A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
MERCOSUL, POLÍTICA DE REGIONALIZAÇÃO NO CONTINENTE
SUL-AMERICANO: AVANÇOS E IMPASSES.
ALINE OLIVEIRA SILVA1
Resumo: Este trabalho tem por objetivo analisar as novas perspectivas que se colocam para a
relação bilateral Brasil e Argentina e consequentemente para a o Mercado Comum do Sul, ao longo
dos últimos doze anos, período caracterizado pela emergência de governos com perspectivas
progressistas possuindo forte operacionalização nas áreas econômico-social, e que, portanto
colocam a integração regional em uma segunda fase, em uma retomada do movimento “nacionaldesenvolvimentista”. Pretendeu-se através da investigação dos novos acordos e negociações no
âmbito bilateral e do bloco - como o FOCEM (Fundo de Convergência Estrutural para o MERCOSUL),
identificar o fortalecimento da integração regional, sobretudo no campo político e social, mas também
apontar os desafios que se colocam para a integração territorial, sobretudo nas deficiências de
infraestruturas, mas também a partir das conjunturas políticas internas dos países supracitados.
Palavras-chave: Globalização; Brasil- Argentina; Mercosul; Integração Regional.
Abstract: This paper aims to analyze the new perspectives about the bilateral relation between
Brazil and Argentina and consequently to the Mercosur, throughout the last twelve years, a period
characterized by the emergence of progressive governments, with strong operation in socio-economic
areas, this way placing the regional integration in a second phase, named “national-development”. We
intended, through the investigation of new agreements and negotiations in the bilateral scope and also
in the bloc one – such as FOCEM (MERCOSUR Fund of Structural Convergence), identify the
strengthening of the regional integration, especially in the political and social fields, but also to point
out the challenges to the territorial integration, principally in the infrastructres’ deficiencies, and also
from internal political conjunctures of the mentioned countries.
Key-words: Globalization; Brazil-Argentina; Mercosur; Regional Integration;
1 – Introdução
Este trabalho tem por finalidade levantar elementos para a reflexão da fase
atual da integração regional sul-americana, em especial do Mercado Comum do Sul
(MERCOSUL), por meio da análise e reflexão da relação bilateral Argentina e Brasil,
no período de 2003 a 2014.
Entende-se que a relação argentino-brasileira compõe o motor central
(VADELL, 2010) para o entendimento e manutenção do referido bloco, devido à
centralidade que exerceu na sua formação, através da existência de uma base
territorial relativamente desenvolvida “que se estende das latitudes de Belo
Horizonte à faixa que vai de Buenos Aires á Córdoba” (GEIGER, 2006, p.153),
estabelecida através da instalação de infraestruturas de integração regional com
crescentes interações econômicas e sociais caracterizando o espaço geográfico
1
Acadêmica do Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana da Universidade de São Paulo. E-mail de
contato: [email protected]
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mais denso no continente Sul-americano, e na centralidade que ainda exerce na
dinâmica atual do bloco, apontado em Costa (2009) como relação bilateral
responsável pelo dinamismo econômico e regional intrabloco.
Adotou-se para a análise o período de 2003 a 2014, pela sua caracterização
como parte do segundo momento do Mercosul (ARROYO, 2010), em um contexto
de críticas ao neoliberalismo e redefinição dos pactos territoriais, por meio da
ascensão de governos com forte retomada de uma abordagem “nacionaldesenvolvimentista”2. Nesta perspectiva, retoma-se um contexto de integração
regional com maior autonomia frente a outros atores do cenário internacional e que
possui em sua essência uma pauta de integração além da comercial, através de
novas abordagens nas esferas econômica, social e política.
Nesta conjuntura observa-se no Mercosul avanços com a criação de órgãos
que abordem temas como democracia, direitos humanos, emprego e questões
sociais, com destaque para o Fundo de Convergência Estrutural para o MERCOSUL
(FOCEM), criado em 2004, destinado a sanar assimetrias entre os países-membros
do bloco através da destinação de recursos para criação de infraestrutura física,
estrutura produtiva e índices sociais.
A partir deste quadro, em especial do estabelecimento do FOCEM, seguemse doze anos de acordos, avanços e impasses para a integração. Este artigo
objetiva por meio do levantamento das novas normativas e da pesquisa bibliográfica,
identificar o fortalecimento da integração regional, sobretudo no campo político e
social, mas também os desafios que se colocam para a integração, apontados
principalmente pelas deficiências de infraestruturas de transporte, energia,
saneamento e telecomunicações, que segundo Gehre (2012), se caracterizam como
os maiores obstáculos ou empecilhos, para o estabelecimento de cadeias produtivas
regionais.
O desenvolvimento do trabalho se divide em duas partes principais, a
primeira, partindo de uma compreensão que o atual contexto do bloco e da relação
Brasil- Argentina não pode ser pensada sem o contexto em que se inseriu a
formação dos blocos regionais no início dos anos 1990, abordará a globalização e
seus impactos para os Estados e a segunda, abarcará diretamente os últimos doze
2
No caso brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2007/ 2007-2010) e Dilma Rousseff (2010-2014) e
do argentino Néstor Kirchner (2003-2007) e Cristina Fernandéz de Kirchner (2008-2011/ 2012-2015).
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anos, com o levantamento e análise dos avanços e dos impasses que se colocam
para a relação bilateral e consequentemente para o Mercosul.
2.1 A globalização, os Estados- Nacionais e o impulso a integração regional.
O final do século XX é caracterizado como um período de profundas
mudanças no sistema internacional mundial configurando-se um quadro de amplas
modificações políticas e econômicas, dentre elas, a globalização, fenômeno que
possui como características a constituição de uma nova fase do capitalismo mundial
(ARROYO, 1999) em um processo de internacionalização e transnacionalização,
onde as finanças, a flexibilização normativa, os novos mercados e padrões de
consumo, as formas de produção, os serviços e inovação tecnológica, surgem como
grandes pilares da transformação econômica mundial.
Influenciados por este grande fenômeno, os atores hegemônicos préexistentes ao período são chamados à requalificação e adquirem novas funções,
participando de maneira diferenciada nos usos do território, com possibilidade de
articulações nas diferentes escalas existentes (local, nacional, regional e global).
Os Estados Nacionais em tal contexto se requalificam e ganham novas
funções, emergindo como grandes provedores de condições para a realização do
capital, colocando-se de um lado como regulador das atividades do capital
corporativo ao seu interesse, a fim de atrair mais capital e de outro adequando e
requalificando seus territórios por meio da provisão e manutenção de sua base
material, adequada para o aumento de fluidez territorial e produzindo um corpo
normativo que facilite a porosidade territorial (ARROYO, 1999; 2010), tornam-se,
portanto, espaços nacionais da economia internacional (SANTOS, [1994] 2008).
Dentre as bases normativas produzidas surgem os blocos regionais, que
produzem
porosidade
territorial,
através
da
institucionalização
de
acordos
normativos inicialmente econômicos, mas que também possuem importantes papéis
geopolíticos e podem devido às múltiplas facetas e escalas que agregam e
amalgamam (ROSEIRA, 2011) ser concebidos como geração de um novo território.
Arroyo (1996) aponta três elementos do Tratado de Assunção (1991) que
caracterizam o Mercosul, maior expressão de bloco regional sul-americano da
década de 1990, como configuração de um novo território, são eles: 1-) “Uma livre
circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países-membros”, criadora
de uma nova escala ao processo produtivo e a circulação e portanto alargado os
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circuitos espaciais da produção e os círculos de cooperação; 2-) “O estabelecimento
de uma tarifa externa comum em relação a terceiros Estados” através da
consignação de uma política comercial negociada entre os membros, sendo,
portanto, criados novos limites econômicos e 3-) “A coordenação de políticas
macroeconômicas e setoriais entre os Estado Parte”, exigindo uma política de
negociação, consenso e objetivos comuns, “pode-se falar então de novos limites
políticos na medida em que busca um nível de decisão compartido” (ARROYO,
1996, p. 308).
O Mercosul, fruto de uma aproximação ainda na década de 1980 de Brasil e
Argentina, tem seu embrião na Ata de Iguaçu de 1985, sendo fundado em um
contexto de forte atrelamento do continente sul-americano aos preceitos do
neoliberalismo forjado pelo Consenso de Washington, momento que caracteriza-se
como primeiro período do bloco (de 1991 a 2003), em um viés fortemente comercial,
sob influência do chamado “regionalismo aberto”. Interessamos especialmente para
este trabalho o já referido segundo momento, ao qual nos dedicaremos na seção a
seguir.
2.2 A segunda fase do Mercosul a partir da relação bilateral Brasil e Argentina,
novos elementos para a análise continental.
As eleições de Luís Inácio Lula da Silva no Brasil e de Néstor Kirchner na
Argentina no ano de 2003 culminaram, embora em graus distintos de intensidade,
em rupturas profundas na forma como internamente se pensava a política externa
em cada país. Uma mudança de paradigmas e focos de atuação que refletiram
diretamente na relação bilateral Brasil e Argentina e consequentemente em todas as
relações multilaterais continentais, reavivando o abalado Mercosul, que ao ser
diretamente impactado pelas crises econômicas internas dos países no final dos
anos 1990, adormecia.
O governo de Luís Inácio Lula da Silva se caracteriza, no tocante a
abordagem da política externa, em relação ao governo anterior de Fernando
Henrique Cardoso, não em uma diferença política quando aos principais temas
abordados, mas sim em uma diferente postura de agir e se posicionar na arena
internacional (VADELL, 2010). Não representando, portanto, um projeto claro de
divergência com o contexto neoliberal, mas sim um modelo de moderação e
pragmatismo conveniente com as tradicionais práticas brasileiras de política externa,
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pautada no multilateralismo e na autonomia, com ênfase na cooperação Sul-Sul e na
região sul-americana (OLIVEIRA, 2012).
Na ênfase da cooperação sul-americana, o governo identificou na Argentina,
país que já vinha sendo encarado como peça fundamental de equilíbrio comercial e
aumento da competitividade externa em termos econômicos, um parceiro essencial
para manutenção de uma zona de paz e equilíbrio político (OLIVEIRA, 2012). A
integração seria, portanto um elemento necessário para impulsionar o próprio
desenvolvimento nacional e regional, atrelando-se além das pautas comerciais,
instrumentos políticos, sociais e culturais, além de infraestruturas de circulação,
questões estratégicas e de segurança.
Partindo-se desta perspectiva de América do Sul, o Mercosul tornou-se a
iniciativa que mais se beneficiou desta nova postura de “autonomia pela
diversificação” do governo Lula (VADELL, 2010), sobretudo a partir de uma
convergência com o governo argentino (primeiramente com Eduardo Duhalde e
aprofundada com Néstor e Cristina Kirchner, a partir de 2003), em uma atitude
compartilhada das diplomacias de dialogar e se relacionar bilateralmente apesar das
divergências, chegando a pontos comuns.
A política externa alterou-se profundamente a partir o governo transitório de
Eduardo Duhalde (2002-2003) e principalmente com a eleição de Néstor Kirchner,
cabe colocar que diferentemente do desenvolvimento da política externa brasileira,
com um Itamaraty consolidado e atuante, a Argentina possui sua diplomacia
fortemente atrelada à postura central do governo federal (VADELL, 2010), portanto,
a partir de 2003, observa-se um rompimento total com a política neoliberal da
década de 1990 e começo dos 2000, com emprego de uma corrente heterodoxa,
com vieses, pragmático, com relação à reconstrução do desenvolvimento argentino,
pós- períodos de instabilidade política e crise econômica de 2001 e progressista a
partir da aposta em uma aliança estratégica com o Brasil.
Como observa Oliveira (2012, p. 111),
[...] a mudança na política externa argentina a partir de 2003 se deu pela
consciência de que deveria existir um câmbio de uma perspectiva liberal
para uma desenvolvimentista, pautada pela aproximação com a região sulamericana; isso tudo fundamentado pelo modelo trazido pelo kirchnerismo,
3
a partir do PJ . O eixo latino-americano se fazia também importante para o
governo Kirchner, até mais importante que no governo Lula.
3
Partido Justicialista (observação nossa).
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Desenvolveu-se uma postura na chancelaria argentina com ênfase no sistema
multilateral em defesa dos direitos humanos- ponto importante na sociedade
argentina-, rejeitando-se o realismo periférico dos governos anteriores, com a
adoção de uma postura não isolacionista, mas com críticas a poderes centrais,
valorizando, portanto, a aproximação com a América Latina, em especial com o
Brasil, por ser entendido como parceiro fundamental por seus valores e interesses
comuns (a partir do Governo Lula), mas também como possibilidade de inserção da
Argentina no sistema internacional.
A relação bilateral é, portanto fortalecida com Lula e Kirchner por meio de
uma postura comum de busca por relações diplomáticas de valores pautados em
uma cooperação “com vistas a garantir a todos os cidadãos o pleno usufruto de seus
direitos e liberdades fundamentais, incluindo o direito ao desenvolvimento, em um
âmbito de liberdade e justiça social [...]” (CONSENSO DE BUENOS AIRES, 2003,
p.24). Configura-se uma agenda diplomática que ademais das relações econômicas
e comerciais, pauta recorrente entre os períodos de 1980 e, sobretudo 1990, agrega
temas voltados aos direitos humanos, à educação, a saúde, a cultura e a
cooperação técnica, resultantes em uma série de acordos, memorandos e atos
internacionais bilaterais, como nunca antes na relação argentino-brasileira, como
observado na Figura 1.
Dentre
esta
série de
aproximadamente quarenta e
cinco acordos,
memorandos, convênios, protocolos e atos realizados durante o período 2003-2014,
destacamos dois documentos elaborados ainda durante o governo de Néstor
Kirchner, o Mecanismo Permanente Conjunto de Temas Educacionais e o Protocolo
de Cooperação da Saúde sobre Medicamentos, que embora passados mais de dez
anos de suas assinaturas, todavia geram uma cooperação efetiva entre os países
O Protocolo para criação do Mecanismo Permanente Conjunto em Temas
Educacionais foi assinado em 19 de julho de 2006 na cidade de Buenos Aires pelo
então ministro da educação Fernando Haddad e por Daniel Filmus, ministro da
Educação, Ciência e Tecnologia da República Argentina. Versando em mecanismo
que pensem através de comissões temas de educação básica, educação
profissional e tecnológica e educação superior e pós-graduação. A partir desta
proposta, aqui vista como possibilidade para os atuais acordos, observou-se um
aumento de programas conjuntos de cooperação, sobretudo no âmbito da pósgraduação, a partir de convênios e financiamentos da CAPES a projetos binacionais,
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de missões de estudos de pesquisadores, projetos comuns de pesquisa de
mestrado, doutorado e pós-doutorado e parceria universitária em três programas
gerais: Capes/ MYCIT (Ministerio de Ciencia, Tecnología e Innovacíon ProductivaArgentina), CAPG/BA (Programa de Centros Associados de Pós-Graduação) e
CAPF (Programa de Centros Associados para o Fortalecimento da Pós-graduação
Brasil/Argentina) e um específico na área de ciências biológicas, denominado
PROBITEC (Programa Binacional de Terapia Celular).
Figura 01- Acordos, Ajustes, Convênios e Memorando entre Brasil e Argentina (1920-2014).
Fonte de dados: Sistema de Atos Internacionais do Ministério de Relações Exteriores da República
Federativa do Brasil. Acessado em junho de 2015. Organização: SILVA (2015)
Na área de saúde destaca-se o primeiro acordo celebrado entre os países em
22 de Agosto de 2005, também na cidade de Buenos Aires, pelo ministro brasileiro
Saraiva Felipe e pela ministra da saúde e ambiente da República Argentina, Ginés
González García, com o objetivo de desenvolver programas de trabalho, pesquisa e
desenvolvimento e produção conjunta de insumos de medicamentos denominados
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essenciais e estratégicos, estabelecidos no âmbito da Fundação Oswaldo Cruz
(FIOCRUZ)- Brasil- e da Administracíon Nacional de Laboratorios e Institutos de
Salud “Dr. Carlos G. Malbrán” (ANLIS)- Argentina.
O Protocolo de Cooperação da Saúde sobre Medicamentos é o primeiro
mecanismo para uma série de acordos que viriam a existir na área, sobretudo em
tecnologia e inovação em saúde, ampliados graças à implantação do MICBA
(Mecanismo de Integração e Cooperação Bilateral entre Brasil e Argentina), que
contempla uma nova faceta da integração argentino-brasileira a partir da elaboração
de planos de trabalho para projetos conjuntos a serem coordenados pelas
chancelarias, na identificação de temas estratégicos e prioritários para o
desenvolvimento da cooperação cultural, econômica, social, científica e tecnológica
entre os dois países.
Assinado em 2011, o MICBA entra em concordância com documento
elaborado em encontro bilateral entre Lula e a então recém-empossada Cristina
Fernandez de Kirchner, denominado Mecanismo de Cooperação e Coordenação
Bilateral Brasil-Argentina, assinado dezembro de 2007. Contemplando quatro
seções principais: a-) Economia, produção, ciência e tecnologia; b-) Energia,
Transporte e Infraestrutura; c-) Defesa e Segurança; d-) Saúde, Educação,
Desenvolvimento Social, Cultural e Circulação de Pessoas, e é marco de uma nova,
mas não distinta, com relação ao governo do marido e ex-presidente, postura na
relação bilateral por parte da Argentina, tomada pela chefe de Estado e sua equipe
diplomática.
Cristina Fernández de Kirchner, em seu primeiro mandato (2008-2011) e em
continuidade no segundo (2012-2015) adota com relação ao Brasil uma postura
mais amistosa que a do marido, que embora inicialmente tenha uma postura mais
aberta à cooperação bilateral, acaba pós- 2005 abrigando uma estratégia de
“barganha” (OLIVEIRA, 2012), a fim de ampliar seu espaço regional com a iniciativa
de posturas assertivas, gerando por vezes bases conflituosas. Fernández de
Kirchner modifica este quadro através de um entendimento de uma “aliança inédita”
entre Brasil e Argentina, melhorando a condução destas relações.
A aliança inédita implementada, sobretudo com políticas como o MCIBA,
acordos de cooperação energética e nuclear e influenciada pela relação cada vez
mais estreita do empresariado, sobretudo na área de investimentos e aquisições de
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empresas brasileiras na argentina4 (LAMOSO, 2012; OLIVEIRA, 2012), efetuou
grande impacto no âmbito do Mercosul, bloco visto pela diplomacia argentina como
principal elemento da integração regional, capaz de gerar desenvolvimento conjunto
para os países (FARIA E COUTINHO, 2011).
O bloco apresentou devido à postura mais flexível da mandatária, sobretudo a
partir de sua assunção a presidência pro tempore no início de seu primeiro governo5,
uma “refundação” e reconfiguração “qualitativa”, impactado, sobretudo, pela postura
da relação bilateral central, ao incorporar e expandir temas envolvendo política,
questões sociais, de educação, de infraestrutura, de saúde e de diminuição de
assimetrias, como é possível observar na figura 2.
Dentre as iniciativas políticas, sociais e econômicas tomadas com relação ao
bloco, destacam-se a criação do Instituto Social do Mercosul (IS), com sede em
Assunção, do Instituto de Direitos de Políticas Públicas em Direitos Humanos
(IPPDH), com sede em Buenos Aires e do Fundo de Convergência Estrutural do
Mercosul (FOCEM) de 2004, fundo que sem dúvida se destaca por destinar
financiamentos a programas de convergência estrutural a fim de desenvolver a
competitividade e a coesão social sobretudo entre as economias menores no bloco,
sendo o Paraguai portanto o maior receptor de investimentos do fundo, seguido por
Uruguai, Argentina e Brasil, os dois últimos maiores investidores e menores
receptores.
Ao assumir a presidência brasileira, em 2010, Dilma Rousseff apresenta
perspectiva semelhante ao seu antecessor com relação à integração regional e a
cooperação bilateral Brasil e Argentina, prova disto foi à realização da primeira visita
de Estado da mandatária ser realizada a Argentina no ano de 2010 (FAGUNDES,
2011). Nesta reunião bilateral reafirmou-se o compromisso entre os dois países de
manutenção de relação estratégica e comprometimento em temas relacionados aos
direitos humanos e das mulheres (Declaração para a Promoção da Igualdade de
Gênero e a Proteção dos Direitos das Mulheres) e Tecnologia (Plano de Cooperação
4
Temática abordada na pesquisa de mestrado em andamento “Globalização e Integração Regional:
A internacionalização de empresas argentinas e brasileiras no contexto do Mercosul”, desenvolvida
no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana da Universidade de São Paulo,
sob orientação da Profª Drª Mónica Arroyo, com auspícios da CAPES.
5
Ao assumir a presidência pro tempore do Mercosul em 2008, Cristina Fernandéz estabeleceu como
prioridade para sua atuação e manutenção do mesmo, a integração produtiva, a integração em
infraestrutura, uma confecção de um novo código aduaneiro e o ingresso da Venezuela.
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Conjunta para Fazer Avançar A Cooperação Bilateral na Área de Massificação do
Acesso a Internet Banda Larga -2011-2015-).
Figura 2: Normativas produzidas em nível do Mercosul no período (2003-2010). Fonte de dados:
Adaptação elaborada a partir de OLIVEIRA, Ana Carolina Vieira (2012). Autora: SILVA (2015).
Apresenta-se também um avanço com relação ao MICBA, nas áreas de
cooperação nuclear, defesa, ciência e tecnologia, saúde, transportes e integração
produtiva, por meio da avaliação (realizada em reunião bilateral em 2011, ocasião da
visita de Estado da presidenta Cristina Fernández de Kirchner ao Brasil) e ajustes
complementários a parcerias já firmadas. Destacam-se projetos concluídos e em
execução como: Criação de uma Farmacopeia Regional através do fortalecimento
binacional,
Fortalecimento
do
Controle
de
Dengue,
Desenvolvimento
de
Capacidades em Gestão de Áreas Protegidas, Fortalecimento dos Serviços Públicos
do Emprego, Auxílios Diplomáticos, entre outros.
Porém, a relação bilateral Brasil e Argentina não é somente marcada pelos
positivos avanços verificados acima, mas também apresenta problemas e questões
em sua configuração. O primeiro ponto sensível que perpassa todo o contexto do
período 2003-2014 é a constante necessidade argentina de proteção a sua indústria
devido à ainda debilitada atuação que possui adquirida pelo contexto de crise em
2001 e volatilidade econômica que viveu o país ao longo do final dos anos 1990,
caracterizando uma forte desindustrialização (LAMOSO, 2012). Para isto os
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governos de Néstor e principalmente o de Cristina Kirchner, adotaram e tem adotado
medidas de intervenção e proteção por meio de aplicação de licenças não
automáticas a produtos vindos não só do Brasil, mas de todo o contexto regional.
Este fator demonstra na verdade uma dificuldade que ainda rebate no
Mercosul e na relação bilateral por meio das assimetrias entre as nações, que ao
não possuírem igual desenvolvimento dificultam a integração regional do ponto de
vista econômico e comercial, embora a criação do FOCEM tenha gerado
expectativas e de fato tenha produzido resultados, sobretudo com a geração de
infraestruturas no Paraguai, o fundo ao se movimentar principalmente por iniciativas
unilaterais,- há somente duas propostas e financiamentos pluriestatais, produzidas
na área de saúde e entre Brasil e Uruguai-, demonstra uma fragilidade institucional
do bloco, que não consegue criar infraestruturas e cadeias produtivas que
dinamizem o território mercosulino, tem-se na China atualmente a esperança de
investimentos.
Há, todavia para o bloco a necessidade da dependência da vontade política
(ARROYO, 2010) dos seus governantes, embora Brasil e Argentina tenham
convergido neste início de século XXI, questões internas, como instabilidade
financeira e movimentos críticos a integração por setores mais conservadores da
sociedade do empresariado e mídia (LAMOSO, 2012), tem sido obstáculo. Os
acordos desenvolvidos e os órgãos e institutos sociais e políticos produzidos
merecem mais proatividade por parte dos atores estatais, podendo passar de foros
consultivos para instituições possíveis de produzir ganhos efetivos os avanços são
claros, efetivos e visíveis, porém carecem de institucionalidade.
3. Considerações Finais
Este artigo buscou através do levantamento das normativas produzidas no
âmbito Bilateral entre Brasil e Argentina identificar o impacto da nova fase de
acordos pós - 2003 têm produzido para a integração regional, sobretudo nas áreas
sociais, culturas e estruturais. Levantaram-se também questões e percalços para
que se efetivem as ações político-econômicas e consequentemente territoriais no
futuro próximo.
A fim de conclusão reafirma-se que para o futuro da integração regional,
precisa-se de vontade política que através da elaboração e institucionalização das
normas e das ações possibilitem uma real integração regional a todos.
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4981
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