SUSTENTABILIDADE EM PEQUENAS PROPRIEDADES PRODUTORAS DE
SUÍNOS: UNIDADE PILOTO
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Souza, G. E.* ; Belli Filho, P. ; Gosmann, H. A. ; Casarin, M. A. ; Mohedano, R. A. ;
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Couto, R. R. ; Muller Jr, V.
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Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis-SC-Brasil
e-mail: [email protected]
RESUMO: O Estado de Santa Catarina é o maior produtor de carne suína do Brasil. A
grande quantidade de animais em reduzidos espaços de criação – situação comum no
Estado – gera uma grande concentração de dejetos que devem ser tratados e podem ser
utilizados como adubo em lavouras desde que se sigam critérios corretos de manejo.
Sabendo da importância do Estado na produção de suínos, o projeto Tecnologias Sociais
para a Gestão da Água (TSGA), da Universidade Federal de Santa Catarina, em parceria
com a EPAGRI e a EMBRAPA e patrocinado pela Petrobrás, desenvolveu o sistema de
manejo de dejetos em uma pequena propriedade produtora de suínos de Braço do
Norte/SC. O sistema visa a sustentabilidade na produção desde a correta utilização do
biofertilizante ao tratamento dos efluentes e à geração de energia à partir do biogás
produzido no tratamento. O objetivo deste trabalho foi descrever o sistema implantado
nessa propriedade piloto, assim como algumas pesquisas que estão sendo elaboradas
na propriedade para a melhoria das práticas de manejo de dejetos e a sustentabilidade
da produção suinícola catarinense. Algumas das pesquisas que foram elaboradas nos
últimos anos e que estão descritas neste trabalho são o próprio sistema de tratamento
dos dejetos, com eficiência da ordem de 99,8%, a geração de energia elétrica com
potência nominal de 3,6kVA a partir do biogás captado no biodigestor, a produção de
lemnas como alimento para animais a partir das lagoas de polimento dos dejetos e o
aproveitamento dos dejetos como biofertilizante nas lavouras.
Palavras-chave: Dejetos suínos, sustentabilidade, tratamento, biogás, energia limpa.
ABSTRACT: The state of Santa Catarina is the largest producer of pork in Brazil. A high
number of animals in small spaces of creation - a common situation in the state generates a high concentration of waste that must be treated and can be used as fertilizer
for crops provided you follow the correct management criteria. Knowing the importance of
the state in swine production, the project Social Technologies for Water Management
(TSGA), from the Federal University of Santa Catarina, in partnership with EPAGRI and
EMBRAPA and sponsored by Petrobras, developed the system of waste management in
a small production of pigs in Braço do Norte/SC. The system aims at sustainability in
production since the correct use of biofertilizers, to effluent treatment and energy
generation from biogas produced at the treatment. The objective of this study was to
describe the system implemented in this pilot property, as well as some research being
produced on the property to improve waste management practices and the sustainability
of pig production in Santa Catarina. Some of the research that has been developed in
recent years and that are described in this paper are the system of waste treatment, with
efficiencies of 99.8%, the generation of electricity with rated power of 3,6kVA from biogas
captured in the digester, Lemnas production as food for fish from polishing ponds of waste
and the use of manure as a biofertilizer in crops.
Keywords: Swine waste, sustainability, treatment, biogas, clean energy.
INTRODUÇÃO
O Estado de Santa Catarina, apesar de ocupar apenas 1,13% do território, é o 5º
produtor nacional de alimentos. Dentre as atividades agropecuárias se destaca a
suinocultura, pelo seu volume de produção e produtividade.
A suinocultura desempenha um papel fundamental na economia catarinense. Com
aproximadamente oito mil suinocultores com produção em escala comercial (ACCS,
2013) e 7,4 milhões de cabeças de suínos, segundo levantamento do IBGE (2012), a
atividade é responsável por 21,43% do PIB estadual (ACCS, 2013). Além disso, a
suinocultura é tecnificada e competitiva sob o aspecto da produção, sendo responsável
por quase 20% do rebanho nacional e 30% da produção de carne suína, participando
com 36% das exportações brasileiras (ACCS, 2013).
Paralelamente a produção, constata-se a insustentabilidade ambiental do setor
suinícola de Santa Catarina, haja vista a produção diária de mais de 60.000 m³ de
dejetos. O rebanho suinícola está altamente concentrado nas tradicionais regiões
produtoras, como o oeste e o sul do Estado, onde falta área para a destinação final dos
dejetos produzidos e sobra material potencialmente poluidor dos recursos hídricos.
A alta concentração de dejetos da suinocultura motivou estudos e pesquisas de
sistemas adequados de manejo, armazenagem, tratamento e valorização destes
resíduos, principal fonte poluidora da rede hidrográfica catarinense. Mesmo assim, a
aplicação dessas tecnologias no campo ainda é precária. É estimado que 86% das águas
de consumo do Oeste de Santa Catarina estão contaminadas por coliformes, além da
presença de matéria orgânica e nitrato. Esta mesma situação ocorre nas demais regiões
do estado onde a suinocultura está concentrada, evidenciando a necessidade urgente de
estagnar e recuperar o processo de degradação ambiental com metodologias e
tecnologias adequadas para a realidade do Estado.
Esta situação de agravamento da degradação ambiental com o comprometimento
dos recursos ambientais motivou a implantação da propriedade piloto de manejo de
dejetos de suínos em Braço do Norte, SC.
MATERIAL E MÉTODOS
A Unidade Demonstrativa do projeto TSGA em Braço do Norte foi instalada em uma
propriedade produtora de suínos com capacidade para 500 animais em ciclo completo.
Conta com um sistema integrado de tratamento e manejo dos dejetos (Figura 1), do qual
fazem parte algumas unidades essenciais.
Biodigestor
A partir das unidades de produção da granja, os dejetos são encaminhados por
gravidade para um tanque de coleta, de onde é bombeado para o biodigestor com Tempo
de Detenção Hidráulica (TDH) de 30 dias. No biodigestor ocorre a degradação do
substrato de forma anaeróbia com uma redução da DQO total na ordem de 70%. No
entanto, o teor de nutrientes (NPK) do efluente permanece inalterado durante o processo
de digestão anaeróbia, ocorrendo, entretanto, a mineralização. A partir da digestão
anaeróbia, também é gerado o biogás, que é captado na campânula do biodigestor.
Lagoa de Armazenamento (Anaeróbia)
Do biodigestor, o efluente com as cargas de DBO5 e DQO reduzida, mas ainda
mantendo o teor de nutrientes de entrada, segue para a lagoa de armazenamento. O
principal papel da Lagoa de Armazenamento é a estocagem dos dejetos, com segurança
ambiental, para a sua utilização na fertilização do solo. Contudo, devido ao tempo de
detenção, os dejetos continuam sofrendo degradação apresentando reduções dos
parâmetros avaliados, sendo sua eficiência da ordem de 50 a 60% na remoção de DQO
(MOHEDANO, 2010). A partir desta lagoa, 70% dos dejetos é destinada à adubação do
solo nas lavouras de milho e aveia, utilizados para a alimentação do rebanho. A outra
parte (fração líquida) segue para as lagoas de lemnas (macrófitas aquáticas).
Lagoas de Lemnas
As lagoas de lemnas são responsáveis pela retirada de nutrientes e polimento do
efluente, além de promover a inserção de O2 no meio líquido. Neste sistema, as duas
lagoas instaladas operam em série e têm TDH de 102 e 34 dias respectivamente. Devido
à taxa de crescimento das macrófitas a remoção de biomassa é feita a cada dois dias,
quando são removidas as plantas em uma quantidade equivalente à 1/5 da superfície da
lagoa. A biomassa removida é então utilizada para alimentação dos peixes criados nos
açudes da propriedade. Após a passagem pela sequência de lagoas de lemnas, o
efluente tratado é então reutilizado na lavagem das unidades da granja.
Motogerador à Biogás
O biogás captado no biodigestor é conduzido para o motogerador passando por
filtro para eliminação de gás sulfídrico (H2S). A energia elétrica obtida através do
motogerador é utilizada nas lâmpadas dos escamoteadores para aquecimento dos leitões
na maternidade e, em algumas tomadas da residência. Concomitantemente, a energia
térmica presente nos gases de escape do motor auxilia na secagem dos grãos na
unidade de silo secador.
A partir de dados obtidos na propriedade, estimou-se uma produção diária de 40m³
de biogás (1,67m³/h), equivalente a uma potência de 3,34kW. Utilizou-se então, um
motogerador com potência nominal de 3,6kVA, com um consumo de 2m³/h de biogás.
Adubação do Solo
Em torno de 70% dos dejetos produzidos na propriedade são utilizados para
adubação do solo na produção de milho e aveia. Apesar de essencial ao
desenvolvimento das plantas, nutrientes em excesso no solo podem contribuir para a
contaminação ambiental. Para o conhecimento das condições do solo na propriedade,
foram feitos alguns estudos, como avaliação dos teores de N total e mineral e estudo de
vulnerabilidade do solo à contaminação por P e outros elementos, este realizado em todo
alto da bacia hidrográfica do Rio Coruja/Bonito, com análises de solo de áreas de
pastagem, floresta e lavouras de milho/aveia.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O Sistema integrado de tratamento dos dejetos da propriedade vem apresentando
excelentes resultados na remoção de DBO/DQO e nutrientes. Após um ano de
monitoramento, avaliando-se parâmetros determinados previamente, as lagoas de
lemnas apresentaram excelentes resultados no polimento do efluente, com as seguintes
eficiências de remoção: NTK= 98%, N-NH3= 99%, Pt= 94%, DQO= 96%, DBO5= 95%, ST
= 92%, E. coli = 2 log (MOHEDANO, 2010). A eficiência total do sistema tem sido da
ordem de 99,8%. A concentração de oxigênio dissolvido no meio líquido, segundo
Mohedano (2010) passou de 0mg/L no efluente bruto para 3,02±1,2mg/L após o
tratamento.
O sistema de geração de energia a partir do biogás captado no biodigestor foi o
mais recente implantado na propriedade piloto. Inicialmente previsto para suprir uma
carga de 2,6kW referentes à 4 refrigeradores e às lâmpadas da granja, o motogerador se
mostrou instável na operação com cargas indutivas oscilantes, como o caso dos
refrigeradores. Isto deve-se à impossibilidade do controle da vazão de combustível no
motogerador, fazendo com que, a cada partida dos compressores dos refrigeradores, o
motor perdesse rotação e, consequentemente, diminuisse sua frequência.
Em relação aos estudos do solo da região, Couto (2014) afirmou que os maiores
teores de P orgânico e inorgânico foram observados na camada superficial do solo,
diminuindo com a profundidade em todas as áreas submetidas à aplicação de dejetos
líquidos de suínos, especialmente nos locais onde a aplicação é feita por longo período
de tempo (maiores que 18 anos). No entanto, o autor concluiu que o alto da bacia Rio
Coruja/Bonito apresenta vulnerabilidade predominante “Muito Baixa” e “Média” à poluição
por P, Cu e Zn, sendo o tipo de cultivo e o tempo de aplicação os principais elementos
para a variação dos resultados. Em outro estudo, Benedet et al, (2013) concluiram que a
aplicação de dejetos de suínos em solo sob sistema de plantio direto proporciona um
incremento de N total e mineral, principalmente na camada superficial. As aplicações
contínuas de cama sobreposta de suínos, em desrespeito a critérios previamente
estabelecidos, podem promover um acúmulo de N mineral no solo, favorecendo sua
lixiviação no perfil e contaminação das águas subsuperficiais.
CONCLUSÕES
Com as unidades de manejo de dejetos implantadas pelo projeto TSGA, foi possível
iniciar o processo de consolidação da propriedade como uma unidade modelo de
sustentabilidade na suinocultura. Os estudos vêm mostrando resultados promissores no
tratamento dos poluentes gerados pela propriedade e sua reutilização como insumo para
outros fins dentro e fora da cadeia produtiva, evitando a contaminação ambiental e
buscando possibilitar a segurança energética da propriedade.
REFERÊNCIAS
ACCS - Associação Catarinense de Criadores de Suínos. Relatório anual 2013. 28f.
Disponível em < http://accs.org.br/arquivos_internos/index.php?abrir=relatorios_anuais>
Acesso em 30 de outubro de 2014.
BENEDET, L.; MULLER JR., V.; VENTURA, B. S.; LAZZARI, C. J. R.; SOUZA, M.;
COMIN, J. J. Teores de Nitrogênio Mineral e Total em Solo Submetido a Oito Anos de
Aplicações de Dejetos Suínos. XXXIV Congresso Brasileiro de Ciência do Solo.
Florianópolis, 2013.
COUTO, R. R. Vulnerabilidade do Solo a Poluição por Pósforo, Cobre e Zinco, em Áreas
Sob Aplicação de Dejetos de Suínos. 2014. 182 f. Tese (Doutorado) - Pós Graduação em
Engenharia Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa da Pecuária Municipal
2011-2012. Disponível em
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/ppm/2012/default_zip_xls.shtm>
Acesso em 29 de outubro de 2014.
MOHEDANO, R. A. Uso de Macrófitas Lemnáceas (Landoltia punctata) no Polimento e
Valorização do Efluente de Suinocultura e na Fixação de Carbono. 2010. 270f. Tese
(Doutorado) - Pós Graduação em Engenharia Ambiental, Universidade Federal de Santa
Catarina, Florianópolis, 2010.
Figura 1: Representação esquemática das unidades de tratamento dos dejetos e geração de energia.
Biodigestor (BD); Lagoa de Armazenamento (LA); Lagoas de Lemnas 1 e 2 (LM1 e LM2)
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sustentabilidade em pequenas propriedades produtoras de