PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
ACÓRDÃO
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N. 037.2007.005861-7/2 - SOUSA
Relator
: Des. Joás de Brito Pereira Filho
Recorrentes : 1. José Washington Dantas (Adv. Ozael da Costa Fernandes) e 2.
Francinaldo Saturnino da Silva -(Adv. João Marques Estrela e Silva)
Apelada
: Ministério Público Estadual
Homicídio
qualificado.
Fundamentação.
PRONÚNCIA.
Qualificadoras. Decisão sucinta. Nulidade. Inexistência.
Legítima defesa. Excludente não evidenciada, extreme de
dúvida. Negativa de autoria. Indícios que apontam a
participação do segundo acusado. Decisão mantida. Recursos
não providos.
I - A despeito de fundamentar o seu convencimento, a
legislação processual não obriga que o Juiz se detenha, na
pronúncia, à análise demorada da tese ou teses esposadas
pela defesa, bastando que se limite a uma exposição sucinta
do articulado pelas partes, máxime na hipótese de pronúncia,
em que, qualquer posicionamento mais profundo poderá ter
reflexos no ânimo dos jurados.
II - Sobre as qualificadoras, mesmo não havendo
fundamentação específica, o contexto da decisão de
pronúncia demonstra que estas não poderiam ser refutadas,
de pronto, eis que há, de fato, indícios de que a vítima foi
executada de surpresa, por causa de uma discussão banal,
ocorrida no dia anterior, entre ela e um irmão do executor.
III - Não ressaindo da prova, extreme de dúvida, ter o autor do
disparo que matou a vítima agido em legítima defesa e
havendo indícios seguros de que o outro imputado prestou
contributo, emprestando apoio moral e logístico ao executor,
com quem fugiu logo após a consumação do homicídio, é
imperativa a pronúncia para que sejam levados a julgamento
perante o Tribunal do Júri, competente para dar o veredicto
final.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
RSE 037.2007.005861-7/2
IV - Preliminares afastadas. Recursos não provido.
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal,
acima identificados:
ACORDA a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça da Paraíba, à
unanimidade, em negar provimento ao apelo.
Na comarca de Sousa, JOSÉ WASHINGTON DANTAS e FRANCINALDO
SATURNINO DA SILVA, qualificados nos autos, foram denunciados como incursos
nas sanções dos arts. 121, 52°, II e IV, do CP, e 14, da Lei n. 10.826/2003,
acusados da prática, em comunhão de desígnios, do crime de homicídio contra
José Paulo Ferreira da Silva, fato ocorrido no dia 13 de junho de 2007, no
terminal rodoviário daquela cidade.
Pronunciados, nos termo da exordial acusatória, os réus recorrem
em sentido estrito, fls. 190/191,alegando, ambos, preliminarmente, que a
sentença é nula, pois, deixou de fundamentar adequadamente a rejeição das
teses da negativa de autoria e de legítima defesa, por eles sustentada, além do
que, também sem a necessária justificativa, acolheu as qualificadoras do
homicídio.
No mérito, rogam, Francinaldo, a despronúncia, posto que, à sua
ótica, não há prova de que sequer estivesse presente no palco dos
acontecimentos; já José Washington pleiteia a absolvição sumária, sob o
argumento de que apenas se defendeu de agressão, atual e injusta, da vítima,
isto por conta de entrevero ocorrido no dia anterior entre esta e um irmão dele
recorrente, fls. 193/214.
Contrarrazões, às fls. 216/225, pugnando pela rejeição das
preliminares e a manutenção da decisão censurada. Às fls. 226, o douto Juiz
despachou reafirmando os termos da pronúncia.
2
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
RSE 037.2007.005861-7/2
Parecer da douta Procuradoria de Justiça, subscrito pela Dra. Maria
Salete de Araújo Melo Porto, Promotora de Justiça convocada, às fls. 232/235,
manifestando-se pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO - Des. Joás de Brito Pereira Filho (Relator):
Por atenderem aos pressupostos de admissibilidade, conheço dos
recursos.
Consoante relatei, intenta a defesa dos réus a anulação da decisão
de pronúncia, sob o argumento de que o douto Juiz não enfrentou as teses
sustentadas nas razões derradeiras, além do que deixou de fundamentar o
reconhecimento das qualificadoras do homicídio. No mérito, José Washington
pede a absolvição sumária, dizendo ter agido sob o amparo da legítima defesa,
enquanto que Francinaldo nega qualquer envolvimento no episódio.
De início, reporto-me ao fato incriminado.
Pesa contra José Washington a acusação de haver matado a vítima
com um disparo de espingarda calibre 12, em razão de embates verbal e físico
ocorrido entre esta e um irmão desse imputado, no dia anterior ao homicídio.
Para tanto, o executor teria contado com o apoio moral e logístico de
Francinaldo, seu padrasto, que o acompanhava no momento do disparo, o qual
ficara dando cobertura, no interior do veículo em que, logo em seguida,
encetaram fuga.
O douto Juiz, na decisão censurada, assim se expressou:
"Cuidam os autos de delito de homicídio qualificado (art, 121, §
2°, incisos II e IV, CPB) c/c porte de arma (art. 14 da Lei n° 10.826/2003),
onde o representante do Ministério Público logrou comprovar todos os
termos da denúncia.
3
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
RSE 037.2007.005861-712
A materialidade é verificada pela Certidão de Óbito de fls. 15, e
por tudo que o processo nos apresenta.
Os depoimentos testemunhais indicam que os mesmos tiveram
participação na autoria do delito de homicídio qualificado contra a
vítima.
Há elementos nos autos de que os réus portavam ilegalmente
arma de fogo de uso permitido no cometimento do crime, fato que
configura o delito de porte ilegal de arma de fogo, vez que não possuía
autorização legal.
Está bem delineado nos autos que o delito foi praticado por
motivo fútil, bem como com uso de recurso que inibiu ou impossibilitou a
defesa da vítima, configurando as qualificadoras mencionadas.
Não vislumbramos dos autos, de forma inconteste, a presença da
excludente da criminalidade, pois se patenteou a presença do animus
necandi.
Da análise dos elementos contidos nos autos é de se concluir pela
411
pronúncia dos réus para julgamento perante o tribunal do júri popular.
Ex positis, considerando o mais que dos autos consta, com base
no art. 413 , caput, do Código de Processo Penal, julgo por bem
PRONUNCIAR os réus JOSÉ WASHINGTON DANTAS, conhecido por
"WASHINGTON" e FRANCINALDO SATURNINO DA SILVA, ambos devidamente
qualificados, como incurso nas penalidades do art. 121, § 2o, inciso II e IV
do CPB, c/c art. 14 da Lei Federal n° 10.826/2003, a fim de serem
julgados pelo Tribunal do Júri Popular desta Comarca. (...)", fls. 182/184.
Em verdade, trata-se de decisão sucinta. Mas, a meu ver, não se
confunde com decisão desfundamentada.
4
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
RSE 037.2007.005861-7/2
Bem ou mal, o douto Magistrado refutou os argumentos da defesa,
quando entendeu presentes os indícios de que os réus atuaram em conjunto, um
executando e o outro dando cobertura, à distância, deixando claro o seu
convencimento pela existência de indícios de participação de Francinaldo no
evento e a não comprovação da excludente invocada por José Washington.
É de se destacar, por oportuno, que, a despeito de fundamentar o
seu convencimento, a legislação processual não obriga que o Juiz se detenha, na
pronúncia, à análise demorada da tese ou teses esposadas pela defesa, bastando
que se limite a uma exposição sucinta do articulado pelas partes, máxime na
hipótese de pronúncia, em que, qualquer posicionamento mais profundo poderá
ter reflexos no ânimo dos jurados.
Com efeito, se tivesse ocorrido, ao revés do que corretamente foi
posto na decisão de pronúncia, uma análise mais acurada da prova ou mesmo
pronunciamento antecipado do Juiz sobre a pertinência ou não da tese de
defesa, tal situação é que viria acarretar a nulidade da decisão, por intromissão
indevida na seara do Júri.
Desse modo, deixando o julgador de expender impressões pessoais
acerca das teses de acusação ou de defesa, evidentemente que pretendeu, de
modo correto, deixar os juizes leigos absolutamente à vontade para discernir,
quanto à matéria em causa, à luz do contraditório e da ampla defesa, segundo a
sua livre convicção.
"SENTENÇA DE PRONÚNCIA - FUNDAMENTAÇÃO SUCINTA NULIDADE - INEXISTÊNCIA - PRONÚNCIA - QUALIFICADORAS DECOTAÇÃO - NÃO CABIMENTO - Na sentença de pronúncia,
não cabe ao Juiz analisar, com profundidade, o mérito da
causa, bem como o conjunto das provas, pois, se o fizesse,
poderia usurpar competência do Tribunal do Júri. Fundamentação sucinta. Nulidade inexistente. - Para que se
5
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
RSE 037.2007.005861-7/2
subtraia ao julgamento do Júri a faculdade de reconhecer ou
não a qualificadora do homicídio, é indispensável que esta
seja de manifesta improcedência." (1964493 MG
1.0000.00.196449-3/000(1), Relator: JOSÉ ANTONINO BAÍA
BORGES, Data de Julgamento: 08/02/2001, Data de
Publicação: 20/02/2001).
Diante disso, rejeito a primeira preliminar, suscitada por ambos
•
os apelantes.
Sobre as qualificadoras, mesmo não havendo fundamentação
específica, o contexto da decisão de pronúncia bem demonstra que estas não
poderiam ser refutadas, de pronto, eis que há, de fato, indícios de que a vítima
foi executada de surpresa, apenas por causa de uma discussão banal, ocorrida no
dia anterior, entre ela e um irmão do executor.
A propósito:
"Pronúncia. Fundamentação sucinta. Nulidade. lnocorrência.
Qualificadora. Dúvidas. Manutenção.Não há que se falar em
•
nulidade por falta de fundamentação da decisão que, ainda
que de forma sucinta, delineia os motivos para inclusão da
qualificadora, a qual, ainda que se mostre de forma
controvertida, deve ser mantida para que o Tribunal do Júri
delibere sobre sua ocorrência." (10702063347356 RO
1.0702.06.334735-6, Relator: Desembargadora Zelite Andrade
Carneiro, Data de Julgamento: 02/09/2010, 1a Vara Criminal).
Afasto, também, essa prefacial, arguida por ambos os apelantes.
No mérito, ambos os réus buscam a reforma da pronúncia, o
primeiro, dizendo ter agido sob o amparo da legítima defesa e, o segundo,
porque nem estava no local onde se deu o homicídio.
2ro
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
RSE 037.2007.005861-7/2
Não têm razão os recorrentes.
A prova é clara no sentido de que, no dia anterior, a vítima teve um
entrevero com o corréu José Washington. No momento do fato aqui tratado,
segundo os informes constantes dos autos, achava-se no interior do seu veículo,
desarmada, quando chegou o réu empunhando uma espingarda doze, com a qual
foi alvejada, morrendo a poucos metros, enquanto buscava por socorro.
A mesma prova dá conta de que, no instante em que José
Washington executava a vítima, o seu padrasto, Francinaldo Saturnino da Silva, o
aguardava no carro, tendo, com o executor, deixado o local após consumado o
homicídio.
É o que se extrai do testemunho de Jucélio Alves Estrela, em juízo,
que disse ter conversado com a vítima pouco antes, avistando o momento em
que "...chegaram na rodoviária os acusados; que enquanto a vitima ainda se
encontrava no interior do veiculo Monza o acusado Washington aproximou-se do
aumotável da vitima com uma espingarda calibre 12 em punho efetuando o
disparo, ao depois foragindo juntamente com Naldo que tinha ficado como
passageiro no veículo gol de propriedade do primeirio acusado, vale ressaltar
que enquanto Washington se aproximava da vitima fatal o segundo acusado
permaneceu no interior do seu veiculo no banco de passageiro foragindo em
seguida; que o primeiro acusado aproximou-se da vitima e sem qualquer
discussão efetuou o disparo calibre 12; que a vitima saiu de dentro do carro
com a camisa manchada de sangue em direção ao regional socorrido por Coca,
Micôca e eto enquanto os acusados foragiram no veiculo gol e o depoente se
deslocava para avisar a família da vitima. (...)", fls. 130.
Não precisa transcrever outros depoimentos, aliás, convertentes
com o acima transcrito, pois, somente este basta a afastar a tese dos réus,
transferindo para os jurados a decisão final, até porque, corno sabido, a
pronúncia é juízo de mera possibilidade da acusação, ficando eventuais dúvidas
sobre a configuração da excludente invocada ou a efetiva participação do correu
ser dirimida pelos Juízes de fato, como, aliás, têm decidido os nossos Tribunais:
7
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
RSE 037.2007.005861-7/2
"Por ser a pronúncia mero juízo de admissibilidade da
acusação não é necessário prova incontroversa do crime, para
que o réu seja pronunciado. As dúvidas quanto a certeza do
crime e da autoria deverão ser dirimidas durante o julgamento
pelo Tribunal do Júri. Precedentes do STF". (STF/RT 730/46).
"VI- Na fase da Pronúncia (iudicium accusationis), reconhecida
a materialidade do delito, qualquer questionamento ou
ambigüidade faz incidir a regra do brocardo in dúbio pro
societate"( STJ RSTJ 115/462).
"Para fins de pronúncia, não se exige a mesma certeza que se
faz necessária para condenar, pois ela representa mero juízo
de adminissibilidade da acusação, vigorando, nesta fase
processual o princípio in dúbio pro societate". (TJSP/TJJ
175/137).
"Havendo nos autos prova demonstrando a existência do crime
e, por outro lado, suficientes indícios de que o acusado seja o
seu autor, deve o mesmo ser pronunciado, não exigindo-se
prova incontroversa da existência do crime. Havendo dúvida,
deve o réu ser pronunciado. Provido o Recurso do Ministério
Público". (TJRJ/ RT 728/630).
"PROCESSO PENAL - TRIBUNAL DO JÚRI - PRONÚNCIA RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - LEGÍTIMA DEFESA EXCLUDENTE QUE NÃO AFLORA DE FORMA INEQUÍVOCA DÚVIDA EM PROL DA SOCIEDADE. IMPROVIMENTO. Comprovada
a materialidade e havendo indícios da autoria, a alegada
Legítima defesa não aflorando de forma inequívoca, confirmase a sentença que submeteu o réu a julgamento pelo tribunal
do júri. Nessa fase processual, qualquer dúvida há de ser
debelada em prol da sociedade." (TJDF, RSE n.°
2005.03.1.018907-3, rel. Des. Romão Cícero, in DJ de
11/01/2006, p. 27).
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA
Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho
RSE 037.2007.005861-7/2
Nesse sentir, não ressaindo da prova, extreme de dúvida, ter o
autor do disparo que matou a vítima agido em legítima defesa e havendo indícios
seguros de que o outro imputado prestou contributo, emprestando apoio moral e
logístico ao executor, com quem fugiu logo após a consumação do homicídio, e
imperativa a pronúncia para que sejam levados a julgamento perante o Tribunal
do Júri, competente para dar o veredicto final.
Isto posto, nego provimento aos recursos, em harmonia com o
parecer da douta Procuradoria de Justiça.
É como voto.
Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Senhor Desembargador
Carlos Martins Beltrão Filho, sem voto, Presidente da Câmara Criminal. Dele
participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Joás de Brito Pereira
Filho, Relator, Arnóbio Alves Teodósio e João Benedito da Silva.
SALA DE SESSÕES "DES. M. TAIGY DE QUEIROZ MELO FILHO" DA
CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA, em João Pessoa,
Capital, aos 17 (dezessete) dias do mês de janeiro do ano de 2013.
Desembargador J
rito Pereira Filho
- RELI OR -
9
TRIBUNAL DE JUSrlçA
lo
Diretorid Judiciaria
R egistrad
o
e
Download

ACÓRDÃO