Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL
RELATOR
RECORRENTE
ADVOGADO
RECORRIDO
ADVOGADO
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:
:
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:
Nº 476.713 - DF (2002/0152167-8)
MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
LA CARNE COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS LTDA
DARCY MARIA GONÇALVES E OUTROS
BANCO BOA VISTA S/A
JOSÉ WALTER DE SOUSA FILHO E OUTROS
EMENTA
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. FRAUDE DE EXECUÇÃO. ALTERAÇÃO NO
CONTRATO SOCIAL. TRANSFERÊNCIA DE BENS E COTAS. CIRCUNSTÂNCIAS DO
CASO. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA
PESSOA JURÍDICA. APLICAÇÃO. ORIENTAÇÃO DO TRIBUNAL. RECURSO
DESACOLHIDO.
I - O acórdão impugnado, examinando as circunstâncias dos autos, decidiu que as
alterações contratuais realizadas inviabilizam a execução, caracterizando fraude.
Afirmou, ademais, que não há notícia da existência de bens de propriedade da
devedora, para fins de penhora. Nesse passo, o recurso especial encontra óbice
no enunciado n. 7 da súmula/STJ.
II - Comprovada a existência de fraude de execução, mostra-se possível a
aplicação da teoria da desconsideração da personalidade Jurídica para assegurar a
eficácia do processo de execução.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma
do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por
unanimidade, não conhecer do recurso. Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro,
Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior. Ausente, justificadamente, o Ministro Fernando
Gonçalves. Presidiu a Sessão o Ministro Aldir Passarinho Junior.
Brasília, 20 de março de 2003(data do julgamento).
MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
Relator
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RECURSO ESPECIAL Nº 476.713 - DF (2002/0152167-8)
RECORRENTE
:
ADVOGADO
RECORRIDO
ADVOGADO
:
:
:
LA CARNE COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO
ALIMENTÍCIOS LTDA
DARCY MARIA GONÇALVES E OUTROS
BANCO BOA VISTA S/A
JOSÉ WALTER DE SOUSA FILHO E OUTROS
DE
GÊNEROS
EXPOSIÇÃO
O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA:
Em execução movida pelo Banco Boa Vista S/A contra a
Distribuidora de Carnes Centro Oeste Ltda., ocorreu a penhora do faturamento
da ora recorrente. Esta opôs embargos de terceiro, alegando não ser parte no
processo de execução, nem avalista, fiadora ou sucessora da empresa
executada.
Desacolhida a pretensão em primeiro grau, o Tribunal de Justiça
do Distrito Federal e Territórios negou provimento, por maioria, à apelação da
embargante, em acórdão assim ementado:
"Execução. Fraude. Teoria da Desconsideração.
É válida para o foro a procuração que, sobre não estampar a
expressão ad judicia outorga poderes para propor ação.
Considera-se em fraude à execução a transferência de cotas
sociais e constituição de nova firma, tudo na pendência do
processo executivo, podendo se dar pela desconsideração da
pessoa jurídica".
Interpostos embargos infringentes pela vencida, foram eles
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desprovidos pelo Tribunal de origem,
com acórdão lavrado nos seguintes
termos:
"Embargos infringentes. Execução. Alterações no contrato
social da empresa devedora. Fraude à execução.
I - As alterações contratuais levadas a efeito pela embargante,
concernentes à denominação social, ramo de atividade e
quadro societário, configuram fraude à execução, face à
utilização tortuosa da personalidade jurídica para lesar
credores de boa-fé. II - Embargos desprovidos".
Adveio o recurso especial, com indicação de violação do art. 593,
CPC, com os argumentos de que a recorrente não é sucessora da empresa
executada; não há comprovação nos autos da insolvência da devedora; não
ocorreu, na espécie, qualquer transferência ou alienação de bens por parte da
devedora. Em linhas gerais, argumenta a recorrente que não houve fraude de
execução.
Com as contra-razões, o recurso foi inadmitido na origem, subindo
os autos em razão de provimento de agravo.
É o relatório.
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VOTO
O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA(Relator):
1. É entendimento desta Corte de que a ocorrência de fraude de
execução, nos termos do art. 593 do Código de Processo Civil, pressupõe ação
em curso, com citação válida. Neste sentido, o REsp 333.161-MS(DJ
15.4.2002), assim ementado, no que interessa:
"I – A jurisprudência deste Tribunal tem entendimento firme
no sentido de que a caracterização da fraude de execução
prevista no inciso segundo (II) do art. 593, ressalvadas as
hipóteses de constrição legal(penhora, arresto ou seqüestro),
reclama a ocorrência de uma ação em curso(seja executiva,
seja condenatória), com citação válida, e o estado de
insolvência a que, em virtude da alienação ou oneração, teria
sido conduzido o devedor".
Ainda a esse respeito, transcrevo o REsp 418.109-SP(DJ
2.9.2002), ementado nos seguintes termos:
"Fraude de execução. Precedentes da Corte.
1. É monótona a jurisprudência da Corte no sentido de que a
fraude de execução não se configura sem a citação válida,
insuficiente para tanto o simples ajuizamento da demanda.
2. Recurso especial conhecido e provido".
No caso, dúvida não há de que as alterações contratuais das
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empresas foram promovidas após à citação no processo executório, consoante
se depreende de trecho do voto vencedor proferido no acórdão impugnado:
"Os executados - Distribuidora de Carnes Centro
Oeste Ltda
e Paulo Cézar Borges dos Santos,
representante legal daquela, foram citados em 28 de
fevereiro de 1996.
Posteriormente à citação, em 23.03.96, ou seja, em
menos de um mês depois, a Lanchonete Pão de Queijo
Ltda., de propriedade da esposa do segundo executado teve
seu contrato social alterado para constituir a empresa La
Carne (fls. 14/16), instalada no mesmo endereço da
primeira executada, transferida para outra localidade, e
desenvolvendo as mesmas atividades comerciais dessa.
Ainda, como havia risco de bens da esposa do executado
serem penhorados, quando da citada alteração contratual,
da Lanchonete Pão de Queijo para a empresa La Carne,
essa foi transferida para a mãe do executado e suas
cunhadas" (fl. 165).
Cinge-se a controvérsia, na realidade, em decidir se as alterações
contratuais das pessoas jurídicas envolvidas na espécie caracterizam a
ocorrência de fraude, a impor a desconsideração da personalidade jurídica.
2. Como se viu, uma terceira empresa, Lanchonete Pão de Queijo
Ltda., de propriedade da esposa do segundo executado - sócio da primeira,
teve seu contrato social alterado para constituir a empresa La Carne Comércio
e Representação de Gêneros Alimentícios Ltda, ora recorrente. Esta passou a
ocupar o endereço da devedora e utilizar do mesmo maquinário. A devedora,
por sua vez, foi transferida para outra localidade.
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O acórdão impugnado, examinando as circunstâncias dos autos,
decidiu que as alterações contratuais realizadas inviabilizam a execução,
caracterizando fraude. Afirmou, ademais, que não há notícia da existência de
bens de propriedade da devedora, para fins de penhora, como se vê do
seguinte trecho do voto vencedor do acórdão impugnado, da lavra da
Desembargadora Vera Andrighi:
"Senhor Presidente, tive compreensão diversa dos
autos. De fato, ela forneceu outro endereço, no entanto, lá
nada mais foi encontrado, nem empresa e nem bens" (fl.
168)".
Nestes termos, a pretensão recursal encontra óbice no enunciado
n. 7 da súmula/STJ, uma vez indispensável o reexame de matéria
fática-probatória para eventual provimento da irresignação.
3. É de registrar-se que este Tribunal tem entendimento pela
aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica quando
determinados atos praticados pela pessoa jurídica devedora importem em
fraude prejudicial aos interesses do credor. Cito, por oportuno, o REsp
211.619-SP(DJ 23.4.2001), assim ementado, no que interessa:
"III – Provada a existência de fraude, é inteiramente
aplicável a Teoria da Desconsideração da Pessoa Jurídica a
fim de resguardar os interesses dos credores prejudicados.
IV - Recurso especial não conhecido"(Rel. Min. Castro
Filho).
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No mesmo sentido, o REsp 86.502-SP(DJ 26.8.1996), lavrado nos
seguintes termos:
"Desconsideração da pessoa jurídica. Pressupostos.
Embargos de devedor.
É possível desconsiderar a pessoa jurídica usada para
fraudar credores"(Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar).
Desse modo, evidenciada a fraude, merece aplicação tal teoria, nos
moldes em que foi feito pelo Tribunal de origem.
4. Finalmente, não merece lograr êxito a sustentada inexistência de
transferência ou alienação de bens por parte da executada, uma vez que tal
ocorrência encontra-se exaustivamente comprovada no aresto atacado,
consoante demonstra o seguinte trecho também do voto vencedor:
"Evidencia-se, portanto, que trata-se de empresas do mesmo
ramo da executada, seus componentes fazem parte da
mesma família, e encontra-se situada no mesmo endereço
daquela, ficando patente a fraude, com a constituição de
nova empresa e transferência de cotas, alterando o corpo
societário" (fl. 165).
5. À vista do exposto, não conheço do recurso especial.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2002/0152167-8
RESP 476713 / DF
Números Origem: 200200597332 980110277954
PAUTA: 18/03/2003
JULGADO: 20/03/2003
Relator
Exmo. Sr. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. WASHINGTON BOLÍVAR DE BRITTO JÚNIOR
Secretária
Bela. CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
AUTUAÇÃO
RECORRENTE
ADVOGADO
RECORRIDO
ADVOGADO
: LA CARNE COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS
LTDA
: DARCY MARIA GONÇALVES E OUTROS
: BANCO BOA VISTA S/A
: JOSÉ WALTER DE SOUSA FILHO E OUTROS
ASSUNTO: Civil - Contratos - Locação
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Barros Monteiro, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior
votaram com o Sr. Ministro-Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Fernando Gonçalves.
O referido é verdade. Dou fé.
Brasília, 20 de março de 2003
CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
Secretária
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