PRÁTICA PEDAGÓGICA EM AULAS DE MATEMÁTICA:
INTEGRAÇÃO DO LAPTOP EDUCACIONAL NO ENSINO DE
ÁLGEBRA
Fernanda Elisbão Silva de Souza
Mestranda da Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul - UFMS, [email protected]
Suely Scherer
Professora adjunta da Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul - UFMS, [email protected]
Resumo: Este texto apresenta um recorte de uma pesquisa de mestrado que se encontra em desenvolvimento
no Programa de Pós Graduação em Educação Matemática da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS). A pesquisa tem como objetivo analisar o processo de integração do laptop educacional na prática
pedagógica de um professor de matemática no ensino da álgebra do 9°ano. A pesquisa prevê a elaboração de
planejamentos de aula numa abordagem construcionista, analisar a relação do que foi planejado com o que é
desenvolvido nas aulas com o uso do laptop educacional (PROUCA) e observar as possibilidades de
integração do laptop no ensino da álgebra. Espera-se que esta pesquisa possa vir a contribuir com o trabalho
de professores que ensinam matemática e, também, com pesquisas na área de educação matemática e
tecnologias digitais. Neste artigo se discute alguns elementos do referencial teórico desta pesquisa.
Palavras-chave: Formação Continuada, Construcionismo, PROUCA.
1 CONTEXTUALIZANDO A PESQUISA
O que me levou a realizar esta pesquisa foram os estudos que realizei em minha
graduação na disciplina de prática de ensino sobre a importância de se utilizar tecnologias
digitais em salas de aulas, conhecendo suas limitações e explorando seus potenciais,
favorecendo a aprendizagem dos alunos. Também na graduação, nos estágios realizados
em minha graduação observei dificuldades dos alunos da educação básica na aprendizagem
2
em álgebra. Assim, optei por investigar o ensino e a aprendizagem de álgebra ao integrar
tecnologias digitais em aulas de matemática.
As dificuldades na aprendizagem de álgebra são discutidas por alguns
pesquisadores como Gil (2008) e Santos (2007), que identificaram que alunos apresentam
dificuldades em álgebra, na interpretação de problemas algébricos, que exigem uma
tradução da linguagem corrente para a linguagem simbólica. Os autores consideraram que
estas dificuldades são decorrentes de obstáculos como a relação entre a Álgebra e a
Aritmética, a interpretação de enunciados de problemas, e questões abertas de álgebra.
Nos PCNs identificamos a importância do ensino de álgebra. De acordo com este
documento (BRASIL, 1998, p. 115):
O estudo da Álgebra constitui um espaço bastante significativo para que o
aluno desenvolva e exercite sua capacidade de abstração e generalização,
além de lhe possibilitar a aquisição de uma poderosa ferramenta para
resolver problemas.
Ao considerar a importância de investigar possibilidades diferenciadas para o
ensino e aprendizagem da álgebra, pensamos em discutir estas possibilidades a partir do
uso de computadores, especificamente os laptops educacionais. Isto, considerando
possíveis mudanças na prática pedagógica do professor de matemática.
Os laptops educacionais são laptops distribuídos em algumas escolas públicas do
Programa um Computador por Aluno (PROUCA)1, uma iniciativa do Governo Federal.
Este programa fornece a cada estudante da educação básica, das escolas contempladas pelo
programa, um laptop. Implantado em algumas escolas do Brasil, o programa tem o intuito
de promover mudanças nas práticas pedagógicas a partir da inserção de laptops
educacionais nas salas de aulas.
A idéia de cada criança ter o seu próprio computador é bem antiga e foi
idealizada bem antes da existência dos microcomputadores. Ela foi
proposta por Alan Kay, em 1968, após ter visitado Seymour Papert no
Massachusetts Institute of Technology (MIT), quando este pesquisador
1
O Programa Um Computador por Aluno - PROUCA tem como objetivo ser um projeto Educacional
utilizando tecnologia, inclusão digital e adensamento da cadeia produtiva comercial no Brasil. O programa
foi estruturado pelo MEC, de modo a se integrar aos planos e projetos educacionais de tecnologia
educacional. (www.uca.gov.br)
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estava iniciando seu trabalho com o Logo. (ALMEIDA; VALENTE,
2011, p. 63)
Assim, muda o cenário, os computadores não estão apenas nas salas de
informática das escolas contempladas com o programa, mas nas mãos dos alunos em
diferentes espaços da escola.
Pesquisas como a de Almeida (2009) apontam que as tecnologias inseridas em
sala de aula, como o laptop educacional, dão possibilidades de mudanças na prática
pedagógica de professores, seja na organização do trabalho docente, no planejamento e no
novo papel docente, ou na mudança no trabalho docente. Isto porque eles se encontram em
um novo ambiente de ensino e de aprendizagem.
No entanto, é importante destacar que, não basta inserir as tecnologias digitais no
ambiente da sala de aula, é necessário integrá-las ao processo de ensino e de aprendizagem.
Neste sentido, “ [...] integrar um novo instrumento em sala de aula implica em mudanças
pedagógicas, mudanças do ponto de vista da visão de ensino, que devem ser estudadas e
consideradas pelos professores”. (BITTAR, 2004, p. 5).
Desse modo, acreditamos que a tecnologia digital além de inserida deve ser
integrada na prática pedagógica do professor, possibilitando que os alunos tenham papel
ativo em suas construções, favorecendo a aprendizagem.
Sabe-se que as tecnologias digitais, como os laptops educacionais, estão sendo
inseridas em sala de aula em algumas escolas públicas, mas é necessário integrá-las. Ao
integrar o laptop educacional na prática pedagógica de um professor, este deverá fazer uso
desse instrumento no processo de ensino, pensado na perspectiva da aprendizagem. Desse
modo, torna-se importante a identificação de dificuldades encontradas pelo professor no
processo de integração. Afinal, as dificuldades neste processo podem inibir a utilização do
laptop educacional, assim elas devem ser estudadas a fim de encontrar elementos para sua
superação.
O foco de nossa pesquisa está na integração do laptop educacional na prática
pedagógica do professor de matemática, ao ensinar álgebra. Outros pesquisadores já
investigaram questões relativas ao uso de tecnologias digitais no ensino de álgebra, mas
pouco foi investigado sobre a integração destas tecnologias ao longo de um processo de
estudos nesta área, da educação básica.
Uma pesquisa que citamos é a de Bittar (2004). A pesquisadora realizou uma
pesquisa com duas turmas do 9° ano de uma escola de Campo Grande/MS, com o uso do
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software Aplusix, que teve como objetivo investigar como a professora utiliza o software
em sua prática. Os alunos apresentavam dificuldades em equação do primeiro grau
(álgebra), assim foi decidido trabalhar com esse software por ele possuir atividades que
envolvem este conceito, e por obter retroações aos alunos, de modo que quando o aluno
errar, ele possa refletir sobre suas ações tentando superar suas dificuldades, refazendo
assim o procedimento.
Observou-se nesta pesquisa que alguns alunos ficaram mais motivados,
interagiram com o software, de modo que se tornaram mais autônomos a cada sessão que
se passava, superando algumas dificuldades. A professora teve o papel de auxiliá-los no
desenvolvimento das atividades, decidindo quais destas os alunos deveriam resolver.
Assim, consideramos que os softwares educacionais podem contribuir para a
aprendizagem dos alunos, desde que o professor tenha formação para o uso dessas
tecnologias.
A intervenção do professor é fundamental nos momentos em que o
aprendiz não consegue progredir ou nos momentos de ser desafiado a
procurar novas situações e, assim, ter a chance de dar saltos de qualidade
no seu trabalho. (ALMEIDA; VALENTE, 2011, p. 74)
Neste contexto, o computador deve ser utilizado como uma máquina a ser
ensinada, em que o aluno o usa para construir conhecimento em uma abordagem
construcionista (PAPERT, 2008). Nesse processo de construção de conhecimento do
aluno, o professor age como mediador intervindo sobre as ações dos alunos. Mas, para isto
é necessário ter conhecimento do uso de softwares no processo de aprendizagem dos
alunos.
Uma alternativa para a formação de professores é a formação em serviço. Desse
modo, os professores podem analisar suas dificuldades ao mesmo tempo em que lecionam,
fazendo reflexões sobre sua prática pedagógica, aprendendo com/na prática na escola.
Almeida e Prado (2007) realizaram uma pesquisa com a formação de professores
e constataram que os professores precisam estar envolvidos na formação, para que assim
possam refletir e compreender esse processo de integração, de forma que reconstruam suas
práticas.
5
Neste contexto, estamos investigando a problemática de pesquisa: Quais as
possibilidades de integração do laptop educacional no ensino da álgebra, no 9º ano do
Ensino Fundamental?
2 CONSTRUCIONISMO, CICLO DE AÇÕES E ESPIRAL DE APRENDIZAGEM
No desenvolvimento da pesquisa estamos usando estudos realizados por Papert
(2008), sobre a abordagem construcionista, e de Valente (2005), sobre o ciclo de ações e a
espiral de aprendizagem.
Papert (1986) defende que na construção de conhecimento com o uso do
computador, o aprendiz constrói algo por meio do fazer, ou seja, do “colocar a mão na
massa”. Para este autor, os alunos com o uso do computador constroem conhecimentos,
tendo papel ativo no processo de aprendizagem, e, consequentemente, fazem reflexões
sobre suas formulações. Os alunos constroem objetos de seu interesse, por esta razão se
envolvem na atividade.
Valente (2005) apresenta diferenças do construtivismo de Piaget para o
construcionismo de Papert. A diferença está no fato de que na abordagem construcionista o
aprendiz aprende em interação com o computador. Nesta abordagem, as tecnologias
digitais são:
[...] integradas na atividade como elementos de mediação da interação do
aluno com o conhecimento, com suas próprias ideias expressas na tela e
com as informações disponíveis em distintas fontes e representadas por
meio de múltiplas linguagens. (ALMEIDA; VALENTE, 2011, p. 8)
Nesta abordagem, a aprendizagem ocorre a partir do ciclo de ações, que consiste
no ciclo de ações de descrição, execução, reflexão e depuração (VALENTE, 2005). Essas
ações do aluno são mediadas por um agente de aprendizagem, o professor, que intervém de
modo a contribuir para a construção do conhecimento do aluno.
O ciclo de ações ocorre na interação do aprendiz com o computador. Não basta
colocarmos o aluno diante do mesmo, é necessário que o professor crie condições para que
o aprendiz, por meio de uma linguagem de programação ou de um software educacional,
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descreva os passos a serem executados pelo computador na resolução de um problema.
Este realiza e reproduz na tela um resultado de acordo com o que foi descrito. Assim,
diante da resposta que o computador fornece, o aprendiz poderá refletir. A partir da
reflexão, o aprendiz depura a descrição realizada anteriormente para o computador, e envia
nova descrição, iniciando um novo ciclo. Essas ações não necessariamente ocorrem na
ordem que foi descrita, podendo ocorrer simultaneamente.
A cada novo ciclo, considera-se que um novo conhecimento foi incorporado,
assim Valente (2005) afirma que se estabelece uma espiral de aprendizagem. A espiral de
aprendizagem cresce a cada momento que se fecha um ciclo, e um novo inicia. Por mais
que não alcancem os resultados esperados, houve um desequilíbrio cognitivo, e os
conhecimentos do aprendiz não são mais os mesmos. Como afirma Valente (2005, p. 66):
A cada ciclo completado, as ideias do aprendiz deveriam estar em um
patamar superior do ponto de vista conceitual. Mesmo errando e não
atingindo um resultado de sucesso, o aprendiz deveria estar obtendo
informações que são úteis na construção de conhecimento. Na verdade,
terminado um ciclo, o pensamento não deveria ser exatamente igual ao
que se encontrava no início da realização desse ciclo. Assim, a idéia mais
adequada para explicar o processo mental dessa aprendizagem, era a de
uma espiral.
O ciclo de ações e a espiral de aprendizagem podem ocorrer simultaneamente. E o
professor pode contribuir para a manutenção do ciclo de ações e espiral de aprendizagem
dos alunos.
Em relação à formação dos professores, “[...] é necessário que os professores
desenvolvam a habilidade de beneficiarem-se da presença de computadores e de levarem
esse benefício para seus alunos”. (PAPERT, 2008, p. 79).
É um desafio preparar professores que adotem esta prática de integração de
computadores ou laptops em sala de aula. Ou seja, é um desafio formar professores que
atuem de modo a possibilitar que os alunos sejam construtores de suas próprias ações, que
mantenham o seu ciclo de ações e a espiral de aprendizagem. E é com este desafio que
estamos trabalhando na pesquisa. Outro desafio é pensar em como integrar o laptop na
prática de um professor de matemática, especialmente no ensino da álgebra.
3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
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Acreditamos que o desenvolvimento dessa pesquisa contribuirá com propostas de
formação de professores de matemática, com vistas à integração do laptop em suas aulas,
especificamente no estudo da álgebra. De modo geral, espera-se que esta pesquisa possa
contribuir com o trabalho de professores de matemática na escola, de forma mudar práticas
a partir da integração de tecnologias digitais em suas aulas focadas no ensino e na
aprendizagem de álgebra.
Neste artigo apresentamos um pequeno recorte dos estudos que estamos
realizando. O trabalho com um professor, ainda não iniciou, estamos nos estudos de
referencial teórico. O caminho por seguir está na escolha do professor, considerando que
ele deva trabalhar numa escola que faça parte do projeto PROUCA. A partir desta escolha,
iniciaremos os trabalhos voltados à prática de integração, com estudos e planejamentos de
atividades, em uma abordagem construcionista, sobre conteúdos da álgebra, para uma
turma em que o professor atua.
Durante a realização das aulas ministradas pelo professor, iremos observar as
aulas, para comparar e analisar a relação existente entre as aulas planejadas com as
realizadas utilizando o laptop. Nessas observações, será analisada a abordagem do
professor e se esta possibilita que os alunos realizem o ciclo de ações e a espiral de
aprendizagem, observando indícios de integração de tecnologias digitais.
Pretende-se a cada planejamento de aula construído pelo professor com a
pesquisadora, e a cada aula ministrada por ele, identificar dificuldades e potencialidades da
abordagem construcionista, de maneira a favorecer a construção de conhecimentos de
álgebra pelos alunos.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini de; VALENTE, José Armando. Tecnologias e
currículo: trajetórias convergentes ou divergentes? São Paulo: Paulus, 2011.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: matemática. Secretaria da Educação
Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BITTAR, Marilena. A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do
professor: estudo de alguns exemplos da Matemática, 2007. (Apresentação de
Trabalho/Conferência ou palestra).
8
FREIRE, Karine Xavier. UCA: Um computador por aluno e os impactos sociais e
pedagógicos. 2009. (Apresentação de trabalho/Congresso).
GIL, Katia Henn. Reflexões sobre as dificuldades dos alunos na aprendizagem de
álgebra. – Tese (Livre-Docência), Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Porto Alegre, 2008.118 f.
Ministério da Educação e Secretaria de Educação a Distância. Programa um computador
por aluno (PROUCA). Disponível em:
<http://www.uca.gov.br/institucional/downloads/workshop3_VisaoGeral.pdf. Acesso em
25/05/2012>.
PAPERT, Seymour. A máquina das crianças: repensando a escola na era da
informática; tradução Sandra Costa. – ed. rev. -- Porto Alegre: Artmed, 2008. 224 p.; 23
cm.
PAPERT, Seymour. (1986) Constructionism: A New Opportunity for Elementary
Science Education. A proposal to the National Science Foundation, Massachusetts
Institute of Technology, Media Laboratory, Epistemology and Learning Group,
Cambridge, Massachusetts.
VALENTE, José Armando. Espiral da espiral de aprendizagem: o processo de
compreensão do papel das tecnologias de informação e comunicação na educação.
Tese (Livre-Docência), Universidade estadual de Campinas, São Paulo, 2005.
VIOLA DOS SANTOS, João Ricardo. O que alunos da escola básica mostram saber
por meio de sua produção escrita em matemática. – Tese (Livre-Docência),
Universidade Estadual de Londrina, Londrina, PR, 2007.
WECKELMANN, Valéria Faria; ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini de. O Uso do
Computador Portátil na Sala de Aula: Indícios de Mudança na Prática Pedagógica.
In: Vi Conferência Internacional de TIC na Educação - Challenges 2009, 2009, Braga.
Actas da Vi Conferência Internacional de TIC na Educação. Braga: Universidade do
Minho, Centro de Competência, 2009. p. 823-834.
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integração do laptop educacional no ensino de álgebra