N.º 08/ CC /2014 N/Referência: PROC.: C. C. 9/2013 STJ-CC Consulente: Chefe de Projeto SIRIC Data de homologação: 18-12-2014 . Assunto: Verificação da identificação nos atos de registo civil – Documentos de identificação – Sua definição em sede de registo civil – Consulente: Chefe de Projeto SIRIC Palavras-chave: Processo de casamento, documento de identificação, cartão de cidadão, bilhete de identidade, protesto, verificação da identidade. A senhora Chefe de Projeto SIRIC e inspetora …….. apresentou e submeteu à consideração do Senhor VicePresidente do Conselho Diretivo do Instituto dos Registos e Notariado, I.P. o entendimento sobre o que a mesma considera ser “Documento de identificação dos nubentes necessário para a instrução do processo de casamento”. IMP.IRN.Z00.07 • Revisão: 01 • Data: 22-01-2014 Para tanto alinha a seguinte argumentação: “Nos termos do artigo 136º nº 1 alínea 1) e artigo 137º ambos do código do registo civil são necessários para a instrução do processo de casamento os documentos de identificação dos nubentes ou sendo estes estrangeiros, título ou autorização de residência, passaporte ou documento equivalente. Com a alteração do Decreto-lei nº 324/2007, de 28 de Dezembro substitui-se a indicação do bilhete de identidade por documento de identificação, em virtude de ter sido criado o cartão de cidadão como documento de identificação. Falando a lei de documento de identificação mas não existindo em nenhum artigo do código o que se entende por documento de identificação para os cidadãos portugueses, questiona-se se pode ser outro qualquer tipo de documento como seja a carta de condução para instruir o processo de casamento. Nos termos do artigo 48º do código do notariado a carta de condução é documento de identificação, sendo admitida para verificar a identidade das partes nos actos notariais, assim poderá aplicar-se esta norma do Código para definir o conceito de “documento de identificação” que não é regulado pelo Código do Registo Civil e aceitar-se os documentos aí previstos como documentos de identificação.”. Proferido despacho do senhor Vice-Presidente para distribuição e consulta pelo núcleo do registo civil, foi por este elaborada Informação que refutou a posição da senhora inspetora e que, por a subscrevermos na íntegra, passamos a reproduzir (com as notas de rodapé 3 e seguintes inseridas no texto a partir do início da transcrição, precedidas das iniciais n.r. e do respetivo número): “I – Em primeiro lugar, cumpre referir que o Código do Notariado só constitui norma supletiva, no que ao registo civil respeita, em casos pontuais por meio de expressa remissão para aquele ou em matérias que sejam conexas com as de notariado, no que não esteja previsto no Código do Registo Civil ou eventual legislação avulsa. Av. D. João II, n.º1.08.01 D • Edifício H • Parque das Nações • Apartado 8295 • 1803-001 Lisboa Tel. + 351 21 798 55 00 • Fax. + 351 21 781 76 93 [email protected] • www.irn.mj.pt 1/8 IMP.IRN.Z00.07 • Revisão: 01 • Data: 22-01-2014 Como é exemplo, no primeiro caso, o art. 210.º-N, do CRC (n.r.3: E respeitante aos procedimentos simplificados de sucessão hereditária) e no segundo a tradução de documentos em língua estrangeira e ainda as procurações. Ora, não existe nenhum artigo no CRC que mande aplicar subsidiariamente, nesta matéria, o Código do Notariado, nem a matéria respeitante à organização de processo de casamento é conexa com as matérias reguladas por aquele Código. Assim não nos parece que à presente situação se possa aplicar subsidiariamente o Código do Notariado. II – Em segundo lugar, há que apurar o que se entende por carta de condução. Poderá ser considerada um documento de identificação? Vejamos melhor. O n.º 4 do artigo 121.º, Código da Estrada (n.r.4: Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de maio), define a carta de condução como o “… documento que titula a habilitação legal para conduzir ciclomotores, motociclos, triciclos, quadriciclos pesados e automóveis…”. Na mesma linha o n.º 1 do artigo 121.º e o n.º 1 do artigo 123.º, do mesmo diploma, determinam que só está habilitado a conduzir o titular da carta de condução. E no mesmo sentido o artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir (n.r.5: Aprovado pelo Decreto-Lei nº 138/2012, de 5 de julho). Ainda no Código da Estrada e a propósito das contraordenações rodoviárias, estipula o art. 171.º, n.º 1, al. c), que a identificação do arguido deve ser efetuada através da indicação do “Número do documento legal de identificação pessoal, data e respectivo serviço emissor ou quando se trate de pessoa colectiva, do número de pessoa colectiva”. Exigindo-se ainda na alínea d) do mesmo artigo o número do título de condução. Ora, a exigência da alínea c) só faz sentido se se considerar que a carta não é documento de identificação. Também naquele Código, no artigo 85.º, n.º 1, al. a), exige-se que o condutor que transite na via pública deve ser portador, além do título de condução (n.r.6: Alínea b), do n.º 1, do artigo 85,º, do Código da Estrada), do documento legal de identificação pessoal. Mais uma vez, essa exigência só faz sentido se se considerar que a carta de condução não é documento de identificação. Mas que elementos contém a carta de condução? O artigo 1.º, n.º 1, do Regulamento já referido determina que a carta de condução (n.r.7: Prevista no artigo 121.º, n.º 4 do Código da Estrada e que aqui nos interessa) obedece ao modelo constante do anexo I daquele Regulamento. Do referido anexo retira-se que da carta de condução consta, no que a nós interessa, os apelidos, o nome próprio e a data e local do nascimento do titular. Não consta assim a filiação, elemento que é de grande relevância para a distinção entre cidadãos com nomes iguais ou similares. Mais é pela filiação que se apura parte importante da capacidade ou não para casar com outro indivíduo. E se a isso juntarmos o facto de o cidadão registado em Portugal não ter que apresentar certidão do seu assento de nascimento, ficando o ónus de encontrar o mesmo para os serviços, maior importância assume a filiação como elemento de despiste. III – Em terceiro lugar, há que apurar o que se entende por documento de identificação do cidadão nacional. O referido artigo 137.º, n.º 1, al. a), do CRC, estatui que a declaração para casamento deve ser instruída com os documentos de identificação dos nubentes de nacionalidade portuguesa. Porém, o CRC não contém uma norma que defina “documento de identificação” ou que especifique que documentos possam ser usados para proceder à identificação no âmbito daqueles processos. Mas o que é um documento de identificação? Av. D. João II, n.º1.08.01 D • Edifício H • Parque das Nações • Apartado 8295 • 1803-001 Lisboa Tel. + 351 21 798 55 00 • Fax. + 351 21 781 76 93 [email protected] • www.irn.mj.pt 2/8 IMP.IRN.Z00.07 • Revisão: 01 • Data: 22-01-2014 Parece-nos o momento certo de nos socorrermos das leis que regem em matéria de identificação civil. Mas concretamente a Lei 33/99, de 18 de maio (n.r.8: Lei que regula a identificação civil e a emissão de bilhete de identidade de cidadão nacional) e a Lei 7/2007, de 5 de Fevereiro (n.r.9: Lei que cria o cartão de cidadão e que rege a sua emissão e utilização). Na Lei 33/99, de 18 de maio, lê-se no artigo 3.º, n.º 1, que o “…bilhete de identidade constitui documento bastante para provar a identidade civil do seu titular perante quaisquer autoridades, entidades públicas ou privadas, sendo válido em todo o território nacional…”. E no artigo 4.º, n.º 1, al. f), determina-se que a apresentação do bilhete de identidade é obrigatória para os nubentes portugueses, “nos termos da lei do registo civil”, norma conexa com o artigo 137.º, n.º 1, al. a), do CRC, que neste processo se analisa. Já da Lei 7/2007, de 5 de fevereiro, resulta que o cartão de cidadão, documento que veio substituir o bilhete de identidade, é um “documento de identificação múltipla” (n.r.10: Artigo 6.º, n.º 1, da Lei 7/2007, de 5 de fevereiro) e permite ao respetivo titular identificar-se perante terceiros (n.r.11: Artigo 6.º, n.º 2, als. a) e b), da Lei 7/2007, de 5 de fevereiro). E o artigo 2.º estipula que o cartão de cidadão é um documento autêntico que “…contém os dados de cada cidadão relevantes para a sua identificação e inclui o número de identificação civil…”. Vejamos ainda os artigos 3.º e 4.º. No n.º 1 do artigo 3.º impõe-se a obrigatoriedade de obtenção do cartão de cidadão para os cidadãos nacionais, a partir dos 6 anos de idade ou “…logo que a sua apresentação seja exigida para o relacionamento com algum serviço público.” E no artigo 4.º determina-se que o cartão de cidadão constitui título bastante para provar a identidade do seu titular perante quaisquer autoridades e entidades públicas ou privadas. O cartão de cidadão veio substituir o bilhete de identidade (n.r.12: Artigo 56.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, da Lei 7/2007, de 5 de fevereiro), continuando este a produzir os seus efeitos enquanto, ao seu titular, não for entregue o cartão de cidadão (n.r.13: Artigo 55.º, n.º 1, da Lei 7/2007, de 5 de fevereiro). Daqui podemos concluir que o documento de identificação de todos os cidadãos portugueses é atualmente o cartão de cidadão em simultâneo com o bilhete de identidade ainda em circulação. Isto sem prejuízo de exceções eventualmente contidas noutros diplomas legais e que sejam aplicáveis (n.r.14: Como é o caso do Bilhete de Identidade Militar, artigo 112.º, do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo Decreto-Lei 236/99, de 25 de junho, que substitui para todos os efeitos legais o BI em território nacional). IV – O artigo 137.º, n.º 1, al. a), do CRC, determina que a declaração inicial para casamento deve ser instruída com os documentos de identificação dos nubentes de nacionalidade portuguesa. Anteriormente aquele artigo impunha que a declaração inicial fosse instruída com os bilhetes de identidade dos nubentes portugueses. A atual redação foi introduzida pelo Decreto-Lei 324/2007, de 28 de setembro. Diploma que é contemporâneo da Lei 7/2007, de 5 de fevereiro, que cria o cartão de cidadão. Pelo que, aquela alteração tem de ser vista neste contexto, como aliás a própria consulente refere. Quer isto dizer que, face à substituição do bilhete de identidade (BI) pelo cartão de cidadão (CC), não faria sentido manter a referência ao BI, mas, por outro lado, não podia ser substituída pela referência ao CC, pois ainda continuava, continua e prevê-se que irá continuar por alguns anos, a utilização do BI. Daí, concluímos que a opção do legislador pela expressão documentos de identificação foi feita para abranger quer o bilhete de identidade quer o cartão de cidadão, dependendo de qual documento os nubentes são titulares. V – Em conclusão e face ao atrás dito, parece-nos, salvo melhor opinião, que a exigência feita no artigo 137.º, n.º 1, al. a), do CRC, tem de ser interpretada no sentido que os nubentes de nacionalidade portuguesa, para a Av. D. João II, n.º1.08.01 D • Edifício H • Parque das Nações • Apartado 8295 • 1803-001 Lisboa Tel. + 351 21 798 55 00 • Fax. + 351 21 781 76 93 [email protected] • www.irn.mj.pt 3/8 instrução do processo preliminar de casamento, devem apresentar ou o seu bilhete de identidade ou o seu cartão de cidadão, consoante o documento de que sejam titulares. Não podendo desta forma ser apresentada carta de condução [ou] outro documento em substituição, exceto aqueles em relação aos quais existe lei em vigor que expressamente o determine. Face ao exposto parece ser de extrair as seguintes CONCLUSÕES: 1 – O artigo 137.º, n.º 1, al. a), do CRC, determina que a declaração inicial para casamento deve ser instruída com os documentos de identificação dos nubentes de nacionalidade portuguesa; 2 – Os referidos documentos são o bilhete de identidade ou o cartão de cidadão, consoante o documento de que sejam titulares, não podendo ser apresentada carta de condução ou outro documento, sem prejuízo de diploma legal que eventualmente permita o recurso a outro documento.”. Sobre esta Informação recaiu o Parecer da senhora coordenadora do setor técnico-jurídico opinando que “ainda que a questão se mostre formulada e abordada em termos mais redutores, parece-nos que a problemática em apreço deve ser equacionada na óptica quer da verificação da identidade no âmbito da organização do processo preliminar de casamento e respetiva celebração (artºs 137º e 154º do CRegCiv), quer na óptica da verificação da identidade aquando da prestação de declaração para atos de registo civil ou intervenção em processos de registo civil e procedimentos perante conservador. Por outro lado, tem-se conhecimento de que a prática dos serviços é díspar, julgando que, o âmbito de processos de natureza inspectiva, foi já defendida e sancionada a aplicação analógica do artº 48º do Código do Notariado. Acresce que no pº CC 72/2011 SJC-CT, ainda que se reconhecendo que o BI e o CC são os documentos de identificação por excelência para iniciar o processo de emissão do cartão de cidadão, se admitiu igualmente a virtualidade de o passaporte e a carta de condução poderem funcionar como meio de identificação para o referido fim. / Deste modo, colocamos à consideração superior a remessa do presente processo a Conselho Consultivo”, o que mereceu a concordância do Senhor Presidente do IRN, I.P. E, sem mais, o processo foi distribuído a este Conselho para emissão de parecer ou deliberação. Importa, pois, que nos pronunciemos. IMP.IRN.Z00.07 • Revisão: 01 • Data: 22-01-2014 Muito embora a Informação prestada pelo setor técnico-jurídico responda integralmente em nosso entender à questão apresentada pela consulente, há que incluir na presente consulta a problemática aditada pela senhora coordenadora que, salvo o devido respeito, se integra em matéria de verificação de identidade e não propriamente na da documentação exigida por lei para a instauração de processo preliminar de casamento. Neste último caso, é nossa opinião resultar sem margem para dúvidas das disposições conjugadas do artigo 137.º n.º 1 alínea a) do Código do Registo Civil (CRC) e dos artigos 3.º nº 1 e 55.º nº 1 da Lei n.º 7/2007, de 5 de fevereiro (que cria o cartão de cidadão e rege a sua emissão e utilização) que os únicos documentos que revestem a natureza de documento de identificação stricto sensu são o cartão de cidadão (CC) ou o bilhete de identidade (BI), se este ainda estiver em vigor. Na verdade, impondo a lei atualmente vigente a obrigatoriedade do cartão de cidadão para todos os cidadãos nacionais, residentes em Portugal ou no estrangeiro, a partir dos 6 anos de idade ou logo que a sua apresentação seja exigida para o relacionamento com algum serviço público e atribuindo ao bilhete de Av. D. João II, n.º1.08.01 D • Edifício H • Parque das Nações • Apartado 8295 • 1803-001 Lisboa Tel. + 351 21 798 55 00 • Fax. + 351 21 781 76 93 [email protected] • www.irn.mj.pt 4/8 identidade a mesma eficácia enquanto o respetivo portador não for titular de cartão de cidadão, necessariamente essa obrigatoriedade é vinculativa no processo preliminar de casamento e, por conseguinte, nenhum outro documento – a não ser o CC ou o BI – é susceptível de o substituir aquando da instauração desse processo. Como já referia Robalo Pombo, em anotação ao artigo 167º do Código do Registo Civil Anotado e Comentado, edição de 1991, Almedina Coimbra, pág. 564, os bilhetes de identidade exigidos no âmbito do processo de casamento têm a natureza de “documento de instrução”, ou seja, a sua finalidade não é apenas a identificação dos nubentes. Também Álvaro Sampaio, em anotação ao artigo 136º do seu Código do Registo Civil Anotado e Comentado, 2011, 4ª Edição, Almedina, pág. 222, afirma perentoriamente que “Na alínea i) [do nº 2] foi usada a expressão “documentos de identificação” para abranger quer os Bilhetes de Identidade, quer os Cartões de Cidadão, uma vez que ainda circulam uns e outros. Isto para os cidadãos portugueses”. A que acrescenta, nas páginas 224 e 225 da mesma obra: “Reforçamos a posição defendida indicando os art.s 3º, nº 1 e 55º, nº 1 da Lei nº 7/2007, de 5 de Fevereiro […]./ O primeiro impõe como obrigatória a obtenção do Cartão de Cidadão para todos os cidadãos portugueses a partir dos 6 anos de idade ou logo que a sua apresentação seja exigida para o relacionamento com algum serviço público./ O segundo permite que os bilhetes de identidade válidos possam continuar a ser usados enquanto não tiver sido entregue cartão de cidadão aos respectivos titulares. / Portanto, não é admitida a carta de condução, cartão profissional ou qualquer outro, salvo para militares, incluindo os da G.N.R., uma vez que, nos termos da legislação própria, o seu cartão de identidade militar substitui os emitidos pelos serviços de identificação civil.”. E ainda que no processo C.C. 72/2011 SJC-CT tenha sido entendido serem o passaporte e a carta de condução documentos idóneos como meios de identificação, por se tratarem de documentos emitidos por autoridade pública contendo a fotografia/imagem facial, assinatura e os elementos de identificação essenciais do titular, maxime o seu nome completo, daí apenas decorre que tais documentos são considerados meios idóneos para verificação da identidade do requisitante de cartão de cidadão mas a que a lei não atribui a qualificação indispensável para instruir o processo preliminar de casamento. IMP.IRN.Z00.07 • Revisão: 01 • Data: 22-01-2014 Com efeito, a exigência legal de apresentação do CC ou BI para instruir o processo de casamento justifica-se por tais documentos conterem elementos, como a filiação, que, em caso de homonímia, são imprescindíveis para identificar completa e corretamente os nubentes e, consequentemente, os assentos de nascimento que lhes respeitam e que permitirão detetar a eventual existência de impedimentos matrimoniais resultantes da consanguinidade. Resta assim, para além de confirmar a solução apontada na Informação supra, apreciar e decidir a questão relativa à verificação da identidade dos interessados aquando da prestação de declaração para atos de registo civil ou intervenção em processos de registo civil e procedimentos perante conservador. E perante a obrigatoriedade de obtenção de cartão de cidadão imposta pelo citado artigo 3,º, n.º 1 da Lei nº 7/2007, poder-se-ia concluir que a identidade dos intervenientes teria de ser sempre verificada pela exibição desse documento ou do bilhete de identidade nos termos do também mencionado artigo 55.º, n.º 1 da mesma Lei. Av. D. João II, n.º1.08.01 D • Edifício H • Parque das Nações • Apartado 8295 • 1803-001 Lisboa Tel. + 351 21 798 55 00 • Fax. + 351 21 781 76 93 [email protected] • www.irn.mj.pt 5/8 Mas, se assim fosse, desnecessário seria o dito normativo do artigo 137.º n.º 1 alínea a) do CRC; e a exigência nele contida constaria, sim, no âmbito das disposições gerais deste diploma, o que não se verifica pelo que manifesta é a inaplicabilidade da exigência de apresentação de documento de identificação estando a identidade em causa assegurada por meio idóneo para tal fim. O que é corroborado v.g. pelo dispositivo do artigo 181.º alínea h) do CRC, segundo o qual o assento de casamento deve conter “A menção à forma como foi verificada a identidade dos nubentes ou o nome completo e residência das testemunhas”. Na verdade, é sabido que a lei exige a identificação o mais segura possível dos respetivos intervenientes. Nesse sentido, o artigo 45.º n.º 2 do CRC estabelece que “Nos assentos de qualquer espécie pode ser exigida a intervenção de duas testemunhas se ao conservador se suscitarem dúvidas fundadas acerca […] da identidade das partes” e o artigo 224.º, n.º 1 do CRC, inserido na secção I do capítulo II, relativa às disposições gerais dos processos privativos do registo civil, determina “No requerimento […], sendo a assinatura do interessado reconhecida nos termos legais”, reconhecimento esse que deve entender-se substituído pela menção dos elementos referenciadores do documento de identificação do requerente, manuscrita pelo signatário (cfr. artigo 31.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de abril). Mas não contendo o Código do Registo Civil, nem o Código do Processo Civil subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 231.º do CRC, qualquer norma relativa à verificação da identidade dos interessados, será de admitir, subscrevendo o parecer da senhora Coordenadora supra transcrito, a aplicação analógica do normativo do artigo 48.º do Código do Notariado sempre que os mesmos não sejam portadores de cartão de cidadão ou bilhete de identidade válido, embora relativamente aos nubentes estes tenham de protestar pela apresentação dos respetivos documentos de identificação sricto sensu (CC ou BI) (cfr. citado artigo 136º nº 1 alínea i)). IMP.IRN.Z00.07 • Revisão: 01 • Data: 22-01-2014 Não se confunda, pois, documento de identificação com meio de verificação da identidade. Para este efeito, a lei contenta-se inclusivamente com a abonação de duas pessoas idóneas que certifiquem tal identidade ou até a própria declaração da entidade perante quem o ato é lavrado se esta atestar ser o interessado do seu conhecimento pessoal. A identidade pode, pois, estar totalmente assegurada e faltar o documento de identificação. E sendo certo que, no caso do registo de nascimento o n.º 2 do artigo 102.º do CRC determina que devem ser exibidos, sempre que possível, os documentos de identificação dos pais, esta norma tem de ser entendida como facilitadora do assento de nascimento e da exatidão dos elementos a figurar no registo e não como desculpabilizadora da eventual inércia dos pais quanto aos respetivos documentos de identificação. Ou seja, a identidade do(s) declarante(s) do registo pode ser verificada por qualquer meio idóneo, mas não deve ser retardada a feitura do assento se não puderem ser exibidos os documentos de identificação dos progenitores por a isso se opor o interesse público inerente à feitura imediata do mesmo. * Posteriormente foi recebido para emissão de parecer ou deliberação por este Conselho o processo C.C.45/2014 STJ-CC sobre a questão da admissibilidade do protesto de apresentação de cartão de cidadão ou bilhete de Av. D. João II, n.º1.08.01 D • Edifício H • Parque das Nações • Apartado 8295 • 1803-001 Lisboa Tel. + 351 21 798 55 00 • Fax. + 351 21 781 76 93 [email protected] • www.irn.mj.pt 6/8 identidade aquando da instauração de processo preliminar de casamento não sendo um dos nubentes ou ambos portadores de documento de identificação válido, processo este que foi distribuído à mesma relatora com parecer desfavorável que se respalda em essência no seguinte argumento: Embora o artigo 136.º, n. 2 al. i) do CRC continue a referir que a declaração para casamento deve conter os elementos de referenciação dos documentos de identificação dos nubentes, quando exigíveis, ou o protesto pela sua apresentação, tendo a anterior redação do artigo 137.º, n.º 2 do mesmo Código - que previa a possibilidade de os documentos de identificação dos nubentes, entre outros documentos, poderem ser exibidos posteriormente à organização do processo de casamento, mas antes da celebração do casamento civil ou da emissão do certificado para casamento católico - sido eliminada pelas alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 324/2007, de 28 de setembro, desapareceu a previsão legal que permitia a exibição dos documentos de identificação em momento posterior à organização do processo de casamento. E conclui: “parece-nos que se tratará de mero erro, não havendo qualquer intenção de manter essa possibilidade.”. Não cremos, porém, que se trate de erro. Como refere Oliveira Ascensão in O direito – Introdução e Teoria Geral, 13ª Edição Refundida”, Almedina, “Desde que um propósito ou objectivo do legislador tenha ficado perceptível na lei, o intérprete não o pode ignorar” (pág. 401). “Directamente dedicada a este resultado final da interpretação encontra-se, no art. 9/3 do Código Civil, a presunção de que “o legislador consagrou as soluções mais acertadas”. A ratio legis será pois a resultante de todos os elementos, mas iluminada por uma pretensão de máxima racionalidade, que permitirá escolher entre possibilidades divergentes de interpretação” (pág. 416). Não embargante o respeito que nos merece a posição sustentada, certo é que não desapareceu a previsão legal que permitia a exibição dos documentos de identificação em momento posterior à instauração do processo preliminar de casamento. IMP.IRN.Z00.07 • Revisão: 01 • Data: 22-01-2014 Tendo o legislador mantido na nova redação do artigo 136.º, n. 2 al. i) do CRC introduzida pelo Decreto-Lei nº 324/2007, de 28 de setembro, a admissibilidade do protesto pela apresentação dos documentos de identificação dos nubentes, o que resulta da eliminação do anterior normativo do artigo 137º, nº 2 do CRC – que visava não só o momento em que teriam de ser apresentados os bilhetes de identidade dos nubentes mas também outros documentos – é que o processo ficará pendente a aguardar aquela apresentação, não prosseguindo a instrução dos autos, o que se justifica por atualmente já não haver a praticar qualquer ato processualmente útil, para além do que resultar da apresentação do cartão de cidadão ou bilhete de identidade em falta. E é indiscutível que à apresentação do CC ou BI no âmbito do processo preliminar de casamento é de aplicar subsidiariamente o Código do Processo Civil ex vi do artigo 231.º do CRC. E assim, e como já defendido no processo CC 155/2013 ST JSR, se “por negligência das partes [os processos] se encontrarem a aguardar impulso processual há mais de seis meses, tal determina a deserção da instância, nos termos do artigo 281.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e, em consequência, a extinção da instância (artigo 277.º, al. c) do mesmo diploma).”. Av. D. João II, n.º1.08.01 D • Edifício H • Parque das Nações • Apartado 8295 • 1803-001 Lisboa Tel. + 351 21 798 55 00 • Fax. + 351 21 781 76 93 [email protected] • www.irn.mj.pt 7/8 O prazo da deserção inicia-se com a declaração para casamento pois já então podia ter sido diligenciada a obtenção do documento de identificação. E é óbvio que a apresentação do recibo comprovativo do pedido de emissão de cartão de cidadão não interrompe o prazo de deserção pois só a exibição do respetivo cartão de cidadão em falta é idóneo para produzir o termo de tal prazo. Termos em que se formulam as seguintes CONCLUSÕES: 1. Os documentos de identificação dos nubentes exigidos para instrução do processo preliminar de casamento são o cartão de cidadão ou o bilhete de identidade, consoante o documento de identificação de que sejam titulares, não podendo ser apresentado outro documento (cfr. artigo 137.º n.º 1 alínea a) do Código do Registo Civil e artigos 3.º nº 1 e 55.º nº 1 da Lei n.º 7/2007, de 5 de fevereiro), salvo no caso de existência de normativo que lhe atribua o mesmo efeito legal. 2. Não sendo apresentado no momento da instauração do processo preliminar de casamento um desses documentos por qualquer dos nubentes ou ambos, poderão protestar pela sua apresentação, ficando o processo a aguardar a exibição do documento em falta. 3. A verificação da identidade dos intervenientes em atos e processos do registo civil e procedimentos perante o conservador pode ser feita por qualquer meio idóneo, maxime por uma das formas previstas no artigo 48.º do Código do Notariado, sem prejuízo da obrigatoriedade de instrução do processo preliminar de casamento nos termos da conclusão 1. Parecer aprovada em sessão do Conselho Consultivo de 18 de dezembro de 2014. Laura Maria Martins Vaz Ramires Vieira da Silva, relatora, Maria de Lurdes Barata Pires de Mendes Serrano, António José dos Santos Mendes. IMP.IRN.Z00.07 • Revisão: 01 • Data: 22-01-2014 Este parecer foi homologado em 18.12.2014 pelo Senhor Vice-Presidente do Conselho Diretivo, em substituição. Av. D. João II, n.º1.08.01 D • Edifício H • Parque das Nações • Apartado 8295 • 1803-001 Lisboa Tel. + 351 21 798 55 00 • Fax. + 351 21 781 76 93 [email protected] • www.irn.mj.pt 8/8