UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
ANA LÚCIA RIBAS
DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL: UM ESTUDO DE CASO DO DISCURSO DA EMPRESA
AUTO POSTO RODEIO
CAXIAS DO SUL
2015
ANA LÚCIA RIBAS
DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL: UM ESTUDO DE CASO DO DISCURSO DA EMPRESA
AUTO POSTO RODEIO
Monografia de Conclusão de Curso,
apresentada como requisito para obtenção do
grau de Bacharel em Relações Públicas, do
curso de Comunicação Social, da Universidade
de Caxias do Sul.
Orientadora: Prof.ª Dr ª. Marlene Branca Sólio
Caxias do Sul
2015
ANA LÚCIA RIBAS
DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL: UM ESTUDO DE CASO DO DISCURSO DA EMPRESA
AUTO POSTO RODEIO
Monografia de Conclusão de Curso,
apresentada como requisito para obtenção do
grau de Bacharel em Relações Públicas, do
curso de Comunicação Social, da Universidade
de Caxias do Sul.
Aprovada em ___de_________de 2015.
Banca Examinadora
__________________________________
Prof.ª Dra. Marlene Branca Sólio
Universidade de Caxias do Sul
__________________________________
Prof.ª Dra. Maria Luiza Cardinale Baptista
Universidade de Caxias do Sul
__________________________________
Prof.ª Me. Silvana Padilha Flores
Universidade de Caxias do Sul
Dedico este trabalho a minha mãe, por sempre
ter acreditado e confiado em mim, bem como
por ter incentivado minhas escolhas. Aos
trabalhadores que lutam por seus direitos e se
reconhecem como cidadãos. Aos profissionais
de Relações Públicas que têm consciência da
sua responsabilidade em atuar no mercado
com transparência e coerência, sabendo de sua
importância como agente de transformação
social.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente, a Deus, por ter me mantido firme, não permitindo que eu
desanimasse no desenrolar de um semestre de várias mudanças.
A minha amada mãe Marli e minha tia Marlene, pela correria e pelo empenho que
tiveram para que eu pudesse iniciar um curso de graduação. Pelas tantas palavras de incentivo
e apoio, que mesmo longe e em momentos difíceis sempre aqueceram meu coração, me
encorajando a seguir em frente.
A minha orientadora Branca, por confiar em minha proposta de trabalho e me trazer
para o foco da pesquisa, mostrando-me o que realmente seria viável e no que era aconselhável
focar – mesmo quando meus passos queriam me levar para outra direção – e por compartilhar
comigo todo seu conhecimento como pesquisadora com humildade.
Aos amigos e futuros vizinhos da Coohabitar, por compreenderem minha ausência em
algumas reuniões, nestes momentos decisivos para a cooperativa.
A minha irmã, Luísa, e aos amigos Camila, Charlene e Márcio, que contribuíram na
execução de algumas tarefas essenciais deste estudo.
Ao meu namorado Vinícius, um agradecimento especial por também ter colaborado na
execução de tarefas, por ter acompanhado algumas noites em claro a caminhada que me fez
chegar até aqui, por ter paciência e ter superado meus altos e baixos, me incentivando sempre.
A minha família, que nunca deixou de enviar energias positivas e acreditar no meu
potencial.
Agradeço também, à amiga e irmã Caroline, por estar sempre a meu lado, me dando
força ao longo desses 18 anos de amizade.
Aos amigos de Carazinho, Passo Fundo e Itajaí que, mesmo distantes, torceram para
que eu concluísse essa etapa, colocando-se à disposição para o que eu precisasse, assim como
aos de Caxias do Sul, pelas vibrações enviadas, com palavras de estímulo para que eu
desenvolvesse essa pesquisa.
“É difícil fazer com que uma
pessoa compreenda determinada
coisa quando seu salário depende
do fato de ela não compreendêla.”
Upton Sinclair
RESUMO
O presente trabalho faz uma análise do discurso organizacional como estratégia nas relações
de poder. A comunicação organizacional é um recurso que deve estar comprometido com a
transformação social dos seus públicos. Sendo assim, o seu discurso também deve ser
empregado com esse propósito, já que a comunicação pode ser simbolicamente utilizada para
o uso do poder. Nesse contexto, a questão que norteia o trabalho é: o discurso funciona como
um instrumento para o estabelecimento de relações de poder em uma organização? No intuito
de encontrar a solução do problema, delineamos, como objetivo geral, analisar o discurso
organizacional como instrumento de controle e poder nas organizações. Para aprofundarmos o
estudo delineamos quatro objetivos específicos: estudar o discurso dos gestores na
comunicação interna, analisar até que ponto o discurso dos funcionários se relaciona com o
dos gestores, identificar o processo de comunicação organizacional exercido na empresa
escolhida para desenvolver o trabalho e investigar o papel do profissional de Relações
Públicas na construção de uma comunicação eficaz. As hipóteses levantadas para o estudo
foram: o discurso organizacional é utilizado como elemento estratégico de dominação por
meio da comunicação, os funcionários são influenciados pela comunicação interna, as
relações de poder nas organizações, na prática, continuam reproduzindo uma trajetória
descendente. Optamos por aplicar uma pesquisa qualitativa, a partir de um estudo de caso
simples, com a técnica metodológica da entrevista em profundidade e da análise do discurso.
Palavras-chaves: Organizações. Comunicação Organizacional. Discurso. Poder.
ABSTRACT
This paper analyzes the organizational discourse as a strategy in power relations. The
organizational communication is a resource that must be committed to social transformation
of its public. Thus, its speech should also be employed for this purpose, since communication
can be symbolically used to the use of power. In this context, the question that guides the
work is: does the speech functions as an instrument for the establishment of power relations in
an organization? In order to find the solution of the problem, we have outlined, as a general
objective, to analyze organizational discourse as an instrument of control and power in
organizations. To deepen the study, we have outlined four specific objectives: to study the
discourse of managers in internal communication, analyze the extent to which the discourse of
employees relates to the managers, identify the organizational communication process
exercised in the company chosen to develop the work and investigate the Professional role of
Public Relations in building effective communication. The hypotheses for the study were:
organizational discourse is used as a strategic element of domination through communication,
employees are influenced by internal communication, power relations in organizations, in
practice, continue playing a downward trend. We opted to apply qualitative research, from a
simple case study, with methodological technique of in-depth interview and discourse
analysis.
Keywords: Organizations. Organizational Communication. Speech. Power.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Aspectos formais e informais da Cultura Organizacional.......................................32
Figura 2 – As quatro etapas do processo de controle................................................................50
Figura 3 – A atividade administrativa passa através do gargalo da comunicação....................61
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – O Poder Contextual e o Poder Pessoal...................................................................42
Quadro 2 – Os Poderes..............................................................................................................45
Quadro 3 – As relações de poder como critérios para outras tipologias................................. 68
Quadro 4 – Quadro demonstrativo da conceituação lógica de público.....................................69
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................13
2 O MÉTODO.........................................................................................................................17
2.1 CIÊNCIA E PARADIGMA................................................................................................17
2.2 DEFINIÇÕES DE MÉTODO.............................................................................................18
2.3 MÉTODO ANALÍTICO E PESQUISA QUALITATIVA...................................................18
2.4 ESTUDO DE CASO...........................................................................................................19
2.5 ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE...........................................................................20
2.6 ANÁLISE DO DISCURSO................................................................................................22
3 ORGANIZAÇÕES E RELAÇÕES DE TRABALHO.....................................................24
3.1
CONCEITUANDO
ORGANIZAÇÕES,
EMPRESAS,
INSTITUIÇÃO
E
CORPORAÇÃO.......................................................................................................................24
3.2 CULTURA ORGANIZACIONAL.....................................................................................28
3.3 INTERDEPENDÊNCIA FUNCIONÁRIO E EMPRESA..................................................34
4 O PODER E O DISCURSO NAS ORGANIZAÇÕES.....................................................41
4.1 AS RELAÇÕES DE PODER..............................................................................................41
4.2 OUTRAS FACES DO PODER...........................................................................................47
4.3 O DISCURSO ORGANIZACIONAL................................................................................54
5 COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL.........................................................................59
5.1 O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO...............................................................................63
5.2 OS DIFERENTES PÚBLICOS..........................................................................................66
5.3 COMUNICAÇÃO E RESPONSABILIDADE SOCIAL...................................................71
5.4 RELAÇÕES PÚBLICAS: MISTIFICAÇÕES E CONTRADIÇÕES................................74
6 O TRABALHO DE CAMPO..............................................................................................77
6.1 ANÁLISE DO DISCURSO NAS ENTREVISTAS............................................................78
6.1.1 Comunicação interna e integração..............................................................................79
6.1.2 Relações de poder...........................................................................................................84
6.2 O DIAGNÓSTICO.............................................................................................................91
6.2.1 Poder................................................................................................................................91
6.2.2 Hierarquia.......................................................................................................................93
6.2.3 Comunicação..................................................................................................................93
6.2.4 Integração.......................................................................................................................94
6.2.5 Discurso...........................................................................................................................95
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................97
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................100
ANEXOS A – PROJETO DE PESQUISA..........................................................................106
13
1 INTRODUÇÃO
Observou-se a necessidade de discutir e analisar a comunicação interna nas empresas,
a partir da percepção empírica de que os recursos utilizados para compartilhar as informações
nem sempre são construídos em conjunto com funcionários e demais áreas que compõem a
organização. Além disso, é necessário citar o interesse da autora na busca de compreensão
dessas questões, mais especificamente, sobre os motivos que levam uma gestão a utilizar-se
da comunicação dominadora e controlada como recurso de poder nas relações
organizacionais. Nessa esfera, é importante abordar tais questões para tentar entender e
observar o discurso organizacional como estratégia nas relações de poder; como essas
situações impactam a vida profissional das pessoas.
Para delimitarmos o campo de pesquisa, a questão que norteia e define o percurso do
trabalho é: O discurso funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de
poder de uma organização?
O objetivo geral do trabalho é analisar o discurso organizacional como instrumento de
controle e poder nas organizações. Estudar o discurso dos gestores na comunicação interna;
analisar até que ponto o discurso dos funcionários se relaciona com o dos gestores; identificar
o processo de comunicação organizacional exercido na empresa escolhida para desenvolver o
trabalho; assim como, investigar o papel das Relações Públicas na construção de uma
comunicação eficaz, são objetivos específicos que estarão presentes ao longo do estudo.
As hipóteses que surgiram ao longo do trabalho são fruto das inquietações em buscar
uma solução que corrobore com o problema de pesquisa. Nesse caso três hipóteses são
levantadas: o discurso organizacional é utilizado como elemento estratégico de dominação
por meio da comunicação; os funcionários são influenciados pela comunicação interna; as
relações de poder nas organizações, na prática, continuam reproduzindo uma trajetória
descendente.
Observando as constantes transformações de um mercado cada vez mais competitivo,
em que as organizações ganham mais espaço e importância na vida profissional e pessoal,
percebe-se que as exigências aumentam na mesma proporção. Segundo Pagés,
O aparelho produtivo exige trabalhadores instruídos capazes de compreender os
princípios de sua ação e não apenas de cumprir tarefas rotineiras, capazes de
iniciativa, não só aceitando mas desejando as mudanças, aderindo voluntariamente a
seu trabalho e interessando-se por ele, capazes e desejosos de cooperar com os
14
outros, não apenas com os colegas permanentes, como nas antigas oficinas, mas de
adaptação rápida a equipes mutantes, e às forças tarefas provisórias. (1987, p. 35).
O aparelho produtivo do qual trata Pagés (1987), é carregado de significados,
intenções e interesses. Um dos elementos que está presente nessa conjuntura é utilizar
recursos que insiram o trabalhador na estrutura física e mental da empresa. Dessa forma, a
identificação do trabalhador com a organização gera maior concordância com as práticas
exercidas por ela e reduz resistências.
Ao passo que o funcionário se sente acolhido pela empresa, esta tem mais liberdade
para aplicar normas e institucionalizar condutas que ao rápido olhar parecem imperceptíveis,
mas estão constantemente presentes, e traduzindo relações de controle e poder no ambiente de
trabalho. Faria (1985, p.11) traz que “a dominação é um conceito-chave para a compreensão
do fenômeno organizacional e se refere a um estado de coisas no qual a vontade manifestada
do dominante se expressa como se os dominados a acatassem como sua”.
Nas organizações, o controle pode ser exercido de diferentes formas, sendo a mais
expressiva representada por meio do discurso implícito na própria fala, ou aquele de materiais
impressos e online utilizados pela empresa. No discurso oficial, é possível observar a presença
e o desempenho das relações de poder revelados por atitudes da empresa em relação as suas
perspectivas, métodos e objetivos.
Nesse contexto, podemos compreender a organização como um espaço de poder,
legitimado pelo processo comunicacional. A comunicação é um dos processos mais
importantes dentro de uma organização; uma transmissão incorreta ou parcial dos fatos que
são de importância para todos que nela trabalham pode atrapalhar, e muito, os resultados. Por
isso, a participação de todos é imprescindível para sua efetividade e o bom relacionamento ao
longo da história da empresa.
No entanto, alcançar este objetivo não é tarefa fácil, daí a importância de contar com o
apoio de um profissional de comunicação, que consiga construir uma ponte entre funcionários
e gestores dentro das organizações, desenvolvendo um trabalho em conjunto com as demais
áreas e mais, que esteja ciente dos direitos da empresa, mas também de seus deveres. Esse
profissional deve, ainda, estar atento a todas as mudanças ocorridas dentro e fora da empresa,
já que a comunicação tem uma responsabilidade social.
Ao mesmo tempo, não se trata de uma visão ingênua de que todo o responsável pela
Comunicação Organizacional seja um herói, mas de um ponto de vista que coloca esse
15
profissional como um agente de transformação social, ou seja: ele é responsável pela
comunicação dos “fatos e desejos” de uma empresa, tanto quanto o responsável pelo esforço
em aproximar os desejos e fatos dessa empresa das necessidades, aspirações e anseios da
sociedade onde ela está inserida e especialmente de seus trabalhadores.
É necessário reforçar que comunicação não é somente troca de informações,
principalmente quando aquilo que se transmite é suficientemente claro para o ouvinte,
havendo, então, um significado comum entre as pessoas envolvidas. Buscar uma
comunicação dialética1 com os empregados e os demais membros que participam da empresa
é uma maneira de tentar atender às expectativas desse organismo social.
Para podermos nos aprofundar na pesquisa em torno da questão norteadora e hipóteses
levantadas, cumprindo nosso objetivo, o método utilizado é o qualitativo, tendo como apoio a
pesquisa bibliográfica de teóricos reconhecidos e com conhecimento profundo nos assuntos.
As palavras-chaves: Organizações, Comunicação Organizacional, Discurso e Poder serão
embasadas nos capítulos da monografia com conceitos de autores que enriquecerão o estudo.
A técnica metodológica que será aplicada na pesquisa de campo será o estudo de caso, com
análise do discurso de entrevistas em profundidade.
Tendo como base as palavras-chaves, dividimos a pesquisa em 5 capítulos: a
Introdução; O Método; Organizações e Relações de Trabalho; O Poder e o Discurso nas
Organizações; Comunicação Organizacional e, por fim, O trabalho de campo.
No primeiro capítulo esclarecemos a relevância em explorar o tema para mais
esclarecimentos das práticas de comunicação organizacional. Já no segundo capítulo
apontamos o método e as técnicas metodológicas aplicadas, para desenvolvermos a pesquisa.
No capítulo seguinte: Organizações e Relações de Trabalho examinamos a relação de
dependência existente nesse contexto, onde contamos com apoio bibliográfico de Chiavenato
(1994 e 1999), Dejours (2000), Srour (2004). No quarto capítulo sobre o Poder e o discurso
nas Organizações nos detivemos a compreender qual o processo de empoderamento por meio
do discurso por meio de conceitos que exemplificam o estudo, tendo como base: Pêcheux
(1988 e 2002), Bourdieu (2001), Foucault (2006 e 2007).
1 As leis da Dialética inscrevem-se numa equação a três tempos: Tese (primeira fase) – Proposição positiva, em
que a contradição parece persistir em estudo latente, característica da situação de identidade; provisório
estado de equilíbrio entre elementos opostos. Antítese (ou contradição) – Primeira “negação” da tese, que por
sua vez é negada, para formação de algo “novo” com auxílio do “antigo” (do que persiste da fase anterior).
Síntese - “Negação” da tese e da antítese, num grau superior, positivo, que surge como consequência de uma
dupla “negação”, e provoca, por um salto, a mudança de quantidade em qualidade. (SUCUPIRA FILHO,
1991, p. 83. Grifos do autor).
16
No capítulo que segue, Comunicação Organizacional, buscamos identificar a
importância de possuir uma comunicação que esteja comprometida com a transformação do
cidadão; nesse caso para a fundamentação teórica citamos alguns autores que fundamentaram
a pesquisa, como: Peruzzo (1986 e 1998), Kunsch (2002), Guareschi (2005).
No último capítulo: Pesquisa de Campo, aplicamos a análise, para responder nosso
problema norteador. Além dos autores citados que fundamentam a pesquisa, também
utilizamos outros teóricos como apoio para investigar melhor a pesquisa aqui proposta.
Acreditamos que nossa pesquisa possa ser de grande relevância para acadêmicos do
curso de Comunicação Social e, principalmente, para os profissionais de Relações Públicas,
que, como agentes de transformação social, possam provocar mudanças eficazes na
comunicação interna, assim como gestar relacionamentos mais horizontais no ambiente de
trabalho. Uma vez que nosso trabalho pretende evidenciar as estratégias de poder
desenvolvidas dentro das organizações, esperamos que o mesmo possa auxiliar o profissional
nesse aspecto de identificação e diagnóstico da estrutura comunicacional das organizações.
17
2 O MÉTODO
Para podermos fazer um estudo mais aprofundado sobre o problema de pesquisa: O
discurso organizacional funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de
poder de uma organização? Compreendemos que é fundamental nos apropriarmos de alguns
conceitos que elucidarão o caminho que percorremos para alcançarmos nosso objetivo.
2.1 CIÊNCIA E PARADIGMA
Barros e Duarte (2005, p.15), entendem “a ciência empírica como um discurso
abstraído e construído a partir da complexidade do mundo fenomenal que envolve, a partir da
constituição de um objeto científico, uma ruptura com o mundo 'vivido'”.
Lakatos e Marconi definem ciência como:
etimologicamente, ciência significa conhecimento; soma de conhecimento prático
que servem para determinado fim; acumulação de conhecimentos sistemáticos;
corpo de conhecimento consistindo em percepções, experiências, fatos certos e
seguros, estudo de problemas solúveis, mediante método científico, conjunto de
conhecimentos racionais, certos e prováveis, que se referem a objetos de uma
mesma natureza; conjunto de proposições logicamente correlacionadas sobre o
comportamento de certos fenômenos que se deseja estudar; conjunto de atitude e de
atividades racionais dirigido ao sistemático conhecimento, com objetivo limitado,
capaz de ser submetido à verificação. (1988, p. 22).
Outra explicação, trazida por Chalmers (1993, p. 22), diz que “a ciência é baseada no
que podemos ver, ouvir, tocar, etc. Opiniões ou preferências pessoais e suposições
especulativas não têm lugar na ciência”. Percebemos, assim, que a ciência é uma ferramenta
que possibilita aprimorar, investigar e testar diferentes saberes, por diferentes teorias, métodos
e conhecimentos científicos.
Ao refletirmos sobre o conceito de ciência, precisamos passar pelo conceito de
paradigma. Kuhn (2003) explica que paradigma está relacionado aos elementos, conceitos e
teorias que se dão por meio de uma descoberta, e se revelam através dos materiais produzidos
por determinado grupo, podendo assim servirem de modelos e fomentar o desenvolvimento
de novas pesquisas. Para ele os paradigmas são realizações científicas.
Chalmers (1993, p. 124), diz que “o paradigma determina os padrões para o trabalho
legítimo dentro da ciência que governa”. Constatamos, de modo geral, que os paradigmas
18
estão lincados com padrões convencionais que cada qual adota mediante um grupo de
convívio, podendo sempre ser reformulados. Um conceito que nos auxiliará muito durante a
pesquisa de campo.
2.2 DEFINIÇÕES DE MÉTODO
Gil (1999, p. 26) define “método como caminho para se chegar a determinado fim”. O
autor expressa, ainda, que o método proporciona ao pesquisador os meios técnicos que
auxiliarão na pesquisa, determinando, também, o rumo que o trabalho deve ter, focalizando a
busca do problema que envolve o estudo.
Para Minayo (2004, p. 22), “a metodologia inclui as concepções teóricas de
abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a apreensão da realidade e também o
potencial criativo do pesquisador”.
Orlandi (1996, p. 15) caracteriza “a questão do método nos estudos da linguagem
fundamental”.
A metodologia utiliza recursos para o desenvolvimento de análise, justificativas e
embasamento de ideias no problema a ser estudado. Permite analisar os métodos que melhor
identificam e qualificam um estudo, para o bom desenvolvimento do trabalho. Assim, o
método nada mais é do que um roteiro que propicia chegar a uma resposta.
2.3 MÉTODO ANALÍTICO E PESQUISA QUALITATIVA
O método analítico, para Barros e Duarte (2005, p. 25), “estruturam a transformação
de um discurso em outro”. Segundo os autores, isso ocorre porque em um primeiro momento,
ao falar de determinado assunto, o sujeito expressa sua opinião baseada no senso comum ou
até mesmo nas próprias experiências, e depois de ter mais informações de determinado
conteúdo, baseado em uma análise mais criteriosa, é possível uma avaliação diferente do caso
em questão. Eles colocam, ainda, que os procedimentos analíticos podem ser aplicados em
diferentes formas, dependendo do interesse de cada pesquisador.
Definido o método analítico, nossa opção será pela pesquisa qualitativa.
A pesquisa qualitativa se difere da quantitativa. Enquanto a primeira preocupa-se com
interpretações subjetivas, a segunda tem o foco na objetividade por meio dos números. Com
19
relação à pesquisa qualitativa, Martinelli diz:
a metodologia qualitativa, pelo fato de trabalhar em profundidade, possibilita que se
compreenda a forma de vida das pessoas, não sendo apenas um inventário sobre a
vida de um grupo. As técnicas utilizadas permitem, entre outras coisas, o registro do
comportamento não verbal e o recebimento de informações não esperadas porque
não seguem necessariamente um roteiro fechado, percebendo como bem-vindos os
dados novos, não previstos anteriormente. (1999, p. 39).
Esse método de pesquisa permite fazer uma abordagem interpretativa do caso a ser
estudado, em que se busca compreender o que é dito e o não dito. A escolha da pesquisa
qualitativa justifica-se por se tratar de um estudo que “[…] lida com interpretações das
realidades sociais” (Bauer e Gaskel, 2002, p. 23). Oferece a possibilidade de uma pesquisa
subjetiva.
2.4 ESTUDO DE CASO
Realizaremos um Estudo de Caso simples, em uma rede de Postos de combustíveis em
Caxias do sul – Auto Posto Rodeio. A empresa possui sua matriz e cinco filiais na cidade; atua
há mais de 45 anos no mercado de combustíveis com uma equipe de 46 funcionários ao total.
Martins (2008) observa que a utilização do Estudo de Caso possibilita uma
investigação profunda e intensa na unidade social definida:
trata-se de uma investigação empírica que pesquisa fenômenos dentro de seu
contexto real (pesquisa naturalística), onde o pesquisador não tem controle sobre
eventos e variáveis, buscando apreender a totalidade de uma situação e,
criativamente, descrever, compreender e interpretar a complexidade de um caso
concreto. Mediante um mergulho profundo e exaustivo em um objeto delimitado –
problema da pesquisa – o Estudo de Caso possibilita a penetração da realidade social
não conseguida plenamente pela avaliação quantitativa. (2008, s.p.)2.
Para Yin,
o estudo de caso é uma inquirição empírica que investiga um fenômeno
contemporâneo dentro de um contexto da vida real, quando a fronteira entre o
fenômeno e o contexto não é claramente evidente e onde múltiplas fontes de
evidência são utilizadas. (2001, p. 32).
Já, Martinelli define: “o estudo de caso é, portanto, uma investigação empírico
2 Apresentação do Livro Estudo de Caso: uma estratégia de pesquisa (2008).
20
indutiva, na qual o caso é a unidade significativa do todo, a deter a possibilidade de
explicação da realidade concreta” (1999, p. 49).
Nogueira (1977), percebe o estudo de caso como uma técnica que procura fazer um
exame minucioso dos olhares com perspectivas diferentes do objeto que se deseja conhecer.
Gil, explica que “o estudo de caso é caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de
um ou de poucos objetos, de maneira a permitir o seu conhecimento amplo e detalhado”
(1999, p. 72).
O estudo de caso proporcionará fazer uma avaliação mais precisa de fatos que estão
presente cotidianamente na vida das pessoas que compõem o case de estudo, desmascarando
situações e condições sociais.
2.5 ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE
Pode-se definir entrevista como a técnica em que o investigador se apresenta frente ao
investigado e lhe formula perguntas, com o objetivo de obtenção de dados que interessem à
investigação. A entrevista é, portanto, uma forma de interação social. (GIL, 1999, p. 118).
Para a realização das entrevistas, Gaskel (2008), entende que um maior número de
entrevistas não é requisito para melhorar significativamente a qualidade, ou fazer uma análise
mais detalhada da pesquisa. Ele traz duas explicações para essa observação. Inicialmente
porque há uma quantidade restrita de versões da realidade, a interpretação das experiências
são resultados de sistemas sociais, não são criadas somente das mentes individuais. Nesse
contexto, representações relevantes em comum ou de um grupo de pessoas em um ambiente
social são partilhadas. Sendo assim, tópicos comuns começam a evidenciar-se, o que faz
crescer a confiança da compreensão do fenômeno, então o pesquisador dá-se conta de que
possivelmente não surgirá nenhuma novidade ou surpresa das falas. O segundo ponto se
refere ao tamanho do corpus a ser observado: “a transcrição de uma entrevista pode ter até 15
páginas” (GASKEL, 2008, p. 71).
O autor observa que o entrevistador precisa viver as entrevistas, ter a capacidade de
lembrar as expressões faciais, físicas e emocionais do entrevistado, o espaço que se deram as
entrevistas, etc, já que corre-se o risco de perder observações importantes para a pesquisa. Por
essas razões o autor diz que há um limite máximo ao número de entrevistas que serão feitas e
possíveis para analisar, então, “para cada pesquisador, este limite é algo entre 15 e 25
21
entrevistas individuais” (2008, p. 71).
Optamos, então, em realizar as entrevistas com 16 pessoas, um bom número para a
verificação na análise; as mesmas foram gravadas para o registro integral das respostas. A
técnica utilizada para a escolha dos entrevistados foi por meio de um sorteio entre os
funcionários da empresa; assim, evitamos que haja alguma intervenção tendenciosa do
entrevistador. O critério dos que serão entrevistados é variado entre a matriz e as cinco filiais;
mulheres, homens, mais velhos, mais jovens, chefia, sem poder algum, de diferentes filiais,
com bom tempo de casa e contratados há pouco tempo. Conforme Barros e Duarte (2005) é
importante observar as diferentes visões sobre o mesmo assunto quando não há uma
linearidade do cargo dos funcionários ou seleção dos recém-chegados com os com mais
tempo de casa na organização.
A entrevista em profundidade segundo Barros e Duarte (2005, p. 62), “é um recurso
metodológico que busca, com base em teorias e pressupostos definidos pelo investigador,
recolher respostas a partir da experiência subjetiva de uma fonte, selecionada por deter
informações que se deseja conhecer”. Essa técnica nos auxiliou a realizar uma investigação
mais detalhada do problema proposto, a partir das vivências de cada entrevistado. Dentre os
tipos de entrevistas, elegemos a semiaberta para executarmos na pesquisa:
uma entrevista semiaberta geralmente tem algo entre quatro e sete questões, tratadas
individualmente como perguntas abertas. O pesquisador faz a primeira pergunta e
explora ao máximo cada resposta até esgotar a questão. Somente então passa para a
segunda pergunta. Cada questão é aprofundada a partir da resposta do entrevistado,
como um funil, no qual, perguntas gerais vão dando origem a específica. (BARROS
e DUARTE 2005, p. 66).
Esse perfil de entrevista nos oferece um exame mais detalhado e profundo das
respostas para a investigação. Como esboço do questionário aplicado, programamos as
seguintes:
a) Como funciona a comunicação dos chefes com os funcionários? Há uma estrutura
de hierarquia na comunicação?
b) As escalas de trabalho dos finais de semana são construídas em conjunto com os
funcionários?
c) Quanto à liberação para consultas, exames, etc, como é feita essa comunicação aos
gestores? É realizada com antecedência, interfere na escala de trabalho?
d) Como é gerenciada a comunicação entre as filiais?
22
e) Como é a relação entre as pessoas do escritório e os da pista?
f) Os trabalhadores sabem que mesmo não estando no papel existe uma hierarquia de
poder de decisão na empresa? Como funciona?
g) Os funcionários têm liberdade para mudar sistemas e rotinas e para sugerir coisas
novas?
h) A empresa é mais formal ou informal para suas normas e regras?
i) Existe uma rotatividade na empresa? Por quê?
Lembramos que as perguntas poderão ser mais exploratórias conforme possibilita a
técnica das entrevistas semiabertas.
2.6 ANÁLISE DE DISCURSO
Além disso, aplicamos a Análise de Discurso para aprofundar a pesquisa. A definição
pela Análise de Discurso especificamente da Escola Francesa (Pêcheux, 1988).
O autor (1988) analisa o discurso a partir de quem o emite. Quanto mais poder o
emissor possui, mais força o discurso ganha:
[…] O sentido de uma palavra, de uma expressão, de uma preposição, etc., não
existe em si mesmo, isto é, em sua relação transparente com a literalidade do
significante, mas ao contrário é determinada pelas posições ideológicas que estão em
jogo no processo sócio-histórico no qual as palavras, expressões e preposições são
produzidas […]. Poderíamos resumir esta tese dizendo: as palavras, expressões,
preposições, etc., mudam de sentido segundo as posições sustentadas por aqueles que
as empregam, o que quer dizer que elas adquirem sentido em referência a essas
posições, isto é, em referência às formações ideológicas […] nas quais essas
posições se inscrevem. (PÊCHEUX, 1988, p. 160).
Barros e Duarte significam o discurso como:
a apropriação da linguagem (código, formal, abstrato e impessoal) por um emissor, o
que confere a este um papel ativo, que o constitui em sujeito da ação. Aquele que
classifica, ordena e organiza, enfim, significa o mundo mostrado; persuade,
convence o locutor da pertinência de seu modo de classificar, ordenar e organizar o
mundo mostrado; e constrói uma voz, um modo de falar, um entendimento do
mundo. (2005, p. 305).
Nessa mesma linha de raciocínio, Orlandi (1996, p. 17), coloca que “o discurso é um
objeto histórico-social, cuja especificidade está em sua materialidade, que é linguística”;
como diz Orlandi, a linguagem é uma intervenção, uma manifestação do homem com sua
23
realidade social e natural. Nessa relação o autor (1996) constata que “o estudo da linguagem
não pode estar apartado da sociedade que produz”.
Tais definições nos fazem entender a importância da fala, da linguagem na
comunicação, pois as palavras não possuem somente o significa etimológico em si, mas
também caracterizam, identificam cada indivíduo, por carregar as ideologias3 e histórias
particulares.
O método e as técnicas explicadas, foram o guia para a caminhada, com o objetivo de
chegar o mais próximo possível da resposta para o problema da pesquisa. Na medida em que
nos apropriamos e dominamos as técnicas metodológicas de pesquisa, mais nos aproximamos
da solução do problema da pesquisa.
3 […] a ideologia é um ideário histórico, social e político que oculta a realidade, e que esse ocultamento é uma
forma de assegurar e manter a exploração econômica, a desigualdade social e a dominação política. (CHAUÍ,
2001, p. 7).
24
3 ORGANIZAÇÕES E RELAÇÕES DE TRABALHO
3.1 CONCEITUANDO ORGANIZAÇÃO, EMPRESA, INSTITUIÇÃO E CORPORAÇÃO
Acreditamos que seja necessário diferenciar os conceitos de organização, empresa,
instituição e corporação para não fazer uso incorreto dos termos durante o desenvolvimento
do trabalho, Srour diz que:
as organizações podem ser definidas como coletividades especializadas na produção
de um determinado bem ou serviço. Elas combinam agentes sociais e recursos e se
convertem em instrumentos da “economia de esforço”. Potenciam a força numérica e
tornam-se o terreno preferencial em que ações cooperativas se dão de forma
coordenada. (2004, p. 107).
O autor salienta que “as organizações são planejadas de forma deliberada para realizar
um determinado objetivo” (2004, p. 108). Suas atividades internas buscam reproduzir-se,
fazendo com que os objetivos pelos quais determinados objetos foram criados, destinem-se
para suprir finalidades que beneficiem a sua própria burocracia (SROUR, 2004).
Sólio acrescenta que,
o modo como elas se desempenham e atuam está intrinsecamente ligado a fatores da
política, da economia e da sociedade onde se inserem, atualizando-se ora como
causa, ora como consequência, ora como meio, ora como fim, em movimentação
permanente, que inclui a disputa interna de poder. (2010, p. 63).
Ao definir o que é uma organização, Chiavenato (1999, p. 8) explica que ela “é uma
entidade social4 composta de pessoas que trabalham juntas e deliberadamente estruturada em
uma divisão de trabalho para atingir um objetivo comum”.
Megginson (1986, p. 191), define organização como “um grupo de indivíduos com
uma meta comum, reunidos por um conjunto de relacionamentos de autoridade e
responsabilidade”. Ou seja, as organizações têm como objetivo, unir a força de trabalho
individual para alcançar um objetivo coletivo, em um ambiente hierárquico.
Kunsch (2002) faz uma abordagem mais abrangente da organização. Segundo a autora,
é preciso extrapolar a ideia de uma estrutura interna e imóvel; tem-se que analisar uma
4 Ao dizer que a organização é uma entidade social deliberadamente estruturada, queremos dizer que as tarefas
são divididas entre seus membros, e a responsabilidade pelo seu desempenho é atribuída a cada um dos
membros da organização. (CHIAVENATO, 1999, p. 8).
25
estrutura também a partir do contexto social, político, econômico, tecnológico, ecológico e
cultural em que ela está inserida. Fatores que podem afetar diretamente uma organização.
Já, Freitas “vê as organizações como lugar de representações e interação humana, e
não apenas como lugar de relações produtivas e racionais” (2002, p. 84).
Para conceituar organizações, Litterer esclarece que é necessário entender que ela
pode ser formal5 ou informal6, e que independentemente de sua finalidade, elas “são
constituídas por pessoas que têm uma série de atividade bastante estáveis e regulares, e interrelações de acordo com o que é determinado pela organização” (1970, p. 26).
O termo organizações definido por Pagés,
é um conjunto dinâmico de respostas e contradições. É realmente um sistema, mas
um sistema de mediações que só pode ser compreendido pela referência à mudança
das condições da população e das contradições entre os trabalhadores por um lado, a
empresa e o sistema social do outro. (1987, p. 31).
Diante de tais definições, entendemos que uma organização é composta por pessoas
que de modo geral têm um objetivo em comum: a construção de um produto ou serviço, para
consumo próprio ou não. Esses indivíduos possuem tarefas e responsabilidades deliberadas e
definidas pela organização, buscando um resultado. Acrescentamos, também, que é necessário
que ela esteja interligada com o ambiente e contexto social que a cerca, como fala Kunsch
(2002).
Ao compreendermos o que é uma organização, buscaremos explicar o que é uma
empresa. Drucker é enfático ao dizer que,
numa empresa, existe um resultado financeiro. Lucro e prejuízo por si sós não são
eficientes para julgar o desempenho, mas, pelo menos, são coisas concretas. Quer os
executivos da empresa gostem ou não, o lucro certamente será usado para medir seu
desempenho. (1997, p. 79).
O autor explica que o lucro é uma avaliação do desempenho, ou seja, uma
consequência do esforço do trabalho empregado para alcançar um objetivo dentro da empresa.
5 As organizações formais produzem algum objeto, como um automóvel, um serviço, tal como assistência
médica. Porque estão vinculadas a algum grau de planejamento consciente e seus propósitos e objetivos são
mais observáveis. O que produzem é em parte, consumido pela sociedade fora da organização em si.
(LITTERER, 1970, p. 25).
6 Organizações informais são aquelas que não produzem necessariamente um resultado visível imediato ao
mundo exterior. Por exemplo, um grupo de pessoas reúne-se costumeiramente a fim de tocar música de
câmara, para seu próprio prazer. A música, produto dessa organização, é desfrutada somente pelos próprios
membros do grupo. Isto é, a organização consome seu próprio produto. (LITTERER, 1970, p. 25).
26
Ele ainda reforça que “o lucro tem uma segunda função, […] É o prêmio pelo risco da
incerteza. A atividade econômica, porque é uma atividade, se volta para o futuro; a única coisa
certa sobre o futuro é a sua incerteza, os seus riscos” (1975, p. 77).
Chiavenato esclarece que a empresa pode ser compreendida como “um sistema aberto,
em constante intercâmbio com o meio ambiente externo que a envolve e do qual faz parte”
(1994, p. 70). Ele relata ainda que
cada empresa constitui uma criação particular, uma invenção específica, pois cada
empresa tem as suas próprias características, seus recursos, seus objetivos, etc. A
empresa é uma organização social que utiliza recursos a fim de atingir determinados
objetivos. (1989, p. 1).
Podemos acentuar que uma empresa objetiva o lucro como foco principal, pela
exploração de algum negócio. Ao longo do trabalho estudamos uma empresa do mercado de
combustíveis que visa ao lucro. De modo geral podemos notar que toda “empresa é uma
organização”, como citou Chiavenato, mas não podemos generalizar ao dizer que todas as
organizações são uma empresa, pois as organizações também podem ser como ONGs,
organizações não governamentais e sem fins lucrativos.
Buscaremos agora, assimilar o conceito de instituição. Srour menciona três aspectos
para o termo “instituição”,
que se aplicaria a organizações dotadas de certa estabilidade estrutural – a escola ou
o conjunto de escolas componentes da rede de ensino; ou àquelas unidades sociais
que adquiriram certo significado especial, valorizadas por si mesmas e por sua
responsabilidade social – a Igreja Católica, as Forças Armadas, a Universidade de
São Paulo; ou ainda, um complexo consagrado de normas, baseado em valores
arraigados e com longa duração no tempo. Ficando com esta última acepção, ele
define as instituições como “conjuntos de normas sociais, geralmente de caráter
jurídico, que gozam de reconhecimento social”. (1998, p. 108. Grifos do autor).
Nessa linha de raciocínio, com a última interpretação do autor, podemos observar que
as instituições estão muito ligadas à transmissão de valores, práticas de comportamento e
modelos que podem ser seguidos pela comunidade entorno dela. Pereira (1988, p. 10),
seguindo Selzinick, entende que “artefatos, papéis, ideologias e cerimônias, como cartão de
crédito, a família, a maternidade, a democracia, o capitalismo e o casamento são conceituados
como instituição”.
Além de complementar a concepção de Srour para instituição, Pereira explica que:
27
a instituição é um organismo vivo, produto de necessidades e pressões sociais,
valores pelos seus membros e pelo ambiente, portadora de identidade própria,
preocupada não somente com lucros ou resultados mas com a sua sobrevivência e
perenidade, e guiada por um claro sentido de missão. As pessoas constroem suas
vidas em torno delas, identificam-se com elas e tornam-se dependente delas. (1988,
p. 10).
Ao concordar com Pereira quando esse diz 'produto de necessidades e pressões
sociais', Oliveira (2001, p. 162), coloca que “nenhuma instituição surge sem que tenha surgido
antes uma necessidade”. Assim, ele conceitua: “instituição é o que está instituído, constituído,
sedimentado na sociedade. São modos de pensar, de sentir e de agir que a pessoa encontra
preestabelecidos e cuja mudança se faz lentamente como um meio para satisfazer as
necessidades da sociedade” (p. 162).
Podemos constatar que o que distingue uma instituição de uma organização ou
empresa é que as instituições são organismos que não focam somente na produção do
resultado final, ou no lucro em si; mas, como diz Pereira (1988), ela possui personalidade
própria, capacidade de se adaptar ao ambiente que está inserida, capaz de reformular ideias e
transferir valores às outras organizações.
Drucker frisa que “a instituição sem fins lucrativos não é paga por seu desempenho
[…] a instituição não consegue gerar mais que uma fração dos fundos de que necessita para
operar. Numa empresa, desempenho é aquilo pelo que o cliente está disposto a pagar” (1997,
p. 80. Grifo do autor).
No que se refere ao conceito de corporação Bakan (2007), relata que o termo constitui
um grupo de pessoas que juntam seus recursos financeiros para montar um negócio, tornandose proprietários e sócios de uma companhia, enquanto quem administra, não é
necessariamente dono do empreendimento. Acentua ainda que “o objetivo legalmente
definido de uma corporação é a defesa, impiedosa e sem exceções, de seus interesses, não
importando as consequências que causem aos outros” (2007, p. 2). Segundo o autor, a
corporação é uma busca patológica pelo poder, ela é perigosa por possuir grande influência
sobre as pessoas e a sociedade.
Bakan expressa que as corporações estão em ascensão nos últimos anos por estarem a
frente de tudo o que nos rodeia, sendo assim, nos encontramos cercados por sua cultura, cada
vez mais elas determinam o que comemos, a que assistimos, o que fazemos, justamente por se
mostrarem eficazes e superiores às fraquezas e ameaças do mercado, somando, assim, “sua
capacidade de combinar o capital, e portanto o poder econômico, de um ilimitado número de
28
pessoas” (2007, p. 9).
A nova norma é a responsabilidade social, que segundo o autor (2007) é uma forma de
reparar as atitudes cometidas nas corporações que agiam pela ambição, mas que ainda assim,
não mudaram sua essência, continuam valorizando seus interesses e desconsidera os valores
morais.
Assim, segundo o autor, constatamos que a corporação está intimamente ligada aos
benefícios particulares dos acionistas, que além de visarem ao lucro, como é o caso das
empresas, tornam-se mais perversas por pouco ou não se preocuparem com os valores éticos e
morais relacionados as suas ações e desconsiderarem a importância do ser humano para a
produção do seu negócio.
Com os conceitos esclarecidos e definidos, daremos andamento ao trabalho explicando
a cultura organizacional.
3.2 CULTURA ORGANIZACIONAL
Para compreendermos como se desenvolve a cultura dentro das organizações,
buscamos nos apropriar do conceito de cultura.
Segundo o pioneiro que definiu o termo cultura, Edward Taylor, o indivíduo está
sempre envolvido pela cultura, partilhando valores, experiências, crenças, ideologias,
conforme o ambiente em que vive, com grande capacidade de aprendizado, ou seja, ela não é
algo inato ou genético para o ser humano (apud LARAIA, 2004).
Srour concorda com Laraia no sentido de que a cultura não se origina de uma herança
biológica ou genética,
porém resulta de uma aprendizagem socialmente condicionada. É disso que se trata
quando falamos de socialização ou endoculturação: os agentes sociais adquirem os
códigos coletivos e os internalizam, tornam-se produtos do meio sociocultural em
que crescem; conformam-se aos padrões culturais, e, com isso, submetem-se a um
processo de integração ou de adaptação. (2004, p. 174).
Geertz, (1989), entende a cultura como uma teia de significados, tecida
individualmente e complementada por meio da associação de ideias amarradas coletivamente.
Possui, assim, uma visão interpretativa da cultura, em busca de significado, logo culturas
diferentes originam ações e interpretações diferentes. Seu conceito é fundamentalmente
semiótico. Para Santos,
29
cultura é uma dimensão do processo social, da vida de uma sociedade. Não diz
respeito apenas a um conjunto de práticas e concepções. […] Cultura não é algo
natural, não é uma decorrência de leis físicas ou biológicas. Ao contrário, a cultura é
um produto coletivo da vida humana. Isso se aplica não apenas à percepção da
cultura, mas também à sua relevância, à importância que passa a ter. Aplica-se ao
conteúdo de cada cultura particular, produto da história de cada sociedade. Cultura é
um território bem atual das lutas sociais por um destino melhor. (1983, p. 44-45).
O autor explica que se a compreensão do termo cultura faz com que pensemos na
diversidade de povos, sociedades, nações ou grupos, valores e crenças, suas formas e relações
é porque eles estão em constante interação, nos convidando a fazer uma reflexão sobre nossa
própria realidade social (SANTOS, 1983).
Assim, entendemos que não há como dizer que a cultura existe independentemente da
vida social. Ela é transformada e recriada conforme as relações de conflitos entre os sujeitos,
no contexto ideológico, econômico, político, histórico, pois, a cultura é um fenômeno cíclico,
que vai se construindo com a intervenção de cada indivíduo, por isso é mutável com o
decorrer dos anos. Pelo fato de cada um estar impregnado de cultura, por entender-se como
um ser social, é possível observar como a cultura pode influenciar a vida particular das
pessoas, suas vivências e formas de ver e acreditar no mundo, determinando assim sua
conduta (SANTOS, 1983).
Somamos a isso o conceito de Schein, o qual relata que em um grupo,
a cultura é um padrão de assuntos básicos compartilhados que um grupo aprendeu
como maneira de resolver seus problemas de adaptação externa e integração interna
e que funciona bem a ponto de ser considerado válido e desejável para ser
transmitido aos novos membros como a maneira correta de perceber, pensar e sentir
em relação àqueles problemas. (2009, p. 16).
Na medida em que assimilamos que a cultura pode influenciar, Santos entende que “as
próprias preocupações com cultura nasceram associadas às relações de poder” (1983, p. 80).
Nesse caso, a cultura também pode ser utilizada para controle de um grupo, já que os
indivíduos podem identificar-se ou serem provocados a pensar e agir dentro de determinados
padrões.
Ao passo que apreendemos o significado de cultura, vamos examinar como ela se
desenvolve no âmbito organizacional, assim faremos uma análise melhor da sua
aplicabilidade na empresa que vamos estudar.
Srour considera que
30
nas organizações a cultura impregna todas as práticas e constitui um conjunto
preciso de representações mentais, um conjunto muito definido de saberes. Forma
um sistema coerente de significações e funciona como um cimento que procura unir
todos os membros em torno dos mesmos objetivos e dos mesmos modos de agir.
(2004, p. 175).
Ao dizer que a cultura está presente em todas as atividades e íntegra “um conjunto de
representações mentais”, que estão enraizadas nas práticas cotidianas, ele expressa também
que os saberes vão sendo moldados pelas opiniões individuais partilhadas com o grupo. Em
um ambiente em que a mobília, as cores, a arquitetura, o movimento das pessoas, os materiais
utilizados, são carregados de sensações, interpretações tanto daqueles que já reconhecem o
espaço, como os novatos que ainda têm que decodificar e adaptar-se aos costumes praticados
naquele ambiente. Por isso, “as representações imaginárias que uma organização cultiva
identificam quem é quem, demarcam praxes nem sempre explícitas, impõem precedentes e
formalidades compulsórias, regulam expectativas e pautas de comportamento” (2004, p. 168).
Para ele, a cultura organizacional tem vida própria, “exprime então a identidade da
organização. É construída ao longo do tempo e serve de chave para distinguir diferentes
coletividades” (SROUR, 2004, p. 174).
Na visão de Motta,
o comportamento das organizações varia culturalmente, […] a conduta de
executivos e trabalhadores baseiam-se em crenças, atitudes, valores e, em certa
medida, verdadeiros ciclos viciosos de comportamento são causados por crenças,
atitudes e valores. (1997, p. 25 e 26).
O universo de significações, no qual o ser humano está inserido, e que constantemente
decodifica palavras, manifestações, posturas das pessoas que o cercam, é processado
mentalmente recebendo sentidos. As interpretações feitas pelo indivíduo estão sempre
relacionadas a uma espécie de linguagem peculiar, concluindo que “cultura é linguagem, é
código” (1997, p. 27). A cultura indica, categoriza, interliga, coloca em ordem a estrutura de
significados, influencia nas relações, fazendo com que cada sujeito proteja seus interesses e
convicções dentro das organizações (MOTTA, 1997).
Já Freitas entende a cultura organizacional
primeiro como instrumento de poder, segundo, como instrumento de representações
imaginárias sócias que se constroem e reconstroem nas relações cotidianas dentro da
organização e que se expressam em termos de valores, normas, significados e
31
interpretações, visando um sentido de direção e unidade, tornando a organização
fonte de identidade e de reconhecimento para seus membros. (2002, p. 96).
A autora complementa que, por meio da cultura organizacional, é decidido e
comunicado o que é realmente importante e cabe aos membros saberem, o comportamento
padrão aceito, a maneira mais adequada de pensar e agir tanto no ambiente interno, quanto no
externo, simultaneamente, é através dos elementos culturais que as organizações mostram-se
em um lugar de excelência, tomadas de valores, em que estão sempre acima de toda e
qualquer eventualidade, capazes de se renovar constantemente. Nesse contexto, os discursos
das organizações acabam ganhando características humanas, virtuosas e perfeitas, em um
estágio em que os indivíduos se sentem acolhidos e reconhecidos por ela que os leva a
idealizá-la e enxergar nela o único lugar para realizar-se profissionalmente e como pessoa, e
isso é extremamente problemático, porque a realização profissional acaba sendo sinônimo de
autoestima, e identidade pessoal é o mesmo que identidade profissional (FREITAS, 2002).
Para Chiavenato, “cultura organizacional é o conjunto de hábitos e crenças,
estabelecidos através de normas, valores, atitudes e expectativas compartilhados por todos os
membros da organização. A cultura espelha a mentalidade que predomina em uma
organização” (1999, p. 172-173). Sendo assim, cultura é a forma que cada organização
aprendeu a laborar em seu ambiente, é esse misto de histórias, comportamentos, ideias que
quando unidas, demonstram a maneira particular do funcionamento e do trabalho
desenvolvido em uma organização (CHIAVENATO, 1999).
No entanto, a cultura mostra alguns aspectos formais mais perceptíveis e encobre
aspectos informais, que são mais difíceis de interpretar e fazer alterações. O autor compara
essa relação de formal (parte superior) e informal (parte inferior), com um iceberg apontando
características que se encaixam em cada um.
32
Figura 1 – Aspectos formais e informais da Cultura Organizacional
Fonte: CHIAVENATO, 1999, p. 173
O quadro demonstra como se dão as relações dentro de uma organização,
possibilitando observar como se configura a dinâmica de interesses.
A proposta de Fleury para cultura organizacional é concebida como “elementos
simbólicos, que em sua capacidade de ordenar, atribuir significações, construir a identidade
organizacional, tanto agem como elemento de comunicação e consenso, como ocultam e
instrumentalizam as relações de dominação” (1996, p. 22).
A autora também sugere uma metodologia para podermos descobrir a cultura de uma
empresa, ela apresenta seis tópicos importantes de observação:
1) Histórico das organizações: Ao resgatar o histórico da empresa, com olhar no
contexto social, político e econômico da época, entenderemos melhor suas práticas e
objetivos.
2) O processo de socialização de novos membros: O processo de integração do
indivíduo na empresa, é de extrema importância para que o mesmo replique as crenças e
normas de comportamento.
3) As Políticas de Recursos Humanos: Examinar as políticas empregadas no processo
de recrutamento, seleção e desenvolvimento falam muito sobre os padrões culturais aplicados,
33
quando mediados pelo capital e o trabalho. Auxiliando também na construção de identidade
organizacional.
4) O Processo de Comunicação: O mapeamento dos meios formais e informais, como
os jornais, informativos, reuniões, telefonemas, entre outros, são fatores essenciais no
processo de produção, transferência e cristalização do universo simbólico.
5) A Organização do Processo de Trabalho: Investigação da organização do método,
em seu contexto tecnológico e social, favorecem para perceber as categorias existentes na
relação de trabalho.
6) As Técnicas de Investigação: Refere-se as técnicas metodológicas que serão
aplicadas. Podem ser qualitativas ou quantitativas, conforme o desejo do pesquisador,
aplicando questionário, realizando entrevistas, no intuito de conseguir informações mais
precisas sobre a cultura organizacional. Essa metodologia nos auxiliará na análise da pesquisa
de campo a reconhecer a cultura estabelecida na empresa.
A cultura expõe a maneira de pensar e agir de uma organização, é sua identidade, o
posicionamento que ela possui perante os seus membros, fornecedores, clientes, concorrentes
e sociedade de modo geral. Sendo assim, ela se apresenta como um elemento de forte
influência, demarca relações de poder, além de estipular valores, crenças e condutas aceitáveis
dentro da organização, é ela que defini quais são os profissionais que melhor se encaixam
dentro dos padrões praticados para serem aceitos dentro da organização.
Diante da força representativa e simbólica que a cultura carrega, compreendemos que
a comunicação desenvolvida no âmbito organizacional deve estar comprometida em
demonstrar a cultura vigente praticada por ela. Acreditamos que a comunicação tem o papel
de evidenciar, e se preciso, modificar a cultura de uma organização, já que ela também ajuda a
construir a imagem7 dessa, o reconhecimento por seus pares, assim como a reputação, fatores
que perpassam a cultura. Pensamos também que ao mensurar a cultura de uma organização, é
necessário observar que tipo de comunicação está sendo praticada por ela e qual a influência
da cultura nesse processo.
Para nos aproximar mais do tema central da pesquisa, vamos explorar mais a cultura
7 A identidade de uma empresa é o resultado das percepções públicas, ou seja, como o público a enxerga por
meio de suas ações de comunicação. Assim, toda empresa tem uma identidade própria conferida por seus
públicos. O reflexo dessa identidade é a imagem da empresa. Já o reflexo da imagem ou o acúmulo da
imagem ao longo do tempo é o que constrói a reputação de uma empresa. Imagens positivas constroem
reputação positiva. (SILVA NETO, 2010, p. 5).
34
organizacional na relação de interdependência funcionário e empresa, assim vamos observar
como se constitui os instrumentos de poder, do qual fala Freitas, já que o comportamento é
moldado conforme os desejos e princípios da empresa.
3.3 INTERDEPENDÊNCIA FUNCIONÁRIO E EMPRESA
O ambiente organizacional é permeado por relações de trabalho, que Dejours entende
como “todos os laços humanos criados pela organização do trabalho: relações com a
hierarquia, com as chefias, com a supervisão, com os outros trabalhadores” (2000, p. 75). Um
local em que todos os interesses devem ser equilibrados para haver uma harmonia no modo de
se relacionar. Envolve relações de dependência financeira por parte dos empregados e a
necessidade da força de trabalho dos funcionários por parte da empresa.
Srour acredita que para garantir uma boa convivência coletiva, são necessário
mecanismos de adesão e integração, assim como de domínio e coibição, já que a inexistência
de normas compromete o relacionamento entre as pessoas:
por falta de uma disciplina mínima, nenhuma coletividade humana funciona. Além
de meios de subsistência para poder reproduzir-se, as coletividades necessitam de
padrões culturais (princípios, valores, crenças, normas morais) para que sejam
inculcadas convicções e para que as ações sociais tenham pautas comuns. (2004, p.
133).
Somente dessa forma, o autor considera possível interferir sobre a convivência social,
sobre a consciência simbólica8 e as aspirações políticas dos agentes. Para ele, “as
organizações navegam em mar tempestuoso e, mesmo sem sabê-lo, administram uma
complexa equação de interesses” (2004, p. 126).
Faria, diz que “a vida social é percebida pelos agentes como um conjunto de
comportamentos visíveis imediatamente, o qual é estritamente ordenado através de normas, de
regras, de regulamentos da estrutura organizacional, enfim, de um simbólico unívoco”. (1985,
p. 35).
O estabelecimento da confiança nas relações de trabalho, se dá, também, por meio da
comunicação dos gestores, que buscam familiarizar-se com as necessidades dos funcionários,
8 Por consciência simbólica, o autor considera todos os padrões culturais somados às representações mentais
empíricas que cada indivíduo possui, que assim constroem o modo de perceber e analisar o mundo que o
cerca. (SROUR, 2004).
35
o que acaba estimulando os bons resultados. Como reforça Hornstein,
a identificação organizacional influencia muito os resultados financeiros de uma
empresa […] o sucesso corporativo está diretamente relacionado à presença de uma
força de trabalho capaz de atestar que, “no nosso trabalho, nossa opinião é levada em
conta; os colegas estão comprometidos com qualidade; temos diariamente a
oportunidade de fazer melhor; e há uma ligação perceptível entre o que fazemos e a
missão da empresa”. (2003, p. 3).
Para o trabalhador, o seu serviço ganha mais valor quando reconhecida sua força de
trabalho por parte da empresa, impulsionando-o a produzir sempre mais, melhor, subir de
cargo e sentir-se de fato parte de algo que é essencial à vida das pessoas para sua subsistência
– o trabalho. Fazendo uma interpretação da visão de Pagés, é possível observar que o desejo
pelo reconhecimento atinge inclusive os valores individuais, “o sucesso, a ambição, fazer
carreira vão se tornar para o indivíduo os valores essenciais, pois são eles e só eles que podem
preencher esta angústia do vazio: para ser reconhecido é preciso vencer” (1987, p. 135)
Esse ponto que interfere na forma de pensar do indivíduo, pode tornar-se uma
problemática, na medida em que o funcionário acredita fielmente que o que importa é vencer
dentro da empresa, pois ele acaba criando uma estrutura mental de ganância e de
superioridade, capaz de agir de forma que valores morais fiquem em segundo plano. É
importante notar que para a organização adquirir credibilidade diante do olhar dos
funcionários é essencial que ela redobre sua atenção com relação à forma de administrar as
opiniões dos empregados para executar projetos. Hornstein diz que
a confiança dos trabalhadores nos líderes se deve menos às ações para a resolução de
problemas atuais ou à prevenção dos futuros e mais à visão que têm sobre a
consideração que os líderes demonstram para com suas opiniões e necessidades no
momento da tomada de decisões e sobre a discussão destas com a equipe. (2003, p.
85).
Assim, comprova-se que uma relação gestor-funcionários é mais produtiva quando há
uma percepção de que a voz dos funcionários está sendo ouvida por seu superior.
Hornstein (2003) ressalta que a carga de responsabilidade de um bom relacionamento
é a mesma tanto para o empregado quanto para o gestor, pois, ao mesmo tempo em que o
funcionário têm que cumprir horários e tarefas designadas a ele, os gestores devem também
manter pagamentos em dia e saberem ser bons receptores diante das reivindicações feitas,
buscando melhorias para a organização como um todo. O que é questionável é a maneira
como se desenvolvem os laços sociais no confronto de interesses.
36
É oportuno colocar que as organizações são envolvidas por relações de mediação. Para
Pagés,
o processo de mediação se coloca como a aliança das restrições (coerção) da
empresa e os privilégios oferecidos ao indivíduo. Os privilégios funcionam como
um terceiro termo que vem ocultar a contradição entre os objetivos da empresa, os
do sistema capitalista (o lucro e a dominação) e os objetivos dos trabalhadores.
(1987, p. 27).
Esse balanço entre restrições da empresa e privilégios oferecidos coloca os
trabalhadores em um sistema de produção moderno, com habilidade de criação, participação,
proporcionando aos mesmos uma sensação de satisfação ou desestabilização de ordem
financeira, governamental, regalias, bons salários, trabalho relevante, entre outros fatores,
combinando o contentamento e a retribuição dos indivíduos com a garantia de domínio por
parte da empresa, subordinando as forças de trabalho aos interesses da mesma; ou seja, “os
privilégios são oferecidos por ela, ao seu modo, segundo sua própria lógica. A empresa
reforça assim a dependência dos trabalhadores, destituindo-os do poder de organizar eles
próprios a produção em relação a ela” (PAGÉS, 1987, p. 28).
Na medida em que a cultura organizacional é apresentada e designada aos
funcionários, havendo uma identificação, reconhecimento e confiança de seus costumes e
valores por seus membros, é que ao longo dos anos o trabalho ganhou mais espaço e
importância na vida das pessoas. É possível perceber essa relação na medida em que ele tende
a ocupar outros ambientes, como a própria casa que, para muitos profissionais, passa a ser
uma extensão do local de trabalho. Para Dejours (2000), fora ou dentro da organização do
trabalho, o homem está condicionado ao modo de produção. É como se ele estivesse
contaminado, pois mantém a mesma forma de pensar e agir. Assim, “o ritmo do tempo fora do
trabalho não é somente uma contaminação, mas antes uma estratégia, destinada a manter
eficazmente a repressão dos comportamentos espontâneos que marcariam uma brecha no
condicionamento produtivo” (DEJOURS, 2000, p. 47).
Com relação à importância com que se trata o trabalho, Antunes diz que ele é:
um processo entre o homem e a natureza. Ele põe em movimento as forças naturais
pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriarse da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio
desse movimento, sobre a natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao
mesmo tempo sua própria natureza. (2004, p. 36).
37
Para Srour (2004), o trabalho é o alicerce e é essencial para as práticas coletivas da
vida humana, não sendo possível viver fora de vínculos sociais. É uma intervenção
desempenhada por um trabalhador, ou vários deles, que condiz com um processo de
transformação do mundo. Pois:
o trabalho é a chave da produção econômica. Sem ele, não há geração de valor e a
vida em sociedade se inviabiliza, porquanto os agentes sociais precisam produzir
seus próprios meios de subsistência, […] quaisquer bens da natureza dependem de
esforço humano para serem transformados em bens socialmente úteis. (2004, p.
132).
Enriquez contribui com essa importância e crença de que o ser humano concede ao
trabalho, “é através do trabalho que o indivíduo demonstra seu próprio poder sobre as coisas,
é pela invenção 'fabricadora' que ele torna possível a realização de seus desejos 'e até mesmo
ter desejos e sonhos'” (2007, p. 58).
Compreende-se, assim, que o trabalho tornou-se essencial na vida do ser humano,
porque o sujeito se sente útil e capaz de conquistar seus objetivos materiais ou não, por meio
dele, podendo, assim, transformar o meio em que ele vive. É desse recurso que vem seu
sustento; nele o indivíduo visualiza a importante para a evolução profissional; se sente
incluído em uma parcela da sociedade que produz bens ou serviços e assim colabora com o
crescimento da economia. Ainda segundo Dejours (2000), dessa forma, o indivíduo é aceito
entre seus pares, ou seja, além de contribuir com o sistema econômico, oportuniza o
relacionamento e a troca de experiências entre os indivíduos que fazem parte da organização.
Deixa de receber rótulos negativos, que abalam sua personalidade e imagem, mas, por outro
lado, sem perceber desenvolve outros constrangimentos que reprimem suas ações.
Tais embaraços que o funcionário sofre, Dejours chama de “ideologia da vergonha”
(2000, p. 32). Esta ideologia está relacionada à doença, e dela surgem dois aspectos; uma se
refere ao corpo: “o corpo só pode ser aceito no silêncio 'dos órgãos'; somente o corpo que
trabalha, o corpo produtivo do homem, o corpo trabalhador da mulher são aceitos”
(DEJOURS, 2000, p. 32-33). O outro aspecto relacionado à doença “diz respeito à relação
existente entre doença e trabalho – para o homem corresponde sempre à ideologia da
vergonha de parar de trabalhar” (DEJOURS, 2000, p. 33).
Ou seja, toda reação de fraqueza do corpo traz à mente a questão do trabalho ou do
emprego. Dejour percebe então que
38
o trabalho atravessa profundamente a vivência da doença: doença-avesso-dotrabalho, a tal ponto que a falta de trabalho torna-se, em si, um sinônimo de doença:
quando alguém diz para um cara que ele está muito velho para trabalhar ou que ele
não é capaz de continuar, é como se ele estivesse doente. (2000, p. 33).
A doença vinculada ao trabalho fortalece a ideologia da vergonha na vida do
trabalhador, na medida em que a doença é pensada como impedimento do trabalho e não na
doença enquanto uma casualidade que todo ser humano está vulnerável a adquirir
(DEJOURS, 2000).
Sólio (2010), acrescenta que se pensarmos nas relações de poder estabelecidas nas
organizações, a doença, o estresse, a exigência excessiva de produção do chefe, são sintomas
da insatisfação e frustração do sujeito, quando sua solicitação não é ouvida e sua vontade
reconhecida pela organização. Podemos unir a esses sintomas o medo, medo da demissão, em
que a autora contribui ao falar:
à medida que o sujeito vê a Organização como aquela que provê seu sustento,
também se sente ameaçado pela possibilidade de demissão e de ser explorado pelas
limitações que lhe são impostas, tanto de autonomia e criatividade quanto
econômicas (baixo salário). Pode instalar-se, então uma relação ambivalente, de
prazer e de dor, de identificação e de agressividade, de dependência e de rebeldia.
(2010, p. 131).
Nesse cenário complexo do relacionamento organizacional, a ponto de o funcionário
não conseguir dar-se conta da ressignificação que ele dá ao termo trabalho, quando agregado
às vivências individuais e aos costumes das empresas, podem desenvolver-se patologias que
ao simples olhar, na maioria das vezes não são relacionadas ao trabalho ou ao modo de
trabalhar. Ou seja, são mínimas as vezes em que o empregado nota que está sendo explorado.
Sólio explica que essa falta de percepção se deve ao fato de que
na medida em que os sujeitos são convocados a absorver práticas e valores culturais
da Organização onde estão inseridos, e na medida em que são submetidos a uma
rígida hierarquia, parecem recalcar sua visão de mundo e de realidade, o que acaba
por facilitar uma relação assimétrica (de dominação), que por sua vez abre caminho
para que a Organização assuma o papel de produtora de significação de valores.
(2010, p. 129).
Na relação de exploração a autora lembra, também, que na sociedade contemporânea o
consumo é encarado como elemento de satisfação e realização, em uma esfera em que a
Organização oportuniza o acesso a esse consumo, que fortalece ainda mais a “exploração do
sujeito, alienando-o daquilo que produz, cerceia-lhe a possibilidade do gozo e afasta-o da
39
gratificação” (2010, p. 136).
Fonseca exprime que a relação das organizações com seus funcionários, de uma parte
“valoriza-os/as, em termos de suas capacidades de empreendimento e criatividade, e, de outra,
não se mostra mais comprometida com seus recursos humanos, fornecendo-lhes garantia de
estabilidade, ascensão funcional e proteção” (2002, p. 17).
Faria, salienta que “o trabalhador alienou-se do processo de trabalho tornando-se uma
ferramenta humana de gerência, sob a potestade do capital; foi, ademais, levado à submissão e
lhe foi tirado a posse efetiva do processo de trabalho” (1985, p. 31). O autor enfatiza ainda
os valores, os ideais que ela propõe, na medida em que vão ser interiorizados, vão
servir de normas de comportamento aos indivíduos que não irão mais interrogar-se
sobre o sentido de sua ação. O sentido já está aí. Basta fazê-lo seu. A partir desse
momento os atos já não levam consigo sentimentos de incerteza. Tudo o que se
apoiar em um objetivo maior é justificado: a exploração justifica-se em nome do
lucro, a punição em nome da disciplina, etc. (1985, p. 39. Grifo do autor).
É no sentido de exploração que Srour expõe: “todo trabalho possui uma capacidade
ímpar: a de produzir mais do que seu agente consome para repor as energias. Vale dizer, todo
trabalho pode gerar excedentes econômicos” (2004, p. 133).
Segundo o autor, o funcionário gera mais valor e riqueza, do que a necessária para
restaurar a energia empregada. Assim, o excedente, no caso do autônomo fica para ele
mesmo, mas para os que são empregados de alguém, o excedente será usurpado pelo dono do
meio de produção, e como recompensa ele receberá uma remuneração pelo esforço e tempo
que dedicou.
Seguindo essa linha de pensamento, Faria, explica essa exploração pela mais valia 9,
baseando-se na análise de Marx, ao dizer que
quando o capitalista e o operário encontram-se no mercado de trabalho, este
oferece sua força de trabalho como mercadoria e aquele a compra por determinada
quantia de dinheiro para usá-la durante um certo período de tempo. O trabalhador
adianta ao capitalista a quantia tratada, pois só a recebe após haver trabalhado. Tendo
comprado a força de trabalho, o capitalista dela dispõe, como valor de uso, fazendo-a
trabalhar. (1985, p. 33. Grifo do autor).
Observando que a interdependência funcionário e empresa, é permeada em grande
relevância pela cultura organizacional, é producente às organizações “repensarem a forma
9 A mais valia seria o valor que o operário cria além daquele valor correspondente a sua força de trabalho e
constitui portanto, a fonte do lucro capitalista. (FARIA, 1985, p. 33).
40
como repassam sua Cultura ao trabalhador, principalmente reconhecendo a individualidade de
cada integrante dessa população organizacional” (SÓLIO, 2010, p. 130). Não impondo-lhes
em primeira instância, os valores ideológicos, como os manuais de conduta, as palestras e
encontros de socialização, visando a melhor adaptação dos funcionários, como cita a autora.
Faria reforça sobre a participação das culturas do indivíduo na organização ao dizer:
“se tudo é colocado de forma que os desejos dos indivíduos não possam ser expressos é
porque só um desejo é considerado, que é o 'desejo da organização', porque a organização
propõe um ideal comum para o qual concorrem todas as condutas individuais” (1985, p. 38).
Segundo observa Krausz, “as relações capital/trabalho e chefe/subordinados seriam mais
equilibradas e igualitárias se cada uma das partes envolvidas tivesse uma nítida consciência de
seus direitos e responsabilidades” (1991, p. 28).
Nessa conjuntura de equilíbrio emocional, físico e mental estão estruturadas as
relações de trabalho. As organizações possuem um papel fundamental na construção ou
desconstrução de todas essas mudanças que ocorreram com o trabalhador, não somente por
empregarem as pessoas mas, principalmente, porque é no trabalho que o indivíduo passa
maior parte do seu tempo. As mudanças que ocorreram no mundo do trabalho têm muito a ver
com as tomadas de decisões e escolhas feitas pelas opções que existiam no momento para as
empresas (HORNSTEIN, 2003).
Buscaremos, agora, nos aprofundar para entender de que forma o poder se manifesta
nas relações sociais no âmbito organizacional, questão essa, que já foi superficialmente
pincelada nesse capítulo.
41
4 O PODER E DISCURSO NAS ORGANIZAÇÕES.
4.1 AS RELAÇÕES DE PODER
Segundo Krausz (1991), o termo poder sempre se inclina a comparações negativas,
relacionadas a manipulação, a arbitrariedade e a tirar proveito de determinadas situações. Em
todo relacionamento há um mínimo de regras levantadas por comportamentos tradicionais que
constituem a cultura de determinados grupos, e assim norteiam as relações dos sujeitos. O
indivíduo sempre sofreu pressão para adaptar-se aos costumes do seu grupo e tentar criar
opções para lidar com o exercício do poder das pessoas e instituições que o rodeiam. São
essas pressões sociais que transformam cada pessoa em influenciador ou influenciado,
conforme as posturas que adotam na vida em sociedade. A autora lembra, também, que muitos
dos princípios transmitidos pela Revolução Industrial fixaram-se nas práticas organizacionais,
influenciando costumes e valores, estilos de vida, condutas políticas, econômicas e sociais na
esfera urbano-industrial:
A padronização dos produtos de consumo e a propaganda limitam as opções, a
especialização aliena, a concentração urbana isola, a centralização impede as pessoas
de pensarem, os bens materiais passam a ser símbolo de prestígio e sucesso, o
gigantismo das cidades e empresas despersonaliza as relações de trabalho, agride o
meio ambiente, cria tensões sociais, transformando os seres humanos em multidões
solitárias, meras máquinas de carne e osso produtoras e consumidoras de bens e
serviços. (KRAUSZ, 1991, p. 10).
O poder é algo universal, onipresente, sistema que envolve e influencia a vida em
sociedade, presente nas vivências de cada indivíduo, sendo impossível negar sua existência. A
“centralização de poder nas mãos de uma minoria acaba por alienar, gerando indiferença,
irresponsabilidade social, acomodação e falta de perspectiva e mudança” (KRAUSZ, 1991, p.
12). Direcionando essa colocação para a esfera organizacional, pode-se entender que quanto
mais inflexível e hierárquica for uma empresa, mais poder ela concentra nas mãos de poucos.
Assim, ela o exerce da forma que melhor entende com seus membros. Na perspectiva de
Krausz, podemos entender, então, que “poder é a capacidade potencial de influenciar as ações
de indivíduos ou grupos no sentido de atuarem de uma determinada maneira” (1991, p. 15).
Todo ser humano, de modo geral, possui capacidade de influenciar. As relações
exigem um vínculo entre quem exerce o poder e quem é alvo dele. Porém, os que detêm,
estão capacitados para deliberar o que quiserem e como quiserem, indiferentemente das
42
opiniões do grupo de modo geral. Esses são os pontos básicos do poder (KRAUSZ, 1991).
Segundo a autora, as organizações podem desenvolver dois tipos de poderes: o contextual,
que engloba a coerção ou pressão, a posição e a recompensa; e o pessoal que incorpora o
conhecimento, a conexão e a competência interpessoal.
Quadro 1 – Poder Contextual e Poder Pessoal
PODER CONTEXTUAL
PODER PESSOAL
Coerção ou pressão
Conhecimento
Exercida por meio de ameaças pessoais veladas
ou implícitas. Gera também reações de
passividade e alienação por quem o recebe. As
pessoas atuam como robôs, sem iniciativa,
bitoladas, cumpridoras estritas de ordens, sem
perspectivas ou opções.
Nesse caso, o
comportamento do subordinado legitima o uso
da coerção.
Gera credibilidade profissional, respeito,
intensificação da potência dos atos influenciais,
sem que a contrapartida tenha que ser a
submissão. Quando a organização permite esse
tipo de poder pessoal, a qualidade e a
quantidade de ações influenciais crescem e se
intensificam, facilitando a interação entre
pessoas e setores.
A Posição
Conexão
Exercido no intuito de facilitar e regulamentar
as relações entre as pessoas e setores. Constitui
um fator poderoso que acaba legitimando
manobras e manipulações ilegítimas. Ex.
Organogramas como mero objeto de decoração.
Esse poder está mais sujeito à distorção e ao
abuso.
Gera cooperação, estimula a interação de
esforços, a identificação de objetos comuns,
pois aumenta a rede de relacionamentos.
Baseia-se na convicção de que é mais produtivo,
fácil e gratificante trabalhar com os outros do
que trabalhar contra os outros. Na prática é
compartilhar recursos e ideias.
A Recompensa
Competência Interpessoal
Exercida para recompensar as pessoas segundo
o seu mérito. Evoca a ideia de bens materiais,
salários, benefícios, prêmios, promoção.
Favorecem a criação de “panelinhas”, e
instauração do nepotismo. A outra face refere-se
ao poder psicológico, necessário para a
manutenção do bem estar inferior e autoestima
elevada.
Gera um conjunto de atos influenciáveis que
ocorrem no relacionamento do dia a dia. É uma
forma de poder não diretiva de atuar e que
respeita o direito de quem está exposto a ela de
aceitá-la ou não. A competência interpessoal
elimina a resistência e a submissão que surge
como reação de qualquer ato influencial
diretivo.
Fonte: KRAUSZ, 1991, p. 22-25.
Para Fleury e Fischer (1996), o poder está conectado à cultura, nas formas como se
apresenta e nas práticas que o validam, “pois o caráter do poder passa a ser estritamente
relacional, ramificado através de formas regionais e locais que se materializam nas práticas
organizacionais cotidianas, ultrapassando os limites dos regulamentos” (1996, p. 71). Esse
poder está dentro das organizações e é praticado através da coerção regularizada que propicia
a coesão nas relações dos grupos. As autoras definem que
43
o poder não é uma unidade global, passível de observação e análise, mas uma prática
social que assume formas heterogêneas, às vezes, díspares entre si, porque é
constituída historicamente e resulta de articulações locais circunscritas a
determinadas áreas de ação. (1996, p. 71).
Pagés identifica que “o poder não está fixo em uma rede de relações hierárquicas
interpessoais, mas encarna o conjunto da organização e se define como a capacidade da
organização em submeter os indivíduos a uma lógica abstrata de lucro e expansão” (1987, p.
67). Faria (1985) acredita que o poder do capital aliena o processo do trabalho, assim ele
torna-se um instrumento da gerência, que o utiliza como bem entende, criando uma lógica
para os funcionários de produção para o crescimento da empresa, gerando lucro para a mesma
ou para seus funcionários por meio dos salários, horas extras ou outros benefícios.
Enriquez (2007), cita dois laços com que o poder está relacionado, um deles é o da
morte: se levar em conta os fatos da história e experiências cotidianas, como pessoas que
foram mortas em campos de concentração, povos que foram escravizados e ainda o são em
algumas regiões, indivíduos que são explorados e tratados como máquinas ou animais, em
uma situação em que seus direitos são transferidos em domínio de outros e, assim, acabam
vivendo uma vida sem prazer, sem sabor e repetitiva. Para ele, “o poder sempre se encontra
atrás da máscara da opressão, da repressão, da violência” (2007, p. 57).
O segundo, baseado nas teorias de Freud e Max Weber, está vinculado à questão do
poder carismático e o poder relacionado a libido e ao amor. O poder carismático está ligado à
pessoa do chefe, como uma benesse irracional que lhe é concedida, ou seja, uma crença em
outra pessoa, que enfrentaria o destino do coletivo ou de si próprio, no qual todos os
envolvidos entregam-se numa situação quase que hipnótica. A libido diz respeito à ilusão da
presença tangível ou intangível de um chefe, que considera a todos da coletividade da mesma
forma, com o mesmo amor (ENRIQUEZ, 2007). Esse cenário gera uma identificação geral
dos membros com a organização, fazendo com que “cada ser substitua seu ideal de eu por um
objeto comum” (2007, p. 59). Nesse caso, o chefe torna-se o objeto de amor concebido.
O autor identifica que o poder está presente em todos os espaços, políticos ou
inconscientes, em condutas sociais, e no âmbito organizacional. É indispensável para manter a
disciplina para o bom convívio da vida em comum. Também é importante a singularidade de
cada sujeito no sistema de trabalho e trocas, assim como direitos e deveres (ENRIQUEZ,
2007).
44
A compreensão de Foucault (2007) sobre poder, diz não ser uma regalia conquistada
ou preservada da classe dominante, mas a consequência do conjunto das posições estratégicas,
efeito manifestado e em muitos casos reproduzidos por aqueles que se encontram em posição
de dominados. Assim
o poder não se aplica pura e simplesmente como uma obrigação ou uma proibição,
aos que “não têm”, ele os investe, passa por eles e através deles; apoia-se neles, do
mesmo modo que eles, em sua luta contra esse poder, apoiam-se por sua vez nos
pontos em que ele os alcança. (2007, p. 26).
Constata-se, então, que o poder extrapola a relação chefe e empregado. Por não se
localizar somente nesses convívios é que ele implanta-se nas práticas cotidianas da
organização. O autor acrescenta, então, que o poder também produz conhecimento,
conhecimento este que surge por meio da disciplina e vigilância também.
Entre as diversas formas de poder, Srour expõe que a mais nua é aquele que concerne
uso de violência e armas, “trata-se da capacidade de coagir, capacidade esta que, obviamente,
prescinde da aquiescência do agente coagido (dominação)” (2004, p. 146). É um poder de
fácil identificação, pois está presente no cotidiano, com abordagens policiais, agressões em
manifestações, os guardas sobre presidiários, a população subjugada, isso na perspectiva
micro. Já, no macro pode-se observar regimes totalitários, atos terroristas, entre outros.
Lembra o autor que essa forma de poder não perdura como força física por muito tempo, pois
logo que os corpos são mobilizados, aqueles que detêm o poder procuram assegurar a lealdade
pela dominação das mentes, “procuram estabelecer sua hegemonia simbólica, porque apenas a
violência física aliena os súditos e não os leva a aceitar a nova ordem instituída” (SROUR,
2004, p. 147).
Srour (2004) explana que as formas de poder embutidas na sociedade, se ramificam
em quatro segmentos: Segurança (poder fardado), Administrativo (Poder Executivo),
Jurídico-judiciário (Poder Jurídico) e Parlamentar (Poder Legislativo).
45
Quadro 2 – Os Poderes
FORMAS DE PODER
REGULAÇÃO DE INTERESSES
COAGIR (dar ordens)
Compelir, ameaçar, controlar
ADMINISTRAR (realizar objetivos)
Planejar, organizar e dirigir
JULGAR (emitir juízos)
Arbitrar disputas
DELIBERAR (definir políticas)
Escolher rumos
Fonte: SROUR, 2004, p. 149.
O poder está presente em todos os espaços, mesmo que não queiramos reconhecê-lo:
“o poder está em toda parte; não porque englobe tudo e sim porque provêm de todos os
lugares” (FOUCAULT, 2000, p. 89).
Justamente pelo fato do poder ser onipresente, Bourdieu (2001) diz que fica mais
difícil percebê-lo de imediato. É necessário saber identificá-lo, torná-lo visível, buscar onde
ele deixa-se notar menos. A esse poder invisível ele chama de poder simbólico, que define
“esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não
querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem” (2001, p. 7-8). Para Bourdieu,
O poder simbólico é um poder de construção da realidade que tende a estabelecer
uma ordem gnoseológica: o sentido imediato do mundo (e, em particular, do mundo
social) […] faz assentar a <<solidariedade social>> no facto de participar num
sistema simbólico – tem o mérito de designar explicitamente a função social […] do
simbolismo, autêntica função política que não se reduz à função de comunicação dos
estruturalistas. (2000, p. 9-10. Grifo do autor).
Ou seja, é um poder da construção do real, que estipula uma ordem do conhecimento:
a percepção imediata do mundo, sobretudo do mundo social. Um entendimento uníssono do
espaço, do tempo, da causa, o que favorece a conformidade entre as inteligências. Sendo
assim, ele só é possível porque há conformidade entre aqueles que praticam o poder e os que
dissimulam não reconhecê-lo. É possível verificar a forma como esse poder simbólico atua
nas organizações quando os gestores optam em expor a seus funcionários somente aquilo que
lhes interessa e beneficia, mascarando demais processos. Os símbolos são ferramentas de
comunicação e socialização que cria concordância com o sentido do mundo social,
favorecendo especialmente a reprodução da dinâmica social (BOURDIEU, 2001). As
produções simbólicas relacionam-se com os interesses da classe dominante. As ideologias
46
prestam assistência a vantagens particulares que querem se apresentar como interesses
coletivos, comum a todo grupo.
a cultura dominante contribui para a integração real da classe dominante
(assegurando uma comunicação imediata entre todos os seus membros e
distinguindo-os de outras classes); para a integração fictícia da sociedade no seu
conjunto, portanto, à desmobilização (falsa consciência) das classes dominadas, para
a legitimação da ordem estabelecida por meio do estabelecimento das distinções
(hierarquias) e para a legitimação dessas distinções. (2001, p. 10).
Indo ao encontro de como Bourdieu define poder simbólico, Fleury, percebe a
instância do simbólico “que em sua capacidade de ordenar, atribuir significações, construir a
identidade organizacional, tanto age como elemento de comunicação e consenso, como oculta
e instrumentaliza as relações de dominação entre as categorias” (1996, p. 117).
No que se refere ao sistema ideológico, Bourdieu diz que “o efeito propriamente
ideológico consiste precisamente na imposição de sistemas de classificação políticos sob a
aparência legítima de ciências filosóficas, religiosas, jurídicas, etc” (2001, p. 14).
O poder simbólico define-se em uma relação determinada, entre os que praticam o
poder e os que estão vulneráveis a ele, no próprio espaço em que se produzem e reproduzem
as crenças; pois são elas que legitimam o poder das palavras de ordem, de manter a disciplina
ou subvertê-la (BOURDIEU, 2001). Sendo assim, quanto mais próximo for o conteúdo das
falas utilizadas por quem exerce o poder, mais próximo o indivíduo estará da organização.
Como reforça Sólio, “quanto mais seu conteúdo captar ou conquistar o afeto das pessoas,
mais força ele terá. Isso significa dizer que potencializa o vínculo social” (2010, p. 123).
Entende-se, então, que as relações de comunicação, são inseparavelmente, sempre relações de
poder, que por sua vez dependem da forma e do conteúdo do poder material ou simbólico
reunido pelos sujeitos ou pelas instituições incluídas nesse contexto (BOURDIEU, 2001).
Bourdieu (20001) complementa ao dizer que o poder simbólico, poder subordinado, é
uma forma transformada, quer dizer, irreconhecível, transfigurada, legitimada, das outras
formas de valor. Talvez seja ele o mais poderoso de todos, pois de forma mascarada permeia,
fixa-se nas organizações provocando danos que são inconscientes ao ser humano.
Diante de tais definições sobre o poder, constatamos que todos possuem duas
características em comum, que são a influência e os relacionamentos. Ele é “ubíquo, permeia
as relações humanas. Existe independentemente de ser procurado. É a glória e o fardo da
maior parte da humanidade” (KRAUSZ, 1991, p. 16). Ao perpassar pelos relacionamentos,
47
deve ser considerado uma ferramenta poderosa que reproduz ideologias e culturas da forma
que melhor favorece aos detentores dos meios de produção, dos diretores, empresários de
modo geral no âmbito organizacional. Para melhor perceber as formas como ele se revela e
suas consequências, é fundamental considerar as experiências de cada indivíduo que compõe
as relações de conflito entre influenciadores e influenciados, assim como o contexto social,
sendo ele parte integrante da vida em sociedade.
Percorrendo, ainda, a esfera do poder, iremos agora estudar quais são as outras faces
que o poder manifesta e como elas interferem nas organizações, assim como nas relações de
trabalho.
4.2 OUTRAS FACES DO PODER
Os que usam do poder, recorrem à autoridade, à liderança, ao controle, ao domínio e à
ideologia, entre outras formas de expressá-lo. Faria (1985), diz que o autoritarismo é a forma
excessiva da manifestação do poder de uma classe ou categoria social. Os exércitos
organizados já carregavam marcas de relações autoritárias, entre pessoas em diferentes
posições sociais. “O autoritarismo é, por todas as razões, a essência do fenômeno burocrático”
(1985, p. 11). Reflete na imposição da vontade das partes, “envolve relações não somente
econômicas, no âmbito da produção, mas políticas e sociais” (FARIA, 1985, p. 17). Inclui
formas de subordinação e submissão. Segundo o autor, ela apresenta-se por meio das relações
de poder, da divisão e da exploração do trabalho e da punição.
A estrutura social, possui fortes traços de autoritarismo, e mesmo que as pessoas
percebam que estão sendo ajustadas para viverem nessa condição, a estrutura as força a se
inserirem nesse meio autoritário. Sendo legalizado, ele tem aparência, evidencia-se sem
máscaras:
O autoritarismo, então, ao mesmo tempo em que é considerado como um caso limite
da existência social, pode ser encarado como um elemento revelador, que permite
postular as transformações estruturais necessárias a eliminá-lo. É necessário, assim,
não apenas alertar para os aspectos alienantes que o autoritarismo provoca, como é
preciso também, que se adquira uma consciência trágica de sua existência cotidiana.
(FARIA, 1985, p. 26).
Ignorar a existência do autoritarismo, ou querer extingui-lo, é desconhecer a natureza
das coisas e dos seres, suas irregularidades e sua significância na história humana (FARIA,
48
1985).
Nas relações entre classe dominante e dominada, o autoritarismo supõe que esta
submeta-se àquela por força da coação. Na relação entre os seres humanos realmente
iguais, o autoritarismo supõe o exercício de uma negatividade que não se refere à
submissão de outro a si, mas de si a si mesmo com relação as regras de uma vida
social civilizada. (FARIA, 1985, p. 27).
Drucker (1997) fala da autoridade conquistada, pois o poder é permitido pelas pessoas
sobre as quais será praticado. “Nas novas organizações, títulos e cargos têm pouco peso até
que os líderes provem sua competência. Toda autoridade precisa ser conquistada antes de
exercida” (1997, p. 31). O autor expõe a autoridade conquistada, considerando que é mais
fácil adquiri-la por intermédio dos líderes, sendo que todo sujeito que está em tal posição deve
estar consciente de que os líderes desenvolvem-se, não são produzidos. A organização deve
ter consciência de que é necessário um tempo para que o líder possa manifestar-se. Nessa
estrutura, “o líder é aquele que estabelece o ritmo e o padrão a serem seguidos […] é
responsável pela escolha da equipe, pela disciplina e pelo ânimo e motivação do grupo”
(DRUCKER, 1997, p. 33).
O autor lembra, também, dos líderes sem cargo, ou seja, a liderança é mais flexível
nesse caso, já que não está relacionada a apontar aos funcionários o que deve ou não ser feito,
mas, sim, a liderança é feita onde e quando necessária, “são como pontos de energia em torno
dos quais a atividade se agrupa” (1997, p. 42). A liderança sem cargo é vista como
“boazinha”; como não é transmitida por ordens ela aproxima mais os trabalhadores e até o
próprio líder que não conscientizam-se dos seus papéis, e assim desempenham funções a
serviço da empresa sem que eles percebam, de forma amenizada, como se esse tipo de
liderança não existisse. Drucker contribui ao dizer que
a liderança requerida pela organização sem cargos é mais “branda” e mais difusa do
que aquela exigida pela tradicional, parece às vezes como se não tivesse líder, o que
não é verdade. Esse tipo de organização exigirá mais líderes, e líderes com aptidões
mais sofisticadas, não o oposto. (1997, p. 43).
Essa observação do autor compactua para a crença de que os indivíduos almejem
conquistar a liderança para poderem mandar com a validação dos colegas, porém o fato é que
“grande parte das pessoas jamais chegará a ser o 'cavalo de frente' das suas organizações: o
número de cargos no topo é simplesmente muito limitado” (DRUCKER, 1997, p. 46). Nesse
49
sentido, a liderança hierárquica é mais ofensiva e está sujeita a ser questionada, recriminada e
em certos casos fracassada, por “privar os funcionários comuns da capacidade de usar a
experiência e a informação que possuem” (DRUCKER, 1997, p. 47). Então, a liderança
requirida substitui a ideia de hierarquia existente entre os membros da organização.
Chiavenato, defende que “todas as organizações precisam de líderes em todos os seus
níveis e em todas as suas áreas de atuação” (1999, p. 558). Esses encontram-se no nível
intermediário e operacional das organizações. Sendo a liderança um fenômeno social, pode
ser definida como
uma influência interpessoal exercida numa dada situação e dirigida através do
processo de comunicação humana para a consecução de um ou mais objetivos
específicos. Os elementos que caracterizam a liderança são, portanto, quatro: a
influência, a situação; o processo de comunicação e os objetivos a alcançar. (1999, p.
558).
Outro campo ocupado pelo poder é o controle. Segundo Chiavenato (1999), as
organizações não agem na base do improviso e nem por imprevistos, elas necessitam ser
adequadamente controladas. O controle, desempenha o papel de supervisionar, avaliar e medir
o desempenho dos empregados. Assim, avalia-se se tudo ocorre de acordo com o que foi
projetado, ordenado e conduzido. “Controle é a função administrativa relacionada com a
monitoração das atividades a fim de manter a organização no caminho adequado para o
alcance dos objetivos e permitir as correções necessárias para atenuar os desvios”
(CHIAVENATO, 1999, p. 16. Grifo do autor). O que significa que todo gestor, representando
determinado setor, deve saber fiscalizar os membros para que os objetivos da empresa sejam
alcançados de maneira eficaz. A essência do controle, para Chiavenato, é “basicamente de um
processo que guia a atividade exercida para um fim previamente determinado” (1999, p. 637).
50
O processo de controle apresenta três etapas.
Figura 2 – As quatro etapas do processo de controle.
Fonte: CHIAVENATO, 1999, p. 637.
Faria observa que “o controle que visa à padronização de comportamento e a
disciplina, enfim, que visa o adestramento de trabalhadores, é legalizado pelo regimento
interno da organização. Assim, cada organização tem seu próprio código penal” (1985, p.
188).
Uma vez que o homem vive de associações organizacionais, por dedicar grande parte
do seu tempo à participação em uma das variadas organizações sociais, estando seus desejos
conectados com os das organizações, muito do que há nela, há em cada indivíduo. Falar de
controle, é saber que ele é uma característica central das organizações, na qual os membros
que dela fazem parte, devem enfrentar e buscar adaptar-se (TANNEMBAUM, 1975). Nesse
sentido, “organização implica controle […] o processo de controle ajuda a restringir os
comportamentos idiossincrásicos e mantê-los de acordo com o plano racional da organização”
(TANNEMBAUM, 1975, p. 16). O autor define controle como
51
uma consequência inevitável da organização. Mas é muito mais do que isso. Está
relacionado com aspectos da vida social que são de alta relevância para cada um.
Está relacionado com questões de bem-estar e aspirações comuns. Está relacionado
não só com o que se passa dentro da organização como também com o que a
organização realiza em suas ações externas. Trata das questões de democracia e
autocracia, centralização e descentralização, estruturas organizacionais “achatadas”
e “altas”, conselhos de trabalhadores e administração conjunta. (1975, p. 16).
De modo geral, as organizações exigem um grau de conformidade, assim como a
interação de variadas atividades, e cabe ao controle fixar a conformidade com os requisitos e
objetivos da organização.
Foucault (2007), ao falar sobre controle, discorre sobre o método da disciplina que
envolve ordens que censuram, regimentam os ciclos de repetição, obrigam o indivíduo a
ocupações determinadas, incluindo, também, o tempo com que são desempenhadas
determinadas atividades. Como exemplo, ele cita que “um quadro geral para uma atividade; é
mais que um ritmo coletivo e obrigatório, impulso do exterior, ele é um 'programa', ele realiza
a elaboração do próprio ato” (2007, p. 129). Ou seja, o “controle disciplinar não consiste
simplesmente em ensinar uma série de gestos definidos, impõe a melhor relação entre um
gestor e a atitude global do corpo, que é sua condição de eficácia e rapidez” (2007, p. 130).
Um corpo disciplinado é a base de um gestor competente, como coloca o autor.
Essa forma de controle disciplinar “é, com efeito, um poder que, em vez de se
aproximar e de retirar, tem como função maior 'adestrar'; ou sem dúvida adestrar para retirar e
se apropriar ainda mais e melhor” (FOUCAULT, 2007, p. 143).
Fleury (1996) fala da vigilância hierárquica, como uma das faces do poder. Sendo que
muitas vezes o subordinado percebe essa vigilância como uma promoção na carreira, uma
possibilidade de se sobressair perante seus colegas, se desempenhar corretamente aquilo que
lhe foi designado. Não se atribui somente a situações mensuráveis quantitativamente, mas
principalmente sobre a conduta dos funcionários no cotidiano. Segundo a autora, na medida
em que o sujeito dá-se conta de que ele pode “subir hierarquicamente” na empresa, a relação
entre as partes tende a caracterizar-se como autocrática e tirana. Isso acaba gerando
insegurança entre os sujeitos, impregnando ainda mais esse desejo de alcançar outros degraus,
que normalmente vem seguidos de atitudes subservientes, aduladores e acusador dos erros dos
colegas.
A mesa, a cadeira, o caixa, constituem as células nas quais os indivíduos são
52
expostos à vigilância, possibilitando sempre determinar, onde estão, o que estão
fazendo, assim como avaliar a quantidade e a qualidade do serviço realizado.
Permite também estabelecer entre os funcionários comparações que possibilitam
informar o grau de adesão dos mesmos às normas e aos princípios da organização,
traduzido entre outros fatores, pelo cumprimento de longas jornadas de trabalho.
(FLEURY, 1996, p. 107).
O agravante nessa relação de comparação entre funcionários é que a disciplina, ao
mesmo tempo em que orienta os comportamentos e regras que devem ser seguidos dentro da
organização, “individualiza os homens através da vigilância e das medidas comparativas por
ele produzidas. Numa organização de carreira fechada, ele passa a ser a base sobre a qual é
construída a posição hierárquica de cada funcionário ou sua exclusão da organização” (1996,
p. 107).
Faria expressa que a história é repleta de fatos de dominação, seja na manifestação de
mando e subordinação, ou mediante relações de interesse, sendo que mesmo sem perceber, o
termo recai mais sobre um movimento voluntário, já que o jogo de interesses se articula de
modo a levar adiante uma ação social, chega a manifestar-se como administração. Nessa
situação, “a dominação é um conceito chave para a compreensão do fenômeno organizacional
e se refere a um estado de coisas no qual a vontade manifesta do dominante se expressa como
se os dominados a acatassem como sua” (FARIA, 1985, p. 11). O autor analisa que toda
dominação mando e subordinação estruturada na organização toma forma sendo o dominante
seu aparelho administrativo e a grande massa dominada formam os componentes essenciais.
Drucker repara que o “conhecimento é a forma dominante em nossa era pós-capitalista
emergente” (1997, p. 46). O autor examina que a organização, estando direcionada para o
conhecimento, atua de maneira mais produtiva, sendo o conhecimento distribuído em
diferentes espaços, desde os que têm poder de decisão aos que não possuem poder, apenas
realizam tarefas que lhes são determinadas.
A dominação também é simbólica, segundo Bourdieu, quando o indivíduo assume a
identidade dominante, ou seja,
quando os dominados nas relações de forças simbólicas entram na luta em estado
isolado, como é o caso nas interações da vida cotidiana, não têm outra escolha a não
ser a da aceitação (resignada ou provocada, submissa ou revoltada) da definição
dominante da sua identidade ou da busca da assimilação a qual supõe um trabalho
destinado a lembrar o estigma (no estilo de vida, no vestuário, na pronúncia, etc) e
que tenha em vista propor, por meio de estratégias de dissimulação ou de embuste, a
imagem de si o menos afastada possível da identidade legítima. (2001, p. 124. Grifo
do autor).
53
Não se trata, portanto, de simplesmente desvincular-se dos sinais estigmatizados pelas
forças dominantes, pois isso seria ainda uma forma de legitimar os próprios estigmas. Para o
autor, o rompimento e a busca da autonomia por parte dos dominados se dão de forma
coletiva, através da “subversão das relações de forças simbólicas – que tem em vista não a
supressão das características estigmatizadas mas a destruição da tábua dos valores que as
constitui como estigmas” (BOURDIEU, 2001, p. 124).
Evidenciamos a ideologia como mais uma esfera do poder, referindo-se a uma
estrutura de representação que os detentores do poder utilizam para encobrir e velar a
realidade. Pagés, entende que “a ideologia predominante num grupo social ou em uma
instituição constitui de fato uma 'bricolage'10 de elementos disparatados resultante de
influências variadas, heranças de períodos diferentes” (1987, p. 74). Na medida em que os
funcionários participam cada vez mais da ideologia da empresa e integram sua preparação,
mais eles colaboram para a conformidade da própria subordinação, tendo em vista que nem
tudo está explícito na fala dos gestores, no qual utilizam o processo de persuasão para se
aproximar dos empregados (PAGÉS, 1987).
Pagés (1987) analisa que a crença na empresa evoca também uma linguagem religiosa,
fazendo da mesma um objeto de culto, não fixam somente em mascaram métodos de
dominação, mas sugerem um sistema de valores na empresa, construindo uma moral de ação,
apropriada para conduzir os empregados à adesão, já que
trabalhar em uma empresa implica a adesão a todo um sistema de valores, a uma
filosofia, e é esta adesão ideológica que galvaniza as energias e incita as pessoas a se
dedicarem de “corpo e alma” a seu trabalho. Esta adesão é um elemento fundamental
para o poder da empresa e para seu sistema de dominação e alienação. (PAGÉS,
1987, 75).
Foucault (2006), problematiza o conceito de ideologia ao explicar que é dificilmente
utilizável por três razões: “A primeira é porque, queira-se ou não, ela está sempre em oposição
virtual a alguma coisa que seria a verdade” (2006, p. 7). A questão não se refere somente à
verdade velada em um discurso, mas de entender como que historicamente são construídos
efeitos de verdade no interior dos discursos. O segundo ponto é que está fundamentalmente
ligada a alguma coisa como o sujeito. E por último, ela está em segundo plano, complemento
com relação daquilo que deve funcionar para ela em diferentes esferas, sejam econômicas,
10 Entende-se que “Bricolage” é a atividade de aproveitar coisas usadas, quebradas ou apropriadas para outro
uso, em um novo arranjo, ou em uma nova função. (PAGÉS, 2006, p. 74).
54
políticas, entre outras. Por tais razões o autor acredita que é um conceito que deve ser
empregado com muito cuidado (FOUCAULT, 2006, p. 7).
Acreditamos ser relevante tratar da ideologia conservadora, ao percebermos que ela
permeia os espaços organizacionais. Srour diz que
na dinâmica das sociedades e das organizações, toda coalizão de forças que
institucionaliza seu poder tende a adotar uma ideologia conservadora […]. Ocorre
que o senso comum confunde erroneamente o conservadorismo com imobilismo ou
cega manutenção do statu quo. Ora, para preservar propriedades, posições de
prestígio, poderes, privilégios ou um modo peculiar de vida, os conservadores
disfarçam mudanças de equilíbrio com a roupagem das mudanças estruturais,
praticam o princípio de “mudar sem mudar”, exercitam com maestria a adaptação às
circunstâncias, antecipam-se com sabedoria aos novos ventos e resguardam o que
mais prezam. (2004, p. 219. Grifo do autor).
A ideologia conservadora contribui para falas preconceituosas, utilização de frases
feitas, julgamentos falsos, reforça estereótipos, entre outros fatores.
Apropriando-nos de diversos mecanismos que o poder se apresenta na esfera social,
incorporado principalmente no espaço organizacional, legitimado em grande parte pelos
membros que constituem o ambiente; é que nos cabe agora examinar o discurso
organizacional como elemento de domínio, fetiche e satisfação aos indivíduos da organização.
4.3 O DISCURSO ORGANIZACIONAL
Ao discorrer sobre o discurso organizacional, lembremos antes de tudo que ele está
intimamente ligado aos valores, normas, a cultura e a comunicação produzida e praticada pela
organização, visto que “a cultura é um fenômeno comunicativo e que o discurso
organizacional é o lugar no qual os elementos de uma dada cultura são produzidos e
veiculados” (MARCHIORI, 2010, p. 146). Nessa instância, Orlandi (2010), entende que o
discurso é muito mais do que transmissão de informação, pois, a mensagem não segue uma
sequência ordenada como: emissor fala de alguma coisa, baseado em um código, o receptor
atrai a mensagem decifrando-a. Já que
a língua não é só um código entre outros, não há essa separação entre emissor e
receptor, nem tampouco eles atuam numa sequência em que primeiro um fala e
depois o outro decodifica, etc. Eles estão realizando ao mesmo tempo o processo de
significação e não estão separados de forma estanque. (2010, p. 21).
55
No local da mensagem o autor propõe exatamente o discurso. A linguagem estabelece
relações entre o indivíduo e diferentes sentidos que são transformados pela língua e história.
Nesse emaranhado de produção de sentidos que integram os indivíduos, Orlandi reforça que é
inapropriado dizer que o discurso resume-se apenas à transmissão de informação, já que “são
processos de identificação do sujeito, de argumentação, de subjetivação, de construção da
realidade, etc” (2010, p. 21). Como as relações de linguagem são relações de sujeito e sentido,
com diferentes finalidades, nessa relação, a definição do autor ao termo discurso, “efeito de
sentidos entre locutores” (2010, p. 21).
O autor lembra da importância em não confundir discurso com a fala, pois
não se trata de opô-lo à língua como sendo um sistema, onde tudo se mantém, com
sua natureza social e suas constantes […]. O discurso tem sua regularidade, tem seu
funcionamento que é possível aprender se não opomos o social e o histórico, o
sistema e a realização, o sujeito ao objetivo, o processo ao produto. (2010, p. 22).
Quando Orlandi (2010) diz que é possível aprender o discurso, é porque na medida em
que a empresa percebe a importância em obter a confiança dos funcionários para assegurar
que seus interesses sejam cumpridos, muitas vezes os gestores desenvolvem uma linguagem
persuasiva e também coerciva para seduzir os empregados. Marchiori mostra isso ao explicar
que
a linguagem da cultura se sobrepõe à consciência e nos possibilita criar textos
complexos. Esses textos podem significar realidades idealizadas, virtualizadas,
ficções de toda ordem, capazes de extrapolar os estreitos limites das linguagens
primárias e artificiais, presas referencialmente aos seus objetos da realidade. (2010,
p. 143).
Podemos lembrar Pêcheux, para quem
o princípio dessas leituras textuais consiste, como se sabe, em multiplicar as relações
entre o que é dito aqui (em tal lugar), e dito assim e não de outro jeito, com o que é
dito em outro lugar e de outro modo, a fim de se colocar em posição de “entender” a
presença de não ditos no interior do que é dito. (2002, p. 44).
Marchiori acrescenta que o cerne da cultura inclina-se para uma posição conservadora
para preservar-se e impedir que se dissolva. Também, pode ser caracterizada “por um discurso
próprio, ou seja, uma coleção de textos, cuja expressão total é formada pelo conjunto das
expressões dos demais textos que entram em sua composição” (2010, p. 145).
56
A união de tais textos pode gerir discursos coerentes, como pode manifestar a
incoerência e a dissemelhança entre os textos que o constitui. Recorda a autora que o discurso
pode ser a forma mais clara de perceber a cultura, pois “não é outra coisa senão uma rede
textual que se sustenta nos intermédios de cada um desses seus integrantes, no lugar e no
momento em que pontos de afinidade promovem elos, gerando cadeias relacionadas” (2010,
p. 147). Porém, o discurso da cultura pode não transparecer, revelar a cultura da organização
(MARCHIORI, 2010).
Nessa linha de pensamento, Sólio diz que “é importante lembrar que um discurso diz
mais do que pensa/quis dizer, podendo significar algo diverso do que foi anunciado” (2010, p.
131). Há muito dito no não dito, isso ocorre normalmente para ludibriar o funcionário e fazer
com que o mesmo não realize nenhuma análise ou reflexão do ambiente que o cerca. A autora
comenta que
é muito comum o líder de equipe organizar seu discurso de forma a plicar situações
do cotidiano do trabalhador – como desemprego, aluguel, endividamento, custo de
vida desencadeando sensação de medo e de insegurança, que leva o Sujeito a acatar
às exigências da organização. (2010, p. 138).
Na medida em que tornam-se mais flexíveis, persuadidos por uma linguagem sedutora,
que ao mesmo tempo gera medo e insegurança, os empregados tendem a aproximar-se da
organização. Marchiori (2010) explica que o vínculo funcionário-empresa se dá, não somente
pelo elo de um sujeito com outro, ou entre organizações e seus públicos, mas também entre
informações, objetos, uma teia de informações e relacionamentos. Eles criam dependência,
não propiciam autonomia, incompatível com a ideia de liberdade.
Quando o funcionário acredita no visível imediato do mundo a sua volta, cai na
armadilha das organizações, pois não assimila a realidade, já que sua percepção está limitada
por imagens ocultas, como trata Faria (1985), o discurso adotado pelo empregado, é o mesmo
adotado pela organização, e o indivíduo sem desejo, sem voz, transfere sua fala ao portador
dos seus direitos. Afirma ainda que
é enquanto máscara que o imaginário se encontra no centro da formação das
ideologias, na medida em que cobre as relações reais, mistifica e falsifica a ação
transformadora, ao mesmo tempo em que acreditando possível o impossível,
preserva e alimenta as utopias. (1985, p. 37).
Dessa forma, compreende-se a importância em “buscar, atrás da cena do manifesto a
57
'outra cena', a 'outra palavra', o 'não dito'” (FARIA, 1985, p. 36).
Pagés verifica que “o discurso informa ao mesmo tempo sobre uma realidade 'objetiva'
exterior e transcendente aos indivíduos e sobre seu universo mental” (1987, p. 198. Grifo do
autor). Contudo, os indivíduos encontram-se em uma esfera de acontecimentos fora dele que
influenciam seu comportamento. O meio não atua diretamente sobre o indivíduo, age através
de um sistema de concepções e ações, conscientes ou inconscientes, próprias do sujeito. O
comportamento do indivíduo, seu discurso, sua forma, equilibra-se entre dois universos, o
interno e externo.
Pode-se notar, então, que “o discurso é ao mesmo tempo coletivo e individual”
(PAGÉS, 1987, p. 1999). Ele é coletivo ao ponto que cada sujeito revela relações entre
fenômenos, existente de variadas maneiras em cada sujeito, não pela similaridade dos
diferentes discursos, mas pela complementariedade. É individual com relação a subestrutura
conglomerada em uma única estrutura, e também como
circuitos paralelos derivados de uma estrutura abrangente. Por exemplo, alguns
indivíduos dão mais importância que outros a gratificações materiais. Outros se
identificam muito com seu trabalho e encontram nele a fonte principal das
gratificações que a organização traz. Nos dois casos a estrutura abrangente restriçãogratificação é a mesma, mas no segundo caso ela é interiorizada a ponto de agir
como instância psíquica autônoma. (PAGÉS, 2010, p. 201).
Pêcheux, sobre discurso e ideologia, observa que
a dominação da ideologia (da classe) dominante, que é caracterizada, no nível
ideológico, pelo fato de que a reprodução das relações de produção “subjuga” sua
transformação (opõe-se a ela, a freia ou a impede, conforme os casos), corresponde,
pois, menos à manutenção do idêntico de cada “região” ideológica considerada em si
mesma do que a reprodução das relações de desigualdade-subordinação entre essas
regiões. (1988, p. 46).
Por sofrer uma pressão interiorizada exercida nas empresas, o funcionário substitui e
fortalece essa pressão praticada por ele mesmo. “O indivíduo interpreta as restrições, mais
geralmente os estímulos que ele recebe do meio contribui para moldá-lo, agindo sobre o
campo objetivo da interação, entre o objetivo e o psicológico do indivíduo” (PAGÉS, 1987, p.
198-199).
Marchiori defende que
as práticas discursivas levadas a cabo pelas organizações não podem e não devem
58
permitir que os meios de sua produção ou os modos de sua veiculação superem ou
obscureçam elementos de vínculos com seus públicos, o que é mais comum
acontecer do que se supõe. (2010, p. 148).
Daí, a necessidade de o empregado estar ciente da linguagem empregada na
organização e ter clareza de que o melhor meio de não se deixar influenciar é decodificar o
discurso organizacional, sabendo da interação que o mesmo possui e levando em consideração
sua história particular.
Daremos seguimento na pesquisa explicando a comunicação organizacional, os
processos de comunicação, públicos, e a importância de um profissional de Relações Públicas
voltado para o social na esfera organizacional. Ao compreendemos como se dão as relações
de poder no campo organizacional, nos aproximamos mais ainda da resposta do problema de
pesquisa que foi proposto.
59
5 COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL
A comunicação é parte integrante da organização, uma depende da outra na cadeia
social. Torquato (2002) explica que a comunicação organizacional surgiu na década de 1960,
pois as empresas começaram a perceber a potente relação que existia entre elas e a sociedade.
Nesse contexto, as organizações começaram a perceber a importância em criar um vínculo
com o trabalhador, dizendo a eles que sentissem orgulho do local de trabalho e também
demostrar que produziam com qualidade para os clientes. No que se refere a sentir-se
orgulhoso do local de trabalho, Marchiori (2010, p. 192), diz que “os indivíduos
organizacionais necessitam 'lugarizar-se' e esse processo/sentimento de 'lugarização' traz
consigo a necessidade de pertencer”. Voltando ao contexto histórico organizacional, Torquato
(2002) diz que não havia investimento para realizar comunicação interna e externa e que, por
fim, os avanços industriais colaboraram para “sofisticar e ampliar os modelos de expressão e
suas estratégias persuasivas, ensejando a estruturação, em áreas, do programa de
comunicação” (TORQUATO, 2002, p. 2).
Para Kunsch, a comunicação organizacional, como objeto de pesquisa, é
a disciplina que estuda como se processa o fenômeno comunicacional dentro das
organizações no âmbito da sociedade global. Ela analisa o sistema, o funcionamento
e o processo de comunicação entre a organização e seus diversos públicos. […]
Configura as diferentes modalidades comunicacionais que permeiam sua atividade.
Compreende, dessa forma, a comunicação institucional, a comunicação
mercadológica, a comunicação interna e a comunicação administrativa. (2002, p.
149-150).
Pelo fato de a comunicação organizacional abranger todos os aspectos das ações
comunicacionais, o termo amplia-se a qualquer tipo de organização como ONGs, órgãos
públicos, privados, fundações, entre outros (KUNSCH, 2002). A autora compreende que
estando a comunicação organizacional no centro da organização, é preciso que a comunicação
integrada11 concentre os demais tipos de comunicação, e que elas interajam harmoniosamente
entre si, apesar de suas peculiaridades, para que seja possível a relação organizacional com a
sociedade em geral e com seus públicos.
11 Entende-se por Comunicação integrada uma filosofia que direciona a convergência das diversas áreas,
permitindo uma atuação sinérgica. Pressupõe uma junção da comunicação institucional, da comunicação
mercadológica, da comunicação interna, e da comunicação administrativa, que forma o mix, o composto da
comunicação organizacional. (KUNSCH, 2002, p. 150. Grifo da autora).
60
Scroferneker entende que “a comunicação é uma organização que organiza, um todo
orgânico que se organiza como frase, oração, estratégia, discurso” (2008, p. 9). O processo
comunicacional no contexto organizacional conta com agentes sociais que atuam em
diferentes estruturas dinâmicas, socializando situações imprevisíveis (MACHADO, 2008).
Segundo Chiavenato (1999, p. 534), “a comunicação organizacional constitui o
processo específico através do qual a informação se movimenta e é intercambiada entre as
pessoas dentro de uma organização”.
Já Baldissera (2008) diz que a comunicação organizacional é incompleta se considerar
somente os projetos, planejamentos para suprir as carências da organização, não devendo ser
limitada a esses aspectos. Sendo que
para além do planejamento, do organizado, do gerenciável existem fluxos
multidirecionais de significação/comunicação de diferentes qualidades e
intencionalidades, somente detectáveis/observáveis no acontecer. Fluxos esses que
dialógica e recursivamente podem complementar, potencializar, qualificar, agilizar,
e/ou resistir, subverter, confundir, distorcer os processos formais/oficiais.
(BALDISSERA, 2008, p. 32).
Contudo, na relação comunicação e organização há discordância de opiniões, e
também poder de persuasão. Quanto ao último exemplo, Kunsch observa que, na
comunicação organizacional,
uma ocorrência frequente é a filtragem da informação na comunicação ascendente.
“Manipula-se” a informação para que esta seja percebida positivamente pelo
receptor. É comum as bases esconderem informações desfavoráveis nas mensagens
que chegam aos escalões dirigentes. (2002, p. 77. Grifo da autora).
Normalmente, a comunicação é pensada como um jogo em que as partes agem por
estratégias que lhes permitem infiltrar-se, conhecer e dominar os códigos da força contrária
para, com isso, concentrar informações que se constituem em poder de manipulação, de
influência, de dominação e, mesmo, de rompimento (BALDISSERA, 2000). Portanto, “é na
tensão 'identidade-alteridade (organização outro/seus públicos)', em seu contexto específico,
que os sentidos que serão individuados pelos sujeitos em relação de comunicação são
transacionados, disputados e ou construídos” (BALDISSERA, 2008, p. 32).
Nessa perspectiva, Marchiori considera que
a comunicação organizacional promove e estimula diálogos visíveis intencionais ao
pretender 'lugarizar' os indivíduos organizacionais. Mas, concomitantemente a esses
61
diálogos, há outros, pouco inclusivos, que acontecem na indiferença, na falta de
reconhecimento e respeito, na ausência de afetividade, na segregação de espaços.
(2010, p. 192).
Chiavenato concorda com Baldissera, pois para o autor a comunicação organizacional
não é perfeita, sendo que “elas são alteradas ou transformadas ao longo do processo, o que faz
com que o último elo – o receptor da mensagem – quase sempre receba algo diferente do que
foi originalmente enviado, transformando a intenção do processo de comunicação” (1999, p.
534). Nesse caso, o autor identifica que existem três problemas que evidenciam-se quanto à
transformação da comunicação
omissão que significa a supressão de aspetos das mensagens, mantendo o sentido da
mensagem íntegro e inalterado. A Distorção: significa uma alteração no sentido da
mensagem em sua passagem pelos diversos agentes do sistema. Sobrecarga: ocorre
quando os canais de comunicação conduzem um volume de informações maior do
que a sua capacidade de processá-las. (CHIAVENATO, 1999, p. 534-535. Grifos do
autor).
O autor percebe que a comunicação organizacional, em sua grande maioria, age de
forma que comprime as mensagens entre a administração e as pessoas.
Figura 3 – A atividade administrativa passa através do gargalo da comunicação
Fonte: CHIAVENATO, 1999, p. 535.
Segundo Kunsch, as barreiras existentes na comunicação organizacional podem ser
enquadradas em quatro formas: “as pessoais; as administrativas/burocráticas; o excesso e a
sobrecarga de informações; e as informações incompletas e parciais” (2002, p. 75). As
pessoais dependem do comportamento, personalidade dos indivíduos, que podem simplificar
ou complicar a comunicação; as administrativas refere-se à maneira como as organizações
desenvolvem, transmitem e demandam suas informações. Já, o excesso de informação diz
respeito à quantidade de informação transferida de diversas formas, reuniões, material
62
administrativo e institucional, meios que não passam por uma triagem e tão pouco por uma
prioridade de produção, cansam e embaralham o público, dificultando a comunicação, pois é
inviável os indivíduos repararem e absorverem todas as informações, mensagens recebidas do
ambiente social e dos locais onde trabalham. Por último, as comunicações incompletas e
parciais que localizam-se nas dúbias informações, nas comunicações parciais ou abafadas
para as pessoas (KUSNCH, 2002).
Baldissera (2000), percebe que a imagem das organizações é criada por meio de
características que são comunicadas. Quando solidificada a identidade12 organizacional, ela
estará presente em toda parte. Assim, o autor verifica que
a comunicação é utilizada para reforçar e preservar a identidade organizacional ou
ser o motor que impulsiona para as transformações desejadas, uma vez que a
comunicação organizacional compreende todo o fluxo de mensagens que compõem a
rede de relações da organização. (2000, p. 13-14).
O autor compreende “a comunicação como elemento do processo cultural” (2000, p.
9). Alocado em um contexto em que se deve indagar o modo como ela é utilizada para
informar os públicos e como é absorvida principalmente pelo público interno da organização,
sendo que deve ser percebida como um sistema de criar sentidos, sabendo que a cultura é
também empregada para diagnosticar e falar sobre os mecanismos organizacionais que
asseguram a disseminação das informações a cerca das práticas convencionais sociais
(BALDISSERA, 2000).
Para Scroferneker, a comunicação é de extrema relevância, ao ponto que “não há
organização sem comunicação” (2008, p. 21).
A organização é vista sempre como uma arena de conflitos: um campo de batalha – o
locus do conflito de classes. E a realidade organizacional é o reflexo desses
'embates', sendo considerada como um 'instrumento de dominação e opressão'. A
comunicação assume assim um papel de mecanismo de 'mascaramento' das
realidades materiais da organização. Enfatiza os aspectos ideológicos da
comunicação, admitindo-a como causa de uma falsa consciência entre dirigentes e
trabalhadores. (SCROFERNEKER, 2008, p. 18-19).
Nessa linha de raciocínio, Baldissera (2000), observa que as comedidas relações de
poder que não são regularizadas e são construídas tendo o conhecimento e o uso tático da
12 O autor entende por identidade o conjunto dos traços peculiares que, associados às demais características,
permitem que uma organização seja reconhecida como sendo ela própria, portanto única. (BALDISSERA,
2000, p. 13).
63
notícia, normalmente minimizam enfrentamentos para possibilitar a adesão de sentidos por
intermédio da comunicação, que percorrem os espaços organizacionais.
Kunsch colabora ao dizer que se deve reparar
a produção de sentido no âmbito da comunicação organizacional e compreender as
estratégias organizacionais como forma de espelhamento, de modo a que os públicos
se reconheçam na fala organizacional e tendam a simpatizar e a se identificar com
ela. (2013, p. 15).
O processo comunicacional é simples, visto que as pessoas se comunicam sem fazer
nenhum esforço e muito menos tem consciência disso. Em contrapartida, é complicado, sendo
que a probabilidade em receber ou enviar mensagens de forma errada ou modificada é
expressiva (CHIAVENATO, 1999).
Diante de tais colocações, é possível observar que apesar de parecer muito simples,
como citou Chiavenato, a comunicação é um processo complexo, ainda mais quando pensada
no âmbito organizacional, tendo em mente que é muito mais do que troca de informações,
“tem de ser pensada numa perspectiva da dinâmica da história contemporânea” (KUNSCH,
2002, p. 71). As organizações como canal da transmissão de informações, têm que levar em
conta todas as dimensões da comunicação, os relacionamentos, as regras internas e externas,
sabendo que nem tudo o que é emitido é compreendido claramente pelos membros.
Compreendido como se dá a comunicação organizacional, iremos agora aprender
quais são os processos de comunicação que podem ocorrer e ser identificáveis dentro das
organizações o que propiciará melhor compreensão da própria comunicação que ocorre no
estudo de caso a ser examinado.
5.1 OS PROCESSOS DE COMUNICAÇÃO
Vamos considerar que “comunicar significa tornar algo comum. Esse algo pode ser
uma mensagem, uma notícia, uma informação, um significado qualquer. Assim, a
comunicação é uma ponte que transporta esse algo de uma pessoa a outra ou de uma
organização a outra” (CHIAVENATO, 1999, p. 518). Mais ainda, que ela é muito mais do que
informação,
a comunicação está além da informação. Ela pressupõe uma relação entre quem
informa e quem é informado, rumo à interpretação, à produção de significação; o
64
estabelecimento de ilações e relações entre o dado que acaba de ser informado e um
repertório anterior. (SÓLIO; BALDISSERA, s. p., 2003).
Compreendido isso, é importante observar que o processo organizacional é executável
devido ao processo de comunicação que se encontra presente no ambiente. As atividades
desempenhadas são realizáveis pelo fato de possuírem um conjunto de recursos, elementos e
habilidades que, assim, auxiliam para cumprir determinado objetivo. É um ciclo que está
interligado constantemente para receber informações e informar, propiciando a permanência,
o fortalecimento e a sobrevivência da organização (KUNSCH, 2002).
Quando mencionamos o processo comunicacional das organizações, como fala
Kunsch (2002), normalmente direcionamos tal sistema a uma ordem, uma forma que compõe
essa estrutura, assim logo relacionamos a: “fonte, codificador, canal, mensagem,
decodificador e receptor” (2002, p. 70). Pode-se observar que é um processo relacional entre
os sujeitos, os setores e as organizações, sendo que no cotidiano essa interação de diferentes
elementos sofre alterações, intervenções e seguem diferentes regulamentos em um contexto
complexo, devido às variadas formas de comunicação subsistentes, atuantes em variados
contextos sociais (KUNSCH, 2002). Torquato define o processo de interação como
comunicação cultural, ou seja, “quando as pessoas falam umas com as outras, estão
estabelecendo uma relação no segundo nível da comunicação. […] Comporta os climas
internos13” (TORQUATO, 2002, p. 34).
Chiavenato (1999), para exemplificar como ocorre o processo comunicacional,
percebe que os elementos básicos encontram-se nas extremidades, as quais são: a fonte e o
destinatário.
O autor entende como fonte a pessoa que transmite determinada informação; o
transmissor é aquele que sistematiza e transporta a ideia ou significado através da fala ou
escrita, já o canal é o meio pelo qual a mensagem perpassa entre a fonte e o destino; o
receptor é o meio que decifra ou exemplifica a mensagem para apresentar um significado
compreensível; o destino é o grupo ou indivíduo que deve receber a mensagem e o ruído é
aquilo que gera alguma imperfeição, distorção que atinge a mensagem transmitida da fonte ao
destino e a retroação é o processo em que o destinatário adquiri a apreende a informação e
apresenta o que ele interpretou da mensagem recebida (CHIAVENATO, 1999).
13 Segundo o autor, o clima interno é utilizado para saber o que está acontecendo no interior da empresa. Mede
a temperatura do clima organizacional, o qual é ajustado por meio da cultura interna – costumes, valores,
ideias, etc. (TORQUATO, 2002, p. 34).
65
No que se refere à função de receptor, os motivos pelos quais pode haver um desajuste
da mensagem no caminho da fonte até o destino se devem ao fato de “o receptor não conhecer
a codificação e não saber decodificá-la; o receptor tem dificuldade em interpretar a
codificação; o receptor não está exatamente sintonizado no canal (por ansiedade, cansaço,
desatenção ou desinteresse” (CHIAVENATO, 1999, p. 521).
Chiavenato observa que o processo de comunicação é metódico e constante, sendo que
“a comunicação deve ser considerada um processo bidirecional para que seja eficaz” (1999, p.
522). Com isso, ele quer dizer que a comunicação é uma via de mão dupla, já que há uma
troca constante de informação entre o emissor e o receptor. Para o autor, uma comunicação
efetiva ocorre quando o receptor decifra a mensagem atribuindo-lhe um significado que se
relaciona com a informação e idealização que a fonte emitiu (CHIAVENATO, 1999). Nesse
caso, “o processo de comunicação pode ser eficiente e eficaz. A eficiência está relacionada
com os meios utilizados para a comunicação, enquanto a eficácia está relacionada com o
objetivo de transmitir uma mensagem com significado” (CHIAVENATO, 1999, p. 522).
Segundo Torquato (2002), é possível identificar quatro formas de comunicação:
comunicação cultural, já mencionada e explicada anteriormente; a comunicação
administrativa, que se direciona aos papéis, ao lado burocrático da organização, observando
que muitas vezes ocasionam intercorrências, pois as informações ficam imobilizáveis no meio
do percurso até chegarem no seu destino devido à exagerada quantidade de canais de
comunicação. Também cita a comunicação social que abrange as áreas dos cursos de
comunicação: relações públicas, publicidade, jornalismo, marketing, etc; e por último, a
quarta forma é o sistema de informação que “agrega as informações armazenadas em bancos
de dados” (2002, p. 34). Essas formas de comunicação são estratégicas e uma intervém a
outra, atingindo-se.
Sólio percebe que o processo de comunicação se expande em variadas esferas ou
círculos, e pode ser traçado da seguinte forma: “numa primeira instância, os Sujeitos recebem
dados. Numa segunda instância, eles processam essa massa de dados. Numa terceira instância,
esse processamento gera respostas multifocais, ou seja, de sentidos variados” (2010. p. 66).
Para Kunsch (2002), é extremamente necessário extrapolar a ideia mecanicista da
comunicação, partindo para uma visão mais investigativa e criteriosa da mesma. O sistema
mecanicista traz um aspecto funcional e eficiente para a organização, tendo consciência que a
atuação comunicacional pode ser mensurada e uniformizada. Diante de tal fato, observa-se,
66
então, que a organização preocupa-se mais com “as estruturas formais e informais de
comunicação e com as práticas em função dos resultados, deixando de lado as análises dos
contextos sociais, políticos, econômicos, tecnológicos e organizacionais” (KUNSCH, 2002, p.
73). Nesse contexto, as organizações devem procurar adotar uma visão mais crítica, capaz de
atender as expectativas e anseios da sociedade moderna, desenvolvendo ações inovadoras e
coesas.
Nesse sentido, o pensamento de Torquato vai ao encontro do de Kunsch, pois o autor
também acredita que é preciso identificar novas linguagens que adquirem mais espaços
internos, amplificando a probabilidade da comunicação eletrônica nas organizações
(TORQUATO, 2002). Marchiori propõe que o uso da linguagem organizacional faça “a
reflexão sobre a própria prática quando se lida com uma noção de linguagem como ação
(performática14), cujos efeitos podem estabilizar/desestabilizar relações e organizações”
(2013, p. 67). Sólio entende que um processo de comunicação “somente se atualizará à
medida que houver interação entre Sujeito e essa interação, evidentemente, está relacionada a
uma permanente disputa de poder que desemboca na disputa de sentido” (2010, p. 66).
Kunsch (2002) observa que mesmo que as organizações tenham mudado muito nos
últimos anos, ainda assim, permanecem com atitudes comunicativas tomadas de uma cultura
tradicional e despótica do século XIX. Nesse caso, é tocante a observação de Torquato ao se
referir à organização reflexiva, menos mecânica e comprometida em desenvolver uma
linguagem, comunicação, mensagem, clara e concisa, o que evitará consideravelmente os
ruídos. Não esquecendo que pensar os processos comunicacionais “é ter em mente o Discurso,
pois é por meio da linguagem que o Sujeito acontece” (SÓLIO, 2010, p. 68).
Vamos nos deter a compreender os diversificados tipos de públicos existentes em uma
organização, que se relacionam entre si e constitui esse organismo social modificando
realidades e contextos.
5.2 OS DIFERENTES PÚBLICOS
Os públicos são elementos fundamentais nas organizações, é devido a sua interação
14 Atos da linguagem como atos performáticos significa dizer que as pessoas estão fazendo coisas com com as
palavras. O ato performativo é um ato político que se constitui na escolha intencional que o sujeito faz das
palavras, de pedras ou de imagens para construir representações aceitáveis dos acontecimentos, das
necessidades, das coisas do mundo. (MARCHIORI, 2013, p. 59).
67
com as organizações que novos questionamentos, estratégias e perspectivas surgem no
decorrer da história da comunicação, já que eles são objeto de estudo dessa área.
Nesse sentido, Kunsch colabora ao dizer que em específico para os profissionais de
Relações Públicas, uma etapa primordial “é o levantamento dos grupos ligados a uma
organização e a identificação desses grupos” (1986, p. 84).
Peruzzo, (1986, p. 42), conceitua público como “um grupo de pessoas que se
distinguem das outras por uma ou mais características em comum, como ler o mesmo jornal,
trabalhar para a mesma companhia, professar a mesma religião, frequentar a mesma escola ou
viver no mesmo bairro”. Para a autora cada público pode ser analisado de forma isolada, pois
cada um possui um comportamento singular, cada público pode se considerar objeto de
pesquisa para um profissional de relações públicas.
A noção básica que França dá “refere-se ao que é pertencente ou destinado ao povo em
geral, à coletividade em toda sua extensão. No sentido político, refere-se ao que pertence ao
governo de um país e está disponível aos cidadãos” (2008, p. 12).
Segundo Rodrigues, é uma
categoria moderna, criada no século XVIII, que, na origem era constituída por
pessoas esclarecidas com vista ao livre debate político, literário ou científico.
Tratava-se de uma categoria política empenhada no esclarecimento e na
emancipação do homem em relação ao obscurantismo e ao domínio do poder
autoritário e coercitivo do antigo regime. (2000, p. 97).
Seguindo uma classificação mais clássica, o público divide-se em interno, externo e
misto, sendo que o público interno engloba
os funcionários de todos os níveis e suas famílias; o externo comporta a imprensa,
consumidores, concorrentes, poderes públicos, “comunidade” onde a empresa atua, o
bairro, a cidade, etc. E o misto abrange acionistas, revendedores, fornecedores, etc.
Trata-se de uma classificação geral e pode variar conforme as características da
empresa. (PERUZZO, 1986, p. 43).
Fortes, nota que “os relacionamentos de uma organização com os grupos que para ela
se voltam […] serão transformados em públicos autênticos” (2003, p. 208). Em uma visão
tradicional, o autor também identifica quatro tipos de públicos: o interno composto por
funcionários e familiares; o misto são os que beneficiam a economia da empresa, como é o
caso de investidores, fornecedores, cooperados e intermediários; o público externo formado
pelo corpo social, sindicatos, imprensa, escolas, órgãos públicos, concorrentes, consumidores,
68
países e grupos internacionais; e por fim, o público em potencial, que são gratificados com
agilidade e quantidade satisfatórias de informações, solucionando dúvidas. Deve sempre
haver boa estrutura, organização, eficácia nas normas e ordens para atender esse público
(FORTES, 2003).
Kunsch também segue a mesma linha tradicional para categorizar os públicos em:
interno, misto e externo. “o interno é formado por, funcionários, diretores e seus familiares. O
misto, por acionistas, fornecedores e revendedores. O externo, por consumidores, imprensa,
comunidade, poderes públicos, concorrentes, escolas, sindicatos, bancos, etc” (1986, p. 84).
Porém, delimitarmos o conceito de públicos somente ao interno, externo e misto é um
erro, pois já
não é suficiente e não contempla a todos os públicos de interesse se os pensarmos
somente nessa estrutura. Conceituar Público é ainda mais complicado se ponderar
também as relações da economia, negociações empresariais e até mesmo o termo
globalização. (FRANÇA 1997, p. 13).
Simões (1995) concorda com França, no que diz repeito a restringir os públicos entre
interno, externo e misto, visto que os mesmos são “insuficientes para caracterizar o tipo de
relação público-organização” (p. 131). Baseado na documentação de Relações Públicas
francesa, o autor adaptou 4 classificações de públicos quanto ao traço de poder, como
parâmetro para outra tipologia. Os quais são
Quadro 3 – As relações de Poder como critério para outra tipologia
DECISÃO
Públicos cuja autorização ou concordância permite o exercício das
atividade organizacionais. Ex: governo
CONSULTA
Públicos que são sondados pela organização, quando a mesma pretende
agir. Ex: acionistas, sindicatos.
COMPORTAMENTO Públicos cuja atuação pode frear ou favorecer a ação da organização.
Ex: Funcionários
OPINIÃO
Públicos que influenciam a organização pela simples manifestação do
seu julgamento e seu ponto de vista. Ex: Seguidores habitual e
inconscientemente.
Fonte: SIMÕES, 1995, p. 132.
Na esfera organizacional há uma confusão ao definir a que público pertence os
funcionários terceirizados, os temporários, os acionistas, etc. Além desses questionamentos,
também pode-se indagar sobre empregados de uma transportadora que só comparecem no
69
escritório para receber e realizar a troca de turno, até mesmo a comunidade, órgãos
governamentais, entre outros, fazem parte de qual público exatamente (FRANÇA, 1997). As
alterações que acontecem na esfera organizacional, econômica e global, as formas de se
relacionar não se sustentam somente com as definições tradicionais, sendo necessário
“encontrar novos critérios para definir essa relação empresa/público” (FRANÇA, 1997, p.
13).
Uma alternativa dessa conceituação seria
em primeiro lugar, com aqueles que contribuem para a sua constituição,
fundamentando sua estrutura como uma organização coesa, produtiva e competitiva.
Em seguida, entram em cena os públicos que contribuem para viabilizar os negócios
da empresa, fornecendo-lhe tecnologia, matéria-prima, assistência técnica, etc.
(FRANÇA, 1997, p. 14).
Foi pensando em uma conceituação lógica de públicos que o autor categorizou os
mesmos em: púbicos essenciais, não essenciais e públicos de redes de interferência
Quadro 4 – Demonstrativo da conceituação lógica de público
CATEGORIAS
DEFINIÇÃO
ESSENCIAIS
São aqueles interligados judicialmente ou não
com a organização e dos quais ela depende
para sua constituição, manutenção de sua
estrutura, sobrevivência e execução de suas
atividades-fim. Ex: Investidores, sócios,
diretores
/Colaboradores,
fornecedores,
clientes, etc.
NÃO ESSENCIAIS
São definidos como teias de interesses
específicos, pelo nível de maior ou menor
envolvimento nas operações da organização.
Por não fazerem parte das atividades-fim, não
estão ligados à fatores produtivos, mas à
prestação de serviços ou à intermediação
política ou social. Ex: Agências de
propagandas, Sindicatos patronais, conselhos
profissionais, Comunidade de modo geral, etc.
REDES DE INTERFERÊNCIA
São considerados os públicos especiais por
conta do seu poder de liderança operacional ou
representativa junto ao mercado e à opinião
pública. Ex: Concorrentes diretos, indiretos,
Mídia impressa e eletrônica.
Fonte: FRANÇA, 2008, p. 77-83.
O autor observa que o principal objetivo do relacionamento organização-públicos
70
senta-se em interesses institucionais, promocionais ou de desenvolvimento de
negócios, assim como ocorre com os colaboradores, clientes, fornecedores,
revendedores e demais públicos ligados às operações produtivas e comerciais da
organização. Empresas e públicos têm interesses comuns de produtividade e
lucratividade. (FRANÇA, 2008, p. 72).
Nesse sentido, constata-se que há um interesse de relacionamento, assim como de
ganho financeiro, uma troca de interesses de ambas as partes, produtividade-lucratividade.
Existe uma parceria entre os públicos e as empresas, pois sabem que se trabalharem
coletivamente vão conquistar bons resultados. Na medida em que se consolida um ambiente
vantajoso propiciado pela qualidade funcional recaindo na identidade da empresa, mais
próximo os públicos proporcionarão então, bom relacionamento (FRANÇA, 2008).
Um novo conceito de público também são os Stakeholders, que Rocha (2010) explica
como termo originário da palavra inglesa stockholder (ou shareholder), que significa
acionista. Expande o foco da organização, que tem como objetivo atender não somente os
acionistas, mas sim os “públicos de interesse estratégicos, como clientes, funcionários,
imprensa, parceiros, fornecedores, concorrentes, sindicatos e a comunidade local” (2010, p.
6). Nesse caso, na gestão dos Stakeholders, a empresa é entendida como o núcleo de uma teia
de públicos interessados, e aquisição da vantagem competitiva 15, que tem por base a gestão
superior dos relacionamentos e interação com seus públicos.
França, observa que é um conceito de uso recente utilizado para “descrever as relações
das organizações com seus públicos e que aos poucos passou a ser utilizado também no
Brasil” (2008, p. 32).
Para conceituar Stakeholders, Harrison (2005, p. 31) diz que são “públicos de
interesse, grupos ou indivíduos que afetam e são significativamente afetados pelas atividades
da organização: clientes, colaboradores, acionistas, fornecedores, distribuidores, imprensa,
governo, comunidade, entre outros”. Os públicos que constituem os Stakeholders, geram
expectativa sobre a conduta da empresa, assim como, os resultados estimados por ela. Quando
não há satisfação desse público com as atividades exercidas pela empresa, sua imagem e a
reputação podem ser prejudicadas (HARRISON, 2005).
Fortes contribui ao dizer que há uma nova configuração no modo de relacionar-se com
as organizações, sendo que os grupos acabam por sua vez agindo como se fossem donos das
15 Conjunto de características ou atributos detidos por uma empresa que lhe confere certa superioridade sobre
os concorrentes imediatos. (ROCHA, 2010, p. 9).
71
empresas, ampliando a ideia de que os proprietários não se restringe somente aos donos da
organização. Os “'novos proprietários', os controladores do capital da empresa são os
primeiros a exigir a transparência da gestão, mas não são os únicos” (2003, p. 82). Os
stakeholders abrangem:
empregados, empregados em potencial e ex-empregados, sindicatos, fornecedores,
intermediários, poderes públicos, comunidade, ONGs, fábricas, escritórios e varejo
da vizinhança, líderes comunitários, ecologistas e grupos de interesse ambiental,
mídia de negócios, associações industriais, comerciais e profissionais, instituições
educacionais, parceiros e concorrentes dos produtos e serviços da companhia. (2003,
p. 82).
Podemos constatar que identificar os públicos não é tarefa tão simples se pensarmos
além da plataforma clássica, estimulando e desafiando a exploração do conceito tradicional
traçado por diferentes autores, pois os públicos não são estanques; pelo contrário, estão em
constante transformação, na forma de pensar, agir, falar, culturalmente e ideologicamente.
Apropriarmo-nos de tais conceitos é fundamental para percebermos a importância que esses
grupos desempenham e representam na esfera organizacional, bem como o porquê agem e
pensam de determinada maneira, devido a sua cultura e experiências vividas no particular e no
coletivo.
5.3 RESPONSABILIDADE SOCIAL E ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES
Como explicado ao longo desse capítulo, é inegável a necessidade da comunicação
para a vida social. É por intermédio dela, da linguagem, da relação interpessoal, que podemos
dar sentido às coisas, que significamos o mundo a nossa volta. Dessa forma, é de grande
relevância estudarmos seu impacto no cotidiano, seu compromisso na transmissão de
informações, já que ela incentiva, influencia, constrói culturas, fortalece ideologias, podendo
mascarar discursos para legitimar o poder. Guareschi afirma que a comunicação é tão
poderosa que “hoje, é tão ou mais vital que o petróleo” (2005, p. 66).
Para Pereira (2002), o que torna verdadeira a premissa “informação é poder” (p. 25) é
saber que aquele que detêm forças, condições para suprir necessidades básicas de outro
indivíduo, como a indispensabilidade de informação, seguramente está em uma posição de
poder. Acrescenta, ainda, que “a posse da informação qualificada confere autoridade,
diferencia o profissional de sucesso de outro menos afortunado, projeta uma empresa, antes
72
talvez inexpressiva, para níveis de competitividade insuspeitada” (2002, p. 25-26). Para
Barros (1995, p. 35), “a informação traz à intersubjetividade do processo comunicativo uma
nova perspectiva: a âncora no real, uma ponte entre o real e o campo da comunicação, entre 'o
fato e o acontecimento informativo”.
Por tais colocações, atualmente muito se tem discutido como os meios de
comunicação estão utilizando a informação, a transmissão da mensagem, “uma nova lei de
imprensa” como fala Pereira (2002, p. 13). Argumentos de que a lei foi criada nos anos da
ditadura militar e por isso carrega mecanismos de coibição são levantados para justificar
posicionamentos da imprensa como um todo. Guareschi, seguindo essa linha de pensamento,
observa que “durante a ditadura, os militares notabilizaram-se por uma censura ferrenha dos
meios de comunicação, principalmente da TV” (2005, p. 50). Tais exemplos não cabem
apenas para a visão macro dos meios de comunicação, mas também para o interior das
organizações, aos responsáveis por produzir a comunicação.
Para Pereira é evidente
a íntima conexão entre consecução da função social própria dos meios de
comunicação e obtenção das metas empresariais de índole mais econômicas. Em
poucas áreas é também tão patente o dano que se pode produzir na sociedade,
quando se sobrepõem ao fim social fins estritamente egoísticos. (2002, p. 37).
Nesse sentido compreende-se que
o reconhecimento da função social dos meios de comunicação não é importante
apenas para o fim de disciplinar as sanções ao seu abuso. Igualmente relevante é a
consideração dessa função para disciplinar as garantias que se devem assegurar à
imprensa para o escorreito desempenho dos seus fins. (PEREIRA, 2002, p. 41).
Os meios de comunicação também possuem um papel político, segundo o autor, que é
“pela realidade sociológica do poder que exercem na conformação da cultura e dos
comportamentos, com todo o impacto político que isso apresenta” (2002, p. 42). Guareschi
contribui ao explicar que a “classe política depende muito dos meios de comunicação para
eleger seus integrantes” (2005, p. 50).
Guareschi (2005), entende que para que seja possível haver democracia em uma
sociedade, é necessário que exista democracia na prática do poder de comunicar, e
democracia está relacionada à autonomia popular e na divisão igualitária dos poderes. O autor
coloca que a empresa, como meio de comunicação de massa, é diferente de outras empresas,
73
porque interfere no pensar e agir do ser humano, dando significado aos objetos, auxilia na
criação da cultura, os variados pontos de vistas e princípios das gerações.
É indispensável ponderar sobre os comunicadores, o quanto eles têm de consciência
das responsabilidades em transmitir uma informação, se possuem liberdade para expressar
suas ideias, o quanto estão dispostos a manter-se monitorados e abertos à criticas e
julgamentos da sociedade (GUARESCHI 2005). Os profissionais responsáveis pela
comunicação nas organizações devem estar cientes do compromisso com os funcionários que
compõe e fomentam o desenvolvimento dela. Não somente os grandes veículos de
comunicação, mas, também e, principalmente, as organizações, por serem a base da estrutura
comunicacional que antes de ser privada, deve saber que é um bem público, “devendo sua
prestabilidade estar à disposição da coletividade, do interesse da sociedade ou governamental,
vale dizer, a serviço do desenvolvimento humano nos aspectos educativos, culturais, artísticos
e éticos” (GUARESCHI, 2005, p. 67).
Rodrigues entende que o prisma da ética na comunicação está na relação entre o
discurso e a ação.
Em síntese no domínio da comunicação, por um lado, uma ética discursiva que tem
sobretudo a ver com o estabelecimento das regras que presidiam à interlocução e ao
diálogo com vista ao estabelecimento de consensos e à gestão das dissenções dos
conflitos e dos diferendos, e, por outro lado, uma ética da ação, que tem a ver com as
regras que regulam a interação, isto é, as normas da ação justa tendo em conta os
valores ou o quadro axiológico. (1995, p. 49).
Para o autor (1995, p. 49), “os dois domínios éticos não são, no entanto, equivalentes
nem teórica nem praticamente”, a interlocução baseia-se em princípios que requerem uma
adaptação e manifestação da linguagem, legalizando o poder dizer, a autorização ou a
imposição de os sujeitos se comunicarem. Já, a interação baseia-se em princípios funcionais e
instrumentalidade, esse “legitimado pelo direito e pelo dever de agir” (RODRIGUES, 1995.
p. 49). Não se deve restringir a ação ao domínio do discurso, mesmo quando considerar o
discurso como uma ação que interfere no meio social, pois, assim, corre-se o risco de misturar
“a ação discursiva com outras modalidades da ação” (1995, p. 49).
Para Srour, falar de ética nas organizações é falar de moral, pois, “não há agrupamento
humano que não obedeça a um sistema de normas morais” (2003, p. 269). Mesmo quando
essa moral não é convencionalmente aceita perante as demais coletividades, sendo que cada
grupo pode adotar uma moral interna e outra externa. Segundo o autor, “as normas morais são
74
simbólicas e animam as relações de saber 'hegemonia e conformidade'” (2003, p. 270). De
forma que a moral torna-se um discurso verdadeiro e se encontra no coração da ideologia,
pois a moral já demonstra um posicionamento ideológico e também refere-se em último caso
aos desejos envolvidos, como no caso da responsabilidade da comunicação organizacional em
saber qual é a melhor informação que deve ser veiculada.
Na medida em que compreendemos as responsabilidades que a comunicação possui na
sociedade e principalmente no ambiente organizacional, vamos agora buscar explorar a
função social do profissional de relações públicas dentro das organizações e seu
comprometimento com uma comunicação pluralizada.
5.4 RELAÇÕES PÚBLICAS: MISTIFICAÇÕES E CONTRADIÇÕES
Para Kunsch, (2002, p. 91), as relações públicas “têm como objeto as organizações e
seus públicos, instâncias distintas, mas que, no entanto, se relacionam dialeticamente”.
Trabalham com o gerenciamento e promoção dos relacionamentos, utilizando métodos,
planejamentos de comunicação conforme as variadas situações experienciadas no contexto
social. Sendo assim, a clareza das ações e confiabilidade das fontes, são essenciais para o bom
relacionamento da organização com a sociedade, além de colaborar para a implantação de
cidadania no sentido de responsabilidade social (KUNSCH, 2002).
O profissional deve, então, facilitar a comunicação da organização com a sociedade,
alertando a mesma para assumir uma postura comprometida, pensando além da prática
“voltada para o setor privado ou governamental e atuar em uma nova dimensão, pondo-se a
serviço, também, das comunidades locais e das organizações sem fins lucrativos” (2002, p.
129). A autora defende que esse processo de conscientização de cidadania é importante pois,
dessa forma o sujeito tem consciência que pode participar da transformação e construção de
uma sociedade mais digna, consciente de que os aparelhos do Estado não conseguem sozinhos
dar conta de atender a todos que dele necessitam. Nesse contexto, as organizações estão sendo
desafiadas a ter novos olhares e novos posicionamentos para a idealização da cidadania.
No que se refere à cidadania, ela é “um arcabouço social que requer o envolvimento de
pessoas, condicionando-se seu status à qualidade da participação. Essa é uma de suas bases.
Outra está na noção de que suas formas se condicionam ao tipo de sociedade política em que
se vive” (PERUZZO, 1998, p. 258. Grifo da autora). A autora explica que ser cidadão é sentir-
75
se legalmente protegido; é ter direito de ir e vir, de poder intervir na esfera política; é poder
manifestar-se, é ter os direitos garantidos da constituição, como casa, comida, educação,
trabalho. Enfim, é ter o direito de compartilhar com equidade na fabricação, na coordenação,
assim como, no desfrute dos recursos “econômicos e culturais” (1998, p. 286-287).
Peruzzo, segundo a Associação Brasileira de Relações Públicas, define Relações
Públicas como “a atividade e o esforço deliberado, planejado e contínuo para estabelecer e
manter a compreensão mútua entre uma instituição pública ou privada e os grupos de pessoas
a que esteja direta ou indiretamente ligada” (1986, p. 33). Seu ofício se fundamenta em agir
sobre a mente dos indivíduos organizacionais, buscando ajustar os desejos da empresa com o
de seus públicos; buscando harmonizar os interesses dos indivíduos com os da organização.
No modo de produção capitalista, a finalidade do RP na contemporaneidade do
amadurecimento da profissão é “fazer com que o interesse privado adquira uma roupagem de
interesse público” (PERUZZO, 1986, p. 34). Nesse sentido, a noção que se tem é que as
atividades do profissional destinam-se ao bem comum, que buscam respeitar e reconhecer o
interesse do público, que não influenciam opiniões, entre outras características peculiares da
função do profissional, vista de um ângulo tradicional (PERUZZO, 1986).
Em contrapartida, é extremamente necessário examinar que a função social do
Relações Públicas
é assegurar a existência das condições favoráveis à reprodução do capital […].
Porém, ao mesmo tempo procura-se camuflar esse comprometimento e os
antagonismos estruturais ao atribuir que os conflitos são oriundos da ausência de
comunicação ou de comunicações deficientes. (PERUZZO, 1986, p. 51).
Sendo assim, a autora nota que há uma disparidade entre a prática e a teoria do RP, um
lado admite seu papel influenciador em prol do capital e o do outro a percepção que hesita em
assumir tal posição. Na prática, as relações públicas “querem harmonizar as desigualdades e
na teoria baseiam-se na igualdade, admitindo (teórica e praticamente), apenas conflitos,
desarmonias ou desajustes de interesses” (PERUZZO, 1986, p. 52). Ao querer garantir
condições para a reprodução do capital, fica claro que um dos objetivos do profissional é
servir à burguesia, que
dentro da sua ideologia divulgam-se ideias procurando fazer 'com que os homens
creiam que são desiguais por natureza e por talento, ou que são desiguais por desejo
próprio. […] Ou, então, faz com que creiam que são desiguais por natureza, mas que
a vida social, permitindo a todos o direito de trabalhar, lhes dá iguais chances de
76
melhorar – ocultando, assim, que os que trabalham não são senhores do seu trabalho
e que, portanto, suas 'chances de melhorar' não dependem deles, mas de quem possui
os meios e condições do trabalho. (PERUZZO, 1986, p. 54).
Simões explica que o surgimento da profissão de relações públicas, segundo lugares e
culturas onde ela mais se expandiu, aponta indícios de que o ofício tem por base as “relações
de poder entre as organizações e seus públicos, assim como na possibilidade iminente do
conflito entre ambos” (1995, p. 51).
É importante desmistificar, despersonificar a ideia clássica e tradicional do
profissional de relações públicas, perceber e analisar no que implica o ser relações públicas,
com o que se quer compactuar ou desvelar; se a função social está para servir e emancipar a
cidadania ou para favorecer as classes mais abastadas; se para ser mais um profissional
atuante na área ou um profissional que não compactua com ações, discursos, linguagens que
não condizem com seus valores e ideologias (PERUZZO, 1986). Acreditar que ser RP é
prestar serviço à comunidade de modo geral e não a uma elite dominante, é fazer com que seu
discurso seja coeso com sua prática.
Não temos como propósito reduzir a imagem do profissional de relações públicas, mas
queremos abordar características que muitas vezes são encobertas e pouco discutidas, mas que
competem às funções do profissional no meio organizacional, seja ele privado ou público. É
fundamental colocar em pauta as atribuições que são direcionadas aos RPs, sendo eles
responsáveis por uma comunicação pluralizada e igualitária. Entendemos então que o relações
públicas precisa ser um agente de transformação social. Na medida em que tem espaço
concomitantemente junto ao capital e ao trabalho, deve ser seu papel buscar a transformação
social a partir de um novo olhar das organizações em direção ao trabalho e à sociedade, numa
posição de aprendizado e de escuta que, a médio prazo representará um crescimento sólido e
efetivo tanto dessa sociedade quento da organização que ela acolhe.
77
6 O TRABALHO DE CAMPO
Resgatando o tema da nossa pesquisa, o discurso como estratégia nas relações de
poder, definimos então, realizar entrevistas em profundidade com dezesseis funcionários da
empresa analisada para melhor investigar tal discurso. Criamos um questionário com
perguntas ligadas à comunicação e integração, e relações de poder. As entrevistas ocorreram
em datas distintas, sendo que todas foram agendadas com antecedência com os funcionários
mediante a liberação dos seus superiores; as mesmas foram realizadas em datas diferentes, no
período de um mês, e todas foram gravadas com um gravador digital.
A escolha dos entrevistados se deu pelo método de sorteio, variando entre a matriz e as
cinco filiais e levando em conta a representatividade dos seguintes segmentos: mulheres,
homens, funcionários mais velhos, funcionários mais jovens, chefias, funcionários sem poder
de decisão, com bom tempo de casa e contratados há pouco tempo. Apenas um funcionário se
recusou a responder as perguntas; nesse caso, então, realizamos a entrevista com outro
funcionário, igualmente sorteado.
Na investigação das informações captadas, o sigilo dos entrevistados será assegurado,
pois nomeamos os mesmos por letras do alfabeto de A a P. Para relacionarmos uma fala com a
outra na análise, apenas distinguiremos por diretora 1 e diretor 2, chefe e funcionário,
seguido das letras (no caso dos diretores, utilizamos apenas números). Quando funcionários
que não foram entrevistados forem mencionados, serão referidos como funcionário (a) X.
Com base na pesquisa bibliográfica e por meio das entrevistas, pretendemos responder
nosso problema de pesquisa: o discurso funciona como um instrumento para o
estabelecimento de relações de poder em uma organização? Realizada a análise das
entrevistas, ao computar os dados, vamos identificar algumas ações estratégicas que
acreditamos que possam ser aplicadas na empresa estudada, auxiliando na comunicação
interna.
O fato de as questões terem sido construídas em estrutura aberta proporcionou aos
entrevistados mais liberdade para expressar suas opiniões. Considerando a estrutura aberta das
entrevistas, ressaltamos que o questionário sofreu alterações conforme o desenvolvimento das
entrevistas. O roteiro de questões divide-se em dois momentos, um com perguntas
relacionadas à comunicação interna e integração e, outro direcionado às relações de poder,
facilitando assim, na estrutura da análise.
78
1º – Sobre a comunicação interna e integração.
a) Como funciona a comunicação dos chefes com os funcionários? Há uma estrutura
de hierarquia na comunicação?
b) Como é gerenciada a comunicação entre as filiais?
c) Quais os meios de comunicação que a empresa possui?
d) Quem é responsável pela comunicação interna da empresa?
e) A empresa é mais formal ou informal na forma de se comunicar?
f) A empresa desenvolve momentos de integração durante o ano?
2º – Relações de Poder.
g) As escalas de trabalho dos finais de semana são construídas em conjunto com os
funcionários?
h) Quanto à liberação para consultas, exames, etc, como é feita essa comunicação
aos gestores? É realizada com antecedência, interfere na escala de trabalho?
i) Como é a relação entre as pessoas do escritório e os da pista?
j) Os trabalhadores sabem que mesmo não estando no papel, existe uma hierarquia
de poder de decisão na empresa? Como funciona?
k) Os funcionários têm liberdade para mudar sistemas e rotinas e para sugerir coisas
novas?
l) Tem hierarquia na comunicação?
m) Existe uma rotatividade na empresa? Por quê?
Na medida em que percebemos que determinada questão levantada pelo entrevistado
poderia ser mais aprofundada, perguntas foram incluídas, dando mais forma e consistência à
pesquisa. As respostas dos entrevistados serão defrontadas para que possamos analisar como
funciona a comunicação da empresa e as relações de conflitos, tendo como base, a análise do
discurso.
6.1 ANÁLISE DO DISCURSO NAS ENTREVISTAS
Para compreendermos qual é o discurso assimilado pelos funcionários na empresa
pesquisada, examinaremos as falas descrevendo-as e relacionando-as com as palavras chaves
que nortearam o estudo: Organizações, Comunicação Organizacional, Discurso, Poder.
79
6.1.1 Comunicação interna
Quando questionado sobre como funciona a comunicação dos chefes com os
funcionários, o funcionário C, diz:
Pelo meu ver, assim, tá sendo boa a comunicação com eles e com nós, assim né.
Mas, tem momentos, como que eu vou te dizer, [silêncio] que tem alguma coisa de
errado, ele, ele, fica quieto [silêncio], assim, não dá explicação pra a gente: - Não,
vai ali e faz assim, faz assim que fica mais fácil. Alguma coisa, assim, para se tornar
mais fácil pra a gente. Fora isso é tudo bem, tudo tranquilo com nós e com ele.16
Já para o seu chefe B
[Silêncio] Bom, a gente tem algumas reuniões né [silêncio], com o grupo todo e
também a gente conversa particularmente com cada um deles e, assim, a gente
passa todas as explicações, principalmente individualmente, para que eles
entendam o que nós, gerentes, queremos.
Logo percebemos que não há conformidade nas respostas, visto que para o chefe B,
ele sempre passa todas as informações, explica os procedimentos para que os funcionários
consigam compreender o que ele quer, e ainda frisa que elas são transmitidas “principalmente
individualmente”. Sendo que o próprio funcionário sente uma carência de explicações que
possam auxiliar no desempenho da sua função.
Hornstein observa que “em toda empresa, todo escritório e todo ambiente de trabalho,
os funcionários estão atentos às mensagens subjacentes às práticas e políticas dos líderes, na
tentativa de decidir se estão sendo considerados nós ou eles” (2003, p. 17. Grifo do autor). No
caso citado acima, o chefe identifica-se como “nós, gerentes”, pois ele faz parte de um grupo
que se encontra em um degrau acima “deles” – os funcionários.
Quando essa mesma pergunta é feita para a diretora 1, essa responde que
ocorre reunião uma vez por mês, reuniões com os gerentes. Era eu que participava
[…], e agora quem tá participando é o diretor 2 [pausa]. Então com o diretor 2, a
gente nota que surte mais efeito. Talvez porque ele seja homem, mais durão, é com o
diretor 2 que tá acontecendo. E assim ó, quando o diretor 2 vê que tem a
necessidade, tá acontecendo isso e isso, ele chama todo mundo.
A diretora 1, nesse momento, lembra diretamente da comunicação que mantém com
16 Todas as falas de pessoas entrevistadas estarão em itálico, para diferenciá-las de citações de autores.
80
os gerentes, nominados aqui por chefes, não fazendo referência aos demais funcionários da
empresa, em uma fala com indícios machistas, colocando que o outro diretor, sendo homem,
consegue ter mais controle da situação por ser “mais durão”. A fala denota, também, uma
cadeia hierárquica de cima para baixo. Diretores falam com chefes e chefes com funcionários.
Quando o chefe fala ao funcionário, há a presença do diretor (hierarquia simbólica).
A funcionária P, ao responder a mesma pergunta, explica que: “[cochicha e fala
ironicamente: 'Meu chapéu!']. Não há, assim, uma gestão muito organizada da parte deles de
conversa, de avaliação de desempenho, mas dentro do possível e do andamento das coisas o
relacionamento é bom”. Quanto às reuniões, ela acrescenta “a gente tem as reuniões dos
gerentes todo mês que na verdade não é seguido também, não é todos os meses, às vezes, tem
mês que não dá, aí não sai né”. Podemos observar que na frase que sai entre cochichos pode
estar implícito um “meu deus, como falar disso de maneira tênue”, além de revelar que as
reuniões não ocorrem regradamente todos os meses, como expressado pela diretora 1.
A funcionária E, percebe que há uma carência de relacionamento por parte dos
diretores com os funcionários ao dizer que: “Eu acho que a comunicação é boa, a
comunicação interna, (pausa). Eu só acho que nas datas festivas, sabe, comemoração que
nem 1º de maio ou final de ano, eles deveriam ter um contato maior com eles – o que não
tem, né”. Ao pedir que a mesma explicasse a frase “eles deveriam ter um contato maior com
eles”, a mesma responde:
Eles, os chefes, no caso […]. Eu acho que isso influencia alguma coisa, sabe, se
eles fossem visitar, ou, pelo menos, nas datas festivas, né, 1º de Maio, que é o Dia
do Trabalhador, que eu acho que seria importante um contato com o funcionário em
si, ainda mais os da pista, né.
É interessante trazermos a visão que França tem sobre relacionamento dos públicos,
visto que os funcionários internos fazem parte de uma categoria de público também, quando
esse diz que, “o relacionamento não pode ser ocasional, esporádico, como se fosse uma
relação de compra e venda. É preciso que ele seja planejado na sua intenção, no seu
acompanhamento e no seu desenvolvimento” (2008, p. 74). Segundo o autor, é preciso ter
cuidado para que essa proximidade com o funcionário não seja infundada, rasa, mas sim
projetada, preocupando-se sempre que tal contato não seja acidental ou efêmero, assim como
ministrar informações e analisar se ela está sendo coletada e captada conforme os interesses
da empresa.
81
Voltando ao contexto de análise da fala da funcionária E, essa influência colocada pela
mesma se atribui ao fato de
se sentirem parte da empresa, né, porque eu acho que isso motiva mais o
funcionário, né, como parte da empresa, poxa, eu conheço o meu supervisor ou o
dono, né… Como, por exemplo, a Randon, né, nas festas vai o dono da Randon e
aperta a mão, aí eles se sentem importantes… eu acho que isso é importante para
uma empresa, o pessoal, o chão de fábrica, ou no caso a pista, ter esse contato que
eu vejo que não tem, sabe. Talvez eu esteja errada, mas nos seis meses em que eu
estou aqui eu percebi que não existe isso.
Para
Freitas, “a vantagem de se poder dizer e se sentir pertencente a um grupo
exclusivo faz da dificuldade de ser nele admitido o melhor prêmio, reforçando o sentimento
de pertença ou a necessidade e filiação existente em todo ser humano” (2002, p. 101).
No que diz respeito à frase “parte da empresa”, Scroferneker entende que, “o
pertencer é o fazer parte. Expressões como 'nessa organização somos uma família', aqui na
'empresa somos um time', 'aqui é a nossa casa', buscam de certa forma fomentar e legitimar
esse sentimento, essa necessidade” (2010, p. 192). A vontade de pertencer faz com que o
indivíduo identifique-se cada vez mais com a organização, assim como, com a cultura
praticada, sendo que “algumas vezes mascara uma realidade negada, a de efetivamente não
pertencer. O indivíduo assume (consciente ou inconscientemente) o seu não-lugar. Percebe-se
excluído, embora incluído, e busca (re)definir seu lugar” (2010, p. 192).
Sólio (2010) diz que em qualquer organização é possível depara-se com processos de
identificação, prestígios, idealização ou coibição, seja nos relacionamentos entre duas pessoas
ou em grupo.
No que diz respeito à comunicação entre as filiais, a diretora 1 exprime que:
O que eu sinto assim, a gente tem o RH tá, eu sinto uma distância do RH com as
filiais. A função do RH é fazer essa comunicação entre aqui – matriz [Grifo nosso] e
as filiais e o RH não tem comunicação nenhuma com as filiais. Faz tempo que eu
sinto isso, entende, e eu já tentei cobrar da pessoa do RH só que ela tem dificuldade
de fazer isso.
Para o chefe B:
[Silêncio] Eu acredito que, pelo que eu vejo, as filiais acho que são meio, tipo,
separadas, cada um tem os seus problemas, fica na filial. Eu não vejo muito, só os
gerentes, os funcionários, particularmente, eu acho que não há, tipo assim, uma
comunicação muito, como que vamos dizer, (silêncio, suspiro, “Ah cara”, silêncio)
eu acho que cada um fica na sua, na verdade né. Quando acontece algum
82
probleminha sempre tem alguém que é mais amigo, mas se não, não. A situação de
cada filial fica dentro de cada filial, eu acredito, alguma coisinha sempre escapa,
mas aparentemente é para ficar tudo dentro da filial, qualquer coisa.
O funcionário A observa que “a gente, na verdade, não é avisado, é gerente com
gerentes, mais é gerente com gerente né, especificamente é gerente com gerente”.
É possível notar que não há conexão na comunicação entre as filiais, visto que a
diretora 1 parece preocupada em delegar essa função somente para o setor de RH, mesmo
que essa preocupação diga respeito, e muito, à direção. Já, o chefe B, entende que não há
comunicação entre elas, pois, cada uma resolve os problemas particularmente, as divergências
ficam dentro da filial. Por fim, o funcionário A constata que a comunicação entre as filiais
ocorre de chefe para chefe, os mesmos não tendo muito como intervir nesse meio.
Sobre a formalidade ou informalidade das normas, regras e comunicação em geral,
quanto à forma de comunicar e quanto à linguagem. Para a diretora 1, “é mais boca a boca,
porque como eu te disse, a gente tem essa dificuldade no RH, entendeu. Então é mais, mais
assim oh, vem aqui é falado. Mais dessa maneira”. A funcionária H, “acha que é mais
informal. A linguagem depende, se essa informação vier do diretor 2, já a gente tem um
pouco mais de dificuldade. Não é muito claro no que ele tá pedindo”. O funcionário C,
expressa que:
Não, é de boca a boca. Eles fala: Tem que fazer isso hoje, a regra de hoje é essa. E
daí, como que vou te dizer, não, eles só falam de boca né. Eles mandaram lá de
cima fazer isso e isso, não tem folheto, assim, que diz algumas regrinhas, alguma
coisa que tem que fazer, ele só chegam e fala para a gente e a gente tem que
cumprir o que eles dizem né.
De modo geral, é utilizada uma linguagem verbal e popular na comunicação, exceto
quando é transmitida pelo diretor 2.
Quando questionados sobre quais seriam os meios de comunicação utilizados pela
empresa, se eles existiam e como funcionavam, o funcionário M inicialmente diz: “Não, isso
aí não tem”. Após explicar se existia algum manual, mural ou informativo, o funcionário
retoma dizendo:
Todo mural, por exemplo tem aniversário, o tempo de empresa né dos colaborador,
tudo isso aí, vem no mural, mas de preço, de combustível que sobe, isso daí é tudo
as guria lá da matriz que passam pra nós, e depois eles vem e fazem o trabalho
deles e de manual não tem, quem me explicou as coisas aqui foi o próprio gerente.
83
Já, a funcionária H, logo identifica que “A gente recebe… Na verdade, quando eu
entrei não tinha isso. Hoje tem uma, [ããã], um, como é que se diz, um… Um jornalzinho de
integração. E quem recebe isso são os funcionários novos de quais são as regras, como
funciona, quais são os benefícios… Isso tem hoje”.
Observamos que o funcionário M somente reconheceu os recursos comunicacionais
utilizados pela empresa quando foram dados exemplos de quais seriam. A resposta da
funcionária H nos faz compreender, ainda, que o manual de integração da empresa – o qual,
quando a mesma começou a trabalhar no Posto, sequer existia – era desconhecido até mesmo
dos funcionários mais antigos. Estes, por sua vez, não receberam o manual durante a
integração (pois este não existia, visto que foi criado em 2014), nem após sua concepção (pois
já estavam “integrados”), de forma que não houve nenhuma padronização no processo de
integração dos funcionários, fazendo com que nem todos ficassem a par das mesmas
informações. Constatamos, assim, que não é explicitado aos funcionários o processo de
comunicação da empresa.
Sobre a prática de desenvolver integração entre os funcionários durante o ano, o
funcionário M responde: “Não isso não, só a festa de final de ano mesmo do posto, mas daí é
o gerencial lá né, os que organizam, aí vai todas as filiais, uma vez por ano, mas assim da
gente fazer uma vez por mês uma janta, um a coisa não”.
A funcionária H responde que: “Não. Não ocorre essa integração... até tem
funcionários que trabalham aqui que eu [ããã], eu não conheço, que faz um ano que tá aqui e
eu só conheço na festa de integração, no caso a festa de final de ano. Não tem essa...essa...
essa integração não tem”.
O funcionário J lembra que: “É todo final do ano tem a festa do posto né”.
Segundo o funcionário K: “Não, ali no posto nós só fizemo quando alguém sai de
férias nós fizemo um churrasquinho ou quando alguém faz aniversário, só os da pista,
gerente alí, só nós ali. Só nós que trabalhamos alí, só nós que fizemos assim”.
Podemos observar a pouca ou quase inexistente integração entre os funcionários, tanto
que eles somente conseguem lembrar da festa que acontece no final do ano. O funcionário K,
que é novo na empresa, não conhece ainda essa integração. Por isso, lembra somente dos
encontros que realizam em datas esporádicas, e enfatiza que ocorre somente com os
funcionários da sua filial.
Quando perguntado quem seria responsável pela comunicação interna, a funcionária
84
H, explica que “é o RH”.
Como comprova a funcionária P, ao falar: “Sou eu do recursos humanos”.
Constatamos então, que a empresa não possui um departamento de comunicação,
tampouco um profissional da área que desenvolva a comunicação interna, o que pode resultar
na pouca habilidade da parte de quem produz essa comunicação ao informar, apresentar um
planejamento, estratégias de comunicação, analisar o clima da empresa para executar ações
que favoreçam uma comunicação mais eficaz entre os membros.
6.1.2 Relações de poder
Quando questionados sobre a existência de hierarquia na comunicação, o funcionário
G, responde o seguinte: “Olha… eu desconheço um pouco, assim, dessa parte, se há ou não
há…” e se contradiz ao colocar que “mas, geralmente, eu falo com o gerente. No meu caso,
assim, eu sempre se tivesse que pedir ou falar alguma coisa, comentar, eu falava com o
gerente, sempre com o gerente. Geralmente eu falo pra ele, o gerente ali, direto”.
O mesmo acontece com o funcionário J, quando ele expressar que “Não, é todo
mundo igual. Quem ensina, pra quem as coisas são mais direcionadas é o chefe!”.
Chauí traz que a hierarquia, são lugares “autorizados a falar e a transmitir ordens aos
degraus inferiores e aos demais pontos da hierarquia que lhe forem paritários” (1997, p. 11).
Isso demonstra a pouca ou nenhuma compreensão que os funcionários possuem do
fato de ocuparem o papel de subordinados, tendo que “prestar satisfação” à outra pessoa. Num
primeiro momento da resposta, na entrevista, eles se confundem, logo depois percebendo que
essa hierarquia existe e é praticada pelo seu chefe. Para Hornstein,
é evidente que o exercício da autoridade não é a causa da alienação dos funcionários.
As hierarquias podem ser íngremes, ligeiramente inclinadas ou planas. Os
funcionários podem estar localizados perto do topo ou da base da hierarquia. Nada
disso é mais importante dos que as mensagens dos líderes ao definir quem está
dentro do círculo corporativo do nós e quem faz parte do grupo externo do eles.
(2003, p. 51).
Já para o funcionário A: “Não, realmente tem, porque a gente tem a pessoa certa já,
que é indicada para isso. A gente tem uma pessoa que passa para a gente os valores, por
exemplo, assim, os aumentos da gasolina, a gente tem a pessoa”.
E a funcionária O afirma existir tal hierarquia: “sim, sim. Daí seria a diretora 1 né.
85
Qualquer dúvida, qualquer coisa, eu sempre vou ver com ela”.
Para a funcionária P, a hierarquia é muito importante, segundo seu ponto de vista, ao
afirmar que: “comigo assim o que que acontece, eu só não permito que eles me liguem direto
pra falar comigo, porque tem que ter né uma hierarquia, eles têm o líder deles, tem o gerente
de pista, então eu peço que eles peçam a eles, eles me ligam”.
Nesses casos, é possível perceber como é dissonante o entendimento dos entrevistados
ao responderem a mesma pergunta. Enquanto dois não notam a relação de hierarquia que os
diferencia não só em salário, mas no poder de tomada de decisões na relação chefefuncionário, os outros confirmam essa hierarquia dando inclusive exemplos de situações em
que ela acontece. Eles evidenciam e legitimam o patamar do seu chefe ao exprimir que “a
gente tem a pessoa certa já, que é indicada para isso”. Hornstein nota que “O respeito, e não
as regras, e a preocupação empática, e não o calculismo frio, são as ferramentas mais práticas
dos líderes” (2003, p. 52).
Sendo nosso estudo de caso aplicado em uma rede de Postos de combustíveis,
acreditamos ser pertinente perguntar se os mesmos trabalhavam por escalas de trabalho nos
finais de semana, bem como se eram construídas em conjunto com os funcionários. Ouvimos
a seguinte resposta do funcionário C: “É feito, assim, em conjunto”. Para sermos mais claros
na pergunta, perguntamos se o chefe chama todos os funcionários para organizar junto, então
a resposta que vem é, “Individual, individual. [Silêncio]. Como esse final de semana não…
foi ontem, ele chamou e disse: Ó, o fulano vai trabalhar esse domingo [silêncio], você não
vai, só vai trabalhar no outro, é assim, assim que funciona”.
Ao responder a mesma pergunta, seu chefe B explica que:
Antes não, antes cada um escolhia o domingo que queria trabalhar, então esse
próximo domingo dois trabalham e o outro domingo é os outros dois. Hoje não, hoje
eu tô fazendo, coloco dois esse domingo e dois no próximo e vou intercalando,
conforme… Se eles realmente necessitam trabalhar dois a fio, por causa da folga,
eles trocam, se não é eu que tô fazendo, junto com eles. Pergunto para eles, aí se
eles querem trocar é que nem eu disse, entre eles né, mas geralmente é eu que estou
fazendo agora.
Nesse caso se verifica que a discordância é enorme, pois a princípio o funcionário C
revela que a escala é feita em conjunto e depois diz que é individual, porém um individual que
nos parece ser feito em alto e bom som, fazendo com que os demais funcionários escutem
também. Então o seu chefe B é extremamente contraditório, por hora falar que atualmente é
86
ele que faz e hora dizer que ele está fazendo junto com os funcionários.
Acreditamos ser oportuno colocar que o chefe não trabalha finais de semana e
feriados, salvo no sábado até o meio dia. Isso é possível notar ao escutar do funcionário K
que,“o gerente não trabalha, nem domingo e nem feriado, só sábado até meio dia”.
Sobre liberação para consultas, exames particulares, qual seria o procedimento
adotado, sua interferência nas escalas de finais de semana e se as mesmas têm que serem
feitas com antecedência, obtivemos as seguintes explanações. O chefe L comenta:
Olha, quase não tem acontecido, muito pouco acontece, mas quando tem eles fazem
na folga né. Trabalha no domingo, tu tem uma folga na semana. Não chego a falar
pra eles fazerem na folga, mas isso já é de bom senso, o funcionário pra não
complica, ele já procura por ele mesmo já se organizar na folga.
O funcionário M responde que:
quando é pessoal a gente pede liberação pra sair pro gerente. Sempre avisamos
antes. É, geralmente a gente marca na folga, só quando não tem mesmo como
marca na folga né, que não tem horário, dependendo do que, mas geralmente é na
folga, já deixo tudo pra fazer na folga.
O funcionário G explana que:
eu tento sempre marcar na minha folga, ou quando tenho, que não dá, eu comento
com o gerente, se tem como liberar. Aí a gente combina o horário, de repente eu
troco de horário, que dê pra mim fazer. É sempre com antecedência que aviso e não
interfere nas escalas porque eu sempre procuro marcar na minha folga.
Segundo o funcionário I, ele se preocupa com isso ao ponto de expressar: “é melhor
tu avisar porque senão ele vai ficar com um a menos, que ele vai precisar. Tipo assim, se eu
faltar, ele precisa de mim”. É apropriada a contribuição de Hornstein nessa linha de raciocínio
a confiança não consiste em mera sutileza social nem na consideração e preocupação
dos líderes pelos funcionários. É claro que esse tendem a considerar “boas pessoas”
aos líderes que genuinamente apresentam tais qualidades. Mas, para as empresas, o
valor desses líderes transcende as relações públicas. Ao desenvolver a identidade
organizacional nos funcionários, eles propiciam à empresa vantagem competitiva
com efeitos mensuráveis de lucro. (2003, p. 53).
Tal citação se assegura na fala do chefe F: “é [gaguejo] sempre é bom avisar antes,
né? Porque a gente também, a empresa (ã) precisa de uma posição, né?”.
Em tais pensamentos já está embutida a ideia de pertencimento e identidade com a
87
organização, pois para os mesmos a empresa é “como sua família”, em uma relação que não
se pode “faltar” com ela, mesmo em caso de doença. Freitas (2002) colabora nesse aspecto ao
explicar que o imaginário17 só pode ser manifestado pelo simbólico, carregando uma
capacidade de substituir posições, ver uma coisa no lugar de outra que não está lá. É
exatamente nesse ponto que as empresas criam táticas para captar o imaginário dos
funcionários, fazendo com que os mesmos aceitem e concordem com situações pouco
saudáveis fisicamente e mentalmente.
Para Chauí (1997, p. 21), “através da ideologia, são montados um imaginário e uma
lógica da identidade social com a função precisa de escamotear o conflito, dissimular a
dominação e ocultar a presença do particular, enquanto particular, dando-lhe a aparência do
universal”. Assim, na medida em que o funcionário vai identificando-se com uma cultura
organizacional repressiva, a ideologia exercida nela, mais suscetível ele estará aos aparatos de
dominação.
Seguindo nosso roteiro de perguntas, na questão que diz respeito ao relacionamento
entre os funcionários da pista e aos do escritório. Os pontos levantados do funcionário K,
“bem normal, só cruzam ali pela gente cumprimenta, nós cumprimentemo e pronto. Sobre
trabalho também que as vezes eles ligam pra pergunta, pra saber de alguma coisa né, se a
gente sabe, a gente responde”.
A funcionária A observa que é
Tranquilo, nunca tive assim, problemas maiores né. Lógico, as vezes dá uns, […]. O
pessoal da pista acha que como a gente tá mais próximo deles, dos diretores, a
gente tem mais vantagem, mas não é isso. Lógico que a gente é mais próximo,
conversa mais logicamente né, mas não que tenha mais regalias ou alguma coisa
assim.
Pelo fato de a funcionária A trabalhar no escritório, mais diretamente com os diretores,
a mesma consegue perceber que os demais funcionários que trabalham na pista , notam que há
um tratamento diferenciado. Isso se comprova nas seguintes falas relacionadas à liberação de
consultas, sendo que uma funcionária trabalha no escritório/administrativo e o outro trabalha
na pista. Funcionária P: “bem tranquilo, na verdade a gente só avisa a direção, a gente nem
questiona 'ah eu posso tal dia?' É mais comum avisar no dia […]. Nunca houve problema em
ter que tá avisando uma semana antes”. E o funcionário K responde: “avisa o gerente daí,
17 O imaginário é o espaço da representação, das formas, e das imagens, a partir do qual é possível conceber o
projeto, o desejo, a fantasia, o sonho de construir a si mesmo e o mundo. (FREITAS, 2002, p. 54).
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avisa o gerente que tu vai fazer uma consulta e depois só trazer um atestado, deu. Avisa uns 3
ou quatro dias antes”.
No que se refere à consciência que os trabalhadores possuem sobre uma hierarquia de
poder de decisão na empresa, observamos que para a funcionária H isso é nítido: “Se alguém
tem um poder maior [pausa]. Sim, eu acho que aqui o poder tá bem, tá bem centralizado, né!
Assim, eu… Tudo que acontece aqui o aval tem que ser, positivo ou negativo do dono da
empresa”. E o funcionário I: “[pausa] hum, acho que tem que ter sim, mas pra mim é ele,
como ele é o gerente né, ele é o encarregado da turma, do pessoal. Se ele tipo, não achar
tava bom, tem que ser do jeito dele. Então é ele que manda”. O mesmo ocorre com a
funcionária D: “Quem tem que decidir é o dono, né”! O chefe B, entende que:
Sim, eu acredito que sim, eles “sabe” que acima deles tem o gerente, que no caso
sou eu, depois tem o coordenador, que é o funcionário X e aí sim tem os “patrão”,
então tem toda uma burocracia né, então, todos eles tão consciente que quem
decide, problema na pista quem decide é o gerente, mas coisas mais “grave” é
passado para a diretoria da empresa, mas eles têm consciência que quem dá as
“ordem” mesmo são os superiores.
Constatamos, nos casos dos funcionários, que eles sabem da existência de poder de
decisão, evidenciado na resposta dos últimos funcionários, por pensarem que quem tem a
palavra final são o gerente ou o dono. Os mesmos já interiorizaram o papel de subordinação,
que é confirmado com a fala do chefe B: “eles têm consciência que quem dá as 'ordem'
mesmo são os superiores”.
Nesse sentido, Hornstein observa que “à medida que aumentam as riquezas e o poder
dos que podem, sua autoestima é inflada e diminui sua estima pelos demais funcionários, a
quem os que podem veem como desprovidos da substância necessária para alcançar alturas
tão grandes” (2003, p. 44. Grifo do autor). Ao fato de os trabalhadores reconhecerem que
quem “manda” é o chefe mesmo, também está ligado o desejo de querer ter a mesma posição
do seu chefe, pois, “além dos benefícios concretos da qualidade de vida que lucro e poder
geram, os executivos acumulam esses dois elementos como meio de aumentar o prestígio e o
senso de valor pessoal” (2003, p. 44).
Quanto à liberdade para mudar sistemas, rotinas ou sugerir coisas novas, o funcionário
K, diz: “não, daí é com eles, eles que mandam né. Nós só obedecemos”.
Segundo a funcionária H: “Sim, sim. Se a gente acha que tem alguma coisa deve ser
mudada ou que poderia melhorar, a gente tem essa liberdade de conversar com qualquer um
89
deles. Só… Isso vai de eles quererem ou não né!”.
O chefe L diz que sim, porém faz ressalvas,
Olha, eu normalmente eu dou liberdade, assim claro que no final a gente vê né, mas
eles, eu procuro sempre que o funcionário tenha liberdade pra dar ideia mas ele
tem que [estala os dedos] fazer por merecer né, aí por exemplo, ele deu uma ideia
boa, então vamos copiar. Mas se não, se o cara já não é bom exemplo tu não pode
tá aceitando muita… eu penso assim, sabe. Mas no mais, beleza.
O chefe F segue essa linha de raciocínio ao mencionar,
Às vezes tu delega poder pra uma pessoa errada ela acaba fazendo algo errado
também, né! Achando que ela está acima dos outros mas é, [ãh] a gente costuma
bastante deixar eles falar e trabalhar essa parte que eles falaram trabalhar a parte
boa, né? E tentar excluir, tirar da cabeça dele essa parte que não, que não vale a
pena investir.
Embora os funcionários K e H discordem, ambos têm consciência de que “obedecem
a alguém”. Os chefes sabem que a palavra final é deles, porém nos parece que só aceitam
sugestões daqueles que, segundo seu julgamento, “fazem por merecer”. Sólio (2010),
esclarece que a busca pelo poder é intrínseca ao ser humano, e no mundo do trabalho ela está
relacionada ao instinto de sobrevivência, de luta por espaço. Porém, o que acontece é que
algumas pessoas possuem mais habilidade em expressá-la e praticá-la, porque isso depende
muito das vivências particulares, psicológicas e culturais do sujeito. “Para alguns, ser chefe
significa ser responsável por controlar os escalões inferiores da hierarquia” (HORNSTEIN,
2003, p. 56). Assim, ele se afirma superior aos funcionários, e em uma situação que muitas
vezes acaba abafando a voz do funcionário, que possivelmente essa ação poderá danificar o
bem estar do funcionário. Dar o direito da fala ao funcionário, amplia a teia de ideia,
diminuindo o poder centralizado, distribuindo aos demais (HORNSTEIN, 2003).
O excesso de rotatividade é unanimidade entre os entrevistados. Em sua grande
maioria, os apontamentos feitos que justificam o elevado número de funcionários que não
ficam muito tempo na empresa se devem ao fato de se ter que trabalhar nos finais de semana.
Segundo a funcionária P:
Sim, olha eu vou te dizer [...] 2012 e 2013 foi bem tranquilo. Agora com essa crise
que na minha cabeça pensei, bom agora o pessoal vai se fixar, não, tá pior, a minha
rotatividade aumentou assim 20 a 30% eu diria falando que aumentou, eu não sei o
que que acontece. As pessoas estão cada vez mais exigentes né, querem escolher o
trabalho, por mais que estejam em crise, elas querem escolher o trabalho. Se ainda
90
tem uma oportunidade que me permita ir de segunda a sexta, eu prefiro essa
oportunidade de segunda a sexta.
O chefe B:
acredita que é mais “os” final de semana, principalmente quando é guri solteiro,
que aí gosta festa em final de semana. Quanto, quando pega, tipo, já pessoas
“casada” com família, não têm muitos problemas, gurizada mais é problema de fina
de semana, aí acaba trocando muito.
Mas o funcionário K, além de apontar a questão do final de semana, acrescenta que:
horário é puxado né! Já aconteceu comigo pela má comunicação lá na 5 também.
Comecei a trabalhar lá e eu trabalhava com o chefe K, que é gerente. Daí o
primeiro mês ele queria me bota pra rua porque eu não fazia as coisa, mas como
que eu ia fazer as coisa se ele não me ensinava as coisa, nunca me ensino, daí não
(pausa). Daí ele saiu de férias e foi o chefe F pra lá, daí o chefe viu que eu
trabalhava né, começou a me dizer o que eu tinha que fazer, eu nunca tinha
trabalhado em posto, daí me mando pra matriz e tô até hoje.
A funcionária H, no final da sua fala, também lembra da questão do horário ao dizer:
Eu acredito que o que conte bastante é a família que não… não se acostuma com a
ideia de, de trabalhar final de semana, sábado e domingo. Acho que esse é um dos
pontos principais… e os horários né. [pausa] Começa cedo de manhã, vai até as
nove e vinte da noite… Acho que isso influencia bastante. Começa cedo de manhã,
vai até as nove e vinte da noite… Acho que isso influencia bastante.
No decorrer do trabalho observamos que é frequente o trabalhador tomar para si falas
que não são suas, falas que são projetadas por seus chefes e superiores. Isso conforta de certa
forma para o funcionário não se sentir inferior, ele replica frases já normatizadas e
formalizadas. Nessa linha de pensamento, Chauí (1997) fala que o discurso competente 18 é um
discurso instituído, sendo que não é um discurso iniciado ou incipiente e que justamente por
ser respaldado, sua função é de ocultar e “existência real de dominação” (p. 11).
Orlandi (2010) acredita ser importante indagar, questionar as formas de perceber,
interpretar as diferentes expressões de linguagem; pois o discurso é assim, “palavra em
movimento, prática de linguagem. […]. Procura-se compreender a língua fazendo sentido,
enquanto trabalho simbólico, parte do trabalho social geral, constitutivo do homem e da sua
18 O discurso competente é aquele que pode ser proferido, ouvido e aceito como verdadeiro ou autorizado.
(CHAUÍ, 1997, p. 7).
91
história” (p. 15).
Verificamos a presença marcante de submissão por grande parte dos funcionários, que
não identificam tal característica, pelo fato de o discurso empregado na empresa já estar
personificado e cristalizado (internalizado), principalmente por funcionários com mais tempo
de casa. A ausência de linearidade e coerência na comunicação é um aspecto que se evidencia
e acaba resultando num modo de trabalho confuso e contraditório. Analisamos, também, em
diferentes situações, que a prática é contraditória à fala dos gestores.
A análise do material colhido em campo permite-nos, a partir daqui, traçar algumas
reflexões importantes para o trabalho.
6.2 O DIAGNÓSTICO
Kunsch (1986) verifica que na área de Relações Públicas, o diagnóstico torna-se um
passo muito importante, sendo que “após o levantamento e a obtenção de informações, temos
que determinar quais as áreas em dificuldades, os problemas ou as situações problemas que
estão afetando o conceito e o posicionamento da organização” (p.83).
Acreditamos ser fundamental para o profissional que produz e conduz a comunicação
organizacional não somente identificar problemas, como também propor alternativas que
melhor possam contribuir para uma comunicação mais horizontal no ambiente de trabalho.
Com base na análise das entrevistas, apontaremos os aspectos que foram identificados na
empresa estudada e tentaremos sugerir, apresentar ações que acreditamos que condizem com
a atuação do profissional de Relações Públicas, seja no ambiente público ou privado.
De nada adianta detectar, expor os dados, os problemas na área da comunicação, “se
não lhes for dada a interpretação e a apreciação devida. É a transformação dos dados em
informações utilizáveis” (KUNSCH, 1986, p. 83).
No sentido de facilitar a análise, dividimos as observações levantadas em sintonia com
as categorias levantadas para o estudo do tema.
6.2.1 Poder
No que diz respeito ao poder, é possível constatar que ele é praticado na empresa de
modo centralizado, hegemônico, legitimado pela fala dos funcionários, carismático e
92
extremamente simbólico, tanto que alguns funcionários pensam que ele não existe. Para que
esse poder seja mais pulverizado e que todos os membros da equipe possam, também, expor
suas dificuldades, anseios e problemas, é necessário que haja reuniões também com os
trabalhadores, e mais, que essas reuniões tenham uma periodicidade e, se possível, com ata ou
documento de registro. Que esse ponto não fique apenas a cargo dos chefes, que se encontram
apenas uma vez por mês “se der”, como expressou uma funcionária, e eles resolverem entre
os mesmos o que pensam ser melhor para desenvolver na filial da qual são coordenadores.
Que os gestores possam pensar um pouco mais nos funcionários, tendo consciência de
que os direitos trabalhistas, como folga, salário, transporte, carga horária de trabalho,
alimentação, entre outros, não são nenhuma benesse, muito pelo contrário, são direitos que
foram adquiridos após muitos terem sofrido. Acreditar que “é bom senso” do funcionário
agendar consultas somente na sua folga, não condiz com a uma cultura humanitária, que se
preocupa em potencializar, otimizar a consciência do funcionário dos seus direitos como
cidadãos. No que se refere aos direitos como cidadão, Peruzzo identifica três: “os civis, os
políticos e os sociais” (1998, p. 286).
Ou seja, o trabalhador tem de saber principalmente do seu direito civil e social, pois
infelizmente, algumas organizações tendem a evidenciar, seja na fala ou por meio de algum
material gráfico produzido pela ela mesma, somente aquilo que assegura seu poder e inquieta,
confunde e provoca temor nos funcionários, e é por isso que muitos pensam que faltar ao
trabalho quando for preciso, ou agendar consultas no período que compreende as horas de
trabalho é “faltar ou falhar” com a empresa, como se fosse uma falta de respeito; e essa ideia
está tão impregnada de mensagens ideológicas, presentes nos costumes, nos interesses da
organização, na cultura organizacional repassada aos funcionários, que eles nem percebem,
tornando tal mensagem simbólica e despropositada. Aí então, encontra-se a primordialidade e
obrigação daqueles que detêm o poder viabilizar “a ampliação da cidadania que levará o
homem e a mulher a serem, cada vez mais, sujeitos e não objetos da sua história”
(PERUZZO, 1998, p. 287). Nesse sentido, o papel do RP é fundamental como um agente de
transformação social junto à organização.
Os membros da organização, de modo geral, têm de saber que não estão lá apenas para
garantir e legalizar a vontade dos donos, de um desejo maior (SIMÕES, 1995). Mesmo
havendo ambiguidade quanto à prática e a teoria das funções e finalidade exercidas por um
profissional de RP, nada impede que quando ele detêm o poder de construir e propagar a
93
comunicação, que o faça com transparência, harmonizando interesses na luta dos contrários,
do público e do privado, tendo consciência de que as vantagens não são as mesmas entre
gestores e funcionários, por isso, a importância de saber lidar com essa estrutura.
6.2.2 Hierarquia
Observamos que mesmo havendo hierarquia de poder de decisão, não há um
organograma na empresa estudada. Talvez, por esse motivo, alguns funcionários ao serem
questionados da existência de tal termo quanto à tomada de decisões, ficaram confusos.
Entendemos que um organograma situa a linha mestra da comunicação na
organização. Não deve, evidentemente, ser inflexível, mas, do mesmo modo, uma
comunicação absolutamente informal, poderá gerar muito ruído e mal-entendidos. Assim,
esse trabalho precisa ser efetivado na empresa estudada. Evidentemente, ele vai refletir a
forma como o poder está instituído. Daí a importância de um trabalho de Relações Públicas
no sentido de, antes de implementar o organograma, analisar com a empresa as mudanças
necessárias em sua cultura e distribuição dos fluxos de poder.
6.2.3 Comunicação
Observamos que a comunicação praticada na empresa é informal, os meios de
comunicação utilizados como o manual de integração, a comunicação oral, o informativo
trimestral e murais, não são funcionais, visto que os funcionários pouco recordaram da
existência deles ou pouco lembravam o que constava em cada um deles quando questionados
nas entrevistas.
Acreditamos que isso se deve ao fato, também, de a empresa não possuir profissional
da área da comunicação, ou um RP para melhor criação e identificação das possíveis maneiras
de comunicar. Quem produz a comunicação da empresa é o departamento de RH, sendo que
quem dá a palavra final daquilo que será publicado é um dos diretores.
A empresa utiliza muito a comunicação oral, que no processo leva ao risco de a
mensagem chegar alterada até o receptor final. Compreendemos que a comunicação
organizacional diz respeito a todos os membros da equipe, visto que ela somente é possível
por meio da interação social, não somente por meio de dados, informações e seus processos,
94
então. Avaliamos ser primordial a presença de um profissional da área de comunicação social
para qualificar as informações institucionais entre seus públicos; organizar e planejar
pesquisas de opinião pública; identificar quais os meios de comunicação que mais adaptam-se
à realidade da organização e seus membros (KUNSCH, 1986).
Não pretendemos dizer que esse profissional tenha que desenvolver sozinho as
funções que dizem respeito à comunicação, devendo, sim trabalhar de forma integrada com as
demais áreas, já que acreditamos que é dessa forma que a comunicação deve ser construída.
Daí, a importância em realizar uma pesquisa de clima, perguntar ao trabalhador o que é do
seu interesse saber, para que esse possa auxiliar na criação da informação, e não apenas
querer saber a opinião dos que possuem poder de decisão dentro da empresa. Isso, segundo
Peruzzo (1998, p. 143), ultrapassar a esfera do “'dar voz e vez', e passar a 'dar voz a quem não
tem voz'”. Criar uma caixa de sugestões para que todos possam opinar, sem precisar
identificar-se. Estabelecer um padrão para que todos os comunicados sejam mais formais,
com relação à alteração de normas, regras, avisos, solicitações, para minimizar a possibilidade
dos ruídos. São algumas das medidas importantes e urgentes a serem implementadas na
empresa estudada.
Criar uma comunicação participativa19 que envolva toda a equipe, contribuir
consideravelmente para uma comunicação mais eficaz dentro da empresa.
6.2.4 Integração
Por meio das entrevistas podemos perceber a pouca integração existente entre os
funcionários não somente entre as filiais, como também os funcionários que trabalham na
mesma unidade. Muitos não conhecem o quadro geral de funcionários, gerência, diretores e
dono. Encerram suas atividades na empresa sem nunca terem tido contato com seus colegas
de trabalho de outras filiais.
A empresa somente organiza uma festa de final de ano como integração de todos os
funcionários. A proposta da empresa era a de apresentar cada funcionário novo a todas as
filiais, para que o mesmo conhecesse todas as unidades. Porém, isso se inviabilizou, devido à
questão da “rotatividade né, onde a gente já tá sem funcionários, tu já fica a quatro dias
esperando ali pra colocar e tu vai ficar mais um fazendo integração”. Nesse caso, sugerimos
19 A comunicação participativa tem sido vista como toda e qualquer forma de interferência popular dos meios.
Tendo como meta, “dar voz aos que não têm”. (PERUZZO, 1998, p. 141).
95
que se realize uma integração trimestral, em função da grande rotatividade.
Uma sugestão levantada pela diretora foi retomar jogos de futebol entre as unidades, o
que acontecia em tempos passados. Poderia ser mais uma atividade para auxiliar na integração
e participação de todos. Também seria interessante a comemoração da data de aniversário do
Posto para todos os funcionários, assim como uma festa junina. Acreditamos que os
funcionários também devem sugerir os cursos ou palestras de capacitação que são do seu
interesse.
Como a empresa já busca presentear os funcionários em datas comemorativas como:
páscoa, aniversários, tempo de casa, dia dos pais e natal, as atividades sugeridas seriam
desempenhadas a longo prazo, no decorrer do ano, somadas às que já ocorrem, porém de
forma mais planejada, obviamente que, concomitantemente trabalhando com a comunicação.
6.2.5 Discurso
A empresa possui um discurso confuso, ambíguo, e ao mesmo tempo ideológico, o que
foi possível perceber na fala dos entrevistados, principalmente daqueles que possuem mais
tempo de casa. Tal discurso busca a legitimidade da empresa, incutindo uma lógica de
identificação dos membros envolvidos com os desejos particulares da mesma. O objetivo é os
modos de pensar, dizer e ser, anulando as diferenças (CHAUÍ, 1997).
A priori, as organizações buscam o reconhecimento do quadro de funcionários. Nesse
sentido, seria apropriado que o discurso da organização fosse mais claro e definido, que fosse
criada uma linguagem padronizada quanto à transmissão de normas, comunicados, avisos, etc,
até mesmo para que as falas dos funcionários não sejam tão desalinhadas como mostraram as
entrevistas. É preciso que a organização se aproprie de um discurso que evidencie o sujeito e a
importância do mesmo, não somente como força de trabalho, mas também como ser humano,
validando mais suas opiniões, fazendo com que ele, o sujeito, “seja chamado à existência”
(Pêcheux, 1988, p. 154). Que seja permanente a relação de importância que se dá ao
trabalhador, e não que seja feita somente em datas comemorativas.
Evidentemente, arrolamos aqui, a título de exemplo, algumas poucas atividades de
Relações Públicas. Esta etapa do trabalho tem como foco o diagnóstico, ou seja, levantar os
maiores problemas detectados no campo, e não o planejamento da comunicação, que exigiria
um detalhamento completo de cada possibilidade aberta.
96
Acreditamos que a análise do discurso, realizada por meio das entrevistas, foi
fundamental para nos ajudar a formular uma resposta ao problema que colocamos no início
deste trabalho, qual seja: saber se o discurso funciona como um instrumento para o
estabelecimento de relações de poder em uma organização. O discurso dos entrevistados
aponta, cada qual com a sua especificidade, para uma estrutura verticalizada de comunicação,
através da qual se repetem e se consolidam os papéis predeterminados pelas relações de
trabalho do modo de produção vigente. Ao mesmo tempo, todavia, tal estrutura
comunicacional deixa entrever o espaço que poderia ser ocupado por um profissional de
Relações Públicas na elaboração de uma comunicação eficaz no âmbito organizacional. Dito
isso, passemos às considerações finais.
97
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sabendo da força que o discurso possui em qualquer tipo de relação, a base que deu
início à pesquisa na esfera organizacional foi a de analisar tal discurso como estratégia nas
relações de poder. Iniciamos o estudo em busca de uma resposta para o nosso problema: O
discurso funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de poder em
uma organização?
O caminho percorrido para alcançarmos tal reposta, aprofundou-se por meio de
conceitos e exemplos, dando início a uma pesquisa bibliográfica que embasaram a pesquisa.
Inicialmente, esclarecemos o que tínhamos por desejo desenvolver ao longo da pesquisa. Em
seguida, buscamos conhecer o melhor método que viria a corroborar para alcançarmos nosso
objetivo, nesse caso, escolhemos desenvolver uma pesquisa qualitativa, por meio de um
estudo de caso simples em uma Rede de Postos de Combustíveis.
Nos apropriamos de conceitos que entrelaçam as organizações e as relações de poder
existentes na mesma. Esse capítulo foi o pontapé inicial para termos mais proximidade
daquilo que queríamos tratar, essencialmente no que tange às relações de trabalho e conflitos
internos dos indivíduos que ao confrontarem-se com as vivências de outro sujeito incorporam
posturas determinantes, que afetam seu modo de pensar e agir.
No intuito de compreender como funcionava as relações de trabalho no âmbito
organizacional, nos debruçamos a buscar exemplos e descrições que elucidassem melhor esse
vínculo. Assim, constatamos o emaranhado de interesses que encontram-se presentes na
linguagem e, que acabam ganhando força dependendo do modo que se expressar, por isso
então, são introduzidas nas ações e imaginário daqueles que ocupam um espaço de
dependência em relação aos que têm o direito de decisão em uma empresa.
Também
foi
imprescindível
tratarmos
do
funcionamento
da
comunicação
organizacional, averiguando a importância do caminho percorrido pela mensagem, a
segmentação dos públicos que compõe e interage com as organizações, bem como, o
compromisso que a comunicação e profissionais que canalizam as informações à sociedade
devem possuir. Nos apropriamos ainda mais da noção de poder que a comunicação concentra,
tendo ela, a capacidade de emancipar ou reprimir o sujeito enquanto cidadão, lúcido da sua
participação no desenvolvimento de uma sociedade mais justa.
Destacamos que a construção dos capítulos baseou-se nas palavras-chave
98
“organizações”, “comunicação organizacional”, “discurso” e “poder”, as quais, ao serem
aprofundadas, possibilitaram mais fundamentação para começar o estudo de campo.
No que se refere à questão técnica da pesquisa, nosso objetivo geral era analisar o
discurso organizacional como instrumento de controle e poder nas organizações, observando,
assim, se o mesmo usa diferentes estratégias conforme deseja influenciar as pessoas e o
ambiente em que está envolvido. Também definimos quatro objetivos específicos: estudar o
discurso dos gestores na comunicação interna; analisar até que ponto o discurso dos
funcionários se relaciona com o dos gestores; identificar o processo de comunicação
organizacional exercido na empresa escolhida para desenvolver o trabalho e investigar o papel
do profissional de Relações Públicas na construção de uma comunicação eficaz. Tais
objetivos foram valorosos para estreitarmos a relação na busca pela resposta do problema.
Algumas hipóteses foram levantadas inicialmente: o discurso organizacional é
utilizado como elemento estratégico de dominação por meio da comunicação; os funcionários
são influenciados pela comunicação interna; as relações de poder nas organizações, na prática,
continuam reproduzindo uma trajetória descendente.
Adotamos como técnica metodológica, realizar entrevistas em profundidade com os
membros que constituem a empresa, tanto funcionários quanto gestores, e posteriormente a
análise do discurso.
Acreditamos ter alcançado nosso objetivo, pois chegamos à resposta do problema por
meio da análise nas entrevistas. A primeira hipótese levantada, de que o discurso
organizacional é utilizado como elemento estratégico de dominação por meio da
comunicação, foi validada, pois, a linguagem, a forma de se expressar e o carisma utilizados
pelos gestores acabam sendo legitimados por funcionários que se identificam e interiorizam
tal discurso como sendo seu. Assim, conferem aos gestores maior poder de controle sobre os
subordinados.
A hipótese segundo a qual os funcionários são influenciados pela comunicação interna
também foi corroborada, pois, mesmo utilizando uma comunicação informal, os funcionários
tendem a acatar e seguir as normas e regras sugeridas pelos gestores, anulando até mesmo
seus pontos de vista, deixando de opinar e de se manifestar para “não se prejudicarem” nas
relações de trabalho.
Por fim, a terceira hipótese também foi certificada. Ela dizia que as relações de poder
nas organizações, na prática, continuam reproduzindo uma trajetória descendente, fato que foi
99
evidenciado na análise, pois o poder centralizado exercido na empresa segue uma estrutura
hierárquica (mesmo que alguns funcionários não a reconheçam) na qual os funcionários
respondem aos gerentes, os gerentes aos diretores e os diretores ao dono. Observamos,
também, que, pelo fato de a cultura organizacional da empresa estar inserida nas ações,
processos e procedimentos executados, alguns funcionários legitimam a necessidade de ter
alguém com poder de decisão, que delegue o que deve ser feito, aceitando seu posicionamento
de subordinados, em que seu poder de fala vem apenas em “último caso”.
A metodologia utilizada desempenhou seu papel em contribuir para que
respondêssemos à questão inicial. A pesquisa qualitativa foi essencial na composição de dados
que nos auxiliassem a verificar comportamentos, interpretando o modo de se relacionar das
pessoas e tendo maior proximidade com o caso investigado. A análise de discurso foi
indispensável para decifrarmos as sensações, sentimentos, opiniões, entendimentos e a
consciência que os funcionários tinham sobre as relações de poder da comunicação e do
discurso utilizado na empresa. Assim como colaborou para notar a comunicação não-verbal
existente nas falas, mas expressadas em gestos, em algumas situações, certificando a
existência dos “não ditos”.
Foi possível compreender, também, como o poder estabiliza, legitima e fortalece
vínculos de relacionamentos entre indivíduos que, na sua grande maioria, conforme
mostraram as entrevistas, acreditam ser iguais perante um discurso institucionalizado que
mascara interesse particulares e os apresenta como público.
Consideramos que a monografia foi de grande relevância para nosso aprendizado,
proporcionando reflexões acerca da atuação dos profissionais de Relações Públicas no meio
organizacional. O trabalho fez apontamentos que nem sempre são levados em consideração
pela academia e que no mercado de trabalho tampouco são pautados, dado o emergente foco
somente na busca de resultados priorizados pelas empresas. A pesquisa evidenciou, as
estratégias de poder que podem ser praticadas nas empresas, o que facilitará aos profissionais,
sejam da comunicação, ou de outras áreas, na identificação das mesmas ao inserir-se no meio
organizacional, não sendo tão influenciáveis quanto as práticas desenvolvidas.
O estudo revelou-se importante para visualizar aspectos que são negligenciados pela
empresa, sendo que, a partir dessa pesquisa, os dados computados poderão ser utilizados
como base para aperfeiçoar os processos que compreendem desde o operacional ao gerencial.
É importante lembrar que, mesmo tendo alcançado um resultado satisfatório quanto ao
100
produzido, acreditamos que a busca enquanto pesquisadores não deve se limitar a esta
monografia, podendo ser mais explorada, servindo de apoio para outras óticas e perspectivas,
contribuindo também ao apontar outra possibilidade no modo de perceber o profissional de
Relações Públicas, bem como as relações e discursos existentes nas organizações.
Acreditamos que, em futuros estudos sobre o tema inicial, o pesquisador deve,
inicialmente, despir-se de conceitos já formalizados e adotar um olhar mais aguçado para
tentar identificar características nem sempre explicitadas em uma organização. Se a retomada
desse estudo for realizada por um profissional de Relações Públicas, as exigências quanto aos
pontos citados devem ser redobradas, para que não se mistifique nenhuma informação. A
partir destas reflexões, então, é recomendável criar um planejamento com ações e métodos
visando lapidar as estratégias da comunicação organizacional, consonante com os desejos da
empresa e funcionário; não havendo uma fórmula a ser aplicada na comunicação, visto que
cada organização possui uma cultura diferente e que essa se confronta e se mistura com as
vivências individuais. Daí a importância de se conhecer o ambiente de trabalho antes de
qualquer análise.
101
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ANEXO – PROJETO DE PESQUISA
108
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
ANA LÚCIA RIBAS
DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL
CAXIAS DO SUL
2014
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
HABILITAÇÃO EM BACHARELADO EM RELAÇÕES PÚBLICAS
ANA LÚCIA RIBAS
DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL
Projeto de Trabalho de Conclusão de
Curso de Comunicação Social, habilitação
em Relações Públicas, apresentado como
requisito para aprovação na disciplina de
Monografia I.
Orientadora: Profa. Mª. Jussania Albé
CAXIAS DO SUL
2014
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 04
1.1 PROCESSO DE DESCOBERTA (OPCIONAL) ................................................. 05
2 TEMA .................................................................................................................... 06
2.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA ................................................................................. 06
3 JUSTIFICATIVA..................................................................................................... 07
4 QUESTÃO NORTEADORA ................................................................................. 08
5. HIPÓTESES (quando houver) ........................................................................... 09
6. OBJETIVOS ........................................................................................................ 10
6.1 OBJETIVO GERAL ............................................................................................ 10
6.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ............................................................................. 10
7. METODOLOGIA .................................................................................................. 11
8. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ...............................................................................
8.1 XXXXXXXXXX....................................................................................................
8.2 XXXXXXXXXX....................................................................................................
8.3 XXXXXXXXXX....................................................................................................
8.4 XXXXXXXXXX....................................................................................................
15
15
15
15
15
9. ROTEIRO DOS CAPÍTULOS .............................................................................. 18
10. CRONOGRAMA ................................................................................................ 19
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 20
111
1 INTRODUÇÃO
O mundo do trabalho tem exigido cada vez mais da sociedade como um todo,
seja quando os profissionais já estão introduzidos no mercado de trabalho ou
quando estão começando a ter os primeiros contatos.
Frente às metamorfoses de um mercado cada vez mais competitivo e
exigente, as organizações passaram a reestruturar seus processos, buscando
adequar a força de trabalho para se encaixar nesse contexto de mudanças. Para
isso, muitas delas investiram seus esforços na tentativa de promover a adesão e o
envolvimento dos funcionários. Foi assim que conceitos como autoridade e controle
passaram a se fazer mais presentes, tornando-se muitas vezes, meios para a
promoção do poder em pequenos ou grandes grupos.
Nas organizações o controle pode ser exercido de diferentes formas, sendo a
mais expressiva representada através do discurso implícito na própria fala, ou até
mesmo nos materiais impressos utilizados pela empresa. Através do discurso
organizacional é possível observar a importância do poder, que revela a atitude da
empresa em relação as suas perspectivas, métodos e objetivos.
De acordo com Fayol (1977, 0.129) “o controle consiste em verificar se tudo
corre de acordo com o programa adotado, as ordens dadas e os princípios
admitidos. Tem por objetivo assinalar as faltas e os erros, a fim de que se possa
repará-los e evitar sua repetição”. A partir desta citação, é possível perceber a
relevância
do
tema,
visto
que
se
relaciona
diretamente
aos
processos
organizacionais.
Seguindo esta perspectiva, PAGÉS, apud MARCUSE, apresenta o conceito
do controle social baseado na tecnologia:
As formas dominantes do controle social são tecnológicas, num
sentido novo. A estrutura técnica e a eficácia do aparelho de
destruição e de produção têm, sem dúvida alguma, durante o período
moderno, contribuído para submeter a população à atual divisão do
trabalho...Hoje os controles técnicos são a própria expressão da
razão, colocada a serviço de todos os grupos, de todos os interesses
sociais, de modo que toda contradição parece irracional e toda
oposição impossível. (1973, p. 43)
112
Conforme o autor, para compreender melhor pode-se considerar que
controles técnicos refere-se a fiscalização que todos estamos submetidos
diariamente. Uma analogia que pode ser considerada nesse caso vai de andar por
uma rua que possui câmera até o controle em cumprir normas dentro de uma
empresa, onde os empregados estão submetidos a cumprir normas de conduta.
Neste contexto, podemos compreender a organização como um espaço de
poder, legitimado pelo processo comunicacional. Muitas vezes, nas empresas, é
possível observar a existência de um acordo subjetivo institucionalizado através das
ferramentas que são utilizadas como recursos para manter a comunicação com os
empregados. Em organizações que possuem uma estrutura piramidal, este fato é
ainda mais perceptível pois, em muitos casos, acredita-se também, que é preciso
manter o controle e o domínio para se perdurar no poder.
A comunicação é a protagonista dentro de uma empresa. Pensá-la como a
água que rega uma planta e que precisa ser boa, tratada, filtrada o suficiente para
que a planta cresça saudável é uma boa metáfora para não se esquecer de que a
comunicação não é usada somente para informar mas, principalmente, para
transformar. Uma transmissão incorreta ou parcial de fatos que são de importância
para todos que nela trabalham pode atrapalhar, e muito, os processos. Por isso, a
participação de todos é imprescindível para sua efetividade e o bom relacionamento
ao longo da história da empresa.
Alcançar este objetivo não é tarefa fácil, daí a importância de contar com o
apoio de um profissional de comunicação, que consiga construir uma ponte entre
funcionários e gestores dentro das organizações, desenvolvendo um trabalho em
conjunto com as demais áreas e mais, que esteja ciente dos direitos da empresa e,
também, dos deveres que ela tem. Este profissional deve, ainda, estar atento a
todas as mudanças ocorridas dentro e fora da empresa, já que a comunicação tem
uma responsabilidade social.
É necessário reforçar que comunicação não é somente troca de informações,
principalmente quando aquilo que se transmite é suficientemente claro para o
ouvinte, havendo, então, um significado comum entre as pessoas envolvidas. Buscar
uma comunicação dialética com os empregados e os demais membros que
113
participam da empresa é uma maneira de tentar atender às expectativas desse
organismo social.
114
2 TEMA
O discurso organizacional como elemento estratégico de dominação através
da comunicação.
2.1 Delimitação do tema
A influência do controle no discurso organizacional como fator de poder das
organizações.
115
3 JUSTIFICATIVA
Observou-se a necessidade de discutir e analisar a comunicação interna nas
empresas, percebendo que os recursos utilizados para compartilhar as informações
nem sempre são construídos em conjunto com funcionários e demais áreas que
compõem a empresa. Além disso, é necessário citar, também, o interesse da autora
na busca de compreensão para o entendimento destas questões, mais
especificamente, sobre os motivos que levam a gestão a utilizar-se da comunicação
dominadora e controlada, como recurso de poder nas relações organizacionais.
Nessa esfera, é importante discutir tais questões para tentar entender e observar
como essas situações impactam a vida profissional das pessoas.
116
4 QUESTÃO NORTEADORA
* Até que ponto o discurso organizacional pode ser considerado uma ferramenta de
controle e dominação?
117
5 HIPÓTESES
•
Os funcionários são influenciados pela comunicação interna.
•
O discurso organizacional é utilizado como elemento estratégico de
dominação através da comunicação.
118
6 OBJETIVOS
6.1 Objetivo geral
Analisar o discurso organizacional como ferramenta de controle e poder nas
organizações.
6.2 Objetivos específicos
 Avaliar o discurso dos gestores na comunicação interna.
 Avaliar até que ponto o discurso dos funcionários se relaciona com o dos
gestores.
 Identificar o processo de comunicação organizacional desenvolvido na
empresa x.
 Investigar o papel do Relações Públicas na construção de uma comunicação
interna eficaz.
119
7 METODOLOGIA
De acordo com Minayo (2004, p. 22), “a metodologia inclui as concepções
teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a apreensão da
realidade e também o potencial criativo do pesquisador”.
A metodologia utiliza recursos para o desenvolvimento de análise,
justificativas e embasamento de ideias no caso a ser estudado. Permite analisar os
métodos
que
melhor
identificam
e
qualificam
um
estudo,
para
o
bom
desenvolvimento do trabalho. Assim, o método nada mais é, do que um
roteiro/itinerário que propicia chegar a uma resposta.
O tema do estudo proposto é o discurso organizacional como elemento
estratégico de dominação através da comunicação. Pretende-se, inicialmente,
realizar uma pesquisa bibliográfica que, segundo Duarte e Barros pode ser
entendida como:
O planejamento global inicial de qualquer trabalho de pesquisa que
vai desde a identificação, localização e obtenção da bibliografia
pertinente sobre o assunto, até a apresentação de um texto
sistematizado, onde é apresentada toda a literatura que o aluno
examinou, de forma a evidenciar o entendimento dos autores,
acrescido de suas próprias ideias e opiniões (2005, p. 51)
De acordo com essa definição, fica evidente a necessidade de estudar
autores que tratam do assunto pesquisado.
A priori os autores que sustentam a pesquisa até o momento são: Pierrre
Bourdieu (2001), relação do poder simbólico; Michel Pêcheux (1988), análise de
discurso sobre a força da palavra e do emissor; e Cecília Peruzzo (1998, 1986), a
função da comunicação inserida no atual sistema econômico.
Entende-se que para responder o problema da pesquisa - Até que ponto o
discurso organizacional pode ser considerado uma ferramenta de controle e
dominação - é necessário definir o tipo de pesquisa utilizado.
A pesquisa qualitativa se difere da quantitativa. Enquanto a primeira
preocupa-se com interpretações subjetivas, a segunda tem o foco na objetividade
por meio dos números.
120
Opta-se no estudo aqui proposto,
a realização da pesquisa qualitativa, a qual
Martinelli diz:
A metodologia qualitativa, pelo fato de trabalhar em profundidade,
possibilita que se compreenda a forma de vida das pessoas, não
sendo apenas um inventário sobre a vida de um grupo. As técnicas
utilizadas permitem, entre outras coisas, o registro do
comportamento não verbal e o recebimento de informações não
esperadas porque não seguem necessariamente um roteiro fechado,
percebendo como bem-vindos os dados novos, não previstos
anteriormente (2000, p. 39).
Esse método de pesquisa permite fazer uma abordagem interpretativa do
caso a ser estudado, em que se busca compreender o que é dito e o não dito. A
escolha da pesquisa qualitativa justifica-se por se tratar de um estudo que “[...] lida
com interpretações das realidades sociais” (BAUER; GASKELL, 2002, p. 23).
Oferece a possibilidade de uma pesquisa subjetiva.
Para investigação científica será realizado um Estudo de Caso em que se
estrutura a partir da seleção de uma Organização da cidade de Caxias do Sul,
região nordeste do estado do Rio Grande do Sul. Opta-se não divulgar o nome da
empresa, pois os objetivos da pesquisa são científicos comprometidos ao avanço do
conhecimento na área de Relações Públicas. A definição de como o pesquisador irá
trabalhar com isso, será na segunda etapa do projeto: na monografia.
Martins (2008) observa que a utilização do Estudo de Caso possibilita uma
investigação profunda e intensa na unidade social definida.
Trata-se de uma investigação empírica que pesquisa fenômenos
dentro de seu contexto real (pesquisa naturalística), onde o
pesquisador não tem controle sobre eventos e variáveis, buscando
apreender a totalidade de uma situação e, criativamente, descrever,
compreender e interpretar a complexidade de um caso concreto.
Mediante um mergulho profundo e exaustivo em um objeto delimitado
- problema da pesquisa -, o Estudo de Caso possibilita a penetração
da realidade social não conseguida plenamente pela avaliação
quantitativa (2008, s.p.)20.
20 Apresentação do livro Estudo de Caso: uma estratégia de pesquisa (2008).
121
Como estratégia de pesquisa será realizada entrevistas em profundidade
semi-estruturadas, individuais com os gestores da organização e entrevistas em
formato de focus group com os funcionários da mesma empresa. O número de
entrevistados ainda será definido. De acordo com Sierra (1998 apud GODOI;
MATOS, 2006) a entrevista em profundidade é uma opção de entrevista em que o
produto investigado está constituído pela vida – vivências, ideologias, valores do
entrevistado.
Godoi e Matos (2006) constatam que existe três modelos de entrevistas
qualitativas: a) entrevista conversacional livre, onde não há um roteiro de perguntas
a ser seguido, e o entrevistador tem a liberdade de fazer indagações do assunto
proposto interagindo mais com o entrevistado; b) entrevistas baseadas em roteiro, o
entrevistador pode ajustar, elaborar e dispor as perguntas conforme seu interesse, c)
entrevista padronizada aberta, que trabalha com a produção de questionários que
serão distribuídos com perguntas iguais para todos os entrevistados, porém, no
entanto as respostas são abertas.
Define-se que nesta pesquisa as entrevistas serão conversacional livre, em
que os questionamentos básicos serão realizados para os entrevistados, mas com
perguntas não padronizadas quando surgir a necessidade, sempre mantendo o foco
do tema.
Além disso aplicaremos a técnica metodológica Análise de Discurso (AD) nos
Manuais Normativos da Organização, ferramentas utilizadas de instrução de
comportamento para os funcionários. A definição pela Análise de Conteúdo,
especificamente da Escola Francesa (Pêcheux, 1988), fundamenta-se para ter uma
pesquisa completa.
O autor (1988), analisa o discurso a partir de quem o emite. Quanto mais
poder o emissor possui, mais força o discurso ganha.
[…] O sentido de uma palavra, de uma expressão, de uma
preposição, etc., não existe em si mesmo, isto é, em sua relação
transparente com a literalidade do significante, mas ao contrário é
determinada pelas posições ideológicas que estão em jogo no
processo sócio-histórico no qual as palavras, expressões e
preposições são produzidas […]. Poderíamos resumir esta tese
dizendo: as palavras, expressões, preposições, etc., mudam de
sentido segundo as posições sustentadas por aqueles que as
empregam, o que quer dizer que elas adquirem sentido em
122
referência a essas posições, isto é, em referência às formações
ideológicas […] nas quais essas posições se inscrevem (PÊCHEUX,
1988, p. 160).
Os métodos serão o guia para a caminhada, com o objetivo de chegar o mais
próximo possível da resposta para o problema da pesquisa. A fundamentação nos
teóricos, alguns aqui já citados, possibilita descobrir novos horizontes e oportuniza
adquirir um olhar mais criterioso às relações de poder presentes através da
comunicação no contexto organizacional. Na medida em que o pesquisador domina
as técnicas metodológicas de pesquisa, mais evidente torna-se a solução do
problema. Além disso, instiga o pesquisador e fomenta outros estudantes de
Relações Públicas na busca do conhecimento – por meio da pesquisa – e da análise
crítica da própria profissão.
123
8 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
8.1 Pierre Bourdieu (2001)
8.2 Michel Pêcheux (1988)
8.3 Cecília Peruzzo (1986 – 1998)
124
CAPÍTULO
AS ORGANIZAÇÕES E AS RELAÇÕES DE TRABALHO
Ao longo dos anos o trabalho ganhou muito espaço e importância na vida das
pessoas. É possível perceber esta relação na medida em que ele tende a ocupar
outros ambientes, como a própria casa que, para muitos profissionais, passa a ser
uma extensão do local de trabalho.
Antunes nos traz uma proximidade dessa importância com que se trata o
trabalho, quando diz:
o trabalho é um processo entre o homem e a natureza […] Ele põe
em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade,
braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria
natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio
desse movimento, sobre a natureza externa a ele e ao modificá-la,
ele modifica, ao mesmo tempo sua própria natureza. (2004, p. 36)
Compreende-se assim, que o trabalho tornou-se essencial na vida do ser
humano, porque é nele que o indivíduo visualiza a importante para a evolução
profissional, que além de contribuir para seu crescimento, oportuniza o
relacionamento e a troca de experiências entre os indivíduos que dela fazem parte.
Por isso as empresas possuem um papel fundamental na construção ou
desconstrução de todas essas mudanças que ocorreram com os empregados, não
só por empregarem as pessoas mas, principalmente, porque é no trabalho que o
indivíduo passa maior parte do seu tempo. As mudanças que ocorreram no mundo
do trabalho têm muito a ver com as tomadas de decisões e escolhas feitas pelas
opções que existiam no momento para as empresas.
Para dar seguimento aos tipos de relações que permeiam o universo
organizacional, é importante exemplificar o termo organização, onde Pagés coloca:
A organização é um conjunto dinâmico de respostas e contradições. É
realmente um sistema, mas um sistema de mediações que só pode ser
compreendido pela referência à mudança das condições da população e
das contradições entre os trabalhadores por um lado, a empresa e o sistema
social , do outro”. (1987, p.31)
125
Essa afirmação nos faz entender que no ambiente organizacional há uma
troca de favores entre a empresa e seus funcionários, pois uma parcela está lá para
prestar serviços à empresa e a outra parcela está lá para oferecer tais serviços.
Sabe-se que as relações são conflitivas, principalmente em um ambiente onde há a
probabilidade de existir competição entre as pessoas, tem-se a necessidade de ter
uma mediação, para que ambos os lados saiam satisfeitos.
Sobre a mediação, Pagés (1987, p. 27) diz que: “o processo de mediação se
coloca como a aliança das restrições (coerções) da empresa e os privilégios
oferecidos ao indivíduo”. Ou seja, deve haver um elo que ligue os interesses dos
empregados aos dos empregadores, dessa forma é possível criar um vínculo de
maior credibilidade e aceitação das diferenças entre as partes.
Com tais colocações pode-se perceber que dentro das organizações quando
fala-se em mediação também quer tratar sobre antecipação de conflitos, antes que
os conflitos individuais se expandam para o coletivo, uma preocupação constante
das empresas que constituem o sistema econômico. É perceptível também, que as
relações de trabalho tenham por base os interesses de todas as partes, que podem
ser dos mais variados possíveis como, superação, reconhecimento profissional,
realizar algum sonho, entre outros.
As Relações entre gestores e empregados
O ambiente organizacional é um local onde todos os desejos e medos devem
ser equilibrados para haver uma harmonia no modo de se relacionar. Envolve
relações de dependência financeira por parte dos empregados e a necessidade da
força de trabalho dos funcionários por parte dos empresários.
Toda e qualquer empresa sabe que é importante obter a confiança dos
funcionários; no entanto, para assegurar que esses interesses sejam cumpridos,
muitas vezes os gestores desenvolvem uma linguagem persuasiva e também
coerciva para seduzir os empregados. O bom discurso dos gestores esta na
construção de familiarizar-se com as necessidades dos funcionários, o que acaba
estimulando os bons resultados. Como reforça Hornstein.
126
A identificação organizacional influencia muito os resultados
financeiros de uma empresa [...] o sucesso corporativo está
diretamente relacionado à presença de uma força de trabalho capaz
de atestar que, “ no nosso trabalho, nossa opinião é levada em conta;
os colegas estão comprometidos com qualidade; temos diariamente a
oportunidade de fazer melhor; e há uma ligação perceptível entre o
que fazemos e a missão da empresa” (2003, p. 3)
Para o trabalhador, o seu serviço ganha mais valor quando reconhecida sua
força de trabalho por parte da empresa, impulsionando-o a produzir sempre mais,
melhor, subir de cargo e sentir-se de fato parte de algo que é essencial a vida das
pessoas para sua subsistência. Fazendo uma interpretação mais profunda, é
possível observar que o desejo pelo reconhecimento atinge inclusive os valores
individuais, como Pagés coloca “o sucesso, a ambição, fazer carreira vão se tornar
para o indivíduo os valores essenciais, pois são eles e só eles que podem preencher
esta angústia do vazio: para ser reconhecido é preciso vencer” (1987, p. 135)
Esse ponto que interfere a forma de pensar os valores pode tornar-se uma
problemática, na medida em que o funcionário acredita fielmente que o que importa
é “vencer” dentro da empresa, ao mesmo tempo ele vai perdendo outros valores
como o coleguismo e empatia com o próximo, o que acaba causando desavenças
no relacionamento entre colegas.
É importante notar que para a empresa poder adquirir credibilidade diante do
olhar dos funcionários é essencial que esta redobre sua atenção com relação a
forma de administrar as opiniões dos empregados para executar projetos; pois como
diz Hornstein:
“as pesquisas revelam repetidamente que a confiança dos
trabalhadores nos líderes se deve menos às ações para a resolução
de problemas atuais ou a prevenção dos futuros e mais à visão que
têm sobre a consideração que os líderes demonstram para com suas
opiniões e necessidades no momento da tomada de decisões e
sobre a discussão destas com a equipe” (2003, p. 85)
Assim comprova-se que uma relação gestor-funcionários é mais produtiva
quando há uma percepção de que a voz do funcionários está sendo ouvida por seu
127
superior.
A carga de responsabilidade de uma bom relacionamento é a mesma, tanto
para o empregado quanto para o gestor, pois ao mesmo tempo em que o funcionário
tem que cumprir horários e tarefas designadas a ele, os gestores devem também
manter pagamentos em dia e saber ser bom receptor diante das reivindicações
feitas, buscando melhorias para a empresa como um todo.
Por isso é tão importante o bom relacionamento dos empregados com seus
superiores, pois é uma relação não só técnica e prática por lidar com a venda da
força de trabalho e a compra dela; mas também afetiva, que acaba envolvendo os
que estão ao redor, pois nesse relacionamento de troca de interesses, há desejos
implícitos e experiências particulares, o que demanda mais tato na maneira de se
criar uma comunicar pluralizada.
128
9 ROTEIRO DOS CAPÍTULOS
Para melhor desenvolvimento da pesquisa, o trabalho será dividido em
capítulos, segue o itinerário previsto:
1. Relações de trabalho e organizações
1.1 As relações entre gestores e empregados
1.2 Objetivos entre empregadores e funcionários.
2. O poder das organizações.
2.1 Recursos de controle dentro das organizações.
2.2 Discursos Mascarados
3. A comunicação interna
3.1 A comunicação como ferramenta de dominação
3.2 A comunicação como poder de transformação
4. Estudo de caso da empresa x
4.1 Metodologia e instrumento de pesquisa a ser aplicada
4.2 Breve história da empresa a ser estudada
4.3 Entrevista com funcionários.
4.4 Entrevista com alguns gestores
4.5 Análise do manual
4.6 Análise do resultado
4.7 A importância do Relações Públicas desenvolver uma comunicação
horizontal dentro das organizações
129
10 CRONOGRAMA
ATIVIDADES Mar Abr
Mai Jun Jul
Ago Set
Out Nov Dez
/ MESES
2014 2014 2014 2014 2014 2014 2014 2014 2014 2014
Elaboração do
Projeto
x
Introdução da
Monografia
x
x
Primeiro
Capítulo
ATIVIDADES Jan
/ MESES
2015
Segundo
Capítulo
x
Fev
2015
Mar
2015
Abr
2015
x
x
Terceiro
Capítulo
x
Quarto
Capítulo
Mai
2015
Defesa
x
Jun
2015
x
Jul
2015
x
x
Conclusões
Revisão
x
x
x
x
x
x
x
x
130
REFERÊNCIAS
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1999.
_________. A dialética do trabalho. São Paulo: Expressão Popular, 2004.
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som: um manual prático. Tradução de Pedrinho A. Guareschi. 4. ed. Petrólis, RJ:
Vozes 2002.
BORDIEU, Pierre. O Poder simbólico. Tradução de Fernando Tomaz. 4. ed. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
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pesquisa em comunicação. São Paulo – Atlas, 2005.
GODOI, Chistiane Kleinubing: MATTOS, Pedro Lincolm C.P. Entrevista qualitativa:
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Bandeira de.; SILVA, Anielson Barbosa da. (Orgs.). Pesquisa Qualitativa em
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LAZZAROTTO, Valentim Ângelo. Pobres construtores de riqueza. Caxias do Sul:
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Paulo: Veras Editora, 1999. (Série Núcleo de Pesquisa 1).
PAGÉS, Max, BONETTI, Michel, (et al). O poder das Organizações. São Paulo:
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PÊCHEUX,
Michel.
Semântica
e
Discurso:
uma
crítica
à
afirmação
do
óbvio.Tradução de E. P. Orlandi. Campinas: Ed. Unicamp – Faculdade de Educação,
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PERUZZO, Cecília Maria Krohling. Relações públicas no modo de produção
capitalista. São Paulo: Summus, 1986.
MINAYO, Maria Cecília de souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa
em saúde. 8º ed. São Paulo: Hucitec, 2004.
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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL ANA LÚCIA RIBAS