Sustentabilidade, o princípio da lógica e da coerência
M Dueñas
¸
}Na realidade, a palavra sustentável resgata o velho e
conhecido princípio da lógica e coerência para a preservação
da vida e do bom relacionamento do homem com o meio.~
Lino A. Lavorato
}Espera-se das
organizações o
novo fundamento
da lógica e coerência:
Falar o que faz,
e fazer o que fala.~
Marilena
SUSTENTA-
BILIDADE,
o princípio
da lógica
e coerência
a
palavra sustentabilidade ganhou tamanho espaço
nos discursos corporativos que corre risco de desgaste e banalização por excesso de uso e exposição.
Tudo é sustentável: a campanha, o produto, a feira, o congresso,
a comunicação etc. É imperativo ser percebido como sustentável
ou adepto da sustentabilidade.
Na realidade, a palavra resgata o velho e conhecido princípio
da lógica e coerência para a preservação da vida e do bom
relacionamento do homem com o meio. Só que desta vez
com um olhar mais profundo, agregando e reconhecendo a
importância dos pilares sociais e ambientais, além do econômico. Isto graças aos movimentos que ganharam força e
espaço nas últimas décadas criando expressões como desenvolvimento sustentável e responsabilidade social.
Pois bem, a palavra sustentabilidade
passou a representar as dimensões
sociais, ambientais e econômicas,
reconhecidas como pilares de sustentação para as atividades humanas
no planeta. Ou seja, para ser sustentável, a atividade, produto, ou ação
deve sempre levar em consideração
o bem-estar das pessoas e do lugar
onde essas pessoas vivem, e mais,
garantir avanços à sociedade como
um todo e não apenas aos seus
acionistas e colaboradores. Óbvio,
todos querem viver, e bem.
A sociedade muito mais bem informada e conectada começa a entender,
ainda que superficialmente, as interconexões do meio ambiente natural
com a economia, com a qualidade
de vida, e principalmente com o
desenvolvimento sustentável ou não.
E cada vez mais consciente de seu
poder de pressão e interferência acelera a adoção de práticas empresariais
transparentes e comprovadas.
Na grande aldeia global com mais
de 6 bilhões de habitantes, temos de
tomar decisões num universo muito
mais complexo, conscientes de que
as escolhas individuais interferem no
todo. O bater de asas de uma borboleta pode causar um tufão em outra
parte do mundo, conforme teorizou o
matemático Edward Lorenz, em 1963
com seu estudo “Efeito Borboleta”,
uma das bases da Teoria do Caos. î
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Sustentabilidade, o princípio da lógica e da coerência
Nosso futuro comum
Questionar o formato de vida em
sociedade e sua perspectiva de sustentabilidade faz parte da natural
evolução humana. É aí que começa,
na prática, a construção do nosso futuro comum. Todos querem sustentabilidade, mas como este conceito
é percebido pelos indivíduos?
Recentemente (1 a 4 de setembro) o
Instituto Mais realizou uma enquete
com mais de 1.000 visitantes de uma
feira sobre práticas de sustentabilidade
(FIBoPS – Feira Internacional para o
Intercâmbio das Boas Práticas Socioambientais), em São Paulo, para conhecer
a percepção e comportamento dessas
pessoas em relação à sustentabilidade.
A enquete continua na internet no link:
www.fibops.com.br/enquete/
O perfil do público em sua maioria
era atuante na área socioambiental,
jovem adulto (25-45 anos), nível
universitário e pós-graduação.
Os
O resultado chamou a atenção pelo fato
de que mais de 50% dos participantes
afirmaram que somente às vezes adotam
o critério da sustentabilidade na hora
da compra, e aproximadamente 10%
disseram que nunca adotam tal critério
na hora de consumir um produto ou serviço. Também, mais de 50% afirmaram
que o mercado brasileiro tem muita propaganda e poucos produtos com reais
atributos sustentáveis. Na visão do consumidor, muito se fala, pouco se prova,
e talvez por isto o descrédito e a falta de
motivação para um consumo norteado
pelos critérios da sustentabilidade. Um
alerta importante para os profissionais
de Marketing e empreendedores com
interesse no mercado verde.
A enquete apontou também que
mais de 60% dos pesquisados acreditam que a sustentabilidade não
é um fator isolado e sim coletivo e
que deve ser liderado por todos os
segmentos da sociedade. O cidadão
chama para si a responsabilidade.
Olhando rapidamente, concluímos
que as pessoas querem sustentabilidade e sentem-se responsáveis por
ela, mas têm receios dos discursos
das empresas. Fica claro que esperam
das organizações mais consistência
e evidências da sustentabilidade
informada. De novo, o fundamento
da lógica e coerência: Falar o que se
faz, e fazer o que se fala.
}É consenso que os resultados são
alcançados com adoção de práticas que
asseguram níveis de excelência nestes
três fundamentos e que consolidam a
imagem das empresas adotantes.~
3 Pilares da SUSTENTABILIDADE
ECONÔMICO
SOCIAL
AMBIENTAL
Martin Rotovnik
¸
Marilena Lino
A Sustentabilidade
é construída com
boas práticas
A nova configuração global entende
como sustentabilidade, a excelência nos
pilares econômico, social e ambiental.
Também é consenso que os resultados
são alcançados com a adoção de práticas que asseguram níveis de excelência
nesses três fundamentos e que consolidam a imagem das empresas adotantes.
Práticas que asseguram sustentabilidade
são reconhecidas como boas práticas.
Dentro da gestão corporativa, entendese por Boa Prática ferramentas gerenciais
de natureza não operacional que atendam aos fatores de enfoque, aplicação,
aprendizado e integração, sustentada
pela apresentação de resultados (FNQ
– Fundação Nacional da Qualidade).
Em outros contextos, uma boa prática é
uma atitude que resulta em algo positivo
para si e para a coletividade. Em ambos
os casos, uma boa prática é uma ideia
aplicada que deu certo e que, se adotada
por outra pessoa ou organização, sempre levando em conta as adaptações
necessárias para cada caso, proporcionará resultados semelhantes aos
seus adotantes.
Uma forma eficiente para identificar,
reconhecer e compartilhar boas práticas empresariais é uma ferramenta de
gestão chamada Benchmarking. Essa
ferramenta tem por premissa aprender
com os melhores, e como metodologia
reunir e compartilhar experiências bemsucedidas que promoveram melhorias e
avanços nos processos organizacionais.
Faz-se Benchmarking nas mais variadas
competências organizacionais, entre
as quais, a competência socioambiental, onde se selecionam práticas que
apresentaram benefícios reais ao meio
ambiente natural, à comunidade e à
empresa adotante, ou seja, resultados positivos nos três pilares da sustentabilidade.
A contribuição Benchmarking para a Gestão
da Sustentabilidade
O Benchmarking, ao promover a melhoria contínua, é por si só uma prática
de sustentabilidade. Mas, para entender
sua contribuição à gestão da sustentabilidade, vamos antes entender o que é e
como funciona.
Benchmarking em sua essência se
configura como das mais antigas ferramentas da gestão corporativa. O termo
Benchmarking surgiu em 1979 quando
a Xerox discutia sobre uma deficiência
que havia identificado em seus processos com relação a seus concorrentes.
Hoje, Benchmarking é reconhecido no
meio empresarial como um método
essencial para a melhoria contínua e
não necessariamente realizado com a
concorrência, mas com as instituições
reconhecidas como detentoras das
melhores práticas.
Segundo o Prof. Dr. Enrique de la Rica,
Director de la Escuela Europea de
Estudios Universitarios y de Negocios
(ESEUNE www.eseune.edu Neguri,
Getxo- Bizkaia – España), processos de
melhoria contínua sem Benchmarking
conseguem em torno de 7% de melhoria. Já com a inclusão de Benchmarking,
conseguem encontrar fórmulas que
representam até 300% de melhoria.
A pesquisa Management Tools & Trends
2005, feita pela Bain & Company, apontou o Benchmarking como a terceira
ferramenta de gestão mais usada pelas
A. Lavorato
empresas. Qualquer organização, pública ou privada, com ou sem fins lucrativos, de qualquer setor ou porte, pode
utilizar Benchmarking para entender e
melhorar os seus processos.
Banco de Boas Práticas
com livre acesso
Se Benchmarking significa aprender
com os detentores das melhores práticas, surge o desafio de identificar estes
detentores. Em se tratando de práticas
ambientais ou socioambientais, o desafio é maior, pois as organizações em sua
grande maioria afirmam serem detentoras de boas práticas de sustentabilidade.
No Brasil temos o Programa Benchmarking Ambiental Brasileiro, criado
há 7 anos para selecionar as melhores
práticas socioambientais corporativas,
aquelas que proporcionaram benefícios reais ao meio ambiente natural e à
comunidade, além de competitividade
à organização adotante. Ou seja, uma
prática que interferiu positivamente nas
dimensões: social, ambiental e econômica. Esse Programa desenvolveu uma
forma estruturada e fundamentada
para identificar e compartilhar práticas
de sustentabilidade, beneficiando as
organizações e gestores que querem se
atualizar, e o consumidor/cidadão que
quer fazer escolhas conscientes.
Como resultado, o programa construiu
e detém o maior banco digital de boas
práticas socioambientais do país com
livre acesso na internet. São 171 cases,
divididos em 10 temáticas gerenciais:
Arranjos Produtivos, Educação, Informação e Comunicação Socioambiental,
Energia, Gases e Poluentes, Ferramentas e Políticas de Gestão, Manejo e
Reflorestamento, Pesquisas Científicas
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Sustentabilidade, o princípio da lógica e da coerência
Benchmarking Ambiental Brasileiro
O conhecimento socioambiental aplicado e compartilhado nas empresas e
instituições brasileiras contribuindo com a construção de sociedades sustentáveis.
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nados no período 2003 a 2006. O livro
BenchMais, as 85 melhores práticas em
gestão socioambiental do Brasil, tiragem
5 mil exemplares, foi distribuído gratuitamente nas universidades brasileiras e
portuguesas, além das entidades representativas nacionais.
il
s O Banco de Boas Práticas é uma
grande contribuição à gestão da
sustentabilidade, pois disponibiliza conhecimento aplicado a
especialistas e gestores.
e Novos Produtos, Proteção e Conservação, Recursos Hídricos e Efluentes,
Resíduos. Nesse período contou com
80 especialistas de 9 países na comissão
técnica, e mais de 100 organizações
que alimentam o Banco mediante os
critérios estabelecidos de participação.
O Banco de Boas Práticas é uma grande
contribuição à gestão da sustentabilidade na medida em que disponibiliza
conhecimento aplicado a especialistas
e gestores. Seu rico acervo está à disposição da micro e pequena empresa e dos
profissionais atuantes na área. É também
um canal de comunicação com grande
credibilidade pelo formato de seleção e
transparência das informações. O consumidor tem acesso ao modus operandi
e indicadores de sustentabilidade de
determinada organização, quer seja ela
de capital aberto ou não.
O Banco de Boas Práticas é fonte de pesquisa para especialistas, pesquisadores,
estudantes e mídia especializada.
Em 2007, o programa Benchmarking
lançou a versão impressa do Banco de
Boas Práticas reunindo cases selecio-
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Transparência
e coerência para
ser legítimo
O tema sustentabilidade exerce fascínio e
encanto nas pessoas e empresas, porém
entre o discurso e a prática há muito o que
fazer, tanto do lado da empresa quanto do
lado do indivíduo.A falta de conhecimento
especializado, somado à falta da visão de
médio e longo prazos são fatores determinantes para ações que nem sempre são
sustentáveis ao longo do tempo.
Um olhar mais atento permite concluir
que poucas ações (das muitas que são
amplamente divulgadas), podem ser
consideradas de fato uma “boa prática
de sustentabilidade”, comprovando
resultados efetivos de melhoria ao meio
ambiente natural e à comunidade, além,
é claro, de ganhos para a organização.
É dentro desse contexto que atua o Programa Benchmarking, sendo catalizador
das boas práticas de sustentabilidade, e
ao mesmo tempo difusor dessa tendência no mercado. Isto dentro de critérios
e fundamentos que assegurem estarmos
de fato diante do que seja uma boa prática de sustentabilidade. O Banco de Boas
Práticas em 7 edições selecionou, em
média, 25 práticas ao ano. Volume pequeno se comparado com o número de
vezes em que a palavra sustentabilidade
apareceu na propaganda, eventos e
informes publicitários das organizações.
A megaexposição dos que se dizem
2010
sustentáveis não está compatível com
as evidências das práticas selecionadas
pelo Programa Benchmarking. Mas é
correto dizer que existe um percentual
que comprova com consistência seu
discurso, tornando legítimo o seu uso.
Na medida em que se conhecem as
práticas e atributos de sustentabilidade
de uma organização, em um canal
com seriedade e imparcialidade, que
é o caso do Banco de Boas Práticas, as
desconfianças tendem a desaparecer e
um ambiente harmonioso e amistoso
aparecer. Essa ação impulsiona adesões
de outras organizações e cria um círculo
virtuoso que beneficia consumidores
e empresas com práticas e discursos
consistentes, fortalecendo vínculos com
seus públicos de interesse.
A sustentabilidade em sua essência é
o desejo de consumo da humanidade,
não resta dúvida. O que se renova
constantemente é o entendimento e interpretação do indivíduo e da sociedade
em relação ao seu significado e a sua
importância. O princípio da lógica e
a coerência do discurso, a prática é,
portanto, vital. Empresas e gestores
devem se lembrar disto quando o
assunto for sustentabilidade.
E isto o filósofo e pai da administração
Peter Drucker já sabia quando afirmou:
“As organizações são concessões
da sociedade, por isso, devem a ela
ESPM
satisfação de seus atos”.
MARILENA LINO
A. LAVORATO
Publicitária com especialização em Marketing, Negócios e Gestão Ambiental. Diretora
do Instituto Mais, Co-Editora do Livro BenchMais e Editora da Revista Benchmarking.
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