110 Fernandes JHA, Lippi UG ARTIGO ORIGINAL Avaliação clínica e ultra-sonográfica dos dispositivos intrauterinos inseridos pós-placenta A clinical and ultrasound study on the use of postplacental intrauterine device* João Henrique Araújo Fernandes1, Umberto Gazi Lippi2 ABSTRACT Objective: To evaluate the relation of postplacental intrauterine device insertion immediately after vaginal delivery and cesarean section and its effects on the following: continuation, expulsion rate and eventual removals. To verify if ultrasound is an adequate method to follow-up postplacental IUD insertions. To assess if the immediate insertion of postplacental IUD leads to an increased risk of uterine infections and perforations, or greater likelihood of pregnancy during the observation period. Methods: A group of 50 patients who had an intrauterine device introduced within ten minutes after delivery of the placenta were studied. Twenty-five women had vaginal delivery and 25 had cesarean sections. The intrauterine device used in this study was the Multiload CU 375, standard model, manufactured by Organon Ltd., in Ireland. The intrauterine device was inserted in those who had vaginal delivery either manually and under anesthesia, or with an inserter, which did not require anesthesia. In patients who had cesarean sections, the insertion was manual. Clinical and ultrasound follow up was performed four times: 48 hours postpartum, and at 6, 12 and 24 weeks. The distance from the top of the intrauterine device to the uterine fundus was measured by ultrasound. Results: This study showed a significant difference in postplacental intrauterine devices inserted after vaginal deliveries and cesarean sections. The expulsion/removal rate was 32% among the subjects who had an intrauterine device inserted after vaginal delivery. There were no expulsions or removals in those submitted to cesarean sections. In the control ultrasound of intrauterine devices inserted after vaginal delivery, at 6 weeks, the distance of 10 mm from the top of the device to the fundus was an average standard measurement to determine continuation (distance < 10 mm, the IUD would remain in the uterus) and expulsion/removal (distance > 10 mm, the IUD would be expelled or be removed). There were no cases of uterine infections or perforations, and no pregnancies during the course of this study. Conclusions: Postplacental intrauterine device insertion showed to be an useful and safe contraceptive method. The ultrasound demonstrated to be a useful and reliable method to control postplacental intrauterine device insertions. Keywords: Contraception; Intrauterine device; Ultrasonography RESUMO Objetivos: Avaliar o comportamento do dispositivo intra-uterino (DIU) pós-placenta, após parto normal ou cesárea, quanto à sua permanência no útero; verificar se a ultra-sonografia é adequada para acompanhar o DIU inserido; avaliar a ocorrência de complicações como infecção, perfuração e gestações. Métodos: A casuística compreendeu 25 pacientes pós-parto normal e 25 pós-cesárea, nas quais foi aplicado um DIU Multiload Cu 375R nos primeiros dez minutos após a dequitação. A inserção no parto normal foi manual, sob analgesia, ou com aplicador, sem analgesia; e manual na cesárea. Os controles clínicos e ultra-sonográficos foram realizados com 48 horas e 6, 12 e 24 semanas após o parto. A ultra-sonografia avaliou principalmente a distância do ápice do DIU à mucosa do fundo uterino (eco endometrial livre). Resultados: O DIU pós-placenta pós-parto normal foi expulso/retirado em 32% dos casos. Não houve expulsão/retirada após cesárea. A ultra-sonografia mostrouse útil e confiável no acompanhamento do DIU pós-placenta. A distância de 10 mm, entre a porção superior do DIU e a mucosa do fundo uterino, tornou-se um valor médio útil para a estimativa de permanência (< 10 mm) ou expulsão/retirada (> 10 mm) do DIU, na avaliação da sexta semana pós-parto normal. Não foram observados casos de infecção, perfuração uterina ou gravidez durante o presente estudo. Conclusões: A inserção do DIU pós-placenta mostrou-se uma técnica anticoncepcional factível e segura, de grande eficácia em casos de pacientes submetidas a cesáreas. A ultra-sonografia foi útil no controle e *Hospital do Servidor Público Estadual “Francisco Morato de Oliveira” - São Paulo/SP. 1 Professor Assistente da Disciplina de Obstetrícia do Curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Metropolitana de Santos (UNIMES). Mestrando do Curso de Pós-Graduação de Perinatologia e Ginecologia do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público do Estado de São Paulo (IAMSPE) - São Paulo - (SP). 2 Professor Titular da Disciplina de Obstetrícia do Curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Metropolitana de Santos (UNIMES). Coordenador do curso de Pós-Graduação de Perinatologia e Ginecologia do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público do Estado de São Paulo (IAMSPE) - São Paulo - (SP). Endereço para correspondência: João Henrique Araujo Fernandes - R. Eloi Fernandes, 11 - apto. 122 - Boqueirão - CEP 11055-110 - Santos (SP), Brasil - Tel: (13) 3222-7575; Fax: (13) 3221-4988 e-mail: [email protected] Recebido em 16 de março de 2004 - Aceito em 30 de agosto de 2004 einstein. 2004; 2(2):110-114 Avaliação clínica e ultra-sonografia 111 permitiu estabelecer a distância menor que 10 mm entre o ápice do dispositivo e o fundo uterino como um bom indicador da sua permanência. Descritores: Anticoncepção; Dispositivo intra-uterino; Ultrasonografia INTRODUÇÃO Pacientes com gestações não planejadas representam uma parcela importante do atendimento nas maternidades. É lícito atribuir-se esse fato à falta de informação acerca dos métodos anticoncepcionais, à ignorância, ou pior, ao baixo apoio dos órgãos governamentais ao planejamento familiar. Sabe-se também que a puerperalidade é, para muitas mulheres, a única oportunidade de receber cuidados em um sistema formal de saúde. Trata-se pois de uma ocasião propícia e ímpar para que sejam orientadas sobre as práticas anticoncepcionais. Com esses conceitos em pauta surgiu a idéia de se aplicar o dispositivo intra-uterino (DIU) logo após a dequitação, “DIU pós-placenta”, designação feita pela Organização Mundial de Saúde (OMS)(1). Seria, em teoria, uma atitude muito próxima da ideal, pois contando com a anuência das pacientes, ter-se-ia uma proteção a baixo custo, com anterioridade segura sobre o reinício da atividade sexual, independente do próprio ato sexual, com poucos efeitos colaterais. Com este intuito idealizou-se fornecer o dispositivo intra-uterino aplicado imediatamente após a dequitação garantindo às usuárias toda a assistência posterior necessária. A OMS (1-2) normalizou, em 1983 e em 1996, essa metodologia, embora as primeiras descrições da técnica datem de 1967(3). Os trabalhos relativos ao uso do DIU aplicado no período puerperal mostraram que as seguintes variáveis influenciam diretamente os resultados obtidos: período de introdução do DIU foram observados melhores resultados do DIU pósplacenta quando comparados às inserções após os primeiros 10 minutos da dequitação(4-5); modelo do DIU (4-7) ; modo de inserção (5,8-10) ; experiência do profissional(5,10-11); tipo de parto(11-13). Em relação ao controle ultra-sonográfico variam os indicadores de um bom posicionamento do dispositivo levando em conta o volume uterino, o comprimento total do útero(14), a distância entre o ápice do DIU e a serosa do fundo uterino(14-16). Procurou-se, neste estudo, avaliar a praticabilidade da inserção do DIU pós-placenta e confirmar ou infirmar as observações da literatura no que diz respeito a eficácia, expulsões, retiradas ou complicações precoces. Avaliou-se também a ultra-sonografia para saber se seria o método ideal com vistas ao seguimento e principalmente se poderia fornecer algum marcador sugestivo da probabilidade do DIU manter-se ou ser expulso. MÉTODOS Estudou-se de forma prospectiva um grupo de 50 pacientes que deram à luz na Maternidade do Hospital Guilherme Álvaro, hospital estadual da cidade de Santos, no período de agosto de 1996 a outubro de 1999. Todas eram oriundas dos municípios da Baixada Santista, e realizaram o Pré-Natal no próprio hospital ou em unidades ambulatoriais denominadas policlínicas. A proposta do estudo foi aplicar um DIU nos primeiros dez minutos após a dequitação (DIU pósplacenta) em 25 pacientes que tivessem dado à luz por cesárea e em 25 por parto normal. Todas passaram por uma seleção rigorosa onde foram respeitados um fluxograma e um protocolo adrede preparados. O projeto de estudo foi apresentado e aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Guilherme Álvaro, Santos. A adesão foi voluntária e precedida por explicação minuciosa, sendo registrada por escrito no prontuário clínico. Foram colhidos dados para avaliação socioeconômica e cultural como: idade, escolaridade, estado civil, moradia, renda familiar e cidade de residência. Anotaram-se ainda os antecedentes obstétricos, método anticoncepcional anterior, tipo de partos prévios e atual, intercorrências no parto, uso de ocitócico, nível de hemoglobina e hematócrito. Foram adotados os seguintes critérios de inclusão: aceitação do método, ausência de fatores de risco para doença inflamatória pélvica, parceiro único, facilidade de acesso ao serviço e evolução clínica do parto sem intercorrências. Os critérios de exclusão foram: não obedecer aos critérios anteriores, dificuldade de controle pós-inserção, intercorrência obstétrica, ginecológica ou clínica passível de ser agravada pela inserção do DIU, a saber: infecção intraparto, amniorrexe há mais de 12 horas, hemorragias pré e intraparto, malformações uterinas, tumores ginecológicos, anemia intensa. Os dispositivos intra-uterinos foram inseridos pósplacenta, ou seja, dentro dos dez primeiros minutos após a dequitação, por médicos residentes do segundo ano devidamente treinados, supervisionados por um médico obstetra plantonista. Nas pacientes submetidas a cesárea, o DIU foi introduzido após a dequitação, sob visão direta do fundo uterino, manualmente. As extremidades dos fios ficaram voltadas para o orifício einstein. 2004; 2(2):110-114 112 Fernandes JHA, Lippi UG interno do colo do útero, sem ultrapassá-lo. Nos casos de parto por via vaginal, o dispositivo foi introduzido após a dequitação, com o útero adequada e espontaneamente retraído e antes da utilização de qualquer ocitócico, através de uma das duas técnicas a seguir expostas: · Manual: com o DIU seguro entre os dedos indicador e polegar, com a paciente sob analgesia, fezse a introdução de uma das mãos no útero até alcançar o fundo, estando este apreendido externamente pela outra mão, realizando uma leve rotação do fundo uterino de aproximadamente 15 graus. O dispositivo foi deixado no interior da cavidade uterina em contato com o fundo. A rotação é para melhor fixação do DIU à parede uterina. · Com aplicador: nesta variante, o lábio anterior do colo uterino foi apreendido com pinça Pozzi e tracionado. Com o aplicador que o acompanha, o DIU foi introduzido até o fundo do útero, este apreendido pela mão externa. Praticou-se também uma rotação de 15 graus seguida da retirada do aplicador. Esta técnica não exige anestesia. O dispositivo intra-uterino utilizado em todas as pacientes foi o Multiload Cu 375*. O controle pós-inserção, do ponto de vista clínico e ultra-sonográfico, foi realizado em quatro períodos: antes da alta hospitalar, com seis, 12 e 24 semanas após o parto. Do ponto de vista clínico, as pacientes foram questionadas e examinadas de acordo com a ficha de controle, com atenção especial para: expulsão do DIU, hemorragias, dor pélvica, infecção, exteriorização dos filamentos, amamentação, se exclusiva ou não e retorno às menstruações. Os exames de ultra-sonografia foram realizados em dois modelos de aparelhos, conduzidos pelo mesmo profissional médico, em geral por via transabdominal, considerando a principal prioridade a medida entre o ápice da haste do dispositivo e a mucosa do fundo uterino (eco endometrial livre), portando não se considerando a espessura do miométrio. Os resultados do presente trabalho foram submetidos à análise estatística através de: média aritmética e desvio padrão, teste de igualdade das médias: t de Student, teste de qui-quadrado corrigido para continuidade segundo Yates, teste exato de Fisher, intervalo de confiança da média para 95% e gráficos em linhas e barras. Adotou-se nível de significância de 5% (a = 0,05). RESULTADOS Não houve expulsão ou retirada do DIU por posição inadequada no grupo de pacientes submetidas a einstein. 2004; 2(2):110-114 cesárea. No grupo onde o parto foi normal ocorreram quatro casos de expulsão (com quatro, oito, dez e 98 dias pós-parto) e quatro casos de retirada do dispositivo intra-uterino por estar localizado no canal cervical (dois casos no controle de ultra-som com seis semanas e dois casos no controle de ultra-som com 12 semanas). Portanto, de maneira didática os casos foram classificados e analisados estatisticamente em seis conjuntos: grupo 1 – totalidade de casos (50 ), grupo 2 – pacientes com parto cesárea (25), grupo 3 – pacientes com parto normal (25), grupo 4 – pacientes com DIU expulsos ou retirados (8), grupo 5 – pacientes com DIU de localização adequada (42), grupo 6 – pacientes com DIU de localização adequada e parto normal(17). A aplicação dos testes paramétricos mostrou que não houve diferença estatística significante entre os grupos no que se refere a idade materna, número de gestações anteriores e número de partos anteriores. Quando a variável foi o número de partos normais anteriores, houve diferença estatística significante entre os grupos de parto normal e o grupo de parto cesárea com valor de p = 0,000001* e t = 6,22. Não ocorreu diferença estatística significante entre os grupos quando a variável foi a distancia média em milímetros da parte superior do DIU à mucosa do fundo uterino em exame de ultra-som realizado com 48 h pósparto; entretanto, houve diferença estatística significante no ultra-som com seis semanas entre os grupos cesárea e grupo de parto normal com p = 0,011236* e t = 2,63 e entre os grupos de DIU com localização adequada e grupo de expulsos/retirados com p = 0,01823* e t = 2,47. No exame de ultra-som realizado com 12 semanas, as diferenças das medidas não foram estatisticamente significantes entre os grupos de cesáreas e normais, mas o foram entre os grupos de adequados (toda a população) e de expulsos/retirados com p = 0,00008* e t = 4,44, e entre os grupos adequados (em parto normal) e o grupo de expulsos/ retirados com p = 0,00031* e t = 4,51. Não ocorreram diferenças estatísticas significantes entre os grupos de parto normal e cesárea nas medidas realizadas ao exame de ultra-som realizados com 24 semanas pós-parto. Os demais grupos não foram comparados, pois não ocorreram expulsões ou retiradas neste controle. No que diz respeito aos testes não-paramétricos adotou-se o valor de corte de 10 mm entre a distância da parte superior do DIU à mucosa do fundo uterino. Não houve diferença estatística nos exames de ultrasom realizados com 48 h, 12 e 24 semanas pós-parto entre os grupos de parto normal e cesárea. Houve sim, no exame com seis semanas pós-parto entre estes grupos de parto normal e grupo de cesárea com p = 0,0082* (Fisher) e entre os grupos de expulsos/retirados Avaliação clínica e ultra-sonografia 113 e grupo de adequados (toda a população) com p = 0,0086929* (Fisher). Quando a variável estudada foi o parto normal anterior, ocorreu diferença estatística significativa entre os grupos expulsos/retirados e o grupo adequados (toda a população) com p = 0,0057892* (Fisher). Quando a variável foi a ocorrência de expulsão ou retirada do DIU, ocorreu diferença estatística significante entre os grupos de parto normal e cesárea com p = 0,0040295* (Fisher). DISCUSSÃO De acordo com os trabalhos citados existem vantagens e desvantagens na aplicação do DIU pós-placenta(17), sendo seu emprego útil e seguro como método anticoncepcional, especialmente em pacientes submetidas à cesárea(7,18-19). Os pontos positivos são: a paciente já se encontra dentro de uma unidade hospitalar para o seu parto e, portanto não precisa retornar para, especificamente, inserir o DIU; o pessoal de saúde tem acesso direto à paciente para educar e esclarecer quanto ao planejamento familiar; uma das duas contra-indicações absolutas para a inserção do DIU está eliminada, ou seja, a gravidez; há pouca reclamação a respeito de sangramento e dor para a inserção do DIU pós-placenta em relação ao DIU de intervalo; o risco de perfuração uterina é o mesmo ou menor, comparado ao DIU de intervalo; o custo é baixo, pois o equipamento e o tempo utilizados para a inserção do DIU pós-placenta são mínimos; é preciso menor treinamento para a inserção do DIU pósplacenta em relação ao DIU de intervalo, já que a técnica é fácil de aprender; a taxa de prevalência contraceptiva é maior nas pacientes em que é oferecido o DIU pós-placenta, comparado com outros locais onde os métodos anticoncepcionais são oferecidos após o puerpério. Os pontos negativos são: as taxas de expulsão são maiores quando a inserção ocorre pós-placenta em relação ao DIU de intervalo; a taxa de “fio perdido” é maior; a taxa de continuidade do método tende a ser ligeiramente menor no DIU pós-placenta em relação ao DIU de intervalo; o aconselhamento contraceptivo para o DIU pós-placenta deve ser monitorado para assegurar que a paciente seja bem informada e sua decisão não seja influenciada pelo impacto emocional do momento do parto; são necessárias instruções especiais para a paciente detectar a expulsão do DIU e retornar para nova inserção ou outro método anticoncepcional. Embora pertinentes em seu conjunto, cabem algumas considerações adicionais. Por exemplo, podese discordar naquilo que diz respeito ao treinamento para a inserção do DIU pós-placenta, que segundo aqueles autores é mais simples do que para o DIU de inserção. É necessária bastante experiência para a inserção do dispositivo em útero puerperal, principalmente no parto normal, situação na qual várias condições podem se apresentar. Assim, a inserção pode ser realizada manualmente ou com aplicador, a paciente pode ou não estar sob analgesia, o útero pode ter graus diferentes de tônus. No parto cesárea efetivamente a técnica é mais singela. Nas desvantagens além das citadas poder-se-ia acrescentar que algumas pacientes não aderem às exigências do protocolo de seguimento, o que, aliás, foi causa de exclusões neste trabalho. Quando retornaram ao controle e indagadas sobre o não comparecimento na data estipulada, o principal motivo foi econômico. Esta é sempre uma variável a se considerar quando a população alvo da aplicação do método é de nível socioeconômico-cultural menos privilegiado. Neste estudo não ocorreu qualquer caso de “fio perdido” nas inserções após parto normal. Todos os filamentos dos dispositivos se mostraram visíveis no controle com seis semanas pós-parto. As freqüências foram, porém, altas nos casos após cesáreas. Pode-se notar que independentemente do tipo de DIU, as taxas de expulsão do dispositivo, inseridos após parto normal, nesta pesquisa, comparam-se desfavoravelmente às de outros autores, com exceção àquelas citadas pela OMS(8). Já no que se refere aos casos de inserção pós-cesariana, os resultados a que se chegou são extremamente favoráveis quando cotejados com os de todos os autores citados. Essa constatação corrobora a de Chi et al. (5) e de Lara et al. (12), que relataram menor freqüência de expulsão quando o DIU foi utilizado no parto cesárea(20-24) em relação ao vaginal ou mesmo nos partos por via abdominal com implantação após a dequitação em relação àquela feita mais de um mês após o parto(25). Caso estes números sejam confirmados em casuísticas mais alentadas, pode a inserção do DIU pós-placenta tornar-se a escolha preferencial em pacientes submetidas ao parto cesárea, exatamente as que devem respeitar um intervalo intergestacional mais longo(23). É razoável supor que, nas histerotomias, a colocação do dispositivo, sob visão direta, bem localizado junto ao fundo uterino seja um dos fatores primordiais para o bom resultado(23). Por outro lado, é bem possível que nos casos pósparto normal a experiência do profissional tenha um peso significativo no bom êxito do processo. Já que aplicar o DIU manualmente ou com o aplicador apropriado não representou um diferencial para os resultados, a diferença deve estar no ponto em que o operador aloca o dispositivo em relação ao “fundus uteri”. Levando-se em conta, porém, que mais de um einstein. 2004; 2(2):110-114 114 Fernandes JHA, Lippi UG fator pode estar envolvido nas taxas de sucesso, devese ter em conta a preocupação de Cole et al.(4), que chamam a atenção para a melhor avaliação do período de inserção, que lhes parece mais importante do que o modelo do DIU. Quanto a complicações imediatas (perfuração uterina, infecções) não foram observadas neste trabalho, fato que está de acordo com observações encontradas na literatura(4,19). Neste trabalho pode-se notar que a avaliação da distância da parte superior do DIU ao fundo do útero realizado nas primeiras 48 horas após o parto (Usg0), ou seja, à inserção, não variou de forma estatisticamente significativa entre os grupos nos quais a população foi dividida para fins de análise estatística. Portanto, tem um valor escasso no sentido de se prognosticar sua permanência. No entanto, há uma tendência para valores maiores dessa distância no grupo de expulsos/retirados. Com uma casuística maior essa diferença poderia tornar-se significativa, contribuindo para criar padrões de prognóstico para a permanência ou expulsão do diapositivo. No entanto, os valores das medidas ultra-sonográficas parecem de extrema valia quando tomadas na sexta semana. Algumas diferenças entre os grupos, com significância estatística, também foram notadas no exame de 12 semanas. Entretanto, deve-se lembrar que por volta da sexta semana um grande número de pacientes retorna à atividade sexual, devendo por isso estar devidamente protegidas. Isto é particularmente importante nas mulheres que foram submetidas à inserção do DIU após um parto normal, condição em que a probabilidade de expulsão é muito alta, em relação àquelas que o receberam após uma cesárea. Por isso é de bom alvitre que se recomende (a todas as usuárias de DIU pósplacenta) que não tenham relações sexuais, nesse período, sem a proteção de outro método e liberá-las após a ultra-sonografia de sexta semana, com medida da distância DIU/mucosa do fundo uterino menor que 10 mm. Essa forma teria vantagem em relação ao modo como Gonçalves et al.(16) avaliam a boa colocação do DIU, que dependeria de duas ou três medidas, ou seja, uma possibilidade de erro duplicada ou triplicada, ainda que sejam medidas simples de ser feitas. O que einstein. 2004; 2(2):110-114 se deve considerar não é a acurácia do exame ultrasonográfico para a visualização do dispositivo dentro da cavidade uterina, mas sim tentar comprovar que a eficácia do dispositivo intra-uterino depende do seu posicionamento intra-útero. O fato é que não existe na literatura uma medida limite que seja consensual para classificar o DIU como estando mal posicionado. Os resultados apresentados nos trabalhos citados são díspares, mesmo com a utilização do mesmo modelo de DIU. Essa disparidade é flagrante quanto se observam as distâncias médias da porção superior do DIU ao fundo uterino, comparadas às freqüências de expulsões. Isto pode fazer supor que outros fatores devam estar envolvidos no insucesso da manutenção do dispositivo “in loco”. Dessa forma, os resultados aqui apresentados sugerem que a metodologia do DIU pós-placenta é útil e segura como método anticoncepcional (26-28) , especialmente em pacientes submetidas a cesárea(7,13,19). Além disso, a utilização de um método anticoncepcional seguro, implantado imediatamente após o parto e, portanto, antes da paciente receber alta hospitalar, é uma técnica de grande alcance em saúde reprodutiva, ao se considerar que um número elevado de puérperas não retorna mais para uma adequada anticoncepção. Também é extremamente estimulante a possibilidade de que estudos mais amplos com o controle da inserção através da ultra-sonografia possam sedimentar a idéia de um ponto de corte na medida entre a parte superior do dispositivo e o fundo do útero (10 mm neste estudo), capaz de sugerir, com grande probabilidade de acerto, que aquele DIU manter-se-á convenientemente disposto e atendendo à sua função precípua, que é a anticoncepção eficaz. CONCLUSÃO A metodologia de inserção de dispositivo intra-uterino pós-placenta mostrou-se útil e segura como método anticoncepcional, especialmente em pacientes submetidas a cesárea. Avaliação clínica e ultra-sonografia 115 REFERÊNCIAS 1. 1. World Health Organization. Intrauterine devices: their role in family planning care. Geneva: WHO;1983. p.53. [World Health Organization, 75]. 15. Bernaschek G, Spernol R, Beck A.. [The position of the IUD and intrauterine pregnancies]. Geburtshilfe Frauenheilkd. 1981;41(9):645-7. German. 2. World Health Organization. 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