FDUNL
16 de Abril de 2009
1
Desistência na Comparticipação
Acórdão do STJ, de 14/12/95
Mónica Silva – 1163
Luísa Alves – 1237
2
Tentativa/Comparticipação

Tipos

Cláusulas de extensão dos tipos

Comparticipação

Desistência
3
Acórdão STJ 95

Autor
Ministério Público

Arguidos
Marçal G. (M)
Carlos F. (C)

Acusados pelo MP que lhes imputa a co-autoria de um crime
de furto qualificado.
4
Acórdão STJ 95

Efectuado o julgamento na primeira instância,
O arguido Marçal G. é absolvido do crime de que vinha
acusado;
O arguido Carlos F. é condenado pela prática de um crime de
furto qualificado previsto nos arts. 296.º e 297.º/2, als. c) e d)
na pena de 20 meses de prisão;
O tribunal decide declarar perdoado, nesta pena, um ano de
prisão, ao abrigo do disposto no art. 14.º/1, al. b) da Lei 23/91
de 4/7/1991.

O MP não se conforma com esta decisão e recorre.
5
Acórdão STJ 95

Factos dados como provados
1.
No dia 23 de Fevereiro de 1991, pelas 21 horas e 30 minutos, os
arguidos dirigiram-se para a residência da ofendida Regina M., em
Monte Gordo, com a intenção de a assaltarem e retirarem do seu
interior os objectos que ali estivessem e que fossem susceptíveis de
serem transportados.
2.
Para concretizarem os seus desígnios, os arguidos entraram pela
escada até ao 1.º andar, passaram depois para um muro nas
traseiras do prédio e, caminhando pelo mesmo, chegaram até uma
janela da residência da ofendida, por onde entraram.
Escalamento
Art. 202.º, al. e) do CP
6
Acórdão STJ 95

Factos provados
3.
Após terem entrado, o arguido Marçal ficou a saber quem eram os
donos daquela residência, seus conhecidos, e por se tratar da
casa de tais pessoas, “decidiu não levar a cabo o seu propósito de
daí tirar os bens que pudesse levar que lhe interessassem”.
4.
Nesta altura deu conhecimento ao arguido Carlos dessa sua
decisão de desistir do assalto e saiu de imediato pelo mesmo sítio
por onde entrara, nada levando consigo.
Consumou ou não o crime de furto que o levou a introduzir-se na
residência da ofendida Regina M.?
Art. 203.º/1 e 2 CP
Art. 204.º/2, al. e) CP
7
Acórdão STJ 95

Factos provados
5.
O arguido Carlos entretanto apoderou-se de uma caixa com
objectos de joalharia examinados e avaliados no valor total de
58.000$00, apoderando-se de tais objectos, e fazendo-os seus.
6.
Posteriormente vendeu alguns desses objectos a três pessoas
diferentes, mas a ofendida Regina M. recuperou todos os
objectos.
7.
Do arguido Carlos sabemos que “agiu deliberada, livre e
conscientemente com o intuito de fazer seus os referidos objectos
bem sabendo que agia contra a vontade da ofendida e que tal
conduta era proibida por lei.
8
Acórdão STJ 95

Factos provados
8.
Quanto ao arguido Marçal fica provado uma “intenção declarada de
assalto à residência da Regina (…) quando nela se introduziu sem
consentimento e até mesmo contra a sua vontade presumida,
ofendendo o bem jurídico da inviolabilidade do domicílio e o direito
à reserva da intimidade ou da vida privada e familiar da ofendida”.
9.
Chegando a praticar “actos de execução de um crime de furto que
decidiu cometer, os quais eram claramente idóneos a produzirem o
resultado típico desse crime (…)”
10. No entanto, e antes de o consumar, desistiu voluntariamente de
prosseguir na sua execução, quando se apercebeu de que os
donos daquela residência eram seus conhecidos.
9
Questões Fundamentais

Crime de furto
Quando é que o crime de furto está consumado?

Arguido Carlos
Análise dogmática do crime?
Crime consumado de furto qualificado?

Arguido Marçal
Crime tentado de furto? Porquê?
Punível nos termos do art. 23.º do CP?
Comparticipação?
Relevância da desistência?
10
Crime de furto

Art. 203.º CP (Furto)
1. Quem, com ilegítima intenção
de apropriação para si ou para
outra pessoa, subtrair coisa
móvel alheia, é punido com pena
de prisão até três anos ou com
pena de multa.

Quando é que o crime de furto
está consumado?

Esta é uma pergunta frequente
nos nossos tribunais.

Para o agente faz toda a
diferença ser condenado por
furto, tentativa de furto, furto
qualificado, ou tentativa de furto
qualificado.

Mas isto depende em larga
medida de se saber quando é
que o crime de furto está
consumado, e quando é
qualificado.
2. A tentativa é punível.
3. O procedimento criminal
depende de queixa.
11
Crime de furto

O crime de furto é um crime formal.
Fica consumado com a subtracção de coisa móvel alheia,
desde que o agente tenha uma ilegítima intenção de
apropriação.

Intenção de apropriação (?)
Significa que para o crime de furto se consumar a apropriação em
si não é exigida; basta a intenção de apropriação.

Subtracção (?)
Consiste na violação do poder de facto que tem o detentor de
guardar o objecto do crime ou dispor dele, e a substituição desse
poder pelo do agente.
12
Crime de furto

Se considerarmos que o agente
subtraiu um objecto móvel alheio,
com a intenção de apropriação
para si ou para outra pessoa,
então ele será responsabilizado
por furto.

É o caso do arguido Carlos.

Que se dirigiu à residência da
ofendida “(…) com a intenção de a
assaltarem e retirarem do seu
interior os objectos que ali
estivessem susceptíveis de serem
transportados”.

Que “apoderou-se de uma caixa que
continha objectos (…) de que o
arguido Carlos se apoderou fazendoos seus” e “posteriormente vendeu
alguns de tais objectos”.

Se considerarmos que o agente não
subtraiu ou suspendeu a subtracção de
um objecto móvel alheio, então não há
subtracção (ou há subtracção
incompleta) e portanto não há
consumação do crime de furto, mesmo
que inicialmente exista uma intenção de
apropriação.

É o caso do arguido Marçal.

Que tal como o arguido Carlos se dirigiu à
residência da ofendida “(…) com a intenção
de a assaltarem e retirarem do seu interior
os objectos que ali estivessem susceptíveis
de serem transportados”.

Mas que após ter entrado ficou a saber
quem eram os donos daquela residência,
seus conhecidos, e “(…) decidiu não levar a
cabo o seu propósito de daí tirar os bens
que pudesse levar que lhe interessassem”. 13
Arguido Carlos

Art. 204.º/2, al. e) CP
(Furto qualificado)
Quem furtar coisa móvel alheia:
penetrando em habitação, ainda
que móvel, estabelecimento
comercial ou industrial ou outro
espaço fechado, por
arrombamento, escalamento ou
chaves falsas; (…) é punido com
pena de prisão de dois a oito
anos.

Análise dogmática do crime

Acção
Subtracção de coisa móvel da residência
da ofendida Regina M.

Tipo preenchido
Furto qualificado.
Tipo objectivo
Autor
Acção
Objecto da subtracção.
A subtracção da coisa móvel da residência
da ofendida pode ser objectivamente
imputada ao arguido Carlos.
14
Arguido Carlos

Tipo subjectivo
Dolo
Intenções especiais

“A punição da entrada em casa alheia visa
proteger o bem jurídico da inviolabilidade
do domicílio e o direito à reserva da
intimidade ou da vida privada e familiar,
enquanto no crime de furto se visa a
protecção da propriedade e do património
de cada um”.
O arguido Carlos sabia que
estava a subtrair coisa móvel
alheia e era isso que queria
fazer; “agiu deliberada … e
conscientemente (…)”
O arguido Carlos tinha a intenção
especial de apropriação: “(…)
agiu com o intuito de fazer seus
os referidos objectos”.
Ilicitude
Culpa
O arguido Carlos tem capacidade de
culpa: é imputável.
E tinha consciência da ilicitude do facto:
“O arguido Carlos agiu (…) bem sabendo
que agia contra a vontade da ofendida e
que tal conduta era proibida por lei”

15
Arguido Carlos

Conclusão

A actuação do arguido Carlos integra todos os elementos objectivos e
subjectivos do crime de furto qualificado previsto no art. 204.º/2, al. e) do
CP.

A ilicitude da sua conduta é elevada (tipo qualificado, consumado).

“(…) afigura-se que a pena de 20 meses de prisão aplicada na primeira
instância é realmente insuficiente para traduzir os sentimentos de
reprovação do acto e para dar satisfação às necessidades de prevenção
(…)”

É condenado como “autor material de um crime de furto qualificado
previsto no actual art. 204.º/2, al. e) do Código Penal, em dois anos de
prisão”.
16
Arguido Marçal

O arguido Marçal entrou na residência da ofendida Regina M., “(…)
com a intenção de a assaltarem e retirarem do seu interior os objectos
que ali estivessem e que fossem susceptíveis de serem
transportados”.

“Após ter entrado, ficou a saber quem eram os donos daquela
residência, seus conhecidos (…) e decidiu não levar a cabo o seu
propósito de daí tirar os bens que pudesse levar e lhe interessassem”.

“O arguido Marçal desistiu, assim, de consumar o crime de furto
que o levara à residência da ofendida, onde todavia penetrou
com intenção de a assaltar e de retirar do seu interior os objectos
que ali estivessem e fossem susceptíveis de serem
transportados”.
17
Arguido Marçal

O arguido Marçal não consumou o crime de furto.
1.
Não havendo consumação pode haver tentativa.
Será que se pode falar num crime tentado de furto?
Será que o crime tentado de furto é punível nos termos do art.
23.º CP?
2.
Havendo tentativa (início de execução) pode haver desistência.
Em que termos?
Comparticipação?
Relevância da desistência na comparticipação?
18
Tentativa?

Art. 22.º CP
(Tentativa)
Há tentativa quando o agente praticar
actos de execução de um crime que
decidiu cometer, sem que este chegue a
consumar-se.
São actos de execução:
a) Os que preencherem um elemento
constitutivo de um tipo de crime;
b) Os que forem idóneos a produzir o
resultado típico;
c) Os que, segundo a experiência
comum e salvo circunstâncias
imprevisíveis, forem de natureza a fazer
esperar que se lhe sigam actos das
espécies indicadas nas alíneas
anteriores.

Como o arguido Marçal não consumou o
crime de furto podemos falar em tentativa.

Há tentativa desde o momento em que se
inicia a execução do delito até ao momento
da sua consumação.

Actos de execução?

Existe uma intenção declarada de assalto à
residência da ofendida, quando o arguido
Marçal, introduzindo-se na residência “(…)
sem o consentimento da respectiva dona e até
mesmo contra a sua vontade presumida (…)”.
19
Tentativa?

O que significa que “o arguido Marçal praticou, assim, actos de
execução de um crime de furto que decidiu cometer, os quais eram
claramente idóneos a produzirem o resultado típico desse crime (…)”

Por serem actos de execução que preenchem um elemento
constitutivo do tipo de crime: art. 22.º/2, al. a) CP
“Penetrando em habitação (…) por escalamento”.
20
Punibilidade da Tentativa?

Art. 23.º CP
(Punibilidade da tentativa)
1. Salvo disposição em contrário,
a tentativa só é punível se ao
crime consumado respectivo
corresponder pena superior a
três anos.

Depois de se constatar que o
crime não está consumado,
deve-se averiguar se a tentativa
do crime é punível conforme o
art. 23.º CP.

Neste caso, crime tentado de
furto qualificado, trata-se de um
crime cuja tentativa é punível nos
termos gerais, dado corresponder
ao crime consumado uma pena
maior de três anos.

Art. 203.º/2 CP
A tentativa é punível mesmo no
caso de furto simples.
2. A tentativa é punível com pena
aplicável ao crime consumado
especialmente atenuada.
21
Desistência?

Só se pode pensar em desistência, caso exista tentativa.
Se o crime estiver consumado ou se o resultado se verificar ninguém
pode desistir (mas pode ainda haver “arrependimento activo”).
O arguido Marçal desistiu “(…) voluntariamente, de prosseguir na sua execução, e antes de o
consumar, quando se apercebeu de que os donos daquela residência eram seus conhecidos”.

Só pode haver desistência a partir do momento em que se inicia a
tentativa, até ao momento em que se consuma.
O que acontece quando o agente pára a execução?
Pode ser punido por tentativa de um crime?

Os artigos 24.º e 25.º CP ajudam a responder a estas questões, mas
é imprescindível ter outras circunstâncias em consideração – saber
qual o motivo que levou o agente a abandonar a execução.
22
Desistência?

Art. 24.º CP
Prevê um regime específico para a desistência em situações de autoria
singular, ie, desistência em caso de crime individual – que conduz à
isenção de pena
• Desistência voluntária;
• Desistência ou arrependimento activo;
• “Esforço sério”.

Art. 25.º CP
Prevê um regime específico para a desistência em situações de
comparticipação, criando uma norma geral assente em duas cláusulas de
desistência alternativas: a de “impedimento da consumação” e a de um
“esforço sério” – ambas conduzindo à isenção da pena.
• Diferentes regras da desistência na comparticipação.
23
Desistência – Art. 24.º CP

Art. 24.º/1
(Desistência)
A tentativa deixa de ser punível
quando o agente voluntariamente
desistir de prosseguir na
execução do crime.

Tentativa inacabada
O agente tem em mente, um
plano já definido, começa a
execução, mas pára no meio, por
um motivo qualquer, desistindo,
sem fazer tudo o que, na sua
opinião, era necessário fazer
para a consumação.

Desistência voluntária
A lei exige que o agente deixe de prosseguir a
execução do crime, que a abandone, e que
não se dê a consumação.
As pessoas desistem por uma série de razões:
medo, emoção, …
O que importa é saber se do ponto de vista de
um comportamento criminoso, a desistência
faz sentido ou não.
Porque o que decide a voluntariedade da
desistência para efeitos de isenção da pena
é saber se o abandonar da execução
correspondeu ao verdadeiro abandono do
plano criminoso.
24
Desistência – Art. 24.º CP

Art. 24.º/1
(Desistência)

Arrependimento activo
Na tentativa acabada só há espaço para o
arrependimento porque a barreira dos actos
preparatórios e dos actos de execução já foi
ultrapassada – o agente não poderá desistir de
prosseguir na prática dos actos de execução se
estes já foram todos executados.

A ele caberá o dever, se ele se arrepender, de
impedir a consumação, ou a verificação do
resultado não compreendido no tipo de crime.

A lei exige ao agente mais do que o abandono
do plano; ele voluntariamente tem de impedir a
consumação do crime através de uma
actividade própria.

Exige-se que o desistente tenha posto em
movimento uma nova cadeia causal dirigida
a impedir a consumação do facto, e que a
não verificação da consumação lhe seja
imputável.
A tentativa deixa de ser punível
quando o agente voluntariamente (…)
impedir a consumação (…)

Tentativa acabada
Verifica-se quando o agente pensa já
ter feito tudo o que era necessário ou
suficiente para a consumação do
crime por ele planejado.
25
Desistência – Art. 24.º CP

Art. 24.º/1 CP
(Desistência)
A tentativa deixa de ser punível
quando o agente voluntariamente
(…) não obstante a consumação,
impedir a verificação do resultado
não compreendido no tipo de crime.

Ainda no âmbito da tentativa acabada, a nossa
lei alarga o privilégio da desistência aos casos
em que se dá a consumação formal; mas não
a consumação material.

O que significa que abrange todos os casos
em que o resultado atípico ainda não teve
lugar; resultado esse que a lei teve em vista
evitar quando construiu a incriminação e que,
por isso mesmo, ainda faz funcionalmente
(embora não formalmente) parte da realização
completa do conteúdo do ilícito tido em vista
pelo legislador.

O art. 24.º CP dá abertura a uma isenção de
penas sem limites para os crimes
consumados, quando são preenchidos os
requisitos nele inerentes – os resultados
que materialmente se tentam evitar através
da incriminação daquele acto.
26
Desistência – Art. 24.º CP

Art. 24.º/2 CP
(Desistência)
Quando a consumação ou a
verificação do resultado forem
impedidas por facto
independente da conduta do
desistente, a tentativa não é
punível se este se esforçar
seriamente por evitar uma e
outra.

“Esforço sério”
Quando o agente intenta levar a cabo
tudo aquilo que subjectivamente pensa
que teria de fazer ou pode fazer para
evitar a consumação.

Aplica-se a situações em que o agente
se propõe impedir a consumação do
crime, mas esta acaba por ser
impedida não por força da sua
actividade, mas por facto independente
da sua conduta.

Mesmo neste caso a nossa lei prevê
que o agente não é punível se ele se
tiver esforçado seriamente para
evitar a consumação.
27
Comparticipação?

A Comparticipação criminosa tem lugar quando várias pessoas concorrem
para a prática de um facto penalmente relevante, caracterizando-se, pois, por
uma pluralidade de intervenientes nesse facto.

A matéria é tratada no CP, arts. 26º, 27º, 28º e 29.

A problemática das regras de comparticipação criminosa consiste em saber,
dentro da prática de um facto doloso, quem é que é responsável, porquê e
em que termos é imputável a responsabilidade criminal.

Integradas nas formas especiais de cometimento da infracção, as regras da
comparticipação criminosa servem para se poder aplicar as regras da parte
especial a outras pessoas que não apenas àquelas que praticam o facto por si
mesmas, sendo certo que as normas da parte especial carecem das normas da
parte geral para integrar outros comportamentos além dos que expressamente
prevêem (tipicidade).
28
Comparticipação?

Por exemplo, as normas dos arts. 26º e 27º CP são normas da Parte Geral que
estão estruturalmente “amputadas”, incompletas; precisam de ser completadas
pelas normas da Parte Especial, que desenha os comportamentos típicos ilícitos;
sozinhas, não têm aplicação.

E através destas relações entre as normas dos arts. 26º, 27º e 28º CP e as
normas da Parte Especial, desenha-se um conjunto de outras regras, “novos”
comportamentos criminalmente relevantes, “novos” comportamentos típicos.

As regras dos arts. 26º, 27º, e 28º CP são, pois, regras de extensão da
tipicidade; ou seja: regras que visam tornar típicos comportamentos que
não eram típicos, através do alargamento dos tipos da Parte Especial .

Funcionam como um alargamento da tipicidade dos actos, valorando
contributos que não são imediatamente subsumíveis aos tipos de ilicitude
da parte especial – estendem a tipicidade da parte especial.
29
Comparticipação?




Comparticipação
Consiste no envolvimento de vários
agentes na prática do facto
criminalmente ilícito.
As distinção das categorias na
comparticipação criminosa
assenta na distinção
fundamental entre autoria e
participação.
A participação abrange os
participantes: instigadores e
cúmplices.
Participação
o
Instigação
O instigador cria dolosamente no autor uma vontade
“ex novo”; ou seja: convence a outra pessoa a
praticar o crime .
o
Cumplicidade
É uma forma de participação criminosa que consiste
em prestar auxílio ao autor do crime; a participação
do cúmplice não é determinante para gerar a
resolução criminosa.

Cumplicidade material
É a prestação de uma ajuda material para a
execução do crime – o cúmplice material ajuda
materialmente na preparação do facto típico e ilícito,
por ex fornecendo os meios para a execução do
crime.

Cumplicidade moral
É o auxílio moral à prática por outrem de um facto
doloso (art. 27°/1). Trata-se de um conselho, um
acto não determinante da prática do facto criminoso
(se for determinante é instigação).
A autoria abrange a autoria
singular, a autoria mediata e a coautoria.
30
Comparticipação?
Autor Material
Autores
Autor Mediato
Co-autores
Comparticipantes
Instigador
Participantes
Material
Cúmplice
Moral
31
Comparticipação?

Art. 26.º CP
(Autoria)
É punível como autor quem
executar o facto, por si mesmo
ou por intermédio de outrem, ou
tomar parte directa na sua
execução, por acordo ou
juntamente com outro ou outros,
e ainda quem, dolosamente,
determinar outra pessoa à prática
do facto, desde que haja
execução ou começo de
execução.

Autoria
Abrange
a autoria singular – que é
directamente tipificada na parte
especial, como autoria como
directa e singular;
a autoria mediata
e
a co-autoria.
32
TEORIAS: AUTORIA

Existem várias teorias referentes à determinação do autor, e
escolhemos dois exemplos para demonstrá-las.

Teoria do domínio do facto
(Welzel, Claus Roxin)

Teoria causalista
(Prof. Eduardo Correia)
33
Comparticipação?

Art. 26.º, 1.ª parte, CP
(Autoria)
É punível como autor quem executar
o facto, por si mesmo ou por
intermédio de outrem (…)

Autor material ou imediato

Teoria do domínio do facto
É autor aquele que tem o domínio do facto.
Quem tem o poder de conduzir o processo
até ao fim e de o fazer parar a qualquer
momento. Quem tem em seu poder o
sucesso da acção ilícita.
O autor tem o domínio do processo
causal, quer positivo, porque é dele que
depende a prática de actos de execução,
quer negativo, porque pode fazer parar a
execução do crime.
34
Comparticipação?

Teoria causalista

Critérios materiais objectivos
(Prof. Eduardo Correia)
Conceito de autor segundo
critérios de causalidade - quem
presta um contributo que é
essencial ao cometimento do
facto é considerado autor.

Diferentemente...

Dr. F. Costa Pinto: não admite
critérios meramente
causalistas.

Entre outras razões, porque a teoria
causalista defendida pelo Prof. Eduardo
Correia trata da mesma forma contributos
que, de acordo com a experiência comum,
são diferentes.

O que é potencialmente lesivo do princípio da
proporcionalidade, até porque as lesões
causadas aos bens jurídicos serão
necessariamente diferentes.

Aquele que pratica actos de execução do
crime por si mesmo – tem o domínio
positivo do facto; tem o domínio da acção.

Ter o domínio do facto/da acção – quer
dizer que há um poder de travar (negativo)
ou fazer avançar a agressão ao bem
jurídico (domínio positivo).

Por oposição, far-se-á o raciocínio
inverso: quem não detém esse domínio
não é autor.
35
Comparticipação?

Art. 26.º, 2.ª parte, CP
(Autoria)
É punível como autor quem (…)
dolosamente, determinar outra
pessoa à pratica do facto, desde
que haja execução ou começo de
execução.


Autor mediato
Aquele que pratica o crime
através de outrem; aquele que
determina directamente a
realização de um crime
utilizando, ou fazendo actuar,
outro por si.

A determinação pode ser por
conselho, ameaça, violência, ordem
pedido etc.

A responsabilidade do autor mediato
não é afastada pelo facto de o
executante ser inimputável.

Nas situações em que há autoria
mediata:
1. É sempre o autor mediato que tem o
domínio da execução;
2. O executante é mero instrumento
do crime.
Têm o domínio do facto, pois têm
o domínio da vontade do autor
material, aquele que vai executar
o crime.
36
Exemplo de autoria mediata:
Dava ordens (aos
autores imediatos) para
cometer variadíssimos
ilícitos (matar, roubar,
incendiar...);
 Hierarquia,
proteccção,
paternalismo.
 Propostas que
“ninguém poderia
recusar”;
 Curiosidade: o logo
alude a uma
marioneta.

37
Comparticipação?

Art. 26.º, 3.ª parte, CP
(Autoria)
É punível como autor quem (…)
tomar parte directa na sua execução,
por acordo ou juntamente com outro
ou outros


Os Co-autores são os agentes do crime
que têm o domínio do facto, e cuja
actuação pode, a todo o momento, evitar
que o facto seja praticado.

Para haver co-autoria exige-se que haja...
(cumulativamente)
Co-autor
Aquele que conheceu da actividade
dos outros e colaborou
conscientemente nela, executando
parcialmente o crime – é
responsável por toda a actividade.
Uma decisão conjunta
ou, pelo menos ...
uma acção concertada


Na co-autoria, basta provar a
adesão de vontades de cada um à
execução do crime?
Nestas situações tem-se uma repartição de
funções em que existe, por parte de cada
um dos co-autores, um domínio funcional
do facto.
38
Comparticipação?

Isto é, de acordo com o contributo
que presta, o sujeito, pelo papel que
tem, pela função que desempenha
dentro do plano, detém um domínio
funcional do facto.

Um dos elementos da co-autoria
é um elemento de carácter misto,
que é o acordo.

Ou seja, para existir co-autoria é
necessário que exista um acordo,
uma concertação de vontades para
a prática do facto; que pode ser
uma decisão conjunta prévia, ou
pode ser uma decisão no momento
da prática do facto.

Esta concertação de vontades
existe na co-autoria e não existe
na autoria mediata.

Co-autoria vs. autoria mediata

Na autoria mediata existe uma vontade de
dirigir o facto por parte do autor mediato,
mas não há concertação de vontades;

Na co-autoria há concertação de vontades –
é necessário um acordo que pode ser:
o Prévio ao facto;
o Ou pode ocorrer no momento da prática
do facto.
o Expresso;
o Tácito.

O que é necessário é que exista um
acordo que se traduz nesta concertação
de vontades para a prática do facto.
39
Exemplo de Comparticipação




Comparticipação
perfeita, completa.
Planos articulados;
Execução concertada,
com papéis atribuídos e
de igual importância.
Verdadeiros co-autores.
40
Desistência – Art. 25.º CP

Art. 25.º CP
Desistência em caso de
comparticipação

A base da desistência é ser voluntária
(…) No entanto, se o crime for
comparticipado as regras são diferentes.

Se vários agentes
comparticiparem no facto, não é
punível a tentativa daquele que
voluntariamente impedir a
consumação ou a verificação do
resultado, nem a daquele que se
esforçar seriamente por impedir
uma ou outra, ainda que os
outros comparticipantes
prossigam na execução do crime
ou o consumam.

A relevância da desistência passa a
depender da verificação alternativa de
uma de duas cláusulas:
a.
A do impedimento da consumação ou
do resultado lesivo;
b.
A do esforço sério de impedir uma ou
outra, ainda que os outros
comparticipantes prossigam na
execução do crime ou o consumem.
41
Desistência – Art. 25.º CP

Antes de aprofundar o conteúdo da desistência em situações de
comparticipação importa referir que o art. 25.º CP…

Prevê uma regulamentação especial da relevância da desistência
relativamente a um facto tentado no qual comparticipam várias pessoas.

Constitui uma radical inovação face ao Direito anterior e perante as
soluções dominantes no plano comparado.

Inovação essa que consiste principalmente em não condicionar a
desistência do “comparticipante” à efectiva ausência de consumação – ao
contrário do que acontece para o autor singular, no art. 24.º CP
42
Desistência – Art. 25.º CP

Especificidades do art. 25.º CP…
Para tudo o resto vale o regime da desistência do art. 24.º CP.
Círculo de pessoas abrangidas pela norma;
 Modelo da desistência da tentativa na comparticipação;
 Relevância da desistência da tentativa na comparticipação.


Círculo de pessoas abrangidas pela norma
Totalidade dos comparticipantes no mesmo facto?
Vai depender do critério utilizado e da delimitação feita entre o art. 25.º e o
art. 24.º CP.
43
Desistência – Art. 25.º CP

Partindo de um conceito de autoria com fundamento na “teoria
do domínio do facto”, o campo de aplicação do art. 25.º é
delimitado a partir da sua diferença essencial com o art. 24.º
CP, que se traduz na verificação de que o legislador distribuiu
de formas diversas o risco de insucesso da desistência.

O art. 25.º CP aplica-se aos agentes que, ao desistirem, não
tenham anteriormente exercido um domínio positivo,
exclusivo ou igualmente repartido sobre a lesão do bem
jurídico.

O que significa que “comparticipantes” para efeitos do art.
25.º CP não corresponde à pluralidade de intervenientes.
44
Desistência – Art. 25.º CP

Art. 24.º CP
Desistência

Art. 25.º CP
Desistência em caso de comparticipação

Um autor apoiado por participantes
(instigadores ou cúmplices) desistirá
nos termos deste artigo;


Um autor imediato desistirá nos
termos deste artigo;
Um co-autor dependente, que não exerça
qualquer domínio positivo sobre o perigo
típico dirigido à consumação, nem negativo
sobre os actos do autor, desistirá nos termos
deste artigo;

Nos casos de participação (instigação e
cumplicidade) a desistência será nos termos
deste artigo.

Nas situações de autoria formal em que o
domínio positivo da lesão do bem jurídico
pertence a outrem que não o autor, a
desistência também será nos termos deste
artigo.

Um autor mediato desistirá nos termos
deste artigo.

Nos casos de co-autoria
complementar a desistência também
será nos termos deste artigo.
45
Desistência – Art. 25.º CP

Modelo da desistência da tentativa na comparticipação
O modelo seguido pelo direito português caracteriza-se por uma
grande liberalidade na atribuição do privilégio da desistência.

A desistência terá ainda lugar quando haja consumação; “ainda que os
outros comparticipantes prossigam na execução do crime ou o
consumam”.

Compreende-se e aceita-se que o privilégio da desistência da tentativa
de comparticipação seja levado tão longe quando possível no sentido de
operar a “reversibilidade do processo lesivo”.

Existem outros modelos da desistência da tentativa na
comparticipação mas são passíveis de sérias reservas.
46
Desistência – Art. 25.º CP

Relevância da desistência da
tentativa na comparticipação
Está dependente da verificação
alternativa de uma de duas
cláusulas:
o A do impedimento da
consumação ou do resultado
lesivo;
o A do esforço sério de impedir
uma ou outra, ainda que os
outros comparticipantes
prossigam na execução do
crime ou o consumem.

As duas cláusulas de desistência do art.
25.º CP são alternativas, autónomas e
têm estrutura e natureza diferentes.
o A conduta do “impedimento” da
consumação gera apenas um
problema de imputação da ausência
de lesão ao desistente – para estar
preenchida basta um domínio ou codomínio do desistente sobre o processo
de defesa do bem jurídico podendo ser
realizada por omissão.
o A cláusula de “esforço sério” alarga as
possibilidades de desistência do
comparticipante, impedindo-o de ser
responsabilizado, quer por uma tentativa,
quer pelo facto consumado.
47
Desistência – Art. 25.º CP

Cláusula do impedimento da consumação ou do resultado lesivo.

Gera apenas um problema de imputação da ausência de consumação ao
comparticipante desistente.

Autoria do impedimento?
 É necessário que o desistente tenha desenvolvido uma contra-
actividade para impedir a consumação;
 É necessário que o desistente tenha dominado ou co-dominado o
processo de salvação do bem jurídico.
 Caso contrário a ausência de consumação acaba por ser independente do seu
contributo – momento em que se deve recorrer ao conceito de “esforço sério” como
alternativa da desistência permitida pela lei – no art. 24.º/2 e no art. 25.º CP.
48
Desistência – Art. 25.º CP

Conclusão

Se o agente se limita a desencadear o processo de defesa do
bem jurídico, transferindo integralmente as probabilidades do seu
sucesso para um terceiro, ou deixando-o ao acaso, não se pode
dizer que foi ele quem impediu a consumação.

Se não mantiver pelo menos uma posição de co-domínio que lhe
permita contrariar erros, riscos ou interferências neutralizadoras
do seu processo de salvamento do bem jurídico, não se pode
dizer que a consumação foi impedida pelo desistente.

Só impede algo quem detém sobre o evoluir dos
acontecimentos um domínio efectivo, ou pelo menos,
potencial. De resto pode ter facilitado a não ocorrência de
um evento, mas não o impediu.
49
Desistência – Art. 25.º CP

Cláusula do esforço sério de impedir a consumação ou o
resultado material

O Dr. F. Costa Pinto dá uma definição daquilo que é “esforço
sério” para estes efeitos, realçando que a inclusão deste
preceito compreende já um alargamento da relevância da
desistência do comparticipante, admitindo que, nalguns casos,
não estará necessariamente ligada a efectiva uma ausência de
consumação.

Isto é, realizado um esforço sério impeditivo da consumação,
mediante “ (...) conduta, activa ou omissiva (...) idónea a
proteger os bens jurídicos em perigo (...)” ou, não conseguindo,
promovendo uma conduta de não inutilização irreversível da “
(..) possibilidade de ser adoptada outra contra-medida com
mais probabilidades de defesa da vítima.”
50
Acórdão STJ 95 - Conclusão

“O arguido Marçal praticou, assim, actos de execução de um crime de
furto que decidiu cometer, (…) desistindo, contudo, voluntariamente,
de prosseguir na sua execução, e antes de o consumar, quando se
apercebeu de que os donos daquela residência eram seus
conhecidos.”

“Se houvesse actuado sozinho, sem a colaboração de outrem, teria
incorrido numa tentativa, não punível, de crime de furto, por efeito da
desistência voluntária de o consumar.”

Art. 24.º/1 CP
51
Acórdão STJ 95 – Conclusão

“Foram, porém, dois os autores do assalto à residência da ofendida
Regina, pelo que, nos termos do artigo 25.º do CP, ainda não seria
punível a conduta do arguido Marçal se este voluntariamente impedisse
a consumação do crime de furto ou a verificação do seu resultado, ou se
se esforçasse seriamente para impedir uma ou outra, mesmo que o seu
comparticipante prosseguisse - como efectivamente prosseguiu – na
execução e consumação do crime.”

“O arguido Marçal limitou-se, porém, a dar conhecimento ao co-arguido
Carlos da sua decisão de desistir do assalto, e a sair imediatamente da
residência da ofendida pelo mesmo sítio por onde entrara.”

“Nada fez, nestas circunstâncias, para evitar a execução do crime de
furto que o seu comparticipante Carlos efectivamente consumou. E
assim sendo, permanecem relevantes, para efeitos de punição, os actos
de execução do crime de furto que o arguido Marçal tinha decidido
cometer, incontestavelmente idóneos a produzirem o resultado típico
desse crime.”
52
Acórdão STJ 95 - Conclusão

De tudo isto se conclui que…

“Não existe desistência relevante quando o arguido entra ilicitamente
com outros comparticipantes na casa que pretendiam assaltar e,
apenas aí dentro, por verificar que a ofendida era sua conhecida,
comunica aos outros que desiste do seu propósito de retirar e levar
bens que lhe interessassem.”

“Isto, porque o artigo. 25.º do CP não prevê a desistência em sentido
próprio, mas apenas o arrependimento activo do comparticipante, que
impedisse seriamente ou se tivesse esforçado seriamente para impedir
a consumação ou verificação do resultado.”

“Desta forma, com essa conduta, constitui-se autor do crime tentado
punível de furto qualificado” – condenado em um ano de prisão.
53
Sugestões de debate:
Sendo o arguido Marçal inicialmente acusado
do crime de furto em co-autoria, passa depois,
em sede de recurso, a ser arguido pelo crime
de furto tentado.
n.b. - já sabemos agora que:
A conjugação do tipo (Parte Especial) com a as
normas da Parte Geral (arts. 22º e ss.) forma
um novo tipo de ilícito, é como se fosse um
“crime diferente”;
[mas não o é de maneira substancial, se não o
julgamento não poderia processualmente
prosseguir]
54
Bibliografia
BELEZA, Teresa Pizarro – Direito Penal – 2º Volume, AAFDL,
Lisboa, 1988
 Ilicitamente Comparticipando: O âmbito de aplicação do art. 28º do
CP
 COSTA PINTO, Frederico Lacerda da - A Relevância da
Desistência em situações de Comparticipação -, Almedina,
Coimbra, 1992
 FIGUEIREDO DIAS, Jorge de – Direito Penal -, Parte Geral, Tomo
I, 2º Edição, Coimbra Editora, 2007

55
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Art. 25.º CP