Entrevista: Roberto Rodrigues
Mercado do etanol depende
de legislação dos países consumidores
Presente à abertura do 50º Simpas – Sistemas
Integrados de Manejo da Produção Agrícola Sustentável, o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, explicou porque, mesmo o etanol sendo aclamado como solução energética, ainda não há um
mercado estruturado para o produto.
Atualmente, ele é presidente do Conselho Superior de Agronegócio da Federação das Indústrias
do Estado de São Paulo (Fiesp) e Coordenador do
Centro de Agronegócio da FGV (Fundação Getúlio
Vargas). Em entrevista à Revista Coplana, ele fala de
seu trabalho nas duas entidades e sobre os desafios
da energia verde.
Revista Coplana - Como vem se desenvolvendo o
seu trabalho na Fiesp e FGV?
Rodrigues - No caso da Fiesp, é um conselho superior
do agronegócio, composto por mais de 50 entidades
do Brasil, que compõem todas as cadeias produtivas
do setor. Lá, tentamos compreender quais são os temas comuns ligados às cadeias produtivas e a cada
segmento diferenciado do agronegócio, buscando propostas e soluções, através das quais a Fiesp
apóie o esforço das entidades, independentemente
de sua origem, seja sindical, cooperativista ou o que
for. Nós não discutimos, por exemplo, a remuneração do algodão ou o transporte da cana, já que são
coisas específicas. Discutimos grandes temas, como
a questão do seguro rural, crédito, comunicação,
rastreabilidade e certificação, assuntos que interessam a todo o setor. Quanto à FGV, ela criou um
centro de agronegócio com o objetivo de unificar
12 - Revista Coplana - Novembro 2007
quatro áreas que estavam dispersas da instituição:
cursos, consultoria, projetos e comunicação. Tudo
isso foi centralizado num único organismo que antes
não existia. Desde que cheguei à FGV, dei prioridade
à questão dos biocombustíveis (agroenergia). Obtivemos alguns resultados importantes. O primeiro é
a criação, na FGV, em parceria com a Esalq (Escola
Superior de Agricultura Luiz de Queiroz) e Embrapa
(Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), do
primeiro mestrado do mundo em agroenergia, que
entra em vigor em 2008. É inusitado na história recente do Brasil que três instituições de pesquisa se
somem num único projeto, tornando-se uma rede de
academia inédita. A agroenergia é um projeto universal de grande envergadura e que não se desenvolve por falta de cérebros preparados para isso. O Bra-
Entrevista
sil não tem que exportar álcool, tem que exportar
tecnologia, know-how, conhecimento e, para isso,
tem que formar profissionais preparados. Ainda no
setor de agroenergia, ligado à consultaria da FGV,
é interessante mostrar que a mesma se candidatou
nessa grande concorrência internacional, quando
Brasil e Estados Unidos se uniram para desenvolver
o etanol na América Central (Caribe). Isso vai nos
permitir desenvolver o etanol de cana-de-açúcar já
aprovado em três países (El Salvador, República Dominicana e Haiti).
Revista Coplana - O etanol tem sido aclamado no
mundo como alternativa energética, mas o produtor ainda se depara com remuneração aquém de sua
expectativa. Qual sua análise sobre isso?
Rodrigues - Não existe no mundo um mercado para
o etanol, por três razões fundamentais: o Brasil é
um produtor que exporta um volume inconsistente;
segundo, porque só vai haver um mercado quando
os países consumidores tiverem uma legislação que
obrigue a mistura do etanol em derivados de petróleo; e terceiro, é necessário que se torne uma commodity. O que precisamos desenvolver no Brasil é
uma estratégia para isso. Não há dúvida nenhuma
que o mercado de biocombustível certamente virá.
O etanol já é viável em qualquer país. Então, é preciso elaborar uma estratégia nacional que considere
quanto etanol queremos produzir, qual a quantidade
para mercado externo e interno, quem vai cuidar de
logística, do saneamento agrícola, financiamentos da
produção e do modelo de produção. Há no Brasil um
modelo iminentemente concentrador de renda e de
terra. Precisamos fazer algo diferente, que garanta
a remuneração dos diferentes agentes de maneira
equilibrada, ou seja, um modelo que distribua renda
a todos, inclusive nas regiões produtoras. Se houver
isso, de forma sustentável e com todas as suas vertentes bem tratadas, ninguém vai ficar contra a cana
ou o etanol.
Revista Coplana - O Simpas (Sistemas Integrados
de Manejo da Produção Agrícola Sustentável) serve
para mostrar que a agricultura e meio ambiente não
estão em campos opostos?
Rodrigues - Quem é o maior interessado na preservação do solo é o agricultor, pois se não cuidar
de seu sistema produtivo, vai perder o seu fator de
produção. O agricultor moderno, que tem uma visão sistematizada de produção e de mecanismos
sustentáveis, é aquele que mais se preocupa com
a preservação ambiental e com a conservação do
solo. O que o Simpas faz é demonstrar a possibilidade de se ter uma agricultura moderna articulada
com a sustentabilidade, que garanta a preservação
do meio ambiente e recursos naturais.
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