DECLARAÇÃO DO SEMINÁRIO DE PARCERIAS DE ENTRAIDE & FRATERNITÉ
NO ALBERGUE DA JUVENTUDE JACQUES BREL, BRUXELAS, ABRIL DE 2015
« Nenhuma família sem teto, nenhum
camponês sem terra, nenhum trabalhador
sem direitos » Papa Francisco
Nós, delegados e delegadas, participantes do Seminário de Parcerias Internacionais de Entraide &
Fraternité e membros do Programa de luta pela Soberania Alimentar, apoiados pela Cooperação
Belga (DGD); originários da África, da América Central, da Ásia e da região do Caribe, operando em
conjunto com as famílias e as comunidades campesinas dos nossos países, estivemos reunidos em
Bruxelas com o objetivo de compartilhar as nossas experiências e de promover a consolidação das
nossas iniciativas comuns para reivindicar assim os direitos de aprimoramento da qualidade de
vida das comunidades.
As famílias e as comunidades campesinas do mundo todo vêm enfrentando diversos problemas
tais como a pobreza causada por aspectos estruturais e tais como:
•
•
O sistema capitalista dominante é a fonte de exclusão e o incentivador do individualismo, do
enriquecimento particular, da corrupção e do paternalismo, sistema este que exacerba os
efeitos das mudanças climáticas e das (malas) condições ambientais, que destrói a dinâmica e
os meios de vida das comunidades e que coloca em perigo a capacidade de subsistência das
gerações futuras.
O sistema agrícola e alimentício agroindustrial não atende a necessidade da população por
uma alimentação que seja suficiente, saudável e de qualidade. Com efeito, ele promove a
padronização e a mercantilização dos alimentos, o consumismo, a pilhagem e a exploração dos
recursos naturais e promove a desintegração da população rural, a desarticulação da
organização comunitária e dos movimentos sociais.
Não há uma vontade política de dar início, de tornar efetiva a elaboração de leis e políticas de
Estados a favor da defesa do território e das iniciativas das comunidades campesinas e da
sociedade civil. Exemplo disso é a criminalização dos movimentos sociais.
Constatamos com alegria avanços importantes das comunidades campesinas e das organizações
comunitárias participantes dos programas de cooperação nas seguintes áreas:
a) Produção e comercialização:
•
•
As famílias vêm adotando e desenvolvendo novas práticas agroecológicas bem como novas
técnicas no processo de produção dos alimentos, tendo como meta não apenas a redução das
despesas e dos impactos ambientais, mas também para aumentar a resiliência no contexto de
mudanças climáticas.
As famílias procuram preservar e proteger a biodiversidade local (como as sementes locais ou
crioulas)
1
•
•
São desenvolvidos sistemas de produção diversificados e saudáveis que buscam contribuir
para a segurança e a soberania alimentar e nutricional.
Os campesino/as vão avançando na elaboração de instrumentos de comercialização tais como
os mercados locais, as cooperativas, tendo como princípio básico a economia social e solidária.
b) Organização e ação política:
•
•
•
Através de suas organizações de base, os campesino/as contam com outros aliados na defesa
dos direitos e da valorização de projetos de leis a favor da soberania alimentar, através de
redes, de articulações e das relações.
Foi constatado um reforço dos grupos de base e dos movimentos sociais, formais ou
informais, tais como as associações, os grupos de mulheres e das suas relações com as
autoridades locais.
As famílias compreendem e aplicam a soberania alimentar.
c) Direitos:
•
•
Os campesino/as melhoram o conhecimento e a defesa dos seus direitos civis, políticos,
econômicos, ambientais e culturais.
As mulheres aperfeiçoam e reivindicam a sua participação social, econômica e política no
contexto das suas comunidades e das suas organizações de base.
Nós vemos compartilhando as principais expectativas das comunidades:
•
•
•
•
Promoção do reforço da segurança e da soberania alimentar através de uma abordagem
agroecológica e de práticas de economia solidária, o que implica em melhores oportunidades
de acesso à terra e aos meios de produção, revalorização do trabalho campesino,
principalmente para os jovens e mulheres, a criação de emprego autônomo e de
microempresas rurais.
Construção de um conceito de comunidade campesina tendo como princípio as relações de
igualdade e de equidade entre homens e mulheres, cujo foco é o reforço da sua identidade, a
proteção da sua cultura, a defesa dos seus direitos sociais, seu questionamento das políticas
públicas e sua capacidade de elaborar proposta política e de reivindicar por uma reforma
agrária integral.
Dar apoio no enfrentamento dos efeitos das mudanças climáticas, com práticas
agroecológicas, na recuperação dos conhecimentos ancestrais, na sensibilização e na defesa
pela proteção do meio ambiente, na utilização responsável dos meios de vida (terra, água, ar e
capital humano), no crescimento da resiliência e da resistência dos territórios1. Diante da
depredação feita pelas multinacionais que promovem a destruição dos recursos naturais.
Ajudar na promoção do acesso aos espaços de reflexão através dos meios de comunicação
comunitários, das universidades, das escolas, das igrejas, das organizações particulares,
públicas e comunitárias, como elementos de sensibilização e de educação na promoção da
1
A defesa do território é a ação de defender coletivamente os direitos humanos que apoiam a vida e geram bem-estar. Este processo
começa a partir a partir das comunidades onde vivem as famílias rurais, em frente dos processos apropriação privada e a sobreexploração devido a latifundiários de modelo agroindustrial nacionais e estrangeiros. Estas formas de explorações introduziram-se no
comércio dos recursos naturais que deterioram os ecossistemas das comunidades (poluição, desflorestamento, uso irracional do
recurso “solo” e a substituição de sementes nativas transgénica, exploração de minas e megaprojetos).
2
cultura, da segurança alimentícia, da defesa dos elementos de vida, da troca de experiências e
de relações de economia solidária.
Diante do desafio do contexto atual e considerando os avanços obtidos nas comunidades
camponesas, continuamos acreditando que um mundo justo é possível no contexto de uma
sociedade que ofereça igualdade de condições e de oportunidades, que seja baseado
particularmente na agricultura familiar campesina e agroecológica. Para alcançarmos isso,
teremos que lutar contra o sistema neoliberal dominante a partir da promoção e luta pelo direito
à alimentação, à soberania alimentar, economia solidária e a igualdade mulher-homem.
Movidos pela força da solidariedade e da cooperação, comprometemo-nos juntos.
1) Vamos dar continuidade à construção de uma parceria durável entre os atores do sul e os do
norte para que:
• Sejamos capazes de aprender juntos com as comunidades e com os grupos de base e de
apoiarmos as suas lutas.
• Possamos atacar as causas estruturais das injustiças e das desigualdades, e não apenas seus
efeitos e assegurar que as nossas ações se encaminhem neste sentido.
• Possamos criar um espaço de intercâmbio e uma rede de solidariedade entre a gente, levando
em conta as nossas realidades diferentes, identificando aquilo que nos une no que diz respeito
as nossas diferenças para que cresça a confiança mútua baseada em valores e compromissos
comuns e que isso possa nos reforçar mutuamente.
• Sejamos capazes de promover as sinergias sul-sul, entre o sul e o norte, nos apoiando nas
capacidades próprias de cada organização.
• Conceber esta solidariedade ao longo do tempo, nos oferecendo indicadores de etapas pois a
nossa parceria vai bem além dos programas específicos levados em comum.
• Sejamos capazes de nos ajudar mutualmente de modo a diversificar as nossas fontes de
financiamento, para aumentarmos e reforçarmos as nossas redes.
• Desenvolvermos mecanismos de proteção dos líderes e dos ativistas cujas ações vêm sendo
criminalizadas.
• Aprimorarmos os nossos laços e a nossa defesa comum junto às redes e instituições, tais como
entre outros, a Via Campesina, a Fimarc2, o Mijarc3 e as igrejas.
2) Na base desta parceria, e seguros de nossas experiências nos programas anteriores, vamos
estabelecer as bases do programa que queremos desenvolver, para os anos 2017-2021, com o
apoio da Cooperação Belga. Trata-se da:
• Construção deste programa levando em conta a opinião e as expectativas das comunidades.
• Articulação do trabalho no sul e no norte, na elaboração de estratégias e ações comuns,
especialmente no domínio da defesa pelo direito à terra, e na criação de um grupo
estratégico.
• Realizar trocas e capitalização de experiências, que valorize os elementos dos programas
anteriores e que aprenda com os outros países. Vamos solicitar para que a EF se comprometa
na criação de um mecanismo para estes intercâmbios.
2
3
FIMARC = Federação Internacional des Mouvements d’Adultes Ruraux Catholiques
MIJARC = Movimento Internacional de la Jeunesse Agricole et Rurale Catholique
3
•
•
Elaborar e desenvolver uma comunicação focada no tema da valorização da agricultura
campesina e das práticas alternativas, especialmente a comunicação popular tendo como alvo
o público jovem.
E, sobretudo, procurar valorizar a agricultura familiar campesina e agroecológica, dando
prioridade aos jovens e às mulheres : se concentrar na busca pelo desenvolvimento de
técnicas agrícolas duráveis e iniciativas de economia solidária ; dar apoio à produção, à
transformação e à comercialização de alimentos saudáveis ; confirmar nosso compromisso na
defesa do direito à terra e por uma reforma agrária integral, promover a igualdade mulherhomem, reivindicar políticas públicas que apoiem a agricultura familiar e a soberania
alimentar ; partir em busca do reforço de capacidades ; lutar pelo respeito das práticas
culturais tradicionais ; por um reforço da resiliência diante da mudança climática ; pelo
incentivo à solidariedade entre produtores e consumidores.
Em conclusão, nós, Entraide & Fraternité, o conjunto todo dos seus parceiros e comunidades
campesinas, queremos reafirmar aqui o nosso compromisso em dar continuidade na construção
de redes, e dar continuidade à luta pela realização da Soberania Alimentar e da Economia
Solidária. E estamos aqui para fazer o nosso convite às demais organizações que têm os mesmos
objetivos, a sociedade civil, os governos dos nossos países, a Cooperação Belga, a se juntarem
todos a nós e ainda a dar seus apoios a este combate.
Bruxelas, 30 abril de 2015
4
Download

1 declaração do seminário de parcerias de entraide & fraternité no