UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL ANA LÚCIA RIBAS DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL: UM ESTUDO DE CASO DO DISCURSO DA EMPRESA AUTO POSTO RODEIO CAXIAS DO SUL 2015 ANA LÚCIA RIBAS DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL: UM ESTUDO DE CASO DO DISCURSO DA EMPRESA AUTO POSTO RODEIO Monografia de Conclusão de Curso, apresentada como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Relações Públicas, do curso de Comunicação Social, da Universidade de Caxias do Sul. Orientadora: Prof.ª Dr ª. Marlene Branca Sólio Caxias do Sul 2015 ANA LÚCIA RIBAS DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL: UM ESTUDO DE CASO DO DISCURSO DA EMPRESA AUTO POSTO RODEIO Monografia de Conclusão de Curso, apresentada como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Relações Públicas, do curso de Comunicação Social, da Universidade de Caxias do Sul. Aprovada em ___de_________de 2015. Banca Examinadora __________________________________ Prof.ª Dra. Marlene Branca Sólio Universidade de Caxias do Sul __________________________________ Prof.ª Dra. Maria Luiza Cardinale Baptista Universidade de Caxias do Sul __________________________________ Prof.ª Me. Silvana Padilha Flores Universidade de Caxias do Sul Dedico este trabalho a minha mãe, por sempre ter acreditado e confiado em mim, bem como por ter incentivado minhas escolhas. Aos trabalhadores que lutam por seus direitos e se reconhecem como cidadãos. Aos profissionais de Relações Públicas que têm consciência da sua responsabilidade em atuar no mercado com transparência e coerência, sabendo de sua importância como agente de transformação social. AGRADECIMENTOS Agradeço, primeiramente, a Deus, por ter me mantido firme, não permitindo que eu desanimasse no desenrolar de um semestre de várias mudanças. A minha amada mãe Marli e minha tia Marlene, pela correria e pelo empenho que tiveram para que eu pudesse iniciar um curso de graduação. Pelas tantas palavras de incentivo e apoio, que mesmo longe e em momentos difíceis sempre aqueceram meu coração, me encorajando a seguir em frente. A minha orientadora Branca, por confiar em minha proposta de trabalho e me trazer para o foco da pesquisa, mostrando-me o que realmente seria viável e no que era aconselhável focar – mesmo quando meus passos queriam me levar para outra direção – e por compartilhar comigo todo seu conhecimento como pesquisadora com humildade. Aos amigos e futuros vizinhos da Coohabitar, por compreenderem minha ausência em algumas reuniões, nestes momentos decisivos para a cooperativa. A minha irmã, Luísa, e aos amigos Camila, Charlene e Márcio, que contribuíram na execução de algumas tarefas essenciais deste estudo. Ao meu namorado Vinícius, um agradecimento especial por também ter colaborado na execução de tarefas, por ter acompanhado algumas noites em claro a caminhada que me fez chegar até aqui, por ter paciência e ter superado meus altos e baixos, me incentivando sempre. A minha família, que nunca deixou de enviar energias positivas e acreditar no meu potencial. Agradeço também, à amiga e irmã Caroline, por estar sempre a meu lado, me dando força ao longo desses 18 anos de amizade. Aos amigos de Carazinho, Passo Fundo e Itajaí que, mesmo distantes, torceram para que eu concluísse essa etapa, colocando-se à disposição para o que eu precisasse, assim como aos de Caxias do Sul, pelas vibrações enviadas, com palavras de estímulo para que eu desenvolvesse essa pesquisa. “É difícil fazer com que uma pessoa compreenda determinada coisa quando seu salário depende do fato de ela não compreendêla.” Upton Sinclair RESUMO O presente trabalho faz uma análise do discurso organizacional como estratégia nas relações de poder. A comunicação organizacional é um recurso que deve estar comprometido com a transformação social dos seus públicos. Sendo assim, o seu discurso também deve ser empregado com esse propósito, já que a comunicação pode ser simbolicamente utilizada para o uso do poder. Nesse contexto, a questão que norteia o trabalho é: o discurso funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de poder em uma organização? No intuito de encontrar a solução do problema, delineamos, como objetivo geral, analisar o discurso organizacional como instrumento de controle e poder nas organizações. Para aprofundarmos o estudo delineamos quatro objetivos específicos: estudar o discurso dos gestores na comunicação interna, analisar até que ponto o discurso dos funcionários se relaciona com o dos gestores, identificar o processo de comunicação organizacional exercido na empresa escolhida para desenvolver o trabalho e investigar o papel do profissional de Relações Públicas na construção de uma comunicação eficaz. As hipóteses levantadas para o estudo foram: o discurso organizacional é utilizado como elemento estratégico de dominação por meio da comunicação, os funcionários são influenciados pela comunicação interna, as relações de poder nas organizações, na prática, continuam reproduzindo uma trajetória descendente. Optamos por aplicar uma pesquisa qualitativa, a partir de um estudo de caso simples, com a técnica metodológica da entrevista em profundidade e da análise do discurso. Palavras-chaves: Organizações. Comunicação Organizacional. Discurso. Poder. ABSTRACT This paper analyzes the organizational discourse as a strategy in power relations. The organizational communication is a resource that must be committed to social transformation of its public. Thus, its speech should also be employed for this purpose, since communication can be symbolically used to the use of power. In this context, the question that guides the work is: does the speech functions as an instrument for the establishment of power relations in an organization? In order to find the solution of the problem, we have outlined, as a general objective, to analyze organizational discourse as an instrument of control and power in organizations. To deepen the study, we have outlined four specific objectives: to study the discourse of managers in internal communication, analyze the extent to which the discourse of employees relates to the managers, identify the organizational communication process exercised in the company chosen to develop the work and investigate the Professional role of Public Relations in building effective communication. The hypotheses for the study were: organizational discourse is used as a strategic element of domination through communication, employees are influenced by internal communication, power relations in organizations, in practice, continue playing a downward trend. We opted to apply qualitative research, from a simple case study, with methodological technique of in-depth interview and discourse analysis. Keywords: Organizations. Organizational Communication. Speech. Power. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Aspectos formais e informais da Cultura Organizacional.......................................32 Figura 2 – As quatro etapas do processo de controle................................................................50 Figura 3 – A atividade administrativa passa através do gargalo da comunicação....................61 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – O Poder Contextual e o Poder Pessoal...................................................................42 Quadro 2 – Os Poderes..............................................................................................................45 Quadro 3 – As relações de poder como critérios para outras tipologias................................. 68 Quadro 4 – Quadro demonstrativo da conceituação lógica de público.....................................69 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................13 2 O MÉTODO.........................................................................................................................17 2.1 CIÊNCIA E PARADIGMA................................................................................................17 2.2 DEFINIÇÕES DE MÉTODO.............................................................................................18 2.3 MÉTODO ANALÍTICO E PESQUISA QUALITATIVA...................................................18 2.4 ESTUDO DE CASO...........................................................................................................19 2.5 ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE...........................................................................20 2.6 ANÁLISE DO DISCURSO................................................................................................22 3 ORGANIZAÇÕES E RELAÇÕES DE TRABALHO.....................................................24 3.1 CONCEITUANDO ORGANIZAÇÕES, EMPRESAS, INSTITUIÇÃO E CORPORAÇÃO.......................................................................................................................24 3.2 CULTURA ORGANIZACIONAL.....................................................................................28 3.3 INTERDEPENDÊNCIA FUNCIONÁRIO E EMPRESA..................................................34 4 O PODER E O DISCURSO NAS ORGANIZAÇÕES.....................................................41 4.1 AS RELAÇÕES DE PODER..............................................................................................41 4.2 OUTRAS FACES DO PODER...........................................................................................47 4.3 O DISCURSO ORGANIZACIONAL................................................................................54 5 COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL.........................................................................59 5.1 O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO...............................................................................63 5.2 OS DIFERENTES PÚBLICOS..........................................................................................66 5.3 COMUNICAÇÃO E RESPONSABILIDADE SOCIAL...................................................71 5.4 RELAÇÕES PÚBLICAS: MISTIFICAÇÕES E CONTRADIÇÕES................................74 6 O TRABALHO DE CAMPO..............................................................................................77 6.1 ANÁLISE DO DISCURSO NAS ENTREVISTAS............................................................78 6.1.1 Comunicação interna e integração..............................................................................79 6.1.2 Relações de poder...........................................................................................................84 6.2 O DIAGNÓSTICO.............................................................................................................91 6.2.1 Poder................................................................................................................................91 6.2.2 Hierarquia.......................................................................................................................93 6.2.3 Comunicação..................................................................................................................93 6.2.4 Integração.......................................................................................................................94 6.2.5 Discurso...........................................................................................................................95 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................97 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................100 ANEXOS A – PROJETO DE PESQUISA..........................................................................106 13 1 INTRODUÇÃO Observou-se a necessidade de discutir e analisar a comunicação interna nas empresas, a partir da percepção empírica de que os recursos utilizados para compartilhar as informações nem sempre são construídos em conjunto com funcionários e demais áreas que compõem a organização. Além disso, é necessário citar o interesse da autora na busca de compreensão dessas questões, mais especificamente, sobre os motivos que levam uma gestão a utilizar-se da comunicação dominadora e controlada como recurso de poder nas relações organizacionais. Nessa esfera, é importante abordar tais questões para tentar entender e observar o discurso organizacional como estratégia nas relações de poder; como essas situações impactam a vida profissional das pessoas. Para delimitarmos o campo de pesquisa, a questão que norteia e define o percurso do trabalho é: O discurso funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de poder de uma organização? O objetivo geral do trabalho é analisar o discurso organizacional como instrumento de controle e poder nas organizações. Estudar o discurso dos gestores na comunicação interna; analisar até que ponto o discurso dos funcionários se relaciona com o dos gestores; identificar o processo de comunicação organizacional exercido na empresa escolhida para desenvolver o trabalho; assim como, investigar o papel das Relações Públicas na construção de uma comunicação eficaz, são objetivos específicos que estarão presentes ao longo do estudo. As hipóteses que surgiram ao longo do trabalho são fruto das inquietações em buscar uma solução que corrobore com o problema de pesquisa. Nesse caso três hipóteses são levantadas: o discurso organizacional é utilizado como elemento estratégico de dominação por meio da comunicação; os funcionários são influenciados pela comunicação interna; as relações de poder nas organizações, na prática, continuam reproduzindo uma trajetória descendente. Observando as constantes transformações de um mercado cada vez mais competitivo, em que as organizações ganham mais espaço e importância na vida profissional e pessoal, percebe-se que as exigências aumentam na mesma proporção. Segundo Pagés, O aparelho produtivo exige trabalhadores instruídos capazes de compreender os princípios de sua ação e não apenas de cumprir tarefas rotineiras, capazes de iniciativa, não só aceitando mas desejando as mudanças, aderindo voluntariamente a seu trabalho e interessando-se por ele, capazes e desejosos de cooperar com os 14 outros, não apenas com os colegas permanentes, como nas antigas oficinas, mas de adaptação rápida a equipes mutantes, e às forças tarefas provisórias. (1987, p. 35). O aparelho produtivo do qual trata Pagés (1987), é carregado de significados, intenções e interesses. Um dos elementos que está presente nessa conjuntura é utilizar recursos que insiram o trabalhador na estrutura física e mental da empresa. Dessa forma, a identificação do trabalhador com a organização gera maior concordância com as práticas exercidas por ela e reduz resistências. Ao passo que o funcionário se sente acolhido pela empresa, esta tem mais liberdade para aplicar normas e institucionalizar condutas que ao rápido olhar parecem imperceptíveis, mas estão constantemente presentes, e traduzindo relações de controle e poder no ambiente de trabalho. Faria (1985, p.11) traz que “a dominação é um conceito-chave para a compreensão do fenômeno organizacional e se refere a um estado de coisas no qual a vontade manifestada do dominante se expressa como se os dominados a acatassem como sua”. Nas organizações, o controle pode ser exercido de diferentes formas, sendo a mais expressiva representada por meio do discurso implícito na própria fala, ou aquele de materiais impressos e online utilizados pela empresa. No discurso oficial, é possível observar a presença e o desempenho das relações de poder revelados por atitudes da empresa em relação as suas perspectivas, métodos e objetivos. Nesse contexto, podemos compreender a organização como um espaço de poder, legitimado pelo processo comunicacional. A comunicação é um dos processos mais importantes dentro de uma organização; uma transmissão incorreta ou parcial dos fatos que são de importância para todos que nela trabalham pode atrapalhar, e muito, os resultados. Por isso, a participação de todos é imprescindível para sua efetividade e o bom relacionamento ao longo da história da empresa. No entanto, alcançar este objetivo não é tarefa fácil, daí a importância de contar com o apoio de um profissional de comunicação, que consiga construir uma ponte entre funcionários e gestores dentro das organizações, desenvolvendo um trabalho em conjunto com as demais áreas e mais, que esteja ciente dos direitos da empresa, mas também de seus deveres. Esse profissional deve, ainda, estar atento a todas as mudanças ocorridas dentro e fora da empresa, já que a comunicação tem uma responsabilidade social. Ao mesmo tempo, não se trata de uma visão ingênua de que todo o responsável pela Comunicação Organizacional seja um herói, mas de um ponto de vista que coloca esse 15 profissional como um agente de transformação social, ou seja: ele é responsável pela comunicação dos “fatos e desejos” de uma empresa, tanto quanto o responsável pelo esforço em aproximar os desejos e fatos dessa empresa das necessidades, aspirações e anseios da sociedade onde ela está inserida e especialmente de seus trabalhadores. É necessário reforçar que comunicação não é somente troca de informações, principalmente quando aquilo que se transmite é suficientemente claro para o ouvinte, havendo, então, um significado comum entre as pessoas envolvidas. Buscar uma comunicação dialética1 com os empregados e os demais membros que participam da empresa é uma maneira de tentar atender às expectativas desse organismo social. Para podermos nos aprofundar na pesquisa em torno da questão norteadora e hipóteses levantadas, cumprindo nosso objetivo, o método utilizado é o qualitativo, tendo como apoio a pesquisa bibliográfica de teóricos reconhecidos e com conhecimento profundo nos assuntos. As palavras-chaves: Organizações, Comunicação Organizacional, Discurso e Poder serão embasadas nos capítulos da monografia com conceitos de autores que enriquecerão o estudo. A técnica metodológica que será aplicada na pesquisa de campo será o estudo de caso, com análise do discurso de entrevistas em profundidade. Tendo como base as palavras-chaves, dividimos a pesquisa em 5 capítulos: a Introdução; O Método; Organizações e Relações de Trabalho; O Poder e o Discurso nas Organizações; Comunicação Organizacional e, por fim, O trabalho de campo. No primeiro capítulo esclarecemos a relevância em explorar o tema para mais esclarecimentos das práticas de comunicação organizacional. Já no segundo capítulo apontamos o método e as técnicas metodológicas aplicadas, para desenvolvermos a pesquisa. No capítulo seguinte: Organizações e Relações de Trabalho examinamos a relação de dependência existente nesse contexto, onde contamos com apoio bibliográfico de Chiavenato (1994 e 1999), Dejours (2000), Srour (2004). No quarto capítulo sobre o Poder e o discurso nas Organizações nos detivemos a compreender qual o processo de empoderamento por meio do discurso por meio de conceitos que exemplificam o estudo, tendo como base: Pêcheux (1988 e 2002), Bourdieu (2001), Foucault (2006 e 2007). 1 As leis da Dialética inscrevem-se numa equação a três tempos: Tese (primeira fase) – Proposição positiva, em que a contradição parece persistir em estudo latente, característica da situação de identidade; provisório estado de equilíbrio entre elementos opostos. Antítese (ou contradição) – Primeira “negação” da tese, que por sua vez é negada, para formação de algo “novo” com auxílio do “antigo” (do que persiste da fase anterior). Síntese - “Negação” da tese e da antítese, num grau superior, positivo, que surge como consequência de uma dupla “negação”, e provoca, por um salto, a mudança de quantidade em qualidade. (SUCUPIRA FILHO, 1991, p. 83. Grifos do autor). 16 No capítulo que segue, Comunicação Organizacional, buscamos identificar a importância de possuir uma comunicação que esteja comprometida com a transformação do cidadão; nesse caso para a fundamentação teórica citamos alguns autores que fundamentaram a pesquisa, como: Peruzzo (1986 e 1998), Kunsch (2002), Guareschi (2005). No último capítulo: Pesquisa de Campo, aplicamos a análise, para responder nosso problema norteador. Além dos autores citados que fundamentam a pesquisa, também utilizamos outros teóricos como apoio para investigar melhor a pesquisa aqui proposta. Acreditamos que nossa pesquisa possa ser de grande relevância para acadêmicos do curso de Comunicação Social e, principalmente, para os profissionais de Relações Públicas, que, como agentes de transformação social, possam provocar mudanças eficazes na comunicação interna, assim como gestar relacionamentos mais horizontais no ambiente de trabalho. Uma vez que nosso trabalho pretende evidenciar as estratégias de poder desenvolvidas dentro das organizações, esperamos que o mesmo possa auxiliar o profissional nesse aspecto de identificação e diagnóstico da estrutura comunicacional das organizações. 17 2 O MÉTODO Para podermos fazer um estudo mais aprofundado sobre o problema de pesquisa: O discurso organizacional funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de poder de uma organização? Compreendemos que é fundamental nos apropriarmos de alguns conceitos que elucidarão o caminho que percorremos para alcançarmos nosso objetivo. 2.1 CIÊNCIA E PARADIGMA Barros e Duarte (2005, p.15), entendem “a ciência empírica como um discurso abstraído e construído a partir da complexidade do mundo fenomenal que envolve, a partir da constituição de um objeto científico, uma ruptura com o mundo 'vivido'”. Lakatos e Marconi definem ciência como: etimologicamente, ciência significa conhecimento; soma de conhecimento prático que servem para determinado fim; acumulação de conhecimentos sistemáticos; corpo de conhecimento consistindo em percepções, experiências, fatos certos e seguros, estudo de problemas solúveis, mediante método científico, conjunto de conhecimentos racionais, certos e prováveis, que se referem a objetos de uma mesma natureza; conjunto de proposições logicamente correlacionadas sobre o comportamento de certos fenômenos que se deseja estudar; conjunto de atitude e de atividades racionais dirigido ao sistemático conhecimento, com objetivo limitado, capaz de ser submetido à verificação. (1988, p. 22). Outra explicação, trazida por Chalmers (1993, p. 22), diz que “a ciência é baseada no que podemos ver, ouvir, tocar, etc. Opiniões ou preferências pessoais e suposições especulativas não têm lugar na ciência”. Percebemos, assim, que a ciência é uma ferramenta que possibilita aprimorar, investigar e testar diferentes saberes, por diferentes teorias, métodos e conhecimentos científicos. Ao refletirmos sobre o conceito de ciência, precisamos passar pelo conceito de paradigma. Kuhn (2003) explica que paradigma está relacionado aos elementos, conceitos e teorias que se dão por meio de uma descoberta, e se revelam através dos materiais produzidos por determinado grupo, podendo assim servirem de modelos e fomentar o desenvolvimento de novas pesquisas. Para ele os paradigmas são realizações científicas. Chalmers (1993, p. 124), diz que “o paradigma determina os padrões para o trabalho legítimo dentro da ciência que governa”. Constatamos, de modo geral, que os paradigmas 18 estão lincados com padrões convencionais que cada qual adota mediante um grupo de convívio, podendo sempre ser reformulados. Um conceito que nos auxiliará muito durante a pesquisa de campo. 2.2 DEFINIÇÕES DE MÉTODO Gil (1999, p. 26) define “método como caminho para se chegar a determinado fim”. O autor expressa, ainda, que o método proporciona ao pesquisador os meios técnicos que auxiliarão na pesquisa, determinando, também, o rumo que o trabalho deve ter, focalizando a busca do problema que envolve o estudo. Para Minayo (2004, p. 22), “a metodologia inclui as concepções teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a apreensão da realidade e também o potencial criativo do pesquisador”. Orlandi (1996, p. 15) caracteriza “a questão do método nos estudos da linguagem fundamental”. A metodologia utiliza recursos para o desenvolvimento de análise, justificativas e embasamento de ideias no problema a ser estudado. Permite analisar os métodos que melhor identificam e qualificam um estudo, para o bom desenvolvimento do trabalho. Assim, o método nada mais é do que um roteiro que propicia chegar a uma resposta. 2.3 MÉTODO ANALÍTICO E PESQUISA QUALITATIVA O método analítico, para Barros e Duarte (2005, p. 25), “estruturam a transformação de um discurso em outro”. Segundo os autores, isso ocorre porque em um primeiro momento, ao falar de determinado assunto, o sujeito expressa sua opinião baseada no senso comum ou até mesmo nas próprias experiências, e depois de ter mais informações de determinado conteúdo, baseado em uma análise mais criteriosa, é possível uma avaliação diferente do caso em questão. Eles colocam, ainda, que os procedimentos analíticos podem ser aplicados em diferentes formas, dependendo do interesse de cada pesquisador. Definido o método analítico, nossa opção será pela pesquisa qualitativa. A pesquisa qualitativa se difere da quantitativa. Enquanto a primeira preocupa-se com interpretações subjetivas, a segunda tem o foco na objetividade por meio dos números. Com 19 relação à pesquisa qualitativa, Martinelli diz: a metodologia qualitativa, pelo fato de trabalhar em profundidade, possibilita que se compreenda a forma de vida das pessoas, não sendo apenas um inventário sobre a vida de um grupo. As técnicas utilizadas permitem, entre outras coisas, o registro do comportamento não verbal e o recebimento de informações não esperadas porque não seguem necessariamente um roteiro fechado, percebendo como bem-vindos os dados novos, não previstos anteriormente. (1999, p. 39). Esse método de pesquisa permite fazer uma abordagem interpretativa do caso a ser estudado, em que se busca compreender o que é dito e o não dito. A escolha da pesquisa qualitativa justifica-se por se tratar de um estudo que “[…] lida com interpretações das realidades sociais” (Bauer e Gaskel, 2002, p. 23). Oferece a possibilidade de uma pesquisa subjetiva. 2.4 ESTUDO DE CASO Realizaremos um Estudo de Caso simples, em uma rede de Postos de combustíveis em Caxias do sul – Auto Posto Rodeio. A empresa possui sua matriz e cinco filiais na cidade; atua há mais de 45 anos no mercado de combustíveis com uma equipe de 46 funcionários ao total. Martins (2008) observa que a utilização do Estudo de Caso possibilita uma investigação profunda e intensa na unidade social definida: trata-se de uma investigação empírica que pesquisa fenômenos dentro de seu contexto real (pesquisa naturalística), onde o pesquisador não tem controle sobre eventos e variáveis, buscando apreender a totalidade de uma situação e, criativamente, descrever, compreender e interpretar a complexidade de um caso concreto. Mediante um mergulho profundo e exaustivo em um objeto delimitado – problema da pesquisa – o Estudo de Caso possibilita a penetração da realidade social não conseguida plenamente pela avaliação quantitativa. (2008, s.p.)2. Para Yin, o estudo de caso é uma inquirição empírica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de um contexto da vida real, quando a fronteira entre o fenômeno e o contexto não é claramente evidente e onde múltiplas fontes de evidência são utilizadas. (2001, p. 32). Já, Martinelli define: “o estudo de caso é, portanto, uma investigação empírico 2 Apresentação do Livro Estudo de Caso: uma estratégia de pesquisa (2008). 20 indutiva, na qual o caso é a unidade significativa do todo, a deter a possibilidade de explicação da realidade concreta” (1999, p. 49). Nogueira (1977), percebe o estudo de caso como uma técnica que procura fazer um exame minucioso dos olhares com perspectivas diferentes do objeto que se deseja conhecer. Gil, explica que “o estudo de caso é caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira a permitir o seu conhecimento amplo e detalhado” (1999, p. 72). O estudo de caso proporcionará fazer uma avaliação mais precisa de fatos que estão presente cotidianamente na vida das pessoas que compõem o case de estudo, desmascarando situações e condições sociais. 2.5 ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE Pode-se definir entrevista como a técnica em que o investigador se apresenta frente ao investigado e lhe formula perguntas, com o objetivo de obtenção de dados que interessem à investigação. A entrevista é, portanto, uma forma de interação social. (GIL, 1999, p. 118). Para a realização das entrevistas, Gaskel (2008), entende que um maior número de entrevistas não é requisito para melhorar significativamente a qualidade, ou fazer uma análise mais detalhada da pesquisa. Ele traz duas explicações para essa observação. Inicialmente porque há uma quantidade restrita de versões da realidade, a interpretação das experiências são resultados de sistemas sociais, não são criadas somente das mentes individuais. Nesse contexto, representações relevantes em comum ou de um grupo de pessoas em um ambiente social são partilhadas. Sendo assim, tópicos comuns começam a evidenciar-se, o que faz crescer a confiança da compreensão do fenômeno, então o pesquisador dá-se conta de que possivelmente não surgirá nenhuma novidade ou surpresa das falas. O segundo ponto se refere ao tamanho do corpus a ser observado: “a transcrição de uma entrevista pode ter até 15 páginas” (GASKEL, 2008, p. 71). O autor observa que o entrevistador precisa viver as entrevistas, ter a capacidade de lembrar as expressões faciais, físicas e emocionais do entrevistado, o espaço que se deram as entrevistas, etc, já que corre-se o risco de perder observações importantes para a pesquisa. Por essas razões o autor diz que há um limite máximo ao número de entrevistas que serão feitas e possíveis para analisar, então, “para cada pesquisador, este limite é algo entre 15 e 25 21 entrevistas individuais” (2008, p. 71). Optamos, então, em realizar as entrevistas com 16 pessoas, um bom número para a verificação na análise; as mesmas foram gravadas para o registro integral das respostas. A técnica utilizada para a escolha dos entrevistados foi por meio de um sorteio entre os funcionários da empresa; assim, evitamos que haja alguma intervenção tendenciosa do entrevistador. O critério dos que serão entrevistados é variado entre a matriz e as cinco filiais; mulheres, homens, mais velhos, mais jovens, chefia, sem poder algum, de diferentes filiais, com bom tempo de casa e contratados há pouco tempo. Conforme Barros e Duarte (2005) é importante observar as diferentes visões sobre o mesmo assunto quando não há uma linearidade do cargo dos funcionários ou seleção dos recém-chegados com os com mais tempo de casa na organização. A entrevista em profundidade segundo Barros e Duarte (2005, p. 62), “é um recurso metodológico que busca, com base em teorias e pressupostos definidos pelo investigador, recolher respostas a partir da experiência subjetiva de uma fonte, selecionada por deter informações que se deseja conhecer”. Essa técnica nos auxiliou a realizar uma investigação mais detalhada do problema proposto, a partir das vivências de cada entrevistado. Dentre os tipos de entrevistas, elegemos a semiaberta para executarmos na pesquisa: uma entrevista semiaberta geralmente tem algo entre quatro e sete questões, tratadas individualmente como perguntas abertas. O pesquisador faz a primeira pergunta e explora ao máximo cada resposta até esgotar a questão. Somente então passa para a segunda pergunta. Cada questão é aprofundada a partir da resposta do entrevistado, como um funil, no qual, perguntas gerais vão dando origem a específica. (BARROS e DUARTE 2005, p. 66). Esse perfil de entrevista nos oferece um exame mais detalhado e profundo das respostas para a investigação. Como esboço do questionário aplicado, programamos as seguintes: a) Como funciona a comunicação dos chefes com os funcionários? Há uma estrutura de hierarquia na comunicação? b) As escalas de trabalho dos finais de semana são construídas em conjunto com os funcionários? c) Quanto à liberação para consultas, exames, etc, como é feita essa comunicação aos gestores? É realizada com antecedência, interfere na escala de trabalho? d) Como é gerenciada a comunicação entre as filiais? 22 e) Como é a relação entre as pessoas do escritório e os da pista? f) Os trabalhadores sabem que mesmo não estando no papel existe uma hierarquia de poder de decisão na empresa? Como funciona? g) Os funcionários têm liberdade para mudar sistemas e rotinas e para sugerir coisas novas? h) A empresa é mais formal ou informal para suas normas e regras? i) Existe uma rotatividade na empresa? Por quê? Lembramos que as perguntas poderão ser mais exploratórias conforme possibilita a técnica das entrevistas semiabertas. 2.6 ANÁLISE DE DISCURSO Além disso, aplicamos a Análise de Discurso para aprofundar a pesquisa. A definição pela Análise de Discurso especificamente da Escola Francesa (Pêcheux, 1988). O autor (1988) analisa o discurso a partir de quem o emite. Quanto mais poder o emissor possui, mais força o discurso ganha: […] O sentido de uma palavra, de uma expressão, de uma preposição, etc., não existe em si mesmo, isto é, em sua relação transparente com a literalidade do significante, mas ao contrário é determinada pelas posições ideológicas que estão em jogo no processo sócio-histórico no qual as palavras, expressões e preposições são produzidas […]. Poderíamos resumir esta tese dizendo: as palavras, expressões, preposições, etc., mudam de sentido segundo as posições sustentadas por aqueles que as empregam, o que quer dizer que elas adquirem sentido em referência a essas posições, isto é, em referência às formações ideológicas […] nas quais essas posições se inscrevem. (PÊCHEUX, 1988, p. 160). Barros e Duarte significam o discurso como: a apropriação da linguagem (código, formal, abstrato e impessoal) por um emissor, o que confere a este um papel ativo, que o constitui em sujeito da ação. Aquele que classifica, ordena e organiza, enfim, significa o mundo mostrado; persuade, convence o locutor da pertinência de seu modo de classificar, ordenar e organizar o mundo mostrado; e constrói uma voz, um modo de falar, um entendimento do mundo. (2005, p. 305). Nessa mesma linha de raciocínio, Orlandi (1996, p. 17), coloca que “o discurso é um objeto histórico-social, cuja especificidade está em sua materialidade, que é linguística”; como diz Orlandi, a linguagem é uma intervenção, uma manifestação do homem com sua 23 realidade social e natural. Nessa relação o autor (1996) constata que “o estudo da linguagem não pode estar apartado da sociedade que produz”. Tais definições nos fazem entender a importância da fala, da linguagem na comunicação, pois as palavras não possuem somente o significa etimológico em si, mas também caracterizam, identificam cada indivíduo, por carregar as ideologias3 e histórias particulares. O método e as técnicas explicadas, foram o guia para a caminhada, com o objetivo de chegar o mais próximo possível da resposta para o problema da pesquisa. Na medida em que nos apropriamos e dominamos as técnicas metodológicas de pesquisa, mais nos aproximamos da solução do problema da pesquisa. 3 […] a ideologia é um ideário histórico, social e político que oculta a realidade, e que esse ocultamento é uma forma de assegurar e manter a exploração econômica, a desigualdade social e a dominação política. (CHAUÍ, 2001, p. 7). 24 3 ORGANIZAÇÕES E RELAÇÕES DE TRABALHO 3.1 CONCEITUANDO ORGANIZAÇÃO, EMPRESA, INSTITUIÇÃO E CORPORAÇÃO Acreditamos que seja necessário diferenciar os conceitos de organização, empresa, instituição e corporação para não fazer uso incorreto dos termos durante o desenvolvimento do trabalho, Srour diz que: as organizações podem ser definidas como coletividades especializadas na produção de um determinado bem ou serviço. Elas combinam agentes sociais e recursos e se convertem em instrumentos da “economia de esforço”. Potenciam a força numérica e tornam-se o terreno preferencial em que ações cooperativas se dão de forma coordenada. (2004, p. 107). O autor salienta que “as organizações são planejadas de forma deliberada para realizar um determinado objetivo” (2004, p. 108). Suas atividades internas buscam reproduzir-se, fazendo com que os objetivos pelos quais determinados objetos foram criados, destinem-se para suprir finalidades que beneficiem a sua própria burocracia (SROUR, 2004). Sólio acrescenta que, o modo como elas se desempenham e atuam está intrinsecamente ligado a fatores da política, da economia e da sociedade onde se inserem, atualizando-se ora como causa, ora como consequência, ora como meio, ora como fim, em movimentação permanente, que inclui a disputa interna de poder. (2010, p. 63). Ao definir o que é uma organização, Chiavenato (1999, p. 8) explica que ela “é uma entidade social4 composta de pessoas que trabalham juntas e deliberadamente estruturada em uma divisão de trabalho para atingir um objetivo comum”. Megginson (1986, p. 191), define organização como “um grupo de indivíduos com uma meta comum, reunidos por um conjunto de relacionamentos de autoridade e responsabilidade”. Ou seja, as organizações têm como objetivo, unir a força de trabalho individual para alcançar um objetivo coletivo, em um ambiente hierárquico. Kunsch (2002) faz uma abordagem mais abrangente da organização. Segundo a autora, é preciso extrapolar a ideia de uma estrutura interna e imóvel; tem-se que analisar uma 4 Ao dizer que a organização é uma entidade social deliberadamente estruturada, queremos dizer que as tarefas são divididas entre seus membros, e a responsabilidade pelo seu desempenho é atribuída a cada um dos membros da organização. (CHIAVENATO, 1999, p. 8). 25 estrutura também a partir do contexto social, político, econômico, tecnológico, ecológico e cultural em que ela está inserida. Fatores que podem afetar diretamente uma organização. Já, Freitas “vê as organizações como lugar de representações e interação humana, e não apenas como lugar de relações produtivas e racionais” (2002, p. 84). Para conceituar organizações, Litterer esclarece que é necessário entender que ela pode ser formal5 ou informal6, e que independentemente de sua finalidade, elas “são constituídas por pessoas que têm uma série de atividade bastante estáveis e regulares, e interrelações de acordo com o que é determinado pela organização” (1970, p. 26). O termo organizações definido por Pagés, é um conjunto dinâmico de respostas e contradições. É realmente um sistema, mas um sistema de mediações que só pode ser compreendido pela referência à mudança das condições da população e das contradições entre os trabalhadores por um lado, a empresa e o sistema social do outro. (1987, p. 31). Diante de tais definições, entendemos que uma organização é composta por pessoas que de modo geral têm um objetivo em comum: a construção de um produto ou serviço, para consumo próprio ou não. Esses indivíduos possuem tarefas e responsabilidades deliberadas e definidas pela organização, buscando um resultado. Acrescentamos, também, que é necessário que ela esteja interligada com o ambiente e contexto social que a cerca, como fala Kunsch (2002). Ao compreendermos o que é uma organização, buscaremos explicar o que é uma empresa. Drucker é enfático ao dizer que, numa empresa, existe um resultado financeiro. Lucro e prejuízo por si sós não são eficientes para julgar o desempenho, mas, pelo menos, são coisas concretas. Quer os executivos da empresa gostem ou não, o lucro certamente será usado para medir seu desempenho. (1997, p. 79). O autor explica que o lucro é uma avaliação do desempenho, ou seja, uma consequência do esforço do trabalho empregado para alcançar um objetivo dentro da empresa. 5 As organizações formais produzem algum objeto, como um automóvel, um serviço, tal como assistência médica. Porque estão vinculadas a algum grau de planejamento consciente e seus propósitos e objetivos são mais observáveis. O que produzem é em parte, consumido pela sociedade fora da organização em si. (LITTERER, 1970, p. 25). 6 Organizações informais são aquelas que não produzem necessariamente um resultado visível imediato ao mundo exterior. Por exemplo, um grupo de pessoas reúne-se costumeiramente a fim de tocar música de câmara, para seu próprio prazer. A música, produto dessa organização, é desfrutada somente pelos próprios membros do grupo. Isto é, a organização consome seu próprio produto. (LITTERER, 1970, p. 25). 26 Ele ainda reforça que “o lucro tem uma segunda função, […] É o prêmio pelo risco da incerteza. A atividade econômica, porque é uma atividade, se volta para o futuro; a única coisa certa sobre o futuro é a sua incerteza, os seus riscos” (1975, p. 77). Chiavenato esclarece que a empresa pode ser compreendida como “um sistema aberto, em constante intercâmbio com o meio ambiente externo que a envolve e do qual faz parte” (1994, p. 70). Ele relata ainda que cada empresa constitui uma criação particular, uma invenção específica, pois cada empresa tem as suas próprias características, seus recursos, seus objetivos, etc. A empresa é uma organização social que utiliza recursos a fim de atingir determinados objetivos. (1989, p. 1). Podemos acentuar que uma empresa objetiva o lucro como foco principal, pela exploração de algum negócio. Ao longo do trabalho estudamos uma empresa do mercado de combustíveis que visa ao lucro. De modo geral podemos notar que toda “empresa é uma organização”, como citou Chiavenato, mas não podemos generalizar ao dizer que todas as organizações são uma empresa, pois as organizações também podem ser como ONGs, organizações não governamentais e sem fins lucrativos. Buscaremos agora, assimilar o conceito de instituição. Srour menciona três aspectos para o termo “instituição”, que se aplicaria a organizações dotadas de certa estabilidade estrutural – a escola ou o conjunto de escolas componentes da rede de ensino; ou àquelas unidades sociais que adquiriram certo significado especial, valorizadas por si mesmas e por sua responsabilidade social – a Igreja Católica, as Forças Armadas, a Universidade de São Paulo; ou ainda, um complexo consagrado de normas, baseado em valores arraigados e com longa duração no tempo. Ficando com esta última acepção, ele define as instituições como “conjuntos de normas sociais, geralmente de caráter jurídico, que gozam de reconhecimento social”. (1998, p. 108. Grifos do autor). Nessa linha de raciocínio, com a última interpretação do autor, podemos observar que as instituições estão muito ligadas à transmissão de valores, práticas de comportamento e modelos que podem ser seguidos pela comunidade entorno dela. Pereira (1988, p. 10), seguindo Selzinick, entende que “artefatos, papéis, ideologias e cerimônias, como cartão de crédito, a família, a maternidade, a democracia, o capitalismo e o casamento são conceituados como instituição”. Além de complementar a concepção de Srour para instituição, Pereira explica que: 27 a instituição é um organismo vivo, produto de necessidades e pressões sociais, valores pelos seus membros e pelo ambiente, portadora de identidade própria, preocupada não somente com lucros ou resultados mas com a sua sobrevivência e perenidade, e guiada por um claro sentido de missão. As pessoas constroem suas vidas em torno delas, identificam-se com elas e tornam-se dependente delas. (1988, p. 10). Ao concordar com Pereira quando esse diz 'produto de necessidades e pressões sociais', Oliveira (2001, p. 162), coloca que “nenhuma instituição surge sem que tenha surgido antes uma necessidade”. Assim, ele conceitua: “instituição é o que está instituído, constituído, sedimentado na sociedade. São modos de pensar, de sentir e de agir que a pessoa encontra preestabelecidos e cuja mudança se faz lentamente como um meio para satisfazer as necessidades da sociedade” (p. 162). Podemos constatar que o que distingue uma instituição de uma organização ou empresa é que as instituições são organismos que não focam somente na produção do resultado final, ou no lucro em si; mas, como diz Pereira (1988), ela possui personalidade própria, capacidade de se adaptar ao ambiente que está inserida, capaz de reformular ideias e transferir valores às outras organizações. Drucker frisa que “a instituição sem fins lucrativos não é paga por seu desempenho […] a instituição não consegue gerar mais que uma fração dos fundos de que necessita para operar. Numa empresa, desempenho é aquilo pelo que o cliente está disposto a pagar” (1997, p. 80. Grifo do autor). No que se refere ao conceito de corporação Bakan (2007), relata que o termo constitui um grupo de pessoas que juntam seus recursos financeiros para montar um negócio, tornandose proprietários e sócios de uma companhia, enquanto quem administra, não é necessariamente dono do empreendimento. Acentua ainda que “o objetivo legalmente definido de uma corporação é a defesa, impiedosa e sem exceções, de seus interesses, não importando as consequências que causem aos outros” (2007, p. 2). Segundo o autor, a corporação é uma busca patológica pelo poder, ela é perigosa por possuir grande influência sobre as pessoas e a sociedade. Bakan expressa que as corporações estão em ascensão nos últimos anos por estarem a frente de tudo o que nos rodeia, sendo assim, nos encontramos cercados por sua cultura, cada vez mais elas determinam o que comemos, a que assistimos, o que fazemos, justamente por se mostrarem eficazes e superiores às fraquezas e ameaças do mercado, somando, assim, “sua capacidade de combinar o capital, e portanto o poder econômico, de um ilimitado número de 28 pessoas” (2007, p. 9). A nova norma é a responsabilidade social, que segundo o autor (2007) é uma forma de reparar as atitudes cometidas nas corporações que agiam pela ambição, mas que ainda assim, não mudaram sua essência, continuam valorizando seus interesses e desconsidera os valores morais. Assim, segundo o autor, constatamos que a corporação está intimamente ligada aos benefícios particulares dos acionistas, que além de visarem ao lucro, como é o caso das empresas, tornam-se mais perversas por pouco ou não se preocuparem com os valores éticos e morais relacionados as suas ações e desconsiderarem a importância do ser humano para a produção do seu negócio. Com os conceitos esclarecidos e definidos, daremos andamento ao trabalho explicando a cultura organizacional. 3.2 CULTURA ORGANIZACIONAL Para compreendermos como se desenvolve a cultura dentro das organizações, buscamos nos apropriar do conceito de cultura. Segundo o pioneiro que definiu o termo cultura, Edward Taylor, o indivíduo está sempre envolvido pela cultura, partilhando valores, experiências, crenças, ideologias, conforme o ambiente em que vive, com grande capacidade de aprendizado, ou seja, ela não é algo inato ou genético para o ser humano (apud LARAIA, 2004). Srour concorda com Laraia no sentido de que a cultura não se origina de uma herança biológica ou genética, porém resulta de uma aprendizagem socialmente condicionada. É disso que se trata quando falamos de socialização ou endoculturação: os agentes sociais adquirem os códigos coletivos e os internalizam, tornam-se produtos do meio sociocultural em que crescem; conformam-se aos padrões culturais, e, com isso, submetem-se a um processo de integração ou de adaptação. (2004, p. 174). Geertz, (1989), entende a cultura como uma teia de significados, tecida individualmente e complementada por meio da associação de ideias amarradas coletivamente. Possui, assim, uma visão interpretativa da cultura, em busca de significado, logo culturas diferentes originam ações e interpretações diferentes. Seu conceito é fundamentalmente semiótico. Para Santos, 29 cultura é uma dimensão do processo social, da vida de uma sociedade. Não diz respeito apenas a um conjunto de práticas e concepções. […] Cultura não é algo natural, não é uma decorrência de leis físicas ou biológicas. Ao contrário, a cultura é um produto coletivo da vida humana. Isso se aplica não apenas à percepção da cultura, mas também à sua relevância, à importância que passa a ter. Aplica-se ao conteúdo de cada cultura particular, produto da história de cada sociedade. Cultura é um território bem atual das lutas sociais por um destino melhor. (1983, p. 44-45). O autor explica que se a compreensão do termo cultura faz com que pensemos na diversidade de povos, sociedades, nações ou grupos, valores e crenças, suas formas e relações é porque eles estão em constante interação, nos convidando a fazer uma reflexão sobre nossa própria realidade social (SANTOS, 1983). Assim, entendemos que não há como dizer que a cultura existe independentemente da vida social. Ela é transformada e recriada conforme as relações de conflitos entre os sujeitos, no contexto ideológico, econômico, político, histórico, pois, a cultura é um fenômeno cíclico, que vai se construindo com a intervenção de cada indivíduo, por isso é mutável com o decorrer dos anos. Pelo fato de cada um estar impregnado de cultura, por entender-se como um ser social, é possível observar como a cultura pode influenciar a vida particular das pessoas, suas vivências e formas de ver e acreditar no mundo, determinando assim sua conduta (SANTOS, 1983). Somamos a isso o conceito de Schein, o qual relata que em um grupo, a cultura é um padrão de assuntos básicos compartilhados que um grupo aprendeu como maneira de resolver seus problemas de adaptação externa e integração interna e que funciona bem a ponto de ser considerado válido e desejável para ser transmitido aos novos membros como a maneira correta de perceber, pensar e sentir em relação àqueles problemas. (2009, p. 16). Na medida em que assimilamos que a cultura pode influenciar, Santos entende que “as próprias preocupações com cultura nasceram associadas às relações de poder” (1983, p. 80). Nesse caso, a cultura também pode ser utilizada para controle de um grupo, já que os indivíduos podem identificar-se ou serem provocados a pensar e agir dentro de determinados padrões. Ao passo que apreendemos o significado de cultura, vamos examinar como ela se desenvolve no âmbito organizacional, assim faremos uma análise melhor da sua aplicabilidade na empresa que vamos estudar. Srour considera que 30 nas organizações a cultura impregna todas as práticas e constitui um conjunto preciso de representações mentais, um conjunto muito definido de saberes. Forma um sistema coerente de significações e funciona como um cimento que procura unir todos os membros em torno dos mesmos objetivos e dos mesmos modos de agir. (2004, p. 175). Ao dizer que a cultura está presente em todas as atividades e íntegra “um conjunto de representações mentais”, que estão enraizadas nas práticas cotidianas, ele expressa também que os saberes vão sendo moldados pelas opiniões individuais partilhadas com o grupo. Em um ambiente em que a mobília, as cores, a arquitetura, o movimento das pessoas, os materiais utilizados, são carregados de sensações, interpretações tanto daqueles que já reconhecem o espaço, como os novatos que ainda têm que decodificar e adaptar-se aos costumes praticados naquele ambiente. Por isso, “as representações imaginárias que uma organização cultiva identificam quem é quem, demarcam praxes nem sempre explícitas, impõem precedentes e formalidades compulsórias, regulam expectativas e pautas de comportamento” (2004, p. 168). Para ele, a cultura organizacional tem vida própria, “exprime então a identidade da organização. É construída ao longo do tempo e serve de chave para distinguir diferentes coletividades” (SROUR, 2004, p. 174). Na visão de Motta, o comportamento das organizações varia culturalmente, […] a conduta de executivos e trabalhadores baseiam-se em crenças, atitudes, valores e, em certa medida, verdadeiros ciclos viciosos de comportamento são causados por crenças, atitudes e valores. (1997, p. 25 e 26). O universo de significações, no qual o ser humano está inserido, e que constantemente decodifica palavras, manifestações, posturas das pessoas que o cercam, é processado mentalmente recebendo sentidos. As interpretações feitas pelo indivíduo estão sempre relacionadas a uma espécie de linguagem peculiar, concluindo que “cultura é linguagem, é código” (1997, p. 27). A cultura indica, categoriza, interliga, coloca em ordem a estrutura de significados, influencia nas relações, fazendo com que cada sujeito proteja seus interesses e convicções dentro das organizações (MOTTA, 1997). Já Freitas entende a cultura organizacional primeiro como instrumento de poder, segundo, como instrumento de representações imaginárias sócias que se constroem e reconstroem nas relações cotidianas dentro da organização e que se expressam em termos de valores, normas, significados e 31 interpretações, visando um sentido de direção e unidade, tornando a organização fonte de identidade e de reconhecimento para seus membros. (2002, p. 96). A autora complementa que, por meio da cultura organizacional, é decidido e comunicado o que é realmente importante e cabe aos membros saberem, o comportamento padrão aceito, a maneira mais adequada de pensar e agir tanto no ambiente interno, quanto no externo, simultaneamente, é através dos elementos culturais que as organizações mostram-se em um lugar de excelência, tomadas de valores, em que estão sempre acima de toda e qualquer eventualidade, capazes de se renovar constantemente. Nesse contexto, os discursos das organizações acabam ganhando características humanas, virtuosas e perfeitas, em um estágio em que os indivíduos se sentem acolhidos e reconhecidos por ela que os leva a idealizá-la e enxergar nela o único lugar para realizar-se profissionalmente e como pessoa, e isso é extremamente problemático, porque a realização profissional acaba sendo sinônimo de autoestima, e identidade pessoal é o mesmo que identidade profissional (FREITAS, 2002). Para Chiavenato, “cultura organizacional é o conjunto de hábitos e crenças, estabelecidos através de normas, valores, atitudes e expectativas compartilhados por todos os membros da organização. A cultura espelha a mentalidade que predomina em uma organização” (1999, p. 172-173). Sendo assim, cultura é a forma que cada organização aprendeu a laborar em seu ambiente, é esse misto de histórias, comportamentos, ideias que quando unidas, demonstram a maneira particular do funcionamento e do trabalho desenvolvido em uma organização (CHIAVENATO, 1999). No entanto, a cultura mostra alguns aspectos formais mais perceptíveis e encobre aspectos informais, que são mais difíceis de interpretar e fazer alterações. O autor compara essa relação de formal (parte superior) e informal (parte inferior), com um iceberg apontando características que se encaixam em cada um. 32 Figura 1 – Aspectos formais e informais da Cultura Organizacional Fonte: CHIAVENATO, 1999, p. 173 O quadro demonstra como se dão as relações dentro de uma organização, possibilitando observar como se configura a dinâmica de interesses. A proposta de Fleury para cultura organizacional é concebida como “elementos simbólicos, que em sua capacidade de ordenar, atribuir significações, construir a identidade organizacional, tanto agem como elemento de comunicação e consenso, como ocultam e instrumentalizam as relações de dominação” (1996, p. 22). A autora também sugere uma metodologia para podermos descobrir a cultura de uma empresa, ela apresenta seis tópicos importantes de observação: 1) Histórico das organizações: Ao resgatar o histórico da empresa, com olhar no contexto social, político e econômico da época, entenderemos melhor suas práticas e objetivos. 2) O processo de socialização de novos membros: O processo de integração do indivíduo na empresa, é de extrema importância para que o mesmo replique as crenças e normas de comportamento. 3) As Políticas de Recursos Humanos: Examinar as políticas empregadas no processo de recrutamento, seleção e desenvolvimento falam muito sobre os padrões culturais aplicados, 33 quando mediados pelo capital e o trabalho. Auxiliando também na construção de identidade organizacional. 4) O Processo de Comunicação: O mapeamento dos meios formais e informais, como os jornais, informativos, reuniões, telefonemas, entre outros, são fatores essenciais no processo de produção, transferência e cristalização do universo simbólico. 5) A Organização do Processo de Trabalho: Investigação da organização do método, em seu contexto tecnológico e social, favorecem para perceber as categorias existentes na relação de trabalho. 6) As Técnicas de Investigação: Refere-se as técnicas metodológicas que serão aplicadas. Podem ser qualitativas ou quantitativas, conforme o desejo do pesquisador, aplicando questionário, realizando entrevistas, no intuito de conseguir informações mais precisas sobre a cultura organizacional. Essa metodologia nos auxiliará na análise da pesquisa de campo a reconhecer a cultura estabelecida na empresa. A cultura expõe a maneira de pensar e agir de uma organização, é sua identidade, o posicionamento que ela possui perante os seus membros, fornecedores, clientes, concorrentes e sociedade de modo geral. Sendo assim, ela se apresenta como um elemento de forte influência, demarca relações de poder, além de estipular valores, crenças e condutas aceitáveis dentro da organização, é ela que defini quais são os profissionais que melhor se encaixam dentro dos padrões praticados para serem aceitos dentro da organização. Diante da força representativa e simbólica que a cultura carrega, compreendemos que a comunicação desenvolvida no âmbito organizacional deve estar comprometida em demonstrar a cultura vigente praticada por ela. Acreditamos que a comunicação tem o papel de evidenciar, e se preciso, modificar a cultura de uma organização, já que ela também ajuda a construir a imagem7 dessa, o reconhecimento por seus pares, assim como a reputação, fatores que perpassam a cultura. Pensamos também que ao mensurar a cultura de uma organização, é necessário observar que tipo de comunicação está sendo praticada por ela e qual a influência da cultura nesse processo. Para nos aproximar mais do tema central da pesquisa, vamos explorar mais a cultura 7 A identidade de uma empresa é o resultado das percepções públicas, ou seja, como o público a enxerga por meio de suas ações de comunicação. Assim, toda empresa tem uma identidade própria conferida por seus públicos. O reflexo dessa identidade é a imagem da empresa. Já o reflexo da imagem ou o acúmulo da imagem ao longo do tempo é o que constrói a reputação de uma empresa. Imagens positivas constroem reputação positiva. (SILVA NETO, 2010, p. 5). 34 organizacional na relação de interdependência funcionário e empresa, assim vamos observar como se constitui os instrumentos de poder, do qual fala Freitas, já que o comportamento é moldado conforme os desejos e princípios da empresa. 3.3 INTERDEPENDÊNCIA FUNCIONÁRIO E EMPRESA O ambiente organizacional é permeado por relações de trabalho, que Dejours entende como “todos os laços humanos criados pela organização do trabalho: relações com a hierarquia, com as chefias, com a supervisão, com os outros trabalhadores” (2000, p. 75). Um local em que todos os interesses devem ser equilibrados para haver uma harmonia no modo de se relacionar. Envolve relações de dependência financeira por parte dos empregados e a necessidade da força de trabalho dos funcionários por parte da empresa. Srour acredita que para garantir uma boa convivência coletiva, são necessário mecanismos de adesão e integração, assim como de domínio e coibição, já que a inexistência de normas compromete o relacionamento entre as pessoas: por falta de uma disciplina mínima, nenhuma coletividade humana funciona. Além de meios de subsistência para poder reproduzir-se, as coletividades necessitam de padrões culturais (princípios, valores, crenças, normas morais) para que sejam inculcadas convicções e para que as ações sociais tenham pautas comuns. (2004, p. 133). Somente dessa forma, o autor considera possível interferir sobre a convivência social, sobre a consciência simbólica8 e as aspirações políticas dos agentes. Para ele, “as organizações navegam em mar tempestuoso e, mesmo sem sabê-lo, administram uma complexa equação de interesses” (2004, p. 126). Faria, diz que “a vida social é percebida pelos agentes como um conjunto de comportamentos visíveis imediatamente, o qual é estritamente ordenado através de normas, de regras, de regulamentos da estrutura organizacional, enfim, de um simbólico unívoco”. (1985, p. 35). O estabelecimento da confiança nas relações de trabalho, se dá, também, por meio da comunicação dos gestores, que buscam familiarizar-se com as necessidades dos funcionários, 8 Por consciência simbólica, o autor considera todos os padrões culturais somados às representações mentais empíricas que cada indivíduo possui, que assim constroem o modo de perceber e analisar o mundo que o cerca. (SROUR, 2004). 35 o que acaba estimulando os bons resultados. Como reforça Hornstein, a identificação organizacional influencia muito os resultados financeiros de uma empresa […] o sucesso corporativo está diretamente relacionado à presença de uma força de trabalho capaz de atestar que, “no nosso trabalho, nossa opinião é levada em conta; os colegas estão comprometidos com qualidade; temos diariamente a oportunidade de fazer melhor; e há uma ligação perceptível entre o que fazemos e a missão da empresa”. (2003, p. 3). Para o trabalhador, o seu serviço ganha mais valor quando reconhecida sua força de trabalho por parte da empresa, impulsionando-o a produzir sempre mais, melhor, subir de cargo e sentir-se de fato parte de algo que é essencial à vida das pessoas para sua subsistência – o trabalho. Fazendo uma interpretação da visão de Pagés, é possível observar que o desejo pelo reconhecimento atinge inclusive os valores individuais, “o sucesso, a ambição, fazer carreira vão se tornar para o indivíduo os valores essenciais, pois são eles e só eles que podem preencher esta angústia do vazio: para ser reconhecido é preciso vencer” (1987, p. 135) Esse ponto que interfere na forma de pensar do indivíduo, pode tornar-se uma problemática, na medida em que o funcionário acredita fielmente que o que importa é vencer dentro da empresa, pois ele acaba criando uma estrutura mental de ganância e de superioridade, capaz de agir de forma que valores morais fiquem em segundo plano. É importante notar que para a organização adquirir credibilidade diante do olhar dos funcionários é essencial que ela redobre sua atenção com relação à forma de administrar as opiniões dos empregados para executar projetos. Hornstein diz que a confiança dos trabalhadores nos líderes se deve menos às ações para a resolução de problemas atuais ou à prevenção dos futuros e mais à visão que têm sobre a consideração que os líderes demonstram para com suas opiniões e necessidades no momento da tomada de decisões e sobre a discussão destas com a equipe. (2003, p. 85). Assim, comprova-se que uma relação gestor-funcionários é mais produtiva quando há uma percepção de que a voz dos funcionários está sendo ouvida por seu superior. Hornstein (2003) ressalta que a carga de responsabilidade de um bom relacionamento é a mesma tanto para o empregado quanto para o gestor, pois, ao mesmo tempo em que o funcionário têm que cumprir horários e tarefas designadas a ele, os gestores devem também manter pagamentos em dia e saberem ser bons receptores diante das reivindicações feitas, buscando melhorias para a organização como um todo. O que é questionável é a maneira como se desenvolvem os laços sociais no confronto de interesses. 36 É oportuno colocar que as organizações são envolvidas por relações de mediação. Para Pagés, o processo de mediação se coloca como a aliança das restrições (coerção) da empresa e os privilégios oferecidos ao indivíduo. Os privilégios funcionam como um terceiro termo que vem ocultar a contradição entre os objetivos da empresa, os do sistema capitalista (o lucro e a dominação) e os objetivos dos trabalhadores. (1987, p. 27). Esse balanço entre restrições da empresa e privilégios oferecidos coloca os trabalhadores em um sistema de produção moderno, com habilidade de criação, participação, proporcionando aos mesmos uma sensação de satisfação ou desestabilização de ordem financeira, governamental, regalias, bons salários, trabalho relevante, entre outros fatores, combinando o contentamento e a retribuição dos indivíduos com a garantia de domínio por parte da empresa, subordinando as forças de trabalho aos interesses da mesma; ou seja, “os privilégios são oferecidos por ela, ao seu modo, segundo sua própria lógica. A empresa reforça assim a dependência dos trabalhadores, destituindo-os do poder de organizar eles próprios a produção em relação a ela” (PAGÉS, 1987, p. 28). Na medida em que a cultura organizacional é apresentada e designada aos funcionários, havendo uma identificação, reconhecimento e confiança de seus costumes e valores por seus membros, é que ao longo dos anos o trabalho ganhou mais espaço e importância na vida das pessoas. É possível perceber essa relação na medida em que ele tende a ocupar outros ambientes, como a própria casa que, para muitos profissionais, passa a ser uma extensão do local de trabalho. Para Dejours (2000), fora ou dentro da organização do trabalho, o homem está condicionado ao modo de produção. É como se ele estivesse contaminado, pois mantém a mesma forma de pensar e agir. Assim, “o ritmo do tempo fora do trabalho não é somente uma contaminação, mas antes uma estratégia, destinada a manter eficazmente a repressão dos comportamentos espontâneos que marcariam uma brecha no condicionamento produtivo” (DEJOURS, 2000, p. 47). Com relação à importância com que se trata o trabalho, Antunes diz que ele é: um processo entre o homem e a natureza. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriarse da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo sua própria natureza. (2004, p. 36). 37 Para Srour (2004), o trabalho é o alicerce e é essencial para as práticas coletivas da vida humana, não sendo possível viver fora de vínculos sociais. É uma intervenção desempenhada por um trabalhador, ou vários deles, que condiz com um processo de transformação do mundo. Pois: o trabalho é a chave da produção econômica. Sem ele, não há geração de valor e a vida em sociedade se inviabiliza, porquanto os agentes sociais precisam produzir seus próprios meios de subsistência, […] quaisquer bens da natureza dependem de esforço humano para serem transformados em bens socialmente úteis. (2004, p. 132). Enriquez contribui com essa importância e crença de que o ser humano concede ao trabalho, “é através do trabalho que o indivíduo demonstra seu próprio poder sobre as coisas, é pela invenção 'fabricadora' que ele torna possível a realização de seus desejos 'e até mesmo ter desejos e sonhos'” (2007, p. 58). Compreende-se, assim, que o trabalho tornou-se essencial na vida do ser humano, porque o sujeito se sente útil e capaz de conquistar seus objetivos materiais ou não, por meio dele, podendo, assim, transformar o meio em que ele vive. É desse recurso que vem seu sustento; nele o indivíduo visualiza a importante para a evolução profissional; se sente incluído em uma parcela da sociedade que produz bens ou serviços e assim colabora com o crescimento da economia. Ainda segundo Dejours (2000), dessa forma, o indivíduo é aceito entre seus pares, ou seja, além de contribuir com o sistema econômico, oportuniza o relacionamento e a troca de experiências entre os indivíduos que fazem parte da organização. Deixa de receber rótulos negativos, que abalam sua personalidade e imagem, mas, por outro lado, sem perceber desenvolve outros constrangimentos que reprimem suas ações. Tais embaraços que o funcionário sofre, Dejours chama de “ideologia da vergonha” (2000, p. 32). Esta ideologia está relacionada à doença, e dela surgem dois aspectos; uma se refere ao corpo: “o corpo só pode ser aceito no silêncio 'dos órgãos'; somente o corpo que trabalha, o corpo produtivo do homem, o corpo trabalhador da mulher são aceitos” (DEJOURS, 2000, p. 32-33). O outro aspecto relacionado à doença “diz respeito à relação existente entre doença e trabalho – para o homem corresponde sempre à ideologia da vergonha de parar de trabalhar” (DEJOURS, 2000, p. 33). Ou seja, toda reação de fraqueza do corpo traz à mente a questão do trabalho ou do emprego. Dejour percebe então que 38 o trabalho atravessa profundamente a vivência da doença: doença-avesso-dotrabalho, a tal ponto que a falta de trabalho torna-se, em si, um sinônimo de doença: quando alguém diz para um cara que ele está muito velho para trabalhar ou que ele não é capaz de continuar, é como se ele estivesse doente. (2000, p. 33). A doença vinculada ao trabalho fortalece a ideologia da vergonha na vida do trabalhador, na medida em que a doença é pensada como impedimento do trabalho e não na doença enquanto uma casualidade que todo ser humano está vulnerável a adquirir (DEJOURS, 2000). Sólio (2010), acrescenta que se pensarmos nas relações de poder estabelecidas nas organizações, a doença, o estresse, a exigência excessiva de produção do chefe, são sintomas da insatisfação e frustração do sujeito, quando sua solicitação não é ouvida e sua vontade reconhecida pela organização. Podemos unir a esses sintomas o medo, medo da demissão, em que a autora contribui ao falar: à medida que o sujeito vê a Organização como aquela que provê seu sustento, também se sente ameaçado pela possibilidade de demissão e de ser explorado pelas limitações que lhe são impostas, tanto de autonomia e criatividade quanto econômicas (baixo salário). Pode instalar-se, então uma relação ambivalente, de prazer e de dor, de identificação e de agressividade, de dependência e de rebeldia. (2010, p. 131). Nesse cenário complexo do relacionamento organizacional, a ponto de o funcionário não conseguir dar-se conta da ressignificação que ele dá ao termo trabalho, quando agregado às vivências individuais e aos costumes das empresas, podem desenvolver-se patologias que ao simples olhar, na maioria das vezes não são relacionadas ao trabalho ou ao modo de trabalhar. Ou seja, são mínimas as vezes em que o empregado nota que está sendo explorado. Sólio explica que essa falta de percepção se deve ao fato de que na medida em que os sujeitos são convocados a absorver práticas e valores culturais da Organização onde estão inseridos, e na medida em que são submetidos a uma rígida hierarquia, parecem recalcar sua visão de mundo e de realidade, o que acaba por facilitar uma relação assimétrica (de dominação), que por sua vez abre caminho para que a Organização assuma o papel de produtora de significação de valores. (2010, p. 129). Na relação de exploração a autora lembra, também, que na sociedade contemporânea o consumo é encarado como elemento de satisfação e realização, em uma esfera em que a Organização oportuniza o acesso a esse consumo, que fortalece ainda mais a “exploração do sujeito, alienando-o daquilo que produz, cerceia-lhe a possibilidade do gozo e afasta-o da 39 gratificação” (2010, p. 136). Fonseca exprime que a relação das organizações com seus funcionários, de uma parte “valoriza-os/as, em termos de suas capacidades de empreendimento e criatividade, e, de outra, não se mostra mais comprometida com seus recursos humanos, fornecendo-lhes garantia de estabilidade, ascensão funcional e proteção” (2002, p. 17). Faria, salienta que “o trabalhador alienou-se do processo de trabalho tornando-se uma ferramenta humana de gerência, sob a potestade do capital; foi, ademais, levado à submissão e lhe foi tirado a posse efetiva do processo de trabalho” (1985, p. 31). O autor enfatiza ainda os valores, os ideais que ela propõe, na medida em que vão ser interiorizados, vão servir de normas de comportamento aos indivíduos que não irão mais interrogar-se sobre o sentido de sua ação. O sentido já está aí. Basta fazê-lo seu. A partir desse momento os atos já não levam consigo sentimentos de incerteza. Tudo o que se apoiar em um objetivo maior é justificado: a exploração justifica-se em nome do lucro, a punição em nome da disciplina, etc. (1985, p. 39. Grifo do autor). É no sentido de exploração que Srour expõe: “todo trabalho possui uma capacidade ímpar: a de produzir mais do que seu agente consome para repor as energias. Vale dizer, todo trabalho pode gerar excedentes econômicos” (2004, p. 133). Segundo o autor, o funcionário gera mais valor e riqueza, do que a necessária para restaurar a energia empregada. Assim, o excedente, no caso do autônomo fica para ele mesmo, mas para os que são empregados de alguém, o excedente será usurpado pelo dono do meio de produção, e como recompensa ele receberá uma remuneração pelo esforço e tempo que dedicou. Seguindo essa linha de pensamento, Faria, explica essa exploração pela mais valia 9, baseando-se na análise de Marx, ao dizer que quando o capitalista e o operário encontram-se no mercado de trabalho, este oferece sua força de trabalho como mercadoria e aquele a compra por determinada quantia de dinheiro para usá-la durante um certo período de tempo. O trabalhador adianta ao capitalista a quantia tratada, pois só a recebe após haver trabalhado. Tendo comprado a força de trabalho, o capitalista dela dispõe, como valor de uso, fazendo-a trabalhar. (1985, p. 33. Grifo do autor). Observando que a interdependência funcionário e empresa, é permeada em grande relevância pela cultura organizacional, é producente às organizações “repensarem a forma 9 A mais valia seria o valor que o operário cria além daquele valor correspondente a sua força de trabalho e constitui portanto, a fonte do lucro capitalista. (FARIA, 1985, p. 33). 40 como repassam sua Cultura ao trabalhador, principalmente reconhecendo a individualidade de cada integrante dessa população organizacional” (SÓLIO, 2010, p. 130). Não impondo-lhes em primeira instância, os valores ideológicos, como os manuais de conduta, as palestras e encontros de socialização, visando a melhor adaptação dos funcionários, como cita a autora. Faria reforça sobre a participação das culturas do indivíduo na organização ao dizer: “se tudo é colocado de forma que os desejos dos indivíduos não possam ser expressos é porque só um desejo é considerado, que é o 'desejo da organização', porque a organização propõe um ideal comum para o qual concorrem todas as condutas individuais” (1985, p. 38). Segundo observa Krausz, “as relações capital/trabalho e chefe/subordinados seriam mais equilibradas e igualitárias se cada uma das partes envolvidas tivesse uma nítida consciência de seus direitos e responsabilidades” (1991, p. 28). Nessa conjuntura de equilíbrio emocional, físico e mental estão estruturadas as relações de trabalho. As organizações possuem um papel fundamental na construção ou desconstrução de todas essas mudanças que ocorreram com o trabalhador, não somente por empregarem as pessoas mas, principalmente, porque é no trabalho que o indivíduo passa maior parte do seu tempo. As mudanças que ocorreram no mundo do trabalho têm muito a ver com as tomadas de decisões e escolhas feitas pelas opções que existiam no momento para as empresas (HORNSTEIN, 2003). Buscaremos, agora, nos aprofundar para entender de que forma o poder se manifesta nas relações sociais no âmbito organizacional, questão essa, que já foi superficialmente pincelada nesse capítulo. 41 4 O PODER E DISCURSO NAS ORGANIZAÇÕES. 4.1 AS RELAÇÕES DE PODER Segundo Krausz (1991), o termo poder sempre se inclina a comparações negativas, relacionadas a manipulação, a arbitrariedade e a tirar proveito de determinadas situações. Em todo relacionamento há um mínimo de regras levantadas por comportamentos tradicionais que constituem a cultura de determinados grupos, e assim norteiam as relações dos sujeitos. O indivíduo sempre sofreu pressão para adaptar-se aos costumes do seu grupo e tentar criar opções para lidar com o exercício do poder das pessoas e instituições que o rodeiam. São essas pressões sociais que transformam cada pessoa em influenciador ou influenciado, conforme as posturas que adotam na vida em sociedade. A autora lembra, também, que muitos dos princípios transmitidos pela Revolução Industrial fixaram-se nas práticas organizacionais, influenciando costumes e valores, estilos de vida, condutas políticas, econômicas e sociais na esfera urbano-industrial: A padronização dos produtos de consumo e a propaganda limitam as opções, a especialização aliena, a concentração urbana isola, a centralização impede as pessoas de pensarem, os bens materiais passam a ser símbolo de prestígio e sucesso, o gigantismo das cidades e empresas despersonaliza as relações de trabalho, agride o meio ambiente, cria tensões sociais, transformando os seres humanos em multidões solitárias, meras máquinas de carne e osso produtoras e consumidoras de bens e serviços. (KRAUSZ, 1991, p. 10). O poder é algo universal, onipresente, sistema que envolve e influencia a vida em sociedade, presente nas vivências de cada indivíduo, sendo impossível negar sua existência. A “centralização de poder nas mãos de uma minoria acaba por alienar, gerando indiferença, irresponsabilidade social, acomodação e falta de perspectiva e mudança” (KRAUSZ, 1991, p. 12). Direcionando essa colocação para a esfera organizacional, pode-se entender que quanto mais inflexível e hierárquica for uma empresa, mais poder ela concentra nas mãos de poucos. Assim, ela o exerce da forma que melhor entende com seus membros. Na perspectiva de Krausz, podemos entender, então, que “poder é a capacidade potencial de influenciar as ações de indivíduos ou grupos no sentido de atuarem de uma determinada maneira” (1991, p. 15). Todo ser humano, de modo geral, possui capacidade de influenciar. As relações exigem um vínculo entre quem exerce o poder e quem é alvo dele. Porém, os que detêm, estão capacitados para deliberar o que quiserem e como quiserem, indiferentemente das 42 opiniões do grupo de modo geral. Esses são os pontos básicos do poder (KRAUSZ, 1991). Segundo a autora, as organizações podem desenvolver dois tipos de poderes: o contextual, que engloba a coerção ou pressão, a posição e a recompensa; e o pessoal que incorpora o conhecimento, a conexão e a competência interpessoal. Quadro 1 – Poder Contextual e Poder Pessoal PODER CONTEXTUAL PODER PESSOAL Coerção ou pressão Conhecimento Exercida por meio de ameaças pessoais veladas ou implícitas. Gera também reações de passividade e alienação por quem o recebe. As pessoas atuam como robôs, sem iniciativa, bitoladas, cumpridoras estritas de ordens, sem perspectivas ou opções. Nesse caso, o comportamento do subordinado legitima o uso da coerção. Gera credibilidade profissional, respeito, intensificação da potência dos atos influenciais, sem que a contrapartida tenha que ser a submissão. Quando a organização permite esse tipo de poder pessoal, a qualidade e a quantidade de ações influenciais crescem e se intensificam, facilitando a interação entre pessoas e setores. A Posição Conexão Exercido no intuito de facilitar e regulamentar as relações entre as pessoas e setores. Constitui um fator poderoso que acaba legitimando manobras e manipulações ilegítimas. Ex. Organogramas como mero objeto de decoração. Esse poder está mais sujeito à distorção e ao abuso. Gera cooperação, estimula a interação de esforços, a identificação de objetos comuns, pois aumenta a rede de relacionamentos. Baseia-se na convicção de que é mais produtivo, fácil e gratificante trabalhar com os outros do que trabalhar contra os outros. Na prática é compartilhar recursos e ideias. A Recompensa Competência Interpessoal Exercida para recompensar as pessoas segundo o seu mérito. Evoca a ideia de bens materiais, salários, benefícios, prêmios, promoção. Favorecem a criação de “panelinhas”, e instauração do nepotismo. A outra face refere-se ao poder psicológico, necessário para a manutenção do bem estar inferior e autoestima elevada. Gera um conjunto de atos influenciáveis que ocorrem no relacionamento do dia a dia. É uma forma de poder não diretiva de atuar e que respeita o direito de quem está exposto a ela de aceitá-la ou não. A competência interpessoal elimina a resistência e a submissão que surge como reação de qualquer ato influencial diretivo. Fonte: KRAUSZ, 1991, p. 22-25. Para Fleury e Fischer (1996), o poder está conectado à cultura, nas formas como se apresenta e nas práticas que o validam, “pois o caráter do poder passa a ser estritamente relacional, ramificado através de formas regionais e locais que se materializam nas práticas organizacionais cotidianas, ultrapassando os limites dos regulamentos” (1996, p. 71). Esse poder está dentro das organizações e é praticado através da coerção regularizada que propicia a coesão nas relações dos grupos. As autoras definem que 43 o poder não é uma unidade global, passível de observação e análise, mas uma prática social que assume formas heterogêneas, às vezes, díspares entre si, porque é constituída historicamente e resulta de articulações locais circunscritas a determinadas áreas de ação. (1996, p. 71). Pagés identifica que “o poder não está fixo em uma rede de relações hierárquicas interpessoais, mas encarna o conjunto da organização e se define como a capacidade da organização em submeter os indivíduos a uma lógica abstrata de lucro e expansão” (1987, p. 67). Faria (1985) acredita que o poder do capital aliena o processo do trabalho, assim ele torna-se um instrumento da gerência, que o utiliza como bem entende, criando uma lógica para os funcionários de produção para o crescimento da empresa, gerando lucro para a mesma ou para seus funcionários por meio dos salários, horas extras ou outros benefícios. Enriquez (2007), cita dois laços com que o poder está relacionado, um deles é o da morte: se levar em conta os fatos da história e experiências cotidianas, como pessoas que foram mortas em campos de concentração, povos que foram escravizados e ainda o são em algumas regiões, indivíduos que são explorados e tratados como máquinas ou animais, em uma situação em que seus direitos são transferidos em domínio de outros e, assim, acabam vivendo uma vida sem prazer, sem sabor e repetitiva. Para ele, “o poder sempre se encontra atrás da máscara da opressão, da repressão, da violência” (2007, p. 57). O segundo, baseado nas teorias de Freud e Max Weber, está vinculado à questão do poder carismático e o poder relacionado a libido e ao amor. O poder carismático está ligado à pessoa do chefe, como uma benesse irracional que lhe é concedida, ou seja, uma crença em outra pessoa, que enfrentaria o destino do coletivo ou de si próprio, no qual todos os envolvidos entregam-se numa situação quase que hipnótica. A libido diz respeito à ilusão da presença tangível ou intangível de um chefe, que considera a todos da coletividade da mesma forma, com o mesmo amor (ENRIQUEZ, 2007). Esse cenário gera uma identificação geral dos membros com a organização, fazendo com que “cada ser substitua seu ideal de eu por um objeto comum” (2007, p. 59). Nesse caso, o chefe torna-se o objeto de amor concebido. O autor identifica que o poder está presente em todos os espaços, políticos ou inconscientes, em condutas sociais, e no âmbito organizacional. É indispensável para manter a disciplina para o bom convívio da vida em comum. Também é importante a singularidade de cada sujeito no sistema de trabalho e trocas, assim como direitos e deveres (ENRIQUEZ, 2007). 44 A compreensão de Foucault (2007) sobre poder, diz não ser uma regalia conquistada ou preservada da classe dominante, mas a consequência do conjunto das posições estratégicas, efeito manifestado e em muitos casos reproduzidos por aqueles que se encontram em posição de dominados. Assim o poder não se aplica pura e simplesmente como uma obrigação ou uma proibição, aos que “não têm”, ele os investe, passa por eles e através deles; apoia-se neles, do mesmo modo que eles, em sua luta contra esse poder, apoiam-se por sua vez nos pontos em que ele os alcança. (2007, p. 26). Constata-se, então, que o poder extrapola a relação chefe e empregado. Por não se localizar somente nesses convívios é que ele implanta-se nas práticas cotidianas da organização. O autor acrescenta, então, que o poder também produz conhecimento, conhecimento este que surge por meio da disciplina e vigilância também. Entre as diversas formas de poder, Srour expõe que a mais nua é aquele que concerne uso de violência e armas, “trata-se da capacidade de coagir, capacidade esta que, obviamente, prescinde da aquiescência do agente coagido (dominação)” (2004, p. 146). É um poder de fácil identificação, pois está presente no cotidiano, com abordagens policiais, agressões em manifestações, os guardas sobre presidiários, a população subjugada, isso na perspectiva micro. Já, no macro pode-se observar regimes totalitários, atos terroristas, entre outros. Lembra o autor que essa forma de poder não perdura como força física por muito tempo, pois logo que os corpos são mobilizados, aqueles que detêm o poder procuram assegurar a lealdade pela dominação das mentes, “procuram estabelecer sua hegemonia simbólica, porque apenas a violência física aliena os súditos e não os leva a aceitar a nova ordem instituída” (SROUR, 2004, p. 147). Srour (2004) explana que as formas de poder embutidas na sociedade, se ramificam em quatro segmentos: Segurança (poder fardado), Administrativo (Poder Executivo), Jurídico-judiciário (Poder Jurídico) e Parlamentar (Poder Legislativo). 45 Quadro 2 – Os Poderes FORMAS DE PODER REGULAÇÃO DE INTERESSES COAGIR (dar ordens) Compelir, ameaçar, controlar ADMINISTRAR (realizar objetivos) Planejar, organizar e dirigir JULGAR (emitir juízos) Arbitrar disputas DELIBERAR (definir políticas) Escolher rumos Fonte: SROUR, 2004, p. 149. O poder está presente em todos os espaços, mesmo que não queiramos reconhecê-lo: “o poder está em toda parte; não porque englobe tudo e sim porque provêm de todos os lugares” (FOUCAULT, 2000, p. 89). Justamente pelo fato do poder ser onipresente, Bourdieu (2001) diz que fica mais difícil percebê-lo de imediato. É necessário saber identificá-lo, torná-lo visível, buscar onde ele deixa-se notar menos. A esse poder invisível ele chama de poder simbólico, que define “esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem” (2001, p. 7-8). Para Bourdieu, O poder simbólico é um poder de construção da realidade que tende a estabelecer uma ordem gnoseológica: o sentido imediato do mundo (e, em particular, do mundo social) […] faz assentar a <<solidariedade social>> no facto de participar num sistema simbólico – tem o mérito de designar explicitamente a função social […] do simbolismo, autêntica função política que não se reduz à função de comunicação dos estruturalistas. (2000, p. 9-10. Grifo do autor). Ou seja, é um poder da construção do real, que estipula uma ordem do conhecimento: a percepção imediata do mundo, sobretudo do mundo social. Um entendimento uníssono do espaço, do tempo, da causa, o que favorece a conformidade entre as inteligências. Sendo assim, ele só é possível porque há conformidade entre aqueles que praticam o poder e os que dissimulam não reconhecê-lo. É possível verificar a forma como esse poder simbólico atua nas organizações quando os gestores optam em expor a seus funcionários somente aquilo que lhes interessa e beneficia, mascarando demais processos. Os símbolos são ferramentas de comunicação e socialização que cria concordância com o sentido do mundo social, favorecendo especialmente a reprodução da dinâmica social (BOURDIEU, 2001). As produções simbólicas relacionam-se com os interesses da classe dominante. As ideologias 46 prestam assistência a vantagens particulares que querem se apresentar como interesses coletivos, comum a todo grupo. a cultura dominante contribui para a integração real da classe dominante (assegurando uma comunicação imediata entre todos os seus membros e distinguindo-os de outras classes); para a integração fictícia da sociedade no seu conjunto, portanto, à desmobilização (falsa consciência) das classes dominadas, para a legitimação da ordem estabelecida por meio do estabelecimento das distinções (hierarquias) e para a legitimação dessas distinções. (2001, p. 10). Indo ao encontro de como Bourdieu define poder simbólico, Fleury, percebe a instância do simbólico “que em sua capacidade de ordenar, atribuir significações, construir a identidade organizacional, tanto age como elemento de comunicação e consenso, como oculta e instrumentaliza as relações de dominação entre as categorias” (1996, p. 117). No que se refere ao sistema ideológico, Bourdieu diz que “o efeito propriamente ideológico consiste precisamente na imposição de sistemas de classificação políticos sob a aparência legítima de ciências filosóficas, religiosas, jurídicas, etc” (2001, p. 14). O poder simbólico define-se em uma relação determinada, entre os que praticam o poder e os que estão vulneráveis a ele, no próprio espaço em que se produzem e reproduzem as crenças; pois são elas que legitimam o poder das palavras de ordem, de manter a disciplina ou subvertê-la (BOURDIEU, 2001). Sendo assim, quanto mais próximo for o conteúdo das falas utilizadas por quem exerce o poder, mais próximo o indivíduo estará da organização. Como reforça Sólio, “quanto mais seu conteúdo captar ou conquistar o afeto das pessoas, mais força ele terá. Isso significa dizer que potencializa o vínculo social” (2010, p. 123). Entende-se, então, que as relações de comunicação, são inseparavelmente, sempre relações de poder, que por sua vez dependem da forma e do conteúdo do poder material ou simbólico reunido pelos sujeitos ou pelas instituições incluídas nesse contexto (BOURDIEU, 2001). Bourdieu (20001) complementa ao dizer que o poder simbólico, poder subordinado, é uma forma transformada, quer dizer, irreconhecível, transfigurada, legitimada, das outras formas de valor. Talvez seja ele o mais poderoso de todos, pois de forma mascarada permeia, fixa-se nas organizações provocando danos que são inconscientes ao ser humano. Diante de tais definições sobre o poder, constatamos que todos possuem duas características em comum, que são a influência e os relacionamentos. Ele é “ubíquo, permeia as relações humanas. Existe independentemente de ser procurado. É a glória e o fardo da maior parte da humanidade” (KRAUSZ, 1991, p. 16). Ao perpassar pelos relacionamentos, 47 deve ser considerado uma ferramenta poderosa que reproduz ideologias e culturas da forma que melhor favorece aos detentores dos meios de produção, dos diretores, empresários de modo geral no âmbito organizacional. Para melhor perceber as formas como ele se revela e suas consequências, é fundamental considerar as experiências de cada indivíduo que compõe as relações de conflito entre influenciadores e influenciados, assim como o contexto social, sendo ele parte integrante da vida em sociedade. Percorrendo, ainda, a esfera do poder, iremos agora estudar quais são as outras faces que o poder manifesta e como elas interferem nas organizações, assim como nas relações de trabalho. 4.2 OUTRAS FACES DO PODER Os que usam do poder, recorrem à autoridade, à liderança, ao controle, ao domínio e à ideologia, entre outras formas de expressá-lo. Faria (1985), diz que o autoritarismo é a forma excessiva da manifestação do poder de uma classe ou categoria social. Os exércitos organizados já carregavam marcas de relações autoritárias, entre pessoas em diferentes posições sociais. “O autoritarismo é, por todas as razões, a essência do fenômeno burocrático” (1985, p. 11). Reflete na imposição da vontade das partes, “envolve relações não somente econômicas, no âmbito da produção, mas políticas e sociais” (FARIA, 1985, p. 17). Inclui formas de subordinação e submissão. Segundo o autor, ela apresenta-se por meio das relações de poder, da divisão e da exploração do trabalho e da punição. A estrutura social, possui fortes traços de autoritarismo, e mesmo que as pessoas percebam que estão sendo ajustadas para viverem nessa condição, a estrutura as força a se inserirem nesse meio autoritário. Sendo legalizado, ele tem aparência, evidencia-se sem máscaras: O autoritarismo, então, ao mesmo tempo em que é considerado como um caso limite da existência social, pode ser encarado como um elemento revelador, que permite postular as transformações estruturais necessárias a eliminá-lo. É necessário, assim, não apenas alertar para os aspectos alienantes que o autoritarismo provoca, como é preciso também, que se adquira uma consciência trágica de sua existência cotidiana. (FARIA, 1985, p. 26). Ignorar a existência do autoritarismo, ou querer extingui-lo, é desconhecer a natureza das coisas e dos seres, suas irregularidades e sua significância na história humana (FARIA, 48 1985). Nas relações entre classe dominante e dominada, o autoritarismo supõe que esta submeta-se àquela por força da coação. Na relação entre os seres humanos realmente iguais, o autoritarismo supõe o exercício de uma negatividade que não se refere à submissão de outro a si, mas de si a si mesmo com relação as regras de uma vida social civilizada. (FARIA, 1985, p. 27). Drucker (1997) fala da autoridade conquistada, pois o poder é permitido pelas pessoas sobre as quais será praticado. “Nas novas organizações, títulos e cargos têm pouco peso até que os líderes provem sua competência. Toda autoridade precisa ser conquistada antes de exercida” (1997, p. 31). O autor expõe a autoridade conquistada, considerando que é mais fácil adquiri-la por intermédio dos líderes, sendo que todo sujeito que está em tal posição deve estar consciente de que os líderes desenvolvem-se, não são produzidos. A organização deve ter consciência de que é necessário um tempo para que o líder possa manifestar-se. Nessa estrutura, “o líder é aquele que estabelece o ritmo e o padrão a serem seguidos […] é responsável pela escolha da equipe, pela disciplina e pelo ânimo e motivação do grupo” (DRUCKER, 1997, p. 33). O autor lembra, também, dos líderes sem cargo, ou seja, a liderança é mais flexível nesse caso, já que não está relacionada a apontar aos funcionários o que deve ou não ser feito, mas, sim, a liderança é feita onde e quando necessária, “são como pontos de energia em torno dos quais a atividade se agrupa” (1997, p. 42). A liderança sem cargo é vista como “boazinha”; como não é transmitida por ordens ela aproxima mais os trabalhadores e até o próprio líder que não conscientizam-se dos seus papéis, e assim desempenham funções a serviço da empresa sem que eles percebam, de forma amenizada, como se esse tipo de liderança não existisse. Drucker contribui ao dizer que a liderança requerida pela organização sem cargos é mais “branda” e mais difusa do que aquela exigida pela tradicional, parece às vezes como se não tivesse líder, o que não é verdade. Esse tipo de organização exigirá mais líderes, e líderes com aptidões mais sofisticadas, não o oposto. (1997, p. 43). Essa observação do autor compactua para a crença de que os indivíduos almejem conquistar a liderança para poderem mandar com a validação dos colegas, porém o fato é que “grande parte das pessoas jamais chegará a ser o 'cavalo de frente' das suas organizações: o número de cargos no topo é simplesmente muito limitado” (DRUCKER, 1997, p. 46). Nesse 49 sentido, a liderança hierárquica é mais ofensiva e está sujeita a ser questionada, recriminada e em certos casos fracassada, por “privar os funcionários comuns da capacidade de usar a experiência e a informação que possuem” (DRUCKER, 1997, p. 47). Então, a liderança requirida substitui a ideia de hierarquia existente entre os membros da organização. Chiavenato, defende que “todas as organizações precisam de líderes em todos os seus níveis e em todas as suas áreas de atuação” (1999, p. 558). Esses encontram-se no nível intermediário e operacional das organizações. Sendo a liderança um fenômeno social, pode ser definida como uma influência interpessoal exercida numa dada situação e dirigida através do processo de comunicação humana para a consecução de um ou mais objetivos específicos. Os elementos que caracterizam a liderança são, portanto, quatro: a influência, a situação; o processo de comunicação e os objetivos a alcançar. (1999, p. 558). Outro campo ocupado pelo poder é o controle. Segundo Chiavenato (1999), as organizações não agem na base do improviso e nem por imprevistos, elas necessitam ser adequadamente controladas. O controle, desempenha o papel de supervisionar, avaliar e medir o desempenho dos empregados. Assim, avalia-se se tudo ocorre de acordo com o que foi projetado, ordenado e conduzido. “Controle é a função administrativa relacionada com a monitoração das atividades a fim de manter a organização no caminho adequado para o alcance dos objetivos e permitir as correções necessárias para atenuar os desvios” (CHIAVENATO, 1999, p. 16. Grifo do autor). O que significa que todo gestor, representando determinado setor, deve saber fiscalizar os membros para que os objetivos da empresa sejam alcançados de maneira eficaz. A essência do controle, para Chiavenato, é “basicamente de um processo que guia a atividade exercida para um fim previamente determinado” (1999, p. 637). 50 O processo de controle apresenta três etapas. Figura 2 – As quatro etapas do processo de controle. Fonte: CHIAVENATO, 1999, p. 637. Faria observa que “o controle que visa à padronização de comportamento e a disciplina, enfim, que visa o adestramento de trabalhadores, é legalizado pelo regimento interno da organização. Assim, cada organização tem seu próprio código penal” (1985, p. 188). Uma vez que o homem vive de associações organizacionais, por dedicar grande parte do seu tempo à participação em uma das variadas organizações sociais, estando seus desejos conectados com os das organizações, muito do que há nela, há em cada indivíduo. Falar de controle, é saber que ele é uma característica central das organizações, na qual os membros que dela fazem parte, devem enfrentar e buscar adaptar-se (TANNEMBAUM, 1975). Nesse sentido, “organização implica controle […] o processo de controle ajuda a restringir os comportamentos idiossincrásicos e mantê-los de acordo com o plano racional da organização” (TANNEMBAUM, 1975, p. 16). O autor define controle como 51 uma consequência inevitável da organização. Mas é muito mais do que isso. Está relacionado com aspectos da vida social que são de alta relevância para cada um. Está relacionado com questões de bem-estar e aspirações comuns. Está relacionado não só com o que se passa dentro da organização como também com o que a organização realiza em suas ações externas. Trata das questões de democracia e autocracia, centralização e descentralização, estruturas organizacionais “achatadas” e “altas”, conselhos de trabalhadores e administração conjunta. (1975, p. 16). De modo geral, as organizações exigem um grau de conformidade, assim como a interação de variadas atividades, e cabe ao controle fixar a conformidade com os requisitos e objetivos da organização. Foucault (2007), ao falar sobre controle, discorre sobre o método da disciplina que envolve ordens que censuram, regimentam os ciclos de repetição, obrigam o indivíduo a ocupações determinadas, incluindo, também, o tempo com que são desempenhadas determinadas atividades. Como exemplo, ele cita que “um quadro geral para uma atividade; é mais que um ritmo coletivo e obrigatório, impulso do exterior, ele é um 'programa', ele realiza a elaboração do próprio ato” (2007, p. 129). Ou seja, o “controle disciplinar não consiste simplesmente em ensinar uma série de gestos definidos, impõe a melhor relação entre um gestor e a atitude global do corpo, que é sua condição de eficácia e rapidez” (2007, p. 130). Um corpo disciplinado é a base de um gestor competente, como coloca o autor. Essa forma de controle disciplinar “é, com efeito, um poder que, em vez de se aproximar e de retirar, tem como função maior 'adestrar'; ou sem dúvida adestrar para retirar e se apropriar ainda mais e melhor” (FOUCAULT, 2007, p. 143). Fleury (1996) fala da vigilância hierárquica, como uma das faces do poder. Sendo que muitas vezes o subordinado percebe essa vigilância como uma promoção na carreira, uma possibilidade de se sobressair perante seus colegas, se desempenhar corretamente aquilo que lhe foi designado. Não se atribui somente a situações mensuráveis quantitativamente, mas principalmente sobre a conduta dos funcionários no cotidiano. Segundo a autora, na medida em que o sujeito dá-se conta de que ele pode “subir hierarquicamente” na empresa, a relação entre as partes tende a caracterizar-se como autocrática e tirana. Isso acaba gerando insegurança entre os sujeitos, impregnando ainda mais esse desejo de alcançar outros degraus, que normalmente vem seguidos de atitudes subservientes, aduladores e acusador dos erros dos colegas. A mesa, a cadeira, o caixa, constituem as células nas quais os indivíduos são 52 expostos à vigilância, possibilitando sempre determinar, onde estão, o que estão fazendo, assim como avaliar a quantidade e a qualidade do serviço realizado. Permite também estabelecer entre os funcionários comparações que possibilitam informar o grau de adesão dos mesmos às normas e aos princípios da organização, traduzido entre outros fatores, pelo cumprimento de longas jornadas de trabalho. (FLEURY, 1996, p. 107). O agravante nessa relação de comparação entre funcionários é que a disciplina, ao mesmo tempo em que orienta os comportamentos e regras que devem ser seguidos dentro da organização, “individualiza os homens através da vigilância e das medidas comparativas por ele produzidas. Numa organização de carreira fechada, ele passa a ser a base sobre a qual é construída a posição hierárquica de cada funcionário ou sua exclusão da organização” (1996, p. 107). Faria expressa que a história é repleta de fatos de dominação, seja na manifestação de mando e subordinação, ou mediante relações de interesse, sendo que mesmo sem perceber, o termo recai mais sobre um movimento voluntário, já que o jogo de interesses se articula de modo a levar adiante uma ação social, chega a manifestar-se como administração. Nessa situação, “a dominação é um conceito chave para a compreensão do fenômeno organizacional e se refere a um estado de coisas no qual a vontade manifesta do dominante se expressa como se os dominados a acatassem como sua” (FARIA, 1985, p. 11). O autor analisa que toda dominação mando e subordinação estruturada na organização toma forma sendo o dominante seu aparelho administrativo e a grande massa dominada formam os componentes essenciais. Drucker repara que o “conhecimento é a forma dominante em nossa era pós-capitalista emergente” (1997, p. 46). O autor examina que a organização, estando direcionada para o conhecimento, atua de maneira mais produtiva, sendo o conhecimento distribuído em diferentes espaços, desde os que têm poder de decisão aos que não possuem poder, apenas realizam tarefas que lhes são determinadas. A dominação também é simbólica, segundo Bourdieu, quando o indivíduo assume a identidade dominante, ou seja, quando os dominados nas relações de forças simbólicas entram na luta em estado isolado, como é o caso nas interações da vida cotidiana, não têm outra escolha a não ser a da aceitação (resignada ou provocada, submissa ou revoltada) da definição dominante da sua identidade ou da busca da assimilação a qual supõe um trabalho destinado a lembrar o estigma (no estilo de vida, no vestuário, na pronúncia, etc) e que tenha em vista propor, por meio de estratégias de dissimulação ou de embuste, a imagem de si o menos afastada possível da identidade legítima. (2001, p. 124. Grifo do autor). 53 Não se trata, portanto, de simplesmente desvincular-se dos sinais estigmatizados pelas forças dominantes, pois isso seria ainda uma forma de legitimar os próprios estigmas. Para o autor, o rompimento e a busca da autonomia por parte dos dominados se dão de forma coletiva, através da “subversão das relações de forças simbólicas – que tem em vista não a supressão das características estigmatizadas mas a destruição da tábua dos valores que as constitui como estigmas” (BOURDIEU, 2001, p. 124). Evidenciamos a ideologia como mais uma esfera do poder, referindo-se a uma estrutura de representação que os detentores do poder utilizam para encobrir e velar a realidade. Pagés, entende que “a ideologia predominante num grupo social ou em uma instituição constitui de fato uma 'bricolage'10 de elementos disparatados resultante de influências variadas, heranças de períodos diferentes” (1987, p. 74). Na medida em que os funcionários participam cada vez mais da ideologia da empresa e integram sua preparação, mais eles colaboram para a conformidade da própria subordinação, tendo em vista que nem tudo está explícito na fala dos gestores, no qual utilizam o processo de persuasão para se aproximar dos empregados (PAGÉS, 1987). Pagés (1987) analisa que a crença na empresa evoca também uma linguagem religiosa, fazendo da mesma um objeto de culto, não fixam somente em mascaram métodos de dominação, mas sugerem um sistema de valores na empresa, construindo uma moral de ação, apropriada para conduzir os empregados à adesão, já que trabalhar em uma empresa implica a adesão a todo um sistema de valores, a uma filosofia, e é esta adesão ideológica que galvaniza as energias e incita as pessoas a se dedicarem de “corpo e alma” a seu trabalho. Esta adesão é um elemento fundamental para o poder da empresa e para seu sistema de dominação e alienação. (PAGÉS, 1987, 75). Foucault (2006), problematiza o conceito de ideologia ao explicar que é dificilmente utilizável por três razões: “A primeira é porque, queira-se ou não, ela está sempre em oposição virtual a alguma coisa que seria a verdade” (2006, p. 7). A questão não se refere somente à verdade velada em um discurso, mas de entender como que historicamente são construídos efeitos de verdade no interior dos discursos. O segundo ponto é que está fundamentalmente ligada a alguma coisa como o sujeito. E por último, ela está em segundo plano, complemento com relação daquilo que deve funcionar para ela em diferentes esferas, sejam econômicas, 10 Entende-se que “Bricolage” é a atividade de aproveitar coisas usadas, quebradas ou apropriadas para outro uso, em um novo arranjo, ou em uma nova função. (PAGÉS, 2006, p. 74). 54 políticas, entre outras. Por tais razões o autor acredita que é um conceito que deve ser empregado com muito cuidado (FOUCAULT, 2006, p. 7). Acreditamos ser relevante tratar da ideologia conservadora, ao percebermos que ela permeia os espaços organizacionais. Srour diz que na dinâmica das sociedades e das organizações, toda coalizão de forças que institucionaliza seu poder tende a adotar uma ideologia conservadora […]. Ocorre que o senso comum confunde erroneamente o conservadorismo com imobilismo ou cega manutenção do statu quo. Ora, para preservar propriedades, posições de prestígio, poderes, privilégios ou um modo peculiar de vida, os conservadores disfarçam mudanças de equilíbrio com a roupagem das mudanças estruturais, praticam o princípio de “mudar sem mudar”, exercitam com maestria a adaptação às circunstâncias, antecipam-se com sabedoria aos novos ventos e resguardam o que mais prezam. (2004, p. 219. Grifo do autor). A ideologia conservadora contribui para falas preconceituosas, utilização de frases feitas, julgamentos falsos, reforça estereótipos, entre outros fatores. Apropriando-nos de diversos mecanismos que o poder se apresenta na esfera social, incorporado principalmente no espaço organizacional, legitimado em grande parte pelos membros que constituem o ambiente; é que nos cabe agora examinar o discurso organizacional como elemento de domínio, fetiche e satisfação aos indivíduos da organização. 4.3 O DISCURSO ORGANIZACIONAL Ao discorrer sobre o discurso organizacional, lembremos antes de tudo que ele está intimamente ligado aos valores, normas, a cultura e a comunicação produzida e praticada pela organização, visto que “a cultura é um fenômeno comunicativo e que o discurso organizacional é o lugar no qual os elementos de uma dada cultura são produzidos e veiculados” (MARCHIORI, 2010, p. 146). Nessa instância, Orlandi (2010), entende que o discurso é muito mais do que transmissão de informação, pois, a mensagem não segue uma sequência ordenada como: emissor fala de alguma coisa, baseado em um código, o receptor atrai a mensagem decifrando-a. Já que a língua não é só um código entre outros, não há essa separação entre emissor e receptor, nem tampouco eles atuam numa sequência em que primeiro um fala e depois o outro decodifica, etc. Eles estão realizando ao mesmo tempo o processo de significação e não estão separados de forma estanque. (2010, p. 21). 55 No local da mensagem o autor propõe exatamente o discurso. A linguagem estabelece relações entre o indivíduo e diferentes sentidos que são transformados pela língua e história. Nesse emaranhado de produção de sentidos que integram os indivíduos, Orlandi reforça que é inapropriado dizer que o discurso resume-se apenas à transmissão de informação, já que “são processos de identificação do sujeito, de argumentação, de subjetivação, de construção da realidade, etc” (2010, p. 21). Como as relações de linguagem são relações de sujeito e sentido, com diferentes finalidades, nessa relação, a definição do autor ao termo discurso, “efeito de sentidos entre locutores” (2010, p. 21). O autor lembra da importância em não confundir discurso com a fala, pois não se trata de opô-lo à língua como sendo um sistema, onde tudo se mantém, com sua natureza social e suas constantes […]. O discurso tem sua regularidade, tem seu funcionamento que é possível aprender se não opomos o social e o histórico, o sistema e a realização, o sujeito ao objetivo, o processo ao produto. (2010, p. 22). Quando Orlandi (2010) diz que é possível aprender o discurso, é porque na medida em que a empresa percebe a importância em obter a confiança dos funcionários para assegurar que seus interesses sejam cumpridos, muitas vezes os gestores desenvolvem uma linguagem persuasiva e também coerciva para seduzir os empregados. Marchiori mostra isso ao explicar que a linguagem da cultura se sobrepõe à consciência e nos possibilita criar textos complexos. Esses textos podem significar realidades idealizadas, virtualizadas, ficções de toda ordem, capazes de extrapolar os estreitos limites das linguagens primárias e artificiais, presas referencialmente aos seus objetos da realidade. (2010, p. 143). Podemos lembrar Pêcheux, para quem o princípio dessas leituras textuais consiste, como se sabe, em multiplicar as relações entre o que é dito aqui (em tal lugar), e dito assim e não de outro jeito, com o que é dito em outro lugar e de outro modo, a fim de se colocar em posição de “entender” a presença de não ditos no interior do que é dito. (2002, p. 44). Marchiori acrescenta que o cerne da cultura inclina-se para uma posição conservadora para preservar-se e impedir que se dissolva. Também, pode ser caracterizada “por um discurso próprio, ou seja, uma coleção de textos, cuja expressão total é formada pelo conjunto das expressões dos demais textos que entram em sua composição” (2010, p. 145). 56 A união de tais textos pode gerir discursos coerentes, como pode manifestar a incoerência e a dissemelhança entre os textos que o constitui. Recorda a autora que o discurso pode ser a forma mais clara de perceber a cultura, pois “não é outra coisa senão uma rede textual que se sustenta nos intermédios de cada um desses seus integrantes, no lugar e no momento em que pontos de afinidade promovem elos, gerando cadeias relacionadas” (2010, p. 147). Porém, o discurso da cultura pode não transparecer, revelar a cultura da organização (MARCHIORI, 2010). Nessa linha de pensamento, Sólio diz que “é importante lembrar que um discurso diz mais do que pensa/quis dizer, podendo significar algo diverso do que foi anunciado” (2010, p. 131). Há muito dito no não dito, isso ocorre normalmente para ludibriar o funcionário e fazer com que o mesmo não realize nenhuma análise ou reflexão do ambiente que o cerca. A autora comenta que é muito comum o líder de equipe organizar seu discurso de forma a plicar situações do cotidiano do trabalhador – como desemprego, aluguel, endividamento, custo de vida desencadeando sensação de medo e de insegurança, que leva o Sujeito a acatar às exigências da organização. (2010, p. 138). Na medida em que tornam-se mais flexíveis, persuadidos por uma linguagem sedutora, que ao mesmo tempo gera medo e insegurança, os empregados tendem a aproximar-se da organização. Marchiori (2010) explica que o vínculo funcionário-empresa se dá, não somente pelo elo de um sujeito com outro, ou entre organizações e seus públicos, mas também entre informações, objetos, uma teia de informações e relacionamentos. Eles criam dependência, não propiciam autonomia, incompatível com a ideia de liberdade. Quando o funcionário acredita no visível imediato do mundo a sua volta, cai na armadilha das organizações, pois não assimila a realidade, já que sua percepção está limitada por imagens ocultas, como trata Faria (1985), o discurso adotado pelo empregado, é o mesmo adotado pela organização, e o indivíduo sem desejo, sem voz, transfere sua fala ao portador dos seus direitos. Afirma ainda que é enquanto máscara que o imaginário se encontra no centro da formação das ideologias, na medida em que cobre as relações reais, mistifica e falsifica a ação transformadora, ao mesmo tempo em que acreditando possível o impossível, preserva e alimenta as utopias. (1985, p. 37). Dessa forma, compreende-se a importância em “buscar, atrás da cena do manifesto a 57 'outra cena', a 'outra palavra', o 'não dito'” (FARIA, 1985, p. 36). Pagés verifica que “o discurso informa ao mesmo tempo sobre uma realidade 'objetiva' exterior e transcendente aos indivíduos e sobre seu universo mental” (1987, p. 198. Grifo do autor). Contudo, os indivíduos encontram-se em uma esfera de acontecimentos fora dele que influenciam seu comportamento. O meio não atua diretamente sobre o indivíduo, age através de um sistema de concepções e ações, conscientes ou inconscientes, próprias do sujeito. O comportamento do indivíduo, seu discurso, sua forma, equilibra-se entre dois universos, o interno e externo. Pode-se notar, então, que “o discurso é ao mesmo tempo coletivo e individual” (PAGÉS, 1987, p. 1999). Ele é coletivo ao ponto que cada sujeito revela relações entre fenômenos, existente de variadas maneiras em cada sujeito, não pela similaridade dos diferentes discursos, mas pela complementariedade. É individual com relação a subestrutura conglomerada em uma única estrutura, e também como circuitos paralelos derivados de uma estrutura abrangente. Por exemplo, alguns indivíduos dão mais importância que outros a gratificações materiais. Outros se identificam muito com seu trabalho e encontram nele a fonte principal das gratificações que a organização traz. Nos dois casos a estrutura abrangente restriçãogratificação é a mesma, mas no segundo caso ela é interiorizada a ponto de agir como instância psíquica autônoma. (PAGÉS, 2010, p. 201). Pêcheux, sobre discurso e ideologia, observa que a dominação da ideologia (da classe) dominante, que é caracterizada, no nível ideológico, pelo fato de que a reprodução das relações de produção “subjuga” sua transformação (opõe-se a ela, a freia ou a impede, conforme os casos), corresponde, pois, menos à manutenção do idêntico de cada “região” ideológica considerada em si mesma do que a reprodução das relações de desigualdade-subordinação entre essas regiões. (1988, p. 46). Por sofrer uma pressão interiorizada exercida nas empresas, o funcionário substitui e fortalece essa pressão praticada por ele mesmo. “O indivíduo interpreta as restrições, mais geralmente os estímulos que ele recebe do meio contribui para moldá-lo, agindo sobre o campo objetivo da interação, entre o objetivo e o psicológico do indivíduo” (PAGÉS, 1987, p. 198-199). Marchiori defende que as práticas discursivas levadas a cabo pelas organizações não podem e não devem 58 permitir que os meios de sua produção ou os modos de sua veiculação superem ou obscureçam elementos de vínculos com seus públicos, o que é mais comum acontecer do que se supõe. (2010, p. 148). Daí, a necessidade de o empregado estar ciente da linguagem empregada na organização e ter clareza de que o melhor meio de não se deixar influenciar é decodificar o discurso organizacional, sabendo da interação que o mesmo possui e levando em consideração sua história particular. Daremos seguimento na pesquisa explicando a comunicação organizacional, os processos de comunicação, públicos, e a importância de um profissional de Relações Públicas voltado para o social na esfera organizacional. Ao compreendemos como se dão as relações de poder no campo organizacional, nos aproximamos mais ainda da resposta do problema de pesquisa que foi proposto. 59 5 COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL A comunicação é parte integrante da organização, uma depende da outra na cadeia social. Torquato (2002) explica que a comunicação organizacional surgiu na década de 1960, pois as empresas começaram a perceber a potente relação que existia entre elas e a sociedade. Nesse contexto, as organizações começaram a perceber a importância em criar um vínculo com o trabalhador, dizendo a eles que sentissem orgulho do local de trabalho e também demostrar que produziam com qualidade para os clientes. No que se refere a sentir-se orgulhoso do local de trabalho, Marchiori (2010, p. 192), diz que “os indivíduos organizacionais necessitam 'lugarizar-se' e esse processo/sentimento de 'lugarização' traz consigo a necessidade de pertencer”. Voltando ao contexto histórico organizacional, Torquato (2002) diz que não havia investimento para realizar comunicação interna e externa e que, por fim, os avanços industriais colaboraram para “sofisticar e ampliar os modelos de expressão e suas estratégias persuasivas, ensejando a estruturação, em áreas, do programa de comunicação” (TORQUATO, 2002, p. 2). Para Kunsch, a comunicação organizacional, como objeto de pesquisa, é a disciplina que estuda como se processa o fenômeno comunicacional dentro das organizações no âmbito da sociedade global. Ela analisa o sistema, o funcionamento e o processo de comunicação entre a organização e seus diversos públicos. […] Configura as diferentes modalidades comunicacionais que permeiam sua atividade. Compreende, dessa forma, a comunicação institucional, a comunicação mercadológica, a comunicação interna e a comunicação administrativa. (2002, p. 149-150). Pelo fato de a comunicação organizacional abranger todos os aspectos das ações comunicacionais, o termo amplia-se a qualquer tipo de organização como ONGs, órgãos públicos, privados, fundações, entre outros (KUNSCH, 2002). A autora compreende que estando a comunicação organizacional no centro da organização, é preciso que a comunicação integrada11 concentre os demais tipos de comunicação, e que elas interajam harmoniosamente entre si, apesar de suas peculiaridades, para que seja possível a relação organizacional com a sociedade em geral e com seus públicos. 11 Entende-se por Comunicação integrada uma filosofia que direciona a convergência das diversas áreas, permitindo uma atuação sinérgica. Pressupõe uma junção da comunicação institucional, da comunicação mercadológica, da comunicação interna, e da comunicação administrativa, que forma o mix, o composto da comunicação organizacional. (KUNSCH, 2002, p. 150. Grifo da autora). 60 Scroferneker entende que “a comunicação é uma organização que organiza, um todo orgânico que se organiza como frase, oração, estratégia, discurso” (2008, p. 9). O processo comunicacional no contexto organizacional conta com agentes sociais que atuam em diferentes estruturas dinâmicas, socializando situações imprevisíveis (MACHADO, 2008). Segundo Chiavenato (1999, p. 534), “a comunicação organizacional constitui o processo específico através do qual a informação se movimenta e é intercambiada entre as pessoas dentro de uma organização”. Já Baldissera (2008) diz que a comunicação organizacional é incompleta se considerar somente os projetos, planejamentos para suprir as carências da organização, não devendo ser limitada a esses aspectos. Sendo que para além do planejamento, do organizado, do gerenciável existem fluxos multidirecionais de significação/comunicação de diferentes qualidades e intencionalidades, somente detectáveis/observáveis no acontecer. Fluxos esses que dialógica e recursivamente podem complementar, potencializar, qualificar, agilizar, e/ou resistir, subverter, confundir, distorcer os processos formais/oficiais. (BALDISSERA, 2008, p. 32). Contudo, na relação comunicação e organização há discordância de opiniões, e também poder de persuasão. Quanto ao último exemplo, Kunsch observa que, na comunicação organizacional, uma ocorrência frequente é a filtragem da informação na comunicação ascendente. “Manipula-se” a informação para que esta seja percebida positivamente pelo receptor. É comum as bases esconderem informações desfavoráveis nas mensagens que chegam aos escalões dirigentes. (2002, p. 77. Grifo da autora). Normalmente, a comunicação é pensada como um jogo em que as partes agem por estratégias que lhes permitem infiltrar-se, conhecer e dominar os códigos da força contrária para, com isso, concentrar informações que se constituem em poder de manipulação, de influência, de dominação e, mesmo, de rompimento (BALDISSERA, 2000). Portanto, “é na tensão 'identidade-alteridade (organização outro/seus públicos)', em seu contexto específico, que os sentidos que serão individuados pelos sujeitos em relação de comunicação são transacionados, disputados e ou construídos” (BALDISSERA, 2008, p. 32). Nessa perspectiva, Marchiori considera que a comunicação organizacional promove e estimula diálogos visíveis intencionais ao pretender 'lugarizar' os indivíduos organizacionais. Mas, concomitantemente a esses 61 diálogos, há outros, pouco inclusivos, que acontecem na indiferença, na falta de reconhecimento e respeito, na ausência de afetividade, na segregação de espaços. (2010, p. 192). Chiavenato concorda com Baldissera, pois para o autor a comunicação organizacional não é perfeita, sendo que “elas são alteradas ou transformadas ao longo do processo, o que faz com que o último elo – o receptor da mensagem – quase sempre receba algo diferente do que foi originalmente enviado, transformando a intenção do processo de comunicação” (1999, p. 534). Nesse caso, o autor identifica que existem três problemas que evidenciam-se quanto à transformação da comunicação omissão que significa a supressão de aspetos das mensagens, mantendo o sentido da mensagem íntegro e inalterado. A Distorção: significa uma alteração no sentido da mensagem em sua passagem pelos diversos agentes do sistema. Sobrecarga: ocorre quando os canais de comunicação conduzem um volume de informações maior do que a sua capacidade de processá-las. (CHIAVENATO, 1999, p. 534-535. Grifos do autor). O autor percebe que a comunicação organizacional, em sua grande maioria, age de forma que comprime as mensagens entre a administração e as pessoas. Figura 3 – A atividade administrativa passa através do gargalo da comunicação Fonte: CHIAVENATO, 1999, p. 535. Segundo Kunsch, as barreiras existentes na comunicação organizacional podem ser enquadradas em quatro formas: “as pessoais; as administrativas/burocráticas; o excesso e a sobrecarga de informações; e as informações incompletas e parciais” (2002, p. 75). As pessoais dependem do comportamento, personalidade dos indivíduos, que podem simplificar ou complicar a comunicação; as administrativas refere-se à maneira como as organizações desenvolvem, transmitem e demandam suas informações. Já, o excesso de informação diz respeito à quantidade de informação transferida de diversas formas, reuniões, material 62 administrativo e institucional, meios que não passam por uma triagem e tão pouco por uma prioridade de produção, cansam e embaralham o público, dificultando a comunicação, pois é inviável os indivíduos repararem e absorverem todas as informações, mensagens recebidas do ambiente social e dos locais onde trabalham. Por último, as comunicações incompletas e parciais que localizam-se nas dúbias informações, nas comunicações parciais ou abafadas para as pessoas (KUSNCH, 2002). Baldissera (2000), percebe que a imagem das organizações é criada por meio de características que são comunicadas. Quando solidificada a identidade12 organizacional, ela estará presente em toda parte. Assim, o autor verifica que a comunicação é utilizada para reforçar e preservar a identidade organizacional ou ser o motor que impulsiona para as transformações desejadas, uma vez que a comunicação organizacional compreende todo o fluxo de mensagens que compõem a rede de relações da organização. (2000, p. 13-14). O autor compreende “a comunicação como elemento do processo cultural” (2000, p. 9). Alocado em um contexto em que se deve indagar o modo como ela é utilizada para informar os públicos e como é absorvida principalmente pelo público interno da organização, sendo que deve ser percebida como um sistema de criar sentidos, sabendo que a cultura é também empregada para diagnosticar e falar sobre os mecanismos organizacionais que asseguram a disseminação das informações a cerca das práticas convencionais sociais (BALDISSERA, 2000). Para Scroferneker, a comunicação é de extrema relevância, ao ponto que “não há organização sem comunicação” (2008, p. 21). A organização é vista sempre como uma arena de conflitos: um campo de batalha – o locus do conflito de classes. E a realidade organizacional é o reflexo desses 'embates', sendo considerada como um 'instrumento de dominação e opressão'. A comunicação assume assim um papel de mecanismo de 'mascaramento' das realidades materiais da organização. Enfatiza os aspectos ideológicos da comunicação, admitindo-a como causa de uma falsa consciência entre dirigentes e trabalhadores. (SCROFERNEKER, 2008, p. 18-19). Nessa linha de raciocínio, Baldissera (2000), observa que as comedidas relações de poder que não são regularizadas e são construídas tendo o conhecimento e o uso tático da 12 O autor entende por identidade o conjunto dos traços peculiares que, associados às demais características, permitem que uma organização seja reconhecida como sendo ela própria, portanto única. (BALDISSERA, 2000, p. 13). 63 notícia, normalmente minimizam enfrentamentos para possibilitar a adesão de sentidos por intermédio da comunicação, que percorrem os espaços organizacionais. Kunsch colabora ao dizer que se deve reparar a produção de sentido no âmbito da comunicação organizacional e compreender as estratégias organizacionais como forma de espelhamento, de modo a que os públicos se reconheçam na fala organizacional e tendam a simpatizar e a se identificar com ela. (2013, p. 15). O processo comunicacional é simples, visto que as pessoas se comunicam sem fazer nenhum esforço e muito menos tem consciência disso. Em contrapartida, é complicado, sendo que a probabilidade em receber ou enviar mensagens de forma errada ou modificada é expressiva (CHIAVENATO, 1999). Diante de tais colocações, é possível observar que apesar de parecer muito simples, como citou Chiavenato, a comunicação é um processo complexo, ainda mais quando pensada no âmbito organizacional, tendo em mente que é muito mais do que troca de informações, “tem de ser pensada numa perspectiva da dinâmica da história contemporânea” (KUNSCH, 2002, p. 71). As organizações como canal da transmissão de informações, têm que levar em conta todas as dimensões da comunicação, os relacionamentos, as regras internas e externas, sabendo que nem tudo o que é emitido é compreendido claramente pelos membros. Compreendido como se dá a comunicação organizacional, iremos agora aprender quais são os processos de comunicação que podem ocorrer e ser identificáveis dentro das organizações o que propiciará melhor compreensão da própria comunicação que ocorre no estudo de caso a ser examinado. 5.1 OS PROCESSOS DE COMUNICAÇÃO Vamos considerar que “comunicar significa tornar algo comum. Esse algo pode ser uma mensagem, uma notícia, uma informação, um significado qualquer. Assim, a comunicação é uma ponte que transporta esse algo de uma pessoa a outra ou de uma organização a outra” (CHIAVENATO, 1999, p. 518). Mais ainda, que ela é muito mais do que informação, a comunicação está além da informação. Ela pressupõe uma relação entre quem informa e quem é informado, rumo à interpretação, à produção de significação; o 64 estabelecimento de ilações e relações entre o dado que acaba de ser informado e um repertório anterior. (SÓLIO; BALDISSERA, s. p., 2003). Compreendido isso, é importante observar que o processo organizacional é executável devido ao processo de comunicação que se encontra presente no ambiente. As atividades desempenhadas são realizáveis pelo fato de possuírem um conjunto de recursos, elementos e habilidades que, assim, auxiliam para cumprir determinado objetivo. É um ciclo que está interligado constantemente para receber informações e informar, propiciando a permanência, o fortalecimento e a sobrevivência da organização (KUNSCH, 2002). Quando mencionamos o processo comunicacional das organizações, como fala Kunsch (2002), normalmente direcionamos tal sistema a uma ordem, uma forma que compõe essa estrutura, assim logo relacionamos a: “fonte, codificador, canal, mensagem, decodificador e receptor” (2002, p. 70). Pode-se observar que é um processo relacional entre os sujeitos, os setores e as organizações, sendo que no cotidiano essa interação de diferentes elementos sofre alterações, intervenções e seguem diferentes regulamentos em um contexto complexo, devido às variadas formas de comunicação subsistentes, atuantes em variados contextos sociais (KUNSCH, 2002). Torquato define o processo de interação como comunicação cultural, ou seja, “quando as pessoas falam umas com as outras, estão estabelecendo uma relação no segundo nível da comunicação. […] Comporta os climas internos13” (TORQUATO, 2002, p. 34). Chiavenato (1999), para exemplificar como ocorre o processo comunicacional, percebe que os elementos básicos encontram-se nas extremidades, as quais são: a fonte e o destinatário. O autor entende como fonte a pessoa que transmite determinada informação; o transmissor é aquele que sistematiza e transporta a ideia ou significado através da fala ou escrita, já o canal é o meio pelo qual a mensagem perpassa entre a fonte e o destino; o receptor é o meio que decifra ou exemplifica a mensagem para apresentar um significado compreensível; o destino é o grupo ou indivíduo que deve receber a mensagem e o ruído é aquilo que gera alguma imperfeição, distorção que atinge a mensagem transmitida da fonte ao destino e a retroação é o processo em que o destinatário adquiri a apreende a informação e apresenta o que ele interpretou da mensagem recebida (CHIAVENATO, 1999). 13 Segundo o autor, o clima interno é utilizado para saber o que está acontecendo no interior da empresa. Mede a temperatura do clima organizacional, o qual é ajustado por meio da cultura interna – costumes, valores, ideias, etc. (TORQUATO, 2002, p. 34). 65 No que se refere à função de receptor, os motivos pelos quais pode haver um desajuste da mensagem no caminho da fonte até o destino se devem ao fato de “o receptor não conhecer a codificação e não saber decodificá-la; o receptor tem dificuldade em interpretar a codificação; o receptor não está exatamente sintonizado no canal (por ansiedade, cansaço, desatenção ou desinteresse” (CHIAVENATO, 1999, p. 521). Chiavenato observa que o processo de comunicação é metódico e constante, sendo que “a comunicação deve ser considerada um processo bidirecional para que seja eficaz” (1999, p. 522). Com isso, ele quer dizer que a comunicação é uma via de mão dupla, já que há uma troca constante de informação entre o emissor e o receptor. Para o autor, uma comunicação efetiva ocorre quando o receptor decifra a mensagem atribuindo-lhe um significado que se relaciona com a informação e idealização que a fonte emitiu (CHIAVENATO, 1999). Nesse caso, “o processo de comunicação pode ser eficiente e eficaz. A eficiência está relacionada com os meios utilizados para a comunicação, enquanto a eficácia está relacionada com o objetivo de transmitir uma mensagem com significado” (CHIAVENATO, 1999, p. 522). Segundo Torquato (2002), é possível identificar quatro formas de comunicação: comunicação cultural, já mencionada e explicada anteriormente; a comunicação administrativa, que se direciona aos papéis, ao lado burocrático da organização, observando que muitas vezes ocasionam intercorrências, pois as informações ficam imobilizáveis no meio do percurso até chegarem no seu destino devido à exagerada quantidade de canais de comunicação. Também cita a comunicação social que abrange as áreas dos cursos de comunicação: relações públicas, publicidade, jornalismo, marketing, etc; e por último, a quarta forma é o sistema de informação que “agrega as informações armazenadas em bancos de dados” (2002, p. 34). Essas formas de comunicação são estratégicas e uma intervém a outra, atingindo-se. Sólio percebe que o processo de comunicação se expande em variadas esferas ou círculos, e pode ser traçado da seguinte forma: “numa primeira instância, os Sujeitos recebem dados. Numa segunda instância, eles processam essa massa de dados. Numa terceira instância, esse processamento gera respostas multifocais, ou seja, de sentidos variados” (2010. p. 66). Para Kunsch (2002), é extremamente necessário extrapolar a ideia mecanicista da comunicação, partindo para uma visão mais investigativa e criteriosa da mesma. O sistema mecanicista traz um aspecto funcional e eficiente para a organização, tendo consciência que a atuação comunicacional pode ser mensurada e uniformizada. Diante de tal fato, observa-se, 66 então, que a organização preocupa-se mais com “as estruturas formais e informais de comunicação e com as práticas em função dos resultados, deixando de lado as análises dos contextos sociais, políticos, econômicos, tecnológicos e organizacionais” (KUNSCH, 2002, p. 73). Nesse contexto, as organizações devem procurar adotar uma visão mais crítica, capaz de atender as expectativas e anseios da sociedade moderna, desenvolvendo ações inovadoras e coesas. Nesse sentido, o pensamento de Torquato vai ao encontro do de Kunsch, pois o autor também acredita que é preciso identificar novas linguagens que adquirem mais espaços internos, amplificando a probabilidade da comunicação eletrônica nas organizações (TORQUATO, 2002). Marchiori propõe que o uso da linguagem organizacional faça “a reflexão sobre a própria prática quando se lida com uma noção de linguagem como ação (performática14), cujos efeitos podem estabilizar/desestabilizar relações e organizações” (2013, p. 67). Sólio entende que um processo de comunicação “somente se atualizará à medida que houver interação entre Sujeito e essa interação, evidentemente, está relacionada a uma permanente disputa de poder que desemboca na disputa de sentido” (2010, p. 66). Kunsch (2002) observa que mesmo que as organizações tenham mudado muito nos últimos anos, ainda assim, permanecem com atitudes comunicativas tomadas de uma cultura tradicional e despótica do século XIX. Nesse caso, é tocante a observação de Torquato ao se referir à organização reflexiva, menos mecânica e comprometida em desenvolver uma linguagem, comunicação, mensagem, clara e concisa, o que evitará consideravelmente os ruídos. Não esquecendo que pensar os processos comunicacionais “é ter em mente o Discurso, pois é por meio da linguagem que o Sujeito acontece” (SÓLIO, 2010, p. 68). Vamos nos deter a compreender os diversificados tipos de públicos existentes em uma organização, que se relacionam entre si e constitui esse organismo social modificando realidades e contextos. 5.2 OS DIFERENTES PÚBLICOS Os públicos são elementos fundamentais nas organizações, é devido a sua interação 14 Atos da linguagem como atos performáticos significa dizer que as pessoas estão fazendo coisas com com as palavras. O ato performativo é um ato político que se constitui na escolha intencional que o sujeito faz das palavras, de pedras ou de imagens para construir representações aceitáveis dos acontecimentos, das necessidades, das coisas do mundo. (MARCHIORI, 2013, p. 59). 67 com as organizações que novos questionamentos, estratégias e perspectivas surgem no decorrer da história da comunicação, já que eles são objeto de estudo dessa área. Nesse sentido, Kunsch colabora ao dizer que em específico para os profissionais de Relações Públicas, uma etapa primordial “é o levantamento dos grupos ligados a uma organização e a identificação desses grupos” (1986, p. 84). Peruzzo, (1986, p. 42), conceitua público como “um grupo de pessoas que se distinguem das outras por uma ou mais características em comum, como ler o mesmo jornal, trabalhar para a mesma companhia, professar a mesma religião, frequentar a mesma escola ou viver no mesmo bairro”. Para a autora cada público pode ser analisado de forma isolada, pois cada um possui um comportamento singular, cada público pode se considerar objeto de pesquisa para um profissional de relações públicas. A noção básica que França dá “refere-se ao que é pertencente ou destinado ao povo em geral, à coletividade em toda sua extensão. No sentido político, refere-se ao que pertence ao governo de um país e está disponível aos cidadãos” (2008, p. 12). Segundo Rodrigues, é uma categoria moderna, criada no século XVIII, que, na origem era constituída por pessoas esclarecidas com vista ao livre debate político, literário ou científico. Tratava-se de uma categoria política empenhada no esclarecimento e na emancipação do homem em relação ao obscurantismo e ao domínio do poder autoritário e coercitivo do antigo regime. (2000, p. 97). Seguindo uma classificação mais clássica, o público divide-se em interno, externo e misto, sendo que o público interno engloba os funcionários de todos os níveis e suas famílias; o externo comporta a imprensa, consumidores, concorrentes, poderes públicos, “comunidade” onde a empresa atua, o bairro, a cidade, etc. E o misto abrange acionistas, revendedores, fornecedores, etc. Trata-se de uma classificação geral e pode variar conforme as características da empresa. (PERUZZO, 1986, p. 43). Fortes, nota que “os relacionamentos de uma organização com os grupos que para ela se voltam […] serão transformados em públicos autênticos” (2003, p. 208). Em uma visão tradicional, o autor também identifica quatro tipos de públicos: o interno composto por funcionários e familiares; o misto são os que beneficiam a economia da empresa, como é o caso de investidores, fornecedores, cooperados e intermediários; o público externo formado pelo corpo social, sindicatos, imprensa, escolas, órgãos públicos, concorrentes, consumidores, 68 países e grupos internacionais; e por fim, o público em potencial, que são gratificados com agilidade e quantidade satisfatórias de informações, solucionando dúvidas. Deve sempre haver boa estrutura, organização, eficácia nas normas e ordens para atender esse público (FORTES, 2003). Kunsch também segue a mesma linha tradicional para categorizar os públicos em: interno, misto e externo. “o interno é formado por, funcionários, diretores e seus familiares. O misto, por acionistas, fornecedores e revendedores. O externo, por consumidores, imprensa, comunidade, poderes públicos, concorrentes, escolas, sindicatos, bancos, etc” (1986, p. 84). Porém, delimitarmos o conceito de públicos somente ao interno, externo e misto é um erro, pois já não é suficiente e não contempla a todos os públicos de interesse se os pensarmos somente nessa estrutura. Conceituar Público é ainda mais complicado se ponderar também as relações da economia, negociações empresariais e até mesmo o termo globalização. (FRANÇA 1997, p. 13). Simões (1995) concorda com França, no que diz repeito a restringir os públicos entre interno, externo e misto, visto que os mesmos são “insuficientes para caracterizar o tipo de relação público-organização” (p. 131). Baseado na documentação de Relações Públicas francesa, o autor adaptou 4 classificações de públicos quanto ao traço de poder, como parâmetro para outra tipologia. Os quais são Quadro 3 – As relações de Poder como critério para outra tipologia DECISÃO Públicos cuja autorização ou concordância permite o exercício das atividade organizacionais. Ex: governo CONSULTA Públicos que são sondados pela organização, quando a mesma pretende agir. Ex: acionistas, sindicatos. COMPORTAMENTO Públicos cuja atuação pode frear ou favorecer a ação da organização. Ex: Funcionários OPINIÃO Públicos que influenciam a organização pela simples manifestação do seu julgamento e seu ponto de vista. Ex: Seguidores habitual e inconscientemente. Fonte: SIMÕES, 1995, p. 132. Na esfera organizacional há uma confusão ao definir a que público pertence os funcionários terceirizados, os temporários, os acionistas, etc. Além desses questionamentos, também pode-se indagar sobre empregados de uma transportadora que só comparecem no 69 escritório para receber e realizar a troca de turno, até mesmo a comunidade, órgãos governamentais, entre outros, fazem parte de qual público exatamente (FRANÇA, 1997). As alterações que acontecem na esfera organizacional, econômica e global, as formas de se relacionar não se sustentam somente com as definições tradicionais, sendo necessário “encontrar novos critérios para definir essa relação empresa/público” (FRANÇA, 1997, p. 13). Uma alternativa dessa conceituação seria em primeiro lugar, com aqueles que contribuem para a sua constituição, fundamentando sua estrutura como uma organização coesa, produtiva e competitiva. Em seguida, entram em cena os públicos que contribuem para viabilizar os negócios da empresa, fornecendo-lhe tecnologia, matéria-prima, assistência técnica, etc. (FRANÇA, 1997, p. 14). Foi pensando em uma conceituação lógica de públicos que o autor categorizou os mesmos em: púbicos essenciais, não essenciais e públicos de redes de interferência Quadro 4 – Demonstrativo da conceituação lógica de público CATEGORIAS DEFINIÇÃO ESSENCIAIS São aqueles interligados judicialmente ou não com a organização e dos quais ela depende para sua constituição, manutenção de sua estrutura, sobrevivência e execução de suas atividades-fim. Ex: Investidores, sócios, diretores /Colaboradores, fornecedores, clientes, etc. NÃO ESSENCIAIS São definidos como teias de interesses específicos, pelo nível de maior ou menor envolvimento nas operações da organização. Por não fazerem parte das atividades-fim, não estão ligados à fatores produtivos, mas à prestação de serviços ou à intermediação política ou social. Ex: Agências de propagandas, Sindicatos patronais, conselhos profissionais, Comunidade de modo geral, etc. REDES DE INTERFERÊNCIA São considerados os públicos especiais por conta do seu poder de liderança operacional ou representativa junto ao mercado e à opinião pública. Ex: Concorrentes diretos, indiretos, Mídia impressa e eletrônica. Fonte: FRANÇA, 2008, p. 77-83. O autor observa que o principal objetivo do relacionamento organização-públicos 70 senta-se em interesses institucionais, promocionais ou de desenvolvimento de negócios, assim como ocorre com os colaboradores, clientes, fornecedores, revendedores e demais públicos ligados às operações produtivas e comerciais da organização. Empresas e públicos têm interesses comuns de produtividade e lucratividade. (FRANÇA, 2008, p. 72). Nesse sentido, constata-se que há um interesse de relacionamento, assim como de ganho financeiro, uma troca de interesses de ambas as partes, produtividade-lucratividade. Existe uma parceria entre os públicos e as empresas, pois sabem que se trabalharem coletivamente vão conquistar bons resultados. Na medida em que se consolida um ambiente vantajoso propiciado pela qualidade funcional recaindo na identidade da empresa, mais próximo os públicos proporcionarão então, bom relacionamento (FRANÇA, 2008). Um novo conceito de público também são os Stakeholders, que Rocha (2010) explica como termo originário da palavra inglesa stockholder (ou shareholder), que significa acionista. Expande o foco da organização, que tem como objetivo atender não somente os acionistas, mas sim os “públicos de interesse estratégicos, como clientes, funcionários, imprensa, parceiros, fornecedores, concorrentes, sindicatos e a comunidade local” (2010, p. 6). Nesse caso, na gestão dos Stakeholders, a empresa é entendida como o núcleo de uma teia de públicos interessados, e aquisição da vantagem competitiva 15, que tem por base a gestão superior dos relacionamentos e interação com seus públicos. França, observa que é um conceito de uso recente utilizado para “descrever as relações das organizações com seus públicos e que aos poucos passou a ser utilizado também no Brasil” (2008, p. 32). Para conceituar Stakeholders, Harrison (2005, p. 31) diz que são “públicos de interesse, grupos ou indivíduos que afetam e são significativamente afetados pelas atividades da organização: clientes, colaboradores, acionistas, fornecedores, distribuidores, imprensa, governo, comunidade, entre outros”. Os públicos que constituem os Stakeholders, geram expectativa sobre a conduta da empresa, assim como, os resultados estimados por ela. Quando não há satisfação desse público com as atividades exercidas pela empresa, sua imagem e a reputação podem ser prejudicadas (HARRISON, 2005). Fortes contribui ao dizer que há uma nova configuração no modo de relacionar-se com as organizações, sendo que os grupos acabam por sua vez agindo como se fossem donos das 15 Conjunto de características ou atributos detidos por uma empresa que lhe confere certa superioridade sobre os concorrentes imediatos. (ROCHA, 2010, p. 9). 71 empresas, ampliando a ideia de que os proprietários não se restringe somente aos donos da organização. Os “'novos proprietários', os controladores do capital da empresa são os primeiros a exigir a transparência da gestão, mas não são os únicos” (2003, p. 82). Os stakeholders abrangem: empregados, empregados em potencial e ex-empregados, sindicatos, fornecedores, intermediários, poderes públicos, comunidade, ONGs, fábricas, escritórios e varejo da vizinhança, líderes comunitários, ecologistas e grupos de interesse ambiental, mídia de negócios, associações industriais, comerciais e profissionais, instituições educacionais, parceiros e concorrentes dos produtos e serviços da companhia. (2003, p. 82). Podemos constatar que identificar os públicos não é tarefa tão simples se pensarmos além da plataforma clássica, estimulando e desafiando a exploração do conceito tradicional traçado por diferentes autores, pois os públicos não são estanques; pelo contrário, estão em constante transformação, na forma de pensar, agir, falar, culturalmente e ideologicamente. Apropriarmo-nos de tais conceitos é fundamental para percebermos a importância que esses grupos desempenham e representam na esfera organizacional, bem como o porquê agem e pensam de determinada maneira, devido a sua cultura e experiências vividas no particular e no coletivo. 5.3 RESPONSABILIDADE SOCIAL E ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES Como explicado ao longo desse capítulo, é inegável a necessidade da comunicação para a vida social. É por intermédio dela, da linguagem, da relação interpessoal, que podemos dar sentido às coisas, que significamos o mundo a nossa volta. Dessa forma, é de grande relevância estudarmos seu impacto no cotidiano, seu compromisso na transmissão de informações, já que ela incentiva, influencia, constrói culturas, fortalece ideologias, podendo mascarar discursos para legitimar o poder. Guareschi afirma que a comunicação é tão poderosa que “hoje, é tão ou mais vital que o petróleo” (2005, p. 66). Para Pereira (2002), o que torna verdadeira a premissa “informação é poder” (p. 25) é saber que aquele que detêm forças, condições para suprir necessidades básicas de outro indivíduo, como a indispensabilidade de informação, seguramente está em uma posição de poder. Acrescenta, ainda, que “a posse da informação qualificada confere autoridade, diferencia o profissional de sucesso de outro menos afortunado, projeta uma empresa, antes 72 talvez inexpressiva, para níveis de competitividade insuspeitada” (2002, p. 25-26). Para Barros (1995, p. 35), “a informação traz à intersubjetividade do processo comunicativo uma nova perspectiva: a âncora no real, uma ponte entre o real e o campo da comunicação, entre 'o fato e o acontecimento informativo”. Por tais colocações, atualmente muito se tem discutido como os meios de comunicação estão utilizando a informação, a transmissão da mensagem, “uma nova lei de imprensa” como fala Pereira (2002, p. 13). Argumentos de que a lei foi criada nos anos da ditadura militar e por isso carrega mecanismos de coibição são levantados para justificar posicionamentos da imprensa como um todo. Guareschi, seguindo essa linha de pensamento, observa que “durante a ditadura, os militares notabilizaram-se por uma censura ferrenha dos meios de comunicação, principalmente da TV” (2005, p. 50). Tais exemplos não cabem apenas para a visão macro dos meios de comunicação, mas também para o interior das organizações, aos responsáveis por produzir a comunicação. Para Pereira é evidente a íntima conexão entre consecução da função social própria dos meios de comunicação e obtenção das metas empresariais de índole mais econômicas. Em poucas áreas é também tão patente o dano que se pode produzir na sociedade, quando se sobrepõem ao fim social fins estritamente egoísticos. (2002, p. 37). Nesse sentido compreende-se que o reconhecimento da função social dos meios de comunicação não é importante apenas para o fim de disciplinar as sanções ao seu abuso. Igualmente relevante é a consideração dessa função para disciplinar as garantias que se devem assegurar à imprensa para o escorreito desempenho dos seus fins. (PEREIRA, 2002, p. 41). Os meios de comunicação também possuem um papel político, segundo o autor, que é “pela realidade sociológica do poder que exercem na conformação da cultura e dos comportamentos, com todo o impacto político que isso apresenta” (2002, p. 42). Guareschi contribui ao explicar que a “classe política depende muito dos meios de comunicação para eleger seus integrantes” (2005, p. 50). Guareschi (2005), entende que para que seja possível haver democracia em uma sociedade, é necessário que exista democracia na prática do poder de comunicar, e democracia está relacionada à autonomia popular e na divisão igualitária dos poderes. O autor coloca que a empresa, como meio de comunicação de massa, é diferente de outras empresas, 73 porque interfere no pensar e agir do ser humano, dando significado aos objetos, auxilia na criação da cultura, os variados pontos de vistas e princípios das gerações. É indispensável ponderar sobre os comunicadores, o quanto eles têm de consciência das responsabilidades em transmitir uma informação, se possuem liberdade para expressar suas ideias, o quanto estão dispostos a manter-se monitorados e abertos à criticas e julgamentos da sociedade (GUARESCHI 2005). Os profissionais responsáveis pela comunicação nas organizações devem estar cientes do compromisso com os funcionários que compõe e fomentam o desenvolvimento dela. Não somente os grandes veículos de comunicação, mas, também e, principalmente, as organizações, por serem a base da estrutura comunicacional que antes de ser privada, deve saber que é um bem público, “devendo sua prestabilidade estar à disposição da coletividade, do interesse da sociedade ou governamental, vale dizer, a serviço do desenvolvimento humano nos aspectos educativos, culturais, artísticos e éticos” (GUARESCHI, 2005, p. 67). Rodrigues entende que o prisma da ética na comunicação está na relação entre o discurso e a ação. Em síntese no domínio da comunicação, por um lado, uma ética discursiva que tem sobretudo a ver com o estabelecimento das regras que presidiam à interlocução e ao diálogo com vista ao estabelecimento de consensos e à gestão das dissenções dos conflitos e dos diferendos, e, por outro lado, uma ética da ação, que tem a ver com as regras que regulam a interação, isto é, as normas da ação justa tendo em conta os valores ou o quadro axiológico. (1995, p. 49). Para o autor (1995, p. 49), “os dois domínios éticos não são, no entanto, equivalentes nem teórica nem praticamente”, a interlocução baseia-se em princípios que requerem uma adaptação e manifestação da linguagem, legalizando o poder dizer, a autorização ou a imposição de os sujeitos se comunicarem. Já, a interação baseia-se em princípios funcionais e instrumentalidade, esse “legitimado pelo direito e pelo dever de agir” (RODRIGUES, 1995. p. 49). Não se deve restringir a ação ao domínio do discurso, mesmo quando considerar o discurso como uma ação que interfere no meio social, pois, assim, corre-se o risco de misturar “a ação discursiva com outras modalidades da ação” (1995, p. 49). Para Srour, falar de ética nas organizações é falar de moral, pois, “não há agrupamento humano que não obedeça a um sistema de normas morais” (2003, p. 269). Mesmo quando essa moral não é convencionalmente aceita perante as demais coletividades, sendo que cada grupo pode adotar uma moral interna e outra externa. Segundo o autor, “as normas morais são 74 simbólicas e animam as relações de saber 'hegemonia e conformidade'” (2003, p. 270). De forma que a moral torna-se um discurso verdadeiro e se encontra no coração da ideologia, pois a moral já demonstra um posicionamento ideológico e também refere-se em último caso aos desejos envolvidos, como no caso da responsabilidade da comunicação organizacional em saber qual é a melhor informação que deve ser veiculada. Na medida em que compreendemos as responsabilidades que a comunicação possui na sociedade e principalmente no ambiente organizacional, vamos agora buscar explorar a função social do profissional de relações públicas dentro das organizações e seu comprometimento com uma comunicação pluralizada. 5.4 RELAÇÕES PÚBLICAS: MISTIFICAÇÕES E CONTRADIÇÕES Para Kunsch, (2002, p. 91), as relações públicas “têm como objeto as organizações e seus públicos, instâncias distintas, mas que, no entanto, se relacionam dialeticamente”. Trabalham com o gerenciamento e promoção dos relacionamentos, utilizando métodos, planejamentos de comunicação conforme as variadas situações experienciadas no contexto social. Sendo assim, a clareza das ações e confiabilidade das fontes, são essenciais para o bom relacionamento da organização com a sociedade, além de colaborar para a implantação de cidadania no sentido de responsabilidade social (KUNSCH, 2002). O profissional deve, então, facilitar a comunicação da organização com a sociedade, alertando a mesma para assumir uma postura comprometida, pensando além da prática “voltada para o setor privado ou governamental e atuar em uma nova dimensão, pondo-se a serviço, também, das comunidades locais e das organizações sem fins lucrativos” (2002, p. 129). A autora defende que esse processo de conscientização de cidadania é importante pois, dessa forma o sujeito tem consciência que pode participar da transformação e construção de uma sociedade mais digna, consciente de que os aparelhos do Estado não conseguem sozinhos dar conta de atender a todos que dele necessitam. Nesse contexto, as organizações estão sendo desafiadas a ter novos olhares e novos posicionamentos para a idealização da cidadania. No que se refere à cidadania, ela é “um arcabouço social que requer o envolvimento de pessoas, condicionando-se seu status à qualidade da participação. Essa é uma de suas bases. Outra está na noção de que suas formas se condicionam ao tipo de sociedade política em que se vive” (PERUZZO, 1998, p. 258. Grifo da autora). A autora explica que ser cidadão é sentir- 75 se legalmente protegido; é ter direito de ir e vir, de poder intervir na esfera política; é poder manifestar-se, é ter os direitos garantidos da constituição, como casa, comida, educação, trabalho. Enfim, é ter o direito de compartilhar com equidade na fabricação, na coordenação, assim como, no desfrute dos recursos “econômicos e culturais” (1998, p. 286-287). Peruzzo, segundo a Associação Brasileira de Relações Públicas, define Relações Públicas como “a atividade e o esforço deliberado, planejado e contínuo para estabelecer e manter a compreensão mútua entre uma instituição pública ou privada e os grupos de pessoas a que esteja direta ou indiretamente ligada” (1986, p. 33). Seu ofício se fundamenta em agir sobre a mente dos indivíduos organizacionais, buscando ajustar os desejos da empresa com o de seus públicos; buscando harmonizar os interesses dos indivíduos com os da organização. No modo de produção capitalista, a finalidade do RP na contemporaneidade do amadurecimento da profissão é “fazer com que o interesse privado adquira uma roupagem de interesse público” (PERUZZO, 1986, p. 34). Nesse sentido, a noção que se tem é que as atividades do profissional destinam-se ao bem comum, que buscam respeitar e reconhecer o interesse do público, que não influenciam opiniões, entre outras características peculiares da função do profissional, vista de um ângulo tradicional (PERUZZO, 1986). Em contrapartida, é extremamente necessário examinar que a função social do Relações Públicas é assegurar a existência das condições favoráveis à reprodução do capital […]. Porém, ao mesmo tempo procura-se camuflar esse comprometimento e os antagonismos estruturais ao atribuir que os conflitos são oriundos da ausência de comunicação ou de comunicações deficientes. (PERUZZO, 1986, p. 51). Sendo assim, a autora nota que há uma disparidade entre a prática e a teoria do RP, um lado admite seu papel influenciador em prol do capital e o do outro a percepção que hesita em assumir tal posição. Na prática, as relações públicas “querem harmonizar as desigualdades e na teoria baseiam-se na igualdade, admitindo (teórica e praticamente), apenas conflitos, desarmonias ou desajustes de interesses” (PERUZZO, 1986, p. 52). Ao querer garantir condições para a reprodução do capital, fica claro que um dos objetivos do profissional é servir à burguesia, que dentro da sua ideologia divulgam-se ideias procurando fazer 'com que os homens creiam que são desiguais por natureza e por talento, ou que são desiguais por desejo próprio. […] Ou, então, faz com que creiam que são desiguais por natureza, mas que a vida social, permitindo a todos o direito de trabalhar, lhes dá iguais chances de 76 melhorar – ocultando, assim, que os que trabalham não são senhores do seu trabalho e que, portanto, suas 'chances de melhorar' não dependem deles, mas de quem possui os meios e condições do trabalho. (PERUZZO, 1986, p. 54). Simões explica que o surgimento da profissão de relações públicas, segundo lugares e culturas onde ela mais se expandiu, aponta indícios de que o ofício tem por base as “relações de poder entre as organizações e seus públicos, assim como na possibilidade iminente do conflito entre ambos” (1995, p. 51). É importante desmistificar, despersonificar a ideia clássica e tradicional do profissional de relações públicas, perceber e analisar no que implica o ser relações públicas, com o que se quer compactuar ou desvelar; se a função social está para servir e emancipar a cidadania ou para favorecer as classes mais abastadas; se para ser mais um profissional atuante na área ou um profissional que não compactua com ações, discursos, linguagens que não condizem com seus valores e ideologias (PERUZZO, 1986). Acreditar que ser RP é prestar serviço à comunidade de modo geral e não a uma elite dominante, é fazer com que seu discurso seja coeso com sua prática. Não temos como propósito reduzir a imagem do profissional de relações públicas, mas queremos abordar características que muitas vezes são encobertas e pouco discutidas, mas que competem às funções do profissional no meio organizacional, seja ele privado ou público. É fundamental colocar em pauta as atribuições que são direcionadas aos RPs, sendo eles responsáveis por uma comunicação pluralizada e igualitária. Entendemos então que o relações públicas precisa ser um agente de transformação social. Na medida em que tem espaço concomitantemente junto ao capital e ao trabalho, deve ser seu papel buscar a transformação social a partir de um novo olhar das organizações em direção ao trabalho e à sociedade, numa posição de aprendizado e de escuta que, a médio prazo representará um crescimento sólido e efetivo tanto dessa sociedade quento da organização que ela acolhe. 77 6 O TRABALHO DE CAMPO Resgatando o tema da nossa pesquisa, o discurso como estratégia nas relações de poder, definimos então, realizar entrevistas em profundidade com dezesseis funcionários da empresa analisada para melhor investigar tal discurso. Criamos um questionário com perguntas ligadas à comunicação e integração, e relações de poder. As entrevistas ocorreram em datas distintas, sendo que todas foram agendadas com antecedência com os funcionários mediante a liberação dos seus superiores; as mesmas foram realizadas em datas diferentes, no período de um mês, e todas foram gravadas com um gravador digital. A escolha dos entrevistados se deu pelo método de sorteio, variando entre a matriz e as cinco filiais e levando em conta a representatividade dos seguintes segmentos: mulheres, homens, funcionários mais velhos, funcionários mais jovens, chefias, funcionários sem poder de decisão, com bom tempo de casa e contratados há pouco tempo. Apenas um funcionário se recusou a responder as perguntas; nesse caso, então, realizamos a entrevista com outro funcionário, igualmente sorteado. Na investigação das informações captadas, o sigilo dos entrevistados será assegurado, pois nomeamos os mesmos por letras do alfabeto de A a P. Para relacionarmos uma fala com a outra na análise, apenas distinguiremos por diretora 1 e diretor 2, chefe e funcionário, seguido das letras (no caso dos diretores, utilizamos apenas números). Quando funcionários que não foram entrevistados forem mencionados, serão referidos como funcionário (a) X. Com base na pesquisa bibliográfica e por meio das entrevistas, pretendemos responder nosso problema de pesquisa: o discurso funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de poder em uma organização? Realizada a análise das entrevistas, ao computar os dados, vamos identificar algumas ações estratégicas que acreditamos que possam ser aplicadas na empresa estudada, auxiliando na comunicação interna. O fato de as questões terem sido construídas em estrutura aberta proporcionou aos entrevistados mais liberdade para expressar suas opiniões. Considerando a estrutura aberta das entrevistas, ressaltamos que o questionário sofreu alterações conforme o desenvolvimento das entrevistas. O roteiro de questões divide-se em dois momentos, um com perguntas relacionadas à comunicação interna e integração e, outro direcionado às relações de poder, facilitando assim, na estrutura da análise. 78 1º – Sobre a comunicação interna e integração. a) Como funciona a comunicação dos chefes com os funcionários? Há uma estrutura de hierarquia na comunicação? b) Como é gerenciada a comunicação entre as filiais? c) Quais os meios de comunicação que a empresa possui? d) Quem é responsável pela comunicação interna da empresa? e) A empresa é mais formal ou informal na forma de se comunicar? f) A empresa desenvolve momentos de integração durante o ano? 2º – Relações de Poder. g) As escalas de trabalho dos finais de semana são construídas em conjunto com os funcionários? h) Quanto à liberação para consultas, exames, etc, como é feita essa comunicação aos gestores? É realizada com antecedência, interfere na escala de trabalho? i) Como é a relação entre as pessoas do escritório e os da pista? j) Os trabalhadores sabem que mesmo não estando no papel, existe uma hierarquia de poder de decisão na empresa? Como funciona? k) Os funcionários têm liberdade para mudar sistemas e rotinas e para sugerir coisas novas? l) Tem hierarquia na comunicação? m) Existe uma rotatividade na empresa? Por quê? Na medida em que percebemos que determinada questão levantada pelo entrevistado poderia ser mais aprofundada, perguntas foram incluídas, dando mais forma e consistência à pesquisa. As respostas dos entrevistados serão defrontadas para que possamos analisar como funciona a comunicação da empresa e as relações de conflitos, tendo como base, a análise do discurso. 6.1 ANÁLISE DO DISCURSO NAS ENTREVISTAS Para compreendermos qual é o discurso assimilado pelos funcionários na empresa pesquisada, examinaremos as falas descrevendo-as e relacionando-as com as palavras chaves que nortearam o estudo: Organizações, Comunicação Organizacional, Discurso, Poder. 79 6.1.1 Comunicação interna Quando questionado sobre como funciona a comunicação dos chefes com os funcionários, o funcionário C, diz: Pelo meu ver, assim, tá sendo boa a comunicação com eles e com nós, assim né. Mas, tem momentos, como que eu vou te dizer, [silêncio] que tem alguma coisa de errado, ele, ele, fica quieto [silêncio], assim, não dá explicação pra a gente: - Não, vai ali e faz assim, faz assim que fica mais fácil. Alguma coisa, assim, para se tornar mais fácil pra a gente. Fora isso é tudo bem, tudo tranquilo com nós e com ele.16 Já para o seu chefe B [Silêncio] Bom, a gente tem algumas reuniões né [silêncio], com o grupo todo e também a gente conversa particularmente com cada um deles e, assim, a gente passa todas as explicações, principalmente individualmente, para que eles entendam o que nós, gerentes, queremos. Logo percebemos que não há conformidade nas respostas, visto que para o chefe B, ele sempre passa todas as informações, explica os procedimentos para que os funcionários consigam compreender o que ele quer, e ainda frisa que elas são transmitidas “principalmente individualmente”. Sendo que o próprio funcionário sente uma carência de explicações que possam auxiliar no desempenho da sua função. Hornstein observa que “em toda empresa, todo escritório e todo ambiente de trabalho, os funcionários estão atentos às mensagens subjacentes às práticas e políticas dos líderes, na tentativa de decidir se estão sendo considerados nós ou eles” (2003, p. 17. Grifo do autor). No caso citado acima, o chefe identifica-se como “nós, gerentes”, pois ele faz parte de um grupo que se encontra em um degrau acima “deles” – os funcionários. Quando essa mesma pergunta é feita para a diretora 1, essa responde que ocorre reunião uma vez por mês, reuniões com os gerentes. Era eu que participava […], e agora quem tá participando é o diretor 2 [pausa]. Então com o diretor 2, a gente nota que surte mais efeito. Talvez porque ele seja homem, mais durão, é com o diretor 2 que tá acontecendo. E assim ó, quando o diretor 2 vê que tem a necessidade, tá acontecendo isso e isso, ele chama todo mundo. A diretora 1, nesse momento, lembra diretamente da comunicação que mantém com 16 Todas as falas de pessoas entrevistadas estarão em itálico, para diferenciá-las de citações de autores. 80 os gerentes, nominados aqui por chefes, não fazendo referência aos demais funcionários da empresa, em uma fala com indícios machistas, colocando que o outro diretor, sendo homem, consegue ter mais controle da situação por ser “mais durão”. A fala denota, também, uma cadeia hierárquica de cima para baixo. Diretores falam com chefes e chefes com funcionários. Quando o chefe fala ao funcionário, há a presença do diretor (hierarquia simbólica). A funcionária P, ao responder a mesma pergunta, explica que: “[cochicha e fala ironicamente: 'Meu chapéu!']. Não há, assim, uma gestão muito organizada da parte deles de conversa, de avaliação de desempenho, mas dentro do possível e do andamento das coisas o relacionamento é bom”. Quanto às reuniões, ela acrescenta “a gente tem as reuniões dos gerentes todo mês que na verdade não é seguido também, não é todos os meses, às vezes, tem mês que não dá, aí não sai né”. Podemos observar que na frase que sai entre cochichos pode estar implícito um “meu deus, como falar disso de maneira tênue”, além de revelar que as reuniões não ocorrem regradamente todos os meses, como expressado pela diretora 1. A funcionária E, percebe que há uma carência de relacionamento por parte dos diretores com os funcionários ao dizer que: “Eu acho que a comunicação é boa, a comunicação interna, (pausa). Eu só acho que nas datas festivas, sabe, comemoração que nem 1º de maio ou final de ano, eles deveriam ter um contato maior com eles – o que não tem, né”. Ao pedir que a mesma explicasse a frase “eles deveriam ter um contato maior com eles”, a mesma responde: Eles, os chefes, no caso […]. Eu acho que isso influencia alguma coisa, sabe, se eles fossem visitar, ou, pelo menos, nas datas festivas, né, 1º de Maio, que é o Dia do Trabalhador, que eu acho que seria importante um contato com o funcionário em si, ainda mais os da pista, né. É interessante trazermos a visão que França tem sobre relacionamento dos públicos, visto que os funcionários internos fazem parte de uma categoria de público também, quando esse diz que, “o relacionamento não pode ser ocasional, esporádico, como se fosse uma relação de compra e venda. É preciso que ele seja planejado na sua intenção, no seu acompanhamento e no seu desenvolvimento” (2008, p. 74). Segundo o autor, é preciso ter cuidado para que essa proximidade com o funcionário não seja infundada, rasa, mas sim projetada, preocupando-se sempre que tal contato não seja acidental ou efêmero, assim como ministrar informações e analisar se ela está sendo coletada e captada conforme os interesses da empresa. 81 Voltando ao contexto de análise da fala da funcionária E, essa influência colocada pela mesma se atribui ao fato de se sentirem parte da empresa, né, porque eu acho que isso motiva mais o funcionário, né, como parte da empresa, poxa, eu conheço o meu supervisor ou o dono, né… Como, por exemplo, a Randon, né, nas festas vai o dono da Randon e aperta a mão, aí eles se sentem importantes… eu acho que isso é importante para uma empresa, o pessoal, o chão de fábrica, ou no caso a pista, ter esse contato que eu vejo que não tem, sabe. Talvez eu esteja errada, mas nos seis meses em que eu estou aqui eu percebi que não existe isso. Para Freitas, “a vantagem de se poder dizer e se sentir pertencente a um grupo exclusivo faz da dificuldade de ser nele admitido o melhor prêmio, reforçando o sentimento de pertença ou a necessidade e filiação existente em todo ser humano” (2002, p. 101). No que diz respeito à frase “parte da empresa”, Scroferneker entende que, “o pertencer é o fazer parte. Expressões como 'nessa organização somos uma família', aqui na 'empresa somos um time', 'aqui é a nossa casa', buscam de certa forma fomentar e legitimar esse sentimento, essa necessidade” (2010, p. 192). A vontade de pertencer faz com que o indivíduo identifique-se cada vez mais com a organização, assim como, com a cultura praticada, sendo que “algumas vezes mascara uma realidade negada, a de efetivamente não pertencer. O indivíduo assume (consciente ou inconscientemente) o seu não-lugar. Percebe-se excluído, embora incluído, e busca (re)definir seu lugar” (2010, p. 192). Sólio (2010) diz que em qualquer organização é possível depara-se com processos de identificação, prestígios, idealização ou coibição, seja nos relacionamentos entre duas pessoas ou em grupo. No que diz respeito à comunicação entre as filiais, a diretora 1 exprime que: O que eu sinto assim, a gente tem o RH tá, eu sinto uma distância do RH com as filiais. A função do RH é fazer essa comunicação entre aqui – matriz [Grifo nosso] e as filiais e o RH não tem comunicação nenhuma com as filiais. Faz tempo que eu sinto isso, entende, e eu já tentei cobrar da pessoa do RH só que ela tem dificuldade de fazer isso. Para o chefe B: [Silêncio] Eu acredito que, pelo que eu vejo, as filiais acho que são meio, tipo, separadas, cada um tem os seus problemas, fica na filial. Eu não vejo muito, só os gerentes, os funcionários, particularmente, eu acho que não há, tipo assim, uma comunicação muito, como que vamos dizer, (silêncio, suspiro, “Ah cara”, silêncio) eu acho que cada um fica na sua, na verdade né. Quando acontece algum 82 probleminha sempre tem alguém que é mais amigo, mas se não, não. A situação de cada filial fica dentro de cada filial, eu acredito, alguma coisinha sempre escapa, mas aparentemente é para ficar tudo dentro da filial, qualquer coisa. O funcionário A observa que “a gente, na verdade, não é avisado, é gerente com gerentes, mais é gerente com gerente né, especificamente é gerente com gerente”. É possível notar que não há conexão na comunicação entre as filiais, visto que a diretora 1 parece preocupada em delegar essa função somente para o setor de RH, mesmo que essa preocupação diga respeito, e muito, à direção. Já, o chefe B, entende que não há comunicação entre elas, pois, cada uma resolve os problemas particularmente, as divergências ficam dentro da filial. Por fim, o funcionário A constata que a comunicação entre as filiais ocorre de chefe para chefe, os mesmos não tendo muito como intervir nesse meio. Sobre a formalidade ou informalidade das normas, regras e comunicação em geral, quanto à forma de comunicar e quanto à linguagem. Para a diretora 1, “é mais boca a boca, porque como eu te disse, a gente tem essa dificuldade no RH, entendeu. Então é mais, mais assim oh, vem aqui é falado. Mais dessa maneira”. A funcionária H, “acha que é mais informal. A linguagem depende, se essa informação vier do diretor 2, já a gente tem um pouco mais de dificuldade. Não é muito claro no que ele tá pedindo”. O funcionário C, expressa que: Não, é de boca a boca. Eles fala: Tem que fazer isso hoje, a regra de hoje é essa. E daí, como que vou te dizer, não, eles só falam de boca né. Eles mandaram lá de cima fazer isso e isso, não tem folheto, assim, que diz algumas regrinhas, alguma coisa que tem que fazer, ele só chegam e fala para a gente e a gente tem que cumprir o que eles dizem né. De modo geral, é utilizada uma linguagem verbal e popular na comunicação, exceto quando é transmitida pelo diretor 2. Quando questionados sobre quais seriam os meios de comunicação utilizados pela empresa, se eles existiam e como funcionavam, o funcionário M inicialmente diz: “Não, isso aí não tem”. Após explicar se existia algum manual, mural ou informativo, o funcionário retoma dizendo: Todo mural, por exemplo tem aniversário, o tempo de empresa né dos colaborador, tudo isso aí, vem no mural, mas de preço, de combustível que sobe, isso daí é tudo as guria lá da matriz que passam pra nós, e depois eles vem e fazem o trabalho deles e de manual não tem, quem me explicou as coisas aqui foi o próprio gerente. 83 Já, a funcionária H, logo identifica que “A gente recebe… Na verdade, quando eu entrei não tinha isso. Hoje tem uma, [ããã], um, como é que se diz, um… Um jornalzinho de integração. E quem recebe isso são os funcionários novos de quais são as regras, como funciona, quais são os benefícios… Isso tem hoje”. Observamos que o funcionário M somente reconheceu os recursos comunicacionais utilizados pela empresa quando foram dados exemplos de quais seriam. A resposta da funcionária H nos faz compreender, ainda, que o manual de integração da empresa – o qual, quando a mesma começou a trabalhar no Posto, sequer existia – era desconhecido até mesmo dos funcionários mais antigos. Estes, por sua vez, não receberam o manual durante a integração (pois este não existia, visto que foi criado em 2014), nem após sua concepção (pois já estavam “integrados”), de forma que não houve nenhuma padronização no processo de integração dos funcionários, fazendo com que nem todos ficassem a par das mesmas informações. Constatamos, assim, que não é explicitado aos funcionários o processo de comunicação da empresa. Sobre a prática de desenvolver integração entre os funcionários durante o ano, o funcionário M responde: “Não isso não, só a festa de final de ano mesmo do posto, mas daí é o gerencial lá né, os que organizam, aí vai todas as filiais, uma vez por ano, mas assim da gente fazer uma vez por mês uma janta, um a coisa não”. A funcionária H responde que: “Não. Não ocorre essa integração... até tem funcionários que trabalham aqui que eu [ããã], eu não conheço, que faz um ano que tá aqui e eu só conheço na festa de integração, no caso a festa de final de ano. Não tem essa...essa... essa integração não tem”. O funcionário J lembra que: “É todo final do ano tem a festa do posto né”. Segundo o funcionário K: “Não, ali no posto nós só fizemo quando alguém sai de férias nós fizemo um churrasquinho ou quando alguém faz aniversário, só os da pista, gerente alí, só nós ali. Só nós que trabalhamos alí, só nós que fizemos assim”. Podemos observar a pouca ou quase inexistente integração entre os funcionários, tanto que eles somente conseguem lembrar da festa que acontece no final do ano. O funcionário K, que é novo na empresa, não conhece ainda essa integração. Por isso, lembra somente dos encontros que realizam em datas esporádicas, e enfatiza que ocorre somente com os funcionários da sua filial. Quando perguntado quem seria responsável pela comunicação interna, a funcionária 84 H, explica que “é o RH”. Como comprova a funcionária P, ao falar: “Sou eu do recursos humanos”. Constatamos então, que a empresa não possui um departamento de comunicação, tampouco um profissional da área que desenvolva a comunicação interna, o que pode resultar na pouca habilidade da parte de quem produz essa comunicação ao informar, apresentar um planejamento, estratégias de comunicação, analisar o clima da empresa para executar ações que favoreçam uma comunicação mais eficaz entre os membros. 6.1.2 Relações de poder Quando questionados sobre a existência de hierarquia na comunicação, o funcionário G, responde o seguinte: “Olha… eu desconheço um pouco, assim, dessa parte, se há ou não há…” e se contradiz ao colocar que “mas, geralmente, eu falo com o gerente. No meu caso, assim, eu sempre se tivesse que pedir ou falar alguma coisa, comentar, eu falava com o gerente, sempre com o gerente. Geralmente eu falo pra ele, o gerente ali, direto”. O mesmo acontece com o funcionário J, quando ele expressar que “Não, é todo mundo igual. Quem ensina, pra quem as coisas são mais direcionadas é o chefe!”. Chauí traz que a hierarquia, são lugares “autorizados a falar e a transmitir ordens aos degraus inferiores e aos demais pontos da hierarquia que lhe forem paritários” (1997, p. 11). Isso demonstra a pouca ou nenhuma compreensão que os funcionários possuem do fato de ocuparem o papel de subordinados, tendo que “prestar satisfação” à outra pessoa. Num primeiro momento da resposta, na entrevista, eles se confundem, logo depois percebendo que essa hierarquia existe e é praticada pelo seu chefe. Para Hornstein, é evidente que o exercício da autoridade não é a causa da alienação dos funcionários. As hierarquias podem ser íngremes, ligeiramente inclinadas ou planas. Os funcionários podem estar localizados perto do topo ou da base da hierarquia. Nada disso é mais importante dos que as mensagens dos líderes ao definir quem está dentro do círculo corporativo do nós e quem faz parte do grupo externo do eles. (2003, p. 51). Já para o funcionário A: “Não, realmente tem, porque a gente tem a pessoa certa já, que é indicada para isso. A gente tem uma pessoa que passa para a gente os valores, por exemplo, assim, os aumentos da gasolina, a gente tem a pessoa”. E a funcionária O afirma existir tal hierarquia: “sim, sim. Daí seria a diretora 1 né. 85 Qualquer dúvida, qualquer coisa, eu sempre vou ver com ela”. Para a funcionária P, a hierarquia é muito importante, segundo seu ponto de vista, ao afirmar que: “comigo assim o que que acontece, eu só não permito que eles me liguem direto pra falar comigo, porque tem que ter né uma hierarquia, eles têm o líder deles, tem o gerente de pista, então eu peço que eles peçam a eles, eles me ligam”. Nesses casos, é possível perceber como é dissonante o entendimento dos entrevistados ao responderem a mesma pergunta. Enquanto dois não notam a relação de hierarquia que os diferencia não só em salário, mas no poder de tomada de decisões na relação chefefuncionário, os outros confirmam essa hierarquia dando inclusive exemplos de situações em que ela acontece. Eles evidenciam e legitimam o patamar do seu chefe ao exprimir que “a gente tem a pessoa certa já, que é indicada para isso”. Hornstein nota que “O respeito, e não as regras, e a preocupação empática, e não o calculismo frio, são as ferramentas mais práticas dos líderes” (2003, p. 52). Sendo nosso estudo de caso aplicado em uma rede de Postos de combustíveis, acreditamos ser pertinente perguntar se os mesmos trabalhavam por escalas de trabalho nos finais de semana, bem como se eram construídas em conjunto com os funcionários. Ouvimos a seguinte resposta do funcionário C: “É feito, assim, em conjunto”. Para sermos mais claros na pergunta, perguntamos se o chefe chama todos os funcionários para organizar junto, então a resposta que vem é, “Individual, individual. [Silêncio]. Como esse final de semana não… foi ontem, ele chamou e disse: Ó, o fulano vai trabalhar esse domingo [silêncio], você não vai, só vai trabalhar no outro, é assim, assim que funciona”. Ao responder a mesma pergunta, seu chefe B explica que: Antes não, antes cada um escolhia o domingo que queria trabalhar, então esse próximo domingo dois trabalham e o outro domingo é os outros dois. Hoje não, hoje eu tô fazendo, coloco dois esse domingo e dois no próximo e vou intercalando, conforme… Se eles realmente necessitam trabalhar dois a fio, por causa da folga, eles trocam, se não é eu que tô fazendo, junto com eles. Pergunto para eles, aí se eles querem trocar é que nem eu disse, entre eles né, mas geralmente é eu que estou fazendo agora. Nesse caso se verifica que a discordância é enorme, pois a princípio o funcionário C revela que a escala é feita em conjunto e depois diz que é individual, porém um individual que nos parece ser feito em alto e bom som, fazendo com que os demais funcionários escutem também. Então o seu chefe B é extremamente contraditório, por hora falar que atualmente é 86 ele que faz e hora dizer que ele está fazendo junto com os funcionários. Acreditamos ser oportuno colocar que o chefe não trabalha finais de semana e feriados, salvo no sábado até o meio dia. Isso é possível notar ao escutar do funcionário K que,“o gerente não trabalha, nem domingo e nem feriado, só sábado até meio dia”. Sobre liberação para consultas, exames particulares, qual seria o procedimento adotado, sua interferência nas escalas de finais de semana e se as mesmas têm que serem feitas com antecedência, obtivemos as seguintes explanações. O chefe L comenta: Olha, quase não tem acontecido, muito pouco acontece, mas quando tem eles fazem na folga né. Trabalha no domingo, tu tem uma folga na semana. Não chego a falar pra eles fazerem na folga, mas isso já é de bom senso, o funcionário pra não complica, ele já procura por ele mesmo já se organizar na folga. O funcionário M responde que: quando é pessoal a gente pede liberação pra sair pro gerente. Sempre avisamos antes. É, geralmente a gente marca na folga, só quando não tem mesmo como marca na folga né, que não tem horário, dependendo do que, mas geralmente é na folga, já deixo tudo pra fazer na folga. O funcionário G explana que: eu tento sempre marcar na minha folga, ou quando tenho, que não dá, eu comento com o gerente, se tem como liberar. Aí a gente combina o horário, de repente eu troco de horário, que dê pra mim fazer. É sempre com antecedência que aviso e não interfere nas escalas porque eu sempre procuro marcar na minha folga. Segundo o funcionário I, ele se preocupa com isso ao ponto de expressar: “é melhor tu avisar porque senão ele vai ficar com um a menos, que ele vai precisar. Tipo assim, se eu faltar, ele precisa de mim”. É apropriada a contribuição de Hornstein nessa linha de raciocínio a confiança não consiste em mera sutileza social nem na consideração e preocupação dos líderes pelos funcionários. É claro que esse tendem a considerar “boas pessoas” aos líderes que genuinamente apresentam tais qualidades. Mas, para as empresas, o valor desses líderes transcende as relações públicas. Ao desenvolver a identidade organizacional nos funcionários, eles propiciam à empresa vantagem competitiva com efeitos mensuráveis de lucro. (2003, p. 53). Tal citação se assegura na fala do chefe F: “é [gaguejo] sempre é bom avisar antes, né? Porque a gente também, a empresa (ã) precisa de uma posição, né?”. Em tais pensamentos já está embutida a ideia de pertencimento e identidade com a 87 organização, pois para os mesmos a empresa é “como sua família”, em uma relação que não se pode “faltar” com ela, mesmo em caso de doença. Freitas (2002) colabora nesse aspecto ao explicar que o imaginário17 só pode ser manifestado pelo simbólico, carregando uma capacidade de substituir posições, ver uma coisa no lugar de outra que não está lá. É exatamente nesse ponto que as empresas criam táticas para captar o imaginário dos funcionários, fazendo com que os mesmos aceitem e concordem com situações pouco saudáveis fisicamente e mentalmente. Para Chauí (1997, p. 21), “através da ideologia, são montados um imaginário e uma lógica da identidade social com a função precisa de escamotear o conflito, dissimular a dominação e ocultar a presença do particular, enquanto particular, dando-lhe a aparência do universal”. Assim, na medida em que o funcionário vai identificando-se com uma cultura organizacional repressiva, a ideologia exercida nela, mais suscetível ele estará aos aparatos de dominação. Seguindo nosso roteiro de perguntas, na questão que diz respeito ao relacionamento entre os funcionários da pista e aos do escritório. Os pontos levantados do funcionário K, “bem normal, só cruzam ali pela gente cumprimenta, nós cumprimentemo e pronto. Sobre trabalho também que as vezes eles ligam pra pergunta, pra saber de alguma coisa né, se a gente sabe, a gente responde”. A funcionária A observa que é Tranquilo, nunca tive assim, problemas maiores né. Lógico, as vezes dá uns, […]. O pessoal da pista acha que como a gente tá mais próximo deles, dos diretores, a gente tem mais vantagem, mas não é isso. Lógico que a gente é mais próximo, conversa mais logicamente né, mas não que tenha mais regalias ou alguma coisa assim. Pelo fato de a funcionária A trabalhar no escritório, mais diretamente com os diretores, a mesma consegue perceber que os demais funcionários que trabalham na pista , notam que há um tratamento diferenciado. Isso se comprova nas seguintes falas relacionadas à liberação de consultas, sendo que uma funcionária trabalha no escritório/administrativo e o outro trabalha na pista. Funcionária P: “bem tranquilo, na verdade a gente só avisa a direção, a gente nem questiona 'ah eu posso tal dia?' É mais comum avisar no dia […]. Nunca houve problema em ter que tá avisando uma semana antes”. E o funcionário K responde: “avisa o gerente daí, 17 O imaginário é o espaço da representação, das formas, e das imagens, a partir do qual é possível conceber o projeto, o desejo, a fantasia, o sonho de construir a si mesmo e o mundo. (FREITAS, 2002, p. 54). 88 avisa o gerente que tu vai fazer uma consulta e depois só trazer um atestado, deu. Avisa uns 3 ou quatro dias antes”. No que se refere à consciência que os trabalhadores possuem sobre uma hierarquia de poder de decisão na empresa, observamos que para a funcionária H isso é nítido: “Se alguém tem um poder maior [pausa]. Sim, eu acho que aqui o poder tá bem, tá bem centralizado, né! Assim, eu… Tudo que acontece aqui o aval tem que ser, positivo ou negativo do dono da empresa”. E o funcionário I: “[pausa] hum, acho que tem que ter sim, mas pra mim é ele, como ele é o gerente né, ele é o encarregado da turma, do pessoal. Se ele tipo, não achar tava bom, tem que ser do jeito dele. Então é ele que manda”. O mesmo ocorre com a funcionária D: “Quem tem que decidir é o dono, né”! O chefe B, entende que: Sim, eu acredito que sim, eles “sabe” que acima deles tem o gerente, que no caso sou eu, depois tem o coordenador, que é o funcionário X e aí sim tem os “patrão”, então tem toda uma burocracia né, então, todos eles tão consciente que quem decide, problema na pista quem decide é o gerente, mas coisas mais “grave” é passado para a diretoria da empresa, mas eles têm consciência que quem dá as “ordem” mesmo são os superiores. Constatamos, nos casos dos funcionários, que eles sabem da existência de poder de decisão, evidenciado na resposta dos últimos funcionários, por pensarem que quem tem a palavra final são o gerente ou o dono. Os mesmos já interiorizaram o papel de subordinação, que é confirmado com a fala do chefe B: “eles têm consciência que quem dá as 'ordem' mesmo são os superiores”. Nesse sentido, Hornstein observa que “à medida que aumentam as riquezas e o poder dos que podem, sua autoestima é inflada e diminui sua estima pelos demais funcionários, a quem os que podem veem como desprovidos da substância necessária para alcançar alturas tão grandes” (2003, p. 44. Grifo do autor). Ao fato de os trabalhadores reconhecerem que quem “manda” é o chefe mesmo, também está ligado o desejo de querer ter a mesma posição do seu chefe, pois, “além dos benefícios concretos da qualidade de vida que lucro e poder geram, os executivos acumulam esses dois elementos como meio de aumentar o prestígio e o senso de valor pessoal” (2003, p. 44). Quanto à liberdade para mudar sistemas, rotinas ou sugerir coisas novas, o funcionário K, diz: “não, daí é com eles, eles que mandam né. Nós só obedecemos”. Segundo a funcionária H: “Sim, sim. Se a gente acha que tem alguma coisa deve ser mudada ou que poderia melhorar, a gente tem essa liberdade de conversar com qualquer um 89 deles. Só… Isso vai de eles quererem ou não né!”. O chefe L diz que sim, porém faz ressalvas, Olha, eu normalmente eu dou liberdade, assim claro que no final a gente vê né, mas eles, eu procuro sempre que o funcionário tenha liberdade pra dar ideia mas ele tem que [estala os dedos] fazer por merecer né, aí por exemplo, ele deu uma ideia boa, então vamos copiar. Mas se não, se o cara já não é bom exemplo tu não pode tá aceitando muita… eu penso assim, sabe. Mas no mais, beleza. O chefe F segue essa linha de raciocínio ao mencionar, Às vezes tu delega poder pra uma pessoa errada ela acaba fazendo algo errado também, né! Achando que ela está acima dos outros mas é, [ãh] a gente costuma bastante deixar eles falar e trabalhar essa parte que eles falaram trabalhar a parte boa, né? E tentar excluir, tirar da cabeça dele essa parte que não, que não vale a pena investir. Embora os funcionários K e H discordem, ambos têm consciência de que “obedecem a alguém”. Os chefes sabem que a palavra final é deles, porém nos parece que só aceitam sugestões daqueles que, segundo seu julgamento, “fazem por merecer”. Sólio (2010), esclarece que a busca pelo poder é intrínseca ao ser humano, e no mundo do trabalho ela está relacionada ao instinto de sobrevivência, de luta por espaço. Porém, o que acontece é que algumas pessoas possuem mais habilidade em expressá-la e praticá-la, porque isso depende muito das vivências particulares, psicológicas e culturais do sujeito. “Para alguns, ser chefe significa ser responsável por controlar os escalões inferiores da hierarquia” (HORNSTEIN, 2003, p. 56). Assim, ele se afirma superior aos funcionários, e em uma situação que muitas vezes acaba abafando a voz do funcionário, que possivelmente essa ação poderá danificar o bem estar do funcionário. Dar o direito da fala ao funcionário, amplia a teia de ideia, diminuindo o poder centralizado, distribuindo aos demais (HORNSTEIN, 2003). O excesso de rotatividade é unanimidade entre os entrevistados. Em sua grande maioria, os apontamentos feitos que justificam o elevado número de funcionários que não ficam muito tempo na empresa se devem ao fato de se ter que trabalhar nos finais de semana. Segundo a funcionária P: Sim, olha eu vou te dizer [...] 2012 e 2013 foi bem tranquilo. Agora com essa crise que na minha cabeça pensei, bom agora o pessoal vai se fixar, não, tá pior, a minha rotatividade aumentou assim 20 a 30% eu diria falando que aumentou, eu não sei o que que acontece. As pessoas estão cada vez mais exigentes né, querem escolher o trabalho, por mais que estejam em crise, elas querem escolher o trabalho. Se ainda 90 tem uma oportunidade que me permita ir de segunda a sexta, eu prefiro essa oportunidade de segunda a sexta. O chefe B: acredita que é mais “os” final de semana, principalmente quando é guri solteiro, que aí gosta festa em final de semana. Quanto, quando pega, tipo, já pessoas “casada” com família, não têm muitos problemas, gurizada mais é problema de fina de semana, aí acaba trocando muito. Mas o funcionário K, além de apontar a questão do final de semana, acrescenta que: horário é puxado né! Já aconteceu comigo pela má comunicação lá na 5 também. Comecei a trabalhar lá e eu trabalhava com o chefe K, que é gerente. Daí o primeiro mês ele queria me bota pra rua porque eu não fazia as coisa, mas como que eu ia fazer as coisa se ele não me ensinava as coisa, nunca me ensino, daí não (pausa). Daí ele saiu de férias e foi o chefe F pra lá, daí o chefe viu que eu trabalhava né, começou a me dizer o que eu tinha que fazer, eu nunca tinha trabalhado em posto, daí me mando pra matriz e tô até hoje. A funcionária H, no final da sua fala, também lembra da questão do horário ao dizer: Eu acredito que o que conte bastante é a família que não… não se acostuma com a ideia de, de trabalhar final de semana, sábado e domingo. Acho que esse é um dos pontos principais… e os horários né. [pausa] Começa cedo de manhã, vai até as nove e vinte da noite… Acho que isso influencia bastante. Começa cedo de manhã, vai até as nove e vinte da noite… Acho que isso influencia bastante. No decorrer do trabalho observamos que é frequente o trabalhador tomar para si falas que não são suas, falas que são projetadas por seus chefes e superiores. Isso conforta de certa forma para o funcionário não se sentir inferior, ele replica frases já normatizadas e formalizadas. Nessa linha de pensamento, Chauí (1997) fala que o discurso competente 18 é um discurso instituído, sendo que não é um discurso iniciado ou incipiente e que justamente por ser respaldado, sua função é de ocultar e “existência real de dominação” (p. 11). Orlandi (2010) acredita ser importante indagar, questionar as formas de perceber, interpretar as diferentes expressões de linguagem; pois o discurso é assim, “palavra em movimento, prática de linguagem. […]. Procura-se compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico, parte do trabalho social geral, constitutivo do homem e da sua 18 O discurso competente é aquele que pode ser proferido, ouvido e aceito como verdadeiro ou autorizado. (CHAUÍ, 1997, p. 7). 91 história” (p. 15). Verificamos a presença marcante de submissão por grande parte dos funcionários, que não identificam tal característica, pelo fato de o discurso empregado na empresa já estar personificado e cristalizado (internalizado), principalmente por funcionários com mais tempo de casa. A ausência de linearidade e coerência na comunicação é um aspecto que se evidencia e acaba resultando num modo de trabalho confuso e contraditório. Analisamos, também, em diferentes situações, que a prática é contraditória à fala dos gestores. A análise do material colhido em campo permite-nos, a partir daqui, traçar algumas reflexões importantes para o trabalho. 6.2 O DIAGNÓSTICO Kunsch (1986) verifica que na área de Relações Públicas, o diagnóstico torna-se um passo muito importante, sendo que “após o levantamento e a obtenção de informações, temos que determinar quais as áreas em dificuldades, os problemas ou as situações problemas que estão afetando o conceito e o posicionamento da organização” (p.83). Acreditamos ser fundamental para o profissional que produz e conduz a comunicação organizacional não somente identificar problemas, como também propor alternativas que melhor possam contribuir para uma comunicação mais horizontal no ambiente de trabalho. Com base na análise das entrevistas, apontaremos os aspectos que foram identificados na empresa estudada e tentaremos sugerir, apresentar ações que acreditamos que condizem com a atuação do profissional de Relações Públicas, seja no ambiente público ou privado. De nada adianta detectar, expor os dados, os problemas na área da comunicação, “se não lhes for dada a interpretação e a apreciação devida. É a transformação dos dados em informações utilizáveis” (KUNSCH, 1986, p. 83). No sentido de facilitar a análise, dividimos as observações levantadas em sintonia com as categorias levantadas para o estudo do tema. 6.2.1 Poder No que diz respeito ao poder, é possível constatar que ele é praticado na empresa de modo centralizado, hegemônico, legitimado pela fala dos funcionários, carismático e 92 extremamente simbólico, tanto que alguns funcionários pensam que ele não existe. Para que esse poder seja mais pulverizado e que todos os membros da equipe possam, também, expor suas dificuldades, anseios e problemas, é necessário que haja reuniões também com os trabalhadores, e mais, que essas reuniões tenham uma periodicidade e, se possível, com ata ou documento de registro. Que esse ponto não fique apenas a cargo dos chefes, que se encontram apenas uma vez por mês “se der”, como expressou uma funcionária, e eles resolverem entre os mesmos o que pensam ser melhor para desenvolver na filial da qual são coordenadores. Que os gestores possam pensar um pouco mais nos funcionários, tendo consciência de que os direitos trabalhistas, como folga, salário, transporte, carga horária de trabalho, alimentação, entre outros, não são nenhuma benesse, muito pelo contrário, são direitos que foram adquiridos após muitos terem sofrido. Acreditar que “é bom senso” do funcionário agendar consultas somente na sua folga, não condiz com a uma cultura humanitária, que se preocupa em potencializar, otimizar a consciência do funcionário dos seus direitos como cidadãos. No que se refere aos direitos como cidadão, Peruzzo identifica três: “os civis, os políticos e os sociais” (1998, p. 286). Ou seja, o trabalhador tem de saber principalmente do seu direito civil e social, pois infelizmente, algumas organizações tendem a evidenciar, seja na fala ou por meio de algum material gráfico produzido pela ela mesma, somente aquilo que assegura seu poder e inquieta, confunde e provoca temor nos funcionários, e é por isso que muitos pensam que faltar ao trabalho quando for preciso, ou agendar consultas no período que compreende as horas de trabalho é “faltar ou falhar” com a empresa, como se fosse uma falta de respeito; e essa ideia está tão impregnada de mensagens ideológicas, presentes nos costumes, nos interesses da organização, na cultura organizacional repassada aos funcionários, que eles nem percebem, tornando tal mensagem simbólica e despropositada. Aí então, encontra-se a primordialidade e obrigação daqueles que detêm o poder viabilizar “a ampliação da cidadania que levará o homem e a mulher a serem, cada vez mais, sujeitos e não objetos da sua história” (PERUZZO, 1998, p. 287). Nesse sentido, o papel do RP é fundamental como um agente de transformação social junto à organização. Os membros da organização, de modo geral, têm de saber que não estão lá apenas para garantir e legalizar a vontade dos donos, de um desejo maior (SIMÕES, 1995). Mesmo havendo ambiguidade quanto à prática e a teoria das funções e finalidade exercidas por um profissional de RP, nada impede que quando ele detêm o poder de construir e propagar a 93 comunicação, que o faça com transparência, harmonizando interesses na luta dos contrários, do público e do privado, tendo consciência de que as vantagens não são as mesmas entre gestores e funcionários, por isso, a importância de saber lidar com essa estrutura. 6.2.2 Hierarquia Observamos que mesmo havendo hierarquia de poder de decisão, não há um organograma na empresa estudada. Talvez, por esse motivo, alguns funcionários ao serem questionados da existência de tal termo quanto à tomada de decisões, ficaram confusos. Entendemos que um organograma situa a linha mestra da comunicação na organização. Não deve, evidentemente, ser inflexível, mas, do mesmo modo, uma comunicação absolutamente informal, poderá gerar muito ruído e mal-entendidos. Assim, esse trabalho precisa ser efetivado na empresa estudada. Evidentemente, ele vai refletir a forma como o poder está instituído. Daí a importância de um trabalho de Relações Públicas no sentido de, antes de implementar o organograma, analisar com a empresa as mudanças necessárias em sua cultura e distribuição dos fluxos de poder. 6.2.3 Comunicação Observamos que a comunicação praticada na empresa é informal, os meios de comunicação utilizados como o manual de integração, a comunicação oral, o informativo trimestral e murais, não são funcionais, visto que os funcionários pouco recordaram da existência deles ou pouco lembravam o que constava em cada um deles quando questionados nas entrevistas. Acreditamos que isso se deve ao fato, também, de a empresa não possuir profissional da área da comunicação, ou um RP para melhor criação e identificação das possíveis maneiras de comunicar. Quem produz a comunicação da empresa é o departamento de RH, sendo que quem dá a palavra final daquilo que será publicado é um dos diretores. A empresa utiliza muito a comunicação oral, que no processo leva ao risco de a mensagem chegar alterada até o receptor final. Compreendemos que a comunicação organizacional diz respeito a todos os membros da equipe, visto que ela somente é possível por meio da interação social, não somente por meio de dados, informações e seus processos, 94 então. Avaliamos ser primordial a presença de um profissional da área de comunicação social para qualificar as informações institucionais entre seus públicos; organizar e planejar pesquisas de opinião pública; identificar quais os meios de comunicação que mais adaptam-se à realidade da organização e seus membros (KUNSCH, 1986). Não pretendemos dizer que esse profissional tenha que desenvolver sozinho as funções que dizem respeito à comunicação, devendo, sim trabalhar de forma integrada com as demais áreas, já que acreditamos que é dessa forma que a comunicação deve ser construída. Daí, a importância em realizar uma pesquisa de clima, perguntar ao trabalhador o que é do seu interesse saber, para que esse possa auxiliar na criação da informação, e não apenas querer saber a opinião dos que possuem poder de decisão dentro da empresa. Isso, segundo Peruzzo (1998, p. 143), ultrapassar a esfera do “'dar voz e vez', e passar a 'dar voz a quem não tem voz'”. Criar uma caixa de sugestões para que todos possam opinar, sem precisar identificar-se. Estabelecer um padrão para que todos os comunicados sejam mais formais, com relação à alteração de normas, regras, avisos, solicitações, para minimizar a possibilidade dos ruídos. São algumas das medidas importantes e urgentes a serem implementadas na empresa estudada. Criar uma comunicação participativa19 que envolva toda a equipe, contribuir consideravelmente para uma comunicação mais eficaz dentro da empresa. 6.2.4 Integração Por meio das entrevistas podemos perceber a pouca integração existente entre os funcionários não somente entre as filiais, como também os funcionários que trabalham na mesma unidade. Muitos não conhecem o quadro geral de funcionários, gerência, diretores e dono. Encerram suas atividades na empresa sem nunca terem tido contato com seus colegas de trabalho de outras filiais. A empresa somente organiza uma festa de final de ano como integração de todos os funcionários. A proposta da empresa era a de apresentar cada funcionário novo a todas as filiais, para que o mesmo conhecesse todas as unidades. Porém, isso se inviabilizou, devido à questão da “rotatividade né, onde a gente já tá sem funcionários, tu já fica a quatro dias esperando ali pra colocar e tu vai ficar mais um fazendo integração”. Nesse caso, sugerimos 19 A comunicação participativa tem sido vista como toda e qualquer forma de interferência popular dos meios. Tendo como meta, “dar voz aos que não têm”. (PERUZZO, 1998, p. 141). 95 que se realize uma integração trimestral, em função da grande rotatividade. Uma sugestão levantada pela diretora foi retomar jogos de futebol entre as unidades, o que acontecia em tempos passados. Poderia ser mais uma atividade para auxiliar na integração e participação de todos. Também seria interessante a comemoração da data de aniversário do Posto para todos os funcionários, assim como uma festa junina. Acreditamos que os funcionários também devem sugerir os cursos ou palestras de capacitação que são do seu interesse. Como a empresa já busca presentear os funcionários em datas comemorativas como: páscoa, aniversários, tempo de casa, dia dos pais e natal, as atividades sugeridas seriam desempenhadas a longo prazo, no decorrer do ano, somadas às que já ocorrem, porém de forma mais planejada, obviamente que, concomitantemente trabalhando com a comunicação. 6.2.5 Discurso A empresa possui um discurso confuso, ambíguo, e ao mesmo tempo ideológico, o que foi possível perceber na fala dos entrevistados, principalmente daqueles que possuem mais tempo de casa. Tal discurso busca a legitimidade da empresa, incutindo uma lógica de identificação dos membros envolvidos com os desejos particulares da mesma. O objetivo é os modos de pensar, dizer e ser, anulando as diferenças (CHAUÍ, 1997). A priori, as organizações buscam o reconhecimento do quadro de funcionários. Nesse sentido, seria apropriado que o discurso da organização fosse mais claro e definido, que fosse criada uma linguagem padronizada quanto à transmissão de normas, comunicados, avisos, etc, até mesmo para que as falas dos funcionários não sejam tão desalinhadas como mostraram as entrevistas. É preciso que a organização se aproprie de um discurso que evidencie o sujeito e a importância do mesmo, não somente como força de trabalho, mas também como ser humano, validando mais suas opiniões, fazendo com que ele, o sujeito, “seja chamado à existência” (Pêcheux, 1988, p. 154). Que seja permanente a relação de importância que se dá ao trabalhador, e não que seja feita somente em datas comemorativas. Evidentemente, arrolamos aqui, a título de exemplo, algumas poucas atividades de Relações Públicas. Esta etapa do trabalho tem como foco o diagnóstico, ou seja, levantar os maiores problemas detectados no campo, e não o planejamento da comunicação, que exigiria um detalhamento completo de cada possibilidade aberta. 96 Acreditamos que a análise do discurso, realizada por meio das entrevistas, foi fundamental para nos ajudar a formular uma resposta ao problema que colocamos no início deste trabalho, qual seja: saber se o discurso funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de poder em uma organização. O discurso dos entrevistados aponta, cada qual com a sua especificidade, para uma estrutura verticalizada de comunicação, através da qual se repetem e se consolidam os papéis predeterminados pelas relações de trabalho do modo de produção vigente. Ao mesmo tempo, todavia, tal estrutura comunicacional deixa entrever o espaço que poderia ser ocupado por um profissional de Relações Públicas na elaboração de uma comunicação eficaz no âmbito organizacional. Dito isso, passemos às considerações finais. 97 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS Sabendo da força que o discurso possui em qualquer tipo de relação, a base que deu início à pesquisa na esfera organizacional foi a de analisar tal discurso como estratégia nas relações de poder. Iniciamos o estudo em busca de uma resposta para o nosso problema: O discurso funciona como um instrumento para o estabelecimento de relações de poder em uma organização? O caminho percorrido para alcançarmos tal reposta, aprofundou-se por meio de conceitos e exemplos, dando início a uma pesquisa bibliográfica que embasaram a pesquisa. Inicialmente, esclarecemos o que tínhamos por desejo desenvolver ao longo da pesquisa. Em seguida, buscamos conhecer o melhor método que viria a corroborar para alcançarmos nosso objetivo, nesse caso, escolhemos desenvolver uma pesquisa qualitativa, por meio de um estudo de caso simples em uma Rede de Postos de Combustíveis. Nos apropriamos de conceitos que entrelaçam as organizações e as relações de poder existentes na mesma. Esse capítulo foi o pontapé inicial para termos mais proximidade daquilo que queríamos tratar, essencialmente no que tange às relações de trabalho e conflitos internos dos indivíduos que ao confrontarem-se com as vivências de outro sujeito incorporam posturas determinantes, que afetam seu modo de pensar e agir. No intuito de compreender como funcionava as relações de trabalho no âmbito organizacional, nos debruçamos a buscar exemplos e descrições que elucidassem melhor esse vínculo. Assim, constatamos o emaranhado de interesses que encontram-se presentes na linguagem e, que acabam ganhando força dependendo do modo que se expressar, por isso então, são introduzidas nas ações e imaginário daqueles que ocupam um espaço de dependência em relação aos que têm o direito de decisão em uma empresa. Também foi imprescindível tratarmos do funcionamento da comunicação organizacional, averiguando a importância do caminho percorrido pela mensagem, a segmentação dos públicos que compõe e interage com as organizações, bem como, o compromisso que a comunicação e profissionais que canalizam as informações à sociedade devem possuir. Nos apropriamos ainda mais da noção de poder que a comunicação concentra, tendo ela, a capacidade de emancipar ou reprimir o sujeito enquanto cidadão, lúcido da sua participação no desenvolvimento de uma sociedade mais justa. Destacamos que a construção dos capítulos baseou-se nas palavras-chave 98 “organizações”, “comunicação organizacional”, “discurso” e “poder”, as quais, ao serem aprofundadas, possibilitaram mais fundamentação para começar o estudo de campo. No que se refere à questão técnica da pesquisa, nosso objetivo geral era analisar o discurso organizacional como instrumento de controle e poder nas organizações, observando, assim, se o mesmo usa diferentes estratégias conforme deseja influenciar as pessoas e o ambiente em que está envolvido. Também definimos quatro objetivos específicos: estudar o discurso dos gestores na comunicação interna; analisar até que ponto o discurso dos funcionários se relaciona com o dos gestores; identificar o processo de comunicação organizacional exercido na empresa escolhida para desenvolver o trabalho e investigar o papel do profissional de Relações Públicas na construção de uma comunicação eficaz. Tais objetivos foram valorosos para estreitarmos a relação na busca pela resposta do problema. Algumas hipóteses foram levantadas inicialmente: o discurso organizacional é utilizado como elemento estratégico de dominação por meio da comunicação; os funcionários são influenciados pela comunicação interna; as relações de poder nas organizações, na prática, continuam reproduzindo uma trajetória descendente. Adotamos como técnica metodológica, realizar entrevistas em profundidade com os membros que constituem a empresa, tanto funcionários quanto gestores, e posteriormente a análise do discurso. Acreditamos ter alcançado nosso objetivo, pois chegamos à resposta do problema por meio da análise nas entrevistas. A primeira hipótese levantada, de que o discurso organizacional é utilizado como elemento estratégico de dominação por meio da comunicação, foi validada, pois, a linguagem, a forma de se expressar e o carisma utilizados pelos gestores acabam sendo legitimados por funcionários que se identificam e interiorizam tal discurso como sendo seu. Assim, conferem aos gestores maior poder de controle sobre os subordinados. A hipótese segundo a qual os funcionários são influenciados pela comunicação interna também foi corroborada, pois, mesmo utilizando uma comunicação informal, os funcionários tendem a acatar e seguir as normas e regras sugeridas pelos gestores, anulando até mesmo seus pontos de vista, deixando de opinar e de se manifestar para “não se prejudicarem” nas relações de trabalho. Por fim, a terceira hipótese também foi certificada. Ela dizia que as relações de poder nas organizações, na prática, continuam reproduzindo uma trajetória descendente, fato que foi 99 evidenciado na análise, pois o poder centralizado exercido na empresa segue uma estrutura hierárquica (mesmo que alguns funcionários não a reconheçam) na qual os funcionários respondem aos gerentes, os gerentes aos diretores e os diretores ao dono. Observamos, também, que, pelo fato de a cultura organizacional da empresa estar inserida nas ações, processos e procedimentos executados, alguns funcionários legitimam a necessidade de ter alguém com poder de decisão, que delegue o que deve ser feito, aceitando seu posicionamento de subordinados, em que seu poder de fala vem apenas em “último caso”. A metodologia utilizada desempenhou seu papel em contribuir para que respondêssemos à questão inicial. A pesquisa qualitativa foi essencial na composição de dados que nos auxiliassem a verificar comportamentos, interpretando o modo de se relacionar das pessoas e tendo maior proximidade com o caso investigado. A análise de discurso foi indispensável para decifrarmos as sensações, sentimentos, opiniões, entendimentos e a consciência que os funcionários tinham sobre as relações de poder da comunicação e do discurso utilizado na empresa. Assim como colaborou para notar a comunicação não-verbal existente nas falas, mas expressadas em gestos, em algumas situações, certificando a existência dos “não ditos”. Foi possível compreender, também, como o poder estabiliza, legitima e fortalece vínculos de relacionamentos entre indivíduos que, na sua grande maioria, conforme mostraram as entrevistas, acreditam ser iguais perante um discurso institucionalizado que mascara interesse particulares e os apresenta como público. Consideramos que a monografia foi de grande relevância para nosso aprendizado, proporcionando reflexões acerca da atuação dos profissionais de Relações Públicas no meio organizacional. O trabalho fez apontamentos que nem sempre são levados em consideração pela academia e que no mercado de trabalho tampouco são pautados, dado o emergente foco somente na busca de resultados priorizados pelas empresas. A pesquisa evidenciou, as estratégias de poder que podem ser praticadas nas empresas, o que facilitará aos profissionais, sejam da comunicação, ou de outras áreas, na identificação das mesmas ao inserir-se no meio organizacional, não sendo tão influenciáveis quanto as práticas desenvolvidas. O estudo revelou-se importante para visualizar aspectos que são negligenciados pela empresa, sendo que, a partir dessa pesquisa, os dados computados poderão ser utilizados como base para aperfeiçoar os processos que compreendem desde o operacional ao gerencial. É importante lembrar que, mesmo tendo alcançado um resultado satisfatório quanto ao 100 produzido, acreditamos que a busca enquanto pesquisadores não deve se limitar a esta monografia, podendo ser mais explorada, servindo de apoio para outras óticas e perspectivas, contribuindo também ao apontar outra possibilidade no modo de perceber o profissional de Relações Públicas, bem como as relações e discursos existentes nas organizações. Acreditamos que, em futuros estudos sobre o tema inicial, o pesquisador deve, inicialmente, despir-se de conceitos já formalizados e adotar um olhar mais aguçado para tentar identificar características nem sempre explicitadas em uma organização. Se a retomada desse estudo for realizada por um profissional de Relações Públicas, as exigências quanto aos pontos citados devem ser redobradas, para que não se mistifique nenhuma informação. A partir destas reflexões, então, é recomendável criar um planejamento com ações e métodos visando lapidar as estratégias da comunicação organizacional, consonante com os desejos da empresa e funcionário; não havendo uma fórmula a ser aplicada na comunicação, visto que cada organização possui uma cultura diferente e que essa se confronta e se mistura com as vivências individuais. Daí a importância de se conhecer o ambiente de trabalho antes de qualquer análise. 101 REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo.A dialética do trabalho. São Paulo: Expressão Popular, 2004. 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ANEXO – PROJETO DE PESQUISA 108 UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL ANA LÚCIA RIBAS DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL CAXIAS DO SUL 2014 UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO EM BACHARELADO EM RELAÇÕES PÚBLICAS ANA LÚCIA RIBAS DICOTOMIA ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA DA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL Projeto de Trabalho de Conclusão de Curso de Comunicação Social, habilitação em Relações Públicas, apresentado como requisito para aprovação na disciplina de Monografia I. Orientadora: Profa. Mª. Jussania Albé CAXIAS DO SUL 2014 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 04 1.1 PROCESSO DE DESCOBERTA (OPCIONAL) ................................................. 05 2 TEMA .................................................................................................................... 06 2.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA ................................................................................. 06 3 JUSTIFICATIVA..................................................................................................... 07 4 QUESTÃO NORTEADORA ................................................................................. 08 5. HIPÓTESES (quando houver) ........................................................................... 09 6. OBJETIVOS ........................................................................................................ 10 6.1 OBJETIVO GERAL ............................................................................................ 10 6.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ............................................................................. 10 7. METODOLOGIA .................................................................................................. 11 8. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................... 8.1 XXXXXXXXXX.................................................................................................... 8.2 XXXXXXXXXX.................................................................................................... 8.3 XXXXXXXXXX.................................................................................................... 8.4 XXXXXXXXXX.................................................................................................... 15 15 15 15 15 9. ROTEIRO DOS CAPÍTULOS .............................................................................. 18 10. CRONOGRAMA ................................................................................................ 19 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 20 111 1 INTRODUÇÃO O mundo do trabalho tem exigido cada vez mais da sociedade como um todo, seja quando os profissionais já estão introduzidos no mercado de trabalho ou quando estão começando a ter os primeiros contatos. Frente às metamorfoses de um mercado cada vez mais competitivo e exigente, as organizações passaram a reestruturar seus processos, buscando adequar a força de trabalho para se encaixar nesse contexto de mudanças. Para isso, muitas delas investiram seus esforços na tentativa de promover a adesão e o envolvimento dos funcionários. Foi assim que conceitos como autoridade e controle passaram a se fazer mais presentes, tornando-se muitas vezes, meios para a promoção do poder em pequenos ou grandes grupos. Nas organizações o controle pode ser exercido de diferentes formas, sendo a mais expressiva representada através do discurso implícito na própria fala, ou até mesmo nos materiais impressos utilizados pela empresa. Através do discurso organizacional é possível observar a importância do poder, que revela a atitude da empresa em relação as suas perspectivas, métodos e objetivos. De acordo com Fayol (1977, 0.129) “o controle consiste em verificar se tudo corre de acordo com o programa adotado, as ordens dadas e os princípios admitidos. Tem por objetivo assinalar as faltas e os erros, a fim de que se possa repará-los e evitar sua repetição”. A partir desta citação, é possível perceber a relevância do tema, visto que se relaciona diretamente aos processos organizacionais. Seguindo esta perspectiva, PAGÉS, apud MARCUSE, apresenta o conceito do controle social baseado na tecnologia: As formas dominantes do controle social são tecnológicas, num sentido novo. A estrutura técnica e a eficácia do aparelho de destruição e de produção têm, sem dúvida alguma, durante o período moderno, contribuído para submeter a população à atual divisão do trabalho...Hoje os controles técnicos são a própria expressão da razão, colocada a serviço de todos os grupos, de todos os interesses sociais, de modo que toda contradição parece irracional e toda oposição impossível. (1973, p. 43) 112 Conforme o autor, para compreender melhor pode-se considerar que controles técnicos refere-se a fiscalização que todos estamos submetidos diariamente. Uma analogia que pode ser considerada nesse caso vai de andar por uma rua que possui câmera até o controle em cumprir normas dentro de uma empresa, onde os empregados estão submetidos a cumprir normas de conduta. Neste contexto, podemos compreender a organização como um espaço de poder, legitimado pelo processo comunicacional. Muitas vezes, nas empresas, é possível observar a existência de um acordo subjetivo institucionalizado através das ferramentas que são utilizadas como recursos para manter a comunicação com os empregados. Em organizações que possuem uma estrutura piramidal, este fato é ainda mais perceptível pois, em muitos casos, acredita-se também, que é preciso manter o controle e o domínio para se perdurar no poder. A comunicação é a protagonista dentro de uma empresa. Pensá-la como a água que rega uma planta e que precisa ser boa, tratada, filtrada o suficiente para que a planta cresça saudável é uma boa metáfora para não se esquecer de que a comunicação não é usada somente para informar mas, principalmente, para transformar. Uma transmissão incorreta ou parcial de fatos que são de importância para todos que nela trabalham pode atrapalhar, e muito, os processos. Por isso, a participação de todos é imprescindível para sua efetividade e o bom relacionamento ao longo da história da empresa. Alcançar este objetivo não é tarefa fácil, daí a importância de contar com o apoio de um profissional de comunicação, que consiga construir uma ponte entre funcionários e gestores dentro das organizações, desenvolvendo um trabalho em conjunto com as demais áreas e mais, que esteja ciente dos direitos da empresa e, também, dos deveres que ela tem. Este profissional deve, ainda, estar atento a todas as mudanças ocorridas dentro e fora da empresa, já que a comunicação tem uma responsabilidade social. É necessário reforçar que comunicação não é somente troca de informações, principalmente quando aquilo que se transmite é suficientemente claro para o ouvinte, havendo, então, um significado comum entre as pessoas envolvidas. Buscar uma comunicação dialética com os empregados e os demais membros que 113 participam da empresa é uma maneira de tentar atender às expectativas desse organismo social. 114 2 TEMA O discurso organizacional como elemento estratégico de dominação através da comunicação. 2.1 Delimitação do tema A influência do controle no discurso organizacional como fator de poder das organizações. 115 3 JUSTIFICATIVA Observou-se a necessidade de discutir e analisar a comunicação interna nas empresas, percebendo que os recursos utilizados para compartilhar as informações nem sempre são construídos em conjunto com funcionários e demais áreas que compõem a empresa. Além disso, é necessário citar, também, o interesse da autora na busca de compreensão para o entendimento destas questões, mais especificamente, sobre os motivos que levam a gestão a utilizar-se da comunicação dominadora e controlada, como recurso de poder nas relações organizacionais. Nessa esfera, é importante discutir tais questões para tentar entender e observar como essas situações impactam a vida profissional das pessoas. 116 4 QUESTÃO NORTEADORA * Até que ponto o discurso organizacional pode ser considerado uma ferramenta de controle e dominação? 117 5 HIPÓTESES • Os funcionários são influenciados pela comunicação interna. • O discurso organizacional é utilizado como elemento estratégico de dominação através da comunicação. 118 6 OBJETIVOS 6.1 Objetivo geral Analisar o discurso organizacional como ferramenta de controle e poder nas organizações. 6.2 Objetivos específicos Avaliar o discurso dos gestores na comunicação interna. Avaliar até que ponto o discurso dos funcionários se relaciona com o dos gestores. Identificar o processo de comunicação organizacional desenvolvido na empresa x. Investigar o papel do Relações Públicas na construção de uma comunicação interna eficaz. 119 7 METODOLOGIA De acordo com Minayo (2004, p. 22), “a metodologia inclui as concepções teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a apreensão da realidade e também o potencial criativo do pesquisador”. A metodologia utiliza recursos para o desenvolvimento de análise, justificativas e embasamento de ideias no caso a ser estudado. Permite analisar os métodos que melhor identificam e qualificam um estudo, para o bom desenvolvimento do trabalho. Assim, o método nada mais é, do que um roteiro/itinerário que propicia chegar a uma resposta. O tema do estudo proposto é o discurso organizacional como elemento estratégico de dominação através da comunicação. Pretende-se, inicialmente, realizar uma pesquisa bibliográfica que, segundo Duarte e Barros pode ser entendida como: O planejamento global inicial de qualquer trabalho de pesquisa que vai desde a identificação, localização e obtenção da bibliografia pertinente sobre o assunto, até a apresentação de um texto sistematizado, onde é apresentada toda a literatura que o aluno examinou, de forma a evidenciar o entendimento dos autores, acrescido de suas próprias ideias e opiniões (2005, p. 51) De acordo com essa definição, fica evidente a necessidade de estudar autores que tratam do assunto pesquisado. A priori os autores que sustentam a pesquisa até o momento são: Pierrre Bourdieu (2001), relação do poder simbólico; Michel Pêcheux (1988), análise de discurso sobre a força da palavra e do emissor; e Cecília Peruzzo (1998, 1986), a função da comunicação inserida no atual sistema econômico. Entende-se que para responder o problema da pesquisa - Até que ponto o discurso organizacional pode ser considerado uma ferramenta de controle e dominação - é necessário definir o tipo de pesquisa utilizado. A pesquisa qualitativa se difere da quantitativa. Enquanto a primeira preocupa-se com interpretações subjetivas, a segunda tem o foco na objetividade por meio dos números. 120 Opta-se no estudo aqui proposto, a realização da pesquisa qualitativa, a qual Martinelli diz: A metodologia qualitativa, pelo fato de trabalhar em profundidade, possibilita que se compreenda a forma de vida das pessoas, não sendo apenas um inventário sobre a vida de um grupo. As técnicas utilizadas permitem, entre outras coisas, o registro do comportamento não verbal e o recebimento de informações não esperadas porque não seguem necessariamente um roteiro fechado, percebendo como bem-vindos os dados novos, não previstos anteriormente (2000, p. 39). Esse método de pesquisa permite fazer uma abordagem interpretativa do caso a ser estudado, em que se busca compreender o que é dito e o não dito. A escolha da pesquisa qualitativa justifica-se por se tratar de um estudo que “[...] lida com interpretações das realidades sociais” (BAUER; GASKELL, 2002, p. 23). Oferece a possibilidade de uma pesquisa subjetiva. Para investigação científica será realizado um Estudo de Caso em que se estrutura a partir da seleção de uma Organização da cidade de Caxias do Sul, região nordeste do estado do Rio Grande do Sul. Opta-se não divulgar o nome da empresa, pois os objetivos da pesquisa são científicos comprometidos ao avanço do conhecimento na área de Relações Públicas. A definição de como o pesquisador irá trabalhar com isso, será na segunda etapa do projeto: na monografia. Martins (2008) observa que a utilização do Estudo de Caso possibilita uma investigação profunda e intensa na unidade social definida. Trata-se de uma investigação empírica que pesquisa fenômenos dentro de seu contexto real (pesquisa naturalística), onde o pesquisador não tem controle sobre eventos e variáveis, buscando apreender a totalidade de uma situação e, criativamente, descrever, compreender e interpretar a complexidade de um caso concreto. Mediante um mergulho profundo e exaustivo em um objeto delimitado - problema da pesquisa -, o Estudo de Caso possibilita a penetração da realidade social não conseguida plenamente pela avaliação quantitativa (2008, s.p.)20. 20 Apresentação do livro Estudo de Caso: uma estratégia de pesquisa (2008). 121 Como estratégia de pesquisa será realizada entrevistas em profundidade semi-estruturadas, individuais com os gestores da organização e entrevistas em formato de focus group com os funcionários da mesma empresa. O número de entrevistados ainda será definido. De acordo com Sierra (1998 apud GODOI; MATOS, 2006) a entrevista em profundidade é uma opção de entrevista em que o produto investigado está constituído pela vida – vivências, ideologias, valores do entrevistado. Godoi e Matos (2006) constatam que existe três modelos de entrevistas qualitativas: a) entrevista conversacional livre, onde não há um roteiro de perguntas a ser seguido, e o entrevistador tem a liberdade de fazer indagações do assunto proposto interagindo mais com o entrevistado; b) entrevistas baseadas em roteiro, o entrevistador pode ajustar, elaborar e dispor as perguntas conforme seu interesse, c) entrevista padronizada aberta, que trabalha com a produção de questionários que serão distribuídos com perguntas iguais para todos os entrevistados, porém, no entanto as respostas são abertas. Define-se que nesta pesquisa as entrevistas serão conversacional livre, em que os questionamentos básicos serão realizados para os entrevistados, mas com perguntas não padronizadas quando surgir a necessidade, sempre mantendo o foco do tema. Além disso aplicaremos a técnica metodológica Análise de Discurso (AD) nos Manuais Normativos da Organização, ferramentas utilizadas de instrução de comportamento para os funcionários. A definição pela Análise de Conteúdo, especificamente da Escola Francesa (Pêcheux, 1988), fundamenta-se para ter uma pesquisa completa. O autor (1988), analisa o discurso a partir de quem o emite. Quanto mais poder o emissor possui, mais força o discurso ganha. […] O sentido de uma palavra, de uma expressão, de uma preposição, etc., não existe em si mesmo, isto é, em sua relação transparente com a literalidade do significante, mas ao contrário é determinada pelas posições ideológicas que estão em jogo no processo sócio-histórico no qual as palavras, expressões e preposições são produzidas […]. Poderíamos resumir esta tese dizendo: as palavras, expressões, preposições, etc., mudam de sentido segundo as posições sustentadas por aqueles que as empregam, o que quer dizer que elas adquirem sentido em 122 referência a essas posições, isto é, em referência às formações ideológicas […] nas quais essas posições se inscrevem (PÊCHEUX, 1988, p. 160). Os métodos serão o guia para a caminhada, com o objetivo de chegar o mais próximo possível da resposta para o problema da pesquisa. A fundamentação nos teóricos, alguns aqui já citados, possibilita descobrir novos horizontes e oportuniza adquirir um olhar mais criterioso às relações de poder presentes através da comunicação no contexto organizacional. Na medida em que o pesquisador domina as técnicas metodológicas de pesquisa, mais evidente torna-se a solução do problema. Além disso, instiga o pesquisador e fomenta outros estudantes de Relações Públicas na busca do conhecimento – por meio da pesquisa – e da análise crítica da própria profissão. 123 8 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 8.1 Pierre Bourdieu (2001) 8.2 Michel Pêcheux (1988) 8.3 Cecília Peruzzo (1986 – 1998) 124 CAPÍTULO AS ORGANIZAÇÕES E AS RELAÇÕES DE TRABALHO Ao longo dos anos o trabalho ganhou muito espaço e importância na vida das pessoas. É possível perceber esta relação na medida em que ele tende a ocupar outros ambientes, como a própria casa que, para muitos profissionais, passa a ser uma extensão do local de trabalho. Antunes nos traz uma proximidade dessa importância com que se trata o trabalho, quando diz: o trabalho é um processo entre o homem e a natureza […] Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo sua própria natureza. (2004, p. 36) Compreende-se assim, que o trabalho tornou-se essencial na vida do ser humano, porque é nele que o indivíduo visualiza a importante para a evolução profissional, que além de contribuir para seu crescimento, oportuniza o relacionamento e a troca de experiências entre os indivíduos que dela fazem parte. Por isso as empresas possuem um papel fundamental na construção ou desconstrução de todas essas mudanças que ocorreram com os empregados, não só por empregarem as pessoas mas, principalmente, porque é no trabalho que o indivíduo passa maior parte do seu tempo. As mudanças que ocorreram no mundo do trabalho têm muito a ver com as tomadas de decisões e escolhas feitas pelas opções que existiam no momento para as empresas. Para dar seguimento aos tipos de relações que permeiam o universo organizacional, é importante exemplificar o termo organização, onde Pagés coloca: A organização é um conjunto dinâmico de respostas e contradições. É realmente um sistema, mas um sistema de mediações que só pode ser compreendido pela referência à mudança das condições da população e das contradições entre os trabalhadores por um lado, a empresa e o sistema social , do outro”. (1987, p.31) 125 Essa afirmação nos faz entender que no ambiente organizacional há uma troca de favores entre a empresa e seus funcionários, pois uma parcela está lá para prestar serviços à empresa e a outra parcela está lá para oferecer tais serviços. Sabe-se que as relações são conflitivas, principalmente em um ambiente onde há a probabilidade de existir competição entre as pessoas, tem-se a necessidade de ter uma mediação, para que ambos os lados saiam satisfeitos. Sobre a mediação, Pagés (1987, p. 27) diz que: “o processo de mediação se coloca como a aliança das restrições (coerções) da empresa e os privilégios oferecidos ao indivíduo”. Ou seja, deve haver um elo que ligue os interesses dos empregados aos dos empregadores, dessa forma é possível criar um vínculo de maior credibilidade e aceitação das diferenças entre as partes. Com tais colocações pode-se perceber que dentro das organizações quando fala-se em mediação também quer tratar sobre antecipação de conflitos, antes que os conflitos individuais se expandam para o coletivo, uma preocupação constante das empresas que constituem o sistema econômico. É perceptível também, que as relações de trabalho tenham por base os interesses de todas as partes, que podem ser dos mais variados possíveis como, superação, reconhecimento profissional, realizar algum sonho, entre outros. As Relações entre gestores e empregados O ambiente organizacional é um local onde todos os desejos e medos devem ser equilibrados para haver uma harmonia no modo de se relacionar. Envolve relações de dependência financeira por parte dos empregados e a necessidade da força de trabalho dos funcionários por parte dos empresários. Toda e qualquer empresa sabe que é importante obter a confiança dos funcionários; no entanto, para assegurar que esses interesses sejam cumpridos, muitas vezes os gestores desenvolvem uma linguagem persuasiva e também coerciva para seduzir os empregados. O bom discurso dos gestores esta na construção de familiarizar-se com as necessidades dos funcionários, o que acaba estimulando os bons resultados. Como reforça Hornstein. 126 A identificação organizacional influencia muito os resultados financeiros de uma empresa [...] o sucesso corporativo está diretamente relacionado à presença de uma força de trabalho capaz de atestar que, “ no nosso trabalho, nossa opinião é levada em conta; os colegas estão comprometidos com qualidade; temos diariamente a oportunidade de fazer melhor; e há uma ligação perceptível entre o que fazemos e a missão da empresa” (2003, p. 3) Para o trabalhador, o seu serviço ganha mais valor quando reconhecida sua força de trabalho por parte da empresa, impulsionando-o a produzir sempre mais, melhor, subir de cargo e sentir-se de fato parte de algo que é essencial a vida das pessoas para sua subsistência. Fazendo uma interpretação mais profunda, é possível observar que o desejo pelo reconhecimento atinge inclusive os valores individuais, como Pagés coloca “o sucesso, a ambição, fazer carreira vão se tornar para o indivíduo os valores essenciais, pois são eles e só eles que podem preencher esta angústia do vazio: para ser reconhecido é preciso vencer” (1987, p. 135) Esse ponto que interfere a forma de pensar os valores pode tornar-se uma problemática, na medida em que o funcionário acredita fielmente que o que importa é “vencer” dentro da empresa, ao mesmo tempo ele vai perdendo outros valores como o coleguismo e empatia com o próximo, o que acaba causando desavenças no relacionamento entre colegas. É importante notar que para a empresa poder adquirir credibilidade diante do olhar dos funcionários é essencial que esta redobre sua atenção com relação a forma de administrar as opiniões dos empregados para executar projetos; pois como diz Hornstein: “as pesquisas revelam repetidamente que a confiança dos trabalhadores nos líderes se deve menos às ações para a resolução de problemas atuais ou a prevenção dos futuros e mais à visão que têm sobre a consideração que os líderes demonstram para com suas opiniões e necessidades no momento da tomada de decisões e sobre a discussão destas com a equipe” (2003, p. 85) Assim comprova-se que uma relação gestor-funcionários é mais produtiva quando há uma percepção de que a voz do funcionários está sendo ouvida por seu 127 superior. A carga de responsabilidade de uma bom relacionamento é a mesma, tanto para o empregado quanto para o gestor, pois ao mesmo tempo em que o funcionário tem que cumprir horários e tarefas designadas a ele, os gestores devem também manter pagamentos em dia e saber ser bom receptor diante das reivindicações feitas, buscando melhorias para a empresa como um todo. Por isso é tão importante o bom relacionamento dos empregados com seus superiores, pois é uma relação não só técnica e prática por lidar com a venda da força de trabalho e a compra dela; mas também afetiva, que acaba envolvendo os que estão ao redor, pois nesse relacionamento de troca de interesses, há desejos implícitos e experiências particulares, o que demanda mais tato na maneira de se criar uma comunicar pluralizada. 128 9 ROTEIRO DOS CAPÍTULOS Para melhor desenvolvimento da pesquisa, o trabalho será dividido em capítulos, segue o itinerário previsto: 1. Relações de trabalho e organizações 1.1 As relações entre gestores e empregados 1.2 Objetivos entre empregadores e funcionários. 2. O poder das organizações. 2.1 Recursos de controle dentro das organizações. 2.2 Discursos Mascarados 3. A comunicação interna 3.1 A comunicação como ferramenta de dominação 3.2 A comunicação como poder de transformação 4. Estudo de caso da empresa x 4.1 Metodologia e instrumento de pesquisa a ser aplicada 4.2 Breve história da empresa a ser estudada 4.3 Entrevista com funcionários. 4.4 Entrevista com alguns gestores 4.5 Análise do manual 4.6 Análise do resultado 4.7 A importância do Relações Públicas desenvolver uma comunicação horizontal dentro das organizações 129 10 CRONOGRAMA ATIVIDADES Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez / MESES 2014 2014 2014 2014 2014 2014 2014 2014 2014 2014 Elaboração do Projeto x Introdução da Monografia x x Primeiro Capítulo ATIVIDADES Jan / MESES 2015 Segundo Capítulo x Fev 2015 Mar 2015 Abr 2015 x x Terceiro Capítulo x Quarto Capítulo Mai 2015 Defesa x Jun 2015 x Jul 2015 x x Conclusões Revisão x x x x x x x x 130 REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho. 6º edição. São Paulo: Cortez Editora, 1999. _________. A dialética do trabalho. São Paulo: Expressão Popular, 2004. BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Tradução de Pedrinho A. Guareschi. 4. ed. Petrólis, RJ: Vozes 2002. BORDIEU, Pierre. O Poder simbólico. Tradução de Fernando Tomaz. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. DUARTE, Jorge e BARROS, Antônio – organizadores. Métodos e técnicas de pesquisa em comunicação. São Paulo – Atlas, 2005. GODOI, Chistiane Kleinubing: MATTOS, Pedro Lincolm C.P. Entrevista qualitativa: instrumento de pesquisa e evento dialógico. In: GODOI. C. K.; MELLO, Rodrigo Bandeira de.; SILVA, Anielson Barbosa da. (Orgs.). Pesquisa Qualitativa em estudos organizacionais: paradigma, estratégias e métodos. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 301-323. HORNSTEIN, Harvey A. O abuso do poder e o privilégio das organizações. São Paulo: Prentice Hall, 2003. HASSEN, Maria de Nazareth Agra, KNAUTH, Daniela Riva, et al. Pesquisa qualitativa em saúde. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2000. LAZZAROTTO, Valentim Ângelo. Pobres construtores de riqueza. 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