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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ
FACULDADE CEARENSE - FAC
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
VIVIANE ANDRÉ LIMA
ASSISTÊNCIA SOCIAL E GÊNERO: UM ESTUDO SOBRE A
REALIDADE SOCIAL DAS MULHERES CHEFES DE FAMÍLIA
BENEFICIÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA
ACOMPANHADAS PELO CRAS JEREISSATI, EM MARACANAÚ-CE.
FORTALEZA - CE
2014
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VIVIANE ANDRE LIMA
ASSISTÊNCIA SOCIAL E GÊNERO: UM ESTUDO SOBRE A
REALIDADE SOCIAL DAS MULHERES CHEFES DE FAMÍLIA
BENEFICIÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA
ACOMPANHADAS PELO CRAS JEREISSATI, EM MARACANAÚ-CE.
Monografia submetida à aprovação da
Coordenação do Curso de Serviço Social
do Centro de Ensino Superior do Ceará,
como requisito parcial para obtenção do
grau de Graduação.
Orientadora: Ms. Luciana Sátiro Silva
FORTALEZA
2014
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4
À Deus e à minha filha, Maria Laura, meus
motivos pra viver e inspirações pra lutar.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus por me dar a vida, e por me permitir chegar
até a etapa final deste curso, que foi tão difícil, mas posso dizer que venci.
A minha mãe que de maneira muito peculiar sempre esteve ao meu lado me
incentivando a não desistir.
Ao meu esposo que por tantas vezes escutou minhas reclamações referente
às dificuldades do curso e ao final de todas as conversas de forma paciente me dizia
para lembra o porquê de minha escolha ao fazer Serviço Social.
A minha orientadora, Luciana que sempre esteve disposta a compartilhar
seu conhecimento para explicar minhas dúvidas, e com certeza foi uma pessoa
enviada por Deus.
As minhas grandes amigas Claudiane Cavalcante que sempre dividiu
comigo suas angustias e Norma Soely que além de amiga é um exemplo de mulher
e pessoa humana.
As Assistentes Sociais com quem tive o imenso prazer de conviver durante
meu estagio obrigatório: Carla Menezes, Mayara Paulo Medeiros, Ana Caroline
Freire Froes, Josabete Cacau, Rebeca Carvalho, Meline Silva, Carolina Castelo
Branco, obrigada pelos ensinamentos.
E a minha banca composta por Ivna de Oliveira Nunes e Samara Hipólito da
Conceição, muito obrigado pelas contribuições que com certeza foram muito
pertinentes.
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Tudo Bem
Já não tenho dedos pra contar
De quantos barrancos despenquei
E quantas pedras me atiraram
Ou quantas atirei
Tanta farpa, tanta mentira
Tanta falta do que dizer
Nem sempre é só easy se viver
Hoje eu não consigo mais me lembrar
De quantas janelas me atirei
E quanto rastro de incompreensão
Eu já deixei
Tantos bons quantos maus motivos
Tantas vezes desilusão
Quase nunca a vida é um balão
Mas o teu amor me cura
De uma loucura qualquer
É encostar no teu peito
E se isso foi algum defeito
Por mim tudo bem.
(Lulu Santos)
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RESUMO
A presente pesquisa teve como objetivo analisar a realidade social das mulheres
chefes de família beneficiárias do Programa Bolsa Família acompanhadas pelo Cras
Jereissati, em Maracanaú-CE. Destacamos as mudanças atuais ocorridas no seio
das famílias, bem como, os conflitos vivenciados pelos papéis sociais desenvolvidos
pela sociedade, principalmente no que se refere às mulheres chefes de família,
principais responsáveis pela gestão dos recursos provenientes do Programa Bolsa
Família em nome de suas família. Quanto à metodologia utilizada, optamos pela
pesquisa de natureza qualitativa, utilizando como principal técnica de coleta de
informações a entrevista semi-estruturada com cinco mulheres acompanhadas pelo
Cras Jereissati I. A análise dos dados revela que o Programa Bolsa Família está
focado nas famílias em extrema pobreza e limita-se a garantir um mínimo em termos
monetários, insuficiente para atender as necessidades básicas e com uma frágil
articulação com as demais ações das políticas sociais setoriais. Ademais, possibilita
a reprodução da responsabilidade feminina no lar para sociedade. Percebemos que
a pesquisa tem sua importância na possibilidade de contribuir para reflexão, debate
e apresentação do cenário atual do Programa Bolsa Família deste município, em
interface a percepção das mulheres chefes de famílias sobre o papel da mulher
nesse Programa no intuito de apresentar as possibilidades e desafios ao analisar a
política de Assistência Social na sua tentativa de se constituir como direito social
mediante programas de transferência de renda na contemporaneidade.
Palavras-chaves: Assistência Social. Família. Gênero. Programa Bolsa Família.
8
ABSTRACT
This research aims to analyze the social reality of women heads of family
beneficiaries of the Bolsa Família Program accompanied by Cras Jereissati in
Marazion-EC. We highlight the current changes within families, as well as the
conflicts experienced by social roles developed by the company especially in regard
to women heads of major family responsible for managing resources from the Bolsa
Família Program on behalf of his family. Regarding methodology, we chose
qualitative research, using as the main technique of gathering information, the semistructured interviews with five women accompanied by Cras Jereissati I. Data
analysis reveals that the Bolsa Família Program is focused on families in extreme
poverty and is limited to ensure a minimum in monetary terms, insufficient to meet
basic and a weak linkage with other actions of the sectoral social policies needs.
Moreover, it enables the reproduction of female responsibility to society at home. We
realize that research has its importance in the possibility of fostering reflection,
discussion and presentation of the current scenario of the Bolsa Família Program
interface with families and the role of women in this program from the perspective of
experience of this municipality, in order to present the possibilities and challenges of
social Assistance attempt to constitute itself as a social right nowadays.
Keywords: Social Assistance. Family. Genre. Bolsa Família Program.
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LISTA DE SIGLAS
AI - Ato Institucional
CADÚNICO - Cadastro Único
CCI - Centro de Convivência do Idoso
CNAS - Conselho Nacional de Assistência Social
CNSS – Conselho Nacional de Serviço Social
CF 88 – Constituição Federal de 1988
CRAS – Centro de Referencia de Assistência Social
CREAS – Centro de Referencia Especializado de Assistência Social
GESUAS - Gestão da informação da Assistência Social
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LBA - Legião Brasileira de Assistência
LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social
MDS - Ministério de Desenvolvimento e Combate a Fome
NASF - Núcleos de Apoio à Saúde da Família
NOB - Norma Operacional Básica
OIT - Organização Internacional do Trabalho
PAIF - Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família
PBF – Programa Bolsa Família
PROJOVEM - Programa Nacional de Inclusão de Jovens
PRONATEC - Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego
PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNAS - Política Nacional de Assistência Social
PTR - Programas de Transferência de Renda
SUAS - Sistema Único de Assistência Social
SASC - Secretaria de Assistência Social
SUDENE - Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
SCFV - Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .....................................................................................................12
2. CAMINHOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ................................................19
2.1 Vivencias e reflexões do caminho percorrido na construção da pesquisa...........19
2.2 Cenários da investigação.....................................................................................27
3. FAMÍLIA: QUAL O PAPEL DA MULHER NESTA COMPLEXA INSTITUIÇÃO
SOCIAL?....................................................................................................................30
3.1 Conceituando a categoria família: olhares sobre as mudanças nas famílias na
contemporaneidade....................................................................................................30
3.2 As relações de gênero como reflexo das relações desiguais entre homens e
mulheres.....................................................................................................................35
4. A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA......................................43
4.1 Uma breve contextualização dos cenários políticos e o histórico da política de
assistência social no Brasil .......................................................................................43
4.2 Instrumentos normativos: o que aconteceu com a Assistência Social brasileira
após 1988?.................................................................................................................47
4.3 O Sistema Único da Assistência Social-SUAS e a centralidade da família na
Assistência Social brasileira.......................................................................................57
4.4 Programas de Transferência de Renda e o Programa Bolsa Família:
possibilidades e contradições.....................................................................................59
4.5 A política de Assistência Social em Maracanaú-CE e o acompanhamento familiar
das mulheres chefes de família..................................................................................63
5. O ESTUDO SOBRE A REALIDADE SOCIAL DAS MULHERES CHEFES DE
FAMÍLIAS BENEFICÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA ACOMPANHADAS
PELO CRAS JEREISSATI EM MARACANAÚ-CE...................................................67
5.1 O perfil socioeconômico das mulheres interlocutoras dessa pesquisa................67
5.2 Análise do Programa Bolsa Família e a vidas das mulheres chefes de famílias do
Cras Jereissati em Maracanaú-CE.............................................................................69
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CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................79
REFERÊNCIAS..........................................................................................................82
APÊNDICE A.............................................................................................................85
APÊNDICE B.............................................................................................................87
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1. INTRODUÇÃO
O caminho da pesquisa é sempre desafiador e instigante, sobretudo na área
social, na qual se estuda as relações sociais, econômicas, políticas e culturais. É,
pois, uma caminhada desafiadora e cheia de surpresas que causam impactos
diretos no modo de agir, pensar e refletir sobre os fatos sociais e tem como objetivo
acompanhar o movimento dinâmico, contraditório e complexo do real.
A interação do pesquisador com o sujeito da pesquisa é uma relação de
muita atenção, o que exige minúcia nos detalhes que envolvem a aproximação com
a realidade. É possível que aconteça do universo do primeiro não faça parte do
cotidiano do segundo, pois estes podem viver em territórios diferentes, com modos
distintos de pensar e agir, o que torna ainda mais interessante e desafiadora a
pesquisa.
Articulando a estrutura social vivenciada na cena contemporânea, o modo de
produção capitalista é um modelo econômico em que os meios de produção e
acumulação se dão pela utilização da exploração da força de trabalho, sendo este, o
chão histórico que cimenta todas as relações sociais, culturais, políticas, ambientais
etc., que desenham a ideologia da sociedade atual.
É percebendo as contradições dessa sociedade que propomos com esta
pesquisa fazer uma reflexão crítica sobre a realidade em que a sociedade brasileira
está inserida, marcada por profundas desigualdades sociais.
Esse sistema econômico se fundamenta no reconhecimento dos direitos
individuais, do favorecimento da propriedade privada, das relações individualistas,
consumistas e formadora das desigualdades sociais e do pauperismo, a partir da
apropriação da riqueza socialmente produzida por uma determinada classe, a
burguesa. É formadora de desigualdades sociais, na medida em que, institui o
trabalhador assalariado que vende a sua força de trabalho ao burguês, com o
objetivo de gerar mais acumulação, sendo esta mediada pela exploração desse
trabalho.
Utiliza-se da atuação do Estado como mediador e legislador político entre as
classes no desenvolvimento de todas as ações sociais reprodutoras do ideal da
classe dominante, adentrando neste rol, as políticas sociais.
13
Esse trabalho estabelece uma relação entre a política de assistência social
brasileira analisando a sua importância inicial enquanto politica conservadora com
viés caritativo e de benesse até se estabelecer como uma política pública de direitos
sociais e dever do Estado na sua árdua e lenta busca pela sua efetivação após
aprovação de seus principais documentos legais:
Constituição Federal – CF de
1988 e pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS de 1993 e a Política
Nacional de Assistência Social -PNAS de 2004 e a Norma Operacional Básica de
2005 com a criação do Sistema Único de Assistência Social-SUAS.
Delimitando essa discussão, no ano de 1988, com a promulgação da
Constituição Federal, a Assistência Social passou a compor o tripé da Seguridade
Social como direito, juntamente com as politicas de Saúde e Previdência Social.
Dessa forma, o que até então era entendida pelo Estado e pela sociedade como
favor, filantropia e caridade, direcionada aos pobres e doentes, somente após a
Constituição Federal que esta passa a ser reconhecida legalmente como direito do
cidadão.
A Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS foi aprovada no ano de 1993, e
com ela, demarcou-se avanços no que se refere ao estabelecimento de objetivos,
princípios e diretrizes dessa politica em todo o território nacional, bem como com a
garantia de um sistema descentralizado e participativo nas três esferas de governo,
desenhado pela existência dos fundos, conselhos e planos. A LOAS inaugura uma
nova era para a assistência social brasileira.
Dez anos após a LOAS, a IV Conferência de Assistência Social no ano de
2003 definiu a implantação do Sistema Único de Assistência Social – SUAS. Nos
anos seguintes, com a criação do Ministério de Desenvolvimento e Combate a Fome
– MDS, o SUAS passou a articular recursos e meios para a execução de programas,
serviços e benefícios socioassistenciais e suas ações passaram a serem baseadas
nas orientações da nova Politica Nacional de Assistência Social – PNAS, aprovada
no mesmo ano pelo Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS.
Entre os anos de 2001 e 2002 foram implementados os primeiros programas
federais de transferência de renda no Brasil: Auxílio Gás, Bolsa Alimentação, Bolsa
Escola e Cartão Alimentação. E no ano de 2003, todos esses programas foram
unificados para a criação do Programa Bolsa Família (PBF).
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O PBF é o maior programa de transferência direta de renda do Brasil. Do
ponto de vista social, tem provocado grandes impactos na vida das pessoas pobres
que veem no beneficio uma renda mensal mínima, apresentando dados
significativos na diminuição relevante nos índices de pobreza e desigualdade social.
O Programa Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda
que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o
país. Tem como foco as famílias com renda per capita inferior a R$ 70,00 mensais.
Baseia-se na garantia de renda, ações complementares de inclusão produtiva e
profissionalização, no acesso aos serviços públicos, especialmente das políticas de
educação e saúde.
As famílias beneficiadas são selecionadas através do aplicativo eletrônico do
Cadastro Único para programas sociais- CadÚnico criado pelo Governo Federal
para programas sociais, instrumento que funciona como banco de dados nacional
para identificar e caracterizar as famílias em situação de pobreza e extrema
pobreza.
O CadÚnico permite conhecer a realidade socioeconômica dessas famílias,
trazendo informações de todos os integrantes da família, das características do
domicílio, das formas de acesso a serviços públicos essenciais e também, dados de
cada um dos componentes da família.
As mulheres são as principais responsáveis pelo recebimento do beneficio,
pela compreensão da sociedade, reconhecida pelo Governo Federal de que a
mulher é a verdadeira responsável pela economia doméstica e por gerenciar a vida
subjetiva e material dos filhos.
Isso pode ser analisado por dois vieses. O primeiro deles, por nossa cultura
burguesa sexista favorável ao homem que historicamente estabeleceu que a mulher
fosse a figura social com referência à santidade, provedora de bons costumes,
responsável pelos filhos e marido. Como boa gestora de seu lar, recaiu sobre nós a
responsabilidade de criar os filhos e manter a “estabilidade e harmonia familiar”.
Na sociedade moderna, isso manteve, agora com uma nova roupagem, que
além desses atributos, pela ausência do homem como provedor dos bens materiais
ou mesmo pelo mau uso deste em detrimento a que seria melhor para toda a família,
esta passou a chefiar a família, assumindo assim, a dupla referência do lar, sendo
15
este último, o argumento utilizado pelo governo ao compreender que a mulher é a
melhor referência para administrar o beneficio.
Outro aspecto que podemos relevar, ainda muito comum, é o fato da mulher
abrir mão da sua possibilidade de trabalhar para cuidar dos filhos reforçando o lugar
tradicional das mulheres na divisão sexual do trabalho doméstico, deixando apenas
para o marido o trabalho, gerando o ciclo de dependência dele. Esta com a renda do
Programa possui mais autonomia financeira adquirida, sendo assim, uma dimensão
positiva desse.
Assim, o Programa Bolsa Família apresenta uma direção de titularidade como
feminina. Somente na sua ausência ou impedimento, o beneficio será repassado
para outro responsável pela unidade familiar.
O referido programa possibilita a sobrevivência das famílias beneficiárias,
além da redução gradual das desigualdades regionais. Todavia, sabe-se que esse
programa ainda comporta várias limitações, em vista da própria estruturação social
de pobreza do sistema de proteção social brasileiro, inserindo o Ceará nessa
discussão.
De acordo com jornal Tribuna do Ceará (2013) 1, este Estado ocupa a 4º
posição no ranking nacional com o número de beneficiados do PBF com um total de
3,8 milhões de pessoas. As famílias pobres do Nordeste recebem em média do
programa R$ 97,00 do benefício social do Governo Federal, sendo este muitas
vezes a única renda da família.
Ademais, segundo a pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística - IBGE - (2012)2, o percentual de famílias chefiadas por mulheres no país
passou de 22,2% para 37,3%, entre 2000 e 2010. Os dados mostram ainda que as
mulheres têm chefiado mais famílias, mesmo quando possuem marido. O IBGE atribui
esse aumento a uma mudança de valores relativos ao papel da mulher na sociedade e a
fatos como: o ingresso no mercado de trabalho, o aumento da escolaridade em nível
superior e a diminuição da fecundidade.
A tendência à feminização da pobreza está ligada a desigualdade entre os
sexos e não a falta de capacidade das mulheres em chefiar família, pois as mulheres
1
2
http://www.tribunadoceara.com.br/noticias/tag/bolsa-familia/. Acesso em 18 novembro 2013.
http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/10/familias-chefiadas-por-mulheres-sao-373-do-totalno-pais-aponta-ibge.html/. Acesso em 22 abril 2014
16
estão em desvantagens em relação ao sexo masculino referente a direitos, salário e
carga horária de trabalho, e ainda referente à ascendência socioeconômica.
A escolha de trabalhar com este tema deve-se a sua importância na
sociedade burguesa, pois é um assunto de relevante discussão, principalmente pela
histórica centralidade da mulher no ambiente familiar, tendo à politica de Assistência
Social brasileira assumido essa perspectiva, mas direcionada pela a questão das
famílias ou domicílios atualmente serem chefiados por mulheres. Esse cenário
extrapola as fronteiras geográficas e de classes sociais, mas certamente também é
mediada por circunstâncias sociais, regionais e culturais e possui revelações
especificas mesmo dentro de um mesmo país.
O interesse pela temática surgiu durante o ano de 2012, quando realizei
estágio supervisionado obrigatório pelo curso de serviço social ocorrido no Centro de
Referencia de Assistência Social (CRAS), situado no bairro Siqueira II, pertencente
ao município de Maracanaú-CE.
Neste período, mantive contato direto com as famílias inseridas no Cadastro
Único3 beneficiárias do Programa Bolsa Família (PBF) através do atendimento
individual no qual realizava a escuta qualificada, nas visitas domiciliares e na
participação dos grupos de convivência realizados pelo referido CRAS.
Os momentos de maior contato com os(as) usuários(as), de um olhar mais
próximo, são importantes para a construção do vínculo e segurança entre este(a)
usuário(a) e profissional. Em cada visita, em cada atendimento, pôde-se estabelecer
uma relação realmente confiante, pois esses atores sociais permitiam aos poucos
uma maior aproximação da sua dinâmica familiar, nos repassando informações
detalhada de sua vida, do seu cotidiano, suas necessidades, medos e modo de ver a
sua realidade.
Assim, esta pesquisa tem o propósito de contribuir com o debate acerca da
política de Assistência Social contemporânea, bem como fomentar a discussão
sobre o real sentido do programa de transferência de renda, Programa Bolsa Família
articulada à dimensão da chefia feminina das famílias beneficiadas.
3
É um instrumento que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda, permite conhecer a
realidade socioeconômica dessas famílias, trazendo informações de todo o núcleo familiar, das
características do domicílio, das formas de acesso a serviços públicos essenciais e, também, dados
de
cada
um
dos
componentes
da
família.
Disponível
em
http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/cadastrounico . Acesso em 03 março 2014.
17
Desse modo, essa pesquisa se estrutura em quatro capítulos. O primeiro
capítulo, intitulado: “Percurso metodológico da pesquisa.”, retrata a escolha do
objeto de estudo, o desenvolvimento da pesquisa, os métodos utilizados e as
aproximações pessoais com o tema. A metodologia consistiu em considerações
feitas pelas autoras Martinelli (1999) e Minayo (2012) acerca dos aspectos
qualitativos da pesquisa e as técnicas que utilizamos para adentrar nas tramas do
real e capturar os fenômenos sociais que estão articulados ao tema com maior
fidelidade e concretude.
O segundo capítulo, com titulo: Família: “Qual o papel da mulher nesta
complexa instituição social?”, apresentamos duas das categorias centrais analisadas
neste estudo, família e gênero. Conceituamos a categoria família, expondo olhares
sobre as mudanças nas famílias na contemporaneidade, dialogamos com autores
como Osterne e Gueiros sobre este grupo. Discutimos ainda sobre as relações de
gênero como reflexo das relações desiguais entre homens e mulheres, destacamos
etapas da historia do movimento feminista no Brasil, expondo suas lutas e
conquistas desde o final do século XIX até os dias atuais.
No terceiro capítulo tratamos da Política de Assistência Social brasileira,
apresentando uma breve análise sobre o histórico dessa, que vai de sua primeira
regulação em 1938, passando pela criação de sua primeira instituição, a Legião
Brasileira de Assistência-LBA em 1942, até a promulgação Constituição Federal de
1988 que foi o marco legal da política como direito do cidadão e dever do Estado.
Fizemos uma breve reflexão inserindo os instrumentos normativos, que
compõe a politica de Assistência Social seus avanços e desafios na sociedade
brasileira.
Ressaltamos a centralidade da família na Assistência Social com o Sistema
Único da Assistência Social-SUAS, no qual a família é percebida como uma
instituição que necessita de condições de sustentabilidade e proteção social para
assim cumprir o seu papel de unidade de proteção primária.
E ainda neste capitulo, contextualizamos a política de Assistência Social em
Maracanaú-CE, desde as principais informações sobre este município, até as ações
das políticas desenvolvidas no cenário contemporâneo.
Finalizamos esse capitulo com possibilidades e contradições dos Programas
de Transferência de Renda tendo como foco principal o Programa Bolsa Família.
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Destacamos de forma sucinta etapas percorridas para chegar até o principal
programa de distribuição de renda, o Programa Bolsa Família. Neste tópico, foram
feitas algumas análises e críticas ao programa, em interface com os depoimentos
das entrevistadas em relação ao programa.
No quarto capitulo designado como “O Estudo Sobre as Vidas das
Mulheres
Chefes
de
Famílias
Beneficiárias
do
Programa
Bolsa
Família
Acompanhadas pelo Cras Jereissati em Maracanaú-Ce”, foi realizada uma análise
do perfil socioeconômico, apresentando o perfil detalhado dos sujeitos da pesquisa,
para assim, revelarmos suas principais características. Finalizamos apresentando os
dados coletados na pesquisa empírica articulando a realidade social das mulheres
chefes de família no CRAS Jereissati e o Programa Bolsa Família.
19
2. PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA
2.1 Vivencias e reflexões do caminho percorrido na construção da pesquisa
Pesquisar as mulheres chefes de família não é um interesse recente, pois
vem desde a minha infância em meu espaço doméstico, onde minha mãe desde os
meus sete anos de idade era a responsável pelo núcleo familiar.
Esse interesse aumentou com a realização do Estágio do Curso de Serviço
Social, realizado no Centro de Referencia de Assistência Social – CRAS Parque São
João, onde tive uma importante experiência junto às beneficiárias do Programa
Bolsa Família, mais especificamente mulheres acompanhadas pelo Serviço de
Proteção e Atendimento Integral à Família – PAIF4, programa central de atendimento
nos CRAS5.
Ao iniciar em 2012 meu estágio, pude perceber no meu cotidiano desse
espaço sócio-ocupacional que era comum intervirmos em casos que tivessem
mulheres como chefes de família, administradoras da economia financeira da
família, observando assim, que o caso da minha família não é um fato isolado.
Realizei o estágio supervisionado obrigatório no CRAS Parque São João,
porém, preferi realizar minha pesquisa no CRAS Jereissati 6, para dessa forma
manter certo distanciamento dos (as) pesquisados (as), tendo em vista que durante
a minha experiência de estágio no CRAS Parque São João, ocorreram por várias
vezes e ainda ocorre de algumas usuárias me pararem na rua ou irem até a minha
casa para saberem de informações dos serviços ofertados e do resultado de alguma
solicitação por conta de morar no bairro.
4
O Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família – PAIF é uma atribuição exclusiva
do poder público e é desenvolvido necessariamente no Centro de Referência de Assistência Social –
CRAS.
5
Todo Centro de Referência de Assistência Social-CRAS, independentemente da fonte
financiadora, deve, obrigatoriamente, implementar o Programa de Atenção Integral à Família – PAIF
ou seja, o PAIF só é executado no CRAS e todo CRAS executa, obrigatoriamente, o PAIF.
6
O CRAS Jereissati pertence à rede socioassitencial do munícipio de Maracanaú, está situado
na Avenida X, número 254, no bairro Jereissati II, sua área de atendimento são os bairros Jereissati I,
Jereissati II e Timbó.
20
Essas situações ocorreram por tantas vezes que ficou constrangedor e na
maioria das vezes as usuárias não querem entender que não tenho como lhes
passar informações que devem ser repassadas no próprio CRAS.
Por esse motivo buscamos outro Cras para realizar a pesquisa, porém
dentro do mesmo município, o Cras ao que nos referimos é o CRAS Jereissati
pertencente ao município de Maracanaú-CE.
Comecei a questionar sobre quantas mulheres são chefes de suas famílias,
como elas enfrentam esse “novo” modo de vida e em alguns casos, como o seu
companheiro passa a depender financeiramente dela. Dessa forma, iniciei minha
pesquisa partindo desses questionamentos e ao longo deste caminho, muitos outros
surgiram no decorrer desde trabalho.
Em se tratando da realidade investigada, é necessário estar disposto a
maior aproximação possível com o real, transpondo nossas barreiras culturais,
simbólicas, o respeito ao que lhe é estranho. Assim, todos esses elementos são
importantes para a pesquisa social.
As manifestações de uma realidade estão sempre em transformações, e
estas impactam diretamente sobre a construção de novas formas de olhar, pensar e
agir sobre os fenômenos sociais. A pesquisa social, assim, busca acompanhar
sempre esse movimento, para que os resultados alcançados sejam sempre
renovados, assim como a realidade.
Esta pesquisa se insere enquanto pesquisa social e busca abranger
aspectos teóricos e práticos relacionados a vida social das mulheres beneficiárias do
Programa Bolsa Família acompanhados pelo Cras Jereissati em Maracanaú-CE.
Entendemos por pesquisa a atividade básica da ciência na sua indagação e
construção da realidade. Alimenta a atividade de ensino e atualiza frente à realidade
do mundo. (MINAYO, 2012, p. 16).
Assim, esta pesquisa é de natureza qualitativa na perspectiva de analisar e
compreender a realidade a partir das falas dos sujeitos, identificando assim, suas
opiniões e seus costumes, pois este modelo de investigação é o mais acessível para
o levantamento das informações sociais, possibilitando o contato direto com o
sujeito. Para Minayo:
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela trabalha
com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças,
dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é
21
entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se
distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar
suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus
semelhantes. (2012, p. 21)
Outra autora que discorre sobre a pesquisa qualitativa, Martinelli, nos informa:
No que se refere às pesquisa qualitativas, é indispensável ter presente que,
muito mais do que descrever um objeto, buscam conhecer trajetórias de
vida, experiências sociais dos sujeitos, o que exige uma grande
disponibilidade do pesquisador e um real interesse em vivenciar a
experiência da pesquisa [...] não podemos pensar que chegamos a uma
pesquisa como um “saco vazio”. Não! Temos vida, temos Historia, temos
emoção. (1999, p. 25).
Através da pesquisa qualitativa pode-se analisar a realidade, além de
proporcionar um olhar mais abrangente sobre o tema. Martinelli (1999) cita alguns
pressupostos que fundamentam o uso da metodologia quantitativa:
O primeiro pressuposto é o do reconhecimento da singularidade do sujeito.
Cada pesquisa é única, pois se o sujeito é singular, conhecê-lo significa
ouvi-lo, escutá-lo, permitir-lhe que se revele; o segundo pressuposto é que
essas pesquisas partem do reconhecimento da importância de se conhecer
a experiência social do sujeito, e não apenas as suas circunstancias de vida
[...] Envolve, portanto, seus sentimentos, valores, crenças, costumes e
práticas sociais cotidianas. Isso nos remete ao terceiro pressuposto, que se
expressa no reconhecimento de que conhecer o modo de vida do sujeito
pressupõe o conhecimento de sua experiência social. (MARTINELLI, 1999,
p. 22 e 23).
O processo de realização da pesquisa se torna importante tanto para
conhecer a realidade, como para o conhecimento profissional, pois o arcabouço
teórico-metodológico geram conhecimentos ainda não percebidos.
Trabalhamos com fatos de forma a poder aprofundar tanto quanto possível
a analise e não para conhecê-los apenas de forma sumaria, a partir de uma
primeira apresentação. Nesse sentido priorizamos não os fatos épicos, os
fatos de grande dimensão, mas aqueles que estão mais próximos do sujeito
e que repercutem diretamente na sua vida (MARTINELI, 1999, p. 22).
Dentre as técnicas da pesquisa qualitativa existentes, optou-se pela técnica
de entrevista, tendo em vista, o leque de opções que a referida técnica fornece ao
pesquisador, pois segundo Gil, a intensa utilização da entrevista na pesquisa social
deve-se a uma série de razões:
a) A entrevista possibilita a obtenção de dados referente aos mais diversos
aspectos da vida social;
b) A entrevista é uma técnica muito eficiente para a obtenção de dados em
profundidade acerca do comportamento humano;
c) Os dados obtidos são suscetíveis de classificação e de quantificação.
22
Se comparada com o questionário, que é outra técnica de longo emprego
nas ciências sociais apresenta outras vantagens:
a) Não exige que a pessoa entrevistada saiba ler e escrever;
b) Possibilita a obtenção de maior número de resposta, posto que é mais
fácil deixar de responder a um questionário do que negar-se a ser
entrevistado;
c) Oferece flexibilidade muito maior, posto que o entrevistador pode
esclarecer o significado das perguntas e adaptar-se mais facilmente as
pessoas e às circunstâncias em que se desenvolve a entrevista;
d) Possibilita captar a expressão corporal do entrevistado, bem como a
tonalidade de voz e ênfase nas resposta (GIL, 2011, p. 110).
A pesquisa para a sua realização é baseada em conceitos, procedimentos e
técnicas. Minayo (2012) denomina essas etapas como Ciclo de Pesquisa, dividindoas em três fases, que são: (01) fase exploratória; (02) trabalho de campo; (03)
análise e tratamento do material empírico e documental. Ainda, também utilizamos
de pesquisa de caráter bibliográfico e documental.
A pesquisa bibliográfica está sendo feita a partir de fontes históricas que já
foram publicadas, tais como artigos científicos, obras e livros sobre o tema e
percorrerá todas as fases do ciclo da pesquisa.
Sobre a primeira etapa utilizada, a fase exploratória, fundamentamos em
Minayo:
É o tempo dedicado – e que merece empenho e investimento – a definir e
delimitar o objeto, a desenvolvê-lo teórica e metodologicamente, a colocar
hipóteses ou alguns pressupostos para o seu encaminhamento, a escolher
e a descrever os instrumentos de operacionalização do trabalho, a pensar o
cronograma de ação e a fazer os procedimentos exploratórios para escolha
do espaço e da amostra qualitativa (2012, p. 26).
A partir do estudo realizado, foram identificados às categorias teóricas que
embasaram este estudo: Assistência Social, Programa Bolsa Família e Gênero.
Ainda como produto da fase exploratória, definimos como objetivo geral
desta pesquisa: analisar a realidade social das mulheres chefes de família
beneficiárias do Programa Bolsa Família acompanhadas pelo Cras Jereissati, em
Maracanaú-CE.
Como objetivos específicos, buscaremos:
 Elaborar perfil socioeconômico das mulheres chefes de família beneficiárias do
PBF acompanhadas pelo Cras;
 Investigar a compreensão dessas mulheres sobre suas relações familiares,
comunitárias e sua história;
23
 Compreender como são cumpridas as exigências das condicionalidades 7 do PBF
na ótica das mulheres pesquisadas;
 Analisar a visão que essas mulheres têm sobre do Programa Bolsa Família e qual
o impacto dele em suas vidas.
Para dar conta de responder a esses objetivos específicos, elaboramos um
roteiro (apêndice I) que serviu como norte para nossas perguntas no processo de
investigação com as interlocutoras.
Este estudo teve como temporalidade o período de quatro meses, durante o
mês de março de 2014 a junho de 2014.
Finalizando esta fase, foi ainda nesse momento que desenvolvemos a
problemática, definimos as técnicas da pesquisa; autores da área pesquisada;
levantamento de perguntas de partida e do título desse estudo.
A segunda fase, a de trabalho de campo, é definido por Minayo da
seguinte forma:
Essa fase combina instrumentos de observação, entrevistas ou outras
modalidades de comunicação e interlocução com os pesquisados,
levantamento de material documental e outros. Ela realiza um momento
relacional e prático de fundamental importância exploratória, de confirmação
e refutação de hipóteses e de construção de teoria. (MINAYO, 2012, p. 26).
Iniciamos a fase da coleta de dados junto ao campo de pesquisa, é a fase
das entrevistas, do contato com as mulheres pesquisadas, aproximação da sua
realidade.
Foi na fase de campo que desenvolvemos nossa aproximação com o objeto
de estudo e tivemos contato com a realidade das mulheres, nosso público-alvo.
Para a produção utilizamos as seguintes técnicas: dados dos documentos da
instituição, observações no campo de pesquisa e a entrevista, que é a estratégia
mais usada no processo de trabalho de campo (MINAYO, 2012, p. 64).
O que buscamos é o conhecimento, a aproximação dos sujeitos
pesquisados, por esse motivo, não se trata, portanto, de uma pesquisa com grande
numero de sujeitos, pois é preciso aprofundar o conhecimento em relação àquele
sujeito com o qual estamos dialogando (MARTINELLI, 1999, p. 23).
7
São os compromissos assumidos tanto pelas famílias beneficiárias do Bolsa Família quanto
pelo poder público para ampliar o acesso dessas famílias a seus direitos sociais básicos. Por um
lado, as famílias devem assumir e cumprir esses compromissos para continuar recebendo o
benefício. Por outro, as condicionalidades responsabilizam o poder público pela oferta dos serviços
públicos de saúde, educação e assistência social.
24
Trabalhamos com cinco mulheres chefes de família, através do roteiro de
entrevista semiestruturada, devido a maior facilidade oferecida por esta técnica em
obter dados das entrevistadas.
Outra vantagem da entrevista semi-estruturada é a sua elasticidade quanto à
duração, o que permite e facilita para o pesquisador ter uma cobertura mais densa
sobre determinados assuntos a serem estudados e pesquisados, bem como a
probabilidade de respostas diversas e uma maior liberdade por parte da
entrevistadora e das entrevistadas. Minayo define entrevista semi-estruturada da
seguinte forma:
A entrevista semi-estruturada combina perguntas fechadas e abertas, em
que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema em
questão sem se prender à indagação formulada. [...] a entrevista como fonte
de informação pode nos fornecer dados secundários e primários de duas
naturezas: a) os primeiros dizem respeito a fatos que o pesquisador poderia
conseguir por meio de outras fontes como censos, estatísticas, registros
civis, documentos, atestados de óbito e outros; b) os segundos – que são
objetos principais da investigação qualitativa- referem-se a informação
diretamente construídas no dialogo com o individuo entrevistado e tratam da
reflexão do próprio sujeito sobre a realidade que vivencia (2010, p. 64-65)
Importa destacar que as identidades foram resguardadas e os nomes
substituídos por fictícios. As entrevistas foram feitas com as mulheres beneficiadas
pelo Programa de Transferência de Renda Bolsa Família, inseridas no PAIF- Serviço
de Atenção Integral a Família, residentes no bairro Jereissati.
Para dar inicio a pesquisa de campo no CRAS Jereissati, primeiramente tive
de solicitar uma autorização do Gsuas8 apresentando o Projeto de Trabalho de
Conclusão de Curso, dentro das normas estipuladas na regulamentação de Portaria
nº 41, de 29 de agosto de 2012, que dispõe sobre as normas para pesquisa e
publicação de trabalhos envolvendo os equipamentos vinculados à Secretaria de
Assistência Social e Cidadania - SASC, do município de Maracanaú e dá outras
providências. (Relatório de Gestão, 2012, p. 01).
Após várias visitas a SASC, de posse da autorização, fomos ao CRAS
Jereissati, apresentar à coordenação a autorização para iniciar a pesquisa de
campo.
8
Gestão da informação da Assistência Social – PRONTUÁRIO SUAS DIGITAL E ONLINE.
Disponível em http://www.gesuas.com.br acesso em 26 jun 2014.
25
Com a permissão da coordenação, dialogamos com as técnicas de
referência para expor um pouco dos meus objetivos para esta pesquisa, buscando
facilitar acesso junto às usuárias, tendo em vista que as técnicas poderiam ter
algumas famílias dentro do perfil ao qual procurávamos. Com essa estratégia,
realmente ficou um pouco mais fácil o acesso e o contato com algumas mulheres,
porém percebemos receio destas em permitir nosso acesso às fichas das usuárias,
sendo compreendido pela questão do sigilo aos seus dados.
De acordo com os profissionais da equipe multidisciplinar do CRAS
Jereissati, do universo de 100 (cem) famílias acompanhadas pelo Programa de
Atenção Integral a Família - PAIF havia quinze mulheres chefes de família.
Inicialmente, esperávamos entrevistar dessas quinze, cerca de dez mulheres, mas
só foram possíveis cinco delas, devido à dificuldade de acesso as interlocutoras.
Por várias vezes tentamos contato com todas elas, porém das quinze, só
conseguimos falar com seis que de imediato aceitaram participar. Agendamos com
duas para o dia seguinte e as outras quatro para dois dias depois. Contribuiu como
fator dificultador o não conhecimento da área, perguntamos as pesquisadas se as
entrevistas poderiam ser no próprio CRAS e todas concordaram. Porém nos dias
agendados as mulheres não compareceram para as entrevistas.
Entramos novamente em contato por telefone com as mesmas para verificar
o que havia acontecido e a resposta foi à mesma para todas. Falaram que o CRAS é
muito distante das suas casas. Avaliando melhor, nos dispusemos a ir a suas casas
que de prontidão todas aceitaram, porém por conta da distância entre as casas das
usuárias, só foi possível fazer cinco entrevistas.
Assim, do universo de quinze mulheres, a amostra da pesquisa foi de cinco,
o que avaliamos como um dado interessante para representar suas realidades
sociais. Todas elas são acompanhadas pelo CRAS Jereissati e chefes de suas
famílias, respeitando assim, o objeto desta pesquisa.
As entrevistas foram realizadas nas casas das famílias, onde fomos muito
bem recebidas por todas. Algumas mulheres se expuseram um pouco mais que as
outras, falando das suas vidas. O fato de ter de ir às residências delas acabou
favorecendo a realização das entrevistas e contribuindo bastante no nosso
aprendizado, pois conhecer o local onde vivem participar um pouco do seu cotidiano
26
contribuiu bastante para coletar mais elementos importantes para esta pesquisa.
Seguimos o roteiro das entrevistas e fizemos nossas devidas anotações.
Finalizado este processo, iniciando a pesquisa documental com o
levantamento dos documentos do Cras Jereissati, como: relatórios, instrumentais,
documentos do Cadastro Único e Programa Bolsa Família que nos ofereceram
dados sobre a realidade das mulheres pesquisadas. Fizemos a leitura desse
material, analisamos e retiramos as principais informações, finalizando então a fase
de campo.
A terceira e última fase da pesquisa se refere à análise e tratamento do
material empírico e documental:
Diz respeito ao conjunto de procedimentos para valorizar, compreender os
dados empíricos, articula-los com a teoria que fundamentou o projeto ou
com outras leituras teóricas e interpretativas cuja necessidade foi dada pelo
trabalho de campo. (MINAYO, 2012, p. 27).
Empregaremos os três procedimentos norteados por Minayo (2012):
a) Ordenação dos dados, organização dos materiais coletados nas visitas ao campo,
nas entrevistas, em documentos, dados, leituras e outros;
b) Classificação dos dados, articulação com os autores, discussão das categorias, a
discussão teórica;
c) Análise propriamente dita se refere à articulação das informações, alcançadas
durante a realização da pesquisa nas entrevistas, nos estudos sobre a realidade e
nos documentos fornecidos pela instituição.
Esperamos com esses caminhos e técnicas metodológicas apresentadas,
conseguir nos aproximar verdadeiramente da realidade social dessas mulheres na
perspectiva de conseguirmos o máximo de dados e informações para embasar este
trabalho.
Compreendemos, pois, que abranger a totalidade de fenômenos envoltos ao
objeto de estudo, é um desafio material. Contudo, sabemos que toda pesquisa social
tem sua temporalidade e limitações do olhar próprio autor, já que a realidade é
dinâmica e contraditória, emaranhada entre as malhas de sua totalidade.
Cabe a nós, esta compreensão, dedicação e compromisso em apreender
esta realidade com responsabilidade e coerência. Esse foi o nosso intuito.
27
2.2 Cenários da investigação.
O município de Maracanaú está situado no Estado do Ceará pertencente à
região do semiárido do nordestino, distante a 13 km da capital cearense. O nome
Maracanaú vem do tupi-guarani, significa “lagoa onde os maracanãs bebem”. É um
município relativamente novo, teve sua emancipação do município de Maranguape
em 1983, resultado da ação politica liderada por um agrupamento de políticos com
interesse de libertá-lo da tutela.
Atualmente Maracanaú ocupa a posição de maior Distrito Industrial do
Ceará, concorrendo para isto à instalação de grandes conglomerados industriais,
que atrai um contingente de mão de obra e promove um crescimento econômico
significativo.
O referido município está situado na Região Metropolitana de Fortaleza. Sua
área territorial é de 106,648 km² com uma população de 209.057 habitantes
segundo dados do censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística –
IBGE9.
De acordo com a Politica de Nacional Assistência Social – PNAS é
caracterizado como município de grande porte. Atualmente a população de
Maracanaú é atendida por 10 (dez) CRAS em diferentes territórios.
O primeiro CRAS do município surge em 2005 através de uma ONG,
denominado CRAS Alto Alegre. No ano seguinte é criado o CRAS Jereissati/Antônio
Justa e o Indígena e nos anos posteriores até o ano de 2012, os outros seis CRAS.
O CRAS Jereissati surgiu em 2006, no prédio da Secretaria de Assistência
Social e Cidadania (SASC) no município de Maracanaú. Na época era conhecida
como Secretaria de Promoção Social, onde funcionava em um pequeno prédio,
situado na Rua Antônio de Alencar, 297 – centro de Maracanaú.
No ano de 2008, o CRAS Jereissati passou a funcionar em um prédio
alugado na Rua 11, nº 696, Bairro Jereissati I, com uma abrangência territorial que
compreendia quatorze bairros, permanecendo nesse endereço por quatro anos.
9
Disponível
em:
Acesso em 09 maio 2014.
http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=230765.
28
Em março de 2012, mudou-se para um prédio pertencente à prefeitura de
Maracanaú onde antes funcionava somente o Pólo de Convivência10 Jereissati. Com
a chegada do CRAS, o Pólo passou a integrar as suas ações.
Atualmente o CRAS Jereissati está localizado no Bairro Jereissati II, Av. X nº
254, vizinho a outros equipamentos da rede socioassistencial como: Centro de
Referencia Especializado de Assistência Social – CREAS, Centro de Convivência do
Idoso – CCI, e a Escola Municipal de Ensino Médio Gonzaga Mota. Embora
localizado em um prédio próprio, situa-se numa área de difícil acesso, com queixas
constantes, por boa parte dos (as) usuários (as).
O CRAS conta com uma estrutura de: uma sala para atendimento social,
duas para a realização das atividades do PROJOVEM, um pequeno auditório onde
acontecem as aulas de teatro, dança e capoeira, a sala de atendimento do Cadastro
Único, a da coordenação, além de uma cozinha com refeitório, três banheiros, uma
dispensa e o almoxarifado.
O prédio possui uma arquitetura que lembra uma escola. A área externa é
bem ampla, com um campo improvisado atrás do prédio, uma quadra onde se
realizam as atividades esportivas e um pequeno parquinho com poucos brinquedos
para crianças menores.
A equipe de trabalhadores (as) do CRAS Jereissati é formada por vinte e
três pessoas: três assistentes sociais, sendo duas concursadas e uma via contrato;
uma psicóloga concursada; três pedagogas, uma concursada e duas com contratos
temporários; quatro agentes administrativos; quatro educadores sociais; cinco
facilitadores culturais; dois porteiros; um coordenador geral; dois serviços gerais;
uma cozinheira e um motorista. Estes últimos todos contratados.
A perspectiva de trabalhar o SUAS significa trabalhar com uma totalidade de
5.564 municípios, um Distrito Federal, 26 estados. Por isso, é muito importante ir a
fundo e analisar pesquisas, como a MUNIC (Pesquisa de Informações Básicas
Municipais), que trabalha todos os dados das gestões municipais, mostrando que,
nos municípios, 73% da força de trabalho que atua na Assistência Social é de nível
fundamental e médio. Só 1/3 é universitário e destes uma parte maior é de
assistentes sociais (CFESS, 2011, p. 50).
10
Locais de atividades educacionais para crianças e jovens de Maracanaú.
29
O CRAS desenvolve ações do Serviço de Proteção e Atendimento Integral a
Família – PAIF com as ações de atendimentos técnicos, escuta qualificada,
encaminhamentos a rede de serviços, busca ativa, dentre outros. Ainda, desenvolve
como atividade do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos - SCFV
para crianças e adolescentes numa faixa etária de 06 a 17 anos, e para idosos com
idade acima de 60 anos, contando também com atividades esportivas e culturais
como: capoeira, dança, teatro e eventuais palestras, também realizam as atividades
do PROJOVEM. Além desses serviços, também desenvolve ações do Cadastro
Único, concessão dos Benefícios Eventuais, Inclusão Produtiva11, e cursos do
Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC.
Após apresentar os ciclos da pesquisa, o caminho e técnicas que utilizamos
para apreensão das informações; também relatamos as ações e serviços do Cras
Jereissati, seu histórico e peculiaridades. No próximo capítulo, discutiremos sobre
conceitos e principais debates sobre as principais categorias deste estudo: família,
gênero e assistência social.
11
Inclusão Produtiva é um programa que visa promover a cidadania das famílias inseridas nos
programas de transferência de renda através do acesso a informações e reflexões acerca dos seus
direitos, da inserção na rede de proteção social e da capacitação para atividades produtivas.
30
3. FAMÍLIA: QUAL O PAPEL DA MULHER NESTA COMPLEXA INSTITUICÃO
SOCIAL?
3.1 Conceituando a categoria família: olhares sobre as mudanças nas famílias
na contemporaneidade.
Para estudar a instituição social família devemos sempre levar em conta sua
perspectiva histórica, pois é sob a tutela da história que as sociedades tendem a
desencadear um complexo processo de transformações sociais. Os acontecimentos
sócio-históricos devem ser considerados, pois estes são resultados de modificações
sociais resultantes das ações humanas no percurso das sociedades.
A família é a instituição fundamental para a garantia de sobrevivência de um
grupo social. Podemos defini-la como núcleo formador dos vínculos sociais,
biológicos, afetivos e emocionais, podendo ocorrer a presença deste isolados ou
juntos, tendo em vista que o conceito de família vai além de laços consanguíneos.
É no convívio da família que o individuo processa suas primeiras relações de
afetividade em sociedade, seja ela familiar ou/e comunitário, sendo através desta
que se influencia a identidade individual dos sujeitos.
A família pode ser compreendida por um grupo pessoas unidas por grau de
parentesco, amizade, solidariedade e relação econômica que tem como objetivo
principal a socialização, integração e satisfação de outras necessidades básicas.
Para Dias (2000, p. 150) esta instituição social consiste num grupo de
pessoas que são relacionadas entre si pelo sangue, casamento ou adoção, vivendo
juntas por um período de tempo definido. Na leitura deste autor, a família ainda se
constitui fixa e determinada pela união dos sujeitos pelo matrimônio ou condicionada
por sua constituição biológica, não abrangendo a interpretação de família unida por
laços afetivos.
Podemos afirmar que o conceito de família está em constante transformação
e, desta maneira, sua definição pode ocorrer de acordo com a cultura e significado
social, mesmo que a união dos laços não seja biológica.
A família é a primeira instituição que uma pessoa entra em contato em sua
vida. É o primeiro grupo social a que pertencemos. Embora haja normas sociais que
31
determinam regras de funcionamento da instituição familiar, cada família tem ainda
suas próprias regras de controle e comportamento.
Ainda para Dias (2000, p. 50), a família é considerada como uma unidade
social básica e universal. Básica, por dela depender a existência da sociedade; e
universal, pois é encontrada em todas as sociedades humanas, de uma forma ou de
outra.
Já Lakatos e Marconi (1999) concordam com o pensamento de Dias ao
discorrer que:
Em todas as sociedades humanas encontra-se uma forma qualquer de
família. Sua posição, dentro do sistema mais amplo de parentesco, pode
oscilar muito, desde um lugar central e dominante (sociedade ocidental) até
uma situação de reduzida importância, que dão maior destaque ao grupo de
parentesco, mais amplo do que a unidade representada pelo marido, mulher
e filhos. (LAKATOS e MARCONI, 1999, p. 171).
Giddens (2005) conceitua família como um grupo de pessoas diretamente
unidas por conexões parentais, cujos membros adultos assumem a responsabilidade
pelo cuidado das crianças. Apresenta a família nuclear a partir de dois adultos
vivendo juntos num núcleo doméstico e coloca que a família ampliada é quando
parentes próximos além do casal e seus filhos vivem juntos no mesmo ambiente
familiar ou um relacionamento próximo e contínuo uns com os outros. Em uma
família ampliada pode incluir os avós, irmãos/irmãs e seus cônjuge, tias e sobrinhos.
A família medieval inicia a partir do século XIV ao século XVII um processo
de transformação tomando assim novas formas em sua base. A situação da mulher
era de inteira subordinação ao homem, sendo tratada com um “objeto” de sua posse
ou propriedade, ocorrendo desta forma uma forte dominação. O mundo era do
homem por excelência, as crianças e mulheres não passavam de seres
insignificantes.
A legislação reforça o poder do marido e dos homens em geral,
estabelecendo a desigualdade entre homem e mulher. Expressão disso é o
fato de a escolaridade passar a fazer parte da vida dos meninos desde o
século XV, mas vai ser extensiva às meninas somente no final do século
XVIII e inicio do século XIX. (GUEIROS, 2002, p. 106).
A família moderna surge no final do século XVIII, havendo neste período
mudanças significativas, tais como a separação do público e do privado e as
modificações no papel social da mulher. Esta mudança fica evidente principalmente
com o movimento feminista no século XIX, período em que a mulher inicia a sua
32
emancipação social e sexual. Feministas e acadêmicos analisaram a história deste
movimento em três "ondas".
A primeira onda teria ocorrido nos Estados Unidos e no Reino Unido, entre o
final do século XIX e o início do século XX. Tendo como destaque a luta pelo direito
ao voto. No Brasil, a conquista ao direito de voto pelas mulheres data o ano de 1932.
A segunda onda teve como foco a preocupação com as questões da
igualdade entre os sexos e o fim da discriminação.
No Brasil, a segunda onda
corresponde ao período da ditadura militar (1964-1989), o que levou as feministas a
se rebelarem contra o regime e também contra a opressão de gênero.
A terceira onda feminista se inicia na década noventa e segue até os dias
atuais. Há quem acredite que essa terceira onda tenha surgido como uma resposta
às falhas da segunda onda.
Com as mudanças no século XVIII, a família passa por alguns ajustes que
favorecem a transformação de seu perfil, deste modo, o novo desenho familiar
passa a ser chamado de família nuclear . Nesse sentido diz Osterne (2001):
No século XVIII, então, com o aparecimento da escola, da privacidade do
lar, da ênfase da igualdade entre filhos, da manutenção das crianças junto
aos pais no núcleo conjugal, do sentimento de família em intima relação
com o sentimento de classe, valorizado pelas instituições, sobretudo pela
igreja, inicia-se a delinear-se, o que convencionou chamar família nuclear
burguesa. (p. 53).
Ressalta-se que a história da família é descontinua, não linear e não
homogênea, constituindo-se de padrões familiares distintos, cada em um
determinado contexto histórico. Abrangendo o conceito de família além de laços
consanguíneos, sendo esta nossa compreensão sobre esta categoria, nos
fundamentamos em Osterne, quando esta autora a conceitua:
A definição dominante de família congrega um conjunto de palavras afins:
pai, mãe, filhos, casa, unidade doméstica, casamento e parentesco. A
família tida como “legitima”, “normal”, que se interioriza no imaginário das
pessoas, caracterizam-se como um conjunto de indivíduos aparentados que
se ligam entre si por aliança, casamento, filiação, adoção ocasional ou
afinidade. É pressuposto comum que esses indivíduos habitem um mesmo
teto. (OSTERNE, 2001, p. 51).
Quando se fala em família quase que de forma instantânea vem ao
pensamento à imagem do pai, mãe e filhos, um modelo de família tradicional. A
família está organizada de diferentes formas, o que lhe atribui um caráter plural ao
33
modelo de família tradicional e, mais tarde, de família nuclear, tida como formas de
organização dominante na sociedade brasileira.
A família burguesa apresentava em seu contexto uma forma nuclear,
representada pela figura do pai, da mãe e dos filhos, ou seja, era organizada numa
rígida divisão dos papeis: o pai era responsável pela garantia do sustento e a mãe
pela administração do lar e cuidado dos filhos.
De acordo com Gueiros (2002), começa então, a se desenvolver a família
conjugal moderna com novas formulações para os papeis do homem e da mulher no
casamento. Dá-se inicio a família contemporânea que surgiu em meados do século
XIX e prossegue até hoje.
A existência de traços da família patriarcal na família conjugal moderna
persiste até o século XX, fundamentada inclusive na legislação, pois, no
Brasil, somente na Constituição de 1988 a mulher e o homem são
assumidos com igualdade no que diz respeito aos direitos e deveres na
sociedade conjugal. (GUEIROS, 2002, p. 107).
O período industrial surgiu mundialmente, e junto com a revolução a
ampliação das famílias. Mesmo com tantos avanços na área social, ainda nos dias
atuais a mulher continua assumindo as tarefas históricas de mãe, esposa e, em
muitos casos, dona de casa.
Osterne (2001, p. 51) levanta os seguintes questionamentos sobre o que
seria família:
Seria a família este grupo concreto, formado por um numero de pessoas
ligadas por consanguinidade ou aliança, ocupando posições diversificadas
numa hierarquia interna de poder e de papéis? Ou seria a família uma
representação social, uma realidade simbólica? Por outro lado, as
manifestações empíricas do real e suas representações não seriam partes
igualmente constitutivas da realidade objeto da análise social? Quais as
manifestações mais comuns da família como fato empírico? Como se
desenvolve sua historicidade? Como aparece no plano das representações
sociais?
Na atualidade as relações familiares, constituem-se por novos rearranjos
sociais, resultante da diversidade de situações implicando em novas adaptações do
cotidiano de cada indivíduo. A família passa a ser todos que de certo modo,
compartilham formas de convivência diária, sejam de afeto ou mesmo de conflitos.
O tipo mais comum de família nuclear é aquela constituída pelo pai, pela
mãe e filhos não casados, esta, porém, não deve ser considerada universal, pois a
estrutura de família nuclear não é encontrada em todas as sociedades.
34
Na contemporaneidade, a família tem perdido o sentido de tradição por
causa das mudanças na sociedade e pela necessidade dos seres humanos de
conviver sobre um mesmo teto.
O reposicionamento do papel da família contemporânea na sociedade é
importante para que possamos compreender muitas das relações sociais existentes
na atualidade. Por ser tão relevante o tema, por vezes, requer intervenção estatal
para que a definição de família seja legalmente estabelecida.
Existem alguns tipos contemporâneos de família: família nuclear constituída
por dois adultos de sexo diferente que vivem maritalmente com os seus filhos
biológicos e/ou adotados; agregados monoparentais constituídas por apenas um
adulto e seu(s) filho(s) na maioria dos casos, o adulto é uma mulher; famílias
recompostas podem acontecer em várias circunstâncias: uma situação é o segundo
casamento entre pessoas jovens que não trazem filhos do anterior casamento e
outra inclui a existência de filhos de casamentos anteriores que veem viver num
novo agregado com o novo conjugue.
A coabitação é cada vez mais frequente entre os jovens, sobretudo com um
período de experiência de vida em comum antes do casamento oficial; casais
homossexuais que se relacionam afetivamente que optam por viver maritalmente,
famílias chefiadas por mulheres sem presença masculina; na ausência dos pais, os
avós como referência, dentre outros. Esses são alguns casos de famílias
contemporâneas existentes. A seguir Osterne (2004) faz uma breve síntese do que é
ser família.
Família seria portanto: … algum lugar seja o lar, a casa, o domicilio, o ponto
focal onde se possa desfrutar do sentido de pertencer, onde se possa
experimentar a sensação de segurança afetiva e emocional, onde se possa
ser alguém para outro, apesar das condições adversas mesmo
independente das relações de parentesco e consanguinidade. (p. 65).
Assim, chegamos ao fim da nossa conclusão desta discussão considerando
que eram necessários alguns esclarecimentos sobre a instituição familiar, e iniciando
no tópico a seguir, sua articulação com as relações de gênero ocorridas nas famílias
e na sociedade contemporânea.
35
3.2 As relações de gênero como reflexo das relações desiguais entre homens e
mulheres
O termo gênero é fruto de uma construção social desenvolvida ao longo da
historia. Para iniciar esse assunto, retornaremos a gênese do movimento feminista
brasileiro que teve sua origem no final do século XIX e inicio do século XX.
A perspectiva das lutas das mulheres baseava-se na igualdade de direitos
entre homens e mulheres. Suas demandas referiam-se à causa abolicionista e,
posteriormente, ao direito à participação eleitoral. A luta pelos direitos políticos foi
reforçada pelas exigências de melhores condições de trabalho para as mulheres e a
constantes lutas contra a dominação masculina e o direito a educação. Sua
constituição é repleta de correlação de forças, resistências e conquistas.
A instituição família também se desenhou na sociedade burguesa formando
o ser homem e o ser mulher. Culturalmente, ao homem são atribuídos papeis como
o de brincar com bola e carros; poder vestir-se de qualquer jeito dentro do padrão
masculino, além de aparentar força e coragem. Para a mulher, esta tem que ser
doce, meiga, frágil e dependente; gostar de bonecas; ter dons para a atividade
doméstica e seguir os passos da mãe, tornando-se sua continuidade. Proteger e
educar os filhos, cuidar da casa e do marido, não se esquecendo de lhe ser fiel por
toda a vida.
Assim, a família, para muitas mulheres, foi considerada como algo sagrado.
Os filhos, a casa, o marido são à base de tudo. Pertence historicamente à mulher a
responsabilidade em manter a “harmonia” do lar. O que é do mundo privado, do lar,
deve ser admitido pela mulher, e tudo que se refere à esfera pública é atribuído ao
homem.
Em síntese, o homem deve ser o provedor e a mulher a dona de casa, “a
rainha do lar”, dando- se a ela o título de nobreza. No entanto apesar de “rainha”, ela
não detém o poder, pois este pertence à figura masculina. Tal ordem reforça a
construção de relações de poder, reafirmando a dominação masculina como algo
natural e lógico pertencente ao modelo patriarcal de sociedade.
O movimento feminista era um movimento que lutava pela equidade, liberdade
e a favor de uma sociedade sem preconceito contra a mulher. Muitas mulheres
36
buscavam respeito para as suas ideias e um lugar na sociedade. Dessa forma, com
a luta do movimento feminista, trazemos a reflexão de Osterne:
Ocorre maior igualdade entre os sexos, maior controle de natalidade, maior
incidência de separações e de novos casamentos. A atividade renumerada
da mulher contribuiria para a redução da autoridade parental. Ocorreria
também um enfraquecimento dos laços de parentesco. (OSTERNE, 2001,
p. 67).
Osterne (2008) aborda em seu livro as compreensões de Pinto (2003),
quando este salienta nas primeiras décadas do século XX que havia três claras
vertentes do movimento feminista.
A primeira vertente foi liderada por Bertha Lutz12, a qual reflete como
objetivo a inclusão das mulheres na sociedade, evidenciando-as como cidadãs de
direito, tanto quanto os homens, uma visão de igualdade para ambos os sexos. A
segunda vertente é denominada como feminismo difuso, pois esta se expressava
nas mais diversas manifestações da imprensa feminista alternativa.
Defendia o direito à educação das mulheres, falava sobre a dominação
masculina e discorria a respeito de temas delicados para a época. A terceira
vertente era formada por mulheres trabalhadoras e intelectuais que militavam no
movimento anarquista e no Partido Comunista, com o objetivo de lutar pela
libertação da mulher de forma radical, tendo a exploração do trabalho feminino como
peça central das lutas.
Os estudos sobre gênero emergem inseridos principalmente no movimento
feminista acadêmico, no final do século XX, entre as décadas de 1970 e 1980. Seu
objetivo advém da necessidade de desnaturalizar e historicizar as desigualdades
entre homens e mulheres, analisadas, pois, como construções sociais, determinadas
pelas e nas relações sociais. (CISNE, 2012).
As hipóteses explicativas sobre as origens da opressão feminina foram
sendo gradualmente questionadas e abandonadas na busca de ferramentas
conceituais mais apropriadas para desnaturalizar essa opressão. Esse
quadro de efervescência intelectual é o contexto no qual se desenvolve o
conceito de gênero. (PISCITELLI, 2002 apud CISNE, 2012, p. 77):
12
Berta Lutz, cientista, líder feminista e política paulista (1894-1976). É uma das pioneiras da
luta pelo voto feminino e pela igualdade de direitos entre homens e mulheres no país. Em 1919
começa a se destacar na busca de igualdade de direitos jurídicos entre os sexos, ao se tornar a
segunda mulher a ingressar no serviço público brasileiro, após ser aprovada em concurso do Museu
Nacional, no Rio de Janeiro.
37
Apesar de este conceito ser de relevante importância para as mulheres, o
contexto de seu surgimento também é marcado por perigos de atraso para o
movimento feminista e também para a classe trabalhadora, pois destaca as ligações
de poder em detrimento da busca das causas da dominação e opressão.
O conceito de gênero veio também no sentido de analisar de maneira
relacional a subordinação da mulher ao homem, ou seja, os estudos sobre
as mulheres não deviam apenas limitar-se à categoria mulher, mas esta
deve sempre ser analisada de forma relacional ao homem. Portanto gênero
se constitui como uma categoria relacional. (CISNE, 2012, p. 78).
O conceito de gênero desde a sua origem e no decorrer do seu
desenvolvimento que ainda está em andamento, foi e é dotado de diferentes
aspectos. Esta diversidade é provocada tanto pelas polêmicas teóricas e políticas no
interior das ciências humanas e exatas, quanto por ser uma categoria que possui um
estudo relativamente recente. (CISNE, 2012, p. 79).
A luta por equidade e liberdade ainda se configuram como as principais
linhas de pensamento, atualmente criam-se novas reivindicações, como o
questionamento do papel da mulher na família, no trabalho e na sociedade. As lutas
mais recentes se configuram nas transformações das relações humanas baseadas
na discriminação social e de gênero.
No Brasil, o impulso dos movimentos feministas e de mulheres e a
receptividade da academia a essa temática inicia-se a partir dos anos 1970.
No entanto, enquanto no final da década de 80 ocorre um refluxo da
viabilidade do movimento, multiplicam-se os estudos sobre o assunto no
âmbito universitário. (OSTERNE, 2001, p. 117).
O movimento feminista brasileiro conquistou, nas últimas décadas, a
ampliação dos direitos da mulher. Suas ações foram decisivas para articular o
caminho da igualdade entre os gêneros, que, apesar de todos os avanços, ainda
não é plenamente garantida.
A categoria de gênero não será usada para substituir referencias à mulher
ou ao homem, mas para designar a dimensão inerente de uma escolha
cultural e de conteúdo relacional, que rejeite o caráter fixo e permanente da
posição binária entre masculino e feminino. O reconhecimento da
importância de sua historicidade e de seu permanente estado de
desconstrução deverá evitar sua aceitação como obvia ou de presente na
natureza das coisas. (OSTERNE, 2001, p. 118).
Carloto (2006) concorda com Osterne (2001) ao aborda que:
Embora o conceito gênero tenha ganhado força e destaque enquanto
instrumento de análise das condições das mulheres, não deve ser utilizado
como sinônimo de “mulher”. O conceito é usado tanto para distinguir e
38
descrever as categorias mulher e homem, como para examinar as relações
estabelecidas entre eles. (p. 142)
Cabe ressaltar ainda que gênero e sexo não tem o mesmo sentido, pois
gênero seria a construção social e sexo seria o que é determinado biologicamente,
fisiologicamente, portanto natural. (CISNE, 2012, p. 79). Referente à relação de
gênero e sexo Osterne (2001) faz a seguinte menção.
As relações de gênero, portanto, não são consequências da existência de
dois sexos, machos e fêmea. O vetor caminha em sentido contrário, ou seja,
do social para os indivíduos. Os indivíduos transformam-se em homens e
mulheres por intermédio das relações de gênero. (p.119)
Apesar do estudo de gênero está sempre coligado às coisas referentes ao
feminino. Assim, enfatiza a perspectiva relacional entre mulheres e homens, ou seja,
só alcançará verdadeiro sentido se recuperar a experiência conjunta entre homens e
mulheres em toda a sua complexidade.
O feminismo era um protesto contra a exclusão da mulher: Seu objetivo era
eliminar as “diferenças sexuais” na política, mas a reivindicação tinha de ser
feita em nome das “mulheres” (um produto do próprio discurso da „diferença
sexual‟). Na medida em que o feminismo defendia as „mulheres‟, acabava
por alimentar a „diferença sexual‟ que procurava eliminar. Esse paradoxo –
a necessidade de, a um só tempo, aceitar e recusar a “diferença sexual” –
permeou o feminismo como movimento político por toda a sua história.
(SCOTT, 2002 apud PEIXOTO, 2010, p. 121).
De acordo com Peixoto (2010):
A partir da década de 1970, o movimento feminista contemporâneo teve
como expressividade, as lutas pela afirmação das diferenças e da entidade,
sobretudo, ao abordar questões mais específicas da condição feminina.
Nessa época, surgem às demandas por novos direitos, tais como os direitos
sexuais e reprodutivos. (p. 120-121).
Na década de 1970 aumentou significativamente à quantidade de mulheres
que adentraram ao mercado de trabalho, assim como o seu nível de escolaridade,
as chefias femininas nos lares brasileiros é um fenômeno cada vez mais aparente e
frequente.
As condições adversas das mulheres chefes de família de administrar
duplamente a sua participação nas esferas produtivas e reprodutivas, sejam estas
pertencentes a qualquer estrutura e arranjo familiar, ainda encontram-se em
disparidade em relação aos homens. Um dos exemplos concretos dessa
desigualdade refere-se à inserção em condições desiguais de tratamento, tempo,
mobilidade e remuneração, em relação aos homens no mercado de trabalho.
39
A segregação no mercado de trabalho destinou às mulheres os empregos
mais precários, geralmente informais ou em tempo parcial, salários mais
baixos, menor cobertura dos serviços de seguridade social e dificuldades de
acesso aos direitos trabalhistas. (PEIXOTO, 2010, p. 109).
Peixoto (2010) ressalta algumas razões exposta por Lavinas (1999) que
podem explicar o aumento do sexo feminino no mercado de trabalho.
Uma delas decorre da amplitude do processo de reestruturação produtiva,
iniciado nos anos 1980, e que afeta, sobretudo o mercado industrial, cuja
redução tem rebatimentos negativos, incidindo mais nos trabalhadores
homens que compõem a maior parte da mão-de-obra desse setor.
Outro fato, segundo essa autora, que estimula a inserção produtiva das
mulheres é a expansão da economia de serviços. Uma terceira questão
refere-se à maior flexibilização no mercado de trabalho e a precarização das
relações de trabalho, com o aumento da ocupação por conta própria e da
informalidade em geral. (p. 109).
De acordo com a Organização Internacional do Trabalho - OIT13 em estudo
publicado em março 2010 a taxa de participação das mulheres no mercado de
trabalho aumentou de 50,2% para 51,7% entre 1980 e 2008, com uma progressão
mais sentida nos anos 1980 e no início dos anos 1990. O percentual de mulheres
que entram no mercado de trabalho teve um significativo aumento nos últimos 30
anos, mas elas seguem ganhando menos que os homens, e geralmente não gozam
dos mesmos benefícios.
Compartilho com Cisne (2012) ao refletir que:
Há uma falsa e vulgar ideia de que as mulheres já atingiram um patamar de
igualdade social com os homens, se libertaram, adquiriram independência,
já ocupam grande parte do mercado de trabalho, enfim já temos uma nova
mulher. Esses pensamentos, que infelizmente vêm crescendo na
sociedade, contribuem para a argumentação de que agora só se precisa de
“um novo homem”, o que significaria a necessidade de se trabalhar muito
mais a masculinidade. (p. 85).
Estudos apontam que na atualidade há dois fatos que merecem a atenção
em relação à questão de gênero no Brasil: o aumento número de domicílios com
chefia feminina e a consistente presença da mulher no mercado de trabalho.
É complicado afirmar qual o motivo pela entrada da mulher no mercado de
trabalho e o aumento da chefia feminina em domicílios, pelo fato dos dois
movimentos decorrem de varias razões que se ligam entre si, entre as causas estão:
a busca pela emancipação feminina, o aumento de importância do setor de serviços,
13
Disponível em: http://noticias.r7.com/economia/noticias/mulheres-sao-51-7-do-mercado-detrabalho-mundial-20100305.html acesso em 26 maio 2014.
40
a importância da renda feminina para complementação da renda familiar, maior
desagregação familiar e, até mesmo, opção pessoal, entre outros motivos.
Na década de 1980, o movimento de mulheres no Brasil era uma força
política e social concretizada. Os conceitos feministas expandiram-se no cenário
social do país, fruto do clima receptivo das demandas de uma sociedade que se
modernizava. Os grupos feministas propagaram-se pelo país. Houve uma
expressiva penetração do movimento feminista em partidos e sindicatos entre outros
que vieram a legitimar a mulher como sujeito social.
Durante a década de 1980, as mulheres organizadas adentram os partidos
políticos, sindicatos e associações comunitárias. Destacam-se, nesse
período, as reivindicações voltadas para o enfrentamento da violência
doméstica. Nos anos de 1990, muitos grupos feministas ganharam uma
forma mais especializada transformando-se em organizações nãogovernamentais (ONGs) e, mediante canais institucionalizados, buscaram
influenciar as políticas públicas no tocante às questões das mulheres.
(PEIXOTO, 2010, p. 121-122).
No ponto de visto governamental, no ano de 2003 inicia-se o governo Lula,
momento em que foram fundadas algumas políticas públicas de superação das
disparidades de gênero, na esfera do Estado. Em 2003 foi criado a Secretaria
Especial de Políticas para as Mulheres e em 2004 e 2007 foram realizadas as
Conferências Nacionais de Políticas para as Mulheres, que resultaram em Planos
Nacionais de Políticas para as Mulheres.
Com efeito, nesse percurso, percebe-se que o movimento de mulheres e
feminista tem contribuído para vários avanços no tocante ao fortalecimento
da cidadania feminina, sobretudo, mediante os avanços recorrentes da
ampliação dos direitos das mulheres. É inegável, pois, o caráter ousado e o
enfrentamento às práticas patriarcais desse movimento que, sob as
máximas da igualdade e da diferença continua contribuindo para a
efetivação de valores e comportamentos humanos mais justos. (PEIXOTO,
2010, p. 123).
Nesse período, entre as recentes lutas estavam: a luta pelo reconhecimento
dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais das mulheres; necessidade
do reconhecimento do direito universal à educação, saúde e previdenciária; defesa
dos direitos sexuais e reprodutivos; reconhecimento do direito das mulheres sobre a
gestação, com acesso de qualidade à concepção e/ou contracepção; a
descriminalização do aborto como um direito de cidadania e questão de saúde
41
pública14. Algumas dessas lutas como pode se ver não é algo tão atual, porém, são
alvos de uma luta constante.
No período de 2001 a 2009, os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios - PNAD evidenciam a continuidade do aumento da proporção de famílias
chefiadas por mulheres no Brasil.
Essas famílias, no entanto, são bastante heterogêneas e apresentam as
mais diversas configurações: mulheres solteiras, separadas ou viúvas com
filhos e tendo ou não parentes e/ou agregados em casa; mulheres solteiras,
separadas ou viúvas, sem filhos com presença ou não de parentes e/ou
agregados; mulheres solteiras, separadas ou viúvas morando sozinhas; e,
ainda, mulheres casadas chefiando a família mesmo tendo um marido ou
companheiro em casa, com ou sem filhos. (IPEA, 2009, p. 05).
Na tentativa de explicar essa “nova chefia”, o Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada - IPEA (2009) nos informa que o reconhecimento como chefe
da família pode ser dado a quem assume a responsabilidade com os cuidados da
casa e com os filhos ou, ainda, a quem responde mais fortemente pela manutenção
econômica do lar... O total de famílias chefiadas por mulheres representava 35,2%
dos arranjos em 2009, enquanto as chefiadas por homens eram 64,8% (p. 05 e 07).
Com a introdução do conceito de „pessoa de referência‟ em substituição ao
de „chefe do domicílio‟, a PNAD transferiu ao respondente a tarefa de
nominar a pessoa, homem ou mulher, responsável pelo domicílio. Essa
mudança da perspectiva de gênero foi um salto importante, pois a noção de
chefia, pela matriz cultural dominante, poderia ser mais facilmente atribuída
à figura masculina do domicílio, marido ou pai... (IPEA, 2009, p. 05).
O aumento proporcional nos novos arranjos pode estar associado, portanto,
ao potencial de autonomia que as mulheres têm assumido nas relações familiares e
na esfera pública.
Resultado de um forte patriarcalismo, o lugar historicamente reservado as
mulheres na sociedade brasileira foi a casa e o cuidado com os filhos, dentro de
uma estrutura opressiva. A divisão sexual do trabalho e fruto dessa vertente
presente no desenvolvimento da nossa sociedade.
O patriarcado estabelece diferenças entre comportamentos femininos e
masculinos. Nesse contexto as mulheres sofrem repressões especialmente no
campo da sexualidade, o modelo patriarcal que há tempos imperou na sociedade
14
Disponível
em:
igualdade-dos-direitos.
http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2012/02/feminismo-pela
42
brasileira caracterizava-se pela limitação e obrigação feminina de procriação tendo
como fins a herança e a sucessão, e ao homem a liberdade sexual.
Articulando essa discussão com o nosso objeto, o Programa Bolsa Família
materializa essa ideia da mulher como a melhor indicada para os cuidados com a
família e com o lar, à medida que as mulheres são foco de administração do
beneficio, a figura feminina são as titulares do programa e portadoras do cartão de
repasse de renda. Compreendendo que as mulheres são as mais indicadas para a
tarefa de administrar a renda recebida, a fim de atender as reais necessidades da
família.
O papel de cumprir as condicionalidades presentes no PBF, relacionados à
saúde e educação, também é atribuído às mulheres, além da responsabilidade de
participar dos grupos de atividades desenvolvidas pelo CRAS. Dessa forma as
mulheres utilizam a maioria do seu tempo em atividades não remuneradas e
socialmente desvalorizadas, restringindo-se mais uma vez ao âmbito privado da vida
familiar.
Na atualidade a mulher realiza diversas tarefas que antes eram privativas
aos homens, até mesmo o papel de chefe de família. Este em particular tem um
valor singular visto que a família é o primeiro lugar social do ser humano. A mulher
no decorrer dos anos, exerceu múltiplos papéis até conseguir chegar ao cenário
atual, objetivando serem independentes e respeitadas, as mulheres alcançaram até
o cargo que era garantido ao homem, o de chefe de família.
Para finalizar este capitulo deixamos a seguinte mensagem: a consciência
de ser mulher não é dirigida aos homens e nem mesmo contra eles, mas dá
preferência ao relacionamento da mulher consigo mesma, à conquista da sua
subjetividade.
43
4. A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA
4.1 Uma breve contextualização dos cenários políticos e o histórico da política
de assistência social no Brasil
No Brasil, a assistência social se constituiu nas marcas deixadas pelo
escravismo, a desqualificação da classe trabalhadora, pelas lutas e movimentos
sociais feitos por esta classe, o desenvolvimento desigual, pelas relações de
compadrio, clientelismo e o patrimonialismo, forma de relações de trato com a
população que direcionam a política na sociedade brasileira, havendo seus reflexos
ainda na atual conjuntura.
Antes de 1930, a economia brasileira era agroexportadora e o sistema
político caracterizado pela ausência de planejamento social. O Estado
quase não geria o processo de provisão social, deixando esse mister com
as seguintes instâncias: o mercado – que atendia a preferências e
demandas individuais-; a iniciativa não mercantil – que dava respostas
tópicas e informais aos reclamos da pobreza-; e a polícia, que controlava,
repressivamente, a questão social então emergente. (PEREIRA, 2007, p.
127 e 128).
As instituições sociais e assistenciais, a partir de 1930, foram utilizadas
como instrumentos de controle politico e social. Essa foi à estratégia utilizada pelo
Estado para manter as relações sociais estáveis e evitar conflitos sociais.
Em 1945, após 15 anos no poder, Getúlio Vargas caiu, e abriu-se um novo
período no país, de intensas turbulências econômicas, politicas e sociais.
Afinal, o Brasil tornou-se um país mais urbanizado, com uma indústria de
base já significativa, apesar de a vocação agrário-exportadora permanecer
forte, e com um movimento operário e popular mais maduro e concentrado,
com uma agenda de reinvindicações extensa. (BEHRING, 2008, p. 109).
A primeira regulação da assistência social no Brasil em 1938 foi com a
instalação do Conselho Nacional de Serviço Social-CNSS, órgão que reproduzia o
clientelismo, objeto de escândalos nacionais, processos de corrupção e subvenções
às instituições fantasmas.
O CNSS foi criado como um dos órgãos de cooperação do ministério da
educação e saúde. Formado por figuras ilustres da sociedade de cultura filantrópica
e substituindo o governante na decisão quanto às quais organizações dar auxílio.
Foi à primeira forma de presença da assistência social do Estado brasileiro, ainda
44
que na função subsidiária de concessão às organizações que prestavam amparo
social.
O CNSS foi, portanto, a primeira forma de presença da assistência social na
burocracia do Estado republicano brasileiro, ainda que na função subsidiaria
de subvenção às organizações sociais que prestam amparo social. Assim,
atuou como uma forma pautada na ajuda ao setor privado, sem relação
direta com a população. Desta maneira, a regulação estatal da assistência
social começa na década de 30, com Getúlio Vargas. (MESTRINER, 2011,
p. 66-67).
Após quatro anos do CNSS, foi criado em 1942 a primeira instituição de
assistência social com traços de público e privado, denominada de Legião Brasileira
de Assistência-LBA gerida pelas primeiras damas15.
Essa instituição foi criada para atender as famílias dos pracinhas envolvidos
na Segunda Guerra e era coordenada pela primeira-dama Sra. Darci
Vargas, o que denota aquelas características de tutela, favor e clientelismo
na relação Estado e sociedade no Brasil, atravessando a constituição da
politica social. Posteriormente, a LBA vai se configurando como instituição
articuladora da assistência social no Brasil, com uma forte rede de
instituições privadas conveniadas, mas sem perder essa marca
assistencialista, fortemente seletiva e de primeiro-damismo, o que só
começará a se alterar muito tempo depois com a constituição de 1988.
(BEHRING, 2008, p. 107 e 108).
Criada com o objetivo de ajudar as famílias dos soldados enviados à
Segunda Guerra Mundial, a LBA teve em sua gênese a presença das mulheres e foi
marcada pelo patriotismo, após o fim do conflito mundial. A instituição continuou
suas ações filantrópicas no atendimento às famílias carentes da época, guiadas
pelos interesses do governo.
A assistência social funcionava como ação social, ato de boa vontade e não
como direito. Foi extinta somente em 1995 no governo de Fernando Henrique
Cardoso.
A assistência social como campo de ação governamental registra no Brasil
duas ações inaugurais: a primeira em 1937 com a criação do CNSS –
Conselho Nacional de Serviço Social; e, a segunda, na década de 40 do
século XX, com a criação da Legião Brasileira de Assistência, a LBA.
(BRASIL, 2005, p. 09).
Em 1946 foi derrotado o Estado Novo, e entrou o governo de Dutra. O país
passou por uma fase de redemocratização, contrária ao governo de Vargas. Ao que
se refere aos direitos sociais, foi reconhecido o direito a greve e mantidas as
15
Primeira-dama no Brasil é o título que recebe a esposa do presidente da República do Brasil.
45
garantias dos(as) trabalhadores(as) já conquistados na constituinte de 1934, não
havendo nenhum retrocesso no campo dos direitos dos cidadãos.
A Constituição de 1946 suprimiu a repressão profissional, prevista na
constituição de 1934, que trazia a marca do corporativismo de inspiração fascista.
(FAUSTO, 2008, p. 400).
Juscelino Kubitschek, em 1955, assumiu a Presidência da República, com o
propósito de desenvolver o Brasil. Apresentou ao povo brasileiro o seu Plano de
Metas,
cujo
lema
era
“cinquenta
anos
em
cinco”,
a
ideia
nacional
desenvolvimentista, que ficou conhecida como os anos de ouro.
Na memoria dos brasileiros, os cinco anos do governo Juscelino são
lembrados como um período de otimismo associado a grandes realizações,
cujo maior exemplo é a construção de Brasília. Na época, a fundação de
uma nova capital dividiu as opiniões e foi considerada um tormento pelo
funcionalismo público da antiga capital da República, obrigado a transferirse para o Planalto Central do país. (FAUSTO, 2008, p. 429 e 430).
Juscelino Kubitschek propiciou a integração do desenvolvimento industrial
com outros setores, como transporte, educação e energia entre outros. A cidade de
Brasília foi construída em quatro anos, e passou a ser a nova capital do país, nova
sede do governo.
Foi em sua gestão, que se criou a Superintendência do Desenvolvimento do
Nordeste – SUDENE, como resultado da preocupação governamental com as
questões regionais, para reduzir a desigualdade socioeconômica dessa região em
relação a Centro-Sul do país. Esse órgão atuava no combate à seca, com medidas
de curto prazo, principalmente de caráter assistencial e de longo prazo na
construção de açudes.
Segundo Behring (2008, p. 111), o golpe militar de 1964 instaurou uma nova
ditadura que durou 20 anos e impulsionou um novo momento de modernização
conservadora no Brasil, com fortes consequências para a politica social. O período
de 1964 a 1985 envolveu vários governos, iniciando com o governo de Castelo
Branco e seguindo até o de Figueiredo. Pereira aponta quais foram esses governos:
•1964-1966: governo Castelo Branco, que instituiu o modelo autoritário,
rompendo com a prática populista/desenvolvimentista anterior;
•1967-1969: governo Costa e Silva, que afirmou o modelo autoritário e
preparou o caminho para a sua continuidade;
•1970-1973: governo Médici, que aprofundou e enrijeceu o modelo
autoritário;
•1974-1979: governo Geisel, que vivenciou o início da abertura política;
46
•1980-985: governo Figueiredo, que participou da continuidade da abertura
política (PEREIRA, 2008, p. 134 – 135).
O período de ditadura foi marcado por generais se alternado no poder e
decidindo os destinos da nação, intervalo que ficou conhecido como anos de
chumbo. Os militares consideravam que para ser um país moderno era necessário o
inicio da ditadura, que resultou em, vinte anos de autoritarismo. O período de 1969 e
1973 foi marcado por intenso crescimento da economia. Nesta época o Brasil era
governado pelo general Médici. O termo “milagre economico” está relacionado com
este rápido e ordinário desenvolvimento econômico pelo qual passou o Brasil neste
período.
Assim, ao longo do período 1964-84, o Brasil transforma-se em verdadeiro
Estado unitário, ficando o poder concentrado no Executivo federal, que usa
a ideologia da segurança nacional como justificativa para todas as medidas
de força e arbitrariedade adotadas e como eixo converge de todas as
políticas, inclusive a econômica. Por meio de atos institucionais, amplia de
tal forma a capacidade de intervenção governamental, que exclui da luta
politica e das decisões econômicas sociais os demais poderes, estados,
municípios, a sociedade em geral e as classes subalternas. (MESTRINER,
2011, p. 153 e 154).
Apenas em meados da década de 1980, após várias manifestações da
população, forte tensão da sociedade civil em questionar o período de forte censura
e autoritarismo do período militar, a sociedade brasileira levantou a bandeira da
democracia como forma de amenizar os conflitos nacionais, as politicas sociais
nesse, foram impostas para acalmar os ânimos da sociedade, e não como forma de
consciente de atender as necessidades sociais, que se aprofundavam no contexto
de pobreza, miséria, inflação desenfreada e desigualdades sociais.
[...] graças à crescente mobilização da sociedade, alguns avanços civis e
políticos se fizeram notar: anistia, em 1979, com a restrição dos direitos civis
e políticos aos cidadãos cassados pelo regime militar, eleições para
governadores, em 1982, e ampla campanha popular pelas „Diretas Já‟, isto
é, pelas eleições diretas para a Presidência da República. (PEREIRA, 2007,
p. 148).
No ano de 1983, inicia-se um grande movimento nunca visto no país,
denominado “diretas já”, o movimento lutava pelo direito de eleições diretas para a
presidência da República.
Graças à mobilização da sociedade, as politicas sociais tornaram-se
centrais, nessa década, na agenda de reformas institucionais que culminou
com promulgação da Constituição Federal de 1988. Nesta Constituição, a
reformulação formal do sistema de proteção social incorporou valores e
critérios que, não obstante antigos no estrangeiro, soaram, no Brasil como
inovação semântica, conceitual e politica. Os conceitos de „direitos sociais‟,
47
„seguridade social‟, „universalização‟, „equidade‟, „descentralização políticoadministrativa‟, „controle democrático‟, „mínimos sociais‟, dentre outros,
passaram, de fato, a constituir categorias-chaves norteadoras da
constituição de um novo padrão de politica social e ser adotado no país.
(MESTRINER, 2008, p. 152).
O período de 1985 a 1990 foi o responsável por contornar os problemas
econômicos do país e garantir o retorno das liberdades democráticas. A partir de
então, iniciou-se um novo período na história política do Brasil conhecido como
“Nova República”, repercutindo nas políticas sociais, e no reconhecimento da
Assistência Social como “[...] direito do cidadão e dever do Estado [...]” (Art. 1º).
Assim, no final dos anos de 1980, temos como contexto um momento de
exigência de práticas inovadoras do setor assistencial para as novas demandas da
realidade do país que estava em transição democrática. Um crescente número da
população pedia respostas mais efetivas de uma política assistencial. As discussões
se intensificaram alterando o caminho para se formular uma política pública de
assistência social para direitos sociais e, mais especificamente, do direito à
Seguridade Social, e nela, a garantia à saúde, à assistência social e previdência
social na Constituição Federal.
As políticas sociais são também um espaço de lutas cujos resultados variam
em função das diferentes conjunturas históricas. Ou seja, existem
momentos de potencialização de conflitos, onde a fragmentação de lutas se
aglutina em torno de oposições e adquire caráter coletivo. Por decorrência
deste movimento, as políticas sociais particularizam-se em diferentes
momentos históricos conforme o grau de prevalência dos interesses da
força de trabalho em suas proposições. (SPOSATI, 2010, p. 71).
Dessa forma, apontando as possibilidades de construção de uma esfera
pública e democrática, ou seja, uma nova forma de compreender a Assistência
Social.
4.2 Instrumentos normativos: o que aconteceu com a Assistência Social
brasileira após 1988?
A Assistência Social como política de proteção social configura-se como
uma nova situação para o Brasil. Ela significa garantir a todos, que dela
necessitam, e sem contribuição prévia a provisão dessa proteção. Esta
perspectiva significaria aportar quem, quantos, quais e onde estão os
brasileiros demandatários de serviços e atenções de assistência social.
(BRASIL, MDS/PNAS 2004).
48
A Constituição Federal de 1988 surge como o primeiro instrumento legal a
determinar transformações estruturais e políticas, e o marco legal para a
compreensão das transformações e redefinições do perfil histórico da assistência
social no país porque a reconhece como política social, junto com as políticas de
saúde e de previdência social, compõe o tripé do sistema de seguridade social
brasileiro, ingressando no campo dos direitos (art. 6º C.F/88), da universalização,
dos acessos e da responsabilidade estatal previsto no art. 194.
A Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de
iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os
direitos relativos à saúde, à previdência e à Assistência Social.
Parágrafo único – Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a
seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
I – universalização da cobertura e do atendimento;
II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações
urbanas e rurais;
III – seletividade e distributividade na prestação de benefícios e serviços;
IV – irredutibilidade do valor dos benefícios;
V – equidade na forma da base de financiamento;
VII – caráter democrático e descentralizado da administração, mediante
gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos
empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgão colegiados.
(BRASIL, 1988, p. 55).
A CF/88 assumiu duas vias para o acesso da população às políticas de
Seguridade Social: a contributiva que se refere à Previdência Social aos
trabalhadores(as) e a não contributiva de caráter universal no caso da Saúde.
Temos no capitulo da Seguridade Social, na seção especifica para a
Assistência Social previsto no Art. 203 da CF que prevê os destinatários desta e seu
segmento de ordem social:
A assistência social será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por
objetivos:
I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à
velhice;
II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III – a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a
promoção de sua integração à vida comunitária;
49
V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa
portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme
dispuser a lei. (BRASIL, 1988, p. 57).
No artigo seguinte a CF estabelecem as fontes de custeio das ações de
forma descentralizada politico-administrativo responsabilizando as três esferas do
governo, como também as diretrizes da politica nas quais se devem adotar a
participação da população nas suas ações. A seguir art. 204 da CF:
As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas
com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195,
além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes:
I – descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as
normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos
respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a
entidades beneficentes e de assistência social;
II – participação da população, por meio de organizações representativas,
na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.
Parágrafo único. É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular a
programa de apoio à inclusão e promoção social até cinco décimos por
cento de sua receita tributária líquida, vedada a aplicação desses recursos
no pagamento de:
I – despesas com pessoal e encargos sociais;
II – serviço da dívida;
III – qualquer outra despesa corrente não vinculada diretamente aos
investimentos ou ações apoiados. (BRASIL, 1988).
As disposições expressas na Constituição Federal de 1988 possibilitam um
cenário de mudanças no contexto brasileiro ao instituir um Sistema de Proteção
Social na órbita dos direitos sociais e de cidadania. Porém, permanecem diversas
formas de obstáculos para a sua concretização.
Cinco anos após a CF, a Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS
inaugura uma nova formatação para a assistência social no cenário nacional,
enquanto Política Pública. Regulamentou o disposto nos artigos 203 e 204 da CF de
1988, dispondo da organização da Assistência Social. Propõe romper com uma
longa tradição cultural e política de filantropia e benemerência.
A LOAS apresenta 42 artigos em seis capítulos, nos quais define a política e
seus objetivos, estabelece seus princípios e diretrizes: universalização e igualdade
de acesso, descentralização e participação. Trata da organização e gestão da
50
assistência social e apresenta elementos do sistema descentralizado e participativo
da assistência social: conselhos, planos, fundos de assistência social nos três entes
federados.
A LOAS deixa claro que,
A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de
Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada
através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da
sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas. (LOAS,
1993, Art. 1º)
A LOAS foca seu atendimento aos cidadãos em situação de vulnerabilidade
e pobreza, considerando os níveis de desigualdade que existem no Brasil.
Entendendo que problemas provenientes da histórica exclusão social jamais
poderão ser enfrentados por meio de um assistencialismo meramente complementar
e emergencial, a LOAS objetivou o fortalecimento da concepção de Assistência
Social e reconhecimento desta como função do governamental e política.
A assistência social tem por objetivos:
I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à
velhice;
II - o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III - a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a
promoção de sua integração à vida comunitária;
V - a garantia de 1 (um) salário mínimo de benefício mensal à pessoa
portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. (BRASIL,
1993, Art. 2º)
Em 2003 foi criado o Ministério de Assistência Social no governo do
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e em dezembro do mesmo ano foi realizada a
IV Conferencia Nacional de Assistência Social com a discussão para a construção e
implantação do Sistema Único de Assistência Social – SUAS no Brasil.
O SUAS tem suas bases de implantação consolidadas em 2005, por meio da
sua Norma Operacional Básica do SUAS – NOB/Suas16, que apresenta as
competências de cada órgão federado e os eixos de implementação e consolidação
da iniciativa.
16
A NOB/SUAS, aprovada em 2005, pelo CNAS, apresenta os eixos estruturantes para a
realização do pacto a ser efetivado entre os três entes federados e as instancias de articulação,
pactuação e deliberação, visando à implementação e consolidação do Sistema Único de Assistência
Social – SUAS no Brasil. (BRASIL, 2005, p. 75).
51
No ano seguinte foi criado o Ministério de Desenvolvimento Social e
Combate a Fome – MDS que acelerou o processo de implantação do SUAS, que
germina como resposta à sociedade brasileira articulada a rede de Proteção Social.
Surge como um novo modelo de gestão que busca estruturar a operacionalização da
politica através da execução de serviços, programas, projetos e benefícios sócios
assistenciais, visando garanti-la como direito e responsabilidade do Estado.
O SUAS é coordenado pelo Ministério de Desenvolvimento Social e combate
a fome – MDS, tem sua gestão composta pelo poder público e pela sociedade civil,
que participa diretamente do processo de gestão compartilhado do SUAS.
A Política Nacional de Assistência Social aprovada pela Resolução n°15, de
15 de outubro de 2004, do CNAS, expressa a materialidade das diretrizes da Lei nº
8.742, de 7 de dezembro de 1993, a Lei Orgânica da Assistência Social.
Política Nacional de Assistência Social – PNAS busca incorporar as
demandas presentes na sociedade brasileira no que tange à
responsabilidade política, objetivando tornar claras suas diretrizes na
efetivação da assistência social como direito de cidadania e
responsabilidade do Estado. (BRASIL, 2004, p. 13).
A PNAS é resultado de um processo histórico e coletivo, o qual defendeu a
assistência social como uma politica de inclusão social. Suas diretrizes foram
baseadas na Constituição Federal de 1988 e na LOAS e tem como objetivos:
I - Prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social
básica e, ou, especial para famílias, indivíduos e grupos que deles
necessitar;
II - Contribuir com a inclusão e a eqüidade dos(as) usuários(as) e grupos
específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços socioassistenciais
básicos e especiais, em áreas urbana e rural;
III - Assegurar que as ações no âmbito da assistência social tenham
centralidade na família, e que garantam a convivência familiar e
comunitária; (BRASIL, 2005, p. 33).
Na PNAS está definido que o SUAS é o novo modelo de gestão da
assistência social e que tem, dentre suas diretrizes:
I - Descentralização político-administrativa para os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios e comando único das ações em cada esfera de
governo, respeitando-se as diferenças e características socioterritoriais
locais;
II - Participação da população, por meio de organizações representativas,
na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis;
52
III - Primazia da responsabilidade do Estado na condução da política de
assistência social em cada esfera de governo;
IV - Centralidade na família para concepção e implementação dos
benefícios, serviços, programas e projetos.(BRASIL, 2005, p. 32 - 33)
Os(as) usuários(as) da PNAS são os:
Cidadãos e grupos que se encontram em situações de vulnerabilidade e
riscos, tais como: famílias e indivíduos com perda ou fragilidade de vínculos
de afetividade, pertencimento e sociabilidade; ciclos de vida; identidades
estigmatizadas em termos étnico, cultural e sexual; desvantagem pessoal
resultante de deficiências; exclusão pela pobreza e, ou, no acesso às
demais políticas públicas; uso de substâncias psicoativas; diferentes formas
de violência advinda do núcleo familiar, grupos e indivíduos; inserção
precária ou não inserção no mercado de trabalho formal e informal;
estratégias e alternativas diferenciadas de sobrevivência que podem
representar risco pessoal e social. (BRASIL,2005).
A PNAS estrutura a Assistência Social em níveis de Proteção Social e
complexidade, com perspectiva socioterritorial considerando diversidades locais e
regionais e tem como base a referência à família como espaço privilegiado de
proteção de socialização primária.
A organização dos níveis de Proteção Social está dividida em Básica e
Especial e dissolve a noção de que os(as) usuários(as) da PNAS sejam cidadãos e
grupos que se encontram em situação de vulnerabilidade e risco. Contudo, ao atuar
com situações de desigualdade social ou mesmo vulnerabilidade e risco social será
requisitada uma atenção especifica.
A proteção social básica tem como objetivos prevenir situações de risco por
meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de
vínculos familiares e comunitários. Destina-se à população que vive em situação de
vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação e, ou, fragilização de vínculos
afetivos – relacionais e de pertencimento social.
Prevê o desenvolvimento de serviços, programas e projetos locais de
acolhimento, convivência e socialização de famílias e de indivíduos,
conforme identificação da situação de vulnerabilidade apresentada. Deverão
incluir as pessoas com deficiência e ser organizados em rede, de modo a
inseri-las nas diversas ações ofertadas. Os benefícios, tanto de prestação
continuada como os eventuais, compõem a proteção social básica, dada a
natureza de sua realização. (BRASIL, 2005, p. 34).
As ações são prestadas de forma direta prioritariamente pelo Centro de
Referência da Assistência Social – CRAS que é uma unidade pública estatal de
base territorial, localizado em áreas de vulnerabilidade social, é a principal porta de
entrada para o SUAS.
53
O CRAS atua com famílias e indivíduos em seu contexto comunitário,
visando a orientação e o convívio sociofamiliar e comunitário. Neste sentido
é responsável pela oferta do Programa de Atenção Integral às Famílias. Na
proteção básica, o trabalho com famílias deve considerar novas referências
para a compreensão dos diferentes arranjos familiares, superando o
reconhecimento de um modelo único baseado na família nuclear, e partindo
do suposto de que são funções básicas das famílias: prover a proteção e a
socialização dos seus membros; constituir-se como referências morais, de
vínculos afetivos e sociais; de identidade grupal, além de ser mediadora das
relações dos seus membros com outras instituições sociais e com o Estado.
(BRASIL, 2005, p.35).
São considerados serviços de proteção básica de assistência social aqueles
que potencializam a família como unidade de referência, fortalecendo seus vínculos
internos e externos, visam à convivência, a socialização e o acolhimento, em
famílias cujos vínculos familiar e comunitário não foram rompidos, bem como a
promoção da integração ao mercado de trabalho, tais como:
• Programa de Atenção Integral às Famílias.
• Programa de inclusão produtiva e projetos de enfrentamento da pobreza.
• Centros de Convivência para Idosos.
• Serviços para crianças de 0 a 6 anos, que visem o fortalecimento dos
vínculos familiares, o direito de brincar, ações de socialização e de
sensibilização para a defesa dos direitos das crianças.
• Serviços socioeducativos para crianças, adolescentes e jovens na faixa
etária de 6 a 24 anos, visando sua proteção, socialização e o fortalecimento
dos vínculos familiares e comunitários.
• Programas de incentivo ao protagonismo juvenil, e de fortalecimento dos
vínculos familiares e comunitários.
• Centros de informação e de educação para o trabalho, voltados para
jovens e adultos (BRASIL, 2005, p. 36).
O CRAS possui duas funções exclusivas: a gestão territorial da rede
socioassistencial de Proteção Social Básica e a oferta do Serviço de Proteção e
Atendimento Integral a Família – PAIF, que é o principal serviço ofertado por este
equipamento, visa fortalecer os vínculos familiares e comunitários bem como
prevenir situações de risco social.
Outra
regulamentação
muito
importante
no
que
se
refere
à
operacionalização da política de assistência social é a resolução nº 109, de 11 de
novembro
de
2009,
que
aprova
a
Tipificação
Nacional
de
Serviços
Socioassistenciais representando uma importante conquista para a assistência
social brasileira, alcançando um novo patamar e estabelecendo tipologias que, sem
dúvidas,
corroboram para ressignificar a oferta e a garantia do
socioassistencial.
direito
54
Esta normativa possibilitou a padronização em todo território nacional dos
serviços de proteção social básica e especial, constituindo o público a ser atendido,
a finalidade de cada um deles e os resultados esperados para a garantia dos direitos
socioassistenciais.
Consoante a Tipificação, o Serviço de Proteção e Atendimento Integral a
Família – PAIF é um trabalho de caráter continuado que visa a fortalecer a função de
proteção das famílias, prevenindo a ruptura de laços, promovendo o acesso e
usufruto de direitos e contribuindo para a melhoria da qualidade de vida. Tem como
público famílias em situação de vulnerabilidade social.
Nesta pesquisa daremos maior ênfase a Proteção Social Básica pelo fato
de ser o nosso foco de investigação. De acordo com a Tipificação Nacional esta é
composta pelos seguintes serviços: Serviço de Proteção e Atendimento Integral a
família – PAIF; Serviços de Convivência e Fortalecimento de vínculos; Serviços de
Proteção Social Básica no Domicilio para pessoas com Deficiência e Idosas 17.
O Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família - PAIF consiste no
trabalho social de caráter continuado com famílias, buscando promover seu acesso
e usufruto de direitos e contribuir na melhoria de sua qualidade de vida. Prevê o
desenvolvimento de potencialidades e aquisições das famílias e o fortalecimento de
vínculos familiares e comunitários, por meio de ações de caráter preventivo,
protetivo e proativo. Seus objetivos são:
- Fortalecer a função protetiva da família, contribuindo na melhoria da sua
qualidade de vida;
- Prevenir a ruptura dos vínculos familiares e comunitários, possibilitando a
superação de situações de fragilidade social vivenciadas;
- Promover aquisições sociais e materiais às famílias, potencializando o
protagonismo e a autonomia das famílias e comunidades;
- Promover acessos a benefícios, programas de transferência de renda e
serviços socioassistenciais, contribuindo para a inserção das famílias na
rede de proteção social de assistência social;
- Promover acesso aos demais serviços setoriais, contribuindo para o
usufruto de direitos;
- Apoiar famílias que possuem, dentre seus membros, indivíduos que
necessitam de cuidados, por meio da promoção de espaços coletivos de
escuta e troca de vivências familiares. (BRASIL, 2013, p. 11).
17
Todos os serviços da proteção social básica, desenvolvidos no território de abrangência do
CRAS, em especial os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, bem como o Serviço
de Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiência e Idosas, devem ser a ele
referenciados e manter articulação com o PAIF. (BRASIL, 2013, p. 10).
55
O PAIF prioriza o acompanhamento de famílias que vivem em decorrência
de vulnerabilidade social, visa atender demandas relacionadas a uma série de
questões tais como habitação, saúde, educação, falta de renda e etc.
Como forma metodológica esse atendimento é feito inicialmente através do
atendimento técnico qualificado, que se propõe de forma continuada a solucionar as
situações familiares e ou individuais mesmo que estas estejam relacionadas a outras
politicas sociais.
É importante citar que o atendimento exige compromisso do técnico e
compreensão quanto às complexidades de situações que as famílias em condição
de pobreza estão submersas.
Os profissionais devem estar preparados para enfrentar algumas questões
como: a dificuldade em acessar determinados territórios, a ausência de rede
de proteção social, a falta de apoios sociais, a não-aceitação da família em
ser atendida e/ou acompanhada, entre outras. (ORIENTAÇÕES TECNICAS
SOBRE O PAIF, 2012, p. 49).
A Tipificação Nacional também estabelece e estrutura outro serviço de Cras
além do PAIF, o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos para os
públicos de criança de 0 a 15, o para adolescentes e jovens de 15 a 17 anos, e
serviço para idosos de idade igual ou superior a 60 anos. Busca o fortalecimento da
convivência familiar e comunitária, desenvolvimento de potencialidades e discussões
coletivas sobre pautas sociopolíticas e direitos sociais. É desenvolvido por meio de
atividades que estimulem a convivência social através de formação de grupos com
atividades coletivas.
A Proteção Social Especial – PSE é designado a famílias e indivíduos em
situação de risco pessoal ou social, cujos direitos tenham sido transgredidos ou
ameaçados, ou seja, são famílias que estão em situações de violações de direitos
por ocorrência de violência física ou psicológica, abuso ou exploração sexual;
abandono, rompimento ou fragilização de vínculos ou afastamento do convívio
familiar.
A PSE tem seus serviços ofertados pelo Centro de Referências de
Especializado de Assistência Social - CREAS, que ampara as pessoas e as
incentivam a superarem suas dificuldades por se tratarem de situações de violação
de direitos do cidadão e da própria legislação. As ações da PSE estão subdivididas
em média e alta complexidade.
56
A média complexidade oferece serviços de atendimentos às famílias e
indivíduos com seus direitos violados, mas cujos vínculos familiares e comunitários
não foram rompidos, oferece serviços tais como:
• Serviço de orientação e apoio sociofamiliar.
• Plantão Social.
• Abordagem de Rua.
• Cuidado no Domicílio.
• Serviço de Habilitação e Reabilitação na comunidade das pessoas com
deficiência.
• Medidas socioeducativas em meio-aberto (Prestação de Serviços à
Comunidade – PSC e Liberdade Assistida – LA). (BRASIL, 2005, p. 38).
A Proteção Social Especial de média complexidade abrange também o
Centro de Referência Especializado da Assistência Social- CREAS, tendo em vista a
orientação e a convivência sociofamiliar e comunitário. Sua diferença em relação à
Proteção Social Básica está em se tratar de um atendimento dirigido às situações de
violação de direitos.
Os serviços de alta complexidade são aqueles que garantem proteção
integral, como: moradia, alimentação, higienização e trabalho, protegido para
famílias e indivíduos que se encontram sem referência e, ou, em situações de
ameaças, necessitando serem retiradas de seu núcleo familiar e, ou, comunitário.
Oferece serviços tais como:
• Atendimento Integral Institucional.
• Casa Lar.
• República.
• Casa de Passagem.
• Albergue.
• Família Substituta.
• Família Acolhedora.
• Medidas socioeducativas restritivas e privativas
(semiliberdade, internação provisória e sentenciada).
• Trabalho protegido. (BRASIL, 2005 p. 38).
de
liberdade
Aprovada em 2005, a Norma Operacional Básica – NOB/SUAS disciplina a
gestão pública da política de assistência social no território brasileiro, exercida de
modo sistêmico pelos entes federativo, em consonância com a Constituição da
República de 1988, a Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS e as legislações
complementares a ela aplicáveis. Seu conteúdo institui:
a) Caráter do SUAS;
b) Funções da política pública de assistência social para extensão da
proteção social brasileira;
c) Níveis de gestão do SUAS;
d) Instâncias de articulação, pactuação e deliberação que compõem o
processo democrático de gestão do SUAS;
e) Financiamento;
57
f) Regras de transição (BRASIL, 2005, p. 15).
Como nosso lócus de investigação se dá em uma unidade de CRAS, darei
ênfase a este, principalmente no que se refere às ações, estratégias e ao PAIF, pois
este compreende o acompanhamento familiar e todas as famílias, dentre elas, as
mulheres chefes de família, sendo este, o vínculo das interlocutoras desta pesquisa
com o Cras Jereissati. Abaixo, trataremos de como o Sistema Único de Assistência
Social direciona o trabalho social para famílias em situação de vulnerabilidade e
pobreza.
4.3 O Sistema Único da Assistência Social-SUAS e a centralidade da família na
Assistência Social brasileira
Ao ser analisada a história da assistência social no Brasil, percebe-se que
suas ações nem sempre foram voltadas para a família, e sim voltadas para atender
as necessidades individuais, por meio de medidas pontuais e emergenciais.
Assistência Social assegura em seus objetivos a proteção à família a partir
da Constituição Federal 1988, e da promulgação da LOAS em 1993 que além de
dispor sobre a organização da Assistência Social reafirma em seus objetivos a
família como principal alvo de proteção.
Com a aprovação da PNAS em 2004, esta reitera a relevância da família na
Política de Assistência Social contemporânea, ao colocar como uma de suas
diretrizes a centralidade na família para a concepção e implementação dos
benefícios, serviços, programas e projetos, até chegar a implementação do Sistema
Único de Assistência Social - SUAS.
O reconhecimento da importância da família no contexto da vida social está
explicito no artigo 226, da Constituição Federal do Brasil, quando declara
que a: "família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado",
endossando, assim, o artigo 16, da Declaração dos Direitos Humanos, que
traduz a família como sendo o núcleo natural e fundamental da sociedade, e
com direito à proteção da sociedade e do Estado (BRASIL, 2005, p. 41).
O SUAS por meio do eixo matricidade sóciofamiliar, na qual tem a família
como centralidade, busca romper com a lógica individualista na prestação de
serviços públicos. Conforme disposto na PNAS:
Por reconhecer as fortes pressões que os processos de exclusão
sociocultural geram sobre as famílias brasileiras, acentuando suas
fragilidades e contradições, faz-se primordialmente sua centralidade no
58
âmbito das ações da politica de assistência social, como espaço privilegiado
e insubstituível de proteção e socialização primárias, provedora de cuidados
aos seus, membros, mas que precisa também ser cuidada e protegida
(2005, p. 40-41).
O princípio da matricidade sociofamiliar no âmbito da Política de Assistência
Social amplia o entendimento de família, ao ser percebida como um grupo social de
pessoas com vínculos consanguíneos e/ou de afinidades. É também entendida
como lócus básico de acolhida, socialização, aprendizagens e protagonismo social
(NOB/SUAS, 2005).
Nesta perspectiva, a Politica de Assistência Social busca ultrapassar o
conceito tradicional e idealizado de família, ao compreender o universo familiar a
partir de sua variedade de modelos, configuração, arranjos, estruturas e dinâmica.
A família no âmbito da Politica Assistência Social é percebida como uma
instituição que necessita de condições de sustentabilidade e proteção social para
assim cumprir o seu papel de unidade de proteção primária. O fortalecimento de
possibilidades de convívio, educação e proteção social, na própria
família,
não
restringe as responsabilidades públicas de proteção social para com os indivíduos e
a sociedade (BRASIL, 2005, p. 90).
Ao defender a centralidade da família como principio e superação da
focalização e fragmentação, parte da premissa de que para a família prevenir,
proteger, promover e incluir seus membros, é necessário dar condições de
sustentabilidade para tal (PNAS, 2005).
[...] as famílias são o palco no qual a política de assistência social finca seus
alicerces e busca, junto com esses sujeitos, engendrar possibilidades de
inserção social, para garantir sua sobrevivência, o acolhimento de suas
necessidades e interesses e o convívio familiar e comunitário – enfim, a
proteção social (GUEIROS e SANTOS, 2011, p. 85).
Com base no principio da matricidade sócio familiar foi criado o primeiro e
principal Serviço da Politica de Assistência Social denominado Serviço de Proteção
e Atendimento Integral a Família (PAIF), fruto do amadurecimento e consolidação do
SUAS e constitui-se como o serviço essencial à proteção social básica do SUAS e
desenvolvido pelo Cras.
Dentro da esfera da proteção social, a família garantiu a centralidade nas
politicas sociais, em que a
A identificação das mulheres com a família, dada a naturalização dos papéis
de gênero, permitiu que Estado, mercado e sociedade construíssem
alianças que, muitas vezes, reforçam o lugar das mulheres como
59
responsáveis diretas pelo bem estar familiar (PEIXOTO, 2010, p. 143).
A Assistência Social reforça a ideia que a família é o núcleo básico de
acolhida, autonomia, convívio e protagonismo social, porém não oferece as
condições sequer de prover as suas necessidades básicas.
4.4 Programas de Transferência de Renda e o Programa Bolsa Família:
possibilidades e contradições.
O debate sobre os Programas de Transferência de Renda – PTR, no Brasil
se
estabeleceu
no
contexto
de
hegemonia
do
neoliberalismo 18,
com
o
reordenamento do frágil Sistema de Proteção Social, quando a Constituição Federal
de 1988 parecia estabelecer a universalização dos direitos sociais.
É diante de uma situação de crescimento do desemprego, da insegurança
nas grandes cidades, do reconhecimento da baixa qualificação da nossa mão de
obra para atender as demandas do modelo de produção, a ampliação dos trabalhos
precarizados.
Coloca-se em questão a necessidade de reforma dos programas sociais e,
dentro desta lógica, os programas de transferência de renda ganham visibilidade
como forma de enfrentar o desemprego e a pobreza.
Os programas de transferência de renda passam a ter mais visibilidade em
meados da década de 1990, quando o governo passa a utiliza-los como politica
social que visa suprir as necessidades básicas das famílias.
Dessa forma no ano de 1991, o PTR passou a fazer parte da agenda pública
brasileira, com o projeto de Lei 80/1991 de autoria do Senador Eduardo Suplicy, que
instituía um Programa de Garantia de Renda Mínima brasileiro de abrangência
nacional.
Várias experiências foram pioneiras para o desenvolvimento e ampliação
dos programas de transferência de renda. Cunha aponta algumas destas
experiências:
18
Neoliberalismo é um sistema econômico que prega uma intervenção mínima do estado na
economia, deixando o mercado se auto-regular com total liberdade. Disponível em:
http://pt.scribd.com/doc/11337/Neoliberalismo acesso em 18 jun 2014.
60
1995: experiência pioneiras de Campinas e do Distrito Federal, com
transferência de recursos a famílias que garantissem a frequência escolar
de suas crianças; 1996: Programa Bolsa Escola de Belo Horizonte; 1998:
Programa Nacional de Garantia de Renda Mínima (MEC); 2001: Bolsa
Escola e Bolsa Alimentação (âmbito nacional); 2002: Auxilio Gás (âmbito
nacional; e 2003: Cartão Alimentação (âmbito nacional). (CUNHA, 2009, p.
335).
Porem mesmo contando com a aprovação do senado no de 1991, apenas
em 2004 o Projeto de Lei 80/1991 foi convertido na lei 10.835, de 8 de janeiro de
2004, de caráter universal.
Art. 1º É instituída, a partir de 2005, a renda básica de cidadania, que se
constituirá no direito de todos os brasileiros residentes no País e
estrangeiros residentes há pelo menos 5 (cinco) anos no Brasil, não
importando sua condição socioeconômica, receberem, anualmente, um
benefício monetário19.
No entanto a lei continuava paralisada, pois a mesma era para ter entrado
em vigor no ano de 2005, mas continuou sendo uma lei sem efeito.
Em 1992 surge a Campanha de Ação Contra a Fome, a Miséria e pela Vida,
com o objetivo de enfretamento da questão social e para suprir a exigência de
formulação de políticas de assistência social, orientadas pela LOAS.
No mandato de Fernando Henrique Cardoso em 1995, seu governo buscou
prioritariamente a estabilização da economia e a inserção na economia globalizada.
Com essa intenção adotou uma politica neoliberal que apontou os novos rumos para
o trato da questão social.
Esse governo foi marcado pela proliferação de programas de transferência
de renda, de iniciativa do governo federal com a implementação descentralizada nos
municípios.
Em 2001 foram implementados os primeiros programas federais de
transferência de renda. A criação do Programa Bolsa Família (PBF) tem origem na
unificação de outros programas não contributivos, a saber: Bolsa Escola, AuxílioGás e Bolsa Alimentação, todos criados no período 2001-2003.
A partir de 2003, iniciou-se o governo do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, marcado por inovações institucionais, mudanças objetivando o fortalecimento
da área assistencial, com a criação do Ministério da Assistência Social e do
Gabinete de Segurança Alimentar da Presidência da República.
19
Disponível
em:
acesso em 23 jun 2014.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.835.htm
61
Antes mesmo de tomar posse da presidência Lula já tinha definido o
combate à fome como carro chefe de sua política social, lançando na mídia o
Programa Fome Zero.
O primeiro procedimento adotado pelo presidente Lula, foi a criação do
Programa Bolsa Família (PBF) instituído por medida provisória No 132/2003 e
posteriormente convertido em Lei 10.836 de 09 de Janeiro de 2014. O segundo
procedimento adotado foi a criação do Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate a Fome - MDS, que tem a missão de coordenar, supervisionar, controlar e
avaliar a execução um conjunto amplo e estratégico de politicas e programas.
O Programa Bolsa Família:
Tem por finalidade beneficiar famílias em situação de pobreza (com renda
mensal por pessoa de R$ 70,00 a R$ 140,00) e extrema pobreza (com
renda mensal por pessoa de até R$70,00). Este programa integra o Fome
zero, que por sua vez é uma estratégia impulsionada pelo governo federal
para assegurar o direito humano à alimentação adequada às pessoas com
dificuldade de acesso aos alimentos. Essa estratégia está inserida na
promoção da segurança alimentar e nutricional, buscando a inclusão social
e a conquista da cidadania da população mais vulnerável (CAVALCANTE,
2010, p. 04).
Ao se constituir o Programa Bolsa Família, não apenas se racionalizou o
provimento de um mecanismo de transferência de renda na sociedade brasileira,
como também se consolidou uma forma de benefício não vinculado aos riscos
inerentes às flutuações do mercado de trabalho, uma forma de enfrentar o problema
da pobreza para parcela da população trabalhadora ou não.
O Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda que
beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o país.
Tem como foco de atuação os milhões de brasileiros com renda familiar per capita
de até R$ 70 mensais por integrante da família e está baseado na garantia de renda,
inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos.
A seleção das famílias é feita através da inserção destas no Cadastro Único
para Programas Sociais do Governo Federal - CADÚNICO, este se configura como
um instrumento de coleta de dados objetivando identificar as condições
socioeconômicas das famílias.
O PBF divide-se em três eixos de atuação: 1) a transferência de renda
propriamente dita; 2) as condicionalidades e programas complementares que se
configuram como uma contrapartida que a família toma como responsabilidade para
62
o recebimento do valor monetário e 3) os programas complementares que visam
incentivar a geração de renda, por meio de oficinas de inclusão produtiva dentre
outras ações.
Atualmente, o PBF integra o Plano Brasil Sem Miséria, que está baseado na
garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos. O
programa articula com a Política Nacional de Assistência Social - Proteção Social
Básica, de gestão descentralizada, se configurando como um direito social do
cidadão que dele necessitar, garantido através da Lei Orgânica da Assistência
Social - LOAS.
O Programa Bolsa Família tem possibilitado vários debates tanto no meio
acadêmico, como na sociedade brasileira. Há quem o defenda levando em
consideração as mudanças ocorridas na vida das pessoas que não tem condições
por inúmeros motivos de prover a sobrevivência da sua família.
No entanto há autores que ressaltam que a política de transferência de
renda do Brasil é falha, especialmente no que diz respeito à ideia de uma
redistribuição de renda. De acordo com Demo:
A grande diferença está em que, no ataque à pobreza absoluta, bastam
política distributivas (transferência de renda), enquanto no ataque à pobreza
relativa, são imprescindíveis políticas redistributivas (que desconcentrem
renda) ( 2006, p. 85).
A continuidade do acesso à transferência de renda dependerá do
cumprimento,
de
condicionalidades
relativas
ao
exame
pré-natal,
ao
acompanhamento nutricional, ao acompanhamento de saúde, a frequência escolar
de 85% (oitenta e cinco por cento) para crianças e 75% para adolescentes.
A distância existente entre as politicas sociais e a concepção de direitos
conquistados e garantidos por lei e a sua vinculação com a prática da ajuda,
possibilita seu uso eleitoral ou clientelista por governos, principalmente nas
prefeituras, além de governos estaduais e federais, mediante a concessão de
benefícios, assegurando o caráter assistencialista.
É um programa importante, contudo não tem proporcionado a essas famílias
a superação da pobreza. Esse benefício permite garantir as famílias o atendimento
das necessidades mínimas, mas não as necessidades básicas, ou seja, tudo aquilo
que o ser humano necessita para viver dignamente. No qual o mesmo teria acesso à
educação de qualidade, a saúde, a uma profissionalização para ter acesso ao
63
mercado de trabalho, entretanto não consegue na atual forma como esta sendo
operacionalizado o programa.
O que se pode ver é que o desenvolvimento da Politica Social brasileira tem
um conjunto amplo e variado, porém, descontinuo e insuficiente, de programas
sociais direcionados para a população mais empobrecida.
4.5 A política de Assistência Social em Maracanaú-CE e o acompanhamento
familiar das mulheres chefes de família
O município de Maracanaú vem estruturando sua rede de assistência social
desde 2005, pautado no modelo determinado pelo Sistema Único de Assistência
Social – SUAS, aos municípios brasileiros. Antes de 2005 era denominada a
Secretária de Saúde e Ação Social passando a denominar-se Secretaria de
Assistência Social e Cidadania, a partir da Lei nº 986, de 7 de janeiro de 2005, com
a finalidade de atuar como um comando único na esfera municipal.
[...] em 2005, através da lei nº 986, de 7 de janeiro do mesmo ano, a
Coordenadoria de Ação Social desagrega-se da Secretária de Saúde
passando a denominar-se Secretária de Assistência Social e Cidadania –
SASC, proporcionando mais autonomia ao órgão, tornando um marco na
politica municipal de assistência social, apesar de contar com apenas 10
servidores efetivos. Nesse sentido, começam a ser criadas as condições
para a implantação do Sistema Único de Assistência Social – SUAS
preconizado pela Politica Nacional de Assistência Social – PNAS. No ano
de 2006, a SASC iniciou a implantação de equipamentos de Proteção
Social. (MEDEIROS, 2014, p 46).
A politica municipal foi organizada em dois eixos operacionais de acordo
com o SUAS, a proteção social básica e proteção social especial, organizada em
uma rede local, pública e conveniada de proteção social com o objetivo de garantir à
família: segurança, acolhida, renda, convívio familiar e comunitário.
No ano de 2005, deu-se inicio a implantação de equipamentos de proteção
social básica através dos Centros de Referencia e Assistência Social – CRAS e no
ano seguinte a implantação do Centro de Referencia Especializada da Assistência
Social CREAS.
O Centro de Referência de Assistência Social – CRAS assume o papel de
gestor da Politica de Assistência Social no território, como equipamento de
Referencia de Assistência Social que responde às situações de
vulnerabilidade e contribui com papel de proteção as famílias do território,
juntamente com sua articulação com outros serviços sócioassistenciais
disponíveis no território, dando ênfase aos serviços de convivência social e
64
os de segurança alimentar, no âmbito da proteção social básica.
(MEDEIROS, 2012, p. 47).
Ou seja, o CRAS é um equipamento de articulação com os outros serviços
socioassistenciais disponíveis no município. Neste sentido, a criação de uma rede
socioassistencial é uma ferramenta importante para as ações desenvolvidas pelos
CRAS.
Segundo o Relatório de Gestão (2012), no município de Maracanaú e a rede
socioassistencial nos anos de 2005 a 2012 é composta no âmbito da Proteção
Social Básica por equipamentos de convivência social como:
Os CRAS, Centro de Convivência Social, Pólos ABC‟s, Centro de
Convivência do Idoso, Equipamentos de Segurança Alimentar, Como
Restaurante Popular, Cozinhas Comunitárias e Banco de Alimentos;
equipamentos de Proteção Social Especial Média Complexidade: CREAS e
Centro POP; e equipamentos de Proteção Social Especial de alta
complexidade: Casa de Passagem e Abrigos (VIGILANCIA SOCIAL, SASC
– MARACANAÚ apud GESUAS, 2012).
Compreende-se que para a efetivação da assistência social enquanto
politica pública de direito, decorre por demandas que se esquivam da realidade
vivida pela população que busca o atendimento às suas necessidades, resultando,
portanto em uma politica focalizada e reducionista, justamente por não conseguir
contemplar a realização de todas as demandas que lhe são apresentadas no
cotidiano, pois este se mostra dinâmico e complexo no que se refere a cada
realidade.
O acompanhamento das famílias no CRAS é feita através do PAIF, é
destinado às famílias que apresentam situações de vulnerabilidades, que requerem
a proteção da assistência social para garantia de seus direitos, demandando de
atenção diferenciada, de um olhar mais atento dos profissionais do CRAS.
O Serviço de Proteção e Atendimento Integral a Família – PAIF é o
responsável pelo acompanhamento das famílias. Estas são divididas entre os cinco
técnicos, que passam a acompanhá-las através de ações como: o atendimento
técnico, a visita domiciliar, encaminhamentos a rede de serviços, concessões de
auxilio enxoval e cestas básicas entre outros benefícios ou serviços ofertados pelo
equipamento.
O acompanhamento familiar do PAIF consiste em um conjunto de
intervenções, desenvolvidas de forma continuada, a partir do estabelecimento de
compromissos entre famílias e profissionais, com o desenvolvimento de um Plano de
65
Acompanhamento Familiar que estabelecem objetivos a serem alcançados,
realização de medidas periódicas, inserção em ações do PAIF a fim de superar
gradativamente as vulnerabilidades sociais vivenciadas, alcançarem aquisições e ter
acesso a direitos.
O
CRAS
desenvolve as ações
do
PAIF
e dentro
dele tem o
acompanhamento familiar de grupo e individual com as 100 famílias acompanhadas.
O cadastro único, os serviços de convivência, os benefícios eventuais e os cursos
do PRONATEC.
O acompanhamento é feito de forma particularizada ou coletiva. O
particularizado, inicialmente as famílias são atendidas, por demanda espontânea, ou
atendimento por encaminhamento contra referenciado pelo CREAS, ou busca ativa.
A partir desse atendimento os técnicos vão conhecer a realidade da família e
prosseguir, sejam com informações, orientações, encaminhamentos, realizando
assim o atendimento especifico de acordo com a demanda apresentada.
De acordo com as vulnerabilidades observadas a família passará a ser
acompanhada. Neste acompanhamento o técnico compactua com a família como vai
ser o acompanhamento e assim é traçado o plano, a família tem que querer ser
acompanhada e fechar junto com o técnico as ações que serão realizadas, pois o
acompanhamento conta com a participação da família, do CRAS e da rede
socioassistencial.
O acompanhamento coletivo é realizado através de grupos. Ocorre com
mais constância o grupo de descumprimento de condicionalidades da educação do
PBF, é uma demanda que vem da listagem de descumprimento que sai a cada dois
meses, e então as famílias são convocadas a participar de uma reunião onde vai ser
explicado o motivo das mesmas estarem ali, o que é o descumprimento de
condicionalidades, porque elas foram chamadas a comparecer ao CRAS.
A abordagem é feita com as mães ou responsável familiar e também com os
descumpridores, as crianças e adolescentes, as temáticas trabalhadas são sobre
bolsa família, estatuto da criança e do adolescente e no final acontece um momento
em que as mães e filhos vão conversar sobre os temas.
Há também outros grupos espontâneos, tais como: grupos de gestantes,
grupos de mulheres, entre outros. Cada grupo acontece de uma demanda especifica
66
e tem durabilidade de dois a três meses, cada um tem seu projeto e sua técnica de
referência que terá um norte e saberá do que se trata aquele grupo.
O grupo de gestantes é realizado em parceria com a equipe dos Núcleos de
Apoio à Saúde da Família20 (NASF), é um grupo rotativo, pois as gestantes vão
tendo o bebê e não voltam mais para o grupo.
Os encontros são realizados de quinze e quinze dias revezando uma vez o
Cras outra saúde. As temáticas trabalhadas são relacionadas à saúde do bebê e da
gestante, o que é o Cras, o papel da família, deveres e direitos das gestantes,
direitos trabalhistas, licença maternidade, ou seja, as temáticas vão se adequando
as necessidades das gestantes.
Quanto ao grupo de mulheres, são encontros também quinzenais, onde
participam mulheres beneficiárias do PBF, acompanhadas pelo PAIF, que são
participantes do grupo de maior vulnerabilidade social, neste grupo são discutidos
temas como: violência contra mulher em todas as suas variações, Lei Maria da
Penha, os direitos da mulher, entre outros temas. Esse grupo tem o objetivo de
informar, apresentar novos caminhos para as mulheres que muitas vezes são
violentadas e nem sabem, explicar seus direitos, e assim transformar suas
realidades sociais.
Os
instrumentos
de
acompanhamento
familiar
são
divididos
em
instrumentais de acompanhamento particularizado: instrumental que detalha
bastante as informações, no qual será traçado o perfil econômico e social dessas
famílias, e instrumental de acompanhamento coletivo, no qual está dividido em dois,
no primeiro consta o nome do grupo, público alvo, objetivos, as metas e a
metodologia, e no outro consta todas as atividades que vão ser trabalhadas no
grupo, como por exemplo: roda de conversa, tema, quantidade de pessoas, material
utilizado, e no final terá um espaço para a avaliação do grupo.
20
Os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) foram criados pelo Ministério da Saúde em
2008 com o objetivo de apoiar a consolidação da Atenção Básica no Brasil, ampliando sua
abrangência e resolubilidade. São equipes multiprofissionais que devem trabalhar de forma integrada
às equipes Saúde da Família, apoiando-as e compartilhando saberes. Disponível em:
http://www.saude.rs.gov.br/upload/1383057504_NASF_set2013.pdf acesso em 09 jul 2014.
67
5. O ESTUDO SOBRE AS VIDAS DAS MULHERES CHEFES DE FAMÍLIAS
BENEFICÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA ACOMPANHADAS PELO
CRAS JEREISSATI EM MARACANAÚ-CE
5.1 O perfil socioeconômico das mulheres interlocutoras dessa pesquisa
Para a construção deste estudo, realizamos uma pesquisa de campo na
perspectiva de identificarmos dados sobre impactos sociais e econômicos na vida
das mulheres chefes de família beneficiárias do Programa Bolsa Família.
Nesse sentido, mesmo compreendendo a subjetividade de todas as
entrevistadas, buscamos elaborar um breve perfil de cada uma delas, uma vez que
suas vidas apresentam muito mais peculiaridades do que podemos visualizar nas
entrevistas realizadas.
Enfatizamos que no intuito da garantir o anonimato das entrevistadas
substituímos seus nomes verdadeiros, por nomes fictícios representados por nomes
de flores. Assim, entrevistadas serão identificadas como: Lírio, Tulipa, Rosa,
Girassol e Cravo.
A primeira entrevistada, denominamos de Tulipa: quarenta e dois anos,
dona de casa, cursou até o sexto ano do ensino fundamental, reside no bairro
Jereissati há onze anos. Mora com o esposo e dois filhos. Trabalha em casa
cuidando dos filhos, do marido e da sua casa. Sua renda familiar mensal é de R$
600,00, sendo esta a soma do ganho do seu esposo que não tem salário fixo, pois
trabalha de maneira informal e o valor do seu beneficio proveniente do Programa
Bolsa Família.
Minha vida se resume em cuidar da minha família dar o meu melhor a eles
(filhos) e ao meu marido que apesar de nem sempre poder me ajudar sei
que ele também faz o que pode, quem sabe algum dia tudo mude, pois
meus filhos vão crescer e é neles que eu confio pra mim ajuda (TULIPA).
A segunda, Lírio tem vinte e dois anos, solteira, cursou até o segundo ano do
ensino médio. Deixou de estudar no ano de 2012 para começa a trabalhar, porém o
trabalho não deu certo e no momento dedica-se a cuidar da sua casa e dos filhos
que tem idade de sete e quatro anos. Sua renda mensal é proveniente da pensão
dos filhos e do Programa Bolsa Família, resultando no valor de R$ 384,00. Mora na
sua residência com os filhos e seu irmão, mora no bairro há quinze anos.
68
Eu gosto de morar assim perto de toda a família, mas as vezes isso tudo é
sufocante, agente não pode fazer nada que toda a família vem perguntar
alguns pra ajuda e outros só pra mata a curiosidade, eu sou simples gosto
de viver aqui, só queria um pouco mais de liberdade (LÌRIO).
A terceira, Rosa possui trinta e um anos, vive com um companheiro há quinze
anos e com seus cinco filhos, tendo a idade de treze anos o mais velho e portador
de deficiência auditiva, e o mais novo com quatro anos. Seu companheiro não
trabalha, seu filho deficiente auditivo recebe o benefício de prestação continuada BPC, e ela recebe o recurso do Programa Bolsa Família há três anos, resultando
numa renda de R$ 1.144, 00 mensal. Não trabalha fora de casa, pois acompanha o
filho mais velho a escola todos os dias. No iniciou do ano voltou a estudar depois de
vinte anos longe da sala de aula. Rosa descreve de forma emocionada sua decisão
de depois de tanto tempo voltar a estudar.
Volteia a estudar por estimulo do meu filho que é surdo e estuda em escola
para surdos. Acompanhar ele e ver como ele fica feliz com tanta coisa nova,
quando agente ta voltando pra casa dentro do ônibus ele ta sempre me
explicando tudo oque aprendeu. Depois de um tempo comecei a assistir as
aulas junto com ele, la dentro da sala fica um interprete traduzindo tudo pra
ele na língua de libras. E então decidi voltar a estudar e um dia quero ser
uma interprete e voltar a ver nos olhos de outras crianças o que hoje vejo
nos olhos do meu filho. (ROSA).
A quarta, Girassol possui trinta e nove anos, solteira, mora no bairro há
dezoito anos, em sua casa vive com seus dois filhos sendo eles uma adolescente de
dezessete anos, uma criança de doze, e uma sobrinha de seis anos. Sua renda é
proveniente da pensão dos filhos e do programa de transferência de renda
resultando num valor de R$ 312,00. Vivem próximo aos seus pais. Sua mãe é uma
idosa de setenta e três anos que tem Alzheimer e é Girassol que cuida diariamente,
tanto na parte da alimentação como nos medicamentos e nos momentos de levar ao
médico. É a principal responsável por seus pais sendo que além dela seus pais têm
mais sete filhos. Mesmo com uma vida dedicada ao próximo, ela afirma que o faz de
bom grado e dá o seu melhor:
Me sinto muito importante em cuidar dos meus pais que são tudo na minha
vida, pois a pesar das necessidades que já passamos no passado quando
morávamos no interior, eles sempre cuidaram de todos nós de mim e dos
meus irmãos nos ensinando sempre o caminho do bem da honestidade, e
hoje sei que o que eu faço é o mínimo, mas dou o meu melhor dentro do
meu poder. (GIRASSOL).
69
A quinta e última chamamos de Cravo. Aos quarenta e três anos, solteira,
analfabeta, é mãe de dois filhos ambos adultos, vivem em sua casa com a filha e
dois netos, residindo no bairro há quinze anos. Sua renda é única e exclusivamente
do valor do programa bolsa família R$ 77,00. A mesma veio do interior do estado,
pois segundo relata, sofria demais com o ex-marido, então decidiu deixá-lo no
interior e veio tentar uma nova vida na cidade, longe de tudo o que a fazia sofrer.
Aquela vida que tia lá no interior eu não quero mais não, vivia sofrendo na
mão daquele homi, chegava bebo, cheirando a cachaça, assustava meus
filhos, dava mal exemplo, então num dia eu tava parada lá pensando e
decidi amanhã vou embora dessa casa, (nesse momento com um olhar
distante como se revivesse aquele momento que descrevia, então
continuou) sai de lá com os meus dois filhos e até hoje não me arrependo,
podia ser melhor, mas nos vive bem (CRAVO).
Nesse sentido identificamos que o público pesquisado trata-se de mulheres
em idade adulta, cuja faixa etária é de 22 a 45 anos, todas são beneficiárias do
mesmo programa de transferência de renda na condição de responsável familiar,
seus níveis de escolaridade são distintos. Suas rendas médias são de menos de um
salário mínimo. Vale destacar que todas têm filhos, moram no bairro em torno de 15
anos, todas em casa própria e no que consiste a situação conjugal, duas vivem em
união estável e três são separadas.
Esse foi o perfil traçado das mulheres entrevistadas, os dados colhidos na
pesquisa nortearam as análises mediante a relação com as pesquisas documental e
bibliográfica desenvolvidas no desenrolar deste trabalho.
5.2 Análise do Programa Bolsa Família e a vidas das mulheres chefes de
famílias do Cras Jereissati em Maracanaú-CE.
A escolha das mulheres chefes de família como objeto da minha pesquisa
ocorreu devido ao contato que tive com as mesmas em meu estágio no CRAS
Parque São João, onde me atiçou a curiosidade para entender o que se passa na
vida dessas mulheres, como vivem, o que elas pensam sobre o PBF e quais as
mudanças depois de inseridas no programa, uma tentativa de ir além do imediato e
adentrar as questões individuais das condições de existência dessas mulheres, suas
trajetórias de vida, seus costumes e suas crenças.
70
Vale ressaltar antes desta analise o Art. 4º que traz os objetivos básicos do
Programa Bolsa Família, em relação aos seus beneficiários que são:
I - promover o acesso à rede de serviços públicos, em especial, de saúde,
educação e assistência social;
II - combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional;
III - estimular a emancipação sustentada das famílias que vivem em
situação de pobreza e extrema pobreza;
IV - combater a pobreza; e
V - promover a intersetorialidade, a complementaridade e a sinergia das
ações sociais do Poder Público.
Ao analisar os objetivos do programa bolsa família é necessário ter em
mente, que além de diminuir a miséria, a transferência de renda deve ser
considerada apenas a primeira etapa, que deve seguir para a fase seguinte, que é a
inserção socioeconômica sustentável das populações vulneráveis.
Dessa forma iniciamos as entrevistas indagando as pesquisadas sobre o
que é o Programa Bolsa Família, de que maneira ele influencia nas suas vidas.
Desde quando passei a receber essa ajuda do governo minha vida mudou,
melhorou pra mim e pros meus filhos, acho que melhorou pra todo mundo e
recebe, se o programa acabar não sei o que será de tanta gente que é
pobre e depende dele pra viver (TULIPA).
Bom eu sei que esse dinheiro é só uma ajuda, um complemento pra gente
que é pobre, mais a cada mês que agente recebe, ele se torna mais
importante e acaba que agente não sabe nem o que fazer sem ele na nossa
vida, pois ele já faz parte da nossa renda (LÌRIO).
O programa pra mim significa a melhora da qualidade de vida pra mim e
pros meus filhos, pra compra um calçado, uma roupa que antes eu não
podia, é muito importante nem sei o que fazer sem essa ajuda que o
governo dá (ROSA).
O programa é muito bom porque não é só o dinheiro que agente recebe tem
muitos benefícios né, como a conta de energia que vem mais baixa, por
conta do baixa renda, é uma coisa que auxilia muito na renda. Como por
exemplo, hoje quando chega a volta as aulas posso comprar o material
escolar dos meninos eles podem escolher porque é um dinheiro que
também é deles (GIRASSOL).
Tudo de bom, ele influenciou muito, pois foi à ajuda que eu tive no momento
em que eu tava mais precisando. Melhorou muito é uma fonte de renda pra
muita gente, para todas as mulheres eu acho que melhorou (CRAVO).
De acordo com a fala das mulheres entrevistadas, essas encontram no PBF
uma forma de ajuda para suprir as necessidades do seu lar e de sua família, embora
não seja suficiente para suprir todas as necessidades apresentadas pela família, e
ainda exista a concepção do acesso ao programa como ajuda e não como um direito
social, ou seja, o fetiche da ajuda contrapondo-se à noção de direitos.
71
A distância existente entre as politicas sociais e a concepção de direitos
conquistados e garantidos por lei e a sua vinculação com a prática da ajuda,
possibilita seu uso eleitoral ou clientelista por governos, principalmente nas
prefeituras, ressaltando governos estaduais e federais, mediante a concessão de
benefícios, assegurando o caráter assistencialista e politico.
Este é um programa importante, contudo não tem proporcionado a essas
famílias a superação da pobreza. Esse benefício permite garantir as famílias o
atendimento das necessidades mínimas, mas não as necessidades básicas, ou seja,
tudo aquilo que o ser humano necessita para viver dignamente, no qual o mesmo
teria acesso à educação de qualidade, a saúde, a uma profissionalização para ter
acesso ao mercado de trabalho, entretanto não consegue na atual forma como esta
sendo operacionalizado o programa.
Um traço relevante acerca das mulheres beneficiárias do Programa Bolsa
Família foi a sua representatividade como chefe de família. Dessa forma,
ponderamos como esse fenômeno se identifica nas relações sociais.
O Responsável pela Unidade Familiar deve, obrigatoriamente, ser um dos
componentes da família e morador do domicílio, com idade mínima de 16
anos e preferencialmente do sexo feminino. Conforme avaliações, o
benefício do Bolsa Família transferido, preferencialmente, às mulheres
responsáveis pela unidade familiar tem contribuído para ganhos de
autonomia e ampliação de seu poder decisório feminino. Das famílias
cadastradas os responsáveis pela unidade familiar são pessoas do sexo
feminino, proporção ainda maior entre as famílias beneficiárias do PBF,com
93,1%. A proporção de pessoas do sexo feminino como responsáveis pela
unidade familiar é maior entre famílias em situação de pobreza (92,1%) e
extrema pobreza (91,5%) – público-alvo do Programa Bolsa Família – que
entre aquelas em situação de baixa renda (84,6%). (BRASIL, 2013, p. 35).
Dessa forma questionamos as entrevistadas por que as mulheres são as
principais responsáveis pelo recebimento do benefício.
Receber esse dinheiro, essa ajuda que o governo ta dando pra nos que é
pobre e muito importante porque antes ficava só pensando meu Deus o que
agente vai merenda a manha de manhã, o que eu vou fazer pro almoço dos
meus filhos, agora é pouco mais tem todo dia, dá pra compra umas
coisinhas ai agente junta com o pouco que meu marido ganha e aquele
pouco daqui com o pouco de lá dá pra viver um pouquinho melhor que
antes, ta tudo melhor agora. Fico feliz por ser eu a receber, pois eu vejo o
que faço, eu contribuo muito em gastar esse dinheiro da forma certa,
(TULIPA).
A mulher depois do beneficio ficou mais independente, não depende só do
marido. A mulher é a cabeça da casa ela é que sabe o que realmente
precisa pra dentro de casa, ela é que administra o dinheiro, eu sou a
responsável porque eu sou a chefe da minha família, com o dinheiro eu
72
pago agua, pago luz, compro o gás, compro a mistura, uma fruta, o pão pra
de manhã (ROSA).
Eu me sinto muito bem em ser eu a responsável pelo beneficio, porque
sempre na casa é a mulher, é ela quem sabe o que os filhos precisam mais,
como material escolar o homem não se atenta a isso, depois do beneficio as
mulheres passaram a ser mais valorizadas, o dinheiro que eu recebo é
pouco né mais da pra comprar o material escolar dos meninos quando
começa as aulas, todo dia tem que comprar pão de manhã, serve pra essas
coisas. (GIRASSOL).
Nesses
trechos,
podemos
afirmar
que
as
entrevistadas
veem
a
responsabilidade pelo benefício como a oportunidade de maior autonomia dentro do
lar, uma vez que o aumento da independência financeira e do poder de decisão são
fatores inseparáveis da autonomia.
A identificação das mulheres com a família, dada a naturalização dos papéis
de gênero, permitiu que Estado, mercado e sociedade construíssem
alianças que, muitas vezes, reforçam o lugar das mulheres
como
responsáveis diretas pelo bem estar familiar (PEIXOTO, 2010, p.145) .
Percebemos que o programa trouxe para a vida dessas famílias além de
acesso a renda, certa autonomia para as mulheres, para que elas pudessem adquirir
um alimento ou pagar uma conta, a liberdade na aplicação do dinheiro recebido.
No entanto de acordo com Cavalcante:
O que se tem observado é que além do programa não atender a todos que
precisam tendo que se fazer uma seleção dos mais pobres entre os pobres,
o mesmo não tem sido eficiente em retirar os beneficiários da situação de
pobreza no sentido de não garantir as condições inclusão desses no
mercado de trabalho, ou de torná-los capazes de produzir formas
alternativas dignas de promover seu sustento a partir de recursos próprios
(2010, p. 09).
A mulher assume neste contexto, o papel de chefe de família que mais se
destaca entre os componentes familiares, pois ele adquire o papel de ser mãe, de
mulher, de provedora do lar, de protetora, enfim a mulher assume múltiplas funções
em busca de melhorar as condições de vida da família, fazendo-a sair da condição
de vulnerabilidade social em que se encontra.
A ideologia naturalizadora do papel das mulheres como mães, na
sociedade, e, ainda, como as principais responsáveis pelo trabalho
doméstico continua sendo reproduzida pelas esferas institucionais, seja o
Estado, a família, a escola, a religião, fixando valores e condutas que
reposicionam as mulheres como as principais cuidadoras da humanidade.
Essas práticas persuasivas são, muitas vezes, permeadas por sentimentos
amorosos que responsabilizam as mulheres pelo sucesso ou fracasso dos
membros de suas famílias (PEIXOTO, 2010, p. 168).
Concordo com Peixoto (2010) quando fala que “A realidade das políticas
sociais no Brasil comporta o modelo familista de proteção social”, destaca-se a
73
focalização do Programa na figura da mulher, como responsável familiar pelo
controle do beneficio, ou seja, é a mulher a representante da família diante da
politica de assistência. Diante dessa realidade levantamos a seguinte questão,
houve mudanças em relação ao papel da mulher na família, a partir do recebimento
do benefício.
Bom, na minha casa desde quando passei a receber o beneficio mudou,
que eu é que dou a ultima palavras, ele vive comigo (se refere ao
companheiro), mas sabe que não lhe dou o direito de reclama de nada,
porque ele não trabalha, nem em casa e nem fora de casa (ROSA).
Me sinto mais responsável pela minha família, só sou eu, ninguém mais
então eu tenho que cuidar dos meus filhos, e receber esse beneficio ajuda
muito, apesar de pouco me sinto mais dona de mim, meu papel dentro de
casa agora é de chefe de família, pesado né essa palavras (risos) mais sou
a chefe da minha família (LÌRIO).
Teve uma grande mudança que as mulheres passaram a ser mais útil a se
valorizar, saber que ela é muito importante dentro da sua família não só pra
lavar passar, cozinhar, nos temos nossa importância dentro e fora de casa
(GIRASSOL).
Depois do beneficio pra mim tá melhor porque não dependo de ninguém, é
uma grande ajuda, me sinto muito bem de ser eu que recebo, e receber
esse dinheiro me deixa um pouco mais despreocupada (CRAVO).
Apesar de ainda permanecer as raízes conservadoras provenientes das
concepções machistas históricas, que colocam em seus preceitos que o chefe de
família só pode ser representado pela figura masculina, hoje a mulher tem se
destacado como representante principal de muitas famílias, o crescimento da
organização da família monoparenteral, chefiadas por mulheres, leva a Politica de
Assistência a focalizar seus programas e benefícios nas mesmas.
Ao que se refere à matricialidade no PBF, Peixoto (2010, p. 148-149) reflete:
O Programa Bolsa Família, portanto, carrega em seu próprio nome a marca
desse lugar de destaque que a família ocupa, seja como esfera de provisão
do bem-estar de seus membros, seja como um dos pilares de sustentação
do Programa, uma vez que as condicionalidades e os recursos serão
administrados no interior da família.
As condicionalidades postas aos beneficiários são apontadas como outra
fragilidade na operacionalização do PBF. Bichir (2010) destaca, "exigir que a
população mais pobre cumpra contrapartidas implica uma negação do direito de
receber parte da riqueza socialmente (BICHIR, 2010, p. 123)”.
74
Perguntamos o que você acha das exigências do Programa em relação à
frequência das crianças na escola e às questões vinculadas ao tratamento da sua
saúde e de seus filhos/as, as chamadas condicionalidades, e ainda questionamos se
elas encontravam alguma dificuldade para cumprir as exigências. Algumas das
respostas:
Mas que obrigatório porque é dever, obrigação de todas as mães mesmo
que não existisse isso (se refere as condicionalidades), é mais um incentivo
pras mães que não faziam isso, cuidar de seus filhos, acompanha-los um
pouco mais, ver o que eles precisam o que acontece na vida deles na
escola. (ROSA).
Eu acho que no caso da vacina é muito bom, agora no caso da escola não é
tão bom assim por que tem criança que vai só por que tem a obrigação de ir
e a mãe obriga (usuária refere-se ao fato da escola não ter nem um atrativo
que incentive as crianças a ir a escola), para não perder o beneficio,
acredito que deveria ter mais investimentos em outras áreas como no
esporte, uma coisa mais dinâmica que atraia as crianças para a escola, pra
não ir só por obrigação (GIRASSOL).
Não acho ruim não porque sendo obrigatório ou não agente tem que fazer,
mas acho complicado por que nem sempre tenho tempo pra ta indo pro
posto de saúde e quando agente vai tem que ta com muito tempo porque
tudo demora a as vezes agente tem até que brigar pra poder ser atendido e
as vezes nem é, ai agente volta pra casa sem ter feito nada. Às vezes
penso que se eles exigem que agente faça um acompanhamento eles
tinham que ver como é que ta sendo as coisas mas escolas e nos posto de
saúde (TULIPA).
É tipo assim, é um compromisso que a pessoa tem que ter né, tem que ter
aquela responsabilidade pra poder receber, se a pessoa não tiver ela
também não recebe, eu não encontro nem uma dificuldade de cumprir
(LÌRIO).
Acho que importante ter essas... como chama hein? acho que é punição,
para as mãe fazer o que é certo pros filhos, e as vezes mesmo sabendo que
vai perde elas ainda num faz o que é o certo, num vejo dificuldade nem
uma, agente todo dia tem que buta os meninos pro colégio né verdade, e o
que custa levar pra vacinar, o posto é longe mais num é nem todo dia, eu
sempre levo os meus netos e gosto muito de fazer isso pra eles, pois eu sei
que é pro bem deles (CRAVO).
As
condicionalidades
obrigatórias
como
contrapartida
das
famílias
beneficiárias dentre as falas, percebemos que apenas duas das entrevistadas falam
um pouco da dificuldade que é cumprir as tais exigências e da deficiência destas
politicas.
A respeito das condicionalidades afirma Cavalcante:
(...) sob a ótica do direito, a um direito não se deve impor contrapartidas,
exigências ou condicionalidades, visto que a condição da pessoa deve ser o
requisito básico para essa titularidade. Além disso, a obrigação de garantir
escola, postos de saúde e demais condicionalidades, ora impostas cabe aos
75
poderes e não as pessoas. Sendo essa uma questão a ser repensada no
programa. (CAVALCANTE, 2010, p. 04)
No que se referem às condicionalidades, os críticos ao Programa considera
a instabilidade das políticas de saúde e educação, haja vista que, muitas vezes as
famílias são "penalizadas" por deficiências das próprias politicas públicas.
De acordo com a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 226, afirma “A
família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Esta afirmação é
confirmada no inciso no 8º do referido artigo que estabelece: “O Estado assegurará
a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando
mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.
A centralidade da família na politica social recai sobre o fato de que esta tem
como uma de suas funções fazer a mediação das relações entre o sujeito e o
Estado, embora esteja inserida num espaço contraditório, marcado pela luta
cotidiana em busca da sobrevivência no contexto social capitalista. Diante do
exposto, questionamos sobre qual a importância da família e quais atividades as
entrevistadas desempenham nas suas famílias.
Família pra mim é amor é amizade, minha família é tudo pra mim (CRAVO).
Família é um ambiente que agente tá tudo junto, é uma coisa que todo ser
humano precisa é de uma família, precisa de alguém pra conversar, pra
cuidar, você precisa se sentir útil, porque antes eu não me achava útil e
agora que eu tenho eles (se refere aos filhos) eu me sinto útil é o que me
faz mais feliz assim, é ter eles pra cuidar. Dentro da minha família, minha
obrigação é dá um bem estar pra eles, cuidar deles ensinando o certo e o
errado, e proteger também (ROSA).
A família significa apesar de ter muita confusão e conflitos é normal dentro
da família, mas ela é muito importante, conviver com a família, eu considero
minha família meus filhos e meu irmão, pra mim eles são a minha família, e
minha obrigação é cuida de casa, cuida dos filhos, levar pro colégio (LÌRIO).
Família é um porto seguro, é um lugar que você se sente sempre protegido,
você sabe que pode contar com ele sempre. Família é muito importante é à
base de tudo, se você tiver uma boa educação você não vai se meter com
coisas erradas. Dentro da minha família eu acredito ter um papel
importante, porque eu cuido do meu pai da minha mãe que são idosos, e
também das minhas sobrinhas e eu acho que pra essas pessoas eu sou
importante (GIRASSOL).
Minha família é tudo o que eu tenho, sem ela não sei o que eu seria, sem
ela me sentiria sem rumo, eu cuido da minha família essa é a minha
principal obrigação (TULIPA).
Neste momento da entrevista, diferente de todos os momentos anteriores,
podemos perceber a emoção nas falas das usuárias, inicialmente todas sem nem
uma exceção deram um meio riso no canto da boca, respiraram fundo e dessa forma
76
começaram a responder, porém, antes das respostas sempre falavam “ai meu e
agora o dizer”, essa também foi uma frase unânime. Cada mulher busca, pensa e
age tendo em mente a proteção da sua família.
Em
relação
à
contribuição
concreta
para
o
desenvolvimento
da
autonomização da família, a natureza das ações:
Não permite a possibilidade do que poderia considerar-se uma capacitação
capaz de alavancar a autonomização das famílias, constituindo-se este
aspecto possivelmente em um dos mais problemáticos no desenvolvimento
do Bolsa Família, mesmo que a articulação com programas estruturantes se
constitua em elemento central na própria proposta do Programa (SILVA,
2010).
Atualmente na sociedade brasileira, a família além de ser reconhecida como
instancia de cuidado e proteção, deve ser reconhecida como instancia a ser cuidada
e protegida, ponto em que se ressalta a responsabilidade pública para com os seus
membros, garantindo lhes acesso aos serviços públicos de forma universal e justa.
Prosseguimos com a entrevista fazendo a seguinte pergunta: O que é ser
mulher, e se as entrevistadas consideravam que existam desigualdades entre
homens e mulheres.
Ser mulher é sempre ter que ceder, é ser sofredora. Ser mulher é buscar
ser independente, sempre vai existir diferenças entre homem e mulhe, um
exemplo é se você tá dirigindo qualquer que acontece ele olha e diz “só
podia ser mulher”, então é claro que tem diferença e tem e é muita
(CRAVO).
Ser mulher é ser forte é ter liderança, dentro da nossa sociedade a mulher
tem sido uma líder, como é o caso da nossa presidente que é mulher, vejo
que hoje a mulher pode lutar pelos seus direitos, mas os direitos não estão
em igualdade, mas a mulher hoje tem muito maios consciência do seu
poder na sociedade, ainda falta muito a conquistar (GIRASSOL).
Destacamos essas duas falas, pois as mesmas refletem sobre uma mulher
guerreira que tudo deve suportar, porém que deve sempre lutar, não pode desistir.
As entrevistadas falam que apesar de existir uma grande desigualdade entre
homens e mulheres no que se refere aos direitos, ela sabe e deve sempre tentar
ultrapassar as barreiras impostas pela sociedade.
Sabemos que o Brasil nos últimos anos vem passando por grandes
mudanças nos padrões socioeconômico das famílias. Houve um avanço na redução
das desigualdades de gênero. Este sucesso foi influenciado pelas conquistas sociais
e políticos do papel da mulher na sociedade e mudanças de comportamento e os
valores sociais das mulheres, proporcionado por alterações na formação da
identidade feminina.
77
Em uma ultima indagação, questionamos as entrevistadas da seguinte
forma: De acordo com o que você vive hoje, como você enxerga o seu futuro?
Eu quero melhoras pro meu futuro, quero terminar os meus estudos, eu não
quero sempre viver aqui com o meu irmão, pois é muito complicado conviver
com ele, eu quero ter minha família com os meus filhos e meu marido que
ainda não sei quem vai ser (risos) (LÌRIO).
Assim o que eu vivo hoje eu posso dize que é bem melhor do que eu vivi no
passado, então para o futuro deve ter algo bem melhor, eu quero e espero
que seja assim (TULIPA).
Eu queria que o futuro fosse melhor, não que eu não seja feliz hoje, mas eu
queria que fosse melhor a minha vida. Se eu pudesse sairia dessa casa
com os meus filhos. No meu futuro quero ver eles tudo grande, eu
trabalhando, terminar os meus estudos e me tornar uma interprete de libras,
caminhar com as minhas próprias pernas sem precisar de ninguém (ROSA).
Se Deus quiser eu tenho boas perspectivas pro meu futuro, pois eu estou
estudando e eu acho que agente não deve parar, agente não pode ficar
achando que é tarde, a gente tem que lutar, eu penso que o meu futuro vai
ser bem melhor. Quero terminar os meus estudos e me forma em psicologia
(GIRASSOL).
Eu quero viver tranquila na minha casa, ver os meus netos terminando os
estudos dele, já que eu não terminei, eu espero que no futuro eu tenha um
mais de sossego, é só isso que desejo, não me preocupar com o que
vamos comer amanhã (CRAVO).
Ao falarem nos planos para o futuro as entrevistadas colocam sempre o
bem estar dos filhos em primeiro lugar, um diferencial notado nesta entrevista é que
mais da metade das entrevistadas têm para o seu futuro planos, seja de voltar a
estudar, seja de terminar os estudos e terem uma formação acadêmica.
Diante dos relatos das entrevistadas, que assumem múltiplas funções para
dar conta do seu papel como responsáveis pela família, percebemos que o
sentimento de acomodação não lhes acomete, pois elas exprimem o desejo por
mudanças e conquistas, principalmente no que se refere às suas condições de vida
e ao seu futuro e de seus filhos.
No que se refere às politicas sociais o que se pode ver é que o
desenvolvimento da Politica Social brasileira tem um conjunto amplo e variado,
porém, descontinuo e insuficiente, de programas sociais direcionados para a
população mais empobrecida.
Compartilho com Silva e Silva (2006) quanto às possibilidades dos PTR‟s:
Considero que ao mesmo que resultados e impactos decorrentes desses
programas, em termo de superação da fome e da pobreza no Brasil, sejam
muito modestos, conforma tem demostrado avaliações desenvolvidas sobre
vários deles, o significado real que apresentam para as famílias
beneficiarias é significativo, por permitir a elevação ou mesmo um único
78
acesso a renda monetária por parte de um número elevado de famílias que
se encontra à margem da sociedade. Toda via, entendo que isso não
significa que esses programas sejam capazes de ir além da manutenção de
um nível de pobreza que poderá ser cristalizada e não superada (2006, p.
28).
Não há duvidas que a implantação de programas de transferência de renda
em todos os municípios brasileiros provocou uma melhora nas condições de vida de
milhões de brasileiros que a eles tem acesso. É fato o impacto que esses programas
causam nas famílias beneficiadas, o efeito de alivio, ao conceder a obtenção ou
ampliação de uma renda, até então inexistente ou insignificante quando proveniente
do trabalho, sendo, em muitos casos, esses programas a única possibilidade de
obter renda, mesmo que baixa.
79
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para o desenvolvimento desta pesquisa, iniciamos destacando que nem tudo
ocorreu como o esperado, pois foram encontradas algumas dificuldades no caminho.
Não em relação às mulheres entrevistadas que, com ternura, dedicaram parte de
seu tempo para conversarmos. No referimos a outras dificuldades que tivemos que
enfrentar. Por mais que as entrevistas tenham sido feitas em tempo possível para
investigação das temáticas, não conseguimos adentrar com profundidade alguns
pontos de ordem mais subjetiva, a exemplo as possíveis relações de poder
vivenciadas no interior dessas famílias, e dessa forma, a sua realidade mais estreito.
A presente pesquisa buscou analisar a realidade social das mulheres chefes
de família beneficiárias do Programa Bolsa Família acompanhadas pelo Cras
Jereissati, em Maracanaú-CE.
Nessa análise, verificamos aspectos que se tornaram relevante à autonomia
das mulheres, tanto sobre situações sociais quanto econômicas, sejam por meio das
ações complementares (ex: PRONATEC) oferecidas pelo Programa Bolsa Família
que buscam a qualificação profissional das mulheres compreendendo-as enquanto
provedoras de seus sustentos e de seus lares, e como essa renda, que lhes
possibilitem superar, de certa forma, as relações de desigualdade de gênero, por
meio da participação das mesmas no complemento da renda familiar lhes
assegurando certa autonomia de renda.
Outro fator que aparece na analise deste estudo é o significado do programa
para as mulheres, diante das novas configurações familiares. Diante do significativo
crescimento das mulheres como chefes de família, é colocado pelas entrevistadas
que o recebimento do beneficio do PBF reforça as possibilidades de assumiram tal
posição. Vale salientar que os impactos do programa na vida das mulheres têm
significados diversos reconhece-se que o fator da renda é significativo, porém não é
o único.
É importante destacarmos que apesar desse programa de transferência de
renda representar uma espécie de “socorro” para as famílias pobres, não podemos
deixar de reconhecer que o mesmo não atinge todas as vulnerabilidades da
população brasileira, especificamente sobre as mulheres.
80
Concordamos que o Programa Bolsa Família pode ser visto como uma
medida de tentativa de superação da pobreza no Brasil, mas, não podemos deixar
de considerar que o problema da desigualdade neste país certamente não será
solucionado apenas com a manutenção ou expansão de programas dessa natureza.
É necessário que haja um ordenamento na estrutura política do Brasil, não só sobre
os programas de transferência de renda, mas, acerca de todas as dimensões
politicas, econômicas e sociais de natureza pública e uma radical transformação
societária.
O desafio da politica de assistência social é de tornar mínimas a situação de
pobreza e extrema pobreza em que vivem milhões de brasileiros (as). As mudanças
e os avanços da política ao longo dos anos é algo perceptível, pois muitos desafios
foram enfrentados e seus resultados se concretizam por meio da LOAS, da PNAS,
do SUAS, mas ainda existem outros desafios a serem enfrentados e conquistados,
pois no atual contexto vê-se o crescimento das desigualdades sociais e o grande
número de sujeitos que vivem em situação de vulnerabilidade social.
Apesar das mudanças ocorridas no Brasil ao longo do desenvolvimento
político, econômico e social, relatórios e estudos recentes apontam que milhões de
pessoas ainda vivem na linha da pobreza e extrema pobreza.
É por meio das demandas apresentadas pela sociedade civil que o Estado
visa intervir na realidade, é a partir destas que surgem leis, politicas que visam
assegurar os mínimos sociais às pessoas que se encontram em situação de
vulnerabilidade.
Os relatos de cada uma das mulheres mostram o quanto são precárias suas
condições de vida, mostram também suas lutas e anseios por melhor qualidade de
vida. Na pesquisa, que teve como foco as mulheres chefes de família beneficiarias
do PBF, é possível observar o quanto a vida delas e de seus familiares transformase após a inserção no programa.
É necessário o desenvolvimento de ações dentro dos equipamentos
socioassistenciais que atenda a demanda apresentada. A vida das mulheres antes e
após a inserção no programa teve modificações, porém ainda faltam muitos
obstáculos a serem vencidos e superados neste ambiente de alta vulnerabilidade
social para que as famílias consigam superar a pobreza que lhes atinge.
81
A mulher é tida pelo programa como uma aliada na superação da pobreza, a
ela foi incumbida à responsabilidade de controle do cartão do beneficio, bem como a
autonomia no que se refere ao destino dado a esse dinheiro mensalmente recebido.
Com isso mudam-se as relações de gênero, pois a mulheres passam a dividir
responsabilidades com seus cônjuges, ou passam a assumi-las sozinha, como é o
caso da maioria das beneficiárias entrevistadas.
A pesquisa mostra que as mulheres mantêm a esperança de conseguir um
trabalho, acreditam que os filhos podem ter melhores condições de vida, elas
acreditam em um futuro promissor, quando terão seus direitos garantidos, e não
tenham o beneficio do Programa Bolsa Família como renda principal.
Como diz Yazbek (2006, p. 09) “Sonhar é necessário para mudar”. E sonhos
não faltam para as mulheres que almejam alcançar melhores condições de vida para
a sua família, são esses sonhos que movem essas mulheres a seguir na luta e a
acreditar que o futuro de seus filhos será bem melhor do que suas próprias vidas, e
que no futuro essas também serão modificadas, para viverem bem melhor.
82
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vantagens e desvantagens. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/60252145/ANALISECRITICA-DO-PROGRAMA-BOLSA-FAMILIA-VANTAGENS-E-DESVANTAGENS
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85
APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Convidamos o (a) Senhor (a) a participar da pesquisa com objetivo: Analisar a
realidade social das mulheres chefes de família beneficiárias do Programa Bolsa
Família
acompanhadas
pelo
Cras
Jereissati,
em
Maracanaú-CE,
sob
a
responsabilidade da seguinte pesquisadora Viviane André Lima sob orientação da
Ms. Luciana Sátiro Silva.
Sua participação é voluntária e se dará por meio do preenchimento de um roteiro
com perguntas abertas e fechadas e trará aspectos relativos à sua vida familiar,
comunitária e participação nos serviços do CRAS Jereissati, em Maracanaú-CE.
Os resultados dessa pesquisa serão analisados e publicados nos meios científicos,
mas ressaltamos que sua identificação não será divulgada, sendo resguardada em
sigilo.
Não há risco decorrente da sua participação e o(a) Sr.(a) possui a liberdade de
retirar sua permissão a qualquer momento, seja antes ou depois da coleta de dados,
independente do motivo e sem nenhum prejuízo ao seu atendimento ou tratamento
na Instituição.
Em qualquer etapa do estudo, poderá contatar para o esclarecimento de dúvidas ou
para retirar o consentimento de utilização dos dados coletados com a pesquisadora:
Viviane André Lima – residente no endereço: Rua Jaçanaú, nº: 1680.
Consentimento Pós – Informação
Eu,______________________________________________,
fui
informado
e
prestado os devidos esclarecimentos sobre o que a pesquisadora deseja realizar e
porque motivo precisa da minha colaboração, e compreende a explicação
transmitida pela pesquisadora. Desde modo, eu concordo em participar da pesquisa,
sabendo que não vou ganhar nada e que posso desistir quando quiser. Este
86
documento é emitido em duas vias que serão ambas assinadas por mim e pela
pesquisadora, ficando uma via com cada um de nós.
___________________________
Assinatura da participante
____________________________
Viviane André Lima- pesquisadora
___________________________________
Ms. Luciana Sátiro Silva- Orientadora
87
APÊNDICE B
ROTEIRO DE ENTREVISTA
1) Idade:____________ Profissão:____________ Estado civil:______________
Escolaridade________________
2) Há quanto tempo mora no bairro Jereissati? __________________________
3) Quantas pessoas moram na residência _______________
4) Trabalha? ( ) sim ( ) não Se sim, com qual tipo de vinculo da sua
ocupação?__________________________________________
5) Qual o valor da sua renda mensal? _______
6) O que é o Programa Bolsa Família, de que maneira ele influencia na sua vida?
7) Por que as mulheres são as principais responsáveis pelo recebimento do
benefício?
8) Houve mudanças em relação ao seu papel na família, a partir do recebimento do
benefício?
9) O que você acha das exigências do Programa em relação à frequência das
crianças na escola e às questões vinculadas ao tratamento da sua saúde e de
seus filhos/as?
10) Você encontra alguma dificuldade para cumprir as exigências?
11) Qual a importância da família para você?
12) Você considera que existam desigualdades entre homens e mulheres quais?
13) De acordo com o que você vive hoje, como você enxerga o seu futuro?
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VIVIANE ANDRÉ LIMA - Faculdade Cearense