultados do teste de Mann-Whitney, aqui utilizado para comparar os diferentes grupos de crianças prematuras.
Parâmetros
GP vs GR
GP vs GT
GR vs GT
Espessura mácula central (μm)
0.001
˂0.001
0.001
GP = grupo de crianças prematuras sem ROP; GR = grupo de crianças prematuras com ROP com regressão espontânea; GT = grupo de crianças prematuras com ROP tratada com laser.
Tabela 5 |
Resultados do teste de Mann-Whitney, utilizado na comparação de pares de grupos.
Parâmetros
GP vs GC
GR vs GC
GT vs GC
0.63
˂0.001
˂0.001
GP vs GR
GP vs GT
GR vs GT
˂0.001
˂0.001
0.65
Espessura CFN (μm)
Espessura CFN (μm)
GP = grupo de crianças prematuras sem ROP; GR = grupo de crianças prematuras com ROP com regressão espontânea; GT = grupo de crianças prematuras com ROP tratada com laser; GC = grupo de crianças
com nascimento após gravidez de termo.
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| Revista da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia
Avaliação da Mácula e Espessura da Camada de Fibras Nervosas Peripapilar em Crianças Prematuras
No que respeita à espessura de CFN podemos igualmente observar valores significativamente inferiores no grupo
de crianças com ROP prévia (não tratada e tratada, entre
os quais a diferença não foi estatisticamente significativa)
face aos grupos de crianças prematuras sem ROP e crianças
controlo (gráfico 1 e tabela 5). Mais uma vez as figuras 1 a
4 (imagens à direita) correspondem a 4 casos que exemplificam os resultados obtidos em cada grupo.
Discussão
Neste estudo investigámos a estrutura macular e camada
de fibras nervosas em crianças prematuras, distribuindo-as
em 3 grupos: GP, prematuros sem ROP; GR, prematuros
com ROP; e GT, prematuros com ROP tratada com laser.
Procurámos determinar o efeito de cada um destes aspectos
comparativamente a um grupo de crianças com nascimento de termo. Tal como Recchia et al.(12) e Ecsedy et al.(13)
haviam verificado, também nos nossos grupos de crianças
prematuras foram evidentes valores significativamente superiores de espessura macular central, acompanhados por
depressões foveais menos pronunciadas, com manutenção,
na maioria dos casos, de acuidades visuais normais (aspecto este que não foi determinado de forma exaustiva por
não fazer parte do âmbito deste estudo). Em muitas destas
crianças, sobretudo no GR e GT os scans maculares mostraram a persistência de camadas internas da retina a nível
Gráf. 1 | Resultados relativos à espessura da camada de fibras
nervosas nos diferentes grupos de crianças. GP = grupo de crianças prematuras sem ROP; GR = grupo de
crianças prematuras com ROP com regressão espontânea; GT = grupo de crianças prematuras com ROP tratada com laser; GC = grupo de crianças com nascimento
após gravidez de termo.
central sendo de salientar que os valores de espessura foram crescentes do grupo de crianças prematuras para o grupo de crianças com ROP e daí para as crianças com ROP
tratada a laser, todos eles com valores significativamente
Fig. 1 | Imagens de scans maculares, mapas de espessura e camada de fibras nervosas de criança de 7 anos pertencente ao GP (prematuros
sem ROP prévia).
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Fig. 2 | Imagens de scans maculares, mapas de espessura e camada de fibras nervosas de criança de 6 anos pertencente ao GR (prematuros
com ROP com regressão espontânea).
Fig. 3 | Imagens de scans maculares, mapas de espessura e camada de fibras nervosas de criança de 6 anos pertencente ao GT (prematuros
com ROP tratada a laser).
diferentes entre si. O teste de Mann- Whitney demonstrou
mais especificamente que as crianças com ROP prévia (tratada e não tratada, GT e GR) mas não as prematuras sem
ROP (GP) apresentaram valores de espessura macular central significativamente superiores às crianças controlo. Já
as espessuras das camadas internas e externas da mácula
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| Revista da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia
foram similares entre todos os grupos. Estes resultados
fazem-nos propor que a retinopatia pode causar uma disrupção no normal desenvolvimento da fóvea, contudo, não
podemos excluir a questão da prematuridade, dado que as
crianças que desenvolvem ROP são também aquelas de
menores idades e pesos gestacionais, sendo que podem ser
Avaliação da Mácula e Espessura da Camada de Fibras Nervosas Peripapilar em Crianças Prematuras
Fig. 4 | Imagens de scans maculares, mapas de espessura e camada de fibras nervosas de criança de 7 anos pertencente ao GC (grupo
controlo).
esses factores os responsáveis pelas alterações estruturais
observadas. Uma limitação deste estudo, e que poderá ser
colmatada numa análise futura, é precisamente a correlação entre esses distintos parâmetros (idade gestacional,
peso à nascença, ROP, ROP tratada) com os resultados
obtidos. Um estudo prévio sobre alterações angiográficas
em crianças prematuras(15) demonstrou a existência de uma
zona avascular central inferior ao normal, sugerindo que
o processo normal de regressão vascular que ocorre nesta
zona estará comprometido em crianças nascidas antes das
30 semanas. Vários outros autores descreveram igualmente
as alterações maculares que decorrem nas últimas semanas
de gestação, como o afastamento progressivo das células
internas da retina e dos núcleos dos cones dos segmentos
externos dos últimos, que se organizam de forma compacta
no centro da fóvea(16). A prematuridade e/ou ROP podem
condicionar este processo e justificar os achados nos scans
maculares, com a persistência das camadas internas e redução da depressão foveal.
Outras possíveis limitações deste estudo dizem respeito
por um lado, ao tamanho das amostras, e por outro ao facto
de termos tido apenas acesso aos dados de crianças entre
5 e 6 anos, para inclusão no grupo de ROP tratada (GT).
O aumento das amostras e a inclusão de crianças de idades
superiores no último grupo poderiam auxiliar a obtenção
de conclusões definitivas. Também de referir a possibilidade de existência de erros na aquisição de imagens em
crianças com fracas colaborações, com a obtenção de scans
parafoveais e valores falsamente elevados de espessuras.
Contudo, a realização deste exame por um técnico experiente terá minimizado este fonte de erro.
No que respeita à espessura da camada de fibras nervosas peripapilar, mais uma vez os grupos de crianças
prematuras apresentaram diferenças significativas entre si
e comparativamente ao grupo controlo, sendo os valores
decrescentes do grupo de crianças prematuras para o grupo de crianças com ROP e daí para as crianças com ROP
tratada a laser. Samarawickrama CB(11) determinou previamente que o baixo peso à nascença e outros marcadores de
um mau desenvolvimento intra-uterino relacionavam-se
com alterações dos parâmetros da papila, nomeadamente
com uma maior relação escavação/disco, numa população
de crianças de 12 anos. Mais recentemente Tariq et al(9)
demonstrou as associações entre baixo peso à nascença e
prematuridade com o espessamento da fóvea, e entre baixo peso e a redução da espessura de CFN. Contudo, em
nenhum destes estudos foi tida em conta a existência ou
não de ROP. Os nossos resultados, juntamente aos já publicados, suscitam questões que podem ser relevantes na
avaliação do nervo óptico destes doentes: serão estas alterações uma particularidade destes indivíduos? Essa verificação poderia evitar diagnósticos erróneos de neuropatias (p.e.glaucomatosa) na idade adulta. Por outro lado,
terão estes olhos um risco acrescido de desenvolvimento
de glaucoma? Para responder a esta questão seriam úteis
estudos longitudinais incidindo nesse aspecto, devidamente
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acompanhados pela avaliação dos campos visuais. O mesmo acontece na avaliação da mácula, dado ser o OCT um
método auxiliar de diagnóstico frequentemente utilizado
em quadros de baixa visão.
Concluindo, este estudo demonstrou que crianças prematuras sem patologia macular aparente na oftalmoscopia
podem apresentar alterações na anatomia desta zona (aumento da espessura central, perda da depressão foveal e
persistência das camadas internas da retina) e menor espessura da camada de fibras nervosas peripapilar. Essas variações são mais pronunciadas em crianças que desenvolveram retinopatia da prematuridade.
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CONTACTO
[email protected]
Trabalho apresentado no 54º Congresso Português de
Oftalmologia, em Dezembro de 2011.
Os autores não têm qualquer interesse comercial no
equipamento utilizado.
Este trabalho não foi publicado e os direitos de autor
são cedidos à SPO.
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